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expediente
revista OLD #número 60
equipe editorial direção de arte texto e entrevista
Felipe Abreu e Paula Hayasaki Tábata Gerbasi Angelo José da Silva, Felipe Abreu e Paula Hayasaki
capa fotografias
Marina Nacamuli Andrés Solla, Angela Sairaf, Fernanda Vallois, Marcelo Pallotta e Marina Nacamuli
entrevista email facebook
Tuca Vieira revista.old@gmail.com www.facebook.com/revistaold
@revista_old
tumblr
www.revistaold.tumblr.com
instagram issn
@revistaold 2525-5622
índice
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livros valongo exposição
marina nacamuli por tfólio
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tuca vieira entrevista
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marcelo pallotta por tfólio
reflexões coluna
carta ao leitor
Se não me falha a mémoria, nunca comentei neste espaço o porquê de publicarmos sempre entrevistas com nossos fotógrafos, sempre na íntegra, em formato ping-pong. A OLD faz isso porque nossa proposta sempre foi e sempre será de ser um espaço para divulgação e discussão sobre fotografia e ter os autores falando sobre seus próprios trabalhos me parece a melhor maneira de fazer isso. O espaço não é da revista, é deles, para fazerem o melhor uso possível. Este espaço aberto de fala e de apresentação de trabalhos é essencial na carreira de um jovem artista, tanto para sua projeção como para - e principalmente - aprender mais sobre seu próprio trabalho. Em um momento político tão deli-
cado, fazemos questões de trazer o maior número possível de vozes para as nossas páginas, para manter a arte em seu papel essencial de provocadora. Neste mês, em que completamos sessenta edições, trazemos as vozes de Marina Nacamuli, Fernanda Vallois, Andrés Solla, Angela Sairaf, Marcelo Pallotta e Tuca Vieira. Como de costume, são trabalhos plurais, que constroem um divertido e complexo panorama do que se produz hoje em fotografia. Aproveite!
por Felipe Abreu
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livros
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THE JUNGLE BOOK de Yann Gross
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título pode não ser dos melhores e confesso que a capa não me ajuda tampouco, mas as fotografias, as fotografias são da melhor qualidade. Yann Gross, saiu da sua Suíça natal e veio para a América do Sul investigar os caminhos realizados pelos Espanhóis durante a colonização do continente. As imagens resultantes dão conta de apresentar a complexidade social e visual que é a região amazônica, além de nos brindar com uma série de duplas incríveis, mostrando a qualidade da edição no trabalho. O livro, lançado pela Aperture, foi o ganhador do Dummy Award do Festival de Arles. Assim, como já nos ensinaram a não julgar um livro pela capa, peço que o abra quando puder – ou visite o site da Aperture agora – e veja a incrível qualidade das fotografias produzidas pelo suíço.
Disponível no site da Aperture valor R$110 228 páginas 6
livros
ZZYZX
de Gregory Halpern
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credite se quiser, mas o nome deste livro não é uma combinação genética ou algum código complexo, mas sim o nome de uma estrada que corte a Califórnia no caminho entre Los Angeles e Las Vegas. É neste profundo deserto entre a ilusão de fama e de dinheiro fácil que Gregory Halpern baseia a sua exploração do famoso Estado americano. As imagens de Halpern são de uma potência embasbacante, trazendo força e inovação tanto para suas paisagens como para seus retratos. A California de ZZYZX é dura, quente, com muita areia, fogo e sol e segue, dentro do livro, um caminho do interior em busca do pacífico, de algum refresco para toda essa dureza. Além deste, editado pela MACK, Halpern também é coautor do Photographer’s Playbook, leitura obrigatória para fotógrafos curiosos.
Disponível no site da Mack valor R$160 128 páginas 7
especial
O NOVO VALONGO O novo festival organizado por Iatã Cannabrava se integra ao processo de revitalização do porto de Santos, além de trazer uma série de novos esforços na discussão sobre fotografia, narrativa e linguagem visual
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Valongo Festival Internacional da Imagem é o novo evento organizado por Iatã Cannabrava depois de onze anos à frente do Paraty em Foco. O festival, produzido em parceria com Thamyres V. Matarozzi, será realizado no Valongo, no porto de Santos entre os dias 12 e 16 de Outubro. A região histórica do maior e mais importante porto da América Latina passa por um processo de revitalização, do qual o festival será parte integrante.
O Valongo contará com uma série de exposições, debates e workshops, que se expandem além do interesse fotográfico e investigam a imagem como um todo. “É fundamental pensar além da fotografia e num espaço mais dinâmico e acessível para o público” afirma Iatã Cannabrava, completando que o festival irá “pensar na modernidade em relação às fronteiras da imagem”. O conteúdo apresentado e discutido durante o festival irá lidar com
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Alejandro Chaskielberg
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questões próximas à fotografia, mas não limitadas a ela. Será abordada a narrativa visual de uma maneira mais ampla, unindo fotografia ao cinema, roteiro, videoarte e outras ações contemporâneas que utilizem a imagem. Dentro desta abordagem, se destacam atividades que lidam exatamente com os aspectos mais amplos da narrativa visual, como a mostra do cineasta Bill Morisson, que lida em sua produção artística com experimentos químicos e tem uma forte relação com a investigação do som nas artes plásticas. Além da mostra de Morisson, vale destacar as exposições de Alejandro Chaskielberg, a homenagem a Roy de Carava, a mostra com novas produções de Cássio Vasconcellos, entre outras, todas com curadoria do espanhol Horacio Fernández. Dentro deste seleto time impressiona o trabalho
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Além das incríveis exposições, o Valongo também organiza uma série de debates, coordenados por Thyago Nogueira, da Zum. Estarão nas mesas Paz Errazuriz, Tatewaki Nio, Oscar Muñoz e Felipe Russo de Alejandro Chaskielberg, mais um do rico time latino que virá ao festival, apresentando seu trabalho Otsuchi, produzido no Japão, após o desastre de Fukushima. Chaskielberg lida com temas de forte relação documental, mas com uma abordagem mais experimental, unindo imagens de longa exposição com técnicas manuais de iluminação e colagens. Além das incríveis exposições, o Valongo também organiza uma série de debates, coordenados por Thyago Nogueira, da Zum. Estarão nas mesas Paz Errazuriz, Tatewaki Nio, Oscar Muñoz e Felipe Russo. Muñoz trará
ao Valongo a discussão por trás de sua produção visual, que transita muito bem entre o desenho, a vídeo-arte e a fotografia. Já Paz Errázuriz, uma das mais importantes fotógrafas da história chilena, vem ao festival trazendo a bagagem da sua potente produção de rua, incríveis retratos e forte discussão de gênero na fotografia. Os mais de dez workshops já confirmados para a primeira edição do Valongo também seguem a temática de expansão em narrativas ligadas à imagem, trazendo propostas que vão além da investigação fotográfica e mergulham em temas que lidam
IatĂŁ Cannabrava
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com investigação do espaço, edição, ressignificação de símbolos, imagens e mais. Cabe destacar a divertida proposta desenvolvida por Walter Costa e Ivan Padovani que pretende reformular o código internacional de sinais de navegação usando provocações visuais que aliem cor, forma e significado. Além da dupla, também oferecem oficinas Claudio Edinger, Marcos Piffer, Juan Valbuena, Bob Wolfenson, Coletivo Garapa, Vibrant, Tuca Vieira, Letícia Ramos, Instituto Querô, Araquém Alcântara, entre outros, construindo um total de 600 vagas para as atividades durante o festival, divididas entre 18 workshops confirmados até agora. Tuca Vieira, entrevistado desta edição da OLD, propõe em seu curso no Valongo um mergulho na cidade de
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Santos, explorando a arquitetura, os contrastes sociais e os personagens da cidade. A abordagem se relaciona diretamente com seu projeto Atlas da Cidade de São Paulo, apresentado atualmente na Casa da Imagem em São Paulo. Completando a já potente programação, Bia Bittencourt trará uma versão pocket da Feira Plana, com quinze expositores confirmados. Neste time estarão Pingado Pres, Vibrant, Coletivo Rapadura, Tijuana, entre outros. Além das mesas das editoras convidadas, a Feira também receberá lançamentos de fotolivros e atividades complementares ligadas à produção impressa em fotografia. Em tempos de incertezas e profundas transformações políticas, o Valongo buscou novas formas de garantir sua existência, apostando em uma cam-
panha de financiamento coletivo para viabilizar o festival. A campanha segue até o dia 2 de Outubro e tem uma série de recompensas como: obras de fotógrafos de destaque, vagas em workshops e leituras de portfolio com Iatã Cannabrava e André Penteado. Os workshops já estão com inscrições abertas, que podem ser feitas pelo site e facebook do Valongo.
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MARINA NACAMULI
Why Generation
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fotografia de Marina Nacamuli é potente, visceral e divertida, assim como parecem ser todas as noites fotografadas por ela e apresentadas na série Why Generation. As imagens são um compilado de momentos de boêmia e diversão e tem uma leveza tão convidativa que fazem com que você se sinta dentro do grupo de amigos apresentados por aqui. A vida e o estilo das pessoas retratadas é o que motiva Marina, que produz um fluxo de imagens, criando uma espiral noturna entre cigarros, drinks, carros e festas.
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É na noite que tudo acontece. Todos Marina, como começou seu interesse pela fotografia? Acho que eu tinha por volta de uns 09 anos de idade quando ganhei minha primeira câmera fotografica, a “Concord - Le Clic” que fotografava com 110mm. Eu sempre tive interesse em equipamentos eletrônicos e em registrar momentos. Aos 15, ganhei minha primeira filmadora pra registrar as viagens em família e fazer entrevistas com os amigos. Em 2004, fiz meu primeiro curso no assunto, e percebi que queria fazer isso pro resto da vida. Nos conte sobre a criação de ‘Why Generation’. A “Why Generation” é sobre a geração nascida entre os anos 70 - 80, a
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minha geração. Entre álcool, drogas, voyerismo e comportamentos antisociais, tento documentar a vida das pessoas a minha volta, acreditando que todos somos assim, acreditando ser um meio de sobrevivência nesse mundo em que vivemos hoje. Meus amigos e pessoas que conheço na noite são a inspiração pra esse trabalho. Estou sempre buscando pessoas diferentes, estilosas, com tinta no corpo, um drink na mão e fumaça na boca. Como você organiza a edição da série? Qual a narrativa que você deseja construir com ela? A organização vem de uma forma muito natural, não tem muito uma maneira certa. A minha narrativa é
se soltam à noite. Tudo é escuro e só o flash revela os segredos. exatamente o que está ali, uma consistência. O mundo tem um otimismo falso, as pessoas se julgam demais. Nós somos jovens, buscando viver e contar uma história, é isso. Qual o papel do improviso no seu trabalho? Você planeja sua produção ou é um fluxo de criação constante? Tenho uma câmera comigo na minha bolsa 24 horas por dia. As fotos dessa série são 100% espontâneas. Estou sempre de olho em tudo, e mesmo assim perco muitas fotos por vergonha ou medo. As fotos são honestas, e muitas vezes não lembradas entre
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os assuntos envolvidos, se tornando um diário de uma cultura contemporânea. Eu não planejo minha produção, mas sei quando vou acabar produzindo mais ou menos. A noite é a principal inspiração para sua produção visual? Sim, pois é na noite que tudo acontece. Todos se soltam à noite. Tudo é escuro e só o flash revela os segredos.
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Pequenas Mortes
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equenas Mortes faz um recorte visuais de temas ligados ao corpo, sua interação com um determinado espaço e com o desejo, tão constante na fotografia, de congelar pequenos fragmentos temporais, no desejo de construir uma memória visual de momentos que teimam em sempre nos escapar. As fotografias de Fernanda Vallois são de uma intimidade tocante e de uma visualidade forte, de sombras e temas profundos, trazendo o espectador para perto de cada uma das pequenas mortes apresentadas.
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O corpo nu nas minhas fotos quase Fernanda, como começou seu interesse pela fotografia? Desde muito pequena me expresso de forma visual, comecei sendo apresentada para o desenho e pintura pela minha mãe, que é uma pessoa muito criativa e com interesse em artes visuais. A fotografia foi uma extensão disso e começou de forma muito espontânea. A partir de alguns ensaios feitos durante a faculdade com uma máquina analógica descobri e me encantei por todo o processo. Um ensaio foi feito com uma ex-namorada e outro com a minha irmã, o resultado me surpreendeu e desde então comecei de forma instintiva a investigar minhas relações de intimidade. Percebi que a fotografia preenchia minha
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necessidade de expressão pessoal e também as minhas curiosidades e anseios constantes de conexão e compreensão alheia. Desde o início minha relação com a fotografia analógica é bem próxima, acho que fiquei viciada nesse sentimento de ser surpreendida pelo resultado, dificilmente sai como imagino, e essa surpresa pode ser positiva ou negativa. Nos conte sobre a criação do ensaio Pequenas Mortes. Uma das etapas do meu processo é colocar uma série de fotografias e pesquisas minhas na parede e estudar o que elas me contam, o que venho buscando, meus temas recorrentes, etc. Quando iniciei meu estúdio de criação, o TRUQUE que tem
sempre nasceu de cenas espontâneas, quando eram pessoas muito íntimas. um grande foco em publicações, dividi esse grande material em três possibilidades iniciais, uma delas acabou amadurecendo e se consolidando no ensaio, e também um livro de artista. Funciona como um grande quebra-cabeça e muitas vezes só entendo meu trabalho e qual tema quero tratar nesse momento, em que essas peças se encaixam. Pois enquanto fotógrafa gosto de me entregar às pessoas, cenas, à manifestação do genuíno. O tema “As Pequenas Mortes” nasceu da percepção de narrativas presentes em uma série de ensaios produzidos, percebi depois de mui-
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to estudo do meu material que muito do que tento comunicar fala sobre suspensões da vida, pequenos momentos que ficam “pairando sobre o fluir inexorável do tempo” (Saramago). É como se no momento em que estava fotografando estivesse tentando guardar um pequeno pedaço de algo invisível, intangível, mas essencial em cada pessoa ou lugar. Um pequeno universo, que muitas vezes passa despercebido por sua sutileza. Tento chamar atenção para o invisível nas coisas, e nas pessoas, mas absolutamente essencial. Chamo essas narrativas de “As Pequenas Mortes” pois tenho a sensação que são detalhes que vem a tona quando suspendemos a vida. Quando mergulhamos profundamente no vazio e damos a chance para o mistério ser revelado. Qual a importância do corpo e do fe-
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minino na sua produção visual? Me sinto em uma busca obsessiva pelo retrato autêntico e fiel. A busca pela verdade do retratado muitas vezes se mistura a minha e acredito que essa seja a justificativa do corpo feminino tão presente nas minhas fotos. Não me vejo na busca por um retrato global e/ou rumo à investigação do que é ser mulher, mas acaba esbarrando nesses temas ao mergulhar profundamente nas mulheres presentes em minha vida e/ou nas mulheres que me fascinam de alguma forma. Mas acima de tudo meus interesses são individuais, em detalhes e curiosidades únicas. O corpo nu nas minhas fotos quase sempre nasceu de cenas espontâneas, quando eram pessoas muito íntimas. Então sempre vi a nudez presente no meu trabalho como resultado de uma pesquisa sobre intimidade e não do corpo em si.
Você vê o surrealismo como uma influência importante na sua fotografia? Gosto do perceber em minhas fotografias um clima sombrio ou misterioso, muitas vezes assustador. Acredito que meu instinto me faz buscar esse clima que lembra algo como um sonho (ou pesadelo), como se as fotos fossem peças de uma história maior, que não necessariamente expressam o que estava acontecendo no momento, mas sim uma interpretação pessoal de uma cena, que quando descontextualizada muitas vezes fica com um clima nebuloso, algo que me interessa explorar, gosto de sentir um pouco de medo as vezes quando estou fotografando. Deixo muito espaço para a manifestação do inconsciente, essas são as maiores influências do movimento nas minhas fotos.
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“Selva” de Calais, no extremo norte da França é um dos grandes marcos da intensa crise migratória que a Europa vive neste momento. Seus milhares de habitantes estão presos, atrás da última fronteira antes de seu destino final: a Inglaterra. O fotógrafo espanhol Andrés Solla apresenta a região com uma produção delicada, que dá conta do tempo estendido neste espaço de espera e mais espera. Suas fotografias trazem não só a história dos personagens da “Selva”, mas também de sua construção urbana e organização social.
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Isso te faz perceber a generosidade Andrés, o que mais te interessa na fotografia? A fotografia me permite conhecer e compartilhar realidade que de outra maneira dificilmente teria acesso. Além disso, ela me traz urgência e independência: durante alguns anos trabalhei com vídeo e o processo era mais lento. Gosto de decidir o que, como e quando e começar a trabalhar diretamente em um tema. Nos conte sobre a criação de Last Border. Quando descobri a existência da “Selva” de Calais meu primeiro impulso foi documentar a forma de vida em um lugar cada vez mais tomado, no qual proliferam restaurantes, igrejas, lojas e mesquitas, construí-
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das pelos próprios habitantes neste parêntesis que supõe a vida naquele local por longos períodos de tempo. Depois, com o conceito já evoluído, tento refletir sobre como essas condições de vida extrema influenciam psicologicamente aqueles que vivem na “Selva” e sobre as fronteiras construídas pelos governos que tentam gerir este fenômeno. Como se deu o contato com os personagens? Que histórias mais te marcaram? A não ser por algumas exceções, que entram dentro do normal, o contato com as pessoas foi muito positivo. É normal passar horas conversando, compartilhando comida e bebida dentro das barracas. Isso te faz per-
das pessoas apesar da difícil situação em que se encontram ceber a generosidade das pessoas apesar da difícil situação em que se encontram e o tratamento tendencioso que muitas vezes recebem da mídia. Foi especialmente marcante quando acompanhei um grupo de amigos sírios que iam tentar passar pela estação de trem em direção à Inglaterra. Ficamos caminhando por horas por estradas durante a madrugada enquanto eles cantavam e dançavam canções típicas do seu país. Como você buscou traduzir este espaço tão complexo em fotografias? Tenho consciência de que a “Selva” é
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um tema já bastante trabalhado, mas ao mesmo tempo acredito que ainda existem novas maneiras de explorá-lo. Tento afastar minha narrativa do estritamente jornalístico, trazendo uma linguagem mais reflexiva, reforçando a ideia da limitação, do isolamento e da falta de liberdade de movimento a que estão submetidas essas pessoas. Para isso, baseio meu trabalho nos retratos e dar muita importância ao espaço em si.
essas viagens, vou parar para pensar e ver com perspectiva todo o que tenho em mãos e aí sim decidirei se o encerro ou se continuo com o projeto de maneira indefinida, com uma criação de longo prazo.
Para você o trabalho está finalizado? Você quer voltar mais vezes para Calais e fotografar mais? Ainda não está terminado. Quero voltar regularmente durante este ano, pelo menos duas ou três viagens mais para explorar diferentes técnicas que me permitam reforçar os conceitos do ensaio. Uma vez feitas
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A fotografia de Tuca Vieira tem uma relação muito profunda com o urbano, especialmente com a cidade de São Paulo. É de sua autoria uma das imagens mais emblemáticas da cidade, que mostra uma comunidade dividindo o muro com um condomínio de alto padrão. Recentemente, Tuca se propôs o quase inimaginável desafio de fazer o Atlas Fotográfico da Cidade de São Paulo. O impressionante resultado da hercúlea empreitada está em exibição na Casa da Imagem, no centro de São Paulo. Conversamos com Tuca sobre sua produção, seus recentes trabalhos e sobre sua participação no Valongo Festival da Imagem, em Outubro.
fotografia neste caminho? Trabalhei também como jornalista, que foi uma escola bem importante, e como professor agora no primeiro semestre. Agora estou num momento especial da minha carreira, justamente porque estou conseguindo juntar todas essas atividades. E com o tempo vou percebendo que elas fazem parte de um mesmo interesse, de uma mesma postura diante do mundo. Se tem uma coisa que diz respeito a tudo isso é a curiosidade. Para o artista, fotógrafo, jornalista, pesquisador ou arquiteto, a curiosidade é um combustível poderoso e imprescindível.
Tuca, você tem uma formação bastante variada, começando nas letras e agora na arquitetura e fotografia. Como esse background influencia seu trabalho? Como foi o processo de descoberta da
Você tem um interesse especial pela arquitetura e pelo espaço urbano na sua produção. Como surgiu este interesse?
Surgiu como cidadão de São Paulo, esse monstro tentacular que desafia nossa capacidade de compreender o espaço que nos circunda. Num lugar como esse, a legibilidade do espaço é uma questão de sobrevivência e cidadania e a busca pela beleza uma batalha constante e diária. Acho também que hoje as cidades estão no centro de qualquer discussão social, política e estética. O século XXI será o século da urbanização quase total do mundo, e teremos que responder a essa realidade. A arquitetura é a face visível da cidade, construída à imagem e semelhança de nós mesmos. E a fotografia pode ser um poderoso instrumento para compreendermos isso. Nesse sentido, a fotografia de arquitetura, como gênero fotográfico, pode estar bem próxima do retrato.
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Você vê a fotografia como um agente transformador da realidade que você apresenta? Indiretamente sim. Grande parte daquilo que conhecemos do mundo é mediado pela fotografia. Agimos muitas vezes tendo como base uma imagem. Para dar um exemplo banal: você preferiria conhecer o Taj Mahal ou as pirâmides do Egito? A resposta vai ser dada em larga medida pelas imagens que temos desses monumentos, levadas até nós pela fotografia. Outro exemplo são esses aplicativos de encontros amorosos. Estamos escolhemos as pessoas para namorar com base apenas na imagem, aceitando ou descartando como se estivéssemos escolhendo tomates na feira. Agora imagine esse tipo de decisão elevada à esfera política... Seu trabalho tem um amplitude geo-
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gráfica muito grande, sempre envolvendo uma série de deslocamentos da sua parte. Esta viagem/movimento é essencial para a sua produção? Sem dúvida. Esse movimento é o oposto desse em que me encontro agora, sentado diante da tela de um computador, com a ilusão de que tudo vai me chegar através dele. O mundo contemporâneo está substituindo a experiência direta pela informação e isso é perigoso. É preciso viajar o Brasil para entender o momento político do país, por exemplo. Se confiarmos no jornalismo carioca e paulista, é claro que teremos uma visão parcial e sectária da realidade, nunca vamos entender as transformações recentes do país. Atualmente você apresenta, na Casa da Imagem, o Atlas Fotográfico da Cidade de São Paulo. Nos conte um pou-
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co sobre este projeto. Este projeto surge de uma pergunta simples: como fotografar São Paulo?, que por sua vez leva inevitavelmente a uma segunda: o que é São Paulo? Eu achei que precisaria de um método, de uma regra, para enfrentar o monstro tentacular. Sabia que meu “percurso afetivo” (como diriam os situacionistas) nunca daria conta do tamanho desse território. Então um dia num taxi, folheando o guia de ruas (objeto que sempre me foi familiar, pelos anos de trabalho como fotojornalista) me veio subitamente essa ideia: fazer uma foto para cada página do guia. São 203 páginas, 203 fotos. O que foi mais marcante nesta complexa empreitada visual? O enfrentamento do território. Foram dois anos e meio de trabalho,
3000km rodados em 19 municípios da Grande São Paulo. Você buscou construir padrões visuais para a representação do caos que é São Paulo? Como foi o processo de pesquisa e decisões da abordagem visual que daria a este trabalho? Esse trabalho deve muito a Militão Augusto de Azevedo, fotógrafo pioneiro de São Paulo que, no século XIX, também fez à sua maneira um mapeamento da cidade. Assim como ele, procurei uma “visão média” da cidade, nem espetacular, nem particular. Achei que assim poderia deixar a própria cidade se apresentar. Mas na escolha das locações usei de vários recursos disponíveis, desde minha própria experiência como fotojornalista até pesquisa de imagem no Google Street View, por exemplo. Além disso, o trabalho foi todo feito
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em grande formato, com chapas 4x5. Busquei com isso desacelerar o momento do clique fotográfico, além de me aproveitar de toda qualidade de imagem o que só o grande formato oferece. Além de São Paulo, você tem um profundo trabalho de investigação e reconhecimento de áreas de intenso crescimento no Brasil. Como foi a experiência de produzir Viagem ao Brasil? Como sua percepção do país mudou durante este processo? Esse trabalho foi feito por encomenda da X Bienal de Arquitetura de São Paulo e do Instituto Moreira Salles. Foi quando percebi uma relação mais intensa entre meu trabalho e o universo da arquitetura. Acho que o Brasil melhorou muito a qualidade de seus problemas. Hoje não discutimos mais a miséria extre-
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ma e a dívida externa. Estamos discutindo a ocupação das cidades, o modelo de desenvolvimento, o acesso à educação. É claro que nesse caminho também vemos desaparecer uma certa tradição cultural ligada à música e aos costumes, dando lugar a uma espécie de cultura genérica de massa. Isso é bastante claro no Nordeste. Ao mesmo tempo em que digo isso, vejo com enorme preocupação o que está acontecendo no país nesse momento. Corremos o risco de um retrocesso histórico com o despertar de velhos fantasmas brasileiros ligados ao conservadorismo e ao patrimonialismo. Não tenho dúvida de que o Brasil sofreu um golpe duro e hipócrita. No mês que vem você participará do festival Valongo, em Santos, ministrando um workshop. O que você apre-
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Corremos o risco de um retrocesso histórico com o despertar de velhos fantasmas brasileiros ligados ao conservadorismo e ao patrimonialismo. Não tenho dúvida de que o Brasil sofreu um golpe duro e hipócrita.
sentará por lá? Quero me relacionar com a cidade de Santos, sobretudo com o porto. Vamos ver se conseguimos alguma autorização para entrar nas áreas mais restritas do cais, e dos depósitos de containers. Isso seria ótimo. Já disseram que a fotografia é apenas um pretexto pra gente fazer coisas raras, conhecer lugares estranhos.... Para finalizar, gostaria de saber se você vê o espaço urbano como uma
fonte infinita de inspiração e quais os próximos caminhos fotográficos que você buscará dentro dele. Agora vou me dedicar à pesquisa de mestrado que estou desenvolvendo na FAU-USP. Parte dela nasceu justamente do projeto do Atlas Fotográfico. Acho que chegou a hora de tirar o time de campo por um tempo, para pensar um pouco sobre esse momento de muita imagem e pouca reflexão. E depois não sei. Só sei que a fotografia vai estar sempre por perto.
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ANGELA SAIRAF How Much Is Too Much
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ngela Sairaf apresenta o interior da Índia, mais precisamente do estado de Orissa, em How Much Is Too Much. Suas imagens lidam com grafismos, cores e principalmente com a noção de volume e preenchimento. Suas fotografias falam muito sobre o vazio, sobre a calma e seu oposto, apresentado pelo preenchimento completo do quadro construindo uma oposição visual que fala muito sobre a realidade do interior indiano em que há grandes volumes de produção e de pessoas mas ainda há muito espaço para desenvolvimento estrutural.
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Acho que os detalhes dão intimidade Angela, como começou seu interesse pela fotografia? Meu pai adorava fotografia e eu adorava sair com ele para fotografar. Ficava toda hora pedindo para ele me alcançar a câmara para eu olhar pelo visor. Quando eu tinha 6 anos ele comprou uma câmara nova e me deu de presente a sua velha Ricoh. Eu passava muitas horas por dia brincando com ela. Depois, comprei uma SLR e em seguida comecei a trabalhar como fotógrafa. A fotografia sempre fez parte da minha vida de uma maneira muito natural. Nos conte sobre a criação de How Much Is Too Much. Fazia muito tempo que eu tinha vontade de ir para a Índia, mas não para
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visitar lugares turísticos: queria a Índia profunda, esta que não aparece nos catálogos de agências de viagens. Minha ideia era conhecer a cultura autóctone, longe -se é que isto ainda é possível- das interferências da globalização. Surgiu a oportunidade de ir para o estado de Orissa, no leste da Índia, por meio de uma residência artística organizada pela Utkal University. Orissa é um estado rico em recursos naturais e, apesar de apresentar um certo crescimento econômico, é um dos estados mais pobres e atrasados da Índia. Sua economia é focada na agricultura, mais especificamente na plantação de arroz. Fiquei alojada em Jashipur, que não poderia descrever de melhor maneira do que “um vilarejo no meio do
ao trabalho: para ter o detalhe você tem que chegar perto. nada”, e dali, saía quase que diariamente para visitar outros povoados e tribos bastante primitivas da região. Fui a festivais, visitei escolas, casas, assisti a rituais, a uma festa de casamento, um funeral... Foi perfeito porque em Orissa o turismo internacional ainda não tocou as portas, ali tudo é ainda muito legítimo. How Much is Too Much é uma parte desta experiência, onde o nada está presente em quase tudo e o suficiente é sempre muito. Como você buscou representar o espaço e os personagens na série?
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Na verdade eu não estava buscando maneiras de representar, nem espaços, nem personagens, nem nada. Estava, simplesmente, aberta ao que poderia encontrar. Digamos, apenas, que eu tenha coincidido em tempo e espaço com estas pessoas e estes lugares que aparecem nas fotografias. Eu saía para caminhar com a câmara na mão e ia fotografando aquilo que me chamava a atenção. Eu naturalmente tendo a fazer fotos de maneira muito intuitiva. Qual a importância das cores e dos detalhes na construção desta narrativa? As cores na Índia, como em qualquer outro lugar, são parte do contexto: são elementos tão naturais como o ar que os indianos, dinamarqueses, mexicanos, brasileiros, russos, gregos ou qualquer outro povo de qualquer
outra nação respiram. É certo que na Índia as cores são muito vibrantes como também é certo que estas cores simplesmente estavam lá: a Índia é um país muito colorido e isso aparece nas minhas fotos sem nenhuma complicação. Acho curioso quando as pessoas vêm falar de foto documental e apresentam -no século em que estamos!- fotografias em Preto e Branco. Acho um contrassenso. Mas já quase estamos entrando no aspecto conceitual sobre o que é foto documental e o que é foto artística e aí temos assunto para a revista inteira pelas próximas 10 edições (risos)! Quanto aos detalhes... Pois é, eu me fixo em detalhes, na fotografia e em geral. Acho que os detalhes dão intimidade ao trabalho: para ter o detalhe você tem que chegar perto.
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MARCELO PALLOTTA Polanturas
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arcelo Pallotta volta às páginas da OLD com uma nova série com suas queridas polaroids. Em Polanturas, Marcelo une fotografia e pintura, extravasando os limites do enquadramento e reimaginando o que ficou de fora da fotografia. As imagens da série lidam com grafismos e formas de uma maneira graciosa e divertida, estimulando a expansão do pensamento visual, buscando o que ficou ao lado de cada uma das fotografias apresentadas por aqui.
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Marcelo, você está de volta nas páginas da OLD depois de alguns anos. O que mudou na sua produção neste tempo? É sempre uma honra participar da OLD. Parabéns pela editoria sempre instigante! Meu processo continua simultâneo à minha produção como designer de cartazes de cinema, um alimentando o outro. Creio que o tempo ajuda a visualizar com distanciamento. Nos conte sobre a produção da série Polanturas. Polanturas é uma homenagem a pintura. Sempre fotografei pinturas na rua e sua interação com as pessoas e a arquitetura. Antes da fotografia, existia a pintura para mim, princi-
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palmente a aquarela. Neste trabalho, uso a pintura para interagir com a fotografia. Para refletir como a ela se relaciona com a cidade, as pessoas e com a arquitetura. A pintura sai da foto e ganha destaque no espaço. Quais os desafios de trabalhar com o que está fora do quadro fotográfico? O quanto foi um processo de reconstrução e o quanto foi uma nova criação? A liberdade de expandi-las é um exercício de composição. De alguma maneira, pintar recriando na foto original, possibilita um orientação de leitura, um foco. Essa série venho estudando desde o ano passado. Inicialmente mais figurativa, depois percebi a força narrativa e me voltei
Uso a pintura para interagir com a fotografia. Para refletir como a ela se relaciona com a cidade, as pessoas e com a arquitetura a geometria. Como você escolheu os temas das Polaroids? O que você viu como fio condutor visual neste trabalho? Seu formato pequeno, quadrado, ajuda na união do conjunto das imagens. É uma janela para o mundo real. Uma realidade “fotográfica” registrada de uma pintura... e uma “pintura” desenhando uma nova realidade. Você tem uma série de trabalhos com Polaroid. O que te instiga no suporte? Quais são sua características únicas? Sempre trabalhei com o suporte da
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Polaroid SX70. Ela é uma plataforma que tento usar como base, como ponto de partida. A cada novo trabalho, um novo desafio...mas como norte, o frame quadrado, a fotografia sem retoques, as cores particulares de uma polaroid SX70.
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VALSA TRISTE
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á escrevi neste espaço de compartilhamento de ideias sobre ruínas, memórias e melancolias. E, mais uma vez, o tema se apresenta diante de mim. Em 1976 é lançado o filme de Bruno Bozzetto Allegro Non Troppo. Trata-se de uma animação que satiriza o filme Fantasia, de Walt Disney, de 1940. A sátira tem como título em português Música e Fantasia e lança mão do mesmo recurso cinematográfico utilizado por Disney, ou seja, são várias composições
Angelo José da Silva é professor de sociologia na Universidade Federal do Paraná e fotógrafo. Suas pesquisas mais recentes focam o espaço urbano e o grafite.
musicais clássicas unidas à diferentes animações, construindo em cada história uma narrativa visual e sonora muito bonita. Uma delas me tocou mais acentuadamente e reaparece muitas vezes em minhas recordações, principalmente quando me percebo diante de uma construção em ruínas. Trata-se de uma casa de dois ou três pisos da qual restou apenas a fachada, alguns restos de portas e janelas e, se a memória não me engana, nada mais. A música que participa do ritmo da narrativa, marcando tempos e sentimentos, é a Valsa Triste de Sibelius. Como uma espécie de narrador ou, talvez, como um guia para nosso olhar, temos um gato que percorre aquele espaço arruinado. Sutil e silenciosamente, como cabe a um gato
quando investiga, os espaços daquela casa em ruínas são revividos e iluminados pela passagem do felino. As memórias, de tão intensas e vívidas que são, acabam por nos iludir e esquecemos que ali, naquele espaço, não estão mais as pessoas vivendo a vida. Agora, temos apenas os sinais de suas passagens desaparecendo lentamente. Quando fotografo construções destruídas, restos de casas e edifícios, muitas vezes me sinto como esse gatinho do filme que passeia por entre memórias. Permito que diferentes sentimentos surjam dentro mim, passeiem, e passem, calmamente. E, as imagens que faço, talvez funcionem, para quem as vê, como esse gato e suas muitas vidas, zanzando por aí.
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Quando fotografo construções destruídas, restos de casas e edifícios, muitas vezes me sinto como esse gatinho do filme que passeia por entre memórias. 125
MANDE SEU PORTFÓLIO revista.old@gmail.com Fotografia da série O Arquipélago, de Ricardo de Abreu Neves. Ensaio completo na OLD Nº 61.