Expediente Foto: Maria Júlia Corrêa
A arte cria vida ou a vida cria arte? Não sabemos, e talvez seja melhor não descobrir para não estragar a magia. O que sabemos, no entanto, é que a arte faz parte da vida – e vice-versa –, da sua e de todos nós. Esta edição da revista Entrelinha, criada por alunos dos cursos de comunicação da Universidade de Caxias do Sul, na disciplina de Design de Notícia, segundo semestre de 2013, tem como tema as principais faces da arte: pintura, música, literatura, escultura, arquitetura, dança, cinema e teatro. Dividir a arte em oito partes certamente não foi uma tarefa fácil e é provável que jamais haja unanimidade sobre qual a forma definitiva de dividi-la. Com isso em mente, buscamos trazer um viés diferente a essas facetas da arte: a pintura que não se limita ao pincel sobre a tela, a dança que vai além do salão, a literatura que foge do clássico, e outras formas que você vai descobrir nessa leitura. Nosso objetivo foi buscar esse conteúdo ao mesmo tempo interessante ao leitor e que fuja dos padrões de revistas de arte. Trouxemos o que havia de mais exótico e inusitado dentro de nosso alcance para satisfazer o desejo de apreciar a arte fora dos padrões.
Reitor Evaldo Antonio Kuiava
Redação, Diagramação e Fotografia
Diretor do Centro de Ciências da Comunicação Jacob Raul Hoffmann
Alana Vencato Bruno de Moura Camila Valentini Douglas Savegnago Gabriela Bregolin Josiel Rodrigues Luana Reis Luiz Henrique Batista Milena Schäfer Roberto Nichetti
Coordenador do Curso de Jornalismo Álvaro Benevenuto Jr. Docente Supervisora Ana Laura Paraginski
Produto final da disciplina de Design de Notícia, do Curso de Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo, da Universidade de Caxias do Sul.
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Dentro desse objetivo, os desafios vieram em forma de perguntas: o quanto podemos fugir do tradicional? Até que ponto é possível esticar a natureza da arte sem deturpá-la por completo? A subjetividade dessas respostas faz parte do fascínio que a arte exerce sobre o ser humano. Discussões sobre arte podem durar uma vida inteira e não gerar respostas que satisfaçam a todos. A expressão e interpretação artísticas são experiências pessoais demais para que todos compartilhem de um mesmo ponto de vista a respeito das mesmas. É difícil até mesmo falar sobre arte com propriedade e sem se perder nas próprias convicções. Mas isso não nos impede de tentar! Por isso desejamos a você uma boa leitura!
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Arquitetura
Otimizar a distribuição do espaço e o uso de recursos financeiros é essencial quando se fala em decoração. E, para atingir essa meta, uma opção interessante é a reciclagem de materiais Diferentemente de outras artes, a arquitetura não pode ser praticada por qualquer pessoa como hobby, por exigir vários anos de estudo. Contudo, dela faz parte uma atividade que realizamos um semnúmero de vezes, a decoração.
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É através dessa tarefa que uma pequena parte do trabalho do arquiteto chega ao alcance popular pois, com um pouco de criatividade pode-se aprender facilmente a distribuir melhor o espaço, com dicas de quem é especializado nisso. Com o desenvolvimento urbano crescente, os espaços ficam cada vez menores, e aproveitá-los ao máximo requer um bom planejamento. Nesse contexto, são necessários, por vezes, muitos móveis e produtos, e a melhor solução para evitar gastos desnecessários é a reciclagem de materiais, tendência que tem crescido nos últimos anos. Além de ajudar a economizar, o reaproveitamento tem impacto positivo no meio ambiente, por diminuir a produção de lixo. A arquiteta Camila Calvi comenta que a reutilização de materiais na decoração decorre não apenas do ideal estético, mas também de uma necessidade de contribuir para a preservação da natureza. Ela lembra de um processo importante para tanto, que é a restauração de móveis antigos, onde muitos deles, geralmente herdados, são recuperados e podem, inclusive, ganhar nova coloração ou acabamento.
Conforme a arquiteta, objetos antigos trazem personalidade ao ambiente e, além deles, engradados de plástico e pallets podem ser boas apostas para a decoração. Ela lembra que o ambiente deve ser visualmente compatível com a sua proposta. “A estética é valorizada, sim. É essencial que cada edifício se adapte ao uso ao qual está destinado e expresse claramente seu caráter”. A rede de microblogs intitulada Tumblr e o Pinterest - uma espécie
Arquitetura Fotos: Gabriela Grillo
de mural online, no qual o internauta pode salvar e compartilhar imagens de seu interesse -, são grandes difusores de ideias de decoração. Ali, luzes de natal, garrafas de vidro comuns e até mesmo caixotes de feira podem virar móveis, abajures e adornos para variados cômodos, e tudo pode ser feito em casa, de acordo com os gostos de cada um. Com um pouco de criatividade e inspirando-se no trabalho de profissionais da área, não fica tão difícil realizar uma decoração econômica e bonita. Assim, não é necessário ser profissional para saber que, quando se escolhe reaproveitar materiais, móveis e objetos, o benefício não vem apenas para o bolso do consumidor, mas também para o mundo.
Decoração para os clientes Em Nova Prata, a atração do espaço de gastronomia Empório São João - além da culinária, é claro - fica por conta da decoração do espaço. Lá, discos antigos de vinil viram porta-pratos, latinhas pintadas servem de suporte aos guardanapos e flores de papel seda enfeitam cada uma das mesas. O local é completamente decorado, não sobram paredes vazias. Em um dos corredores, os panfletos e anúncios ficam pendurados em um varal feito com linha na parede, uma alternativa a deixá-los espalhados nas mesas. Acima do balcão, pequenos vidros de conservas emolduram as diversas lâmpadas que iluminam o local, trazendo uma nova ideia de luminária. Pequenas
Imagens da decoração do Empório São João Bosco, de Nova Prata
pinturas de santos, quadros de artesanato, fotografias antigas e capas de discos ocupam cada espaço disponível. O arquiteto Marcelo Nedeff, decorador e proprietário do Empório, conta que o local foi pensado como uma soma de histórias, que buscam fazer com que o cliente sintase acolhido e identifique-se com o estabelecimento. Ele conta que foi necessário muito planejamento para combinar os diferentes materiais: “Os desafios encontrados foram a escolha do que seria utilizado, visto que são muitas informações distintas presentes no mesmo local. O maior desafio foi trabalhar com todas elas e criar um ambiente que despertasse o interesse dos clientes”, explica. Para Marcelo, a preocupação em conservar alguns artefatos
é o que acaba propiciando uma tendência a reciclar. “A intenção principal é manter objetos e características com valor, seja ele histórico, arquitetônico ou, até mesmo, sentimental”, complementa. Ele afirma, ainda, que a cultura do local onde o projeto se situa é sempre motivo de inspiração e é importante buscar materiais que possam ser encontrados na região.
O arquiteto Marcelo e seu trabalho
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Arquitetura
A arquitetura há muito caminha por vias ecológicas. Nas grandes cidades, a natureza ganhou espaço sobre as casas e construções A grande concentração da população e de edificações nos centros urbanos, que está em crescente progresso, tem trazido diversos motivos de preocupação quanto à qualidade de vida e ao meio ambiente. A poluição do ar, o clima abafado e as constantes enchentes são alguns agravantes das condições de saúde de pessoas que vivem em grandes cidades. Nesse panorama, a busca por alternativas que levassem em conta o pouco espaço no ambiente urbano para a criação de áreas verdes acabou por incentivar a criação de diversos projetos. Entre eles, destacam-se os telhados verdes, nos quais as tradicionais telhas são substituídas por uma cobertura viva. Para a instalação de um telhado verde, é necessária a
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impermeabilização do teto, para evitar possíveis infiltrações e, posterior à isso, cria-se uma camada de drenagem, responsável por acumular a água da chuva. Acima dela fica o solo e uma cobertura contra a ação erosiva, sobre a qual fica, por fim, a vegetação.
ele atua como isolante térmico, ajudando a diminuir a troca de calor entre os ambientes interno e externo. A arquiteta lembra que se deve observar apenas que a vegetação escolhida para a cobertura seja adepta às condições climáticas.
A professora de arquitetura Maria Fernanda Nunes destaca como vantagens da cobertura viva o isolamento térmico e acústico das residências, bem como o aumento de áreas permeáveis nas cidades. Ela ressalta, ainda, que uma estrutura do gênero exige certos cuidados. “A construção do telhado verde depende de vários fatores, entre eles o quanto o proprietário está disposto a arcar com a manutenção. Seria a mesma manutenção de um jardim, mas muitas pessoas não têm essa disponibilidade”, comenta.
Para quem pretende construir uma casa própria, vale pensar em adaptar o projeto para comportar uma cobertura viva, pois as estruturas feitas para os telhados comuns podem não suportar o peso de um projeto do tipo. Se a preocupação for o custo, ele não é muito maior que o de um telhado comum e o custo-benefício tende a ser bom, levando-se em conta a economia de energia proporcionada pela menor utilização de climatizadores e arcondicionados.
Ainda não se encontram muitos projetos do gênero na região. Contudo, Maria Fernanda acredita que eles possam se tornar populares no futuro. Mesmo com o clima frio do Rio Grande do Sul, possuir um telhado verde não é problema, afinal,
A arquitetura verde, além de econômica, pode inaugurar uma nova era de tendências urbanas que podem reverter o ônus ecológico da nossa sociedade de consumo. Prédios hoje já são construídos de forma a aproveitar a água da chuva e reduzir ao máximo o desperdício de energia. O telhado verde é a coroa no topo de edificações que começam, ainda que timidamente, a visar pelo bem comum.
Cinema
Há mais de 18 anos, Rudimar Balbinot é projetista do Cine Ideale em Carlos Barbosa. A atividade é executada como hobby, mas exige comprometimento, responsabilidade e, acima de tudo, paixão incondicional pela sétima arte Uma sala de cinema vai muito além da mera exibição de um filme. Durante aproximadamente duas horas – às vezes menos, às vezes mais - o espaço se torna palco de grandes emoções transmitidas pelas imagens do filme. Cenas de amor, suspense e ação contagiam o público, provocando risos e lágrimas com cheiro de pipoca. Por trás de tudo isso, em uma salinha de poucos metros quadrados, um rolo gira e, iluminado pelo projetor, torna possível que todas essas emoções sejam transmitidas,
sejam sentidas por quem trocou a novela, o jogo, e até mesmo os estudos, pelo cinema. Das cerca de 150 pessoas que podem lotar a única sala do Cine Ideale, poucas – quem sabe duas ou três - percebem a presença dele, atrás de uma janelinha iluminada, em uma espécie de mezanino: o projetista, Rudimar Balbinot. Aos 44 anos de idade, o barbosense se dedica, há quase duas décadas, ao ofício que aprendeu com seu pai, Darci Balbinot, hoje com 73 anos. Fotos: Milena Schäfer
Cine Ideale, de Carlos Barbosa, é administrado por uma associação e funciona como “cinema de rua” no prédio da antiga Estação Férrea, com lugar para 150 pessoas e exibição de um filme por semana, em cinco exibições
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Cinema Darci começou a projetar filmes ainda nas décadas de 1960 e 1970, em um cinema que funcionava no Salão Paroquial da Igreja Matriz de Carlos Barbosa, administrado por Celso Dolzan, hoje com 81 anos. Com a extinção da sala, e inauguração do Cine Ideale, em 1992, Darci voltou a projetar, contando em seguida com a ajuda de seu filho. “Perdemos muitos compromissos, casamentos e aniversários, para projetar filmes no cinema”, lembra Rudimar, que calcula ter assistido aproximadamente 600 filmes ao longo de sua trajetória no Cine Ideale. “É uma vida para quem é casado, e não tem muitos compromissos, faço por hobby mesmo”, completa o projetista, que tem outras atividades profissionais e recebe apenas um valor simbólico para projetar filmes no cinema de Carlos Barbosa.
filme por semana, com um total de cinco sessões, somente à noite, com exceção de alguns filmes (geralmente os de público infantil, que ganham matinês extras).
Com o passar dos anos, Darci acabou passando para o filho a tarefa. “Ele ainda vem algumas vezes, mas a maior parte fica comigo”, explica Rudimar. O Cine Ideale exibe um
A projeção hoje é realizada com um equipamento elétrico, de segunda geração. “O primeiro era movido à carvão”, afirma Rudimar, que gosta do que faz e a esse sentimento
Rudimar Balbinot na sala onde projeta filmes para o público do cinema
atribui a responsabilidade e comprometimento que dedica para tal atividade. “O Cine Ideale nunca deixou de ter exibição por falta de projetista. Meu pai e eu faltamos apenas no dia do meu casamento, e conseguimos um substituto para aquela noite”, relembra ele. Atualmente, um rapaz está sendo capacitado para também projetar os filmes na sala de cinema barbosense.
O cinema em Caxias A cidade teve em 1908 sua primeira sala de cinema, o Cine Juvenil, que recebia jovens intelectuais e casais cultos, mas ainda era considerado um programa para a minoria. Foi nos anos 50, no seu auge, que o cinema ganhou espaço em Caxias com os famosos matinês. Ao todo, eram cinco salas de cinema de calçada: Ópera, Guarany, Central, Imperial e Real. Nessa época, as salas eram frequentadas nos finais de semana por centenas de pessoas. Considerado um ponto de encontro, principalmente, para os jovens, o cinema já tinha ganhado a população que ia tradicionalmente todos os domingos aos matinês. Com muito glamour, o cinema era uma extensão do clube social, afinal, era espaço de paquera, de divertimento e até de troca de gibis. Como um marco
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na infância e adolescência dos jovens da época, o cinema passava a fazer parte da vida de todos os caxienses. Um documentário de 2005 aborda as histórias das cinco maiores e mais frequentadas salas de cinema de calçada de Caxias do Sul. O longa Efeito Dominó foi produzido pela produtora caxiense Absoluta e dirigido e escrito pelo jornalista Emilio Caio Ferrasso. No documentário, professores de cinema, jornalistas, operadores de cinema, historiadores, pesquisadores e frequentadores falam sobre suas lembranças, sobre o movimento que as salas causaram no setor cultural do município e, logo após, sobre o fim trágico das grandes salas de cinema, que resultou na falência das casas.
Cinema Sobre o Cine Ideale Em atividade desde 1992, o Cine Ideale é a única sala de cinema em Carlos Barbosa, que também recebe público de cidades da região como Garibaldi, Barão e São Vendelino. Administrado pela Associação de Cinema, Cultura e Arte (ACCARTE), o Idelae é um dos poucos “cinemas de rua” que ainda sobrevive em meio às redes cinematográficas instaladas em shoppings e grandes centros.
A sala funciona no prédio da antiga estação férrea, que ainda é preservado pelo Poder Público como patrimônio histórico. Além de promover a sétima arte para os moradores da cidade e arredores, a ACCARTE também apoia outras atividades de cunho cultural e de interesse social, como shows, teatros, palestras e debates. A barbosense Maria Cristina Chies, que fez parte do primeiro grupo da Associação do Cinema, ressalta o princípio de atuação da ACCARTE na cidade. “Nunca tivemos compromisso com uma distribuidora e, além do mais, não objetivávamos lucro, apenas arrecadação suficiente para mantermos o cinema”, afirma ela, lembrando de muitos títulos que foram exibidos somente em Carlos Barbosa, enquanto outros cinemas adotavam apenas filmes lucrativos, que rendiam bilheteria, deixando os interesses culturais em segundo plano. 21 anos depois, o Cine Ideale mantém a mesma premissa: levar cultura à comunidade, sem fins lucrativos. Presidida atualmente por Crisitano Piacentini, a Associação conta com aproximadamente 10 sócios, que contribuem com uma mensalidade e também com trabalho voluntário (cuidando das sessões durante a semana). Foto: Domingos Mancuso
Cine Ópera foi a principal sala de cinema de Caxias do Sul
Equipamento de segunda geração que projeta as imagens na tela do Cine Ideale, em Carlos Barbosa
As sessões podem ser apreciadas por um valor relativamente baixo se comparado ao preço pago em outros cinemas. Com o valor arrecadado, A associação cobre o valor do filme e despesas com a manutenção e administração da sede, visando ainda uma reforma no local. “Estamos buscando recursos federais para executar um projeto de reforma que inclusive já temos no papel”, conta Piacentini, com a ideia de que o “cinema de rua” de Carlos Barbosa perdure por muitos anos. Os entrevistados destacam que, a cada sessão de matinê, quase duas mil pessoas eram reunidas nas salas, o que era considerado um número extraordinário para a época. Eles também ressaltam a grande espera da população pelas estreias de famosos filmes nas salas. O documentário aborda o motivo do fim das salas de cinema de calçada em Caxias. A facilidade na aquisição de televisores a cores e de videocassete foram fatores determinantes. Além disso, os proprietários não investiram com a modernidade das salas, dividindo-as em várias, e oferecendo mais opções de filmes. O longa destaca que o fim das salas causou a perda de valores histórico e culturais para Caxias. Quando fechadas, as salas foram transformadas em locais como garagem, banco, bingo, loja de sapatos e até depósito de farmácia.
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Dança
A dança contemporânea e a liberdade de movimento que permite uma (movimento), outra (pesquisa) e que, principalmente, gera a integração das duas (movimento e pesquisa) Pense na seguinte palavra: dança. Provavelmente passou pela sua cabeça uma menina graciosa com um coque no cabelo usando uma sapatilha com ponta de madeira e que executava movimentos delicados e graciosos. Para alguns, a dança é isso. Apenas isso. Para outros, a dança é a expressão do corpo pura e simples, que pode ser expressa quando se ouve uma música ou num simples e puro instinto. Mas existem pessoas que enxergam qualidades de movimento em todos os corpos existentes, sejam eles humanos ou não. É esse o pensamento de Matheus Brusa. Bailarino, iluminador, cenógrafo, músico, ator, videomaker e coreógrafo, hoje é um dos nomes mais respeitados no país em relação à dança contemporânea. As muitas atividades colaboram para a criação coreográfica. “Fazer muitas coisas numa mesma obra ajuda a não desalinhar o discurso, de ir para um lado que eu não quero. […] E isso me ajuda na hora de compor”, afirma o multifacetado Matheus. Mas afinal, o que é essa dança? Nem Matheus, nem sua companhia de dança (que leva o nome dele), nem os livros e nem o Google (por incrível que pareça) têm uma definição clara e universal do assunto. Mas uma certeza todos têm: é uma dança que não possui uma técnica específica. As fontes, tanto livros impressos quanto veículos online divergem do assunto quando se trata de datas. O que se sabe é que a dança contemporânea surgiu entre as décadas de 1950 e 1960 a partir da dança moderna – movimento que propunha a ruptura com o ballet clássico (aquela que eu descrevi no início desta
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matéria, dos movimentos delicados e graciosos). A dança moderna queria fugir dos padrões estabelecidos pela dança clássica, mas ainda assim possui nomenclaturas e regras. Já a dança contemporânea é uma coleção de sistemas e métodos desenvolvidos a partir da dança moderna e pós-moderna. Sendo assim, o que menos se tem são regras e nomenclaturas. A dança contemporânea utiliza desde técnicas teatrais como improvisação e contato-improvisação, passando por técnicas de outras modalidades de dança e exercícios corporais até estudos cognitivos. É nessa parte que se pauta a criação da Companhia de Dança Matheus Brusa.
“Pesquisa-experimento-criação-movimento” Originada em Caxias do Sul, o grupo existe desde 2007 e sempre utilizou em seus trabalhos a pesquisa: análise do corpo em determinadas situações ou sob determinadas condições. Foi assim que nasceram criações como Gaudério (que nada mais é que a análise experimental da chula), Bipolar (que trouxe a pesquisa de como o quente e o frio afetam comportamentos e temperamentos humanos – trabalho este que contou com participação de bailarinos gaúchos e nordestinos) e Playmobile (coreografia infantil que estudou o comportamento do corpo dos bonecos de Playmobile). Um dos pensamentos que permeiam a Companhia como um todo é a ideia de que um bailarino tem que pensar. - Os bailarinos cansam muito mais pensando enquanto dançam do que fisicamente – afirma Matheus. O processo de criação das coreografias é algo simples: após os “intérpretes-criadores” (modo como Matheus
Josie
Dança chama seus bailarinos) entrarem nas pesquisas a serem desenvolvidas, fazem-se listas de acordo com o assunto e estudam-se qualidades de dança a partir dos tópicos destas listas. “Eu dou o brinquedo e as instruções e os deixo brincando”, brinca Brusa.
A Criação Interpretada “E o mundo fica soterrado, o bem fica soterrado sob a passiva aceitação de que o mundo é assim mesmo e não adianta mudar.” A frase final do texto da coreografia Silêncio dos Fatos (2006) mostra a real intenção das pesquisas propostas pela Cia. de Dança: sair do comodismo das sequências coreográficas que mais se preocupam com ideais estéticos (no sentido não-filosófico do termo) do que com a reflexão que as artes provocam, ou deveriam provocar. Isadora Martins, bailarina da companhia, afirma que as pesquisas instigam a criação, a percepção de qualidade de movimento. “Elas ajudam a ver o mundo de outra forma, a mentalidade muda depois de uma pesquisa”, afirma a jovem premiada em festivais de qualidade, como o de Joinville, considerado o maior do mundo. Já Shaiane Giusti salienta o fato de que os integrantes têm idades muito diferentes (que variam de 13 a 42 anos), mas que em palco aparentam ter a mesma idade. Em relação às pesquisas, ela fala que “quando se entra numa pesquisa, não se consegue mais fazer algo sem pensar em qualidades de movimento”. Diego Santos, solista da coreografia Hipotálamo (coreografia resultante da pesquisa sobre a região do encéfalo responsável pelos arrepios), comenta que o contemporâneo muda o pensamento em relação a dança. O fato da pesquisa ser tão profunda, de instigar a descobrir coisas que tu ainda não tentou ou não sabe que pode fazer, faz descobrir coisas que o hip-hop (modalidade que também pratica) não tem. O bailarino mais antigo (não necessariamente o mais velho) da companhia, David Cruz salienta a importância de pensar no porquê dos movimentos – e acaba os levando para a vida. O que despertara o interesse dele nesta modalidade foram as “técnicas”, mas acabou se apaixonando pelo exercício de pensar. Quando ingressou no grupo, em 2010, era um aluno cheio de “manias”. Após a pesquisa para a coreografia “Léxico” (que conta a história da Língua de Sinais através da linguagem de sinais), essas
manias desapareceram quase que por completo.
Sociabilizando a Dança Contemporânea Embora o contemporâneo tenha suas origens na década de 1950, ainda não é um estilo popular a todas as pessoas. Mas a quê se deve este fenômeno? Ao espaço que se dá a modalidade? Às peculiaridades deste gênero? Ao interesse que se têm em dançar uma “dança de louco”? Quando se fala nisso, não se quer criar um rótulo desta dança, mas sim trazer à luz o que se fala a respeito disso. Katherine Brusa, produtora cultural do Ballet Margô (escola que sedia os ensaios da companhia), lembra a dificuldade que se tem em formar público cativo: – “Em 1998, quando comecei a dançar contemporâneo, muitos desconheciam esta dança. Trazer público para assistir espetáculos era muito difícil. E os poucos que conheciam diziam que era dança de louco, que é se debater, é se sacudir. E realmente a maioria que conhece acaba queimando o filme da modalidade. O desconhecimento causa a falta de interesse – relata Katherine. Mas quem está em outras modalidades e se aproxima, mesmo que de longe e apenas visualmente da “prima pobre” da dança (apelido ironicamente dado por Katherine), acaba querendo fazer aulas. “Hoje, tenho alunas de oito, nove anos, me dizendo que não querem mais fazer ballet, mas somente contemporâneo. Pais pedem quando os filhos vão poder começar as aulas de contemporâneo”, conta a produtora, salientando ainda que este fato é importante na formação de público. Hoje, Katherine credita muito a Matheus o fato de tirar do contemporâneo a ideia de que “é uma modalidade que não cabe em outros estilos”. Ruptura essa que abriu espaços para as crianças que dançam contemporâneo mostrarem suas habilidades em festivais de dança. Ruptura essa que dá a Cia. de Dança Matheus Brusa destaque nacional. “A companhia leva o meu nome, mas é de todos os bailarinos”, enfatiza Matheus.
Na foto ao lado, a bailarina Isadora Martins em seu solo “Magnético”. Foto: Acervo Pessoal/Reginaldo Azevedo
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É uma forma de levar alegria a quem já não tem mais motivos aparentes para sorrir
Foto: Objetiva
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rrancar risadas nos corredores de hospitais é um dos objetivos do Projeto Médicos do Sorriso, formado em 2004 por um grupo de atores de Caxias do Sul. O trabalho dos profissionais encanta quem vê, leva esperança para quem participa e diverte pacientes, familiares e até mesmo, o corpo médico.
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Um desejo antigo, uma experiência de enfermidade e uma oportunidade de aperfeiçoamento foram os grandes motivos para a criação do grupo de teatro idealizado e dirigido por Davi Souza. Após passar um período hospitalizado, em que os companheiros de quarto faziam brincadeiras para animá-lo, Davi encontrou nessa situação uma forma que possibilitava trabalhar o teatro, através da arte clownesca, em um ambiente hospitalar. Davi então fez o curso que formava palhaços em Porto Alegre, reuniu artistas especializados e resolveu colocar em prática o projeto.
Foto: Mau rício Conc atto
Apesar de levar a alegria pelos corredores, trabalhar nos hospitais não é só diversão. A doença, e até mesmo a morte, andam lado a lado com o sorriso e as gargalhadas. Por isso, essa atividade precisa de artistas qualificados e preparados para encarar esta realidade. Para atingir os objetivos, é preciso contar com uma equipe de profissionais dedicados que, em sua maioria, vivem inteiramente da arte.
O Projeto Médicos do Sorriso foi apresentado na Festa da Uva de 2004, tendo uma parceria com a Unimed. O grupo de atores, inicialmente, alegrava o Pronto Atendimento (PA) e, mais tarde, passaram a visitar os pacientes do Hospital da Unimed, inaugurado em dezembro de 2004. Em 2011, uma incompatibilidade de interesses entre a nova direção do hospital e o grupo teatral pôs fim aos sete anos de parceria. Desde então, os Médicos do Sorriso buscam ajuda de empresas para manter o projeto em funcionamento. O projeto tem apoio da Lei Federal de Incentivo a Cultura (Rouanet) desde 2012, e está em fase de captação de recursos. Com isso, as organizações privadas podem investir parte do seu imposto de renda para incentivar a causa. A expectativa é que até o final desse ano os Médicos do Sorriso voltem a atuar expandindo seus serviços para o Hospital Geral, Hospital Pompéia e também para o Hospital Conceição, em Porto Alegre.
Foto: Mary
leen K. Horstmann
Muitas vezes, pequenos gestos fazem uma grande diferença na vida dos profissionais e dos pacientes. “A arte é o tocar, chegar dentro do coração das pessoas e isso faz você pensar: quero fazer tudo de novo, fazer mais disso e para o resto da minha vida”, relata Davi. De acordo com o diretor, ver um paciente desanimado, muitas vezes sem força para dar um simples ‘oi’ e conseguir deixá-lo animado, com um sorriso no rosto quando se despede, não tem preço. Viver do teatro não é só viver de improviso. Como qualquer outro profissional, de qualquer área, é necessário estudo e dedicação para que o resultado final saia como o planejado. “Viver do teatro é um desafio diário. Tu dorme pensando em projetos, acorda pensando em projetos e fica pensado como vai fazer com que as pessoas comprem sua arte. Somos heróis da resistência”, conclui Davi. Contar uma história usando a ludicidade, fazer do teatro uma inspiração para as pessoas, nem sempre é fácil, principalmente sem o investimento necessário. Assim, o teatro e todas as manifestações da arte, não são somente uma “palhaçada”. Mudar a realidade de alguém é um trabalho árduo e ao mesmo tempo, prazeroso. Se dedicar todo e cada dia para fazer uma pessoa sorrir é um trabalho sério e que deve ser apreciado, investido e respeitado.
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A apreciação pela arte cresce a cada dia, e o teatro está aos poucos conquistando o público, mas ainda falta apreciação. Francisco Carlos Vieira de Sá, que trabalhou na Associação Artistas no Palco na Cidade de Bento Gonçalves e também trabalha no grupo de teatro Malagueta, acredita que o teatro ainda precisa cair no gosto popular, pois as pessoas não têm o hábito de ver e de valorizar o trabalho feito na região. “É preciso pegar o que já existe e trabalhar mais. Tornar um hábito na vida das pessoas. Hoje já existe muita coisa boa, só falta o público”, conta o ator. Francisco ainda comenta que é difícil viver só da arte e, muitas vezes, a saída é criar uma empresa. “Tu acaba tendo que transformar o teatro em um empreendimento pra poder sobreviver. Muitas vezes não tem o retorno financeiro desejado, mas tem outro tipo de retorno, de muito mais valor”, afirma Francisco. A arte não tem faixa etária, seja para apreciá-la ou para viver dela. Caciano Kuffel (22), jovem estudante de Publicidade e Propaganda da Universidade de Caxias do Sul, atua no cenário artístico há oito anos. Desde os 17 anos ele vive da arte e há três abriu sua empresa de eventos artísticos com a sócia Maryleen Kathelin Horstmann (20).
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rylee Foto: Ma
Caciano comenta que o teatro empresarial é o mais rentável atualmente e diz que cidade de Caxias é uma das poucas do estado que incentiva a cultura e a arte com projetos. “Dá sim para viver da arte, mas é complicado. Talvez falte um pouco de compreensão das pessoas com a classe artística como um todo, principalmente no teatro. O problema é que as pessoas não entendem, parece que é fácil e todo mundo pode fazer”, afirma Caciano. Maryleen trabalha com arte desde os 13 anos e diz que uma das dificuldades de viver da arte é o fato dela ser imensurável. “Por tu não ter um produto físico, as pessoas acham que o teu trabalho pode ser trocado por qualquer coisa. Querendo ou não, nós (atores) nos frustramos muito. A gente estuda tanto... e quando agridem o teu trabalho agridem a você, porque você é o teu trabalho. Se o cliente não gostou, não é o produto que deu problema, ele não gostou de ti. Às vezes acontece, faz parte”, conta a artista. Trabalhar com arte, em especial com o teatro, é coisa séria. Exige muito preparo. Somente assim, é possível transportar o público para este universo mágico onde tudo é possível, e fazer com que eles esqueçam, pelo menos por alguns instantes, seus problemas e dificuldades.
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Foto: S
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Ensaio
Ao final de cada espetáculo, o resultado esperado não é apenas financeiro, mas sim a alegria e satisfação do público. É incrível quando o sorriso é o portfólio do profissional.
A palavra “palhaço” deriva do italiano paglia, e quer dizer palha. Esta era o material usado no revestimento de colchões. O nome começou a ser usado porque a primitiva roupa dos palhaços era feita de um tecido grosso e listrado, e afofada nas partes mais salientes do corpo com palha. Esse revestimento de palha os protegia das constantes quedas. Já a palavra clown é de origem inglesa, do século XVI e é derivada do termo declod, que significa “camponês”.
O clown, ou palhaço, é considerado lírico, inocente, ingênuo, angelical e frágil. Ele não interpreta, simplesmente é. É o próprio ator expondo seu ridículo, mostrando sua ingenuidade. Na busca desse estado, o ator não busca construir um personagem, mas sim encontrar essas energias próprias. Embora seja muito vinculado aos circos, o palhaço pode atuar também em espetáculos abertos, teatros, programas de televisão ou em qualquer outro ambiente. É geralmente vestido de um jeito engraçado, com trajes desproporcionados e multicoloridos, maquiados e utilizando acessórios característicos.
Caciano Kuffel e Maryleen Kathelin Horstmann são artistas, palhaços, sócios, amigos e namorados. Eles namoram há três anos e confessam que é complicado separar as coisas. Muitas vezes, por gostar tanto do trabalho, ficam falando sobre projetos e acabam misturando as coisas.
Contudo, trabalhar juntos tem suas vantagens, pois estão sempre na companhia um do outro, inclusive nas viagens de trabalho, o que proporciona muitos momentos para passear e curtir como casal.
Fotos: Jorian Peçanha
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Escultura
Em um lugar onde ninguém deseja estar – e também não muito frequentado – esculturas das mais diversas referências compõem um cenário de “dar arrepio”. Sim, o cemitério reúne obras de arte com carga histórica e procedência normalmente desconhecida por quem visita o local
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Fotos: Milena Schäfer
Apesar de ser um lugar triste e, para alguns, muito assustador, o cemitério pode se tornar uma verdadeira exposição de artes se olhado com a devida atenção. Isso já ocorre em alguns países da Europa e Argentina, por exemplo, onde os mausoléus e as melancólicas esculturas das lápides integram o roteiro turístico. O termo “arte tumular” ou “arte funerária” é usado para designar obras feitas para permanecerem em cima das sepulturas nos cemitérios e igrejas. Esta arte é uma forma de representação que está ligada à cosmovisão de determinado contexto histórico, ideológico, social e econômico, interpretando a vida e a morte. Essa interpretação pode ser feita através de um conjunto de símbolos ou de uma obra narrativa, utilizando-se materiais variados como o mármore, o granito, o ferro fundido e o bronze.
Escultura
Este tipo de arte atingiu seu apogeu nos séculos XVIII e XIX, sendo hoje menos utilizada em virtude do avanço do cemitériojardim. No município de Garibaldi, na Serra Gaúcha, o cemitério foi recentemente incluso no roteiro turístico, tornando público o que costuma ficar no desconhecimento, até mesmo da comunidade local, por trás dos muros que o cercam. Iniciado em 1935 em seu atual endereço, o Cemitério Público Municipal de Garibaldi conta com uma série de esculturas e obras arquitetônicas que tornam o ambiente mais bonito e, dependendo do ponto de vista, mas “arrepiante”. São lápides antigas e novas, que carregam consigo histórias de vida. Importantes personalidades da antiga comunidade garibaldense, que muito contribuíram para o desenvolvimento da cidade, também possuem seu espaço no local, cercados por obras de arte encantadoras e até mesmo um busto, como no caso do importante engenheiro Agostinho Mazzini, falecido em 1933. Os símbolos utilizados nas lápides, em geral, remetem a um significado diferente do objeto construído e colocado no túmulo, como, por
Sepultura da família Mazzini, no Cemitério Público de Garibaldi / RS
exemplo, uma tocha com fogo, que remete à purificação da alma após a morte, ou seja, a tocha tem seu significado real transformado em
um símbolo de purificação. Brasões e suntuosidade nas lápides eram a demonstração de importância e poder.
Cemitério Público Municipal de Garibaldi - RS Não se tem registros por escrito que especifiquem o ano de construção do primeiro cemitério no município de Garibaldi. Contam os moradores mais antigos que o primeiro cemitério localizava-se ao lado da Igreja Matriz e que ali teriam sido enterrados os nossos primeiros povoadores da então colônia Conde D´Eu, atual Garibaldi, e que chegaram no ano de 1870. Anos mais tarde, foi construído um segundo cemitério. Este localizava-se em cima de um morro, em um local de difícil acesso. Com o passar dos anos, o cemitério do morro também ficou pequeno para a
crescente população, além da dificuldade de acesso. Assim, o Intendente e Primeiro Tenente Brigadeiro Dormelindo de Oliveira resolve comprar das Irmãs do Colégio de São José um terreno situado na Estrada Buarque de Macedo, com 19.250 m², para a construção do novo e terceiro cemitério da cidade, pelo valor de 5.000$000 (cinco contos de réis), no ano de 1934. Em janeiro de 1935, começa então a construção do novo e atual cemitério da cidade. O escultor e pedreiro responsável pelos primeiros mausoléus e túmulos foi o Sr. Gringuelli, que era morador de Garibaldi e tinha nacionalidade italiana.
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Escultura
MATERIAL: antigamente era usado o mármore de Carrara. Cada vez mais raro, passou a ser substituído pelo mármore comum, granito ou bronze. PIETÁ: a escultura de Maria com Jesus recém crucificado nos braços representa o desejo de que a alma seja bem recebida. ANJO QUE APONTA: quando a mão indica o céu, significa que o falecido era considerado uma pessoa boa e espera-se que ela vá direto para o paraíso. ANJO PENSATIVO: um anjo pensativo, com a mão no queixo, significa que está refletindo sobre a vida do falecido e não existe certeza sobre a absolvição de seus atos em vida. GUIRLANDA: simboliza o triunfo da vida sobre a morte. PATA DE FELINO: patas esculpidas nas quinas são usadas para lembrar que o falecido era o responsável
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pelo sustento da família. COLUNA PARTIDA: representa o túmulo do último membro de uma família tradicional. ESCADA: intervalada em degraus finos e largos, representa a vida de altos e baixos que o morto teve. CRUZ: representa a interseção do plano material com o transcendental em seus eixos perpendiculares. VASO: geralmente representado vazio, representa o corpo separado da alma. AMPULHETA: remete à utilização e fim do tempo de vida terrestre, e seu reinício em outro plano. GLOBO: remete à utilização e fim do tempo de vida terrestre. FLORES, FOLHAS E FRUTOS: representam a vitória da alma humana sobre o pecado e a morte. São associados, com frequência, à nobreza, à beleza e à precocidade.
Literatura
Sexo. Nada é tão normal e ao mesmo tempo tão intrigante. Talvez a morte o seja, mas nem a morte tem o mesmo apelo, o mesmo magnetismo da sexualidade humana Foto: Luiz Henrique Batista
O sexo sempre foi um fator comum na literatura. Diversos gêneros exploram o tema em maior ou menor escala. É perfeitamente normal. Sempre existiu, também, um gênero da literatura específico para discorrer sobre essas questões sem medo de ser feliz: a literatura erótica. Até 2012, a literatura erótica sempre ocupou um cantinho obscuro nas livrarias brasileiras. Foi então que surgiu aquele livro que eu ouvi falar, você ouviu falar, todo mundo ouviu falar. Isso mesmo, “50 Tons de Cinza”, o best-seller da autora inglesa E. L. James. Alcançando a impressionante marca de mais de 10 milhões de exemplares vendidos nas seis primeiras semanas de sua publicação europeia, em 2011, Fifty Shades of Grey tirava a literatura erótica do cantinho obscuro e a colocava nas vitrines de livrarias do mundo todo. No auge do sucesso da obra, não havia uma livraria nas grandes cidades brasileiras que não tivesse uma pilha de exemplares exposta na vitrine, para todo mundo ver e se interessar. Uma verdadeira Amsterdam da literatura.
Mas qual o segredo do estrondoso sucesso do romance entre a destrambelhada Anastasia Steele e o milionário bonitão Christian Grey? O que “50 Tons de Cinza” tem que outros romances do gênero não têm? Alguns dirão que o sucesso da obra foi alavancado pela mesma ter se originado de um fan fiction – trabalho feito de fã para fã – de “Crepúsculo”. É realmente provável que os vampiros de Stephenie Meyer tenham
brilhado tanto no sol que sua luz tenha dado o empurrãozinho inicial que “50 Tons de Cinza Precisava”. Mas a carona no sucesso dos vampiros brilhantes e lobisomens sem camisa não explica 10 milhões de exemplares vendidos em seis semanas. Não mesmo. Para tentar explicar esse mistério, trazemos uma entrevista com o crítico literário Gabriel Utiyama, 25 anos, que leu “50 Tons de Cinza” e encarou o desafio de falar a respeito desse fenômeno literário e sobre literatura erótica em si.
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Literatura Sobre quebrar tabus Revista Entrelinhas: Qual o grande atrativo de livros como “50 Tons de Cinza”? Gabriel Utiyama: Acredito que erotismo e sexo encantam e fascinam boa parte dos seres humanos. É algo realmente comum, mas cercado de tabus e preconceitos. Penso que “50 Tons de Cinza” conseguiu quebrar um pouco essa visão de que sexo é algo a ser escondido.
mulheres porque acrescenta contexto ao erotismo. Não se trata apenas de um conto erótico onde só se vê sexo e nada mais: existe uma história que acrescenta o pano de fundo, a fantasia com a qual elas podem se identificar. Homem, a meu ver, é muito mais visual e direto. É imediatista, quer ver ação e se contenta c o m i s s o . Não por acaso é
O maior atrativo de “50 Tons de Cinza” é que o livro conseguiu contar uma história romântica, ainda que fora dos padrões, ao mesmo tempo em que inseriu o elemento erótico como algo a ser explorado e almejado. Para mim, o sadomasoquismo presente no livro não figura tanto como atrativo, mas sim a quebra do tabu. Livros eróticos, em sua maioria, são vistos como literatura de segundo nível, mas começo a ver uma mudança nessa visão.
R.E.: Parece que, de fato, a maioria dos fãs do gênero são mulheres. Por que você acha que isso acontece? Seria um “bloqueio” da parte dos homens? G.U.: Acredito que esse tipo de literatura chame mais a atenção das
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R.E.: Literatura erótica não é algo realmente novo. Na verdade, existe há muito tempo, embora fosse considerada brega e de gosto duvidoso. Agora há essa “glamourização” do gênero. Por que você acha que isso acontece? Acha que vai durar ou é uma moda com prazo de validade? G.U.: Acho estranha a utilização de termos como “brega” e “gosto duvidoso” quando temos grandes autores como Marques de Sade e Hilda Hilst, os quais possuem obras muitíssimo aclamadas e repletas de conteúdo erótico. O que acontece é que, como mencionado, sempre houve muito preconceito, o que fez com que as obras mais recentes de literatura erótica caíssem em um grande estereótipo de escrita. Vide a quantidade de livros de banca que são impressos.
R.E.: Pelo que você observa, qual o público alvo desse livro, ou o perfil do(a) leitor(a)? G.U.: É difícil precisar esse público porque muita gente lê e não admite. Ainda existe muito preconceito e tabu. Diria que essa literatura, quando feita nos moldes de “50 Tons de Cinza”, tem maior apelo ao público feminino. Porém, creio que qualquer um disposto a abrir a mente e conhecer novos pontos de vista a respeito de sexo e erotismo se encaixa no público alvo da obra.
de Gelo e Fogo”, do autor George R. R. Martin, por exemplo, apresentam muito erotismo, apesar de não ser o foco. Mas livros focados em erotismo definitivamente não são excludentes a uma boa literatura.
o homem o principal consumidor de filmes pornográficos. Então, penso que não se trata de um “bloqueio”, apenas de interesses diferentes.
Acredito que veremos uma queda no número de livros eróticos vendidos, como acontece com qualquer moda, mas uma grande barreira já foi vencida, então é possível que ótimos livros do gênero apareçam no futuro.
R.E.: Você acredita que um livro desse gênero possa conter uma trama realmente envolvente, personagens profundos e demais características de um grande romance? G.U.: Sim, com certeza. Não são poucos os livros que contêm cenas de sexo (às vezes explícitas, às vezes não), mas que, juntamente, figuram um ótimo desenvolvimento de narrativa e personagens. Os livros de “As Crônicas
Gabriel Utiyama, publicitário e crítico literário.
Música A arte de construir instrumentos musicais faz parte da vida de um caxiense e sua família Desde pequeno, o empresário Agostinho Cardozo vive em meio à música. Para ele, a música é lazer, trabalho e, principalmente, paixão. Agostinho confecciona instrumentos de cordas em seu atelier, localizado no bairro Desvio Rizzo, em Caxias do Sul, ao lado de sua esposa e de seus filhos. Há cerca de 20 anos, Agostinho dedica-se a luthieria* (veja no Box o significado dessa palavra), arte que está na família há quatro gerações. “Fui criado no meio da madeira, das máquinas, de músicos e instrumentos. Mas não comecei por aí. Eu era padeiro e nas horas vagas fazia violão”, explica. Segundo ele, o gosto por música e pela construção
Agostinho Cardozo fabrica e conserta instrumentos musicais artesanais
dos instrumentos começou desde muito cedo. “A música é minha vida”, conta entusiasmado. Apesar de haver diretrizes técnicas a serem seguidas, o principal segredo para um bom instrumento é a paixão, sentimento que envolve toda família do artesão musical. “Todos ajudam, inclusive minha filha é pianista e meu filho toca violão clássico”, observa ele.
Parte do atelier Dominus Luthier, da família Cardozo
Sempre acompanhado de um rádio e, consequentemente, de uma boa música, Agostinho constrói e conserta todos os tipos de instrumentos de corda, desde guitarra até harpa. Para ele, não há instrumento difícil de construir, mas elege um preferido. “Violão clássico é meu foco, pois toco um pouco”, afirma.
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Música
Além de fabricar e restaurar os instrumentos, Agostinho mantém ainda uma escola de luthieria* para quem quiser aprender sobre essa arte tão minuciosa.
Apesar de pouco conhecida na região, a luthieria é um trabalho antigo, cujo termo se refere à arte de construir instrumentos musicais. Para exercer essa profissão, é necessário conhecimentos de outras áreas, como marcenaria, pintura, desenho e até química.
Além disso, essa atividade exige muita dedicação e habilidade. Quem faz esse trabalho é chamado de luthier, termo francês que significa “fabricante de alaúde”.
Quem tiver interesse de conhecer um pouco mais sobre o trabalho de Agostinho, pode ligar para (54) 3224.5795 ou (54) 9113.5827.
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A empresa Dominus Luthier fica no bairro Desvio Rizzo, Rua Domingos Bianco, 183.
Pintura Pintor italiano, deixado à sombra de Aldo Locatelli, começa a ser redescoberto Era 1953, a construção de uma nova igreja estava concluída em Caxias do Sul. Na cabeça do pároco uma ideia: colorir as paredes e o teto cinza. A imponência da edificação pedia algo grandioso. A convite do padre, desembarcam em Caxias dois pintores italianos, nada melhor para uma cidade onde a maior parte de sua população descende deste mesmo país, para dar aos muros da igreja ares magistrais. A igreja era São Pelegrino, um dos maiores cartões postais da cidade, e os pintores eram Aldo Locatelli e Emilio Sessa. Locatelli tinha prestígio como grande pintor sacro. Com o apoio de Sessa, havia feito trabalhos na Catedral São Francisco de Paula em Pelotas, na Catedral Nossa Senhora da Conceição em Santa Maria e no Aeroporto Salgado Filho em Porto Alegre. Sessa também possuía grande prestígio como pintor na Itália, apresentando a mesma genialidade de seu companheiro de tintas. O tempo, e o descaso com a verdade histórica, glorificaram um só autor pelos trabalhos: Aldo Locatelli. Como já havia se tornado um pintor de renome no Estado, ganhou, por parte da população, todos os méritos, levando Sessa ao ostracismo. O Instituto Cultural Emilio Sessa (ICES), criado em 31 de outubro de 2008, veio para corrigir esses enganos com a autoria das obras do pintor. “A intenção do Instituto não é indispor a história e o legado artístico de Locatelli e Sessa e sim dar ao pintor o direito de ser reconhecido por sua obra, retirando Sessa da sombra de
mero ajudante de Locatelli”, diz Arnoldo Doberstein, coordenador de pesquisas do ICES. É injusta a classificação de Emilio Sessa apenas como companheiro de Locatelli, pois em diversas ocasiões realizou trabalhos solos. “A obra do pintor está expressa em diversos locais, como nas igrejas da Sagrada Família e Santa Tereza em Porto Alegre, nas quais podemos notar a leveza de sua pintura. Sua representação aos anjos como figuras dóceis e de expressões reflexivas. Ele também usou da pintura indireta dos elementos sacros, obrigando aos que apreciam suas obras interpretarem os traços com o olhar catequético. Essa é a principal diferença, e a mais relevante, entre as pinturas de Sessa e de Locatelli”, afirma Doberstein Um dos fatos curiosos resgatados pelo ICES é sobre os 7 anjos de misericórdia, figuras registradas nas paredes da igreja de São Pelegrino, um caso de pintura a quatro mãos. Segundo Doberstein, Aldo Locatelli fez o cartone, o desenho no papel, que posteriormente é transferido com grafite para as paredes, servindo de guia para o pintor, mas talvez por ter começando a obra da via sacra na igreja, quem pintou os desenhos nas paredes foi Sessa, e isso é comprovado por documentos deixados pelo padre Giordani, o pároco da igreja à época. “Neste caso não se vê a leveza angelical de Sessa nos anjos, mas a força que eles ganhavam com Locatelli, já que a criação foi dele e somente a execução de Sessa”, ressalta ele. Mas os traços
(*Obra: Estudo da Madonnina, crayon sobre papel, 1942-43, Coleção Particular Familia Sessa)
Foto: ICES
característicos de Emilio Sessa são vistos nas nuvens que servem de fundo para as imagens. As obras exclusivas do pintor podem ser conferidas também, em Caxias do Sul, na capela do colégio São José. E uma parceria tão grande e frutífera como a dos dois pintores não poderia ter um desfecho menos intrigante como o que aconteceu. “Sessa pintava um mural na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, enquanto Aldo Locatelli estava ali internado”, conta Doberstein. Aldo Locatelli veio a falecer na época em que seu amigo terminava a pintura no mesmo hospital. Ao contrário do que muitos conspiradores afirmam, nunca houve divergências graves entre os dois pintores, isso se comprova pela carta enviada por Sessa aos familiares de Locatelli na Italia. “Naquela carta enviada por Emilio Sessa para os familiares de Locatelli, que continuavam na Italia, pode-se notar a tristeza expressa por ele através das palavras. Certamente são palavras de que quem acaba de perder um grande amigo”, afirma Arnoldo. Quem quiser saber mais sobre as obras de Sessa, o ICES possui canal de comunicação através do site do Instituto: emiliosessa. com.br.
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Pintura
O tatuador Felipe Videira começou a se interessar por tatuagem quando conheceu, num curso de desenho, um professor que também tatuava. A partir daí, foi só uma questão de tempo até transferir seu estilo do papel para a pele. Com traços firmes e muitas cores combinadas, seu trabalho se destaca não apenas pela qualidade, mas também pela dinamicidade que o leva a passear por diversos estilos, do novo estilo, ao realismo, passando pelo neotradicional, caricatura e até uma pegada mais comics. O estúdio de Felipe fica na área central de São Paulo. Lá ele também ministra cursos de tatuagem, oferecendo uma introdução à área técnica aos que gostariam de tatuar e de ter a arte como profissão, mas não sabem por onde começar.
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“não há evolução na tatuagem sem conhecimento em desenho” Revista Entrelinha: Primeiro, aquelas perguntas de sempre: quando se interessou pela tatuagem? Há quanto tempo tatua?
Seu estilo de desenhar daquela época e o atual são muito parecidos? Como foi o processo de encontrar seu próprio estilo de tatuar?
Felipe Videira: Tatuo há aproximadamente uns 7 anos, mas profissionalmente mesmo, há uns 6 anos. Comecei a me interessar pela tatuagem quando tive contato com um professor de desenho que também era e é tatuador e dava aulas de desenho, na época, para mim, em um curso de desenho que fiz.
F.V: Eu praticamente cresci desenhando tudo que via, era daqueles moleques que em vez de sair para a rua jogar bola, preferia ficar em casa desenhando o que via na TV e nas revistas que eu comprava, que eram de muitos estilos, mas principalmente de mangá e até algumas revistas que ensinavam a desenhar. Antes de conhecer o curso de desenho, eu basicamente desenhava mangá, quadrinhos,
R.E.: Antes de começar a tatuar, você estudou desenho.
Pintura desenhos da TV, fotos realistas e alguns cartoons como os da Disney e outros que me agradavam na época. Hoje em dia trago muito desses “estilos” no meu estilo atual, já que faço bastante essa linha, mais de desenho mesmo, cartoon, quadrinhos e realista também, apesar da procura pelos outros estilos ainda ser maior. Também acho que meu estilo agrega algumas características de artistas dos quais eu admiro o trabalho, mas sempre tentando inovar com os traços e cores.
R.E: Você chegou a fazer algum curso de tatuagem ou teve um tatuador que te ensinou? F.V.: Nunca fiz um curso de tatuagem, mas confesso que, talvez, se tivesse feito algo do tipo, com um profissional que eu admirasse, a minha evolução poderia ter sido mais rápida, apesar de eu ainda ter muito chão pela frente. No começo, tive um amigo, que é meu amigo até hoje, e tatua também. Não tinha muita experiência na época, mas o que tinha passou para mim e me ajudou. Depois disso, foi por minha conta mesmo, aprendi muito trabalhando em alguns estúdios pelos quais passei, vi muita gente trabalhar e observei muito. Como eu já desenhava desde pequeno e fazia o curso de desenho, me senti um pouco mais seguro e já comecei a criar meus próprios desenhos para tatuagem desde o começo.
R.E: Onde busca inspiração para desenvolver sua arte? F.V.: Busco inspiração em tudo, filmes, personagens, fotos, animais, acho que basicamente tudo ao meu redor que me chama atenção de certo modo.
R.E: Acha importante que o
tatuador saiba trabalhar com outros meios de se fazer arte além da tattoo? F.V.: Acho não só importante como essencial o tatuador não ser apenas o cara que passa o desenho para a pele, e sim um artista que vive da sua arte. Eu sou suspeito para falar, porque amo pintar, desde shapes até geladeira, telas, folhas com desenhos meus, enfim, a cada dia uma nova descoberta e um novo aprendizado. Gosto muito de pinturas em lugares inusitados.
R.E: Por fim, tem algum recado para os que desejam aprender
a tatuar mas não têm acesso a um curso ou a um mentor que se disponha a ensinar? F.V: O meu recado é simples: “não há evolução na tatuagem sem conhecimento em desenho”. Para mim, a minha bagagem de desenho sempre foi fundamental e me evoluiu mais rápido, então estude sempre desenho e diferentes métodos de ilustração. Depois, mais tarde, como passá-los para a pele e assim por diante. Tente focar em oferecer o melhor para seu cliente sempre, independente do que os outros falem. Isso com certeza vai diferenciar você dos outros.
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Cultura
Religiões com culturas de descendência africana realizam, há centenas de anos, rituais no País Em ritmo de batucada, dança e clima de festa é que algumas religiões, como Umbanda e Candomblé, reúnem fiéis em rituais de adoração a orixás, caboclos, pretos velhos e entidades superiores. A crença, denominada espiritualista, tem em seus encontros a identidade das culturas africana, indígena, e também influências do catolicismo e do espiritismo. Como numa corrente, os conhecidos terreiros ou casas espirituais realizam, quase sempre, seus rituais todas as sextas-feiras à noite. Apesar de todos os preparativos e detalhes em gestos, roupas e acessórios, as sessões começam mesmo depois que os babalorixás – pessoas que recebem as entidades – bebem, fumam e dançam. As bebidas sempre da preferência das entidades superiores que re-
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gem a casa, e o batuque frenético acompanhado das danças circulares soam como convite para os orixás participarem da sessão. O momento de incorporação é realizado através da mediunidade nas sessões espirituais. É o momento em que o doutrinador (pai de santo) se anula, e quem passa a comandar os gestos, as falas e todo o pensar dele é a entidade incorporada. Durante as sessões, as entidades dão assistência às pessoas presentes com passes e orientações. E nos dias que não são realizadas as reuniões espirituais, a maioria dos pais de santo dão orientações através da leitura de cartas e com o jogo de búzios, que são formas dos orixás enviarem mensagens fora de sessões espirituais. Em Caxias do Sul, de acordo com a
Associação de Umbanda, são 240 casas filiadas na entidade. O mistério da mediunidade e da incorporação de entidades é seguido por 0,3% dos brasileiros, segundo o último Censo do IBGE. O presidente da Associação, Saul de Medeiros, explica que o representante de cada casa filiada é avaliado para se tornar membro da entidade. Ele passa por um processo de aprovação do seu trabalho na prática de Umbanda. O objetivo é conhecer seu histórico e sua raiz na religião. Depois disso o centro é cadastrado. Mesmo assim, muitos centros de Umbanda não têm a regulamentação exigida pela Associação. “Nossa associação serve como célula mãe, onde os babalorixás (pais de santo) têm amparo jurídico e são integrados em atividades”, conta.
Cultura A Umbanda, o Candomblé, a Nação e outras mais, são religiões que atravessam séculos e trazem consigo ricos detalhes históricos, culturais e místicos do povo africano, da escravidão e da vida indígena no Brasil. Seus seguidores são os conhecidos pais, mães e filhos de santo. Desde sempre, os praticantes dessas religiões sofrem com o preconceito e, muitas vezes, são vistos com maus olhos por pessoas de outras crenças. Esse receio vem por conta da cultura de rituais e também por causa das conhecidas oferendas feitas às entidades e expostas em encruzilhadas. As oferendas elaboradas por pais e mães de santo são perfeitos banquetes: comidas, bebidas, objetos e enfeites, tudo com muita fartura e do gosto da entidade a quem é oferecido. Antônio Rodrigues, 57 anos, é mais
conhecido como o pai de santo Faneco de Oxalá. Ele trabalha e segue as religiões Umbanda e Nação há mais de 36 anos. Ele explica que os cultos, trazidos da África na época da escravidão, eram praticados nas senzalas à noite e o principal pedido dos negros e índios durante as cantorias e o batuque era para que os orixás os protegessem dos senhores do engenho.
a missão de ajudar os praticantes da religião.
“Para evitar a proibição dessa prática religiosa, os escravos encontraram uma maneira muito sábia: colocavam na frente das imagens dos orixás as estatuetas de santos católicos. Eis aí a sincronia dos santos como São Jorge por Ogum e Virgem Maria por Iemanjá”, explica.
Ao contrário do que a maioria acredita, a Umbanda é uma religião fundada no Brasil, que significa paz, amor e caridade. Ela é uma mistura de religiões africanas como o Candomblé e o Batuque, com o espiritismo de Alan Kardec e até mesmo o catolicismo.
Os pretos velhos, que também são entidades incorporadas por pais de santo, abençoam e dão conselhos às pessoas como forma de caridade. Em suas histórias de vida, os pretos velhos e caboclos foram escravos muito sofridos, e agora voltam com
Segundo pai Faneco, as cores são os principais símbolos que identificam as entidades superiores. E é por isso que cada pai ou mãe de santo utilizam sempre colares e roupas das cores adeptas ao orixá que a rege.
Paz, amor e caridade
A prática de religiões como essas e tantas outras faz parte da pluralidade do povo brasileiro. Assegurada por um governo laico, a liberdade religiosa e de crenças é um direito de todos, desde que não agridam os adeptos de outras culturas de fé.
Elementos da cultura nos centros de Umbanda Atabaque Instrumento de percussão de origem árabe. Serve para manter o ambiente sob uma vibração homogênea e contribuem para que os médiuns permaneçam em sintonia.
Defumação Ato de purificar o ser, o objeto e o ambiente, através da fumaça, expulsa o negativo, através de aromas e ervas, de acordo com a necessidade da utilização. O aroma desperta alguns centros nervosos das pessoas, fazendoos vibrar de acordo.
Guias
É um colar ritual de miçangas, contas de cristal, de louça, de frutos pequenos, construídos de acordo com a Entidade, que designa também a cor de sua preferência. É um elo de ligação entre o médium e a entidade espiritual, de uso pessoal, individual e intransferível.
Sal grosso O sal grosso é assim chamado por não ter passado pelo processo de refino industrial. É um composto químico nominado de cloreto de sódio (cloro e sódio). Os etéreos do sal grosso é que fazem a limpeza fluídica.
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Cultura
Crítico de cinema, colecionador e jornalista - não diplomado são algumas das características de Nesi que, dentre alegrias e dificuldades, segue sua paixão
Rogério é um aficionado por Cinema e leva bastante a sério este tema. Começou a se interessar por cinema pela primeira vez quando estudava no Colégio Nossa Senhora do Carmo em 1954. Uma de suas turmas se reuniu para estudar sobre cinema onde o professor Humberto passava filmes imperiais para seus alunos Além de cinema, Rogério afirma ser aficionado por tudo. Filmes, fotografias, cartazes, revistas, miniaturas, capas de dvd. E tem uma grande coleção de cada gênero. Relata que no município de Carazinho em 1949 assistiu seu primeiro filme “Fantasia”, uma animação da Walt Disney. A partir desse dia Rogério descobriu uma
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paixão pelo mundo do cinema, se interessando não só pelos filmes e curtas em si mas estudando a história por trás de toda aquela arte. Biografia de diretores, atores e atrizes, estúdios de cinema. Do lugar filmado ao equipamento utilizado.
de um amigo. Fitas VHS e DVD’s fazem parte de sua longa coletânea. Podemos encontrar filmes, documentários e novelas do mundo todo e de diversas épocas. A maioria dos arquivos guardados são antigos e difícies de serem encontrados, daí o “invejável acervo”.
Seu acervo é de dar inveja a qualquer colecionador. “O estande não dos mais organizados revela Nesi, mas sempre sei onde tudo está.Futuramente desejo arrumar todo meu estoque de discos, filmes e revistas.”, conta
Rogério Nesi chegou a fazer exposições de todo seu material em diversos espaços culturais do município de Caxias do Sul. Costuma dizer que o principal objetivo de todo seu estudo sobre cinema, não é para si mesmo, e sim levar toda essa história para as pessoas. “Minha alegria é quando alguém se encanta e admira por meus arquivos e meu trabalho”.
Consta em seu patrimônio cerca 4.500 vinis, Rogério ainda afirma ter mais 2.000 unidades na casa
Cultura Porém, por possuir alguns objetos de valor cultural e monetário, Nesi já sofreu roubos e perdas do seu conteúdo.
Sua “vitrola moderna” que Nesi usa para ouvir seus discos. Conta com entrada USB e SD
Para interessados, o colecionador Ruggero Gustavo Nesi possui um blog onde fala sobre cinema específico, onde publica artigos diariamente.
Nesi passou muitas dificuldades em sua carreira. Por conta de um incêndio ele perdeu boa parte de sua coleção. Um fato curioso: em uma ocasião, ao emprestar alguns discos de vinil para um amigo, sem a autorização de Rogério, essa pessoa começou a vender os exemplares e assim prejudicando seu acervo musical.
Um de seus xodós é a miniatura de “Laurel and Hardy (O Gordo e o Magro)” artigo bastante cobiçado por outros colecionadores pelos quais Rogério recebeu propostas para negociá-lo
Diploma da Câmara Municipal de Caxias do Sul (fotos acima), conferindo a Ruggero Nesi o Certificado de Participação das comemorações alusivas aos 110 anos de instalação do Poder Legislativo Municipal Contato: Rogério Nesi (54)8154-7706
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Cultura
Dança, pintura, música, literatura. Olhando assim, até parece que são elementos artísticos separados, isolados um do outro e que em nada (ou muito pouco) se complementam. Então imagina comigo: uma roda de amigos se fecha e no centro delas jovens executam movimentos corporais no chão, desafiando a gravidade. Eles dançam ao som de músicas que possuem batidas fortes e letras que retratam inúmeros problemas sociais. E esse som também embala alguns que, com latas de spray nas mãos, pintam muros e paredes retratando a vida urbana. Reconheceu agora? Sim, estou falando da cultura hip-hop, que integra, alegra e conscientiza jovens, adultos, crianças e idosos. Sim, estou falando de um movimento que está saindo das favelas e conquistando espaço na cultura “pop”. Sim, estou falando de uma manifestação cultural que integra dança, pintura, música e literatura. Lembro-me dos bons tempos em que a dança urbana, em específico, fazia parte diretamente do meu cotidiano.
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Tudo começou na adolescência, naquela fase mesmo em que se quer ter emoção de tudo e razão de nada. Nessa ânsia de querer curtir a vida enlouquecidamente, sem se preocupar com nada, descobri ali a olhar para o lado, a ver que a vida não é feita só de rosas. Descobri que, mesmo com os inúmeros problemas existentes na vida cotidiana (que indiferem de classe, raça, gênero, religião, orientação sexual, classe social e de toda e qualquer classificação), há esperança para viver e querer sobreviver. E assim, nessa motivação diária, nessa reflexão constante, foram cinco anos de vivências e convivências. Uma das maiores lições que o hip-hop deixa é de nunca desistir. É saber que viver é difícil, mas que no final dá tudo certo. Que ser diferente é legal. Que cantar, dançar, pintar e escrever toca as pessoas. E que, se cada um puder ser tocado por essa mensagem e se permitir a reflexão, um novo mundo será construído - mais justo, mais igualitário, mais aberto e mais receptivo. Um mundo que vive na utopia dos raps, do graffitti e do street dance.
Alana Venacto
Bruno de Moura
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Gabriela Bregolin facebook.com/ gabibregolin gbgrillo@ucs.br
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Milena Sch채fer
Roberto Nichetti
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INSCRIÇÕES ABERTAS 32