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SAÚDE DIGITAL | Felipe César
A REVOLUÇÃO DO HOSPITAL DIGITAL Entenda a certificação HIMSS e acompanhe como dois hospitais partiram de realidades diferentes rumo ao uso do Prontuário Eletrônico do Paciente
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ospitais de todo o mundo vêm planejando a implantação de tecnologias para melhorar seus processos e dar mais eficácia ao tratamento médico prestado, com redução de custos e melhoria no atendimento. Para que a estratégia seja conduzida da forma correta, as organizações têm recorrido ao processo de avaliação da Healthcare Information and Management Systems Society (HIMSS), a principal instituição de TI na área da saúde. A HIMSS é uma organização global sem fins lucrativos que tem um único objetivo: melhorar a saúde por meio da tecnologia. Para que um hospital se torne 100% digital, ele deve estar de acordo com os oito estágios evolutivos do modelo de prontuário eletrônico da HIMSS, o chamado Electronic Medica l Record Adoption Model (EMRAM). Funciona como uma espécie de acreditação em TI na saúde. Há uma série de requisitos que o estabelecimento de saúde deve
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cumprir em cada estágio para obter a certificação. “O passo nº 1 é o planejamento em longo prazo, não será em dois ou três meses que o hospital colocará para rodar um prontuário eletrônico ou um sistema de gestão hospitalar. A implantação pode levar o ano inteiro”, pondera Cláudio Giulliano Alves da Costa, diretor executivo da Folks eSaúde. Ele explica ainda que a implantação é complexa, e a instituição deve planejar as ações e observar o funcionamento. “A informatização deve ser feita com cuidado para entregar os resultados da forma correta e segura.” A vantagem do processo de certificação da HIMSS é que o hospital pode se comparar com outras instituições do mundo. Para dar o start no processo, o hospital precisa saber em qual estágio ele se encontra: são oito estágios, que vão do 0 ao 7. O estabelecimento de saúde precisa responder a um questionário da HIMSS sobre as tecnologias
utilizadas, dessa forma, de acordo com o que é recomendado em cada estágio, é definida a classificação do hospital. Nos casos em que a classificação atingir os estágios 6 ou 7, então há um processo de validação pela HIMSS para comprovar que o hospital esteja com todas as tecnologias exigidas e em pleno funcionamento. Há duas etapas para essa comprovação: uma é a aplicação de outro questionário, que tem como objetivo verificar a adoção do prontuário eletrônico e seu impacto nas decisões clínicas. Após esse processo, auditores da HIMSS realizam uma videoconferência com a equipe do hospital para tirar dúvidas e certificar as informações já declaradas nos processos anteriores. Caso o hospital avance, a próxima etapa será com a visita in loco pelos auditores da HIMSS, e se forem validadas todas as conformidades e especificações, o hospital recebe a certificação com um relatório detalhado dos auditores.
Caso prático 1 HOSPITAL ‘NASCE’ COM CONCEITO PAPERLESS
Níveis da certificação internacional da HIMSS
O Hospital Unimed Recife III foi uma das Benefício clínico pela TI limitado; Nenhum dos primeiras instituições a obter a certificação sistemas de Serviços de Apoio está instalado nível 6 da HIMSS no Brasil e um dos poucos a (Laboratório, Radiologia e Farmácia). ser construído já com a estrutura 100% digital. A unidade já trabalha para conquistar o nível Todos os sistemas de Serviços de Apoio estão instalados (Laboratório, 7 da certificação e, caso consiga, será a priRadiologia e Farmácia). meira da América Latina a ter esse Repositório de Dados Clínicos (CDR), Vocabulário reconhecimento. Para que Médico Controlado, Suporte e Decisão Clínica e Interoperabilidade de Informação (IHE). Com 202 leitos e um hospital atendimento de Documentação clínica, CDSS nível terciário, (Sistema de Suporte à Decisão) se torne 100% todos os processos com verificação de erros. de registro médico digital, ele deve são digitais, e a Sistema de Entrada de Ordens Médicas integração entre os (CPOE), suporte à decisão clínica estar de acordo fundamentada em protocolos clínicos. diferentes serviços ocorre de forma com os oito Todos os sistemas transparente para PACS de Radiologia o colaborador, ou estágios evolutivos instalados. seja, pelo prontuário eletrônido modelo de Documentação médica (modelos), sistema co do paciente de suporte à decisão clínica completo, circuito fechado de medicação completo. (PEP) é possível prontuário acessar exames de imagem, laboHospital Digital; Registro Médico Eletrônico eletrônico (EMR) completo, sistemas analíticos para ratório e hemomelhorar os cuidados com a saúde. componentes em da HIMSS tempo real. Fonte: HIMSS-AL “O grande diferencial do PEP está na integração e no manuseamento das informações de forma clínica é uma das maiores tência muito mais assertiva, inteligente. Ele permite ao gestor tomar decisões vantagens da ferramenta, com qualidade e segurança”, de forma mais rápida, e os processos são mais auxiliando o médico com explica o diretor médico do eficientes”, destaca George Trigueiro Filho, alertas quando surge um Hospital, Fernando Cruz. gestor hospitalar da instituição. risco no tratamento medicamentoso, ou oferecendo No caso do Unimed Recife, Para obter a certificação da HIMSS, o gestor protocolos clínicos para o há cinco protocolos clínicos conta que foi preciso fazer apenas alguns adotados pela instituição ajustes, já que a instituição já foi construída plano de cuidado. dentro da fercom o conceito paperless (sem papel). “Não “Tem algumas patologias disponíveis ramenta: protocolo de enfarto preciso ter no hospital um espaço físico para para as quais a equipe médica do miocárdio, de AVC, Sepse, armazenamento de prontuário de papel, como precisa ter resultados de TEV (tromboembolismo um SAME por exemplo (Serviço de Arquivo laboratório, de imagem e venoso) e PAC (Pneumonia Médico e Estatística). Isso economiza custo, não de sangue o mais rápido Adquirida na Comunidade). só dessa estrutura como também de pessoal.” possível para implementar Está sendo implantado Além de ganhar eficiência nos processos de uma linha de cuidado. Com também o protocolo de gerenciamento de internação e do faturamento, o PEP, você abre um novo insuficiência cardíaca e o PEP possibilita uma verdadeira transformação cenário com mais agilidade outro para fratura do colo na gestão da assistência. O suporte à decisão e eficiência, tornando a assis- de fêmur. Melh res Práticas |
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Para conquistar o nível 7, Trigueiro Filho explica que está sendo preciso fazer alguns investimentos para cumprir com as exigências da HIMSS. A dispensação de medicamentos e a leitura de sinais vitais na beira do leito foram alguns dos processos que passaram pela digitalização. Agora, a farmácia clínica recebe a prescrição pelo PEP, verifica os alertas que o sistema gera, o farmacêutico avalia esses alertas e tem acesso a todo o plano terapêutico do médico, e pode então tomar a sua decisão, seja liberando a medicação ou entrando em contato com o médico. Quando o medicamento chega ao paciente, a checagem é feita com um aparelho de leitura de códigos de barras. Ao fazer a conferência pela pulseira de identificação, se a medicação não estiver prescrita para aquele paciente, o sistema gera um alerta avisando o profissional, “isso reduz a quase zero a troca de medicação e erros de dosagem”, diz o diretor médico. No caso dos sinais vitais, antes um enfermeiro transcrevia as informações e registrava no prontuário eletrônico. Agora (ainda em fase de testes), a equipe assistencial não precisa fazer nada, os equipamentos têm conectividade com o sistema, as informações são registradas diretamente no PEP. Para conseguir a certificação 7, todos os leitos de UTI precisam ter esse monitoramento digital funcionando em tempo real. “A previsão é recebermos a visita da equipe da HIMSS em outubro”, finaliza o gestor.
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Caso prático 2 DO PAPEL PARA O DIGITAL Em São Paulo, o Hospital Santa Paula começou seu processo de digitalização do prontuário entre 2006 e 2007. O planejamento foi feito por etapas: começou com a implantação da ferramenta no Administrativo, para depois ir para as áreas assistenciais. O setor administrativo fazia então o processo de internação pela ferramenta e transcrevia a prescrição do médico do papel para o eletrônico. Nessa fase, já era possível gerar o faturamento de forma eletrônica. Em 2008, foi iniciado o processo assistencial. Não havia mais a necessidade da transcrição, o médico já conseguia ver a evolução do paciente e fazer o plano terapêutico pelo PEP. Nessa etapa, foram incluídas a unidade de Emergência e uma parte da UTI. “A ideia era testar dois cenários distintos: uma parte da UTI que tinha a característica de receber pacientes de longa permanência, enquanto na Emergência era o inverso, o paciente chegava, era tratado e liberado. Outro aspecto que influenciou para iniciarmos a transição nesses dois setores foi o perfil do corpo clínico fechado. Então tenho os mesmos profissionais trabalhando todos os dias e apontando os ajustes a serem feitos”, conta Alexandre Dias, gerente de Tecnologia da Informação da instituição.
Desde 2012, a unidade tem todos os processos funcionando no PEP, desde a enfermagem até toda a equipe multiprofissional, que engloba Nutrição, Psicologia, Farmácia, entre outros. De acordo com Dias, muitos profissionais tiveram dificuldade de adaptação, que foi resolvida com treinamento e com o próprio uso da ferramenta, mas não houve nenhum problema de aceitação da tecnologia. Para que todos os colaboradores estivessem aptos a usar o sistema, foi feito um plano de capacitação que envolveu todos os setores do hospital. Cada setor tem uma pessoa bem treinada no uso do PEP, e é esse colaborador o responsável por treinar os profissionais do seu departamento e fazer a “ponte” entre o suporte da equipe de TI e os profissionais que possuírem dúvidas que ele não consegue sanar. O sucesso de uma transição benfeita depende do planejamento da equipe de TI e do envolvimento do corpo clínico. “Nenhum médico me questionou sobre o uso da ferramenta, pelo contrário, hoje eles enxergam que não há condições de prestar a assistência sem antes consultá-la”, ressalta. “É o médico quem está no topo da assistência junto com o paciente, é ele quem toma as decisões, então o trabalho deve começar por esse profissional. Uma vez que os médicos estiverem engajados, o restante flui naturalmente.”