G N A R U S | 44
Coluna:
CINEMA, MATERIALIDADE TEXTUAL E HISTÓRIA CULTURAL: ALGUMAS PONDERAÇÕES CRÍTICAS SOBRE A RELAÇÃO HISTÓRIA, CINEMA, PESQUISA E ENSINO. Por: Alexander Martins Vianna
U
m filme está inscrito num processo institucional-social contingente que o torna um efeito, evento e agente necessariamente coletivo, cujos significados, em seu momento de produção e posteriormente podem transcender muitas vezes o intencionado pelo diretor, produtor ou roteirista. Mesmo considerando as novas técnicas de multimídia, que podem fazer a criação de um filme caber num computador pessoal ou tablet, um filme dificilmente poderia ser entendido como o resultado de um trabalho exclusivamente individual, já que a produção de seu complexo afetivo-cognitivo envolve edição, recontextualização ou (re)temporalização de recursos verbais, gestuais-performáticos, sonoros e imagéticos, cada um dos quais sendo polos de sistemas de significados com específicos agentes, recursos, repertórios e tradições estético-expressivas, com os quais se negocia no processo de produção . Por outro lado, os seus significados também são produzidos pelas perguntas que o historiador considera possíveis de um filme responder. Afirmar isso significa igualmente considerar que o filme, a partir da forma material em que se apresenta enquanto resultado para um plano narrativo, também resiste às perguntas do pesquisador, pois, como qualquer artefato sociocultural, possui regularidades
internas inexauríveis. Entendo por plano narrativo, ou narrativa, o(s) princípio(s) orientador(es) da sequência de imagens visuais, textos escritos, falas, performance e sons (verbais ou não) de um filme visando a provocar atenção afetivo-cognitiva sobre suas teses ou temas principais, cumprindo ou não as expectativas habituais de um gênero. Os significados intencionais (e não intencionais) do plano narrativo se expressam por meio da forma final em que o filme se materializa. Daí, considero oportuno dizer que os significados do plano narrativo de um filme dependem de sua materialidade textual. É a materialidade textual que limita as possibilidades de perguntas do historiador à fonte fílmica. Aqui, valho-me de Donald F. Mckenzie que, em meados da década de 1980, expandiu o conceito de “texto” ao retomar a sua base etimológica “tecer”, ou seja, configurar redes de sentido e significados com intenções comunicativas. Nesses termos, o conceito de “texto” estende-se para formas não escritas e nãolibrárias que se inscrevem em (ou propõem) sistemas de significados e, portanto, configuram efeitos comunicativos que transcendem a estrutura estritamente morfológica ou sintática da linguagem. Estão implicados no conceito de materialidade textual: (1) o reconhecimento de que os meios e a forma