Fernanda Fragateiro: dos arquivos, à matéria, à construção

Page 1



Fernanda Fragateiro dos arquivos, à matéria, à construção from archives to matter, to construction


4-5


Dos constructos espaciais: a obra recente de Fernanda Fragateiro

14

On spatial constructs: Fernanda Fragateiro’s recent œuvre

16

Pedro Gadanho Index

5

Fernanda Fragateiro e os processos editoriais: folha a folha, bloco a bloco, passo a passo

20

Fernanda Fragateiro and editing processes: sheet by sheet, block by block, step by step

21

Sara Antónia Matos Obras Works

42

Silence, space and time in the work of Fernanda Fragateiro

120

Silêncio, espaço e tempo na obra de Fernanda Fragateiro

121

George Stolz Lista de obras List of works

144


6-7

Demolição, 2 (pormenor detail), 2017



8-9



10 - 11



12 - 13



Dos constructos espaciais: a obra recente de Fernanda Fragateiro

14 - 15


Como instituição recém-criada, o Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT) tem sido publicamente definido tanto pela sua abordagem interdisciplinar aos diversos campos da área cultural, como pela sua visão relativa ao contributo destes para um debate alargado sobre as questões da atualidade. Quando definimos como um pilar estratégico da nossa programação as mostras antológicas de artistas portugueses em «meio de carreira» e confirmação de reconhecimento internacional, o nome de Fernanda Fragateiro surgiu como uma escolha natural para a inauguração desta série de exposições. Ainda que, finalmente, neste ano a artista conte com várias exposições individuais em Portugal, discretamente ela tem vindo a estabelecer uma presença sólida no contexto artístico internacional, tendo participado em diversas exposições na Europa e nos Estados Unidos da América. Paradoxalmente, grande parte do trabalho desenvolvido pela artista ao longo deste período permaneceu desconhecida do público português. Uma mostra antológica de meio de carreira apresentou-se como uma excelente oportunidade para revelar peças da sua produção recente nunca antes mostradas em Portugal, mas também como uma possibilidade de oferecer uma visão geral mais estruturada da sua prática artística a um público que nos visita a partir de fora. O trabalho de Fernanda Fragateiro toca ainda todos os aspetos da produção de conhecimento que pretendemos desenvolver no MAAT. O seu trabalho escultórico está claramente relacionado com a arquitetura e outras práticas espaciais. Contudo, esta relação não se esgota nas correspondências formais que a artista estabelece com as fontes arquitetónicas às quais vai buscar inspiração. Antes, as correlações que ela estabelece são cruciais porque questionam a cultura arquitetónica, para lançar uma revisão crítica de quem tem o poder de definir o espaço enquanto constructo cultural e social. Ao assumir uma posição política, subtilmente feminista, esta artista revela aquilo que as estruturas arquitetónicas muitas vezes têm mantido na obscuridade – desde gestos de sujeitos femininos, em grande parte ausentes, a significados menorizados por publicações especializadas ou pelas paredes das instituições museológicas. Neste processo, Fernanda Fragateiro permite que o seu público compreenda aquilo que permanece impercetivelmente imutável no nosso contexto social e, assim, aponta para tópicos que ainda necessitam de questionamento e examinação, nomeadamente através da investigação artística. O seu trabalho é preciso, esteticamente poderoso, espacialmente envolvente – mas, também, um processo de revelação para além da mera, bela agregação de formas, objetos e referências. Pedro Gadanho Diretor, MAAT – Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia


On spatial constructs: Fernanda Fragateiro’s recent œuvre

16 - 17


As a recently created institution, the Museum of Art, Architecture and Technology (MAAT) has been publicly defined by its interdisciplinary approach to different cultural fields, as well as its take on how these may jointly contribute to a wider debate on contemporary issues. When we set out “mid-career” surveys of internationally acclaimed Portuguese artists as one of our programme’s strategic pillars, Fernanda Fragateiro was a natural choice to inaugurate this exhibition series. This year the artist is finally engaged in several solo shows in Portugal, while she has also been discreetly establishing a solid presence on the international stage, participating in different exhibitions around Europe and the United States of America. Nevertheless, most of the work the artist has produced over this period has, paradoxically, remained unknown in her homeland. A mid-career survey presented an excellent opportunity to reveal locally unseen examples of her recent output, as well as the chance to show a more structured overview of her practice to an audience of foreign visitors. Furthermore, Fernanda Fragateiro’s work ticks every single box regarding the furthering of knowledge that is our goal at the MAAT. Her sculptural work is evidently related to architecture and other spatial practices. However, this relationship is not only important because she establishes formal connections with, and draws inspiration from, architectural sources. Rather, the correlations she devises are crucial because they delve into the architectural culture to trigger a critical revision of those who wield power to define space as a cultural and social construct. Establishing a political, subtly feminist position, she uncovers what architectural structures have often kept hidden, from gestures of mostly absent female subjects down to meanings subdued by specialist publications or the walls of museum institutions. In this process, she allows her audience to understand what remains imperceptibly unchanged in our social context. Thus, she, points to topics that still require inquiry and examination, namely through artistic investigation. Her work is precise, aesthetically powerful and spatially engaging, while also revelatory beyond the mere beautiful aggregation of forms, objects and references.

Pedro Gadanho Director, MAAT – Museum of Art, Architecture and Technology


18 - 19

Demolição, 2, 2017



Fernanda Fragateiro e os processos editoriais: folha a folha, bloco a bloco, passo a passo Sara Antรณnia Matos curadora curator

20 - 21


Fernanda Fragateiro and editing processes: sheet by sheet, block by block, step by step


A exposição Fernanda Fragateiro: dos arquivos, à matéria, à construção, apresentada pelo MAAT – Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia na galeria Central 2, consiste numa intervenção espacial, constituída por várias peças produzidas ao longo do percurso da artista e outras propositadamente para a ocasião, através das quais Fernanda Fragateiro (Montijo, 1962) se propõe desenhar e estruturar o próprio espaço expositivo. A intervenção, que deve ser lida, segundo as palavras da artista, como «uma janela, que se abre e fecha, sobre os processos de elaboração da obra de arte, convertidos eles mesmos em obra», revela o seu pensamento em torno da modelação espacial, mostrando uma relação umbilical com a arquitectura Capa Cover Stones Against Diamonds, 2013.

e fazendo referência aos domínios da construção e da edição no espaço. Pode perguntar-se, então, o que significa editar no espaço? Trata-se de criar possibilidades de leitura, associações mais ou menos encriptadas, encadeamentos com ou sem vínculo nítido, para as matérias expostas no espaço bidimensional ou tridimensional. Tanto as intervenções no espaço expositivo como as publicações, em suporte físico ou digital, envolvem processos editoriais. Seja nas paredes do museu ou nas páginas do livro, os processos de edição implicam o manuseamento de ferramentas e matérias específicas, a criação de estruturas com entradas, percursos e saídas – ou começo, meio e fim –, a disposição de obras, imagens e textos, a introdução de espaços de respiração, ritmos e movimentos. Daí que, embora os suportes sejam diferentes – a folha de papel ou a sala de exposição –, os processos editoriais se possam equiparar. Para ir um pouco mais longe na resposta, deve evidenciar-se ainda o modo como Fragateiro se apropria dos materiais e dos processos editoriais, comuns às disciplinas de modelação do espaço: a arquitectura e as artes plásticas. Nesse sentido, é necessário clarificar o que aproxima esta artista dos arquitectos a quem tantas vezes faz homenagem ou referência, e o que a distancia do território da arquitectura, fazendo com que o seu trabalho permaneça enquadrado no campo das artes plásticas. Essa aproximação e essa distância residem no facto de as duas disciplinas terem o espaço como uma das suas matérias privilegiadas de trabalho. Porém, enquanto a arquitectura e os arquitectos modelam o espaço para o tornar habitável, as artes plásticas e os artistas tratam de pensar as suas hipóteses de representação. Isso justifica que Fragateiro, mais do que trabalhar os edifícios arquitectónicos em si mesmos – ou seja, as construções em «carne e osso», melhor dizendo, cimento e betão, tijolo e armadura –, se debruce sobre os livros, suportes impressos e documentos que os referem, isto é, formas editoriais de representação. Nessa área da (re)elaboração conceptual, os dois campos, arquitectura e artes plásticas, estão já em paridade, ou seja, no campo do pensamento e da representação. Não é isto que Fernanda Fragateiro realça a propósito da sua peça Stones Against Diamonds (p. 103), de 2017, presente na exposição?

22 - 23


The exhibition Fernanda Fragateiro: from archives to matter, to construction, presented by MAAT – Museum of Art, Architecture and Technology in its Central 2 gallery, consists of a spatial intervention comprising various pieces produced over the course of her career as an artist, and others that have been specially constructed for the occasion, through which Fernanda Fragateiro (Montijo, 1962) designs and structures the exhibition space itself. The intervention – to be understood, in the words of the artist, as “a window, opening and closing, to the processes of creating an artwork, themselves turned into an artwork” – reveals her thinking about spatial modelling, in which an umbilical relationship with architecture is evident, as well as references to construction and to Cover Capa Architecture without Architects,

editing in space.

1964.

But what does editing in space mean? It is about creating reading possibilities, more or less encrypted associations, connections whose links may be clear or not, for matter exhibited in the two- or threedimensional space. Both interventions in an exhibition space and physical or digital publications involve editing processes. And those processes, whether on the walls of the museum, or in the pages of a book, imply handling specific tools and materials, creating structures with entrances, route-throughs, and exits (or beginning, middle and end), arranging works, images and texts, introducing spaces to pause, rhythms and movements. As a result, although the mediums may be different – a sheet of paper or an exhibition room –, the editing processes are comparable. To develop this answer further, we also need to show how Fragateiro appropriates the editing materials and processes common to disciplines involving the shaping of space: architecture and the visual arts. In this regard, it is important to clarify what brings the artist close to the architects she so often homages or references, and what distances her from the territory of architecture and ensures that her work remains rooted in the visual arts field. This link and this distance come from the fact that the two disciplines use space as one of their principal working materials. Yet while architecture and architects shape space to make it habitable, the visual arts and artists are concerned with thinking about possible ways of representing it. Hence, Fragateiro doesn’t so much work with architectural buildings themselves – “flesh and blood” or, rather, cement and concrete, brick and pier constructions – as turn to the books, printed matter and documents – in other words, editorial forms of representation – that refer to them. In this area of conceptual (re)elaboration, the two fields, architecture and the visual arts, are now on an equal footing within the field of thought and representation. Isn’t this what Fernanda Fragateiro highlights in her 2016 piece Stones Against Diamonds (p. 103), included in this exhibition? The work of Lina Bo Bardi (1914-1992), an Italian architect who, in 1946, adopted Brazil as her country, spanned architecture, design, teaching, curating and writing. The

Cover Capa Latin American Architecture since 1945, 1955.

book Stones Against Diamonds, which gives substance to Fragateiro’s piece, is a


O trabalho de Lina Bo Bardi (1914-1992), arquitecta italiana que a partir de 1946 adoptou o Brasil como seu país, estende-se da arquitectura ao design, passando pelo ensino, pelo trabalho curatorial e pela escrita. O livro Stones Against Diamonds, que dá corpo à obra de Fragateiro, reúne os ensaios e os 1. Lina Bo Bardi, Stones Against Diamonds.

artigos da arquitecta, publicados em inglês pela primeira vez nesta edição 1 .

Anthony Doyle, Pamela Johnstone. London:

A antologia de textos evidencia a importância que os meios e as linguagens

Architectural Association Publications, 2013.

editoriais tinham para Bo Bardi na concepção do espaço. Eram o veículo através do qual Bo Bardi repensava as ideias inerentes ao Modernismo, transformando-as e propondo novos parâmetros para a prática da arquitectura, tais como uma nova tolerância às ideias de «imperfeição», rudeza, etc. O foco de Fernanda Fragateiro na componente conceptual e editorial, a qual em larga extensão se refere a publicações de conteúdo arquitectónico, alarga-

2. Architecture without Architects: A Short

se a obras como Modern Architecture Without Architects2 (p. 67), de 2011, ou

Introduction to Non-Pedigreed Architecture

(Not) Reading Modern Latin American Architecture 3 (p. 111), de 2013, e Brazil Builds4

é a publicação que acompanha a exposição com o mesmo nome apresentada no MoMA

(p. 95), de 2015, presentes nesta exposição. Estas três obras de Fragateiro, as quais

– The Museum of Modern Art (Nova Iorque),

incorporam nas suas estruturas os próprios livros, referem-se não propriamente

originalmente editada por este museu em

aos edifícios que estão documentados nas páginas ou aos seus arquitectos mas

1964. O livro, cujo autor é o curador da exposição, Bernard Rudofsky, aborda a riqueza

àquelas que são provavelmente as três publicações mais icónicas no que diz

da arquitectura vernacular, discutindo as suas

respeito à arquitectura modernista. O recurso às publicações como matéria da obra

vertentes artística, funcional e cultural.

demonstra a necessidade da artista de continuar a reflectir, por meios plásticos

3. Latin American Architecture since 1945,

e a partir do domínio editorial, sobre o campo da arquitectura e da construção.

catálogo da exposição com o mesmo nome

O interesse pelos livros e os lugares que os recebem estende-se a obras como

apresentada no MoMA, é da autoria de Henry-Russell Hitchcock e foi editado por este museu

Biblioteca5 (pp. 74-75), de 2016-2017, que replica a estrutura das estantes da Sala de

em 1955.

Leitura Geral da Biblioteca Pública de Évora. Esta peça é formalmente composta

4. Brazil Builds – Architecture New and Old (1652-

por várias grelhas de madeira pintada de branco, em parte sobrepostas, como

-1942), catálogo da exposição com o mesmo

que remetendo para as várias camadas e níveis de conhecimento preservados

nome apresentada no MoMA, é da autoria de Philip L. Goodwin e foi editado por este museu

nos livros guardados nas estantes e na biblioteca que lhe serve de referência.

em 1943. O livro resulta do desejo de conhecer

Além deste interesse pelas bibliotecas, a artista tem, na última década, dado

a arquitectura brasileira, especialmente no que

crescente importância às páginas impressas, de publicações (livros e revistas)

respeita a soluções para problemas de controlo de calor e luminosidade em grandes superfícies

de arte e de arquitectura, transformando-as na «carne» ou matéria plástica das

de vidro.

suas construções escultóricas, como são exemplo Architecture, a place for

5. Integra a exposição A reserva das coisas no

women? (pp. 90-91) e Elevation Study (Domus), ambas de 2016, ou a escultura

seu estado latente, com curadoria de Adam

Built (looking at Lina Bo Bardi, MASP, S. Paulo 1957-1968) (p. 85), de 2011.

Budak, patente no Fórum Eugénio de Almeida (Fundação Eugénio Almeida), em Évora, entre 21 de Janeiro e 23 de Abril de 2017.

Se Architecture, a place for women? questiona de forma simbólica o lugar da mulher num território disciplinar (a arquitectura) tradicionalmente dominado por homens, Built (looking at Lina Bo Bardi, MASP, S. Paulo 1957-1968), realizada cinco anos antes, sublinhava já a existência de uma obra icónica da autoria de uma das poucas mulheres a participar na construção de espaço na América do Sul. É uma peça escultórica de aço e papel, este oriundo de publicações que fazem referência aos conteúdos do Museu de Arte de São Paulo (MASP), desenhado por Bo Bardi. Dentro dos parâmetros da arquitectura modernista, este museu, tal

24 - 25


collection of the architect’s essays and articles, published in English for the first time 1. Lina Bo Bardi, Stones Against Diamonds.

in this edition.1 The collection of texts shows the importance editorial methods and

Anthony Doyle, Pamela Johnstone. London:

languages had for Bo Bardi in her conception of space. They were the vehicle through

Architectural Association Publications, 2013.

which she rethought the ideas inherent to modernism, transforming them and proposing new parameters for architectural practice, such as a new tolerance for the ideas of “imperfection”, roughness, etc. Fernanda Fragateiro’s focus on the conceptual and editorial component, which largely relates to architectural publications, encompassed works such as Modern

2. Architecture without Architects: A Short

Architecture Without Architects,2 (p. 67) from 2011, (Not) Reading Modern Latin

Introduction to Non-Pedigreed Architecture is

American Architecture,3 (p. 111) from 2013, and Brazil Builds,4 (p. 95) featured in this

the publication that accompanied the exhibition of the same name held at MoMA – The Museum

exhibition. These three works by Fragateiro, whose structure includes the books

of Modern Art (New York), originally published

themselves, do not refer so much to the actual buildings documented on their pages

by that museum in 1964. The book, by Bernard

or to their respective architects as to probably the three most iconic publications on

Rudofsky, the exhibition curator, deals with the richness of vernacular architecture, discussing

modernist architecture. The use of publications as material for her work shows the

its artistic, functional and cultural aspects.

artist’s need for continued reflection on the field of architecture and construction

3. Latin American Architecture since 1945,

through plastic means, taking the realm of publishing as a starting point.

catalogue to the MoMA exhibition of the

Fragateiro’s interest in books and the places that host them extends to works such as

same name, is by Henry-Russell Hitchcock and was published by that museum in 1955.

Biblioteca,5 (pp. 74-75) from 2016-2017, which replicates the structure of the bookcases in the general reading room of Évora Public Library. Formally, this piece consists

4. Brazil Builds – Architecture New and Old

of several white-painted metal meshes, overlapping in places, as if alluding to the

(1652-1942), catalogue to the MoMA exhibition

various layers and levels of knowledge preserved in the shelves and in the library used

of the same name, is by Philip L. Goodwin and was published by the museum in 1943. The book

as reference.

came about as the result of a desire for more

In addition to libraries, over the last decade printed pages taken from art and

knowledge of Brazilian architecture, particularly

architecture publications (books and magazines) have become increasingly

with respect to its solutions to issues of heat control and luminosity in large glass surfaces.

prominent in Fragateiro’s work, where they are transformed into the “flesh” or the physical matter of her sculptural constructions, as in Architecture, a place for women?

5. Included in the exhibition The reserve of things in their latent state, curated by Adam Budak, held at the Fórum Eugénio de Almeida (Fundação Eugénio de Almeida) in Évora from 21 January to 23 April 2017.

(pp. 90-91) and Elevation Study (Domus), both from 2016, or the sculpture Built (looking at Lina Bo Bardi, MASP, S. Paulo 1957-1968) (p. 85), from 2011. If Architecture, a place for women? symbolically questions the place of women within a disciplinary territory (architecture) traditionally dominated by men, Built (looking at Lina Bo Bardi, MASP, S. Paulo 1957-1968), produced five years earlier, had already drawn attention to the existence of an iconic work by one of the few women to participate in the construction of space in South America. It is a sculptural piece made of steel and paper, the latter taken from publications referring to the contents of the Museu de Arte de São Paulo (MASP), designed by Bo Bardi. Built according to the parameters of modernist architecture, this museum, like the sculpture, is raised spiderlike from the ground on four pillars, which support the structure’s central element in the air – in suspension. The void created by the elevation of this central element, as well as conferring transparency and permeability to the surrounding urban area, is frequently filled with large crowds of political protesters – bearing witness to the continued relevance of Bardi’s architecture and designs.

Cover Capa Brazil Builds, 1943.


como a escultura, eleva-se do nível do chão, como um aranhiço, graças a quatros pilares que sustentam no ar – em suspensão – o corpo central do edifício. O vazio gerado pela elevação deste corpo central, além de conferir transparência e permeabilidade à zona urbana onde o museu está implantado, é frequentemente ocupado por grandes multidões em contestações políticas que acontecem no Brasil – testemunhando a actualidade da arquitectura e dos projectos de Bo Bardi. Neste grupo de trabalho, em que as folhas de papel e os miolos das publicações se tornam tijolos, vigas ou colunas arquitectónicas, podem enquadrar-se ainda Having Words (p. 57), de 2016, e Measuring E1027 (pp. 58-59), de 2011. A primeira obra é um pequeno bloco escultórico feito com onze exemplares da publicação que lhe deu Capa Cover Having Words, 2009.

o título: Having Words6 . Este livro reúne artigos e ensaios de referência da arquitecta e urbanista Denise Scott Brown (n. 1931), esposa de Robert Venturi (n. 1925), com

6. Denise Scott Brown, Having Words. London:

quem partilhou, entre 1980 e 2012, o atelier Venturi, Scott Brown and Associates,

Architectural Association Publications, 2009.

não vendo todavia o seu papel como autora condignamente reconhecido, aspecto a que Fernanda Fragateiro pretende dar visibilidade. A este propósito, é de lembrar que a arquitecta foi co-autora e responsável por vários projectos do Venturi, Scott Brown and Associates, mas quando o Prémio Pritzker – o mais alto galardão da arquitectura – foi atribuído ao seu marido, em 1991, Denise não foi à cerimónia, assumindo a sua posição contra o não-reconhecimento do seu trabalho. A segunda, Measuring E1027, é uma obra através da qual Fernanda Fragateiro referencia a arquitecta modernista Eileen Gray (1878-1976), procurando reverter um apagamento da história. Esse apagamento, a que certamente não foram alheios os factos de a autora ser mulher e de o seu campo profissional estar dominado por homens, remeteu ao esquecimento o trabalho desta arquitecta irlandesa, particularmente a Casa E1027 (1926-1929), localizada à beira do mar Mediterrâneo, no Sul de França, em Roquebrune-Cap-Martin. Nesta edificação, Le Corbusier (1887-1965) pintou uma série de murais coloridos, que Eileen desaprovou veementemente por considerar que desvirtuavam a integridade austera do desenho da casa. O desentendimento entre Eileen Gray e Le Corbusier gerou uma série de equívocos e uma troca de correspondência entre os dois, através da qual

7. Vd.: Beatriz Colomina, «Battle Lines: E.1027»,

se percebe que Le Corbusier veio a arrogar a si o título de co-autor7 do projecto,

in Renaissance and Modern Studies [Culture,

subjugando e fazendo cair ainda mais no esquecimento a sua verdadeira autora.

Theory and Critique), vol. 39, no 1, Nottingham: University of Nottingham, 1996, pp. 95-

Desta série de trabalhos, em que Fernanda Fragateiro adopta publicações

-105. [Disponível na Internet: http://dx.doi.

como base das obras, pode ainda destacar-se a peça Double Words (pp. 86-87),

org/10.1080/14735789609366597].

de 2011, realizada para a segunda exposição da artista na galeria Arratia Beer, em Berlim. A obra é constituída por duas publicações abertas, colocadas na parede, lado a lado, e suportadas por estruturas de aço. De um lado, encontra-

8. Nikolaus Jungwirth, Demo: Eine

-se o livro Demo: Eine Bildgeschichte des Protests in der Bundesrepublik 8 , que a

Bildgeschichte des Protests in der

artista encontrou numa das suas pesquisas na biblioteca do Goethe-Institut, em

Bundesrepublik. Weinheim/Basel: Beltz, 1986.

Lisboa. A publicação reúne um conjunto de referências a contestações políticas e sociais ocorridas na Alemanha durante o século XX. Pese embora o interesse

26 - 27


A further two pieces can be included within this group of work, in which the pages and insides of publications become bricks, beams or architectural columns: Having Words (p. 57), from 2016, and Measuring E1027 (pp. 58-59), from 2011. The first work 6. Denise Scott Brown, Having Words. London:

is a small sculptural group consisting of 11 copies of the publication that gives it its

Architectural Association Publications, 2009.

title: Having Words.6 This book is a collection of significant articles and essays by the architect and planner Denise Scott Brown (b. 1931), the wife of Robert Venturi (b. 1925). Between 1980 and 2012 the couple were partners in the Venturi, Scott Brown and Associates practice, yet Scott Brown’s role as an architect has still not been properly recognised – an issue to which Fernanda Fragateiro aims to draw attention. It should be remembered that the architect was the co-author of, and jointly responsible for, several Venturi, Scott Brown and Associates projects, yet when the Pritzker Prize – architecture’s highest accolade – was awarded to her husband in 1991, Denise did not attend the ceremony, taking a stance against the lack of recognition for her work. The second, Measuring E1027, is a piece through which Fernanda Fragateiro alludes to the modernist architect Eileen Gray (1878-1976), in an attempt to remedy an erasure from history. The erasure, surely not unrelated to the fact that she was a woman in a profession dominated by men, led to the neglect of the work of this Irish architect, particularly House E1027 (1926-1929), located on the shores of the Mediterranean, in

Cover Capa E.1027 Maison en bord de mer (by

Roquebrune-Cap-Martin, south of France. Le Corbusier (1887-1965) painted a series of

Eileen Gray and Jean Badovici, facsimile ed.,

colourful murals inside the building, which Gray vehemently disapproved of, believing

Marseille: Éditions Imbernon), 2006.

they disrupted from the austere integrity of the house’s design. The disagreement between Eileen Gray and Le Corbusier led to a number of misunderstandings and an exchange of correspondence between the two, which reveals that Le Corbusier

7. See: Beatriz Colomina, “Battle Lines:

claimed for himself the title of co-author7 of the project, overshadowing the house’s

E.1027”, in Renaissance and Modern Studies

true architect and relegating her to further obscurity.

[Culture, Theory and Critique], Vol. 39, No. 1, Nottingham: University of Nottingham, 1996,

Another piece from this series of works based on publications as a starting point is

pp. 95-105. [Accessible online: http://dx.doi.

Double Words (pp. 86-87), from 2011, produced for the artist’s second exhibition at

org/10.1080/14735789609366597].

the Arratia Beer gallery in Berlin. The work consists of two open publications, placed side by side on the wall, supported by steel structures. On one side is the book Demo:

8. Nikolaus Jungwirth, Demo: Eine Bildgeschichte

Eine Bildgeschichte des Protests in der Bundesrepublik,8 which the artist found during

des Protests in der Bundesrepublik. Weinheim/

one of her searches at the Goethe-Institut library in Lisbon. The publication contains a

Basel: Beltz, 1986.

group of references to twentieth-century German political and social demonstrations. Despite the artist’s interest in the various records and matters contained within the publication, the cover of Demo, reflected in the metal surface of Double Words, shows a group of demonstrators being violently attacked by water cannons during a protest against fare increases in Frankfurt in 1974. Alongside, in the work’s other element, is a Donald Judd (1928-1994) catalogue whose distinctive orange cover matches the colour of the top worn by one of the demonstrators. Questioning the distance between art and human drama, the artist saw the image as a document portraying the process of becoming socially conscious: a process that undeniably involves the notion of citizens’ power of representation and their demand for rights, particularly the right to disagree with the status quo.


da artista pelos vários registos e assuntos contidos na publicação, a capa de Demo, reflectida na superfície de metal de Double Words, mostra um conjunto de manifestantes a ser violentamente atacados por canhões de água durante um protesto contra o aumento do preço dos transportes, em Frankfurt, em 1974. Ao lado, no outro elemento que compõe a obra, vê-se o catálogo de Donald Judd (1928-1994), cuja típica cor laranja da capa coincide com a cor da camisola usada por um dos manifestantes. Questionando a distância entre arte e drama humano, a artista olhou para a imagem como um documento que retrata o processo de consciencialização social: um processo que passa indiscutivelmente pela noção do poder de representação dos cidadãos e pela reivindicação Capa Cover Kunst + Design, 1993.

dos seus direitos, nomeadamente o de discordância perante o statu quo. A publicação Demo: Eine Bildgeschichte des Protests in der Bundesrepublik exerceu tal fascínio sobre a artista, que veio a servir de base para outras obras suas, nomeadamente Black Bloc (pp. 78-81), de 2013, presente nesta exposição. O título da peça é uma referência explícita aos movimentos e grupos «antiglobalização» e «anticapitalismo», cujos membros, durante as acções de protesto, costumam cobrir de negro os rostos e corpos, ora em sinal de luto, ora como metáfora de um processo de dessubjectivação dos indivíduos consentâneo com as sociedades capitalistas. Esta peça, com a forma de uma coluna vertical, é constituída por cinco elementos: cadernos Moleskine de capa negra, suportados por estruturas de acrílico e ligados entre si por elásticos. Embora os cinco cadernos estejam virados para a parede, deixam entrever no seu interior algumas páginas de Demo referentes aos movimentos emancipatórios feministas que ganharam preponderância no espaço público, durante as manifestações do Maio de 68. Nesses protestos, um conjunto de mulheres expõe o peito, desnudando-se da cintura para cima – procedimento adoptado noutras contestações que viriam a ganhar relevância na Alemanha, especialmente na década de 1980. Além de integrar estas obras, a publicação Demo veio ainda originar um corpo recente de trabalho – com o título images are acts, de 2017 –, mostrado na exposição individual da artista na Arratia Beer, em Berlim, já em 2017. Segundo Fragateiro, o processo de construção deste corpo de trabalho passou por observar a imagem como um bloco ou muro de pessoas, movimentos de corpos, cores de vestes, fachadas de edifícios, sinaléticas e símbolos publicitários, e por os transpor para uma construção plástica, composta de elementos monocromáticos, capaz de transmitir a experiência maciça, de bloco, vivida nestas manifestações político-sociais. Desse modo, a artista reflecte mais uma vez sobre a forma como as reivindicações e as representações ideológicas ganham substância e evidência pública através da vertente plástica, espacial e editorial. É preciso, de facto, que os cidadãos representem e materializem os seus posicionamentos para que estes existam no domínio e na consciência públicas.

28 - 29


The artist was so fascinated by the publication Demo: Eine Bildgeschichte des Protests in der Bundesrepublik that she used it as the basis for other works, such as the 2013 piece Black Bloc (pp. 78-81), included in this exhibition. The title of the piece is an explicit reference to anti-globalization and anti-capitalist movements and groups, whose members cover their bodies and faces in black during protest actions, both as a sign of mourning and as a metaphor for a process of the de-subjectification of individuals, characteristic of capitalist societies. Taking the form of a vertical column, the artwork consists of five elements: Moleskine notebooks with black covers, supported by acrylic structures linked together by elastic bands. Although the five notebooks face the wall, inside them one can see glimpses of some of the pages Cover Capa Demo: Eine Bildgeschichte des

from Demo referring to the growing prevalence of women’s liberation movements in

Protests in der Bundesrepublik, 1986.

the public space during the May 1968 demonstrations. At these protests, a group of women exposed their breasts, stripping off from the waist up – an action adopted in other demonstrations that rose to prominence in Germany, particularly in the 1980s. As well as forming a part of these works, the publication Demo also led to a recent body of work – with the title images are acts, from 2017 – shown at the artist’s solo show at Arratia Beer, in Berlin, in 2017. According to Fragateiro, the process by which this body of work was constructed involved looking at images as a block or wall of people, movements of bodies, colours of clothing, building façades, advertising signs and symbols, and transposing them to a physical construction, consisting of monochromatic elements, capable of conveying the dense, block-like experience of these political and social demonstrations. In this way, the artist once again reflects on the way that ideological demands and representations acquire substance and public visibility through the physical, spatial and editorial dimension. It is indeed necessary for citizens to represent and give form to their positions to bring them into existence in the public domain and consciousness. With regard to the series of works by Fragateiro that are based on publications and that acquire sculptural form in space it could be said that what is most important is not the explicit and complete decoding of the contents of the publication, nor the physical buildings in themselves, but the referencing of the architectural field. Through this field, the sculpture engages in a constant redefining of the territory in which it operates. On this point, and for a better understanding of the definition of the field that encompasses the discipline of Sculpture, it is relevant to consider the titles with the prefix “não” (not) that the artist commonly gives to her work. (Não) ler, (Não) ver, (Não) pensar [(Not) reading, (Not) looking, (Not) thinking] are titles of works that allude to the modernist labels coined by Rosalind Krauss (b. 1941) in an

9. See: Rosalind Krauss, “Sculpture in the

attempt to define sculptural practice.9 For Krauss, sculptural practice from the 1960s

Expanded Field”, in October, Vol. 8 (Spring),

onwards could be described as an expanded field no longer belonging precisely

Cambridge, MA/London: The MIT Press, 1979, pp. 30-44.

to architecture or landscape (non-architecture and non-landscape), but to a much larger field of activity, situated at the interstices of these two domains, concerned with spatial and three-dimensional representation. One might say that this broader


Deste conjunto de obras de Fernanda Fragateiro que partem de suportes editoriais e ganham corpo escultórico no espaço pode dizer-se que o mais relevante não é o deciframento explícito e completo dos conteúdos da publicação, nem tão-pouco os edifícios físicos em si mesmos, mas a referenciação ao campo arquitectónico – a partir do qual a escultura está permanentemente a redefinir o seu território de acção. Neste âmbito, e para melhor compreender a definição de campo que envolve a disciplina Escultura, é relevante ter em conta os títulos com o prefixo «não» que a artista vulgarmente atribui ao seu trabalho. (Não) ler, (Não) ver, (Não) pensar são títulos de obras que remetem para as designações modernistas de Rosalind Krauss (n. 1941) ao tentar definir a prática escultórica 9. Demo: Eine Bildgeschichte des Protests in der

Para Krauss, a prática escultórica dos anos de 1960 em diante passou a poder

Bundesrepublik, p. 60, 1986.

definir-se como um campo expandido que já não pertence à arquitectura nem à paisagem propriamente ditas (non-architecture e non-landscape), mas

9. Vd.: Rosalind Krauss, «Sculpture in the

a um domínio de actuação mais vasto, situado nos interstícios daquelas, e

Expanded Field», in October, vol. 8 (Spring),

que concerne à representação espacial e tridimensional. Ora, pode dizer-se

Cambridge, MA/London: The MIT Press, 1979, pp. 30-44.

que este território mais vasto, onde as definições caem e as classificações se tornam ineficazes, é também o domínio de operação de Fernanda Fragateiro. Dito de outro modo, aquilo que esta artista trabalha não são os territórios estanques das disciplinas, mas os significados (num plano simbólico e imagético) atribuídos ao uso dos materiais, as novas atitudes e as novas formas de dar resposta aos problemas encontrados face à construção do espaço. Neste plano, em que à arte está subtraída uma função racional, funcional e científica, cabe-lhe manter a capacidade de gerar debate interno, confrontação, e de comunicar modelos filosóficos, representacionais e ideológicos alternativos. Pode dizer-se então que a exposição, através de espaços profundamente editados, proporciona uma experiência estética, conceptual e sensível oferecendo novos modelos representacionais. Como que dentro de uma casa, de porta em porta, de esquina em esquina, de sala em sala, ou imaginariamente dentro de um livro, virando página atrás de página: corpo

10. Vd.: Beatriz Colomina (coord.), Sexuality &

e espaço fundem-se e, em simbiose, adquirem uma presença política10.

Space. New York: Princeton Architectural Press,

Esta presença política passa pela reelaboração e representação do nosso

1992.

corpo (feminino/masculino, individual/colectivo) no espaço e do nosso espaço de representação, dos quais fazem parte o estar, o habitar, o imaginar, o projectar, o ter expectativas, o criar beleza, etc. Ao contribuir para efectivar estes domínios de representação que, por sua vez, exigem processos de construção, desconstrução e reconstrução, o trabalho de Fernanda Fragateiro é, poder-se-á dizer, profundamente político, pois reclama uma ampliação do nosso campo de movimentação, bem como alternativas de representação. Este campo nada tem a ver com a norma ou com as formas regulares de habitar. É uma forma de pensamento e de especulação onde caem as divisões típicas das disciplinas e onde ciência e arte, cálculo e mito já não são os pólos

30 - 31


territory, where definitions collapse and classifications become ineffectual, is also the realm in which Fernanda Fragateiro operates. In other words, it is not the impermeable territories of disciplines that she explores but the meanings (at the level of symbols and imagery) attributed to the use of materials, and the new attitudes and new ways of responding to the issues that arise during the construction of space. At this level, in which a rational, functional and scientific function is extracted from art, it is also important to maintain art’s capacity to generate internal debate, confrontation, and to communicate alternative philosophical, representational and ideological models. It might thus be said that, through heavily edited spaces, the exhibition Fernanda Fragateiro: from archives to matter, to construction creates an aesthetic, conceptual Demo: Eine Bildgeschichte des Protests in der

and tangible experience that offers new representational models. As if we were inside

Bundesrepublik, p. 97, 1986.

a house, moving from door to door, from corner to corner, from room to room, or imagining ourselves within a book, turning page after page: body and space merge

10. See: Beatriz Colomina (ed.), Sexuality &

and, in symbiosis, acquire a political presence.10

Space. New York: Princeton Architectural

This political presence involves the re-making and representation of our body

Press, 1992.

(female/male, individual/collective) in space and of our space of representation, which encompass being, inhabiting, imagining, projecting, having expectations, creating beauty, etc. By helping to bring about these realms of representation that, in turn, require processes of construction, deconstruction and reconstruction, Fernanda Fragateiro’s work could be described as deeply political since it calls for an expansion of our field of movement, as well as representational alternatives. This field has nothing to do with the norm or with the usual forms of living. It is a form of thought and speculation where the characteristic divisions between disciplines collapse and where science and art, calculus and myth are no longer opposite sides of a contradiction but elements of an indivisible discourse on the possibilities of life, revealed through art. Here’s what Fragateiro does through her works: reveal and claim new forms of living, of inhabiting and shaping the space in which we move. Frequently, as in this exhibition, this proposal, which is also ethical and moral, involves deconstructing pre-existing structures and norms, not to destroy or reject them, but to get to their elementary roots and rework them, making her work deeply current and contemporary. Muro [Wall] (pp. 70-71), from 2017, created specifically for this exhibition, bears witness to this method of thinking and construction that is both contemporary and ancient, inherent in the roots of a city. It could be said that the wall is one of the first elements in the construction of the polis, which is what makes it symbolically so relevant in this

11. Emanuele Coccia, O Bem nas Coisas. A Publicidade como Discurso Moral. Transl. Jorge Leandro Rosa. Lisbon: Documenta/Fundação Carmona e Costa, 2016.

exhibition. As the thinker Emanuele Coccia11 states on the constitution of society:


de uma contradição mas componentes de um discurso indivisível sobre as possibilidades da vida, que se dá a conhecer através da arte. É isso que faz Fragateiro através das suas obras: dar a conhecer e reivindicar novas formas de vida, de habitar e de modelar o espaço em que nos movemos. Muitas vezes, como nesta exposição, essa reivindicação, que é também ético-moral, passa por uma desconstrução das estruturas e normas preexistentes, não para as destruir ou descartar, mas para chegar às suas raízes mais elementares e para as retrabalhar – o que torna o seu trabalho profundamente actual, contemporâneo. Muro (pp. 70-71), de 2017, que a artista concebeu especificamente para esta exposição, testemunha essa forma de pensar e de construir contemporânea, mas também ancestral, inerente à raiz de uma cidade. Digamos que o muro é dos primeiros elementos na construção da pólis, daí que simbolicamente seja tão 11. Emanuele Coccia, O Bem nas Coisas.

relevante nesta exposição. Como refere o pensador Emanuele Coccia11, a propósito

A Publicidade como Discurso Moral. Trad.

da constituição da sociedade:

Jorge Leandro Rosa. Lisboa: Documenta/ Fundação Carmona e Costa, 2016.

A cidade permanece, ainda hoje, uma “coisa de pedra”: um conjunto ordenado de muros, uma colecção de vidas encerradas entre pedras. E são as paredes ainda – quer dizer, coisas de pedra – que estabelecem a amplitude das nossas cidades, que definem o traçado e a direcção das ruas, que separam o espaço privado do espaço público. Se a pedra é a “coisa” política por excelência e a matéria-prima de toda a nossa existência social, não o é apenas porque permita dividir e determinar o espaço comum [...] [mas por o] muro encarnar perfeitamente o mecanismo de inclusão e exclusão que parece ser o acto fundador de toda a comunidade política. [Coccia, 2016: 30] A comunidade projecta-se sobre os muros, dá-se ao olhar e fala sobre si mesma através das suas superfícies. Assim, pode dizer-se que os muros «representam ainda hoje o espaço público por excelência, a superfície sobre a qual a cidade e o indivíduo registaram e conservaram o seu saber, as suas normas de vida, os seus juízos» (Coccia, 2016: 30). Por tudo isto, o construir e destruir o muro, o alterar a sua configuração estrutural ou superficial, o retirar-lhe tijolos ou fornecer-lhe uma coloração rosada (tom de carne), como fez Fernanda Fragateiro nesta obra, pode entender-se como um acto de reconstruir politicamente a comunidade, traçar os contornos do 12. Vd.: Casabella, «SITE, Indeterminate

seu retrato – sendo essa uma das funções do artista. O artista imagina outros

Façade», n. 411 (Marzo), Milano: Arnoldo

retratos possíveis da sociedade na qual habita e gostaria de vir a habitar.

Mondadori Editore, 1976, p. 42.

Tal como a fachada que lhe serve de referência (um armazém-stand de vendas

13. Casabella, op. cit., p. 43. A tradução

da companhia BEST Products Co., Inc.12), este muro de Fernanda Fragateiro

do termo para a língua portuguesa é da

oferece-se como um exemplo de «des-arquitecturalização»13 que questiona e

responsabilidade da autora do presente ensaio.

32 - 33

produz o efeito contrário ao da solidez, segurança e imponência corporativas das


The city remains, even today, a “thing of stone”: an ordered group of walls, a collection of lives enclosed among stones. And it is also stones – or things of stone – that establish the extent of our cities, that define the layout and direction of the streets, that separate private space from public space. If stone is the political “thing” par excellence and the raw material of our entire social existence, it is not merely because it allows our shared space to be divided and determined [...] [but because the] wall perfectly embodies the mechanism of inclusion and exclusion that seems to be the founding act of the entire political community. [Coccia, 2016: 30]

Casabella, “SITE, Indeterminate Façade”,

The community projects itself upon walls, it makes itself visible and speaks of itself

No. 411 (March Março), 1976, p. 42.

through its surfaces. It could thus be said that walls “still represent today the public space par excellence, the surface upon which the city and the individual have registered and preserved their knowledge, their ways of life, their judgements” (Coccia, 2016: 30). For all these reasons, constructing and destroying a wall, altering its structural or surface configuration, removing bricks from it, or giving it a rosy shade (the colour of flesh), as Fernanda Fragateiro does in this work, can be understood as an act of politically reconstructing the community, tracing the contours of its portrayal, one of the functions of the artist. Artists imagine other possible portrayals of the society in which they live and which they would like to inhabit. Like the façade that serves as a reference (a BEST Products Co., Inc. showroom/

12. See: Casabella, “SITE, Indeterminate Façade”,

warehouse),12 this wall by Fernanda Fragateiro is an example of “de-architecturisation”13

No. 411 (March), Milan: Arnoldo Mondadori Editore,

that questions and produces the opposite effect to that of the corporate solidity,

1976, p. 42.

security and impressiveness characteristic of large corporations. Indeterminate

13. Casabella, op. cit., p. 43.

Façade, designed in the 1970s for BEST, in Houston, by the SITE (Sculpture In the

14. Margaret McCormick, “The Ironic Loss of

Environment) 14 studio, specifically by its founder, the architect James Wines (b. 1932),

the Postmodern Best Store Façades”, in Failed

known for transforming architecture into sculptural pieces,15 explores a fascination

Architecture, Amsterdam: Failed Architecture Foundation, 22 July 2014. [Available online:

with the effects of demolition and ruin, thereby questioning the modernist aesthetics

https://www.failedarchitecture.com/the-ironic-

inherent to both architecture and to the most orthodox models of display. This

loss-of-the-postmodern-best-store-facades/].

typically postmodern questioning is something that Fernanda Fragateiro also set

15. Alyssum Skjeie, “James Wines: The Architect

out to consider in this exhibition. In her reconsideration of established models of

Who Turned Buildings into Art”, in Storyboard,

“display” or exhibition “devices”, it could be said that the artist – like James Wines,

Pittsburgh: Carnegie Museum of Art, Jul 8, 2015. [Available online: http://blog.cmoa.org/2015/07/

with whom she has exchanged ideas and correspondence – used a process that

james-wines-the-architect-who-turned-buildings-

is also deconstructive or “de-architecturising” and absolutely characteristic of

into-art/].

postmodernism. She worked with the exhibition structure itself, opening up cracks in the walls to create expansive views that cut between compartments (as if turning the exhibition into one piece or unifying intervention), or linking together existing walls with others recuperated from previous constructions, without repairing them or disguising their previous use. On the contrary, the artist embraced the reutilisation of materials and their histories, and these walls became both the support for and part


14. Margaret McCormick, «The Ironic Loss of

grandes empresas. A Indeterminate Façade, concebida, na década de 1970, para

the Postmodern Best Store Facades», in Failed

a BEST, em Houston (EUA), pelo estúdio SITE (Sculpture In The Environment) 14 –

Architecture, Amsterdam: Failed Architecture Foundation, 22 July 2014. [Disponível na

especialmente pelo seu fundador, o arquitecto James Wines (n. 1932), conhecido

Internet: https://www.failedarchitecture.com/

por transformar a arquitectura em peças escultóricas15 –, envolve um fascínio pelo

the-ironic-loss-of-the-postmodern-best-store-

efeito de demolição e de ruína, problematizando assim as estéticas modernistas

facades/].

inerentes quer à arquitectura quer aos modelos expositivos mais canónicos. Esta

15. Alyssum Skjeie, «James Wines: The Architect

problematização característica do pós-modernismo foi algo que a artista Fernanda

Who Turned Buildings into Art», in Storyboard,

Fragateiro também pretendeu equacionar nesta exposição. Para reconsiderar os

Pittsburgh: Carnegie Museum of Art, Jul 8, 2015. [Disponível na Internet: http://blog.cmoa.

modelos canónicos dos «dispositivos expositivos» ou de exposição, pode dizer-

org/2015/07/james-wines-the-architect-who-

-se que a artista usou, tal como James Wines – com quem Fernanda Fragateiro

turned-buildings-into-art/].

tem mantido correspondência e uma troca de ideias –, um processo também ele desconstrutivo ou de «des-arquitecturalização» muito característico do pós-modernismo. Trabalhou a própria estrutura expositiva, abrindo-lhe rasgos nas paredes para criar vistas amplas e transversais entre os compartimentos (com isso fez da exposição como que uma peça ou intervenção una), ou acoplando às paredes existentes outras recuperadas de construções anteriores, sem as reparar ou sem que o seu uso prévio seja disfarçado. Pelo contrário, assumiu a reutilização dos materiais e as suas histórias, passando estas paredes a ser suporte e simultaneamente parte das obras que albergam. Esta acção política sobre os muros, sobre as estruturas arquitectónicas, faz lembrar ainda que: Foi sobre o espaço de um muro – vertical, sólido, público, universalmente visível – que o Poder começou a brandir a sua Palavra e o seu Direito; a lei começou a ser publicada nas paredes. […] Foi sobre as paredes que o tempo, solar e astronómico, se foi tornando mensurável, e foi ainda sobre as paredes que, desde sempre, foram conservados a memória do tempo vivido e os nomes dos mortos, as suas últimas palavras. [Coccia, 2016: 31]

A Paisagem não tem dono/ Landscape has no

Se as palavras de Coccia chamam a atenção para a dimensão política inscrita nos

owner, 2009.

muros desde sempre, isto é, ao longo da história, pode dizer-se que a intervenção do artista está imbuída de uma ambição prospectiva, quer dizer, apontando para ou aspirando já a uma dimensão de futuro. A aspiração de participar na modelação espacial e social passa por gravar nas paredes, abrir na superfície dos muros

16. «Landscape has no owner», frase de Ralph

outra história e outro futuro para a comunidade, nomeadamente a comunidade

Waldo Emerson citada por W.J.T. Mitchell no

artística. A este propósito, vale a pena recordar a intervenção que a artista fez em

livro Landscape and Power (Chicago/London: The University of Chicago Press, 1994).

2009 na fachada da Central Tejo inscrevendo nela a frase «A paisagem não tem

A intervenção fez parte da exposição Construir

dono»16 . Antecipando o que viria a acontecer anos mais tarde, a obra de Fernanda

é destruir é construir, com curadoria de João

Fragateiro desapareceu com o derrubar desse muro para possibilitar a construção

Pinharanda, patente na Sala do Cinzeiro 8 do Museu da Electricidade, Fundação EDP, em Lisboa, entre 16 de Maio e 12 de Julho de 2009.

do novo edifício do MAAT, o qual por sua vez, abre novos olhares sobre a paisagem e proporciona ao visitante outra vivência do espaço comum. Esta intervenção atesta que inscrever opiniões nos muros, neles «tatuar» graffiti de protesto, rebelião

34 - 35


of the works that they host. This political action on walls, on architectural structures, is also a reminder that: It was on the space of a wall – vertical, solid, public, universally visible – that Power began to set out its Word and its Law; law began by being published on walls. [...] It was on walls that time, both solar and astronomical, became measurable, and it has also always been on walls that the memory of time lived and the names of the dead, their final words, have been preserved. [Coccia, 2016: 31] If Coccia’s words draw attention to the political dimension that has always – throughout history, in other words – been inscribed on walls, it could be said that the artist’s intervention is imbued with a prospective ambition, that is, signalling or aspiring towards a future dimension. The desire to participate in shaping space and society involves etching onto walls, opening up on their surface another history and another future for the community, particularly the artistic community. Here it is salient to recall the artist’s 2009 intervention on the façade of the Central Tejo building, 16. Portuguese translation of Ralph Waldo

on which she inscribed the phrase “A paisagem não tem dono”.16 Anticipating what

Emerson’s phrase “Landscape has no owner”,

would happen some years later, Fernanda Fragateiro’s work disappeared when the

cited by W. J. T. Mitchell in the book Landscape and Power (Chicago/London: The University of

wall was demolished to allow the new MAAT building to be constructed, which in

Chicago Press, 1994). The intervention was part

turn opened up new views over the landscape, offering visitors another experience

of the exhibition Construir é destruir é construir,

of shared space. This intervention demonstrates that by inscribing opinions on walls,

curated by João Pinharanda, which was held in the Ashpit 8 gallery at the EDP Foundation’s

by “tattooing” protest, rebellion or art graffiti on them, we transform our space into

Museu da Electricidade, in Lisbon, between 16

a place of projection (future) and not merely of retro-projection (past); a place of

May and 12 July 2009.

utopias, dreams and nightmares. Thus Fernanda Fragateiro’s walls, and works of art in general, are political things par excellence, shared imaginary projections, the tangible thought of a community. Works of art, artistic interventions, like this exhibition, are part of a discourse that entails the construction of a community, a culture, a city. Art gives community and reality a voice. Evidence of the link between the history of cities and the people who live in them and the methodologies used by Fragateiro can be found in various pieces she has produced, such as Construir é destruir é construir [To build is to destroy is to build] (pp. 46-47), from 2009, included in the exhibition. To install this work, a container

17. Work conceived specifically by the artist for

filled with broken bricks, belonging to the EDP Foundation Art Collection,17 the artist

the Ashpit 8 gallery and included in the exhibition

retrieved three tonnes of brick fragments from demolitions and ruins, some of them

of the same title (see preceding footnote).

coming from building works to restore the brick façade of the Central Tejo itself. This procedure is not, in fact, unusual for the artist, particularly in the creation of recent pieces, such as Demolição, 2 [Demolition, 2], (pp. 18-19) from 2017. Covering almost the entire wall at the entrance to the exhibition, where it is installed, the piece seems to announce the exhibition, suggesting the complex constructive and deconstructive processes concealed within. To create the work, the artist used pieces of masonry


ou arte, é fazer do nosso espaço um lugar de projecção (futuro), e não apenas de retroprojecção (passado); um lugar de utopias, sonhos e pesadelos. Assim, os muros de Fernanda Fragateiro e as obras de arte em geral são coisa política por excelência, projecção imaginária partilhada, pensamento sensível de uma comunidade. As obras de arte, as intervenções artísticas, como esta exposição, são parte de um discurso que envolve a construção de uma comunidade, de uma cultura, de uma cidade. A arte faz a comunidade e a realidade adquirirem voz. A prova de que a história das cidades e das pessoas que nelas vivem não é alheia às metodologias utilizadas pela artista revela-se em várias peças do seu percurso, nomeadamente Construir é destruir é construir (pp. 46-47), de 2009, em exposição. Para instalar esta obra em forma de contentor, cheio de tijolo 17. Obra especificamente concebida pela

partido, pertencente à Colecção de Arte Fundação EDP17, a artista recuperou

artista para a Sala do Cinzeiro 8, integrada

três toneladas de fragmentos de tijolo de demolições ou ruínas, tendo parte

na exposição com o mesmo título (vd.: nota anterior).

desse material provindo de uma obra de reabilitação da fachada de tijolo da própria Central Tejo. Este procedimento, de resto, não é inédito para a artista, nomeadamente na execução de peças recentes, tal como Demolição, 2 (pp. 18-19), de 2017. Instalada na parede da entrada da exposição, ocupando a extensão desta quase na totalidade, a peça funciona como uma anunciação da exposição, deixando adivinhar os complexos processos construtivos e desconstrutivos que se escondem no seu interior. Para realizar a obra, a artista recorreu a pedaços de alvenaria encontrados numa obra de remodelação de um edifício na Baixa da cidade de Lisboa, reservando para si fragmentos de alvenaria que não tinham valor arqueológico. Desse modo, socorrendo-se de materiais usados, provenientes de estruturas urbanas, carregados de vivência e história, a artista amarra as suas obras à realidade actual da cidade. Uma forma de trabalhar que parte da realidade, que a toma como base de acção e pensamento, um laboratório de recolha de materiais no qual a artista age como uma arqueóloga, transformando os restos em esculturas, contando novas histórias a partir daqueles. O processo de envolvimento efectivo com os lugares não é estranho às metodologias utilizadas por Fernanda Fragateiro logo nas suas primeiras obras, as quais datam do início dos anos de 1990, ou de peças como Existe

18. Integrada no Projecto Capicua 2002, patente

um substituto para a experiência?, 2, (pp. 54-55) de 200218 . Esta escultura de

no Foyer do Teatro Municipal do Porto – Rivoli.

chão, pertencente à Colecção de Arte Fundação EDP, é uma estrutura de aço inoxidável e espelho, com doze metros de comprimento, que reflecte o espaço onde é instalada, abrindo sobre o chão um fosso equivalente à altura do edifício que a acolhe. O uso de materiais reflectores, nomeadamente o espelho e o aço inoxidável polido, confirma, de resto, a consistência da linguagem plástica da artista que, década a década, série a série, obra a obra, vem reinventando o valor plástico e simbólico dos materiais – fazendo com que, ao longo dos tempos, a obra que produz seja inequivocamente reconhecida como sua.

36 - 37


she found on the site of the restoration of a building in the Baixa district in Lisbon, taking fragments that did not have any archaeological value. In this way, employing used materials from urban structures, laden with memory and history, the artist anchors her work in the here and now of the city. It is a method of working that takes reality as a starting point, using it as the basis of action and thought, a laboratory for the collection of materials in which the artist acts like an archaeologist, transforming remains into sculptures and using them as a starting point for new stories. The process of actual involvement with places is something that Fernanda Fragateiro has employed as a methodology from her very first works, in the early 1990s, and in pieces such as Existe um substituto para a experiência?, 2 [Is there a substitute for 18. Part of Projecto Capicua 2002, exhibited in the

experience?, 2] (pp. 54-55), from 2002.18 This floor sculpture, which belongs to the

Foyer of the Teatro Municipal do Porto – Rivoli.

EDP Foundation Art Collection, is a stainless steel and mirror structure, 12 metres long, which reflects the space where it is installed, opening up a gulf on the floor equivalent to the height of the building that houses it. The use of reflective materials, namely mirror and polished stainless steel, also confirms the consistency of the artist’s visual language, who decade by decade, series by series, and work by work, reinvents the plastic and symbolic value of materials – so that, over the years, the work she produces becomes unmistakably hers. Further examples of the intrinsic relationship with place are the projects (Não) ver,

19. Part of the group exhibition 7 Maravilhas

created for the central nave of Alcobaça Monastery in 2008,19 and “In the vocabulary

EDP, promoted by the EDP Foundation, which

of profit, there is no word for ‘pity’” (pp. 154-155), from the same year, for the old

presented interventions by seven artists in seven national monuments.

fish market building in Portimão,20 or her 2001 intervention in the former carpentry workshop of the Central Tejo building, (Não) ligar [(Not) connecting],21 a drawn-out

20. Part of the group exhibition Holidays in

process of which few records remain, where the artist separated, cleaned and

the Sun, curated by João Fernandes for the

(re)presented materials from the workshop, out of use for several years.

ALLGARVE 08 Contemporary Art programme.

In these actions, we already see indications of methodologies that are today part

21. Part of the group exhibition Apresentação,

of Fernanda Fragateiro’s working practices: the gathering of materials, from various

curated by João Pinharanda.

sources, and their (re)presentation under the title Materials Lab. Through these pieces, the artist exhibits studies for projects, drawings and significant notes for the development of her work, material samples, colour studies, etc., which are themselves “turned into an artwork”. In the exhibition, these groups are given the specific name Laboratório de Materiais, 4 [Laboratory of materials, 4] (pp. 114-117) and are presented sorted into boxes, as if in a laboratory or archive. This group of pieces offers unprecedented access to the artist’s working methods, to her tests and materials of choice, to her visual vocabulary and to her work in a kind of raw state: sheet by sheet, block by block, step by step. Materials Lab emerged from a seminar Fernanda Fragateiro gave at the Harvard Art Museums (Cambridge, USA), in 2015. In order to talk about her work with the students, the artist decided – instead of showing reproductions of the works – to present boxes with materials and to invite discussion not of the work in its final state, but of the work in the very process of conception, as if making her creative process visible and


São ainda exemplos da intrínseca relação com o lugar os projectos (Não) ver, 2 que 19. Integrados na exposição colectiva

realizou para a nave central do Mosteiro de Alcobaça19, em 2008, e “In the vocabulary

7 Maravilhas EDP, promovida pela Fundação

of profit, there is no word for ‘pity’” (pp. 154-155), para o edifício da antiga lota de

EDP, que proporcionou intervenções de sete artistas em sete monumentos nacionais.

Portimão20, também em 2008, ou uma intervenção que fez em 2001 na antiga carpintaria da Central Tejo, (Não) ligar 21, de decurso moroso e da qual restam poucos

20. Integrado na exposição colectiva Holidays

documentos de registo, em que a artista se propôs separar, limpar e reapresentar os

in the Sun, comissariada por João Fernandes

materiais existentes naquela carpintaria, desactivada havia vários anos.

no âmbito do programa ALLGARVE 08 Arte Contemporânea.

Estas acções eram já indícios das metodologias que hoje fazem parte da prática de trabalho de Fernanda Fragateiro: a recolha de materiais, de várias proveniências,

21. Integrada na exposição colectiva

e as suas (re)apresentações sob o título Laboratório de Materiais. Através destas

Apresentação, comissariada por João

peças, a artista mostra estudos para projectos, desenhos e apontamentos

Pinharanda.

importantes no desenrolar das obras, amostras de material, estudos de cor, etc., eles mesmos «convertidos em obra». Na exposição, estes conjuntos adquirem o nome específico de Laboratório de Materiais, 4 (pp. 114-117) e apresentam-se arrumados em caixas, como num laboratório ou arquivo. Este conjunto de obras dá acesso, como nunca antes, aos modos de trabalho da artista, aos seus testes e materiais de eleição, ao seu vocabulário plástico e à sua obra como que em estado bruto: folha a folha, bloco a bloco, passo a passo. O aparecimento do Laboratório de Materiais decorre de um seminário que Fernanda Fragateiro foi fazer nos Harvard Art Museums (Cambridge, EUA), em 2015. Para falar do seu trabalho com os alunos, em vez de reproduções das peças, a artista decidiu apresentar caixas com materiais e pôr em discussão não a obra na sua forma final, mas antes a obra em pleno processo de concepção, como que dispondo-se a tornar visível e transparente para nós o seu processo criativo. Desse modo, as peças adquirem a qualidade de um projecto de investigação, não devendo ser lidas como um arquivo fechado. Como sugere a artista, estas caixas,

(Não) ver, 2, 2008

que revelam e escondem, são também uma espécie de miniaturas da exposição, cada uma delas lembrando a maqueta de uma casa ou um livro, podendo o último, por sua vez, ser pensado como um pequeno edifício – o que reforça a complementaridade entre a modelação do espaço e os processos editoriais. Assim, recorrendo a uma multiplicidade de materiais provenientes das suas pesquisas e da cidade, Fernanda Fragateiro distancia-se cada vez mais da linguagem – linguagem com a qual tantas vezes a sua obra é conotada – e dos artistas exclusivamente minimalistas, para entrar no campo amplo e contaminável das práticas artísticas pós-modernas nas quais a realidade invade a obra e se manifesta de forma clara. Devendo ser experienciada como um todo, a exposição é uma intervenção única, em que Fernanda Fragateiro se viu compelida a demolir paredes da estrutura expositiva preexistente, partindo, obturando partes dela, assim mostrando que, para a artista, o espaço expositivo é mais uma matéria a editar. As obturações permitiram unificar espaços e criar vistas cinematográficas, movendo-se o

38 - 39


transparent to us. In this way, the pieces take on the quality of a research project and should not be read as a closed archive. As the artist suggests, these boxes, which reveal and hide, are also like miniatures of the exhibition, each of them resembling the model of a house or a book, the latter in turn can be thought of as a small building, emphasising the complementary nature of the relationship between the shaping of space and editing processes. Thus, drawing on a multiplicity of materials sourced from her research and from the (Não) ligar, 2001

city, Fernanda Fragateiro increasingly distances herself from exclusively minimalist language – a language that her work is often associated with – and artists, in order to enter the broad and contaminable field of postmodern artistic practices in which reality invades the work and clearly manifests itself. Demanding to be experienced as a whole, the exhibition is a single intervention, in which Fernanda Fragateiro felt compelled to demolish walls of the pre-existing exhibition structure, splitting and blocking off parts of it, and thereby demonstrating that, for the artist, the exhibition space is just another material to be edited. Through this blocking, spaces are unified and cinematographic perspectives created, with visitors circulating in accordance with the demands made by the differing scale of the pieces. Large works impose distance; other smaller ones seem to call for intimacy and privacy. Thus, in a back and forth between closeness and distance, the interior appears to be an exterior, and the exterior, in turn, a habitable interior: a house or a book in which the divisions/sections communicate and are discovered with each step or turn of the page, placing us, spectators, at the very heart of the editing process.

Sara Antónia Matos has been director of the Atelier-Museu Júlio Pomar, in Lisbon, since 2012, and of the Galerias Municipais de Lisboa since January 2017. She has an undergraduate degree in Sculpture, a master’s degree in Curatorial Studies, and a PhD with the thesis titled «Da Escultura à Espacialidade» [From sculpture to space], all from the University of Lisbon’s Faculty of Fine Arts. She regularly publishes essays on art in catalogues and specialised journals.


espectador ao sabor das exigências impostas pelas peças de diferentes escalas. Obras de grande dimensão impõem distância; outras, pequenas, parecem pedir intimidade e recato. Assim, num exercício de vaivém, entre aproximação e afastamento, o interior parece transformar-se num exterior, e o exterior, por sua vez, num interior habitável: uma casa ou um livro em que as divisões/secções comunicam e se vão descobrindo a cada passo ou virar de página, colocando-nos, a nós próprios, espectadores, no cerne do processo editorial.

Sara Antónia Matos é directora do Atelier-Museu Júlio Pomar, em Lisboa, desde 2012, e das Galerias Municipais de Lisboa desde Janeiro de 2017. É formada em Escultura pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa, Mestre em Estudos Curatoriais e Doutorada com a tese «Da Escultura à Espacialidade» na mesma universidade. Publica regularmente ensaios sobre arte, em catálogos e revistas da especialidade.

40 - 41

Por vontade expressa da autora, este texto não segue as regras do Acordo Ortográfico de 1990, atualmente em vigor em Portugal.



42 - 43

Casa de fĂŠrias, 2017



44 - 45



46 - 47

Construir ĂŠ destruir ĂŠ construir, 2009



48 - 49



50 - 51

Modernity Unbound, 2017



52 - 53



54 - 55

Existe um substituto para a experiĂŞncia?, 2, 2002



56 - 57

Having Words, 2016



58 - 59



60 - 61

Measuring E1027 (pormenores details), 2011



62 - 63



64 - 65



66 - 67

Modern Architecture Without Architects, 2011



68 - 69



70 - 71



72 - 73

Muro (pormenor detail), 2017



74 - 75

Biblioteca, 2016-2017



76 - 77



78 - 79

Black Bloc, 2013



80 - 81



82 - 83



84 - 85

Built 3 (Looking At Lina Bo Bardi, MASP, S. Paulo 1957-1968), 2011



86 - 87

Double Words, 2011



88 - 89



90 - 91



92 - 93

Architecture, a place for women? (pormenor detail), 2016



94 - 95

Brazil Builds, 2015



96 - 97



98 - 99

Utopien (pormenor detail), 2009



100 - 101



102 - 103

Stones Against Diamonds, 2017



104 - 105

Stones Against Diamonds, after Lina Bo Bardi, 2016



106 - 107

Cuadra San Cristรณbal, Luis Barragรกn, 2017



108 - 109



110 - 111

(Not) Reading Modern Latin American Architecture, 2013



112 - 113



114 - 115

Laboratรณrio de Materiais, 4, 2017



116 - 117



118 - 119



Silence, space and time in the work of Fernanda Fragateiro George Stolz

120 - 121


Silêncio, espaço e tempo no trabalho de Fernanda Fragateiro


View from the Instalação na Sala Sul Vista da Instalação na Sala Sul, 1990. Photography Fotografia Pedro Letria.

“This is how space begins, with words only, signs traced on the blank page.” 1

1. Georges Perec, Species of Spaces and Other Pieces [Espèces d’espaces, 1974, etc.]. Ed., intro.,

Georges Perec

transl. John Sturrock. London: Penguin Books Ltd, 1997, p. 13.

In 1990 Fernanda Fragateiro organised, on her own initiative, an exhibition of her 2. National Museum of Natural History and

work in a large room at the Museu Nacional de História Natural e da Ciência,2 a room

Science, in Lisbon.

situated in a part of the building that had been in disuse for years due to an earlier fire. After locating the room and arranging for the requisite permissions, she cleaned the space thoroughly, emptying it of its refuse, sweeping, scrubbing and scouring its damaged surfaces into presentability. Fragateiro then assembled and hung a makeshift yet effective lighting system. Finally, she created, in situ, a remarkable series of sculptures out of concrete, bricks, wood, plaster, and aluminium. These sculptures would become ephemeral when she later removed, dismantled and destroyed them all, relegating them from the present to the past, their only remaining traces photographic. Among the works in the show (which was entitled, simply, Instalação na Sala Sul, “Installation in the south hall”) was a wall sculpture composed of a series of white, narrow, box-like forms of varying lengths, hung in straight, parallel rows. While formally abstract, this quasi-modular sculpture clearly referenced writing – if any further clue were needed, it was supplied by the interspersed presence of smaller elements reminiscent of punctuation, in particular quotation marks. Or rather, it more specifically referenced printed text, with its regulated line spacing, font size and alignment. As Fragateiro later recalled:

122 - 123


Vista da Instalação na Sala Sul View from the Instalação na Sala Sul, 1990. Fotografia Photography Pedro Letria.

«É assim que o espaço começa, apenas com palavras, 1. Georges Perec, Species of Spaces and Other Pieces [Espèces d’espaces, 1974, etc.]. Org., intro., trad. John Sturrock. London: Penguin

sinais traçados na página em branco.»1 Georges Perec

Books, 1997, p. 13.

Em 1990, Fernanda Fragateiro organizou por iniciativa própria uma exposição do seu trabalho numa grande sala do Museu Nacional de História Natural e da Ciência, em Lisboa, situada numa parte do edifício há anos em desuso devido a um incêndio. Depois de encontrar a sala e obter permissão para a intervenção, limpou o espaço ao pormenor, tirou o entulho, varreu e poliu as superfícies danificadas. Montou também um sistema de luzes improvisado mas eficaz. Finalmente, criou, in situ, uma série notável de esculturas com cimento, tijolos, madeira, gesso e alumínio. Estas esculturas tornar-se-iam efémeras quando mais tarde a artista as removeu, desmontou e destruiu, relegando-as do presente para o passado – os únicos vestígios sobreviventes são fotográficos. Entre os trabalhos incluídos na exposição (simplesmente intitulada Instalação na Sala Sul) existia uma escultura de parede composta por algumas figuras em forma de caixa, brancas e estreitas, de vários comprimentos, penduradas em filas direitas e paralelas. Embora formalmente abstrata, esta escultura quase modular claramente referenciava a escrita – se mais alguma prova fosse necessária, esta podia encontrar-se na presença intercalada de elementos mais pequenos a fazer lembrar pontuação, em particular, aspas. Ou melhor, referenciava mais precisamente texto impresso, com o seu entrelinhamento regulado, corpo da fonte e alinhamento. Como Fragateiro mais tarde recordou:


(Not) Reading Modern Painting and Abstract Painting, 2010. Photography Fotografia Miguel Ângelo Guerreiro.

My first use of text occurred in my first installation, in 1990, at the Faculty of Science in Lisbon. It was a citation from Maurice Blanchot that I read in a text by Peter Eisenman, I don’t remember the text or the citation anymore, but I still remember transforming the citation, a phrase, into an object: each word was converted into a white piece, like an empty shelf suspended on the wall, very much like Donald Judd’s works. Not readable as semantic text, but as form. [...] Maybe this first use of text was a prediction that influenced and anticipated future works. What I’m really interested in is thinking/working about space. Theory is so much a part of it that I cannot separate textual materials from other materials, as text is memory and also anticipation, and it participates in the 3. George Stolz, “Ideas Are Like Bricks”, in

construction of reality.3

Proyectos 2014, Bogotá: NC-arte, 2015. p. 155.

It is striking to note that Fragateiro refers to her “use of text” in this work, although in point of fact there is no element of text present. Text (i.e. the quotation from Blanchot, already once-filtered by Eisenman) may have been useful as a generative element in the artist’s creative process, but in the course of that same process it has been converted into a non-verbal object that, as far as it is readable, is now exclusively “readable as form”. The skeletal structure of printed text has been recognisably maintained, but a shift of focus and emphasis has been enacted on the material level, substituting for verbal signification the haptic qualities that constitute the final sculpture: its volumes, surface textures, inner rhythms, along with the play of light and shadow, and its physical presence on the wall. Thus what is at work here is a kind of ekphrasis, an interpretive restatement or conversion of content from one medium of expression to another, a device generally associated with literature but that in fact can bridge any media. But in Fragateiro’s wall 124 - 125


A primeira vez que usei texto foi na minha primeira instalação, em 1990, na Faculdade de Ciências de Lisboa. Era uma citação de Maurice Blanchot que tinha lido num texto de Peter Eisenman. Já não me lembro do texto nem da citação, mas ainda me lembro de transformar a citação, uma frase, num objeto: cada palavra foi convertida numa peça branca, como uma prateleira vazia suspensa na parede, muito ao estilo dos trabalhos de Donald Judd. Não podia ser lido como texto semântico, mas como forma. […] Talvez este primeiro uso de texto tivesse sido um presságio que influenciou e antecipou trabalhos futuros. Aquilo que me interessa mesmo é pensar/trabalhar sobre espaço. A teoria é uma parte tão importante que não consigo separar materiais textuais de outros materiais, uma vez que o texto é memória e 2. George Stolz, «Ideas Are Like Bricks», in

também antecipação, e participa na construção da realidade.2

Proyectos 2014, Bogotá: NC-arte, 2015. p. 155.

É impressionante notar que Fragateiro se refere ao seu uso de texto neste trabalho, embora, na verdade, não existisse qualquer elemento de texto presente. O texto (isto é, a citação de Blanchot, já anteriormente filtrada por Eisenman) pode ter sido útil como elemento gerador no processo criativo da artista, mas, no decorrer desse mesmo processo, foi convertido num objeto não verbal que, na medida da sua legibilidade, é agora exclusivamente «lido como forma». É possível reconhecer a estrutura em forma de esqueleto do texto impresso, que foi mantida, mas uma mudança de foco e ênfase foi levada a cabo a nível material, substituindo a significação verbal pelas qualidades hápticas que constituem a escultura final: os seus volumes, as texturas da superfície, os ritmos interiores, bem como o jogo de luz e sombra e a sua presença física na parede.


Building Blocks, 1, 2011. Photography Fotografia Miguel Ângelo Guerreiro.

sculpture, if this be ekphrasis, it is ekphrasis of a brutalist sort. The translation into a visually communicative form is evident, the “poetics of the object” palpable; but the particular kind of conversion that has been enacted has entailed an act of silencing, and thus of silence. The voice within the writing has been made mute, the paths toward meaning once mapped irremediably blocked; even the artist herself no longer knows what those lost, ghostly words once “said”. What is involved in this work, in other words, is what might be considered a “creation” of silence – a technique that is frequent within Fragateiro’s overall practice. It is seen, for instance, in the many works in which she employs printed matter – i.e. books and magazines – in such a way as to make them hermetic, literally sealing their contents into materials such as concrete or steel while, at the same time, producing accomplished minimalist-inflected sculptures. Examples abound in Fragateiro’s production, and are particularly frequent in her most recent work: for instance, Architecture, a place for women?, 2016 (included in the present exhibition, pp. 90-91), in which old copies of the Italian architectural magazine Abitare are compressed into a solid object that resembles an iron beam, spanning the exhibition space; or Concrete Words, 2, 2016, in which a book on art history has been sandwiched between two delicately pigmented concrete blocks; or (Not) Reading Modern Painting and Abstract Painting, 2010, in which art books from the 1950s have been cut and encased in a acrylic supports, hanging on the wall; or the various iterations of the “Building Blocks” series, such as Blocos de Construção, 5, 2016, in which sections of an encyclopaedia are placed within marble housings and scattered across the floor, like uprooted

4. Robert Smithson (1938-1973), press release for

cobblestones. These volumes continue to speak volumes, but exclusively in a new

the Dwan Gallery, 1967.

idiom; or as in Robert Smithson’s phrase, this is indeed “LANGUAGE to be LOOKED at and/or THINGS to be READ”,4 but taken to an extreme.

126 - 127


Concrete Words, 2, 2016. Fotografia Photography António Jorge Silva.

Assim, o que está aqui a acontecer é uma espécie de ekphrasis, uma reafirmação interpretativa ou uma conversão de conteúdo, de um meio de expressão para outro, um mecanismo geralmente associado à literatura, mas que de facto é extensível a qualquer suporte. Mas no caso da escultura de parede de Fragateiro, se for ekphrasis, é uma ekphrasis de espécie brutalista. A tradução para uma forma visualmente comunicativa é evidente, a «poética do objeto» é palpável; mas o tipo específico de conversão representada implicou um ato de silenciamento, logo, de silêncio. A voz dentro da escrita foi calada, os caminhos para o conhecimento, outrora cartografados, irremediavelmente bloqueados; a própria artista já não sabe o que aquelas palavras perdidas e fantasmagóricas algum dia «disseram». Por outras palavras, este trabalho envolve o que poderá ser considerado «criação» de silêncio – uma técnica frequente na prática geral de Fragateiro. Encontra-se, por exemplo, nos muitos trabalhos em que a maneira como utiliza papel impresso – ou seja, livros e revistas – os torna herméticos, literalmente selando os seus conteúdos com recurso a materiais como cimento e ferro, enquanto ao mesmo tempo produz esculturas que são inflexões minimalistas bem-sucedidas. Existem exemplos abundantes na produção de Fragateiro, e são particularmente frequentes no seu trabalho mais recente: por exemplo, a obra Architecture, a place for women?, 2016 (incluída na presente exposição, pp. 90-91), em que números antigos da revista italiana de arquitetura Abitare são comprimidos num objeto sólido semelhante a uma viga de ferro e que atravessa o espaço expositivo; ou Concrete Words, 2, 2016, em que um livro de história da arte foi embutido entre dois blocos de cimento levemente pigmentados; ou (Not) Reading Modern Painting Blocos de Construção, 5 (pormenor detail), 2006.

and Abstract Painting, 2010, em que pequenos livros de arte dos anos de 1950

Fotografia Photography António Jorge Silva.

foram cortados e encaixados em suportes de acrílico, pendurados na parede; ou


128 - 129

Lugares perfeitos, 2, 1997-2000. Collection Coleção Caixa Geral de Depósitos.


© DMF Daniel Malhão Fotografia (Courtesy of the photographer Cortesia do fotógrafo)


MR10 Double Chair (after Mies van der Rohe and Lilly Reich), 2009. Photography Fotografia Miguel Ângelo Guerreiro.

Silence and silencing permeate other aspects of Fragateiro’s work, often in less immediately overt ways. For instance, Fragateiro’s dogged reclaiming of forgotten figures from the history of 20th-century art and design (especially women artists and designers whose obscurity has been imposed, directly or indirectly, by their male colleagues) is no more than the incorporation of an historicised silence into her own work, albeit from a critical perspective; here silence is not so much made as utilised. This can be seen in works such as MR10, 2009, which alludes to the work of the designer Lilly Reich (1885-1947), who worked with Mies van der Rohe (1886-1969); or forget me (not), 2017, which references the palette of the textile designer Otti Berger (1898-1944). A work that seems somewhat anomalous in Fragateiro’s oeuvre but that might be reconsidered in this light is Lugares perfeitos, 1997-2000 (“Perfect places”), a shelf of books written exclusively by authors who committed suicide, thereby silencing themselves. A connection might even be drawn between the interplay of silence within Fragateiro’s work and the preliminary, quasi-ritualistic cleansing of exhibition spaces that she so frequently performs (from the Sala Sul to the present exhibition spaces at MAAT) and which, as Paulo Pires do Vale points out in his deeply reflective essay on Fragateiro’s work, she tellingly refers to as “the eliminating of 5. Paulo Pires do Vale, “Prepared Places. Exercises

noise”: 5

for Keeping the Void”, in (Não) Ver. Lisbon: Projecto Travessa da Ermida/Mercador do Tempo Lda, 2013, p. 19. This book was published on the

Verbs such as clean, remove, unblock, eliminate, open up, and relieve emerged

occasion of the exhibition Pensar é Destruir, held

in the artist’s discourse as essential gestures. She considered these to be not

at the Ermida de Nossa Senhora da Conceição, in

just actions preparatory to placing the piece but part of the work itself. An

Lisbon, between 26 January and 24 March 2013. 6. Idem, ibidem, p. 17.

130 - 131

essential act of emptying without the utopia of immaculate purity, because the absolute void, as Cage taught us about silence, does not exist.6


as várias iterações da série «Building Blocks», como Blocos de Construção, 5, 2016, em que partes de uma enciclopédia são encerradas em cubos de mármore e estes espalhados pelo chão, como se fossem pedras da calçada desarraigadas. Estes volumes continuam a dizer muito, mas exclusivamente num novo idioma; ou, como na frase de Robert Smithson, isto é «LINGUAGEM para ser VISTA e/ou COISAS para 3. No original, «LANGUAGE to be LOOKED at

serem LIDAS»3, mas levado ao extremo.

and/or THINGS to be READ». Robert Smithson

Silêncio e silenciar permeiam outros aspectos do trabalho de Fragateiro, muitas

(1938-1973), press release para a Dawn Gallery, 1967.

vezes de maneiras não imediatamente claras. Por exemplo, a recuperação obstinada de figuras da história da arte e do design do século XX (especialmente, mulheres artistas e designers cuja obscuridade foi imposta, direta e indiretamente, pelos seus colegas – homens) não é mais do que a incorporação de um silêncio historicizado no seu trabalho, se bem que a partir de uma perspetiva crítica; aqui, o silêncio não é tanto «criado», mas «utilizado». Isto pode ser visto em obras como MR10, 2009, onde Fragateiro alude ao trabalho da designer Lilly Reich (1885-1947), que trabalhou com Mies van der Rohe (1886-1969); ou forget me (not), 2017, que referencia a paleta da designer têxtil Otti Berger (1898-1944). Uma peça que parece perspetiva é Lugares perfeitos, 1997-2000, uma prateleira de livros escritos apenas por autores que se suicidaram, desse modo silenciando-se a si próprios. Podemos até fazer uma ligação entre a interação do silêncio no trabalho de Fragateiro e a

4. Paulo Pires do Vale, «Lugares Preparados.

limpeza preliminar, quase ritualística, do espaço expositivo que tão frequentemente

Exercícios para Guardar o Vazio», in (Não) Ver.

executa (da Sala Sul aos espaços da atual exposição no MAAT) e ao qual, como

Lisboa: Projecto Travessa da Ermida/Mercador do Tempo Lda, 2013, p. 7. Este livro foi publicado por ocasião da exposição Pensar é Destruir, patente na Ermida de Nossa Senhora da Conceição, em Lisboa, entre 26 de janeiro e 24 de março de 2013.

Paulo Pires do Vale aponta no seu ensaio profundamente reflexivo sobre o trabalho de Fragateiro, a artista se refere, de modo revelador, como «eliminar o ruído»4:


132 - 133

forget me (not), after otti berger, 2017. Photography Fotografia Luis AsĂ­n.



Caixa para guardar o vazio, 2005. Photography Fotografia José Alfredo.

Silence, as we see here, intersects inevitably with its spatial counterpoint: space, emptiness, “the void.” And although, as Pires do Vale asserts, neither absolute silence nor the absolute void may exist, the same can not be said of the somewhat paradoxical “creation” of silence and the parallel “production” of space. Furthermore, while such acts may involve reduction (e.g. silencing, emptying), they are not necessarily negative, insofar as they yield a positive via the phenomenological experience of the artwork. In keeping with Carl Andre’s ethos (Andre’s work and 7. Carl Andre, b. 1935.

thought being of fundamental importance to Fragateiro’s),7 the essence of the sculptor’s act is to effect a transformative “cut”, altering that which was already, primordially there, and yet producing something else which is equally here. This procedure with regard to the production of space has driven much of Fragateiro’s work, particularly in its earlier periods, as well as in her highly successful public projects. For instance, Fragateiro’s Caixa para guardar o vazio, 2005 (“Box to keep the void”), as its declarative title indicates, is a human-scale box containing just that, a void, i.e. nothing; and yet at the same time, it is a layered and multi-faceted work of relational sculpture, its versatility in part due to its very simplicity. In a similar fashion, Jardim das ondas, 1998 (“Waves garden”) is an undulating grass-covered public space in Lisbon that adds no object to the existing landscape (other than a few lovely poplar trees), and yet that precisely through the understatement of its fluid design utterly reshapes the experience of that same landscape. Existe um substituto para a experiência?, 2, 2002 (“Is there a substitute for experience?, 2”) , included in the present exhibition, pp. 54-55), as well as structurally similar works such as MMM, 2001, are latticed floor structures under which mirrors have been placed; the lattices serve to fragment and call attention to the fact of the floor and (when permitted) to the act of passage; the

134 - 135


Verbos como limpar, tirar, desobstruir, eliminar, abrir, desentaipar, surgiam no discurso da artista como gestos essenciais. Não os considerava como apenas preparatórios para colocar a peça, mas já parte da obra. Um esvaziamento essencial, sem a utopia da pureza imaculada, porque o 5. Idem, ibidem, p. 5.

vazio absoluto, como nos ensinou Cage sobre o silêncio, não existe.5 O silêncio, como vemos aqui, cruza-se de forma inevitável com o seu contraponto espacial: o espaço, o vácuo, «o vazio». E embora, como Pires do Vale afirma, nem o silêncio absoluto nem o vazio absoluto existam na verdade, o mesmo não se pode dizer da «criação» algo paradoxal de silêncio e da «produção» paralela de espaço. Além disso, apesar de essas ações poderem implicar redução (por exemplo, silenciar, esvaziar), não são necessariamente negativas, na medida em que produzem algo positivo através da experiência fenomenológica da obra de

6. Carl Andre, n. 1935

arte. De acordo com o ethos de Carl Andre 6 (o trabalho e o pensamento de Andre têm uma importância fundamental na obra de Fragateiro), a essência da ação do escultor é produzir um «corte» transformativo, alterando aquilo que já lá estava, primordialmente, e ao mesmo tempo produzindo outra coisa que está também aqui. No que diz respeito à produção de espaço, este procedimento tem sido o impulso de muito do trabalho de Fragateiro, em especial nos primeiros tempos, assim como nos seus muito bem-sucedidos projetos para espaços públicos. Por exemplo, Caixa para guardar o vazio, 2005, como o título declarativo indica, é uma caixa à escala humana que contém apenas isso, um vazio, ou seja, nada; e ainda assim, ao mesmo tempo, é um trabalho escultórico relacional estratificado e multifacetado, cuja versatilidade se deve em parte à simplicidade. De forma similar, Jardim das ondas, 1998, é um espaço público ondulante e coberto de


Pensar é Destruir, 2012. Photography Fotografia Miguel Ângelo Guerreiro.

mirror, however, subverts the experience entirely, inducing disorientation yet without any actual distortion. Fragateiro’s oft-displayed mastery of floor works – one example of many is provided by Pensar é Destruir, 2012 (“Thinking is destroying”), a flowing current of terra cotta bricks – underscores this aspect of her method: as Fragateiro herself has said, “my favourite space is the floor. Only the sky is bigger than the floor. 8. George Stolz, op. cit., p. 156.

The floor is primordial and is the minimum we can use to build space”.8 The space “built” or “produced” in these works often invites and even relies on a participatory or relational response, whether unscripted by spectators or when, on occasion, Fragateiro has enlisted transdisciplinary collaborations – such as choreographers and dancers in Caixa para guardar o vazio, or gardeners in Ar, terra, água, luz, aço, tempo, 2008 (“Air, earth, water, light, steel, time”). These spatial works are also, as Ruth Rosengarten has pointed out in her discerning essay on Fragateiro’s work, fundamentally social, in that they invoke human agency – the presence of living, breathing people, coming and going, moving and not moving. In other words, of people experiencing, and thus existing, in time, so that “time and space are

9. Ruth Rosengarten, “The Art of Relating:

interwoven in these at first apparently static works”.9

Fernanda Fragateiro in Context”, in

This temporal element, however, is not limited to Fragateiro’s participatory-

DARDOmagazine, no 11 (June-September), Santiago de Compostela: Dardo, 2009, pp. 106-131.

-performative works; indeed it has been a constant across her oeuvre, from the Sala Sul to the present exhibition, at times direct and at other times oblique, at times declared and at other times more subtle. For instance, a temporal element lies latent within Fragateiro’s insistent reuse of pre-existing materials – a technique which, indeed, is one of the most characteristic aspects of her artistic practice. Moreover, in Fragateiro’s work this reuse often achieves the status of repurposing; in other words, not only reusing a chosen material or an object but rather assigning it a new function, shifting it from one cycle of use into another, lending it a new purpose and a new

136 - 137


Ar, Terra, Água, Luz, Aço, Tempo, 2008. Fotografia Photography Miguel Ângelo Guerreiro.

relva em Lisboa que não acrescenta nenhum objeto à paisagem existente (exceto alguns belos choupos), e é precisamente através do comedimento do seu design fluido que a experiência dessa mesma paisagem se reformula. Peças como Existe um substituto para a experiência?, 2, 2002 (incluída na presente exposição, pp. 54-55), a par de outras estruturalmente similares como MMM, 2001, são estruturas de chão reticulares debaixo das quais foram colocados espelhos; os retículos servem para fragmentar e chamar a atenção para o chão e (quando possível) para o ato que é a passagem; contudo, o espelho subverte a experiência por completo, induzindo a desorientação, embora sem qualquer distorção real. A mestria muitas vezes demonstrada nas peças de chão de Fragateiro – um exemplo entre muitos é Pensar é Destruir, 2012, uma corrente contínua de tijolos de terracota – sublinha este aspecto da sua metodologia: como a própria artista diz, «o meu espaço favorito é o chão. Só o céu é maior do que o chão. O 7. George Stolz, op. cit., p. 156.

chão é primordial e é o mínimo que podemos usar para construir espaço.»7 É frequente o espaço «construído» ou «produzido» nestes trabalhos convidar a, e até depender de, uma resposta participativa ou relacional, quer a improvisada pelos espectadores, quer a resultante das colaborações transdisciplinares que, por vezes, Fragateiro estabelece – com coreógrafos e bailarinos, no caso de Caixa para guardar o vazio, ou com jardineiros, no caso de Ar, Terra, Água, Luz, Aço, Tempo, 2008. Assim, estas peças espaciais são também, como Ruth Rosengarten apontou no seu ensaio perspicaz sobre o trabalho de Fragateiro, intrinsecamente sociais, na medida em que evocam agenciamento humano – a presença de pessoas reais, que vão e vêm, em movimento ou paradas. Por outras palavras, de pessoas que experienciam, e logo que existem, no tempo, e assim «o tempo e o espaço aparecem interligados


138 - 139

Unbuilt, 2010. Collection Coleção Fundació “la Caixa”. Photography Fotografia Miguel Ângelo Guerreiro.



(Not) connecting, 2, 2007. Photography Fotografia Pedro Ferreira.

identity, and in so doing retrieving it from the past and placing it in the present. An emblematic example of this is Unbuilt, 2010. In Unbuilt, Fragateiro collected maquettes that had been discarded from an architectural studio in Lisbon. Fragateiro refashioned the plain plywood maquettes into an extended, sequential, horizontallyoriented object that visually retained the references to modular architecture while, at the same time, by enhancing the play of volume, proportion, light and shadow, also functioned as an autonomous work of wall sculpture. The original maquettes were elements of design, plans or proposals that by definition point toward some later realisation as buildings in time future. On the other hand, they had been discarded into the trash – that is, relegated rather unmercilessly to time past. Fragateiro, in repurposing them into sculpture, thus retrieved them from both the past and the future, placing them squarely into time present as sculpture. Further examples of such repurposing are found across the breadth of Fragateiro’s production, at different periods and in different media, from various points of departure and towards different formal ends. These include works such as Construir é destruir é construir, 2009 (“To build is to destroy is to build”), included in the present exhibition, pp. 46-47); or the use of silk threads salvaged from a defunct German haberdashery and used to demarcate (and thus “produce”) sculptural space in (Not) connecting, 1, 2007, and (Not) connecting, 2, 2007; or the numerous instances of books and magazines converted into sculptures, referred to above.

140 - 141


8. Ruth Rosengarten, «The Art of Relating:

nestas obras que, num primeiro momento, nos parecem estáticas»8 .

Fernanda Fragateiro in Context», in

Este elemento temporal não está limitado, porém, às obras participativas-

DARDOmagazine, n.º 11 (junho-setembro), Santiago de Compostela: Dardo, 2009, pp. 106-131.

-performativas de Fragateiro; na verdade, tem sido uma constante na sua obra, da Sala Sul até à presente exposição, de forma por vezes direta e outras vezes oblíqua, por vezes declarada e outras vezes mais subtil. Por exemplo, um elemento temporal repousa latente na reutilização insistente de materiais preexistentes – uma técnica que, de facto, é um dos aspectos mais característicos da sua prática artística. Além do mais, no trabalho de Fragateiro esta reutilização atinge frequentemente o estatuto de reproposta; por outras palavras, não apenas reutilizar um material ou um objeto escolhido, mas dar-lhe uma nova função, deslocando-o de um ciclo de utilização para outro, conferindo-lhe um novo objetivo e uma nova identidade, desta maneira recuperando-o do passado e colocando-o no presente. Um exemplo emblemático deste processo é Unbuilt, 2010. Em Unbuilt, Fragateiro colecionou maquetes que tinham sido descartadas por um ateliê de arquitetura em Lisboa. Remodelou as maquetes simples de contraplacado, transformando-as num objeto alargado, sequencial, orientado horizontalmente, que retinha, visualmente, as referências à arquitetura modular e que, ao mesmo tempo, através do realçar do jogo de volume, proporção, luz e sombra, funcionava como um trabalho autónomo enquanto escultura de parede. As maquetes originais eram elementos de design, projetos ou propostas que, por definição, apontavam para uma qualquer futura concretização, como edifícios no tempo futuro. Por outro lado, tinham sido atirados para o lixo – isto é, relegados sem piedade para o tempo passado. Fragateiro, reutilizando-as numa escultura, foi buscá-las tanto ao passado como ao futuro, colocando-as diretamente no tempo presente enquanto escultura. Mais exemplos destas reutilizações podem ser encontrados em toda a amplitude


(Not) connecting, 1, 2007. Photography Fotografia Pedro Ferreira.

This artistic repurposing (not unrelated to the ekphrasis discussed earlier in this essay) bears within it an ethical component: that of frugality, of a wise use of resources, of 10. See: Delfim Sardo, “Emotional Ecology”, in

rescue.10 It is an ethos that, in its resistance to adding more material to the material

Fernanda Fragateiro: Caixa para Guardar o Vazio.

world, is particularly resonant today, in the face of the anthropogenetic glut that is

Lisbon: Assírio & Alvim, 2007, pp. 41-51.

choking our ecosystem, ourselves included. It is no small matter. But at the same time, Fragateiro’s repurposing is not limited to the salvage of materials such as rubble and thread, out-of-date magazines and obsolete encyclopaedias. Or rather, for Fragateiro, “materials” are not limited to the physical realm per se. As she has stated, “Ideas are materials. Ideas are like bricks. That’s what I think when I’m using other people’s

11. George Stolz, op. cit., p. 153.

ideas. I build a new thing with them.”11 Hence Fragateiro’s insistent, even obsessive, referentiality to history and the work of her predecessors, the references to the lesser known, to the more obscure, to the overlooked (especially women). The dead cannot be revived, but they can, perhaps, be saved. Thus voice is given to that which has been silenced; space is made for that which no longer had space; what is past is lent presence – via the present fact of art.

142 - 143

George Stolz is an independent critic and curator based in Madrid and New York.


da produção de Fragateiro, em diferentes períodos e em diferentes suportes, com diferentes pontos de partida e para atingir diferentes fins formais. Estes incluem trabalhos como Construir é destruir é construir, 2009 (incluído na presente exposição, pp. 46-47); ou o uso de fios de seda recuperados de uma retrosaria desactivada e usados para demarcar (e, por consequência, «produzir») espaço escultural em (Not) connecting, 1, 2007, e (Not) connecting, 2, 2007; ou os muitos exemplos de livros e revistas convertidos em esculturas, já referidos acima. Esta reutilização artística (não sem relação com a ekphrasis, de que falei anteriormente neste ensaio) contém em si uma componente ética: a da 9. Vd.: Delfim Sardo, «Ecologia Emocional», in

frugalidade, do uso racional dos recursos, do resgate.9 É um ethos que, na sua

Fernanda Fragateiro: Caixa para Guardar o Vazio.

resistência a acrescentar matéria ao mundo material, tem uma ressonância

Lisboa: Assírio & Alvim, 2007, pp. 31-40.

particular nos nossos dias, em face da fartura antropogénica que está a asfixiar o nosso ecossistema, nós próprios incluídos. Esta não é uma questão insignificante. Mas, ao mesmo tempo, a reutilização de Fragateiro não se limita a salvar materiais como entulho e fios, revistas datadas e enciclopédias obsoletas. Ou melhor, para Fragateiro, os «materiais» não se limitam à esfera material per se. Como a artista afirmou: «As ideias são materiais. As ideias são como tijolos. É nisso que penso quando estou a utilizar as ideias de outras pessoas. Construo uma

10. George Stolz, op. cit., p. 156.

coisa nova com essas ideias.»10 Daí a referenciação insistente, obsessiva até, de Fragateiro à história e ao trabalho dos seus antecessores, as referências aos menos conhecidos, aos mais obscuros, aos omitidos (especialmente mulheres). Os mortos não podem ser reanimados, mas talvez possam ser salvos. Assim, é dada voz ao que foi silenciado; é criado espaço para o que já não tinha espaço; ao que é passado é concedida presença – através do presente feito da arte.

George Stolz é crítico de arte e curador independente. Vive e trabalha entre Madrid e Nova Iorque.


144 - 145


Lista de obras List of works


PP. 6-13, 19

PP. 42-43

PP. 46-47

Demolição, 2, 2017

Casa de férias, 2017

Construir é destruir é construir, 2009

Fragmentos de alvenaria provenientes de demolição.

Fragmento de alvenaria proveniente de demolição.

Ferro pintado, contraplacado de bétula, tinta acrílica,

Masonry fragments from demolition.

Masonry fragment from demolition.

espelho e fragmentos de tijolo provenientes da

450 × 675 × 30 cm

10 × 15 × 10 cm

demolição de uma fábrica de cerâmica desativada, no

Coleção da artista. Collection of the artist.

Coleção da artista. Collection of the artist.

Montijo, e do restauro dos muros exteriores da Central Tejo. Painted iron, birch plywood, acrylic paint, mirror and

Composta por fragmentos de alvenaria recolhidos

brick fragments from the demolition of an old ceramics

pela artista, ao longo de vários meses, numa obra de

factory in Montijo (Portugal), and from the restoration of

remodelação no centro da cidade de Lisboa, esta

the outside walls of Central Tejo, Lisbon.

peça anuncia o teor «desconstrutivo» da exposição e,

479 × 382 × 50 cm

simultaneamente, revela uma forma de operar que usa

Coleção de Arte Fundação EDP. EDP Foundation Art

a cidade como lugar de pensamento e laboratório para

Collection.

a criação. Created from masonry fragments collected by

Como um contentor ligeiramente elevado do chão,

the artist over several months from a renovation

a obra suporta 3 toneladas de tijolo de demolições ou

project in the centre of Lisbon, this piece announces

ruínas, sendo parte desse material proveniente de uma

the “deconstructive” spirit of the exhibition and,

intervenção na fachada da Central Tejo da Fundação

simultaneously, reveals a working method in which the

EDP, instituição para a qual a obra foi concebida e onde

city is used as a place of thought and as a laboratory for

foi exposta em 2009.

creation.

Like a container slightly lifting away from the floor, this work supports 3 tonnes of brick fragments from demolitions or ruins. Some of the materials come from the intervention on the façade of the EDP Foundation’s Central Tejo building, the institution for which the piece was designed and in which it was exhibited in 2009.

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista.

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista e

Courtesy of the artist.

Courtesy of the artist.

EDP. Courtesy of the artist and EDP.

146 - 147


PP. 50-51

PP. 54-55

PP. 56-57

Modernity Unbound, 2017

Existe um substituto para a experiência?, 2, 2002

Having Words, 2016

Aço inox polido e 1 exemplar do livro Modernity

Aço inox e espelho. Stainless steel and mirror.

Aço inox polido e 11 exemplares do livro Having

Unbound: Other Histories of Architectural Modernity

1200 × 190 × 5 cm

Words (de Denise Scott Brown, Londres: Architectural

(de Detlef Mertins, Londres: Architectural Association

Coleção de Arte Fundação EDP. EDP Foundation Art

Association Publications, 2009). Polished stainless steel

Publications, 2011). Polished stainless steel and 1 copy

Collection.

of the book Modernity Unbound: Other Histories of

and 11 copies of the book Having Words (by Denise Scott Brown, London: Architectural Association Publications,

Architectural Modernity (by Detlef Mertins, London:

Concebida como um tapete e construída como um

2009)

Architectural Association Publications, 2011).

lugar de passagem, esta escultura reflete o espaço

18 × 11 × 10,5 cm PA. AP

18 × 11 × 10,5 cm

arquitetónico onde se inscreve, abrindo no chão um

Coleção da artista. Collection of the artist.

Coleção da artista. Collection of the artist.

vazio equivalente à altura do edifício que a acolhe, convocando o espectador para dentro da obra.

Pequeno bloco escultórico composto por 11 exemplares

Carpet-like in design, and constructed as a place of

do livro Having Words, que reúne ensaios da arquiteta e

transit, this sculpture reflects the architectural space in

urbanista Denise Scott Brown, casada com o arquiteto

which it is set, opening up a void in the floor equivalent

Robert Venturi, com quem concebeu vários projetos.

to the height of the building that houses it, inviting the

Em 1991, Venturi recebeu o Prémio Pritzker, a cuja

viewer into the work.

cerimónia de entrega a arquiteta não compareceu como forma de protesto pelo facto de o seu trabalho de coautoria não ter sido igualmente reconhecido. A small sculptural block consisting of 11 copies of the book Having Words, a collection of essays by the architect and urban planner Denise Scott Brown, wife of the architect Robert Venturi, with whom she designed various projects. In 1991, Venturi received the Pritzker Prize. Scott Brown did not attend the award ceremony in protest at the fact that her work as co-architect had not also been recognised.

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista.

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista e

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista.

Courtesy of the artist.

EDP. Courtesy of the artist and EDP.

Courtesy of the artist.


PP. 58-63

PP. 66-67

PP. 70-73

Measuring E1027, 2011

Modern Architecture Without Architects, 2011

Muro, 2017

Acrílico, cadernos manufaturados com capa de tecido

Aço inox polido e livros: Modern Architects (de Henry-

Blocos maciços de betão rosa. Solid blocks of pink

e páginas do livro E.1027 Maison en bord de mer (de

Russell Hitchcock et al., ed. fac-similada, Lisboa: Trienal

concrete.

Eileen Gray e Jean Badovici, ed. fac-similada, Marselha:

de Arquitectura de Lisboa/Babel, 2011; ed. orig., Nova

Dimensões variáveis. Dimensions variable.

Éditions Imbernon, 2006; ed. orig. in L’Architecture

Iorque: MoMA, 1932 – ed. comercial do catálogo de

Coleção da artista. Collection of the artist.

vivante, Paris: Éditions Albert Morancé, 1929). Acrylic,

Modern Architecture: International Exhibition, a primeira

Apoio Support Secil.

handmade notebooks with fabric cover and pages

exposição de arquitetura, comissariada por Henry-

from the book E.1027 Maison en bord de mer (by

-Russel Hitchcock e Philip Johnson) e Architecture

Construída meticulosamente como uma ruína para

Eileen Gray and Jean Badovici, facsimile ed., Marseille:

Without Architects (de Bernard Rudofsky, Nova Iorque:

a exposição, esta obra é uma operação intelectual

Éditions Imbernon, 2006; orig. ed. in L’Architecture

MoMA, 1964). Polished stainless steel and books: Modern

e um exemplo de «des-arquiteturalização», que

vivante, Paris: Éditions Albert Morancé, 1929).

Architects (by Henry-Russell Hitchcock et al., facsimile

tem como referência o projeto pós-modernista

150 × 25 × 600 cm

ed., Lisbon: Lisbon Architecture Triennale/Babel, 2011;

Indeterminate Façade, concebido na década de 1970

Cortesia Courtesy Arratia Beer, Berlim Berlin.

orig. ed., New York: MoMA, 1932 – trade edition of the

pelo grupo SITE (Sculpture In The Environment).

Modern Architecture: International Exhibition catalogue,

Meticulously constructed like a ruin for the exhibition, this

A obra faz referência à arquiteta modernista Eileen

the first architecture exhibition, curated by Henry-Russel

work is an intellectual exercise and an example of “de-

Gray e à Casa E1027 que desenhou para o arquiteto

Hitchcock and Philip Johnson) and Architecture Without

architecturalisation”, which refers to the post-modernist

Jean Badovici, editor da revista L’Architecture

Architects (by Bernard Rudofsky, New York: MoMA, 1964).

Indeterminate Façade project, designed in the 1970s by

Vivante, na qual, em 1929, o projeto da casa foi

23,5 × 21,2 × 32,5 cm

the SITE (Sculpture In The Environment) group.

publicado, tendo posteriormente sido remetido

Coleção Collection Cristina Maya León.

ao esquecimento durante mais de 40 anos. This piece refers to the modernist architect Eileen Gray and to E1027, the house she designed for the architect Jean Badovici, editor of L’Architecture vivante. The house project was published in this magazine in 1929, and then just forgotten for more than 40 years.

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista e

Fotografia Photography Miguel Ângelo Guerreiro. Cortesia da artista

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista.

Arratia Beer. Courtesy of the artist and Arratia Beer.

e Galería Elba Benítez. Courtesy of the artist and Galería Elba Benítez.

Courtesy of the artist.

148 - 149


PP. 74-77

PP. 78-81

PP. 84-85

Biblioteca, 2016-2017

Black Bloc, 2013

Built (looking at Lina Bo Bardi, MASP, S. Paulo 1957-

Estrutura em madeira pintada e rede metálica (a partir

Acrílico, cadernos Moleskine e páginas do livro Demo,

-1968), 2011

das estantes da Sala de Leitura Geral da Biblioteca

Eine Bildgeschichte des Protests in der Bundesrepublik

Aço inox polido e livros de arte. Polished stainless steel

Pública de Évora. Painted wood frame and metal net

(de Nikolaus Jungwirth, Weinheim/Basel: Beltz, 1986).

and art books.

(after the bookcases of Main Reading Room at Évora

Acrylic, Moleskine notebooks and pages from the

130 × 30 × 75 cm

Public Library)

book Demo, Eine Bildgeschichte des Protests in der

Coleção Collection Navacerrada, Espanha Spain.

275 × 855 × 5 cm

Bundesrepublik (by Nikolaus Jungwirth, Weinheim/Basel:

Cortesia Courtesy Galeria Baginski, Lisboa Lisbon.

Beltz, 1986).

A peça escultórica faz referência ao Museu de Arte

285 × 42,5 × 31,5 cm

de São Paulo, desenhado pela arquiteta Lina Bo Bardi

Coleção Collection Roberto Profili, Brasil Brazil.

– uma das raras presenças femininas na arquitetura

A escultura replica a estrutura das estantes da Sala de Leitura Geral da Biblioteca Pública de Évora, onde

da América Latina. Tal como o museu, esta escultura

repousam centenas de livros, aos quais está interdito o

O título desta peça é uma referência explícita aos

eleva-se do nível do chão através de quatros pilares,

acesso direto. Esta obra remete para as várias camadas

grupos «antiglobalização» e «anticapitalismo», cujos

que sustentam no ar o corpo central do volume.

e níveis de conhecimento preservados nos livros

membros, durante as ações de protesto, cobrem de

This sculpture alludes to the Museu de Arte de São

que se encontram adormecidos nas bibliotecas.

preto as suas faces – metáfora de um processo de

Paulo, designed by Lina Bo Bardi – one of Latin

The sculpture replicates the structure of the shelving units

dessubjetivação dos indivíduos, consentâneo com

America’s few female architects. Like the museum, the

in the Évora Public Library’s main reading room, where

as sociedades capitalistas. A peça deixa entrever no

sculpture is raised from the ground by four pillars, which

hundreds of books rest and cannot be directly accessed.

seu interior páginas com imagens de manifestações

support the structure’s central element in the air.

The work alludes to the various layers and levels of

políticas que ocorreram na Alemanha nas décadas de

knowledge preserved in books that lie dormant in libraries.

1960 e 70. The title of this piece is an explicit reference to anti-globalisation and anti-capitalism groups, whose members cover their faces in black during protest actions – a metaphor for a process of the de-subjectification of individuals, consistent with capitalist societies. The interior of the piece offers glimpses of pages with images of political demonstrations in Germany in the 1960s and ‘70s.

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista.

Fotografia Photography Miguel Ângelo Guerreiro. Cortesia da artista

Fotografia Photography Miguel Ângelo Guerreiro. Cortesia da artista

Courtesy of the artist.

e Galería Elba Benítez. Courtesy of the artist and Galería Elba Benítez.

e Galería Elba Benítez. Courtesy of the artist and Galería Elba Benítez.


PP. 86-87

PP. 90-93

PP. 94-95

Double Words, 2011

Architecture, a place for women?, 2016

Brazil Builds, 2015

Aço inox polido e livros: Kunst + Design. Donald Judd,

Aço inox e revistas de arquitetura (Abitare e Domus)

Betão e livro Brazil Builds – Architecture New and Old

Preisträger der Stankowski-Stiftung 1993 (de Donald

cortadas. Stainless steel and cut architecture magazines

(1652-1942) (de Philip L. Goodwin, Nova Iorque: MoMA,

Judd, Todd Eberle et al., Wiesbaden/Stuttgart: Museum

(Abitare and Domus).

1943). Concrete and book Brazil Builds – Architecture

Wiesbaden/Hatje Cantz Verlag, 1993) e Demo, Eine

22 × 420 × 14 cm

New and Old (1652-1942) (by Philip L. Goodwin, New York:

Bildgeschichte des Protests in der Bundesrepublik

Coleção de Arte Fundação EDP. EDP Foundation Art

MoMA, 1943).

(de Nikolaus Jungwirth, Weinheim/Basel: Beltz, 1986).

Collection.

24 × 28,5 × 22,2 cm Cortesia Courtesy Galería Elba Benítez, Madrid.

Polished stainless steel and books: Kunst + Design. Donald Judd, Preisträger der Stankowski-Stiftung 1993 (by Donald

Atuando como um elemento arquitetónico, esta viga,

Judd, Todd Eberle et al., Wiesbaden/Stuttgart: Museum

composta por dezenas de exemplares da icónica

Na sua estrutura, estas obras incorporam os livros que

Wiesbaden, Hatje Cantz Verlag, 1993) and Demo, Eine

revista de arquitetura Abitare, faz parte de uma série de

lhes dão nome e referem-se a publicações icónicas no

Bildgeschichte des Protests in der Bundesrepublik (by

trabalhos em que a artista usa livros e revistas de arte

âmbito da arquitetura modernista. Estas publicações,

Nikolaus Jungwirth, Weinheim/Basel: Beltz, 1986).

e de arquitetura como matéria plástica para as suas

enquanto matéria constituinte da obra, demonstram

20 × 20 × 80 cm. PE EP

esculturas. Como o título indica, a peça questiona o

uma reflexão sobre o campo da arquitetura a partir do

Coleção Collection Apostolatos.

lugar da mulher no território disciplinar da arquitetura,

domínio editorial.

tradicionalmente dominado por homens.

These works incorporate as part of their structure the

Duas publicações colocadas lada a lado: Demo: Eine

Functioning as an architectural element, this girder,

books from which they borrowed their name, in an

Bildgeschichte des Protests in der Bundesrepublik

constructed from dozens of copies of the iconic

allusion to iconic publications on modernist architecture.

(1986), cuja capa mostra um conjunto de manifestantes

architecture magazine Abitare, is part of a series of works

These publications, as constitutive materials of the work,

a ser violentamente atacados por canhões de água

in which the artist uses books and art and architecture

reveal some reflection about the field of architecture from

e o catálogo Kunst + Design (1993), de Donald Judd,

magazines as materials for her sculptures. As the title

the realm of publishing.

cuja típica cor laranja da capa, coincide com a cor da

indicates, the piece questions the place of women within

camisola usada por um dos manifestantes.

the traditionally male-dominated disciplinary territory of

Two publications placed side by side: Demo: Eine

architecture.

Bildgeschichte des Protests in der Bundesrepublik (1986), whose cover shows a group of demonstrators being violently attacked with water cannons, and the catalogue Kunst + Design (1993), by Donald Judd, whose characteristic orange cover matches the colour of the top worn by one of the demonstrators.

Fotografia Photography Miguel Ângelo Guerreiro. Cortesia da artista

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista e

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista e

e Arratia Beer. Courtesy of the artist and Arratia Beer.

EDP. Courtesy of the artist and EDP.

Galería Elba Benitez. Courtesy of the artist and Galería Elba Benítez.

150 - 151


PP. 96-99

PP. 102-103

PP. 104-105

Utopien, 2009

Stones Against Diamonds, 2017

Stones Against Diamonds, after Lina Bo Bardi, 2016

Acrílico, livro e encarte 44 Evaluations (de Enzo Mari,

Aço inox polido e 11 exemplares do livro Stones Against

Acrílico e 1 exemplar do livro Stones Against Diamonds

projeto para a Bienal de Veneza, 1976, in Kursbuch,

Diamonds (de Lina Bo Bardi, col. Architecture Words,

(de Lina Bo Bardi, Londres: Architectural Association

n.º 52, 1978). Acrylic, book and insert 44 Evaluations

Londres: Architectural Association Publications, 2013).

Publications, 2013. Acrylic and 1 copy of the book Stones

(by Enzo Mari, project for the Venice Biennial, 1976, in

Polished stainless steel and 11 copies of the book Stones

Against Diamonds (by Lina Bo Bardi, London: Architectural

Kursbuch, no. 52, 1978).

Against Diamonds (by Lina Bo Bardi, coll. Architecture

Association Publications, 2013).

Dimensões variáveis. Dimensions variable.

Words, London: Architectural Association Publications,

18,3 x 11,6 x 10,5 cm

Cortesia Courtesy Arratia Beer, Berlim Berlin.

2013).

Coleção da artista. Collection of the artist.

18 × 11 × 10,5 cm Coleção da artista. Collection of the artist. Este pequeno bloco escultórico, feito com 11 exemplares do livro Stones Against Diamonds, uma coletânea de textos escritos pela arquiteta Lina Bo Bardi, alude à importância que os meios e as linguagens editoriais têm para a artista na conceção e no desenho do espaço. This small sculptural block, made up of 11 copies of the book Stones Against Diamonds, a collection of texts written by the architect Lina Bo Bardi, alludes to the importance that the publishing media and languages assume for the artist when conceiving and designing space.

Fotografia Photography Miguel Ângelo Guerreiro. Cortesia da artista

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista.

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista.

e Arratia Beer. Courtesy of the artist and Arratia Beer.

Courtesy of the artist.

Courtesy of the artist.


PP. 106-109

PP. 110-111

PP. 114-117

Cuadra San Cristóbal, Luis Barragán, 2017

(Not) Reading Modern Latin American Architecture,

Laboratório de Materiais, 4, 2017

Acrílico e página da revista L’Architecture d’Aujourd’hui.

2013

Conjunto de caixas de contraplacado e materiais

Acrylic and page from L’Architecture d’Aujourd’hui

Aço inox polido e livros: Modern Architects (de Henry-

variados de trabalho e pesquisa. Set of plywood boxes

magazine.

-Russell Hitchcock et al., ed. fac-similada, Trienal de

and various work and research materials.

32,5 × 26 × 10 cm

Arquitectura de Lisboa, Lisboa: Babel, 2011; ed. orig.,

Dimensões variáveis. Dimensions variable.

Coleção da artista. Artist collection.

Nova Iorque: MoMA, 1932 – ed. comercial do catálogo

Coleção da artista. Collection of the artist.

de Modern Architecture: International Exhibition, a

Apoio Support Fundação Eugénio de Almeida.

primeira exposição de arquitetura, comissariada por Henry-Russel Hitchcock e Philip Johnson), Latin

Desenhos, textos, livros, amostras de materiais, provas

American Architecture since 1945 (catálogo da primeira

de cor, testes de escala, organizados em caixas, como

exposição de arquitetura moderna latino-americana,

num laboratório ou arquivo, apresentam-se como

comissariada por Henry-Russel Hitchcock, Nova Iorque:

obra, revelando os processos de criação e tornando-os

MoMA, 1955). Polished stainless steel and books: Modern

acessíveis ao espectador.

Architects (by Henry-Russell Hitchcock et al. facsimile ed.,

Drawings, texts, books, material samples, colour proofs

Lisbon Architecture Triennale, Babel, Lisbon, 2011; orig.

and scale tests, arranged in boxes, as if in a laboratory or

ed., New York: MoMA, 1932 – trade edition of the Modern

archive, are presented as work, revealing the processes of

Architecture: International Exhibition catalogue, the first

creation and making them accessible to the viewer.

architecture exhibition, curated by Henry-Russel Hitchcock and Philip Johnson), Latin American Architecture since 1945 (catalogue of the first exhibition of Latin American modern architecture, curated by Henry-Russel Hitchcock, MoMA, New York, 1955). 4,5 × 47,3 × 30,6 cm Coleção privada. Private collection.

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista.

Fotografia Photography Miguel Ângelo Guerreiro. Cortesia da artista

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista.

Courtesy of the artist.

e Galería Elba Banítez. Courtesy of the artist and Galería Elba Benitez.

Courtesy of the artist.

152 - 153


PP. 154-155

No vocabulário do lucro, não existe a palavra «compaixão», 2008 Frase de John Updike (The Coup, 1978); acrílico sobre parede. Quote from John Updike (The Coup, 1978); acrylic on wall. 54 x 756 cm Coleção da artista. Collection of the artist.

Fotografia Photography António Jorge Silva. Cortesia da artista. Courtesy of the artist.


154 - 155



Fernanda Fragateiro (natural do Montijo, vive e trabalhe em Lisboa) interessa-se por repensar e testar as práticas modernistas através da investigação continuada com base em matéria de arquivo, materiais e objetos. A obra da artista foi exposta no MAAT – Museu de Arquitetura, Arte e Tecnologia (Lisboa, 2017), La Galleria Nazionale d’Arte Moderna e Contemporanea di Roma (Roma, 2017), Fundação Eugénio de Almeida (Évora, 2017), Palm Springs Art Museum (2016), Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa, 2016), CaixaForum (Barcelona, 2016), Orlando Museum of Art (2015), Palais des Beaux-Arts – Beaux-Arts de Paris (2015), Carpenter Center for the Visual Arts, Harvard University (Cambridge, 2015), Krannert Art Museum (Champaign, 2015), CIFO Art Space (Miami, 2014), The Bronx Museum of the Arts (Bronx, 2014), Koldo Mitxelena Kulturunea (San Sebastián, 2014), MUAC – Museo Universitario Arte Contemporáneo (Cidade do México, 2014), Dublin Contemporary 2011 (Dublin, 2011), Trienal de Arquitetura de Lisboa (Lisboa, 2010), Centro Cultural de Belém (Lisboa, 2007), Fundação de Serralves (Porto, 2005). Os seus trabalhos são parte de diversas coleções institucionais e privadas. A artista é representada pelas seguintes galerias: Galería Elba Benitez (Madrid), Arratia Beer (Berlim), Galeria Baginski (Lisboa) e Josee Bienvenu Gallery (Nova Iorque). Fernanda Fragateiro (born in Montijo, based in Lisbon) is interested in rethinking and probing modernist practices, through ongoing research with archival matter, materials, and objects. Fragateiro’s work has been exhibited at MAAT – Museum of Architecture, Art and Technology (Lisbon, 2017), La Galleria Nazionale d’Arte Moderna e Contemporanea di Roma (Roma, 2017), Fundação Eugénio de Almeida (Évora, 2017), Palm Springs Art Museum (2016), Fundação Calouste Gulbenkian (Lisbon, 2016), CaixaForum (Barcelona, 2016), Orlando Museum of Art (2015), Palais des Beaux-Arts – Beaux-Arts de Paris (2015), Carpenter Center for the Visual Arts, Harvard University (Cambridge, 2015), Krannert Art Museum (Champaign, 2015), CIFO Art Space (Miami, 2014), The Bronx Museum of the Arts (Bronx, 2014), Koldo Mitxelena Kulturunea (San Sebastián, 2014), MUAC – Museo Universitario Arte Contemporáneo (Mexico City, 2014), Dublin Contemporary 2011 (Dublin, 2011), Lisbon Architecture Triennale (Lisbon, 2010), Centro Cultural de Belém (Lisbon, 2007), Fundação de Serralves (Porto, 2005). Her work is featured in several public and private collections. Fragateiro is represented by Galería Elba Benitez (Madrid); Arratia Beer (Berlin); Galeria Baginski (Lisbon) and Josee Bienvenu Gallery (New York). www.fernandafragateiro.com

156 - 157


Agradecimentos Acknowledgements Para a For Sofia e o and José Fernanda Fragateiro gostaria de agradecer a todos aqueles que inspiraram, contribuiram e participaram na exposição. Fernanda Fragateiro would like to thank everybody that inspired, facilitated and participated in the exhibition. Andrea Baginski, Ângela Nunes, Anton and Victoria Apostolatos, António de Campos Rosado, António Jorge Silva, Augusto Dju, Carolina Jegundo, Celia Birbragher, Cláudia Manso, Cristina Maya Léon, Daniel Malhão, Elba Benítez, Euridice Arratia, Filipa Oliveira, Filipe Meireles, George Stolz, Gonçalo Bugia, João Maria Trindade, José Fragateiro, José Manuel Navacerrada, José Ramos, Josélia Fragateiro, Luís Fernandes, Luís Raposo Alves, Maria Beatriz Vilhena, Miguel Ângelo Guerreiro, Miguel Mesquita, Nuno Maia Silva, Oleksandr Ivanov, Patrícia Cativo, Pedro Faro, Pedro Letria, Roberto Profil, Rui Devesa, Rui Marianito, Sara Léon, Sara Matos, Tessa Goffin, Vasco Barros, Vítor Vermelhudo, Yarislav Ivanov Um especial agradecimento à equipa do MAAT. A warm thankyou to the MAAT team.


Exposição Exhibition

Catálogo Catalogue

Fernanda Fragateiro dos arquivos, à matéria, à construção

Conceito Concept

from archives to matter, to construction

Fernanda Fragateiro

MAAT, Central 2, 20/06–18/09/2017

Sara Antónia Matos Filipe Meireles

Curadoria Curatorship

Seguros Insurance

Sara Antónia Matos

Innovarisk (Hiscox)

Coordenação curatorial Curatorial

Revisão Proofreading

Sara Antónia Matos

coordination

Carla da Silva Pereira

George Stolz

Tradução Translation

Coordenação editorial Editorial coordination

Lucy Phillips (Kennis Translations)

Nuno Ferreira de Carvalho

Carolina Jegundo Textos Texts

Ana Anacleto Produção Production Patrícia Guerreiro Atelier Studio Fernanda Fragateiro

Design gráfico Graphic design

Apoio à produção Production support

Alexander Ivanov

Patrícia Cativo

Rita Marques

Beatriz Vilhena Carolina Jegundo

Fotografia Photography

Apoio técnico Technical support

Filipe Meireles

António Jorge Silva (vistas da exposição e obras)

Campus

José Fragateiro

Miguel Ângelo Guerreiro (obras)

Pascal Carvalho

Yarislav Ivanov Revisão Proofreading

Versátil Partilha Apoios Support

Carla da Silva Pereira

Conservação e restauro

SECIL

Conservation and restoration

Galería Elba Benítez, Madrid

Tradução Translation

Ana Fryxell

Arratia Beer, Berlim

Lucy Phillips (Kennistranslations)

Carina Fonseca

Galeria Baginski, Lisboa

Susana Pomba

Fundação Eugénio de Almeida, Évora Comunicação Communication

Pré-impressão, impressão, encadernação

Leonor Carrilho

Pre-press, printing, binding Gráfica Maiadouro

Design gráfico Graphic design João Turvo

Tiragem Print run 800 exemplares copies

Produção gráfica Graphic production Logotexto

ISBN 978-972-8909-40-6

Construção Construction Stripeline

Depósito Legal Legal Deposit 00000

Transportes Shipping Feirexpo Cargomix

© das obras reproduzidas, das fotografias, dos textos e das traduções: os autores

Montagem Installation

of the works reproduced, of the photographs,

Artshutle

texts and translations: the authors

Lapsus © desta edição of this edition: Fundação EDP, 2017

158 - 159


MAAT Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia Museum of Art, Architecture and Technology

Fundação EDP EDP Foundation Conservação e Produção

Conselho de Administração

Conservation and Production

Board of Directors

Ana Fryxell

António Mexia, presidente president

Diretor Director Pedro Gadanho

Nuno Alves Produção Production

Miguel Coutinho

João Covita

José Manuel dos Santos

Produção Executiva e Gestão de Parcerias

Suzanne Marivoet

Executive Production and Partnership

Fernando Ribeiro

Management Rita Costa Gomes

Conselho Diretivo Executive Board Miguel Coutinho, diretor geral general manager

Assistência Curatorial Curatorial Assistance

José Manuel dos Santos

Rita Marques

Margarida Pinto Correia

Curadoria, Gestão de Coleção e Publicações

Pedro Gadanho

Curatorship, Collection Management and

Apoio Serviço ao Visitante

Catarina Seixas

Publications

Visitor Service Support

Eduardo Rosa Silva

Ana Anacleto

Ana Cachado

Sandro Fonseca

António Banza Curadoria, Gestão Internacional e Programas

Francisco Barros

Curatorship, International Management and

Beatriz Uva

Programmes Inês Grosso

Apoio Relações Públicas Public Relations Support

Serviço ao Visitante Visitor Service

Maria José Dantas

Raquel Eleutério Apoio Produção Production Support Serviço Educativo Education Service

Matilde Neves

Joana Simões Henriques Estagiários Interns Secretariado de Direção Executive Assistant

Patrícia Guerreiro

Vanessa Pires

João Turvo

Publicações Publications Nuno Ferreira de Carvalho Comunicação Communication Inês Brito Leonor Carrilho Bárbara Martins Carlota Meirelles Matilde Paiva Raposo Elisabete Sá Relações Públicas e Institucionais Public Relations and Institutional Partnerships Filipa Sanchez Coleção e Produção Collection and Production Margarida Almeida Chantre




Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.