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expediente
revista OLD #número 56
equipe editorial direção de arte texto e entrevista
Felipe Abreu e Paula Hayasaki Tábata Gerbasi Angelo José da Silva, Felipe Abreu e Paula Hayasaki
capa fotografias
Pietro Paolini Fernando Moleta, Inti Gajardo, Maria Oliveira, Pietro Paolini e Romy Pocztaruk
entrevista email facebook
João Kehl e Rafael Jacinto revista.old@gmail.com www.facebook.com/revistaold
@revista_old
tumblr
www.revistaold.tumblr.com
@revistaold
índice
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livros quina exposição
pietro paolini por tfólio
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romy pocztaruk por tfólio
inti gajardo por tfólio
joão kehl & rafael jacinto entrevista
104 84 104 120
fernando moleta por tfólio
maria oliveira por tfólio
reflexões coluna
carta ao leitor
Este editorial vai ser um pouco diferente do que o normal. Antes de comentar os trabalhos desta edição vou abordar um tema que insiste em assombrar a fotografia e tantas outras áreas profissionais. Fica cada vez mais clara a quantidade de abusos e de diferença de tratamento recebidas por fotógrafas ou praticadas por fotógrafos que, por algum motivo, se veem no direito de se impor pelo simples motivo de terem nascido com o gênero masculino. A OLD não compactua com nenhuma atitude deste tipo e sempre se posicionou como uma publicação igualitária, que dá espaço para jovens fotógrafas e fotógrafos para apresentar seus trabalhos e textos sobre fotografia, sem nenhum tipo de distinção social ou de gênero.
Decidi aproveitar para este tópico parte considerável das poucas linhas que tenho aqui porque estas atitudes violentas e mesquinhas não podem mais passar em vão. Somos todos iguais atrás e em frente às lentes e devemos ser julgados apenas pela qualidade dos nossos trabalhos. Neste mês, apresentamos mais uma vez uma mistura de fotógrafas e fotógrafos das mais variadas origens e abordagens visuais, ressaltando a qualidade e a pluralidade da fotografia que se produz hoje. São eles: Pietro Paolini, Romy Pocztaruk, Inti Gajardo, Fernando Moleta e Maria Oliveira, acompanhados de uma entrevista com João Kehl & Rafael Jacinto.
por Felipe Abreu
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livros
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MASKE
de Phyllis Galembo
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hyllis Galembo viajou por vinte anos por boa parte da África Ocidental e do Haiti para produzir Maske. Deste intenso esforço a fotógrafa produziu uma série impressionante de retratos de eventos ritualísticos com uso de máscaras. Há na série mascarados que traduzem da alegria ao temor completo. O livro e, por consequência as fotografias, tem uma visão bastante direta dos seus retratos, que busca apresentar não só com respeito, mas com uma certa reverência histórica a seus personagens. Maske acaba de ser lançado pela Aperture e se posiciona como uma grande coletânea do incrível trabalho de Galembo, o organizando geográfica e temporalmente. Se a lógica narrativa não parece das mais complexas, a qualidade fotográfica parece compensar este problema.
Disponível no site da Aperture valor R$160 208 páginas 6
livros
CATHEDRAL OF THE PINES de Gregory Crewdson
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regory Crewdson é um mestre da iluminação e da construção de performances fotográficas. Suas sempre melancólicas imagens tem um nível de precisão e de controle inigualáveis. São fotografias que facilmente te transportam para um mundo em que realidade e ficção se perdem e se mesclam quase que completamente. Em seu novo livro, lançado em Dezembro pela Aperture, Crewdson constrói uma narrativa geográfica criada em homenagem à uma pequena cidade no interior do Massachusetts. A nova publicação é o primeiro trabalho inédito do artista em cerca de cinco anos e chega para encerrar um período de problemas pessoais e reclusão social, justamente na área que dá nome ao livro.
Disponível no site da Aperture valor R$280 76 páginas 7
exposição
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A CONSTRUÇÃO DE UMA GEOGRAFIA ATRAVÉS DE SUAS LINHAS Mariana Tassinari apresenta sua individual Quina, na Fauna Galeria, com curadoria de Eder Chiodetto e o constante objetivo de reconstruir cada espaço apresentado.
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ariana Tassinari buscou em seu arquivo fotográfico o material base para construir a sua nova exposição. A mostra, composta por três séries – Entre, Caixa e Quina – é um exercício constante de ressignificação do olhar e de um passado produzido pela fotógrafa. As obras apresentadas em Quina flertam com a colagem fazendo da união de imagens sua principal - e mais potente – ferramenta expressiva. São linhas, texturas, cantos e cores que se unem para transformar o que um dia foram apenas registros de viagens em uma geografia própria e pulsante, ca-
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paz de construir novos mundos em frente ao espectador. A curadoria da mostra é de Eder Chiodetto, que aponta como “Mariana Tassinari atiça, revolve, provoca a linguagem. Entres, quinas, arestas e dobras formam uma espécie de alfabeto particular com o qual a artista rearticula as possibilidades de construir o plano, de reinventar códigos e combinações entre a digura e o fundo.” Na construção desta nova tridimensionalidade, Mariana Tassinari faz uso de diferentes apresentações visuais e assim divide as três séries que
compõem a mostra: Entre apresenta fotografias em backlight, Caixa fotografias em impressão UV em caixas de madeira e Quina fotografias de impressão UV em alumínio. Criando mais um elemento para este processo visual, a mostra também se traduz em livro, de mesmo nome, lançado junto à exposição e criando mais um layer de uniões entre linhas e texturas, agora em papel. Quina segue em cartaz na Fauna Galeria até o dia 30 de Abril. A Fauna está na Rua Tangará, 132, na Vila Mariana.
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PIETRO PAOLINI Balance on the Zero
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ietro Paolini vagou pelo Equador durante meses, buscando a melhor maneira de representar a cultura e a vida diária do país. Na série Balance on the Zero, Pietro apresenta um país que caminha entre o surreal e o delicado, com uma série de personagens e espaços marcantes. Em sua visão não há o desejo de julgar ou construir uma visão antropológica de um país, mas sim apresentar pequenos detalhes que instiguem o observador a completar a viagem em sua própria mente.
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pietro paolini
Busquei descobrir as paisagens e Pietro, como começou seu interesse pela fotografia? Comecei a me interessar por fotografia durante o ensino médio, depois disso estudei por três anos na Fondazione studio Marangoni na Itália. A fotografia me ajudou a ter uma identidade e a dar sentido à minha vida, meu interesse sempre foi primeiramente com o meio e não como uma profissão em si. Seguindo minhas necessidades e o que eu sentia eu fui capaz de construir minha visão fotográfica, que lentamente se tornou minha profissão. Em 2006 fundei junto com um grupo de fotógrafos o coletivo TerraProject e assim começou minha vida profissional como fotógrafo documental.
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Nos conte sobre a criação de Balance on the Zero. A série desenvolvida no Equador faz parte de um projeto maior que apresenta três países latino-americanos que vivem o novo socialismo: Venezuela, Bolivia e Equador. Meu interesse era principalmente retratar a vida diária nestes países e não fazer um julgamento político destas experiências. Busquei descobrir as paisagens e as pessoas sem preconceitos, com suas tradições e contradições. A abordagem sempre era bastante aberta, vagando pelo país e deixando o inesperado me capturar. Quais foram os desafios de fotografar uma cultura diferente da sua? O desafio é se manter aberto e des-
as pessoas sem preconceitos, com suas tradições e contradições. construir meu imaginário europeu sobre este espaço. A possibilidade de viver uma cultura diferente é uma das coisas mais bonitas em fotografia. Também tenho que considerar que a minha visão pessoal é essencial para produzir um ponto de vista interessante. Enfim, fiz quatro viagens para lá durante dois anos e realmente gosto de me perder no lugar em que trabalho, me deixar levar, e não vejo também diferenças além da geografia entre Europa e América Latina, já que pela colonização a cultura da região tem uma série de traços europeus. Há gente no Equador que vive
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em mansões com piscinas e carros importados, que percebi que eram completamente deslocados do que entendemos como a cultura local, por exemplo. Você tinha uma série de maneiras distintas para representar a cultura equatoriana em suas imagens. Como você selecionou seus tópicos e como você buscou organizá-los em sua história? Simplesmente não organizei nada, só viajei muito buscando lugares interessantes dentro do país, às vezes com uma ideia em mente que acaba se transformando completamente quando chego ao local. Para mim, é fundamental não tentar construir a história antes de realizá-la. Gosto de seguir sugestões visuais e um estado mental pessoal. É claro que existem
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alguns tópicos recorrentes em meu trabalho, como a contradição entre passado e presente, ancestralidade e colonialismo, sonho, surrealismo, etc.
é uma metáfora da vida e do mundo, socialismo e capitalismo, Europa e América do Sul, tradição e globalização, eu e o mundo.
Você fala de equilíbrio – e da falta dele – em volta da linha do Equador no texto sobre o projeto. Como você buscou representar visualmente este sentimento? Eu estava buscando por uma luz bastante suave, nas fotos sempre há um céu cinza que me dá a sensação de suspensão. Nos retratos também, muito vezes não é claro o que está acontecendo na foto, pode ser uma coisa ou outra completamente diferente. Gosto quando o observador não tem certeza do que vê e tem que fazer um esforço ou colocar algo de sua própria interpretação para completar o sentido da foto. O equilíbrio
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ROMY POCZTARUK Feira de Ciências
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omy Pocztaruk começou a produzir sua fotografia depois de sua graduação em artes visuais no Rio Grande do Sul. Esta experiência prévia com outras formas de expressão e a maturação de seu pensamento visual trazem um frescor e uma lógica produtiva muito marcantes em sua obra. Em Feira de Ciências, Romy busca a construção de paralelos entre arte e ciência, suas técnicas e a maneira com que os dois campos transformam os objetos que apresentam ou estudam. É um caminho fantástico entre museus, fábricas e caçadores.
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Procurei imagens que colocam em Romy, como começou seu interesse pela fotografia? Foi durante a graduação em artes visuais no Instituto de Artes da UFRGS, quando comecei o curso pensava em trabalhar com pintura e desenho mas isso foi mudando ao longo do curso e passei a me interessar por questões relacionadas a fotografia e ao vídeo. Logo apos a graduação, comecei o mestrado com um trabalho que partia de apropriações de materiais audiovisuais. Nessa época, passei a utilizar a fotografia como registro de trabalhos e também ações/ intervenções urbanas e aos poucos fui incorporando a fotografia no meu trabalho de forma sistemática. Nos conte sobre a produção do ensaio
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Feira de Ciências. Feira de Ciências é um projeto em andamento que comecei a desenvolver em 2012 durante uma residência na China. Parte de uma coleção de imagens e objetos que articulam relações possíveis entre metodologias utilizadas nos campos da arte e da ciência. Meu interesse inicial foi colocar em discussão a relação entre arte e ciência e como cada campo, com as suas especificidades e particularidades, transformam os objetos. Uma transmutação mágica entre dois campos de conhecimento que se cruzam em várias especificidades. Na China, visitei e fotografei diversos museus de história natural. Durante essas visitas, o que me chamou a atenção foram os modos de dispo-
“dúvida” o universo científico para criar uma narrativa poética sição/apresentação e as estratégias de representação utilizadas nesses lugares. Comecei a traçar paralelos possíveis entre esses sistemas e as metodologias que são utilizadas também no universo artístico. As fotografias dos caçadores de insetos, por exemplo, estavam em um museu de ciência como imagens didáticas de uma atividade científica de coleta de material para pesquisa mas se aproximam do que se conhece hoje por “fotografia encenada”, ou seja, fotografias que são construídas como um teatro do real. Quando essas imagens saem do seu contexto de origem e
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são deslocadas para outro campo adquirem novos significados e possibilidades de leitura. Como então, me pergunto, cruzar esses campos e criar novos sentidos para imagens. Foram esses, os questionamentos iniciais para o desenvolvimento do projeto Feira de Ciências. Qual o papel da ficção e do fantástico na construção desta série? No processo de edição dessa serie procurei criar uma narrativa ficcional, misturando imagens de diversas origens que criam um dialogo entre o campo da arte e o imaginário visual científico. No processo de produção e seleção dessas imagens, acabei encontrando imagens estranhas, que desorientaram meu olhar pois desviavam os sentidos de narrativas pré -estabelecidas. A imagem do cavalo
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com três pernas, por exemplo, pode ser um documento de uma anomalia científica, mas deslocada para o universo da arte adquire um novo sentido, através de infinitas possibilidades de leitura e novas camadas de significado. Assim, para esse projeto, busquei criar um universo que dialoga com o intervalo de sentidos e nãosentidos, que se produzem e, concomitantemente, interrompem-se. A literatura fantástica, principalmente Borges e Bioy Casares, também foi uma referencia essencial para desenvolver esse trabalho.
ciência, principalmente de estratégias utilizadas nestes dois campos para produção e recepção de imagens. Parti da discussão sobre a relação entre arte e ciência como uma antinomia, construída historicamente, como afirmação das diferenças entre estes dois campos. Assim, procurei em imagens que colocam em “dúvida” o universo científico para criar uma narrativa poética e dessa maneira estabelecer fissuras em discursos pré-estabelecidos.
Quais foram os pontos mais interessantes de se trabalhar de uma maneira artística questões científicas? Um dos ponto de partida desse projeto foi produzir uma reflexão crítica a respeito das relações entre arte e
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INTI GAJARDO Fractura
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omentos de grandes mudanças e a possibilidade de respirar novos ares costumam ser ótimos motores criativos. Enfrentar novas situações, frustrações e alegrias contribuem para a criação e para o crescimento de quem produz. No caso de Inti Gajardo uma mudança entre continentes foi o empurrão necessário para a construção de Fractura, uma série que lida com sentimentos comuns a qualquer migrante e conseguem dar uma cara aos sentimentos confusos de quem chega para se instalar em um novo país.
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Inti, como começou seu interesse pela fotografia? Meu interesse pela fotografia nasceu de uma maneira bastante espontânea com mais ou menos 15 anos, não tenho muita certeza da idade. Só me lembro de estar sempre tirando fotos da minha família e amigos de uma maneira muito natural, sem ter nenhuma noção de técnica. Tive uma infância e juventude bastante agitadas e acho que a fotografia nestes momentos foi uma maneira de nutrir esta tremenda inquietude que eu tinha. Com 19 comecei a estudar moda, mas só durei um semestre e fui neste momento que percebi que tinha que me dedicar completamente à fotografia e mudei do design de moda para o fotojornalismo.
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Acredito que sempre de alguma forma ou outra mantenho meu interesse pela fotografia, mesmo que em momentos em que esteja completamente dedicada a outras coisas, sempre estou fotografando. Nos conte um pouco sobre a criação de Fractura. Foi um processo bastante confuso na verdade. No princípio só fazia fotos de uma maneira muito espontânea, sem pensar muito, partindo das emoções que nem eu conseguia entender perfeitamente. Minha vida pessoal estava em um momento de grande transformação, já que tinha decidido deixar o Chile, meu país natal, e me mudar para Barcelona, uma decisão que tomei em menos de um mês,
Assim nasce Fractura, com a ideia de capturar o desenraizamento, as incertezas do meu novo entorno e das pessoas que também as vivem nele. para começar tudo do zero. Assim nasce Fractura, com a ideia de capturar o desenraizamento, as incertezas do meu novo entorno e das pessoas que também as vivem nele. Acho que é uma série de fotos que não tenho concluída, sigo fazendo imagens que falam dessa Fractura. Como você buscou materializar sentimentos, como medo, amor, raiva, em suas imagens? A verdade é que nunca me propus a buscar imagens que projetassem amor, medo, raiva, etc. Só fazia fotos de uma maneira muito impulsi-
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va. Fractura é um trabalho sobre um processo muito pessoal. Ao longo do tempo, com a ajuda de meus professores e guias Camilla de Maffei e Eugeni Gay Marin do El Observatorio, fui me dando conta do que queria transmitir com minhas imagens e que ela falavam de raiva, incertezas e amor, tudo sobre o processo que eu estava vivendo. Como foi o processo de edição da série e quais foram os desafios desta etapa? O processo de edição foi bastante complexo e lento porque não tinha muita consciência do que estava fazendo no início, só estava criando de uma maneira muito impulsiva e não pensando muito. Acabei me guiando pelo que eu sentia sobre cada fotografia, até que chegou um momento em que tive que parar, pensar e ver
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o que eu queria transmitir com tantas imagens. Acho que este foi o primeiro desafio, porque também era, de uma certa forma, um momento de me enfrentar e enfrentar o que eu estava vivendo. Mas, a nível fotográfico, um dos maiores desafios era construir uma ordem para este vômito de imagens e emoções.
na série e eu sinto que os retratados falam muito mais sobre o que eu estava vivendo naquele momento.
Quais são os papeis das paisagens e dos personagens na construção da narrativa da série? Quando consegui criar uma ordem para a série fui agregando mais paisagens como uma maneira de dar mais espaço e calma dentro de uma sequências de tantos retratos de temas tão duros. As paisagens também serviam como recordações e a uma evocação da sensação de partida. Os retratos sempre estiveram presentes
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JOÃ O KEH L E R A FA E L JACI N TO OLD entrevista
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João, Pio e Rafael marcaram a fotografia brasileira com a cia. de foto. Quase dois anos e meio depois do final do grupo conversamos com João e Rafa para conhecer sua nova produção e seus processos de criação atual. Conversamos sobre uma série de retratos e panorâmicas que exploram e destacam os limites da fotografia digital além de apresentar os primeiros passos de um novo trabalho desenvolvido pela dupla. No final de 2013 vocês fecharam uma importante parte da carreira com o final da cia. de foto. Um pouco mais de dois anos depois, quais são os pontos mais marcantes da nova caminhada? Rafa: No meu caso, acho que voltar para a fotografia de forma mais leve, mais sincera, mais amadora. No final da Cia de Foto eu estava fotografando muito pouco e só depois perce-
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bi o quanto isso estava me fazendo mal. Hoje faço, no mínimo, uma foto por dia (que publico no Instagram @aphotoaday_project e @rjacinto). Fora os trabalhos que estamos desenvolvendo como dupla. João: Essa nova caminhada é meio que um recomeço. a cia de foto deixou uma marca muito forte no universo da fotografia brasileira e o processo de desassociar nossa imagem da imagem do coletivo foi o primeiro passo. Depois de muito tempo, a gente voltava a ter nome para o mercado. Esses dois primeiros anos ficaram marcados por uma necessidade de reposicionamento no mercado e uma necessidade profunda de voltar a fotografar de maneira mais leve e livre. Vocês tem uma produção bastante forte em publicidade além do trabalho autoral. Como estes meios se influen-
ciam dentro da criação dos projetos? Rafa: Além de fotógrafos somos também diretores de cena pela Paranoid, então temos uma rotina diária de “briefings”, reuniões, emails, etc. Essa rotina foi algo que desejamos, buscamos. Foi uma forma que encontramos de viver de fotografia. Isso faz com que pensemos nos trabalhos publicitários todos os dias mas isso não quer dizer que não temos tempo para nossas ideias. Vamos quase que diariamente para nosso estúdio, onde temos nosso “canto de projetos”, com textos, ideias, livros e objetos que fazem parte do desenvolvimento de nossos ensaios. Além do mais, estamos sempre conversando e pensando sobre tudo. Certamente há uma contaminação entre os meios, o que acho muito produtivo. São aprendizados diferentes, relações pessoais muito ricas.
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A fotografia comercial nos ensina muito sobre técnica, equipe, responsabilidades. E nossas pesquisas nos ajudam a pensar criativamente nossos trabalhos comerciais. É uma troca saudável. João: Desde a cia de foto que essa ligação entre o trabalho autoral e o publicitário acontece. Ela pode ser muito interessante em alguns momentos, mas pode ser muito perigosa em outros. O lado bacana é quando as duas formas de comunicar conseguem se influenciar positivamente. Já aplicamos experimentos interessantes da arte na publicidade e vice-versa. Acho que quando isso acontece de forma natural o trabalho tende a ganhar e existe um amadurecimento da linguagem. O maior perigo é que muitas vezes, a publicidade te leva pra um jeito um pouco automático de fazer as coisas e isso te consome
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e afeta outras áreas da sua vida, inclusive o trabalho artístico. Enquanto essa relação é saudável só temos a ganhar. Os dois trabalhos que apresentamos nesta edição lidam com questões ligadas a um certo limite da fotografia digital. Lidar com essa busca pelo “máximo” do equipamento é um ponto central para a produção da dupla? Rafa: É muito interessante, pelo menos pra mim, entender, questionar e testar os limites técnicos. Acho que é a melhor forma de apreender o potencial do equipamento. Na série de retratos operamos no limite do equipamento. Com o uso de filtros obrigamos a câmera a trabalhar, mesmo no ISO mais alto com uma longa exposição, revelando o ruído, resultado do esforço que o equipamento fez para registrar aquela intensidade
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mínima de luz. Na série de paisagens, construímos imagens panorâmicas com uma sequência de fotos. Daí interrompemos o processo de junção dessas imagens pelo Photoshop e expomos a costura que o algoritmo traça de acordo com a duplicidade de informação. Isso é uma falha de visualização do software, quase imperceptível. Depois trabalhamos a imagem realçando essas falhas, pintando-as de vermelho. João: Acho que algo fundamental da fotografia é tentar desconstruir as possibilidades do aparelho fotográfico. Esse aparelho tem se tornado cada vez mais complexo e não se limita apenas a câmera fotográfica. Hoje em dia os softwares de tratamento de imagem, computadores e impressoras, fazem parte desse aparelho expandido. A fotografia digital tem algo de infa-
lível, do alcance máximo da capacidade técnica dos dispositivos. Câmeras que enxergam mais que o olho humano, dezenas de frames por segundo, altas velocidades capazes de congelar qualquer objeto, mas apesar desse super desenvolvimento, ela tem suas limitações e acho que é isso que a gente tem tentado explorar. A série de retratos tem um elemento interessante de nostalgia, estendendo o tempo de exposição e forçando o congelamento dos retratados, como no início da fotografia. O que chamou a atenção de vocês neste jogo entre passado e presente? Rafa: As câmeras “enxergam” mais que o olho humano hoje em dia. A partir desse fato desenvolvemos esse trabalho. Fomos para o estúdio e construímos todo esse ambiente controlado. A câmera com filtros na
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lente, no ISO mais alto. O estúdio todo escuro com uma única fonte de luz vindo de cima, um banquinho entre tapadeiras em V. Durante a realização das fotos, a espera incomodava. É realmente um clique muito longo quando estamos sentados lá. E, olhando bem as imagens, podemos perceber que a espera está lá. São imagens silenciosas. Tem muita coisa “impressa” nessas imagens. Espera, silêncio, esforço, ruído, história, rito, relação humana. João: O Rafa adora estúdio e há algum tempo queria fazer algo pra explorar esse espaço tão tradicional da fotografia. Chegamos nesse resultado após alguns dias de experimentação dentro do estúdio, fotografando a nós mesmos. No início da fotografia, a necessidade de longas exposições se dava por conta de uma limitação técnica,
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pra nós nos dias de hoje, esse ritual adquiriu um ar de experimentação. Queríamos explorar os limites da câmera fotográfica, mas também algumas das questões envolvidas no ritual do retrato. O retrato é um elemento constante dentro da produção da dupla. Como vocês costumam lidar com esta troca? O quanto de vocês está nos retratos produzidos? Rafa: O retrato sempre me fascinou. Há sempre a busca por um equilíbrio entre conduzir e deixar ser conduzido. Essa história de que há muito do fotógrafo no retrato é também algo muito relativo. Posso fazer uso de técnicas e artimanhas desenvolvidas durante anos de profissão e colocar nada meu lá, a não ser cacoetes. Mas nesse caso era um único clique, então o antes era muito importante.
A preparação dessa cena, a argumentação, eram muito importante. Em uma ou duas tinha mais gente conversando no estúdio e isso incomodou bastante. Foram as únicas vezes que repetimos a ação. Fazer um retrato é, sobretudo, uma negociação. Tem que ter respeito. Acho que nesse ensaio especificamente, o que tem de nós nas imagens é a fixação pelo ritual, pelo processo. Mostramos como somos curiosos e como temos respeito pela história da fotografia. Aliás, acho que nos dois trabalhos apresentados isso fica evidente. João: O retrato é um tema clássico da fotografia, assim como da arte em geral. O interessante é que ele pode assumir diferentes formas e acho que lidamos bem com isso. Se olharmos nosso acervo, vamos encontrar os mais diversos tipos, desde um retra-
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to de executivo pra uma revista de economia, que acho que diz muito pouco sobre fotógrafo e fotografado, até retratos muito intimistas da nossa família, que talvez transbordem um pouco mais do que somos e de quem é o fotografado. Essa série, especificamente, diz muito mais sobre a gente do que sobre a pessoa que está lá diante da câmera e acho que busca refletir sobre a história dessa fotografia como gênero, então é também um retrato do retrato. A série de panorâmicas também faz referência ao passado, neste caso à produção de Ansel Adams. Como surgiu a ideia para desenvolver esta série e buscar este tipo de referencial? Rafa: O formato panorâmico nos interessa muito. Essa forma que induz uma leitura da imagem da esquerda pra direita, que transforma qualquer
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assunto em paisagem. Isso é muito potente. A imagem que escolhemos para ser a primeira da série é justamente a do Parque Nacional de Yosemite, nos EUA. Paisagem que, em nossas mentes, tinha sido imortalizada pelo Ansel Adams, em um de seus portfólios. Fomos direto na referência. Mas o nosso trabalho é resultado da forma como construímos as panorâmicas. Fazemos uma sequência de fotos com a câmera em movimento panorâmico e depois as juntamos no computador. Quando o Photoshop usa seu algoritmo para eliminar as informações duplicadas nas margens de cada frame, materializa em uma falha de visualização a negociação entre o tempo de cada captura, e é isso que nos interessa. Apresentar e valorizar as rachaduras criadas pela junção desses “frames”
nos pareceu uma forma de atualizar a fotografia de paisagem. João: A ideia de construir imagens panorâmicas surgiu quase que junto com a fotografia. Desde o início, fotógrafos uniam imagens na tentativa de dar conta do mundo que enxergavam. Assim como o retrato, a paisagem é um tema clássico da fotografia e sempre sentimos o desejo de revisitá-la. A referência ao Ansel Adams acabou surgindo já no meio do processo do trabalho, quando começamos a experimentar com o preto e branco. Fez sentido para nós esse contraponto a imagem tecnicamente perfeita do Adams. De longe, essas panorâmicas remetem diretamente ao apuro técnico que ele explorava ao máximo, mas quando chegamos perto, enxergamos as rachaduras, a marca do processo interrompido que denuncia a
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falibilidade do meio. Estas panorâmicas quebram com a realidade esperada deste tipo de imagem, evidenciando suas falhas. Quais vocês diriam que são os papeis de realidade e ficção nesta série? Rafa: Acho que é uma interpretação de uma fotografia de paisagem. Nosso referente é a fotografia de paisagem. Seja do Ansel Adams ou de outro produtor de imagens. As rachaduras evidenciam as margens. O lugar onde a informação é dobrada, onde o tempo é negociado. João: Acho que a fotografia nasce desse jogo entre realidade e ficção. Nessa série isso fica bem evidente porque adicionamos um elemento estranho na construção das imagens, que nos joga diretamente pra longe da realidade, mas não acredito que esse seja o foco principal desse trabalho. Acho
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que o limite que buscamos explorar e expandir aqui é o limite da fotografia de paisagem como gênero, são imagens construídas e que denunciam um certo tipo de temporalidade própria que se dá pela sucessão de instantes. Vocês diriam que o papel destas duas séries é afastar a fotografia de uma simples apresentação da realidade? Rafa: Não sei exatamente qual é o papel das duas séries. Mas de fato pretendem levantar questões sobre o tempo e espaço. João: Sempre achei a ideia da fotografia como mero espelho da realidade de uma inocência tremenda. Invariavelmente, a fotografia é uma interpretação de mundo. Não acho que o papel dessas séries seja esse, porque pra mim isso é intrínseco a qualquer fotografia. Acho principal-
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De longe, essas panorâmicas remetem diretamente ao apuro técnico que ele explorava ao máximo, mas quando chegamos perto, enxergamos as rachaduras, a marca do processo interrompido que denuncia a falibilidade do meio.
mente, que essas duas séries são uma reflexão tanto sobre o processo fotográfico digital, quanto uma exploração e expansão de gêneros clássicos da arte. Vocês pretendem estender esta temática a outros trabalhos? Tem algo em mente que já possam contar? Rafa: Não sabemos. Essas duas séries estão sendo trabalhadas para serem apresentadas juntas ou separadas. Nas duas apresentamos um argumento e o defendemos através da re-
petição. Nosso próximo trabalho, que estamos desenvolvendo já há alguns anos, vai ser diferente. É um trabalho que se baseia no livro “A Doutrina das Cores”, de Goethe. Um livro que tem nos norteado bastante na nossa produção atual e que virou objeto de estudo. Um ensaio enorme, mais poético, sem afirmação pela repetição, mas com caminhos que dialogam com as teorias do filósofo. João: Rafa disse tudo.
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onzo é um trabalho íntimo, sensorial, que convida o espectador a se aproximar, a explorar cada um dos detalhes dos corpos apresentados. A série de Fernando Moleta é uma viagem, uma jornada de descoberta por cada um dos personagens presentes em suas imagens, é uma liberação do corpo e de seus sentidos. Para construir este trabalho, Fernando transforma a lógica Situacionista de exploração do urbano e a traz para o íntimo para a descoberta sem pressa do corpo em frente à sua lente.
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É como se eu buscasse retratar o Fernando, como começou seu interesse pela fotografia? Não sei dizer exatamente quando iniciou o meu interesse, talvez porque paixões são acontecimentos inesperados onde o aspecto temporal deixa de existir para apenas tornar-se algo que simplesmente permanece na nossa vida sem saber de onde veio. Mas além de fotografo, sou estudante de arquitetura. Me recordo que, em diversos momentos do curso, eu preferia fotografar a obra de arquitetura do que projetá-la. E é quando tomo consciência disso que tento iniciar uma carreira de fotografo de fato. Meus primeiros trabalhos de fotografia sempre foram inerentes a arquitetura, depois eu comecei a envolver outros interesses na fotografia, como
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a fotografia de rua, o nu, a land art e mais recentemente a cultura pop. Nos conte sobre a produção do ensaio Zonzo. Zonzo provém de uma teoria da Internacional Situacionista, que foi um movimento político-artístico dos anos 1960. A teoria em questão é a “Théorie de la dérive”, que seria definido basicamente como o “deixar-se ir”. É um “Modo de comportamento experimental ligado as condições da sociedade urbana: técnica de passagem apressada por vários ambientes. Mais particularmente, também designa a duração de um exercício contínuo desta experiência”. Ou seja, era uma prática de conhecimento urbano através do ato de per-
caminho que o olhar fascinado por aquele corpo nu perfaz, percorre. der- se pelo espaço. Devanear, estar a deriva pela cidade. E assim se conhecerá um determinado espaço de uma forma muito mais sensorial do que pragmática. Já o meu interesse, é metamorfosear esta experiência sensorial urbana para explorar o corpo humano através da fotografia. Qual o papel da intimidade na construção da linguagem deste trabalho? O trabalho ao mesmo tempo que é muito intimo, por se tratar de corpos nus, onde isto ainda é um tabu na nossa sociedade, ele também é um
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trabalho genérico quanto a identidade do modelo fotografado, afinal eu nunca fotografei seus rostos. De alguma maneira eu também quero dizer que das minhas lentes nunca sairão registros que servem somente para mitificar rostos bonitos ou estéticas temporárias. É um trabalho muito mais denso porque fala de sentidos, sensibilidades, experiências. O fato é que nunca houve combinação prévia entre eu e meus modelos, ou algum roteiro a seguir. Não há nenhuma concessão ao perfeccionismo, pois neste trabalho os erros e as imperfeições tem muito mais valor do que os caminhos práticos e certeiros. Ou seja, a intimidade é importantíssima. Só acontece se o modelo encontrarse disposto a vaguear como bem entender pelo cenário. Como você buscou trabalhar os corpos
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apresentados na suas fotos? Eu procurei olhar os corpos como paisagens, mas não como alusão a simples bodyscapes, mas sim como paisagem envolvente, onde permitese devanear através do traçado orgânico do corpo humano. É como se eu buscasse retratar o caminho que o olhar fascinado por aquele corpo nu perfaz, percorre. Talvez estas fotografias devessem ser observadas na sua minuciosidade, como se cada pixel da imagem fosse um frame de um vídeo a ser visto por um determinado tempo. É uma homenagem muito delicada ao ofício de voyeur. Como você buscou trazer outros sentidos, além do olhar, para estas fotografias? Você quer que o espectador se veja no lugar de quem faz as fotos? Eu acredito que uma boa fotografia
tem o poder de deslocar o espectador para dentro da obra. É um exercício de teletransporte através da visão. Indo mais além, ao imaginar que este processo de deambulação é um estado de hipnose, em um desorientadora perda de controle, também pressupomos que é o momento em que se entra em contato com a parte inconsciente da paisagem. Ou seja, é como se eu conseguisse, agora na fotografia, ir além do que é o padrão. E é nesse momento que os outros sentidos se fazem presente, uma vez que discorda que a imagem é algo relacionado unicamente com a visão, a imagem pode trazer sensações que vão além do olhar. Eu, por exemplo, me sinto acalentado por estas imagens.
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MARIA OLIVEIRA Sob Vigia
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aria Oliveira é uma fotógrafa portuguesa que descobriu a fotografia em um período de seis meses passados estudando no Brasil. Depois deste período, mais de dez anos atrás, Maria se aprofundou cada vez mais em seus estudos e na sua produção fotográfica. Nas páginas da OLD Maria Oliveira apresenta seu ensaio Sob Vigia, uma revisitação à cidade em que viveu até seus 18 anos. A série é uma busca pela representação das transformações vividas no espaço e na visão da fotógrafo sobre a pequena cidade que a acompanhou durante boa parte de sua vida.
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O meu interesse é ir acompanhando e Maria, como começou seu interesse pela fotografia? A minha aproximação à fotografia aconteceu em 2004 quando frequentei a disciplina de fotojornalismo durante um intercâmbio de 6 meses no Brasil. Foi um momento em que me confrontei com as possibilidades de exploração que este meio permite. Como foi o processo de criação do ensaio Sob Vigia? Sob vigia é um projecto em desenvolvimento e é baseado no local onde nasci e vivi até aos 18 anos. Depois de deixar de lá morar continuei a revisitá-lo e o que aconteceu é que a minha relação com este lugar foi-se modificando, aquilo que me trans-
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mite foi sofrendo mutações ao longo dos tempos e foi essa constatação que me levou a iniciar este trabalho. O meu interesse é ir acompanhando e registando essa alteração de significado, de sentimento, é, também, nesse aspecto, uma relação terapêutica. Nos conte um pouco sobre a construção da narrativa na série. Este trabalho funciona como anotações do meu regresso a este importante período da minha vida. Foi desenvolvido em formato analógico porque é também um projecto sobre o tempo; voltar aos campos, percorrer os caminhos de sempre, revisitar os lugares, ouvir, escrever, desenhar.
registando essa alteração de significado, de sentimento Estas imagens são o resultado desse processo de introspecção, dessa experiência. Este é, cada vez mais, um lugar parado no tempo, afastado do ritmo do mundo, um espaço que vai sendo preenchido pela natureza, e é, também, esta a ideia que procuro transmitir. Qual o papel da memória neste trabalho? A memória é essencial neste projecto. Revisitar os lugares é também recuperar as memórias da infância, dos anos em que lá morei e confrontá-las
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com aquilo que sou hoje em dia. A memória é o canal de regresso a essas vivências. Como você acha que a fotografia pode representar - ou até mesmo revisitar o passado? No caso deste projecto em específico, a fotografia permite-me convocar o passado, voltar a ele, mas de outra forma, com o distanciamento provocado pelo tempo.
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EXPRESSÃO, SINGULARIDADE E DOCUMENTAÇÃO
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uso da fotografia como meio de expressão tem aumentado nos últimos anos. Antes, no tempo, a documentação predominava de outras formas como o fotojornalismo. Tratava-se de construir uma identidade, a foto três por quatro, a carteira de identidade. Hoje, brota a necessidade de expressão como “prioritária”. Construímos singularidades ao invés de identidades. Apresentamos o próprio corpo como forma de expressar sentimen-
Angelo José da Silva é professor de sociologia na Universidade Federal do Paraná e fotógrafo. Suas pesquisas mais recentes focam o espaço urbano e o grafite.
tos, sensações ou visões de mundo. No momento presente a expressão também pode ser considerada como documentação. Hoje se observa uma espécie de migração do foco de interesse da fotografia. Para dizermos algo chamamos o olhar para o individual e não para o social. E, nos referimos à uma predominância nos trabalhos produzidos mais recentemente, sejam eles classificados como fotojornalismo, fotografia de arte, pessoal, documental, etc. Quando o fotógrafo tira fotos de grupos sociais ele está dizendo, muitas vezes, mais de si mesmo que dos outros. Ou, ela dá voz, visibilidade às questões sociais e às suas próprias. Quando ele representa sua individualidade com fotos de seu entorno pessoal ou do
próprio corpo, ou ainda, do corpo de seus afetos ele não mudou a sua questão essencial. Mudou a maneira de expressá-la. Passou a mostrar, além da sua individualidade a sua singularidade. Ou seja, representa, pela fotografia os aspectos que o constroem como ser único, singular e pertencente a um grupo. Expande, assim, a representação do indivíduo para uma forma que integra e sintetiza o social e o singular em um mesmo trabalho. A foto que acompanha este texto representa um pedaço de minha história marcado no meu corpo: um corte feito por um paralama de bicicleta muitos anos atrás. Uma cicatriz no tempo, uma foto. Uma marca em minha perna, uma cicatriz.
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Hoje se observa uma espécie de migração do foco de interesse da fotografia. Para dizermos algo chamamos o olhar para o individual e não para o social. 121
MANDE SEU PORTFร LIO revista.old@gmail.com Fotografia do ensaio Gigantes, de Diego Saldiva. Ensaio completo na OLD Nยบ 57.
URBAN looks fo from which to exhibits. Since
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for talent and quality both among professional and amateur photographers, offering them an international stage get noticed. The highest placing photos in the competition will take part in series of ”travelling” photography 2011, URBAN exhibits were held in Italy, Poland, Hungary, Latvia, Slovenia, Cyprus, Ukraine and Colombia.
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