Editorial Protocolos, cuidado e desigualdade Não há como pensar no ano de 2020, em qualquer viés, sem passar por esses eixos. A pandemia do novo coronavírus exigiu de todos mudanças, nunca antes vistas. A cobrança, entretanto, não foi igualitária. Exacerbou o desabrigo financeiro e falta de proteção da saúde dos mais pobres. Expôs ainda mais aqueles que não tem opção de não trabalhar, de trabalhar menos, ou ainda, de trabalhar de casa. Expôs o desequilíbrio. A 9ª edição da Revista F levou mais tempo para ser produzida e editada. Nós tivemos que aprender a fazer remotamente e construí-la enquanto o avião estava no ar. Trazemos como capa um ensaio que mostra a realidade de pescadores da Ilha de Florianópolis; em outras produções, os efeitos da crise sanitária em outras cidades dos país. Além disso, entrevistamos um fotógrafo e uma psicóloga sobre as adaptações feitas no fluxo de trabalho remoto e trouxemos dois editoriais produzidos exclusivamente de forma remota. A fotografia remota evidenciou a troca e interação entre fotógrafo e retratado em sua forma mais ativa e potente. Os Perfis, entretanto, foram apurados no contexto de pré-quarentena, por isso, tem uma estética fotográfica distinta. E inauguramos nesta edição a Frame como editoria fixa. Nela vamos trazer notícias e histórias por meio do formato de fotolegendas. Aprender modos de fazer é ampliar o olhar. Nesta edição exercitamos novas formas de técnica e linguagem para olhar aquilo que não pode ser mais escondido. O Brasil é desigual. E a pandemia mostra isso a quem quiser ver.
Ilustra
Por Arthur Salles
Brasil
DE TODOS OS CANTOS
Atividades físicas: modificações no serviço e saúde mental Diminuição do número de alunos na sala é uma das principais mudanças nas aulas de Muay Thai em Curitiba. Por Júlia Caldeira (PR)
O funcionamento das academias e outros espaços de atividades físicas foi um dos mais afetados pela necessidade de isolamento social. O Grão Mestre Rudimar Fedrigo, proprietário de academias que oferecem Muay Thai, conta que para as aulas ocorrerem (após a decisão do Tribunal de Justiça no dia 05/062020) houve uma série de regras restritivas e sanitárias, que necessitam ser cumpridas. Como a diminuição no número de alunos em sala que deve ser de até 40%, a obrigatoriedade do uso de máscaras durante o treino, e os bebedouros do local vetados.
Neste período de isolamento social as pessoas estão mais sujeitas a sentirem o cansaço mental; nesse sentido, a atividade física pode ajudar. “A arte marcial do Muay Thai colabora tanto para a saúde física, quanto para a saúde mental dos que praticam, pois ela mexe com todos os sentidos do corpo”, explica Fedrigo. “A atividade além do desenvolvimento físico, trabalha a parte psicológica. O atleta é movido em grande parte pelo mental. Então, quando o psicológico está mal, o atleta acaba se travando”, finaliza Silveira.
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Lotação de alunos em sala que deve ser de até 40%.
O professor Rogelson Henrique Silveira (apelidado de B.A.), concorda com o Grão Mestre e completa dizendo que também há um desgaste psicológico nos alunos. B.A. relata que a adaptação com as novas regras tem sido dificultoso para os praticantes nas academias. O Muay Thai (também conhecido como boxe Tailandês) é um esporte originado na Tailândia. No Brasil, a modalidade chegou no ano de 1979 e é conhecido como um esporte de combate muito violento, com o uso dos cotovelos, joelhos, golpes com a canela, chutes e também golpes giratórios. Esta arte tem técnicas de ataque e defesa, e é um tipo de arte marcial com muito atrito com o adversário.
*A apuração da matéria foi finalizada em 15/06/2020.
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Famílias carentes recebem ajuda durante a pandemia Organizações sociais unem-se para distribuir donativos a moradores de ocupações urbanas em Passo Fundo (RS) Por: Demian de França Dantas (RS)
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A Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo (CDHPF), no Rio Grande do Sul, estabeleceu uma parceria com o Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM). O objetivo da união das duas organizações é socorrer as famílias carentes que vivem em ocupações urbanas no município. “Já arrecadamos alimentos, material de higiene e máscaras para mais de 500 famílias. Vale lembrar que das 13.676
que estão com o cadastro atualizado no Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), 8.832 têm renda per capita de até meio salário mínimo. E apenas 4.132 delas recebem auxílio do programa Bolsa Família”, conta Paulo César Carbonari, coordenador geral da CDHPF. Moradora da ocupação do Valinhos II, Edivânia Rodrigues da Silva também faz parte da equipe da CDHPF, ajudando no
processo de recebimento e entrega dos donativos. Silva explica que dentre os critérios para seleção de beneficiários está o número de filhos, idosos, e não fazer parte de nenhum programa governamental de assistência, como por exemplo, o Bolsa Família.
Edivânia Rodrigues da Silva é integrante da Comissão de Direitos Humanos de Passo Fundo.
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Com uma infraestrutura precária a ocupação II do Valinhos é um dos locais que foi beneficiados.
Educação da rede pública e seus obstáculos durante a pandemia Com aulas suspensas, professores e estudantes precisam se adaptar ao novo formato online. Por Milena Monteiro (PE)
Para o professor Allan Diego Silva Lima continuar com as suas atividades de pesquisa e extensão, precisou se adaptar à nova forma online de dar aula. Silva leciona na área de Informática no Instituto Federal de Pernambuco (IFPE), localizado na periferia da região metropolitana de Recife. Em isolamento social, o professor e pesquisador tem concentrado seu trabalho em atividades acadêmicas, administrativas e orientação a alunos. Com as aulas presenciais suspensas desde março, uma pesquisa online foi realizada pela instituição; 40% dos alunos matriculados não conseguiram responder a mesma por não terem acesso a um dispositivo com internet.
Para dar continuidade, mesmo com as desigualdades aparentes, aos projetos de pesquisa e extensão, sem o acesso aos laboratórios equipados com computadores e internet de qualidade, as reuniões passaram a ocorrer semanalmente através de videochamadas. “Apesar do momento crítico, a produtividade aumentou. Alguns alunos trabalham e em casa eles podem dedicarse mais aos projetos que estão envolvidos integralmente”, conta o professor. Por uma videochamada, a bolsista de pesquisa Luana Florêncio dá o seu feedback: “Consigo tirar minhas dúvidas, compartilhar avanços e o professor estipula metas e etapas futuras”. Allan Diego Silva Lima é professor de Informática no Instituto Federal de Pernambuco (IFPE).
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Projeto social integra minorias e empreendimentos locais No norte fluminense, uma “varanda” de arte se abriu como oportunidade para o desenvolvimento da cultura e economia local. Por Jéssica Felipe (RJ)
Amarelo é a cor do otimismo, uma tonalidade associada a luz e que desperta a criatividade. Por isso, antes de falarmos sobre um negócio social que leva o nome de “Varanda Amarela” não por acaso, precisamos destacar a palavra criatividade. A criatividade gera inovação e inovação gera mudança. Esse é um dos fatores que caracteriza o empreendimento social, “a intenção de provocar mudanças nas condições de vida dos segmentos populacionais mais vulneráveis e de baixa renda com base em modelos de negócios inovadores”, como apresenta Muhammad Yunus, empresário social e especialista no assunto. Mas o empreendedorismo não é algo recente, na década de 40 o termo já aparecia nas discussões sobre capitalismo e desenvolvimento econômico como registra por exemplo, os trabalhos do economista austríaco Joseph A. Schumpeter. No entanto, o acréscimo da palavra “social” a esse conceito, não foi por acaso. Por volta de 1960 empreendimentos sociais começaram a surgir nos Estados Unidos e na Europa, com o intuito de unir lucro a minimização de problemas sociais. No Brasil, esses negócios começaram a aparecer vinte anos depois com iniciativas como a do Grupo Primavera.
A escola de fotografia Ateliê da Luz funciona dentro do projeto social Varanda Amarela.
Desde então, o campo do empreendedorismo social vem se desenvolvendo no Brasil com a missão de estimular negócios lucrativos que gerem impacto em determinadas áreas da nossa sociedade que precisam de visibilidade e investimento. Este foi o objetivo central da Varanda Amarela, uma galeria de arte que abriga diversos empreendimentos locais no município de Campos dos Goytacazes,
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interior do estado do Rio de Janeiro. “Buscamos ser um espaço de arte, música, dança, teatro, debate, conversa, bar alternativo, um espaço de cultura. Fazemos isso buscando empresas diferentes, com pessoas diferentes, para o nosso espaço ter cada vez mais representatividade”, conta Fernando Borges, 26, fotógrafo e idealizador do projeto. Esse “diferente” colocado por Borges é uma observação aos grupos e minorias que se sentem excluídos e/ ou desvalorizados por grande parte dos espaços e empreendimentos clássicos, como por exemplo, artistas LGBTQI+. “Nós temos uma pegada muito voltada para alguns grupos que não se encontram ou não pertencem a outros espaços, ou até mesmo têm um pertencimento limitado”, destaca ele sobre o empreendimento que se iniciou em maio de 2019. Com pouco mais de um ano, o Varanda Amarela já nasceu dando espaço fixo a mais de 10 negócios locais, entre eles, um café/bistrô, uma escola de fotografia, um bar/pub, um estúdio de tatuagem e body piercing, um brechó e um hostel. Além dos eventos culturais, festas, feiras e exposições que ocorrem em períodos específicos o local gera renda direta a 50 pessoas em média. “O Varanda Amarela surgiu com a necessidade de expandir os meus projetos para além da minha casa, como se fosse mesmo a varanda da minha casa. Lá acontece várias coisas, é um espaço para criação, é um lugar de encontro, um lugar de arte para qualquer pessoa que queira mostrar o seu trabalho. Nosso formato flexível é o que enriquece nosso negócio. Cedemos o espaço para que artistas/ artesãos possam vender sua arte, seja
Fernando Borges idealizador do projeto, ministrando uma das aulas de fotografia do Ateliê da Luz.
ela um produto propriamente dito ou um serviço. Também temos as oficinas, aulões com artistas plásticos, músicos, atores, dançarinos, palestras, roda de conversa, clube do livro, etc. Como não temos uma receita, todas as propostas são ouvidas. A intenção é agregar pessoas e ideias”, acrescenta Borges. Kellen Monteiro, artista visual campista de 25 anos é expositora no Varanda Amarela. Suas intervenções digitais buscam levar protagonismo para mulheres negras de sua cidade. Para ela o espaço é uma conquista social “Tenho uma relação uma relação de muito carinho com o Varanda, é um espaço extremamente necessário na cidade, que vem potencializando cada vez mais as expressões
culturais da região, fico feliz de fazer parte da história deles e eles da minha”, conta a artista. Borges destaca ainda que esse não é um tipo de negócio simples e fácil, e que é preciso integrar muito bem os projetos sociais aos objetivos econômicos do empreendimento. “É um espaço onde se trabalha com lucro, com vendas de produtos, só que a nossa forma é de ser um espaço mais horizontal, onde isso não é o nosso final ou objetivo principal. A forma de ser diferente é o meio do caminho. Há muitos desafios, saber dividir exatamente quais são as partes coletivas, as partes que precisam funcionar dentro de uma empresa. É muito complicado porque lidar com o público é difícil, ainda mais um público que já é ferido, então é preciso muito cuidado. Não existe uma escola que ensina a gente a fazer isso, então é um processo mesmo, a gente vai errando muito”, finaliza o fotógrafo.
Kellen e uma de suas intervenções digitais que buscam enaltecer o protagonismo feminino.
Varanda Amarela continua a ser luz O aniversário de um ano do Varanda Amarela não teve as comemorações esperadas mas registrou muita união e planejamento para manter o empreendimento vivo. Borges conta que nos meses de pandemia os esforços foram dedicados exclusivamente para manter as despesas básicas do negócio e uma renda mínima aos colaboradores que dependem exclusivamente dos recursos extraídos da Varanda. Além dos serviços em delivery para os produtos possíveis, a equipe lançou a venda antecipada de ingressos para eventos futuros. Mesmo com o cenário desafiador que ameaça a continuidade do empreendimento, a equipe do V.A. não deixou de
contribuir com as causas que acredita e que motivam o negócio a existir. A escola de fotografia Ateliê da Luz, que funciona dentro do Varanda Amarela, realizará a 5ª Edição do Congresso de Fotografia Lampião de forma totalmente gratuita. Fora isso alguns colaboradores da escola estão mobilizando um projeto voltado especificamente para o público “T” (Travestis, Transexuais e Transgêneros). A ideia é fornecer um curso de fotografia sem custo nenhum para o número total de pessoas que manifestarem interesse “Se não tem fotógrafos trans, significa que eles não estão tendo acesso a essa arte. Por isso queremos democratizar o acesso a fotografia” diz o fotógrafo.
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STONEW ALL -VISTAS 50 Anos
Atendimento online para a saúde mental “As pessoas sairão desta pandemia mais solidárias e fraternas”, afirma a psicóloga Maria da Graça Shüler Por Júlia Caldera Roque
atendimento médico. Em entrevista à Revista F, ela conta como tem sido a experiência utilizando esta nova forma de atendimento. Revista F: Como são realizados os atendimentos? Maria da Graça Shüler: Devido a pandemia os atendimentos são feitos de forma online e utilizamos plataformas de troca de mensagens.
nas o Especialista em psicoterapia, Maria da Graça Shüler tem atendido seus pacientes de forma online. .
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Especialista em psicoterapia e credenciada pelo Conselho Federal de Psicologia, a gaúcha Maria da Graça Shüler, 57, desde o início da pandemia tem atendido os seus pacientes de forma remota. Formada há dez anos em psicologia, pela Universidade Tuiuti do Paraná, Shüler é uma das profissionais de saúde que tem praticado o chamado telemedicina. Conceito que trata do uso das modernidades tecnológicas para o fornecimento de informação e
Revista F: O que muda com este novo formato de atendimento? Maria da Graça Shüler: Uma das mudanças é a dificuldade de proceder com a leitura corporal do paciente, mas buscamos fazer o acolhimento necessário de outras formas. As regras e normas de um atendimento online são as mesmas de um atendimento presencial. Revista F: Em média, quantos atendimentos você faz por dia? Maria da Graça Shüler: São de nove a doze atendimentos por dia, com exceção dos sábados em que realizo de cinco a seis.
Revista F : Aumentou o número de pacientes? Maria da Graça Shüler: Sim, aumentou cerca de quatro pacientes por dia. Revista F: Quais são os desafios tecnológicos?
Maria da Graça Shüler: Por diversas vezes, há interrupção do servidor de internet e queda de sinal. Para alguns pacientes demanda mais tempo para se adaptarem a essa nova modalidade de atendimento. Revista F: Como profissionais (terapeutas), vocês já tinham um preparo para atender de forma remota? Maria da Graça Shüler: Muito pouco se sabe de psicologia de urgências e emergências. Buscamos nos atualizarmos em literatura publicada gradativamente durante o período. Foi um novo aprendizado para todos nós. Revista F: Sabemos que o isolamento social tem provocado no ser humano mais ansiedade e estresse. Então, o que podemos fazer para amenizar os sintomas? Maria da Graça Shüler: Foco na rotina, ou seja, ter horário para acordar, fazer refeições, estudar, dormir, conversar com os amigos. As atividades físicas ajudam. Algo muito importante é reservar um tempo para o autoconhecimento, pensar nas suas emoções, ver e rever a vida e, se necessário, mudar a maneira de lidar com tudo isso. O suporte profissional ajuda muito. Revista F: Você tem percebido alguma mudança de comportamento, nos seus pacientes? O que mais tem os atingido neste momento? Maria da Graça Shüler: Sim, está havendo uma grande mudança. Percebo que há um questionamento sobre o viver e o morrer. Também percebo um comportamento mais solidário para com o próximo. Em contrapartida, outros casos apresentam um comportamento mais agressivo, mais
inconstante. Percebe-se ainda uma busca desenfreada de estar com outras pessoas, numa demonstração da dificuldades de lidar consigo mesmo. Revista F: Você atende pacientes que descobriram que estão infectadas com o vírus da Covid-19? Maria da Graça Shüler: Sim. Os pacientes positivos para covid-19 trazem muito o questionamento de suas vidas e inseguranças com o desconhecido, a vida e a morte.
Uma adaptação no mundo da fotografia Gero Hoffmann mesmo fotografando de casa, consegue realizar seu trabalho sem perder a essência Por Eduarda Zeglin
Diante de tantas pandemias que já passaram pela história da humanidade, o novo Coronavírus chega ao século XXI atingindo todos os setores, e exigindo que façamos adaptações na nossa vida. O que provoca grandes desafios para os mais diversos profissionais. Nos últimos meses tomados pelo isolamento social, inúmeros fotógrafos precisaram se reinventar e aprender novas maneiras de fotografar a distância. Como o fotógrafo Gero Hoffmann, que fotografa há dez anos e em 2017 começou a desenvolver o seu trabalho com a gastronomia. Atendendo a muitos clientes dos mais diversos segmentos, Hoffman conta em entrevista à Revista F sobre como tem sido seus dias de trabalho em meio a quarentena.
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Revista F: Como era a sua rotina de trabalho antes da pandemia? Gero Hoffmann: Antes eu atendia em média de três a quatro clientes na semana, trabalhando com o sistema de diária e meia diária. Como prefiro fotografar e entregar mais material para o cliente, gerando um conteúdo maior, eu ia nos locais e atendia aos clientes ali mesmo. Montava as cenas no espaço do restaurante, com equipamentos, flashes, câmera, enquanto os pratos iam entrando. Então, ficava mais fácil.
Gero Hoffmann é fotógrafo há dez anos e desde 2017 desenvolve o seu trabalho com a gastronomia.
Revista F: Qual a diferença entre trabalhar presencialmente e à distância? Gero Hoffmann: Eu já fiz muita fotografia de produto em casa. Eu recebia o produto e tinha um tempo hábil para desenvolver o trabalho, com o produto na minha mão.
ENTRE -VISTAS Eu testava, colocava no computador e via se estava tudo certo. Era uma liberdade um pouco maior do que diretamente com o cliente na empresa, tendo pouco tempo para resolver qualquer tipo de falha técnica. Mas em casa tem que ter um pouco mais de disciplina. Revista F: De que maneira está sendo a sua adaptação dentro de casa, em relação a ambientação que você tinha nos restaurantes e outros estabelecimentos? Gero Hoffmann: A minha função é deixar bonito. Eu não sou um ótimo cozinheiro, o meu negócio é fazer a foto. Eu encaro a comida como um elemento de cena. O que eu posso criar em cima? Como posso montar ela de uma forma arquitetônica para que fique interessante? Então, busco o melhor pedaço da comida, o que se destaca, que dá um brilho diferente. É isso que vou buscando. Revista F: Para você está sendo desafiador esse momento? De quê forma? Gero Hoffmann: Sim, estou tendo que me adaptar a uma nova forma de trabalho. Falta o contato, falta o cliente. Acho que também é uma questão de ajeitar um marketing, uma proposta de engajamento, que é o que eu vejo que tem muito. Muita gente apostando e patrocinando coisas online. Eu tenho colocado datas limites para desenvolver as coisas, e tenho usado outras pessoas como referência pensando ‘’isso é legal fazer igual. Isso nem tanto’’. Então, você vai lapidando até chegar em um resultado interessante. Revista F: Como você está administrando o que era feito nas cozinhas dos seus clientes? Gero Hoffmann: O preparo já implica um pouco de trabalho, então eu preciso praticar isso um pouco mais. Para fazer um
prato legal e bonito demanda tempo, e eu gosto de trabalhar com os clientes por conta disso. Porque vou lá para executar foto. Mas eu tenho tentado buscar alguma coisa com envios. Tenho uma amiga que é padeira, ela está fazendo os pães e vendendo e sempre me manda os pães semanalmente. Então, são produtos que vem até em casa e acaba se tornando mais fácil para fotografar. Agora para fazer um carpaccio, que demanda uma boa experiência nessa área, eu não domino. Até pela questão da cozinha que tem que ter toda uma infraestrutura.
Gero Hoffmann recebe o produto para fotografar em casa, onde já tem um cenário e estúdio montado.
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Pescadores da Ilha de Santa Catarina Cultura centenária, pesca da tainha em Florianópolis resiste à presença do coronavírus. Por Andreson Coelho
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Mesmo com o risco por
contaminação do novo coronavírus, os pescadores artesanais da capital catarinense se arriscam para manter a tradição dentro e fora do mar. Com a presença silenciosa mas constante da doença, a rotina de trabalho foi modificada trazendo com ela apreensão aos patrões. Mas mesmo com a incerteza, esses pescadores não perdem a esperança de uma boa safra de tainhas (pescado da temporada), que já foi anunciada pelos ventos gelados do Sul. Além do mar furioso e dos ventos fortes que estremecem os ranchos construídos nas praias, os pescadores artesanais agora também se expõem à Covid-19. Uma doença que já infectou mais de um milhão de pessoas no Brasil, tendo atingido no Estado de Santa Catarina mais de vinte mil pessoas. Somente com os olhos à vista por conta da máscara de pano que protege os pescadores, eles conversam sobre os destinos da pesca esse ano. Os ventos gelados que chegaram em abril vindos do sul já anunciaram a presença de muitos peixes. No entanto, ainda é cedo para saber quantos quilos conseguiram pescar neste ano. A pesca artesanal é uma das atividades econômicas dotadas de muita culturalidade, são saberes, tradições e muitas histórias compartilhadas desde a observação dos cardumes até a captura e contagem dos peixes na praia. O rancho do pescador é a representação fiel do grande universo da pesca artesanal, e que está rareando no litoral catarinense. Cada vez menos jovens se dedicam a essa prática trazida pelos açorianos, além disso, os ranchos sofrem pressão do mercado imobiliário para a ocupação das margens litorâneas.
Esta série retrata os ranchos do Sul da Ilha de Santa Catarina (Campeche e Pântano do Sul), e os processos e desdobramentos na temporada de pesca. Nesses três meses (período da temporada) eles se reúnem do amanhecer até o fim do dia nos ranchos, na espera dos cardumes chegarem. É uma emoção que começa desde o vigia, ao ver de longe a escura mancha no mar, e os pescadores lançando o barco a remo no mar, até o momento da “puxada do lanço”, em terra, feita por outros pescadores para recolher as tainhas.
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Curitiba em restrição Medidas de prevenção mudam a rotina da capital paranaense. Por Kethlyn Tavares Saibert
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Com a declaração da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a pandemia do novo coronavírus, os países tiveram que se ajustar às novas medidas sanitárias. No Paraná, o governo juntamente com a Prefeitura Municipal de Curitiba (PMC), estabeleceram protocolos para combater a doença, tendo em vista que ainda não há vacinas ou tratamento para esse vírus. No decreto de n° 421/2020 instaurado no dia 16 de março, foi orientado o isolamento social e as atividades com aglomerações de pessoas suspensas, como as aulas nas escolas, shows e eventos esportivos. Mas com o avanço da pandemia, no dia 15 de abril a PMC adicionou novas normas ao decreto de n° 470/2020. Entre as novas medidas estão o uso obrigatório de máscaras nos espaços públicos, restrições no número de pessoas nos estabelecimentos, e nos locais de entrada devem ter sempre álcool em gel à disposição.
A resolução ainda determina que em caso de descumprimento, ficará passível de penalização administrativa para o cidadão, com multa que varia entre R$ 106 e R$ 530. Já para os estabelecimentos os valores são entre R$ 2.120 e R$ 10.600, além da cassação do alvará. Diante dessas novas regras sociais a cidade de Curitiba (assim como no mundo todo), está enfrentando um cenário nunca imaginado antes. O impacto do novo coronavírus modifica o comportamento das pessoas nas ruas e muda a nossa rotina. Agora as regras de etiqueta são outras e o que mais observamos são os rostos que passaram a ser cobertos por máscaras.
*Apuração realizada em 29/05/2020.
Lucianas e Marias: projeto que busca a troca de conhecimentos Por Amanda Zanluca
“Eu venho aqui só para bater papo”, confessa uma das participantes do projeto social intitulado de “Lucianas e Marias”. Uma frase que descreve bem a relação dessas mulheres, que em todas as quartasfeiras de tarde, se reúnem na Unidade de Saúde Vitória Régia (Cidade Industrial) para aprenderem algo. Seja tricô, crochê, bordado, artesanato ou produzindo flores em homenagem ao dia internacional das mulheres, todos os trabalhos elas realizam com muita alegria e amor enquanto batem um papo. De forma voluntária, esse é um projeto que tem como objetivo perpassar o conhecimento e incluir as pessoas para que elas não sejam apenas participantes do projeto, mas que façam parte dessa troca de saberes. Além do
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Vitória Régia, outro encontro do grupo acontece às sextas-feiras na Unidade de Saúde no Rio Bonito. Pelo “Lucianas e Marias” já passaram mais de mil mulheres, e a ong em cinco anos de existência já chegou a oferecer atividades em mais de nove unidades em Curitiba. Além do empoderamento feminino, esse projeto também contribui para a melhora da saúde mental de suas participantes. Pois, as atividades oferecidas são como terapia para as pessoas que sofrem de problemas psicológicos como depressão, síndrome do pânico, ansiedade entre outros.
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Glass half empty Por Eduarda Moreira
A esperança se esvai, pois são tempos estranhos. Uma história nunca vivida pela nossa geração, onde a frustração toma conta e a ansiedade lhe dá uma ajuda. Tudo pode desaparecer a qualquer momento. O copo está meio vazio, contudo você sabe que enquanto se conhecer a alma, terão dias que o copo estará meio cheio.
Juntos, mas isolados Por Victória Renée
O isolamento social tem sido o principal recurso utilizado pelo mundo para tentar diminuir a disseminação do novo coronavírus. As recomendações é para que as pessoas permaneçam em casa e só saiam para realizar atividades essenciais. Mas essa tarefa simples tem sido ignorada por diversas pessoas que optam por “furar” o isolamento, colocando não só sua vida em risco mas de todos a sua volta.
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I need to know if you’re feeling it “And if there is a voice in your head don’t listen to it” Por Eduarda Moreira e Stefany Bodziak
O ensaio foi baseado na música These Days da banda norte americana Wallows, o clipe passa uma leve brisa de domingo, o aroma de laranjas frescas, e o sentimento blasé que pode ser sentido na monotonia diária dos últimos tempos. O cotidiano nos cega e às vezes é preciso não escutar a pequena voz em nossa cabeça, para conseguir entender os dias de hoje, ou ao menos, tentar.
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Cuidado com o coletivo Por Jorge Junior Enquanto muitos estão trabalhando de casa, profissionais das mais diversas áreas tiveram que continuar com a sua rotina, circulando pela cidade e utilizando o transporte público. O uso das máscaras é uma proteção para si mesmo e um ato de cuidado para com o próximo.
Trabalho em conjunto Por Amanda Zanluca O Parque das Aves (Foz do Iguaçu - PR) é a única instituição do mundo focada no resgate, abrigo e conservação das aves da Mata Atlântica e se mantém por meio do apoio de instituições parceiras e do público visitante.
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Vende-se máscaras Por Victória Renée A confecção e venda de máscaras - itens fundamentais na proteção contra a covid-19 - foi o refúgio de muitas pessoas que ficaram desempregadas em função da pandemia.
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Costurando solidariedade Por Thaiane Carvalho Matilde Carvalho, costureira há 12 anos, começou a produzir máscaras para doar aos seus vizinhos. Com tempo livre por conta da pandemia, ela tem passado mais tempo costurando em seu pequeno ateliê. Carvalho já distribuiu cerca de 30 máscaras.
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A metamorfose da vida por meio da arte Além de um encontro com a arte, Helisson Garcia passou por muitos momentos difíceis em sua vida mas nunca desistiu. Por Eduarda Zeglin
Helisson Garcia, jovem que transformou sua vida através da dança.
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Helisson Garcia de 20 anos, veio de uma família humilde e foi criado na periferia de Almirante Tamandaré (PR). Em um lugar onde a realidade nem sempre é das mais fáceis, o jovem encontrou um diferencial; desde muito pequeno que Garcia começou a descobrir o seu talento e paixão pela arte, em especial, pela dança.
‘“Quando eu estava no Ensino Médio, tinha um projeto de dança no meu colégio. E quem me inspirou a dançar foi meu professor, o Marcelo, que é meu amigo até hoje. Ele tinha um jeito alegre e eu queria ser igual a ele’’, conta Garcia. Sem ter uma boa relação com o pai - que abandonou a mãe quando Garcia tinha apenas quatro anos de idade -, o jovem conta que, apesar da ausência paterna, teve boas referências dentro de casa, com duas grandes mulheres: sua mãe, Salete dos Santos Oliveira, e sua avó, Neuza dos Santos. Na dança a referência veio com o Marcelo Henrique dos Santos. Muito ligado aos alunos, tinha uma relação diferente com Garcia, forte e especial. Em 2014, o Estado ofertava o projeto Mais Educação’, no qual cerca de 270 alunos participavam. Marcelo Henrique dos Santos recebeu o convite para trabalhar no teatro e em um musical. Foi quando Helisson se juntou ao grupo. “Eu via um potencial muito grande nele, mas ele tinha muito medo. Não sei se era medo ou timidez. Acho que muito era por conta das relações, devido a história com o pai’’, conta Santos. ‘’O Nego (apelido que o professor deu ao jovem), para mim, é uma pessoa com uma grande sensibilidade, sempre gentil e doce. E eu percebi que tinha dado certo quando vi um vídeo dele dançando, em que ele parecia outra pessoa. Isso me fez sentir que o meu dever foi cumprido
Perfil Atualmente, Helisson atua na escola de dança WorldStep Company em Almirante TamandarÊ.
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pois eu só queria que ele fosse diferente do pai’’, relata Santos. Helisson Garcia sempre teve um apego muito grande com o professor que sabia do histórico familiar do jovem e que ele precisava de uma figura masculina por perto. “Ele era como um filho para mim, mas o Nego se sabotava muito, não via o quão inteligente e criativo ele era’’, comenta o professor feliz em ver a transformação do jovem. As aulas de arte e dança que aconteciam na Escola Municipal Vereador Atílio Bini, eram ministradas pelo professor Marcelo Henrique dos Santos. O projeto intitulado de ‘’Caminhos da Paz’’, em parceria com o governo, tinha o objetivo de combater a violência na periferia possibilitando aos jovens um novo olhar sobre a realidade, e consequentemente, minimizando as possíveis vulnerabilidades sociais, como as drogas. A história de Helisson Garcia vai além do seu encontro com a arte. O jovem passou por muitos momentos difíceis em sua vida. Um desses momentos foi em uma tarde de quinta-feira, quando estava em um ensaio para uma apresentação no teatro e recebeu a notícia de que sua mãe havia sofrido um acidente, colidindo com um ônibus biarticulado. Por conta do acidente, Dona Salete acabou perdendo uma de suas pernas. Garcia também viu muitos de seus amigos se perderem no caminho das drogas. Mas o professor de dança sempre esteve ao seu lado lhe mostrando o caminho do bem e resgatando cada vez mais a sua essência. Atualmente, Helisson atua na escola de dança WorldStep Company que fica localizado em Almirante Tamandaré, onde participa de diversos concursos. Garcia se
tornou um jovem forte que luta por seus objetivos, como o de se tornar um grande dançarino. Para Santos, muitas crianças têm a escola como refúgio, um lugar onde podem ser mais felizes, tendo momentos de socialização e aprendizado. Muitas também vão em busca de alimento e afeto. ‘’Você pode levar Mozart, Djavan e ouvir do mesmo jeito que Racionais e um funk. Com isso a criança tem um leque de oportunidades e assim elas podem escolher o que querem. Eu amo a arte e acho que é por meio dela e da educação que você alcança a alma’’, defende o professor.
Criado na periferia, desde muito pequeno Helisson Garcia descobriu o seu talento para dança .
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Uma faísca que incendiou os bailões Conheça a história do gaiteiro Edonir Gonçalves, o Faísca, que animou as noite do interior do Paraná na década de 80. Por Thaiane Carvalho
Edonir Gonçalves, gaiteiro que incendiava as noite do interior do Paraná.
Na década de 80, os tradicionais bailões, que aconteciam em rodeios, casas de shows e chácaras, no estado do Paraná, tiravam as pessoas de casa para dançar e sendo uma forma de fugir da vida monótona do interior. Foi nesse cenário que surgiu a banda “Os Serritanos”. Formada em 1982, por Emerson no contrabaixo, Magrão na guitarra, Rogério na bateria, Bem-te-vi na gaita e Edonir Gonçalves no vocal e na gaita. Com uma voz marcante e presença de
palco, Edonir Gonçalves ficou conhecido como “Faísca”, apelido que ganhou, pois incendiava o salão. Quem teve a chance de ir nos bailes em que Os Serritanos tocavam, jamais esquece. A banda que percorreu todo o estado do Paraná - passando por todos os clubes de Curitiba; chegou a se aventurar em uma turnê por São Paulo. Faziam de 4 a 5 shows por semana, com um maior público nos fins de semana. Para Faísca, se tivesse gente dançando, tinha gente feliz. Hoje, aos 65 anos, ele lembra dos bons tempos da banda. “Foram 16 anos vivendo só de música”, diz Gonçalves. Mas a banda teve de se desfazer quando o baterista Rogério Mazur foi diagnosticado com câncer. Um choque que abalou a todos os integrantes, que acabaram por vender o ônibus usado pela banda. Cada um seguiu seu rumo e nunca mais tocaram juntos, uma memória dolorida para Faísca, pois estavam prestes a gravar um disco. Amigo de longa data de Faísca, Pedro Santos, conhecido como Pedrão, foi a muitos bailes e acompanhava a banda para se divertir e encontrar os amigos. “Ele era o cara que trazia alegria para todos nós”, conta em referência a Faísca. José Siqueira que também frequentou os bailes embalados pelos Serritanos conta: “Eu gostava da seleção das músicas e da alegria deles. Às vezes, me pergunto por
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Hoje aos 65 anos, o gaiteiro “Faísca” relembra 16 anos que viveu só de música.
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por que não deu certo, por que não seguiram adiante”. Faísca agora toca sozinho em casa, onde senta-se na beira da cama, apoia a gaita na perna e passa horas a fio tocando a música que lhe vem à cabeça. “Às vezes, sonho que estou tocando no baile”, conta ele que, nos churrascos em família, sempre recebe pedidos para tocar. Apesar de o instrumento ser pesado e difícil, a desenvoltura com a gaita só mostra o
quanto Faísca e ela sempre foram bons amigos. O contato com os companheiros de banda se perdeu, e só uma notícia de vez ou outra, como a dos quatro filhos do gaiteiro e que um aprendeu a arte da sanfona. Atualmente aposentado, Faísca vive com a família em um sobrado de rua calma, onde há histórias e mais histórias que dariam um livro.
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