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Serra

Esta revista é um suplemento local que integra a edição nº 3608, de 12 de Maio de 2006, do Semanário REGIÃO DE LEIRIA e não pode ser vendida separadamente.

MAIO 2006

ANO 4

Semana Cultural na EBI Págs.6 e 7

A vila na Feira de Maio Pág.8

Nº 40

Onze anos após a sua morte, recordamos (Especial de 17 páginas)

Padre Joaquim Faria 04/12/1917 a 13/05/1995



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PHOTOTECA MENSAL

FORUM

Retratos de um fotógrafo

FICHA TÉCNICA DIRECTOR Francisco Rebelo dos Santos DIRECTOR-EXECUTIVO Pedro Costa

ÍNDICE Tasquinhas na Loureira .................. 5 Semana Cultural na EBI........... 6 e 7 A nossa vila na Feira de Maio ......... 9 Vale Tacão visita a capital ............. 10

CONSELHO DINAMIZADOR David Vieira Fausto Neves Jaime Silva Joaquim Rodrigues Jorge Primitivo José Augusto Antunes José Carlos Rodrigues TEXTOS e PAGINAÇÃO Amândio Santos FOTOGRAFIA Amândio Santos e Foto Antunes PUBLICIDADE Lídia Órfão Tereso PATROCINADORES PERMANENTES Construções J.J.R. & Filhos, S.A. LubriFátima MaiaPerfil - Matalomecânica, Lda. Lena Construções JRP/TPB Casa Costa Clinifátima Iriamédica IMPRESSÃO Mirandela SA TIRAGEM 3000 exemplares Esta revista é um suplemento local que integra a edição n.º 3608, de 12 de Maio de 2006, do Semanário REGIÃO DE LEIRIA e não pode ser vendida separadamente.

Especial: Padre Faria .................... 11 Vida e Obra ............................12 e 15 10 Retratos.............................18 e 27 Agenda Maio/Junho ...................... 29 Académicos ................................... 30 Site ................................................ 31

Participe A sua opinião conta. Agora a VOZ DA SERRA disponibiliza um endereço de correio electrónico que pode usar para nos fazer chegar as suas opiniões, notícias e impressões. O endereço é: vozdaserra@regiaodeleiria.pt Mantemos ainda em funcionamento um Ponto de Apoio ao Leitor na Papelaria Bemposta, no centro da vila de Santa Catarina da Serra. Porque a participação activa dos nossos leitores é essencial, tem duas plataformas possíveis de colaboração. Queremos ouvi-lo sobre os assuntos que gostaria de ver abordados, para enriquecer esta publicação, podendo ainda abordar outras questões que considere pertinentes.

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Há rostos e retratos que fazem parte do imaginário público de uma comunidade. São rostos que marcam, ou marcaram, a história comum, pessoal e social e que pela sua genuinidade deixam bem vincado o seu nome nas tábuas da história de cada sociedade. A nossa terra conheceu e deu-se a conhecer a um rosto durante mais de meio século. Com o desaparecimento fisico desse rosto, ficam os retratos que ele próprio “fotografou”, e ficam sobretudo, os retratos que cada um de nós foi gravando na pelicula da sua memória. O fotógrafo faleceu. Faleceu com ele um senhor muito cortês. Cortês e não só. Foi há precisamente onze anos, que a freguesia de Santa Catarina da Serra deixou de contar com a presença física do seu “Senhor Prior”. A freguesia ficou com certeza mais pobre. Perdeu provavelmente nesse dia 13 de Maio de 2006 quem melhor conheceu a freguesia em todo o século XX, e além da perda religiosa, a freguesia perdeu nesse dia uma figura até um tanto ou quanto carismática, um rosto respeitável, um homem de cultura, de uma austeridade a toda a prova, além claro das virtudes religiosas que os seus paroquianos afirmam não esquecer. No décimo primeiro aniversário da morte de Joaquim Carreira Faria, Padre, Prior de Santa Catarina da Serra, a revista presta a sua singela homenagem, recordando a sua vida e obra, as suas virtudes, e também os seus defeitos, tudo contado por quem muito conviveu com ele, e dessa forma, bem o conheceu... Nota: Nesta edição não publicamos as rubricas “Avós da Serra” e “Made in Serra”, devido à pertinência e importância do tema especial que publicamos. Estas rúbricas voltarão na próxima edição.

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Serra ABERTURA


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Serra ABERTURA

Fim-de-semana em grande, com muitas actividades

Tasquinhas na Loureira As tasquinhas na Loureira realizaram-se nos dias 21, 22 e 23 de Abril. Com um programa muito preenchido, esta festa supera já em grande escala o conceito normal de tasquinhas. Depois de na sexta a festa ter começado com música e animação própria desta aldeia, o sábado começou cedo com a realização de um passeio de automóveis velhos, em provas de perícia numa gincana no local da feira. À noite um jantar aconchegou o estômago destes automobilistas todo o terreno, seguido do arraial. No domingo, último e grande dia do evento, a manhã começou com a missa, celebrada pelo ainda Bispo Diocesano, D. Serafim, eucaristia animada pelo coro do Centro de Dia

da Loureira, ensaiados pelo Sr. José Gonçalves. A seguir à missa realizou-se o muito esperado passeio de bicicletas antigas de alavanca. O Bispo não faltou a esta prova e também ele pedalou pela aldeia, lado a lado com o Américo Vieira, histórico ciclista desta terra. Deste passeio resultou a ideia de criar um clube de bicicletas antigas, ideia apadrinhada pelo Bispo, que aguarda agora um enquadramento jurídico apropriado para que se insira na ADSL da Loureira, após a necessária alteração dos estatutos. À tarde realizou-se um passeio de motas velhas, muito participado e sonoro, com os escapes das motorizadas a dar o tom da festa. Mais à noite cada um dos participantes recebeu uma lembrança em pleno

palco das festas. Segundo Jorge Gameiro, presidente da associação da Loureira, este evento “correu bem, o tempo ajudou bastante, ao contrário do que aconteceu em anos anteriores. Este ano, adulterámos um pouco o ambiente das tasquinhas pois o bufete funcionou na cave do nosso salão. Ao nível de lucros, estima-se que o saldo deste evento esteja próximo dos 5 mil euros”. E recordou: “Para o ano há mais, e esperamos, ainda melhor…”

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Serra EDUCAÇÃO

10º Aniversário da EBI e Semana Cultural A Escola Básica 1,2,3, hoje Básica Integrada de Santa Catarina da Serra, iniciou a sua actividade lectiva no ano de 1995/96. Não tendo um início fácil dada a presença de três colégios em Fátima, cada um com o seu prestígio, ano após ano, graças a projectos educativos dinâmicos, abertos e inclusivos, a EBI, ao comemorar os seus dez anos, constitui-se , já, como alternativa prioritária para os alunos oriundos das freguesias de Santa Catarina e opção para muitos alunos das freguesia da Chainça e Arrabal. Tornada sede do Agrupamento das Escola e Jardins da Serra em 1999, tendo por base um Projecto Educativo comum que formaliza e objectiva as intenções e as acções da política educativa e curricular para todo o Agrupamento, assente em três pressupostos fundamentais: - Escola para todos; - Escola aberta à comunidade; - Opção por um currículo integra-

do (que não se esgota nos conteúdos curriculares disciplinares), A EBI, apesar de ainda menina, projecta, com sorriso e esperança, o seu futuro. Esta esperança alicerça-se no esforço e dedicação das partes que constituem a comunidade educativa e local numa convergência de ideias e projectos, de modo a que cada um se orgulhe do seu papel.

Semana cultural A semana cultural, que decorreu de 2 a 5 de Maio, constituiu-se como ponto alto da comemoração dos dez anos da EBI. Nesta, tiveram lugar um leque de actividades onde destacamos a sessão protocolar, com a inauguração do auditório e a abertura da exposição dos trabalhos dos alunos do Agrupamento, a visita de estudo a Óbidos e Caldas da Rainha, a criação de espaços lúdicos e pedagógicos para os alunos do pré-

escolar e 1º ciclo do Agrupamento, uma sessão prática do projecto ”Vamos parar com isto” do Governo Civil, uma tarde desportiva e, para encerrar, um espectáculo de “Chuva de Estrelas” , com alunos, além das tasquinhas dos pais e doces dos alunos a servirem alguns dos condimentos e doçarias da região. Decorreu também durante toda a semana uma feira do livro. O Conselho Executivo quer expressar o seu orgulho pelo modo como decorreram as diversas actividades e aproveitar para agradecer a todos os intervenientes a participação na construção desta semana cultural. Esta só foi possível, graças ao dinamismo e empenho de muitos, desde o pessoal docente, não docente, passando pelos alunos, Pais e Encarregados de Educação. Queremos também abranger nestes agradecimentos a Câmara Municipal e as Juntas de Freguesia de Santa Catarina da Serra e Chainça.

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Serra EDUCAÇÃO

Abertura Solene da Semana Cultural No dia 2 de Maio realizou-se a cerimónia solene de inauguração do novo auditório da EBI, ao mesmo tempo que se deu inicio à Semana Cultural do Agrupamento de Escolas e Jardins da Serra. Estiveram presentes como convidados altas individualidades, entre as quais, o Governador Cívil de Leiria,

dois deputados da Assembleia da República, representantes da CAE, os elementos da Junta de Freguesia, autarcas e ex-autarcas. António Reis abriu a sessão, apresentou os convidados, agradeceu as presenças e apresentou um filme sobre a história da escola. Dos discursos proferidos saliente-se o desafio feito por Lino

Pereira para que se continue a centralizar a educação das nossas crianças, na EBI, o que obrigaria à construção de um novo edificio. José Manuel Silva respondeu ao desafio lembrando o muito que tem sido feito na última década. Seguiu-se uma visita à exposição e uma pequena refeição.

Projecto “Vamos parar com isto” O Governo Civil de Leiria preocupado com a grande sinistralidade existente nas estradas de todo o País, em parceria com a Direcção Regional de Educação do Centro, leva a efeito uma campanha dirigida para a comunicação social e para os estabelecimentos de ensino do distrito cujo lema se intitula “Vamos parar com isto”. A Escola Básica Integrada aderiu de imediato a este projecto que se desenvolve no 3º período, em duas componentes, a teórica a ser ministrada nas aulas de Formação Cívica para as turmas dos 2º e 3º ciclos e uma prática . Assim, na passada sextafeira, 5 de Maio, a partir das dez horas, os alunos, devidamente acompanhados e

orientados pelos agentes da Escola Segura e pela GNR, tiveram ocasião, de numa pista criada para o efeito, circular em situações reais, com mini carros puxados a pedais, e com a existência de sinais de trânsito e peões, de constatar que a maioria dos acidentes se deve à má condução dos condutores que não respeitam as regras de condução. Foi sem dúvida uma jornada pedagógica e instrutiva a merecer os elogios e a pedir continuidade.

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Iniciativa da Junta, divulga colectividades

A Vila na Feira de Maio A Vila de Santa Catarina da Serra está representada na Feira de Maio de Leiria. A iniciativa partiu da Junta de Freguesia, em consonância com as nossas colectividades, que assim poderão expor a um público mais alargado o muito que as associações locais fazem pela nossa terra. Cada uma das doze colectividades ficou responsável por dinamizar este espaço durante cerca de dois dias, segundo um calendário aprovado por todos nas reuniões de preparação. Os primeiros cinco dias estiveram a cargo da UDS e do CAASCS, que decoraram o espaço com as cores destes clubes, videos de jogos e passeios, e os mais importantes troféus conquistados pela UDS nos seus quase trinta anos de vida. No dia da abertura, os três elementos da Junta de Freguesia fizeram as honras da casa à comitiva de ilustres visitantes, entre eles o Governador Civil e a Presidente da Câmara Municipal de Leiria, entre muitos outros aultarcas. De referir que a nossa freguesia, e a freguesia da Barreira são as únicas que apostaram neste tipo de presença na feira. A “barraca” tem sido ponto de para-

gem obrigatória para todos os transeuntes conterrâneos, mas também para aqueles que tendo nascido cá, vivem noutras freguesias ou na cidade de Leiria, que perguntam como evoluem alguns aspectos da vida desta terra. Para responder de forma mais concreta a estas questões estão a ser distribuídas na feira, as últimas edições da revista Voz da Serra. A procura às revistas tem sido grande, pelo que esta edição terá uma publicação de mais 500 exemplares. Se é santacatarinense e ainda não visitou o “nosso” stand na feira de Maio,é tempo de sair de casa dar um pulinho ao nosso stand na feira... UDS / CAASCS: de 29/4 a 3/5. CASA DO POVO: 4 e 5 RANCHO S. GUILHERME: 6 e 7 ACR VALE TACÃO: 8 e 9 CAÇADORES DA SERRA: 10 e 11 ADS LOUREIRA: 12 e 13 ACR SOBRAL: 14 e 15 AGRUP. ESCOLAS: 16, 17 e 18 ESCUTEIROS / C SOCIAL: 19 e 20 BOMBEIROS DA SERRA: 21 e 22

Pontos fortes e fracos Para quem não conhece Santa Catarina e acaba de receber esta revista, será interessante que se apresente aqui um ligeirissimo levantamento dos pontos fortes e fracos, das luzes e das sobras, das virtudes e dos defeitos desta vila, à beira Fátima plantada. Sem querer ferir qualquer susceptibilidade, e procurando ser rigoroso e imparcial no ponto de vista, aqui segue uma (muito incompleta) lista: Sinal mais para: Zona desportiva da uds: É a menina dos olhos da freguesia, ainda não está concluída e já é local de encontros de lazer de muitos conterrâneos. Associações locais: Discute-se por vezes se são muitas ou se são demais. Ainda assim, são antes de tudo o resto, prova do muito dinamismo do cidadão comum. Em Santa Catarina, por cada centena e meia de habitantes há uma associação. Tecido empresarial: São o motor de quase tudo o que esta terra produz, económica, cultural e até socialmente. Um tecido empresarial que cresceu junto e que estabeleceu ligações fortes entre empresas. Sinal menos para: Estradas e sinalização: Muito tem sido feito, mas muito mais há a fazer. Urge alargar certas estradas para peregrinos e para o mior número de pessoas que passeia a pé. A sinalização rodoviária parece por vezes errada, outra vezes abandonada. Consciência histórica: É urgente discutir em conjunto acerca do valor dos prédios antigos, habitações ou edificios públicos. Aprendamos com os erros e não nos obriguamos um dia a voltar a pôr “a torre“ torre como ela era há 40 anos... Consciência ambiental: A vila foi poupada dos fogos no Verão passado. Ter bombeiros bem equipados é bom, mas bons caminhos e limpezas florestais em locais estratégicas são fundamentais para evitar o pior...

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Antes de inaugurar o seu polidesportivo de ar livre

Vale Tacão visita pontos turísticos da capital O Centro Cultural e Recreativo do Vale Tacão realizou uma excursão a Lisboa no domingo, dia 30 de Abril. Participaram cerca de meia centena de pessoas, que assim ficaram a conhecer melhor vários locais turísticos da capital. O roteiro da viagem arrancou com uma visita guiada ao Palácio da Ajuda, que encantou os participantes pela sua beleza e pelos ricos adornos presentes nas muitas salas visitadas. A esta visita seguiu-se outra à Torre de Belém, local histórico privilegiado à beira Tejo plantado. Para o almoço que se seguiu, o local escolhido foi o parque do Alvito, sitio muito apropriado para o efeito. Mais para a tarde, o autocarro conduziu os participantes para o

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Parque das Nações onde cada um pode escolher o melhor ambiente para passar o tempo. A maior parte visitou pela primeira vez o Casino de Lisboa, recentemente inaugurado, e que era alvo da curiosidade de muitos. Segundo Nelson Santos, presidente desta associação, a excursão foi um sucesso já que “o clima esteve óptimo para este tipo de passeio”, salientando igualmente que “poderíamos até ter levado dois autocarros, visto que muitos interessados em participar já não encontraram vaga neste autocarro. Para esses haverá futuras oportunidades…” Nelson Santos, revela que está a ser preparada a inauguração do polidesportivo de ar livre. Inicialmente prevista para o dia 14 de

Maio, a data foi entretanto alterada para a tarde do dia 28 de Maio. “Estamos a preparar um mini-torneio de futsal para essa tarde, para o qual iremos convidar equipas da freguesia a participar. Todo o programa deste evento será divulgado em tempo oportuno.”



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Nascimento e Infância

Padre Joaquim Carreira Faria Vida e Obra

Joaquim Carreira Faria nasceu no dia 04 de Dezembro de 1917 na aldeia do Alqueidão, nesse tempo freguesia e paróquia dos Pousos, hoje freguesia e paróquia da Boavista. O ano em que nasceu ficou para a história como o ano das Aparições de Nossa Senhora em Fátima, mas há época, o que mais marcava as pessoas era a febre “pneumónica” e dizia-se à época que todas as mulheres que se encontrassem grávidas nesse ano morreriam e levariam junto o seu feto. Não aconteceu com a Dona Cândida que por diversas vezes na sua vida recordou que o parto do seu filho Joaquim fora o mais fácil dos sete que suportou. Talvez porque nasceu pequeno e frágil, cerca de um mês

antes do previsto. Seu pai era natural da Caranguejeira, e antes de casar teria sido negociante de madeira, aqui na região e em Lisboa. Consta que fora num dia muito fraco de negócio, em que a noite caíra, ficando toda a madeira por vender, que levando à cabeça preocupada a sua mão, lhe vieram logo, agarrados aos dedos, uma boa porção de cabelos, início de uma calvície que haveria de se revelar hereditária. Do seu pai haveria de herdar não só o nome (Joaquim) como também a calvície em tenra idade. Seu pai deixou a madeira quando casou com sua mãe, dedicando-se à agricultura na quinta que a sua mãe herdara. Estranhamente o seu último nome (Faria) pertencia à sua mãe, o que também acontece com quase todos os seus irmãos, sem que para isso apareça qualquer razão lógica. Precisamente no dia em que nasceu, o colégio dos Cardeais aprovou a restauração da Diocese de Leiria, que o Papa Bento XV criou por bula de 17 de Janeiro de 1918. Joaquim Faria cumpriu o ensino primário na escola Primária de Santa Eufémia, na Quinta do Sirol. Ali estudou sem que tenha perdido qualquer

ano, e revelando muita aptidão para o cálculo mental, além de ser igualmente bom nas outras disciplinas. A sua infância foi igual à dos catraios do seu tempo. Sem liberdade para ir brincar nos casais vizinhos, brincava com as irmãs e com os filhos dos trabalhadores da quinta da sua família. Brigava com os outros garotos e beneficiava por ao contrário dos seus adversários, nunca ter andado descalço, o que servia de desculpa para os outros que normalmente perdiam. A fraqueza da nascença tinha sido ultrapassada e o rapaz cresceu forte e desembaraçado. Consta que ainda criança brincava com as suas irmãs às missas. Sempre com muito respeito, fazia por vezes de padre, distribuindo pedaços de pão e uvas pelas crianças presentes. Era já um sinal da vocação que sentia e do desejo de entrar no seminário. Foi o que aconteceu pouco tempo depois de terminar a instrução primária. Pediu ao seu pai a autorização necessária para se inscrever. Pedido aceite, entrou no seminário em Outubro de 1931. Uma irmã sua seguiu também a vida religiosa, tomando hábito nas Irmãs Dominicanas, onde ainda se encontra. Quando chegou a idade de ir à tropa, seu pai então já pessoa muito conceituada, foi pedir ao inspeccionador, seu amigo pessoal, para que o jovem seminarista não perdesse um ano nos serviços militares. Terminou os estudos no Seminário em Julho de 1942.

Ordenação e Missa Nova O diácono Joaquim Faria foi ordenado presbítero no dia 12 de Julho de 1942 na capela das Confissões do Santuário de Fátima. Presidiu a esta cerimónia o Bispo da Diocese de Leira D. José Alves Correia da Silva e serviu de mestre-de-cerimónias o Vice-reitor do Seminário Monsenhor Manuel Marques dos Santos, natural do Vale Tacão, nessa data com 52 anos de idade. O Cónego Formigão assistiu a

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esta cerimónia. Foram também ordenados presbíteros nessa cerimónia António Afonso Calado, Manuel da Silva Gaspar e Manuel dos Santos Craveiro, natural da nossa freguesia. A sua missa nova realizou-se uma semana depois da ordenação e teve lugar na capela da Boavista. O pregador desta missa foi o P. Dr. José Fernandes de Almeida e a seguir à missa houve “Te-Deum” e bênção com Santíssimo Sacramento. (Voz do Domingo, 19-08-1942)

De Coadjutor a Pároco Precisamente um mês depois de ter sido ordenado sacerdote, tomou posse como coadjutor na paróquia de Santa Catarina da Serra. A sua ida para esta freguesia terá sido aconselhada por Mons. Marques dos Santos ao Bispo. Anos mais tarde o Monsenhor haveria de confidenciar que procurou entre os seus alunos seminaristas aquele que mais condições teria para ajudar e substituir o seu “velhinho” pároco, Prior Joaquim Gonçalves das Neves. Foi este “fulanico” seminarista que despertou na mente do professor para liderar o futuro da sua paróquia. Durante cerca de três anos confioulhe tarefas especiais, experimentou-

lhe o feitio e fidelidade e rezou por ele. (Luz da Serra, Junho 1995) A sua vinda para Santa Catarina deu-se quando tinha 24 anos. Foi acompanhado por sua irmã Maria Cândida, mais velha do que ele. O Prior Neves, vivia a doença e a velhice da sua muita idade. A sua memória estava bastante afectada e a suas capacidades de trabalho pela paróquia eram já bastante reduzidas. O jovem P. Faria encarregou-se durante quase seis anos, tanto da assistência ao seu pároco, como ao trabalho na paróquia. Consta que teve o mérito de se adaptar sem problemas aos hábitos e tradições da paróquia. O Prior Neves faleceu no dia 3 de Janeiro de 1948, e o Padre Faria foi nomeado Pároco de Santa Catarina da Serra no dia 27 de Fevereiro de 1948.

Registos da altura afirmam que esta freguesia se situava entre as ribeiras de Sirol e as Cortes. Segundo os Censos a freguesia tinha ao início da década de 40, 3 310 habitantes e 861 fogos. A freguesia crescia a um ritmo bastante elevado. Durante a década de 30, a população aumentou em cerca de 500 pessoas. Da década de 20 até à de 30 o mesmo crescimento. Antes disso, crescimentos mais baixos na ordem da uma ou duas centenas. Nessa década na freguesia existiam já fábricas de cerâmica, lagares de azeite, fábricas de cerâmica, de carpintaria e de serralharia, além do que, a agricultura era actividade que ocupava todas as famílias. Foi no final desta década, em 1949 que se festejou o quarto aniversário da criação da freguesia, pelo primeiro Bispo de Leiria, D. Frei Brás de Barros. A Igreja matriz, antiga capela de invocação de Santa Catarina, é de

A Freguesia que conheceu A freguesia de Santa Catarina da Serra nos anos quarenta era composta por 24 lugares. Era como sempre foi pertencente ao concelho, distrito e bispado de Leiria. Militarmente pertencia à Terceira região militar e ao 7º distrito de recruta e mobilização, com sede também em Leiria. Tinha um posto de correio central em Santa Catarina e postos de correio secundários no Casal da Estortiga, na Chainça, Gordaria, Loureira, Olivais e Vale Sumo. Tinha um posto de registo civil.

Nesta página em cima Foto do dia da ordenação, ao lado do seu pai Gravura da Igreja de Santa Catarina da Serra(década de 30) Fotografia da Igreja (década de 50) Na página anterior: Pai, irmãos e cunhado (foto tirada pelo P. Faria) Alunos do Seminário (assinalados o P. Faria e o Mons. Marques dos Santos)

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Serra ESPECIAL uma só nave, com um altar-mor e três laterais. A Igreja que ele conheceu tinha o adro murado, e também já tinha o arco à frente na entrada, que foi construído em 1940. O fervor religioso, aliado aos tempos áureos da Estado Novo e dos movimentos civis/religiosos que envolviam a mocidade. Ao pároco era confiado o poder religioso e não só. Os párocos tinham deixado de ser autarcas por obrigação legal em 1910, mas a tradição atribuía ainda ao pároco o poder de decidir e de orientar junto com as juntas de freguesia, os destinos da autarquia. O poder de resolver os problemas jurídicos e sociais estava entregue ao regedor, na altura um homem da Pinheiria, aos cabos de ordens, um por cada ramo da paróquia. Também neste poder a voz do pároco era soberana na resolução de rixas e de problemas com extremas de terras, entre outros. (Dicionário Chorográfico, 1940 e Domingos Marques, 1997)

Obra e legado Durante várias décadas organizou retiros e colónias de férias na Praia do Pedrógão, que levavam as crianças e adolescentes da paróquia a viver quinze dias de diversão e crescimento. São muitos os relatos de casos interessantes vividos nestas colónias, tanto das crianças como dos animadores que o ajudavam. Deu continuidade à Peregrinação paroquial a Fátima na Festa da Ascensão, realizando por mais de 50 vezes esta tradição religiosa que no fim deste mês se realizará novamente. Organizou, escreveu e encenou várias peças de teatro, com actores cá da terra. Os relatos destas peças contam sobretudo a adesão que este tipo de eventos tinham nessa época, apesar das dificuldades por exemplo sonoras causadas pela falta de microfones. Esteve intimamente ligado à criação da Via-Sacra entre os Olivais e o Santuário de Fátima, trabalhando em conjunto com a Paróquia de Peniche que ofereceu as pedras e o Santuário. Escreveu e realizou esta Via-Sacra durante quase vinte anos, sempre no 1º Domingo da Quaresma. Foi Vigário da Vara e dedicou-se tam-

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bém ao serviço do Santuário de Fátima, doando o seu trabalho na organização do serviço de confissões, nas Peregrinações Aniversárias. (Voz da Fátima, 13/06/1995) Em 1973, ainda durante o Estado Novo, e quando, na freguesia, a emigração para França e a guerra colonial em África levava os jovens a deixar a sua terra, criou o jornal Luz da Serra com o objectivo primordial de levar as noticias a estes que estavam longe. O primeiro número foi publicado em Janeiro de 74. Foi director deste jornal até ao dia da sua morte, e contribuiu para o sucesso do seu jornal com interessantes artigos que escrevia e assinava primeiro com o “Senhor Cortês” e depois com o “Fotografo”. Viajou algumas vezes para o estrangeiro e foi recebido por grupos de emigrantes da nossa terra em vários países. Em 25 de Dezembro de 1980 foi-lhe confiada interinamente durante alguns meses a paróquia da Atouguia. É também reconhecida a importância que o P. Faria teve no aparecimento da UDS, tendo sido ele quem incentivou o presidente da Junta dessa época a construir um campo de futebol para que a rapaziada não “fugisse” para outras freguesias. Nem sempre foram consensuais as suas ideias, e nem sempre foram pacíficas as suas acções, mas uma vida inteira de serviço gratuito, vivendo na austeridade e na pobreza, sempre na mesma residência, mantendo também na pobreza e até na necessidade sua irmã, que o serviu até ao dia 3 de Dezembro de 1993, foram exemplo e são um legado importante de obediência e coerência com o puritanismo bíblico.

Bodas de prata A festa das Bodas de Prata Sacerdotais e Bodas de Prata da sua entrada na Freguesia realizou-se no dia 6 de Agosto de 1967. A festa decorreu em jeito de homenagem, com triduo preparatório em todas as capelas da paróquia nos dias antes, e com missa, sessão solene de cumprimentos e ofertas e terminou com um jantar. Estiveram presentes várias autoridades, o Sr. Governador Civil de Leiria e o presidente da Câmara Municipal de Leiria.


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Serra ESPECIAL A Eucaristia começou às 15 horas e foi celebrada pelo homenageado, com a ajuda de Mons. Marques dos Santos que conduziu a homilia, nesta altura com 75 anos. Na sessão solene houve lugar a discurso, recitação de poemas por elementos representativos de toda a comunidade paroquial, e oferta de recordações, flores e várias salvas de palmas. (Voz do Domingo, 20/08/1967)

Ficou sepultado no cemitério paroquial, por vontade própria expressa em carta das “últimas vontades” segundo consta por desejar “ressuscitar de onde pudesse ver a torre da sua igreja”. Esteve presente uma multidão de pessoas de toda a diocese que assim, uma vez mais lhe prestou aquela que afinal, não foi a última homenagem…

Bodas de Ouro A festa das Bodas de Ouro Sacerdotais e Bodas de Ouro da sua chegada a Santa Catarina realizou-se no dia 12 de Julho de 1992, na igreja Paroquial. Cocelebraram com ele, o Bispo D. Serafim e alguns padres naturais desta freguesia, entre eles o P. Manuel dos Santos Craveiro, celebrando também as suas Bodas de Ouro. A igreja engalanou-se para prestar esta homenagem. Nos discursos, o Padre Faria confessou-se ao seu povo: Se hoje fosse jovem, queria ser padre, e se me deixassem escolher, escolhia Santa Catarina da Serra”. Palmas e cânticos animaram a tarde, eternizada pelo descerrar de uma placa comemorativa, junto à entrada da igreja. Discursos e ofertas, saliente-se a fotografia emoldurada de corpo inteiro que a paróquia lhe ofereceu. Era conhecido de todos e é facto unânime que até mesmo nesta fase da sua vida, sabia os nomes (e até alcunhas) de toda a gente da freguesia. Conhecia esta terra como poucos a terão conhecido ao longo de toda a História.

Morte e Funeral O Padre Faria faleceu na casa onde sempre viveu, a cerimónia fúnebre realizou-se na igreja onde sem celebrou e foi sepultado no cemitério que sempre visitou. Consta que teria manifestado o desejo de morrer no dia das Aparições de Fátima, e no mesmo dia em que a sua mãe tinha falecido. Tal desejo se concretizou e após vários anos de doença e várias intervenções cirúrgicas, faleceu no dia 13 de Maio de 1995, no leito da sua cama. A missa foi presidida pelo Bispo D. Serafim, co-celebrada por mais de 70 sacerdotes e dois bispos eméritos, D. Alberto e D. Américo Henriques.

NOTA: Algumas confidências sobre a infância e a vida do P. Faria foram feitas pelas suas irmãs, sobretudo pela irmã Joaquina que vive ainda na casa onde ambos nasceram, e que no dia seguinte à nossa conversa festejou os seus 92 anos de idade (ao meio).


Onze anos ap贸s a sua morte, recordamos (P谩gs. 11 a 24)

Padre Joaquim Carre 04/12/1917 a 13/05/1995

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Fotografia emoldurada oferecida pela Par贸quia de Santa Catarina da do Padre Joaquim Carreira Faria, Pastor desta comunidade durante


eira Faria

a Serra, nas Bodas de Ouro Sacerdotais mais de cinquenta anos.

Foto gentilmente cedida por:

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“Servo inútil” por Pe. José Augusto

«Qual de vós, tendo um servo a lavrar ou a apascentar gado, lhe dirá, quando ele regressar do campo: ‘Vem cá depressa e senta-te à mesa’? Não lhe dirá antes: ‘Prepara-me o jantar e cinge-te para me servires, enquanto eu como e bebo; depois, comerás e beberás tu’? Deve estar grato ao servo por ter feito o que lhe mandou? Assim, também vós, quando tiverdes feito tudo o que vos foi ordenado, dizei: ‘Somos servos inúteis; fizemos o que devíamos fazer.’» (Lc 17, 7-10) Esta passagem do evangelho de S. Lucas sempre me intrigou… À primeira vista, parece rebaixar todos aqueles que fazem da sua vida uma entrega total e completa à vontade de Deus. Sermos chamados “servos inúteis” não parece ser grande título de honra. Mas, segundo as Palavras de Jesus Cristo, é… Aquilo que retenho do Pe Faria não será muito diferente da grande maioria dos seus paroquianos. Recordo um homem com uma personalidade forte e bem definida, que se manifestava na forma como celebrava a Eucaristia ( o seu tom de voz, a forma ligeiramente curvada às palavras da consagra-

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ção…), como fazia a preparação para festa da Profissão de Fé (exame doutrinal nos bancos do antigo salão…), como nos cumprimentava na rua (só com 2 dedos, pois os outros seguravam o molho das chaves…), etc. Pessoalmente, recordo muito bem a forma como me acolheu quando lhe pedi ajuda para redigir a carta dirigida ao Sr Bispo para poder entrar no Seminário. “Então, rapaz: o que é que tu queres ser quando cresceres?” Tímido mais que a conta, com 12/13 anos, respondi, meio a tremer: “Não sei bem, sr prior! Se calhar,… pedreiro, como o meu pai…” Apesar das minhas dúvidas existenciais, lá me esclareceu, ajudou a fazer a carta e eu entrei… Um outro momento que jamais esquecerei foi quando o fui visitar ao Hospital de Coimbra, nos seus últimos

meses de vida. Intrigou-me a forma como falou repetida e convictamente do futuro, apesar de ser evidente que o seu fim não poderia estar longe. “Nas próximas férias do verão, marcamos um dia e vamos passear…” Incapaz de compreender a gravidade da sua situação? Desejoso de nos confortar? Sinal de força interior e apego à vida que ainda lhe restava? Não sei…talvez de tudo um pouco. Aquilo de que tenho certeza é que o Pe Faria foi para mim o exempo de alguém que se gastou ao serviço de uma comunidade cristã chamada Santa Catrina da Serra. Aos maus, o tempo encarrega-se de os fazer esquecer; aos bons, torna-os ainda melhores… Servo inútil…? Quem me dera que também eu, como ele, o fosse…


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O Senhor Padre Faria por Domingos Marques Aceitei falar sobre o Senhor Padre Faria. O Senhor Prior, como ele tanto gostava de ser tratado. Conheci-o quando eu tinha 13 anos de idade e foi por sua mão que entrei para o Seminário de Leiria. Nem sempre estive de acordo com ele. É verdade, mas sempre me mereceu o maior respeito e admiração e sempre me respeitou muito bem. Foi descendente de uma família humilde, como ele sempre quis ser, mas um cidadão que tudo sabia, tudo conhecia. O seu relacionamento com a paróquia e os paroquianos foi excelente. Exerceu o seu múnus sacerdotal num

período muito difícil para a sociedade civil, quando predominava a falta de emprego, dinheiro, os fluxos da imigração, ou da guerra colonial. Quando me candidatei pela primeira vez a presidente de Junta de Freguesia esteve ao meu lado e no desempenho das funções sempre me respeitou como autarca. Quando nos encontrávamos o nosso cumprimento era assim: Sr. Presidente!... Senhor Prior!...selado com um cordial aperto de mão. Colaborei com ele no boletim paroquial Luz da Serra, que ele fundou com três empresários da freguesia, em 101 textos utilizando o pseudónimo de DOMAR e acompanhava de perto os artigos de opinião que ele também escrevia. São textos inigualáveis ditados por um intelectual e de alto significado histórico, político e filosófico. Aproveitava as coisas de um nada, utilizando um vocabulário muito seu, para fazer um Retrato (nome do artigo) para dele fazer uma história, para dar um conselho e para exprimir um ensinamento religioso, doutrina e sacramento e até por vezes para enviar uma critica ou avaliação política dos governantes e governados e até partidária. Foi um mestre na escrita e no saber.

Nunca se envergonhou de ser padre e um dia escreveu: o padre deve ser mesmo padre e parecê-lo em toda a banda (vid. Retrato de Julho 1990). Nunca usou roupas furta-cores, gravatinhas, nem camisolas de gola alta, sapatos de todo o terreno, calças de abertura ou cintos de vista. O cabeção e a batina eram distintivos de filosofia, sapatos de fivela para os dias grandes e tricórnio (barrete eclesiástico) para as cerimónias; casaco preto chegado aos joelhos, para a cidade. Foi um homem que todos nos habituámos a respeitar, mesmo nas grandes diferenças e onde iam derramar as nossas intimas confidências, nas suas mais secretas lágrimas, que tudo sabia e que tinha o direito de tudo ensinar, de penetrante lucidez e grande sensibilidade religiosa, as suas emoções obedeceram cegamente à sua grande força de vontade, ao seu carácter de homem consagrado a Deus, ao ser fervor apostólico e de sacerdote. Era vê-lo na igreja, nos trabalhos paroquiais ou na oração e não abandonava o confessionário. Foi assim para mim o senhor Padre Faria.

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“Que o seu exemplo frutifique” por Pe. Nuno Filipe, O.H. Pediram-me que desse o meu testemunho sobre o saudoso Padre Joaquim Carreira Faria, que sacrificou a sua vida de sacerdote quase toda ao serviço da freguesia de Santa Catarina da Serra. Escrevo estas linhas singelas. Gostaria que tivessem ressonância positiva em todas as pessoas que as lessem. Por isto: O padre Faria, como todos simplesmente lhe chamávamos, merece de facto um elogio profundo. Viveu o seu ideal de sacerdote com muito entusiasmo. Amava a sua freguesia com grande sentimento de verdadeiro amigo das suas gentes. Contaram-me que já próximo do fim da sua vida teve esta expressão: “Quando for sepultado no nosso cemitério paroquial, quero ficar com o rosto voltado para a nossa igreja”… Sim, o P. Faria tinha uma fé profunda e prática. A devoção ao Santíssimo Sacramento estava bem vincada no seu espírito. A celebração da Santa Missa constituía uma vivência espiritual que irradiava das suas palavras e dos seus gestos. Esta fé ser o seu maior sermão. Sim porque uma fé sem obras é morta, como diz o apóstolo S. Tiago na sua Carta. (Tg. 2, 17). Era cheio de zelo pela catequese. Assisti a algumas reuniões suas com as crianças, sobretudo na altura em que estavam a preparar-se para a Comunhão Solene. Era muito acolhedor com as pessoas. Estendia o seu zelo para além da sua paróquia. Durante algum tempo. Não sei bem quanto, ajudou no Santuário de Fátima. Na procissão anual que a freguesia costuma fazer a Fátima, lá estava ele em primeiro plano, para servir e

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animar. Era muito austero. Vivia pobremente, podemos dizê-lo, sem receio de errar. Para conseguir servir melhor, fundou o jornal “Luz da Serra”. O número de Abril é já o 381, neste que é já o XXXIII de existência deste mensário. Desde o inicio, convidou-me para colaborar. Aceitei com gosto e não me lembro de ter faltado algum mês. O P. Faria tinha uma maneira de escrever bastante correcta e até atraente. Se alguma vez “pisava” regras

de gramática era certamente por estar cansado. Felizmente, o jornal não morreu com ele. O seu sucessor, o P. Mário Verdasca pegou-lhe com força e ele, o jornal, continua de boa saúde. E o seu director também. Deus o conserve. Aqui fica o meu testemunho. Que o seu exemplo frutifique em bênçãos para a nossa querida freguesia de Santa Catarina da Serra.


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Luz da Serra, uma vitória de todos por João Dias O Padre Faria não terá sido um homem de grandes obras mas criou algumas coisas que para o seu tempo podemos considerar – inovadoras. Por exemplo, proporcionou-me a mim e a muitos como eu, o primeiro contacto com o mar, na colónia de férias no Pedrógão. Mas o que me leva a escrever algo sobre o nosso “Sr. Prior” pois era assim que todos o “tratávamos” - foi um desafio que travámos juntos e que considero não só uma vitória de ambos mas de toda a freguesia – o nascimento da “Luz da Serra”. Permitam-me desde já alguma imodéstia mas apenas pretendo partilhar convosco factos que realmente aconteceram e poderão eventualmente ter algum interesse. Na minha opinião estes foram alguns aspectos muito importantes que contribuíram para o nascimento da “Luz da Serra”. -A disponibilidade do Padre Faria. -A dedicação e entrega ao projecto do sr José Ruivo. -O entusiasmo e alguma irreverência dos meus 16 anos. Apesar de o nº1 da Luz da Serra ter saído em Janeiro de 1974, já há alguns anos se falava em criar um boletim informativo na nossa freguesia, ideia que eu abracei desde inicio e que ganhava sempre algum entusiasmo no Verão com a visita dos nossos emigrantes que sentiam a necessidade de lá longe receberem notícias da sua terra natal - tal como os soldados no ultramar - só que o projecto ia sendo adiado porque as reuniões realizadas nesse sentido, principalmente com os estudantes mais velhos da freguesia - centravam-se em

questões que tinham mais a ver com a criação de um jornal nacional - quando o que os nossos emigrantes e soldados queriam - era apenas saberem as noticias da nossa terra - e ai… como eu os compreendia. - Também eu me tinha sentido um emigrante quando aos dez anos pela mão do padre Faria ingressei no seminário. Ninguém imagina a emoção que sentia todas as semanas quando nas páginas do “O Mensageiro “ ou “Voz do Domingo” eu lia as notícias da minha freguesia Mas para meu desgosto o projecto ia sendo adiado. E quando no Verão de 1973 durante as “Festas Grandes” sou abordado mais uma vez pelo sr. Prior com a questão do jornal eu, então já com 16 anos, apesar de sentir a mesma vontade de sempre, respondi-lhe com alguma dose de provocação: - “que estava farto de promessas e que já não acreditava no projecto”. Um pouco incomodado lá me respondeu muito à sua maneira : - “Então, então… rapaz de pouca fé…” e lá seguiu o seu caminho. Decorria o mês de Setembro quando, (inesperadamente) me chega às mãos um “cartão-convite” para uma reunião a realizar em Santa Catarina, - no 1º Domingo de Outubro (se a memória não me atraiçoa).- Não mencionava qual a razão do convite, mas vinha assinado pelo padre Faria. Só na dita reunião é que tive a certeza de que o tema a abordar era a criação do jornal e foi ali que também tive conhecimento que o Padre Faria pedira ao Sr. José Ruivo - que me fizera chegar o convite - para não me informar sobre a razão do encontro para me confrontar com o efeito “surpresa”. Estavam ali as principais “figuras” da nossa freguesia, pessoas com provas dadas em muitas áreas mas um jornal era algo diferente. Se por um lado me senti ali um pouco deslocado (era o mais jovem) por outro sabia que era um convidado “especial” do padre Faria – pois toda aquela gente ali estava para apoiar um projecto do qual eu era talvez o maior entusiasta. E foi naquela tarde que se deu o 1º grande passo para o nascimento da nossa “Luz da Serra”. Ficou decidido que o Jornal ia ser uma realidade e que o nº 1 sairia em Janeiro de 1974. Foi escolhida a direcção: a Director o

Pároco - Padre Faria; Administradores: Sr: José Ruivo e Sr. Vieira Rodrigues. O logotipo foi sugerido pelo Francisco enfermeiro. É claro que no final da reunião tive que “gramar”com as provocações do padre Faria que estava visivelmente satisfeito mas a minha alegria não era menor. E fui para casa já com a cabeça a dar azo à minha imaginação e a idealizar o artigo que haveria de sair no 1º jornal com o título – “Grande Jornal”. Seguiram-se tempos de grande azáfama pois era preciso pôr a máquina a funcionar e o tempo escasseava. Se não me engano apenas recebemos um texto - da professora Alzira dos Olivais. O meu artigo também estava pronto, tal como as notícias de desporto que tinham ficado à minha responsabilidade para além de outras informações úteis. O padre Faria teve que se preocupar com o restante conteúdo do jornal, enquanto o Sr. José Ruivo teve a cargo toda a logística necessária. Foram necessários dois longos serões nas recentes e modernas instalações do nosso administrador Sr: Vieira Rodrigues para dobrar, selar e colocar os endereços nos boletins que seguiram para todos aqueles conterrâneos que viviam fora da Freguesia. O mais importante estava feito, nascera a “Luz da Serra”.

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Recordando com verdade por Maria da Conceição Eu era uma criança de dez anos quando o P. Faria entrou nesta paróquia como coadjutor do P. Neves. Era o senhor prior muito debilitado, velhinho, coradinho e baixinho, que todos respeitavam muito. O P. Faria, seu último coadjutor serviu a paróquia praticamente sozinho durante quatro anos, pois o P. Neves começou a deteriorar-se-lhe a saúde. Dizia o P. Faria, que se agarrou aos homens, alguns já anciãos, mas todos de boa reputação e vida cristã, para o ajudarem a introduzir nas boas tradições e costumes da vida paroquial. Não queria alterar nada que afectasse o bom ritmo do seu pároco e ele estava vivo e ali na paróquia. Referiu-se muitas vezes à sua sobrinha e companheira da vida sacerdotal D. Maria Pereira das Neves, que mais tarde veio a casar com o José Mariano, era uma senhora piedosa, simples, alegre e atenta, e muito sábia das coisas de Deus e da Igreja. Dizia o P. Faria, que ela muito o ajudara naqueles primeiros anos. O P. Neves, pouco tempo depois da chegada do coadjutor que ele antevia ser seu sucessor, dizia com a graça que lhe era peculiar que tinha que ser assim. Era Joaquim, e por conseguinte o terceiro pároco com este nome. A casa onde o P. Faria ficou a viver com sua irmã Cândida não fora feita para residência, mas serviu para ambos até à morte. Nunca se ouviram queixas sobre a falta de condições, e de facto, não eram muitas. O P. Neves, puxava o cordão da campainha e ao ser atendido fazia o pedido de o ajudar a ir ao cemitério, o que acontecia a seguir. Isto repetia-se com muita frequência. Ao chegar a casa o bondoso velhinho já não se lembrava e o P. Faria, ao despedir-se, ouvia de novo o pedido “Vá comigo ao cemitério”. Claro,

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que naquele dia não se repetia mas no dia seguinte fazia parte do programa. A via-sacra era feita pelos dois mesmo fora da Quaresma. Na catequese com as crianças ou nos encontros da cruzada eucarística rezava-se sempre pelo senhor prior. Quando estava próximo mesmo de morrer disse-me a mim e a mais duas meninas que saíamos da igreja para irmos ver o senhor prior e rezar por ele. Fui sozinha e encontrei lá de pé, rezando, Monsenhor Marques dos Santos, que depois falou baixinho assim: “Mais umas horazitas e está no céu”. Nunca me esqueci, e ele também não. Menciono o brio que o P. Faria usou para celebrar a festa aniversária das Bodas de ouro Sacerdotais do seu velhinho pároco, e sei de cor o poema que ele lhe escreveu para eu recitar. O mesmo poema foi recitado por outra menina nas Bodas de Ouro Sacerdotais do P. Faria. O que escreveu há 50 anos para o seu antecessor estava actual para ele.

Finalmente adormeceu no Senhor o P. Neves e pouquíssimo tempo depois é nomeado pároco, o já integrado na paróquia P. Faria. Fê-lo Mons. Marques dos Santos na Igreja repleta de povo entoando cânticos religiosos. De Sr. P. Faria passou-se sem esforço nem incómodo de parte a parte a “senhor prior”. E, sem poder a todos como sempre aconteceu, começou a sua vida de pároco sem alterar ao seu ritmo muito do que já vinha fazendo. Nas primeiras sextas-feiras e primeiros sábados, ou vésperas de festas, uma hora antes da missa o confessionário já funcionava porque não havia outra hora

livre em certas épocas agrícolas. Nestes dias era frequente a igreja encher-se e não faltavam jovens, rapazes e raparigas de toda a paróquia. Nestes dias mal tinha tempo para comer, queixava-se a sua irmã Maria Cândida. Tinha que haver a reunião dos préjacistas e das pré-jacistas, dos adolescentes na mesma linha, Benjaminas e Cadetes que depois aos 14-15 anos transitavam à JAC- Rapazes e JACFRaparigas e ainda os organismos adultos homem e senhoras do mesmo movimento Acção Católica, que tinha as reuniões gerais sempre ao Domingo. Tudo isto era ao Domingo depois da missa das almas com meia hora de sol e de missa de dia, que salvo erro era por volta das 10 horas. Depois da oração do terço realizavam-se o ensaio de cânticos bem como os baptismos. Com 3 e 4 reuniões ao Domingo, missas e outros sacramentos, e atendimento inesperado de pessoas. Era mesmo extenuante o trabalho pastoral e dizia-se na Diocese que Santa Catarina da Serra dispunha de gente para tudo nos serviços diocesanos. Como ocupação para jovens e também um pouco de cultura o P. Faria escreveu várias peças de teatro que ele depois levava à prática ensaiando os jovens rapazes, à noite, à luz do candeeiro de petróleo. As moças tinham o ensaio ao Domingo à tarde ou quando possível depois das missas. A paróquia e pároco eram elo de ligação e ajuda, respeito e confiança admiráveis. Os homens começaram a emigrar. Com esta saída a cruz do pároco associada à de tantas mães e filhas, agora sem a presença dos pais. Os riscos da viagem, os pedidos de apoio para conseguir emigrar não dispensavam tantas vezes a intervenção do pároco junto de autoridades e instâncias governamentais. Reunia os emigrantes em férias e visitou-os em França, algumas vezes. Mas estes ajudaram a renovar a igreja, edifício que ficou belo e durou até à presente tarefa de reparação e arranjo. Gostava de organizar passeios e tinha muito jeito para tal. Era culto e viajar com ele era regressar mais enriquecido. Tinha como todos os humanos as suas limitações, defeitos próprios das qualidades, como por exemplo, a falta de paciência com tudo o que lhe chei-


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Serra ESPECIAL rasse a exibição, vaidade, gabarolice, esbanjamento, egoísmo, falta declarada de bom senso. A sua fidelidade à igreja nunca foi desmentida, sofreu por isso e por muitos outros ossos do oficio. Nunca ninguém o ouviu queixar-se do seu povo nem dizer mal da paróquia.Acima de tudo sentiu-se sempre padre para servir a todos a tempo inteiro. Rápido na assistência aos doentes que pediam sacramentos. Houve doentes a quem levava a santa comunhão pelo menos uma vez por semana durante anos. Se alguém, e a toda a hora acontecia, batia à porta lhe pedir o sacramento do perdão, ele respondia sempre afirmativamente. Celebrou em sua casa enquanto pode “pestanejar”. Não tenho a certeza se foi na última, se na penúltima Semana Santa antes de morrer, os confessores que prometeram vir confessar num determinado dia faltaram, e as pessoas estavam tristes. Um homem foi ter com o Sr. Padre Faria que estava com vários tubos dos tratamentos a que estava a ser sujeito e contou-lhe o que se estava a passar. Ele disse-lhe “vá lá chamar as pessoas que eu confesso aqui até poder”. Ali, na cozinha de sua casa, naquele estado atendeu cerca de 75 pessoas. Ouvia, pouco dizia e absolvia. Veio o primeiro Domingo da sua última Quaresma. Das obras que realizou a via-sacra entre os Olivais e Fátima amava-a do fundo da alma, sempre numa união e amizade com o Santuário de Fátima. Todos os anos escrevia uma via-sacra diferente. Escreveu tanta coisa e não guardou nada, não dava valor à sua pessoa. Na última via-sacra, antes da sua morte, o Sr. Padre Faria impossibilitado de participar, estava em sua casa embrulhado a um cobertor, estando junto à lareira, o seu pensamento estava naquela via-sacra. A certa altura e quebrando um silencio impressionante, levantou a cabeça e disse: “Já vêm ao Joaquim da Avó“. Levantou-se a cambalear e foi até a janela do então seu escritório, escutando à distância as vozes da via da cruz que se aproximava. Rezou deixando cair as lágrimas até ao chão, e soluçou, quando ouviu o Senhor Reitor do Santuário falar dele e por ele pedir ao Senhor. Já sem conseguir falar muito, fazia

de vez em quando pedidos, um dos que mais guardo gravado foi este “Sejam bons para o futuro pároco” Valeu para as poucas pessoas que ouviram, o que só Deus conhece, avalia e conduz. Estava a sofrer muito, mas serviu de escola para outros saberem sofrer. Uma das suas frases que não mais profundas era “Só é rico o padre que vive pobre”. Há vidas que o melhor de si, é aquilo que ninguém é capaz de dizer ou escrever. Durante o seu mais duro sofrer, fui por obediência e consciência cristã, todos os dias e às vezes mais do que uma vez, porque sua irmã velhinha não podia ir buscar o que necessitava e pedia-me pelo telefone. Ía visitá-lo e prestar ajuda. Custava-me muito ouvi-lo exclamar pelo nome de sua irmã e companheira de mais de 50 anos que falecera pouco tempo antes. “Ai a minha querida irmã Maria”. Fazia-lhe falta. Muito devoto da Nossa Senhora, faleceu no dia 13 de Maio, tal como sua mãe. Balbuciou comigo as últimas jaculatórias com que se desprendeu do mundo e entrou no convívio eterno. Esta minha presença nos duros momentos de tanta dor e manifestação de amor à paroquia, não foi de forma cristã vista por todos, mas fiquei compensada com um muito obrigado pela ajuda dada ao Sr. Prior, pronunciado pelo nosso Bispo Sr. D. Serafim. Que mais nos pode interessar do que prestar um serviço desinteressada à Igreja e ser reconhecida pelo seu maior representante entre nós? Não há vida sem história, nem história bela sem dor. A vida continua para os que estão a olhar por nós no céu, e a sorrir vamos caminhando e sofrendo também ao seu encontro. Que esta verdade se não apag ue em nós.

Um amigão por José Ruivo

Não me encontro ainda capaz de dizer muito. A doença deixoume assim. Mas dá-me para dizer como disse o Senhor Prior de S. Mamede, Pe. Ramos. “Era um amigão, o Pe. Faria”. Acima de tudo era “Padre”. Muito simples, alegre e de uma enorme seriedade. Contas certas e em dia era coisa igual a ele. Soube trabalhar e sofrer pela igreja, e para a igreja. Cuidadoso com a vida de piedade das pessoas e sempre disponível. Sofria calado. Era inteligente, esperto e honesto. Não se preocupava muito que houvesse quem não gostava dele, porque não era essa a sua motivação de viver. Era uma pessoa sempre disponível para os sacramentos ou outras atenções solicitadas, e eram muitas. Rezava e apelava à oração. Conhecia todos pelo seu nome, e eu gostava de ter, como ele, jeito para não me deixar envolver em cantigas. Parece que ele via as pessoas por dentro. Apreciei sempre a forma como ele gostava dos colegas, e a forma como ele fazia com gosto a “Luz da Serra” a luz por Ele. Deu-se todo até ao fim e deixou-me muitas saudades.

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Sr. Prior... Para sempre! por Maria da Nazaré G. G. Cristo Quando me pediram um testemunho sobre a vida do Sr. Padre Joaquim Carreira Faria, apercebi-me da importância do que me estavam a pedir. Confesso que vacilei em escrever estas linhas porque tenho a certeza que tudo o que disser não chegará para lhe prestar a devida homenagem. Era um Homem muito bom, muito humilde, sempre presente quando precisavam dele, sem hora marcada para nos servir, durante mais de cinco décadas na nossa freguesia, dia e noite para quem o chamasse. Era padrinho do meu irmão mais novo, o Francisco Gomes Gonçalves, falecido em Angola. Lembro-me que os meus pais decidiram pôr-lhe o nome de Joaquim. Mas, segundo o que a minha mãe me contou, o Sr. Prior preferia que ele tivesse o nome do pastorinho de Fátima e que, ao proferir estas palavras, referiu, com um sorriso, que se ele fosse Joaquim, as pessoas iriam chamá-lo de «Esquim»! E assim ficou «Francisco», como o pastorinho. Talvez porque ele próprio gostasse de ser Pastor. E, na minha opinião, o melhor pastor para conduzir o seu rebanho até Deus. Era amigo de toda a gente. Os idosos, nunca os esquecia! De tantas memórias que tenho, não posso deixar de partilhar convosco uma que me marcou muito! Já na última fase da sua vida (recordo-me da sua cor facial que já demonstrava sinais de debilidade física!), veio visitar, pela última vez, a minha mãe que se encontrava acamada já há algum tempo. Com a sua boa disposição, ainda lhe perguntou: «Então? Como vai? E o seu menino (referindo-se ao meu irmão Augusto), visita-a muitas vezes?». Ao que ela respondeu com uma gargalhada, conti-

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nuando numa conversa bem disposta. E era assim o Sr. Prior, até mesmo nos momentos mais difíceis, de trabalho e de doença. Pouco tempo depois faleceu. Eu e a minha irmã São nem sabíamos como dar a notícia à minha mãe, com receio da sua reacção. Mas, para nosso espanto, quando lhe demos a notícia, ela respondeu serenamente: «Um Santo! Está no Céu!» Mas também não esquecia os mais novos. Como catequista, lembro-me da sua presença constante em todas as actividades possíveis naquele tempo, em que ainda demorávamos uma hora a pé até Santa Catarina da Serra. Fizesse chuva ou sol, de dia ou de noite, o Sr. Prior acompanhava e ajudava sempre, em tudo o que precisávamos. Os meus filhos sempre o respeitaram, como crianças, adolescentes e,

ainda hoje, se lembram e falam do Sr. Prior com muito carinho. Da Colónia de Férias na Praia do Pedrógão, lembro-me de os meus filhos me contarem que alguém, num dos saraus depois do jantar, lhe perguntou se o Sr. Prior saberia responder à seguinte adivinha: «O que faz um piolho na cabeça de um careca?». Com uma gargalhada, o Sr. Prior respondeu que desconhecia a resposta. «Patinagem artística!» era a solução que gerou a alegria e as gargalhadas da pequenada que ele tanto gostava de ver à sua volta. Muito mais haveria para escrever, mas vou terminar dizendo que, para mim, o Sr. Prior Joaquim Faria era tudo o que se espera de um Pároco. Deixou a sua terra e dedicou-se de corpo e alma aos seus paroquianos. Tenho a certeza que, de onde está, ainda hoje olha por nós! Um muito obrigado, Sr. Prior!


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Padre Faria... por Manuel da Costa e Silva Quando veio para a nossa freguesia, e creio que poderá ser testemunhado pelas pessoas que à altura, andavam pelos 20 anos, foi como um desejado que veio substituir o “sr. Prior velho“, o Sr, Padre Neves. Acompanhou os tempos áureos da Acção Católica, organizou teatros e récitas, enfim pôs toda a juventude em acção, provocando uma participação activa de todos os cristãos da nossa paróquia.

Foram feitas reparações de vulto na igreja paroquial e em algumas capelas. Era o reflexo da força e entusiasmo da sua juventude. De muito cedo granjeou a confiança dos seus paroquianos, o que vezes lhe trouxe alguns dissabores. Sei que quando se apercebia de famílias em grande dificuldade, as socorreu monetariamente. Como sempre tive uma grande à vontade com ele, ao fazer-lhe certos reparos, argumentava: “O que é que queres, não fui ensinado assim, e não consigo mudar”. Recordo que o casamento dos meus pais foi dos primeiros, senão o primeiro que ele fez, baptizou-me a mim e ao meu irmão, foi meu padrinho do crisma, casou-me um filho e baptizou alguns dos meus netos. Disse-me algumas vezes que nunca dormia a cesta. Sempre que comia e podia, dava o seu passeio até ao cemitério a ler ou rezar o breviário. Uma expressão que usou

algumas vezes, quando notava o meu afastamento da igreja, “ ó Neca, quanto menos se come, menos vontade se tem de comer “. A ele se deve a vigília de Nª Sª da Conceição no dia 8 de Dezembro e a Via Sacra nos primeiros domingos da Quaresma dos Olivais para a Fátima, entre muitas outras que fazem parte do calendário da nossa paróquia. Quando no seu leito da morte, contou-nos que “dantes eu ia a pé celebrar a missa à Chainça, e passava de madrugada pelos carreiritos do Vale Maior, e para poupar, só acendia o luso-cu onde não conhecia e por vezes debaixo de tempestades. Ao ver a cara de pena dos que estávamos, disse ”não tenham pena de mim, porque nessa altura eu tinha só 26 anos”. Foi sempre conservador, poupado e não se conseguiu habituar à evolução dos tempos. Depois de 50 anos a servir este povo, muito se pode recordar dele.

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O que recordo do Padre Faria por David Filipe das Neves Recordando o Sr. Padre Faria, recordo com especial carinho uma das actividades que ele ajudava a desenvolver, as representações e o teatro. Lembro-me que tomei parte em varias representações. Uma delas era da vida de Santa Catarina, nossa padroeira. Esta representação envolvia bastantes pessoas e fez-se no adro da igreja, a assistência era muita e não cabia no salão. No dia 3 de Dezembro de 1962 representámos uma peça de teatro sobre as Aparições de Fátima. Nesta peça eu fazia o papel de pároco de Fátima, e vesti a batina do P. Faria. Poucos dias depois, o Padre Faria ofereceu-me uma fotografia com a parte da peça em que eu fazia uma entrevista aos pais dos três videntes de Nossa Senhora. Ainda hoje guardo essa fotografia. Outras peças de teatro que me lembro terem sido ensaiadas pelo P. Faria e que eu participei foram o “Bruxo em calças pardas” e o “Bucha e estica”. Participei em muitas outras peças, mas já não tenho presente na memória os nomes delas. Guardo no entanto na minha mente a imagem do salão sempre cheio de povo para as ver. Todas estas peças eram iniciativas do Sr. Padre Faria, que ensaiava à noite, durante a semana, depois de todos terem tido um dia de trabalho. Uma boa parte dos actores não tinha sequer a quarta classe, mas no dia da apresentação tudo corria invariavelmente bem. Viajei várias vezes na sua companhia, trabalhei com ele em vários movimentos, na minha juventude, e mesmo ao longo de toda a minha

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vida. Foi também o P. Faria que celebrou a missa do meu casamento, já lá vão mais de 50 anos. Eu reparava que quando ele sabia que um paroquiano estava mal de saúde vinha logo visitá-los e fazia sempre o necessário para lhe ministrar o último sacramento. Organizava as festas na igreja e nas capelas, e a seguir à missa da festa e ao almoço tinha sempre tempo para estar à conversa com as pessoas na

festa. Sempre me dei bem com ele, mas sempre que eu e outros da minha idade estávamos em desacordo com ele, acerca dos bailes, ou acerca de outras coisas, sempre fui muito frontal com ele, e ele sabia aceitar isso e por vezes até mudava de opinião quando nós lhe explicávamos as nossas razões. No final da sua vida sofreu muito e eu admirava-o porque não era amigo de se queixar.

Nota Final e Agradecimentos A selecção das pessoas que foram convidadas a comentar a vida e a obra do P. Faria foi feita segundo o critério simples de que tenham reconhecidamente convivido com ele uma boa e importante parte da vida de ambos. Sabemos que muitos outros conterrâneos poderiam ter apresentado também os seu testemunho com casos certamente interessantes. Alguns outros conterrâneos foram convidados a participar com o seu testemunho, mas por razões várias, não se mostraram-se disponíveis para tal. Além das nove pessoas que colaboraram com o seu testemu-

nho, prestaram importante colaboraçao neste trabalho alguns conterrâneos, dos quais saliento Luciano Antunes que cedeu uma boa parte das fotos publicadas neste especial. Agradecimento especial também ao sobrinho Agostinho do P. Faria que cedeu também algum material de muito interesse, e a três irmãs do P. Faria que depois de uma longa conversa sobre o irmão, pousaram para uma fotografia em frente da casa onde todos nasceram. Agradecimento também ao Seminário Diocesano, ao Jornal Mensageiro, ao Jornal Voz do Domingo.


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Foi sempre um bom amigo por António Vieira Rodrigues

Conheci o nosso falecido pároco, Joaquim Carreira Faria, bem jovem quando este me acompanhou na minha Comunhão Solene. Ao longo do tempo em que convivi com ele,

achei-o um homem determinado, frontal, bom professor e um amigo, não dispensando de ter um temperamento rijo, penso que tinha um bom coração. Acompanhei-o enquanto fui Presidente da Junta de Freguesia, defendendo eu os interesses da sociedade, defendendo ele os interesses da Igreja. Sempre existiu um óptimo relacionamento. Notei nele, uma pessoa que nunca se recusou a visitar os mais pobres da freguesia Embora tempos mais magros, recordo-me de algumas atitudes dele, de ajuda aos mais pobres e o perdão do pagamento de algumas obrigações paroquiais cujas atitudes eu fui testemunha. Foi com ele que eu e outro colega fundámos o Jornal Luz da Serra, com bastante sacrifício em serões

prolongados, que eram preparados cerca de 2000 exemplares que eram enviados às nossas ex-colónias e aos nossos emigrantes espalhados pelos diversos continentes. Confesso que era com grande sacrifício que naquele tempo o jornal era feito, mas sempre saiu no devido tempo, onde ele deu provas de interesses pela freguesia. Na parte das obrigações de Pároco, penso que, para aquela época, não encontraríamos pessoa mais dedicada. Rondando o meio século de vida activa ao serviço da Paróquia, conversou comigo sobre a sua pretensão de ser sepultado nesta freguesia. Assim se fez. Foi bom amigo. A terra lhe seja leve.

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Serra AGENDA

Muitos eventos na vila em Maio e Junho

Inaugurações, passeios e festas... Maio Sábado dia 13 Campanha Limpar a Serra do Agrupamento de Escuteiros 1211 Domingo dia 14 Passeio pedestre da Casa do Povo pelos caminhos da freguesia

Inauguração do Polidesportivo no Vale Tacão com tasquinhas e torneio quadrangular entre Vale Tacão, Sobral, Siróis/Quinta da Sardinha e Cercal.

Junho

Domingo dia 21 Encontro de Coros na Casa do Povo

Domingo dia 4 Festa do Espírito Santo (Festa do Pão). Actuação dos Coros da Casa do Povo

Domingo dia 28 77ª Peregrinação paroquial a Fátima (Festa da Ascensão)

Sábado dia 10 Feriado Nacional Final da Taça Distrital no Estádio

Municipal Dr. Magalhães Pessoa entre as equipas UDS vs Biblioteca Domingo dia 11 Cortejo de oferendas da Associação dos Bombeiros da Serra. Quinta Feira dia 15 Convívio no Parque de Merendas Fim de Semana dias 17 e 18 6º Passeio do Clube de Automóveis Antigos, desta vez com destino ao litoral Norte do País. (Dormida em Espinho) Domingo dia 18 Festa do Santíssimo (Primeira Comunhão) Dia do Sócio no Rancho Folclórico de São Guilherme Domingo dia 25 Audição do Projecto de Intervenção Musical da Casa do Povo Dias 29, 30, 1 e 2 (Julho) Festa de São Pedro na Associação Cultural e Recreativa do Sobral, recuperando uma tradição antiga desta aldeia.

Jovens nascidos em 1966 No próximo mês de Agosto realiza-se a Festa do Sagrado Coração de Jesus e seria bom que todos participassem na organização, mesmo aqueles que não tendo nascido cá, fazem parte da paróquia, ou que, sendo de cá, estão fora. Está agendada a próxima reunião para o dia 27 de Maio às 21:30 no salão paroquial. Para mais informações contacte: Armando Vieira: 919 107 041 ou a Milita: 917 540 975. Anuncie os eventos culturais aqui enviando-nos os dados para:

vozdaserra@regiaodeleiria.pt

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Serra ACADÉMICOS

Um pouco de saúde... por Sónia Gonçalves Silva* A preocupação com aspectos como os níveis de colesterol no sangue, a pressão arterial, a alimentação saudável, tornou-se uma constante. Este facto está associado ao aumento da prevalência de doenças cardiovasculares. Torna-se importante, por isso, uma compreensão geral sobre esta problemática. Neste artigo, é focado, essencialmente, o papel do colesterol. O colesterol é uma substância que o organismo utiliza para diversos mecanismos fundamentais, como a produção de hormonas e vitaminas, a formação dos sais biliares (necessários na digestão das gorduras), ou mesmo a construção das paredes das células. Provém não só da alimentação, como também é produzido pelo fígado. Quando em “excesso” no sangue o colesterol torna-se um potencial perigo para a saúde. É um dos três principais factores de risco controláveis para a doença das artérias coronárias (artérias que irrigam o coração) e de outros órgãos. A hipertensão (pressão arterial elevada) e o tabagismo são os outros factores de risco mais importantes. O excesso de colesterol no sangue leva à formação de placas de gordura no interior das artériasaterosclerose, diminuindo o seu calibre e dificultando, deste modo, a circulação do sangue e consequente transporte de oxigénio e nutrientes ao órgão, principalmente durante o esforço, altura em que as necessidades das células são maiores. O resultado final deste processo de aterosclerose vai depender das artérias mais afectadas. Se ocorrer ao nível do cérebro pode levar a AVC (acidente vascular cerebral- famosa “trombose”). Ao nível do coração pode levar a angina de peito ou a enfar-

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te do miocárdio co). Este últiquand o ç ã o

(ataque cardíamo ocorre há obstrutotal à passagem do s a n g ue,

levando à morte de células. Se for ao nível dos membros inferiores pode haver claudicação intermitente (dor ao nível das pernas ao andar). Grande parte destas complicações que surgem precocemente em indivíduos em idade média, podem ser prevenidos através de um controlo adequado dos níveis de colesterol no sangue, dos valores de pressão arterial e por parar de fumar.

O valor ideal de colesterol total num adulto saudável é inferior a 200 mg/dL, havendo um aumento do risco cardiovascular quanto maior for este valor ou quanto maior for o número de outros factores de risco associados (hipertensão arterial, tabagismo..). Outro valor mais preciso a ter em conta é LDL/HDL, que deve ser inferior a 3. Estas são as duas formas de colesterol do organismo (LDL-“mau” e HDL-“bom”) e é o equilíbrio entre as duas que constitui um maior ou menor risco para o indivíduo. Apesar de haver uma importante componente genética, é possível, em parte, controlar estes valores. O aumento do HDL é conseguido através do exercício físico e a diminuição do LDL, essencialmente, através da redução da ingestão diária de gorduras, pr i nc ipa l mente, saturadas (carnes gordas, manteiga/banha..) e alimentos muito ricos em colesterol (gema de ovo, manteiga) sendo, por vezes, necessário recorrer a medicamentos. É indiscutível todo o benefício adquirido com a adopção destas e outras medidas (como diminuição da ingestão de sal, parar de fumar, etc)! Esta mudança de atitude representa uma forma de redução significativa de morte e invalidez tão prevalente na nossa sociedade que, no fundo, depende apenas de força de vontade! *Estudante Finalista do Curso de Medicina, em Lisboa, residente na Loureira


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Serra SITE

Empresa de imagem e publicidade está internet

www.ples-publicidade.com O design criativo e a força das imagens são o rótulo deste site tão completo quanto interessante, não fosse este site o espaço cibernético da empresa que tem tomado conta da imagem de tantas empresas na nossa vila e da nossa região. A descrição cronológica do aparecimento e evolução da empresa, e sobretudo um vasto portfólio, ilustrado com imagens dos trabalhos realizados pela empresa nos vários tipos de trabalho que produz são pontos fortes do site. Na folha de rosto do site, (aquela que nos aparece quando digitamos o endereço www.ples-publicidade. com) o visitante pode ler o lema da empresa: “soluções para comunicar”. Este site é com toda a certeza uma boa solução, quanto mais não seja para conhecer melhor os trabalhos desenvolvidos pela empresa, merecendo portanto a sua visita…

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