Revista Entrelinha 2018/4

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ENTRELINHA

Revista-laboratório da disciplina Design de Notícias e Planejamento Visual no Jornalismo 2018/4

Ciclovias na Serra PÁGINA 11

Todos fazem sexo, mas nem todos o fazem benfeito PÁGINA 4

Reforma eleitoral reduz contratações PÁGINA 7

Alimentação saudável nas escolas PÁGINA 9


AO LEITOR

A mensagem dentro da mensagem Esta edição da Revista Entrelinha te faz praticar a leitura das entre­ linhas. Uma das características dessa produção é a de revisitar temas amplamente debatidos, mas que continuam a permear os debates no âmbito social. Religião, eleições, transporte alternativo, doenças sexual­ mente transmissíveis, alimentação saudável são assuntos que já foram muito explorados pela mídia. Porém, uma das funções do jornalismo é a de buscar novos ângulos e abordagens, tornado, assim, as pautas inovado­ ras e diferenciadas. As reportagens que compõem a revista foram produzidas pelos acadê­ micos da disciplina de Design de Notícia e Planejamento Visual no Jorna­ lismo, do curso de Jornalismo, da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Cada estudante levou em consideração o fazer social do jornalismo e sua responsabilidade em informar, para mostrar o outro lado de muitos temas que permeiam as rodas de conversa. O que não está dito explicitamente, está nas críticas e opiniões implícitas, que somente serão percebidas no momento em que ocorrer a leitura das entrelinhas, levando a uma inter­ pretação que se desprende do óbvio. Para complementar a leitura, o projeto gráfico também projeta o leitor para dentro do conteúdo, fazendo-o ir além. O design visual busca somar ao conteúdo escrito cores, ilustrações e elementos que carregam uma mensagem, que é revelada a quem exercita o olhar crítico e uma leitura atenta aos detalhes. Esperamos que as mensagens embutidas nas linhas e entrelinhas desta revista contribuam com o seu dia.

Sumário AUMENTA A PROCURA POR AJUDA PSICOLÓGICA

SEXO: UMA PRÁTICA SEM CUIDADOS

REFORMA ELEITORAL REDUZ CONTRATAÇÕES ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL NAS ESCOLAS CICLOVIAS NA SERRA

BANDAS INDEPENDENTES DESAFIOS DAS BIBLIOTECAS PÚBLICAS NOVO PARADIGMA RELIGIOSO NO BRASIL

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Expediente REITOR Dr. Evaldo Antonio Kuiava DIRETOR DA ÁREA DO CONHECIMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS Me. Fábio Eberhardt Teixeira COORDENADOR DO CURSO DE JORNALISMO Me. Marcell Bocchese DISCIPLINA Design de Notícia e Planejamento Visual no Jornalismo PROFESSORA Dra. Marlene Branca Sólio PROJETO GRÁFICO Isadora Helena Martins ALUNOS Ana Júlia Griguol Carine Luana do Amaral Claudia Rossatto Edna Morgana Brasil da Silva Gabriel Felipe Bressan Gleiciane Bartelle Trois Ingrid Raquel Fochezatto Isadora Helena Martins João Vítor Perozzo Soares Jorge Alves Junior Karina Cavinato Laura Waechter Kirchhof Mateus Frazão da Silva Mauricio da Rocha Palma Milena do Amarante Soares Paulo César Emer Junior Pedro Facundo Teixeira Giles Pietra Pauletti Thais Strapazzon

Rua Francisco Getúlio Vargas, 1130 Bairro Petrópolis - Caxias do Sul - RS CEP 95070-560 Fone: +55 54 3218-2100 www.ucs.br


SAÚDE

AUMENTA NÚMERO DE JOVENS QUE BUSCAM AJUDA PSICOLÓGICA NAS UNIVERSIDADES Pressões da vida acadêmica, busca por diploma e sucesso profissional desencadeiam diversos transtornos em estudantes no País Foto: Edna Brasil da Silva

Ansiedade, depressão e síndrome do pânico. Esses, são alguns dos distúrbios de­ senvolvidos por estudantes, durante o período de gra­ duação. A estrutura da vida acadêmica, repleta de pres­ sões relacionadas à escolha do curso, à busca do diploma e ao fracasso profissional, desencadeia transtornos nos jovens. Na contramão, a busca por ajuda psicológica entre os estudantes têm aumen­ tado. Dados da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de En­ sino Superior (Andifes), de 2016, mostram que 30% dos Estudantes que precisam de auxílio podem recorrer a instituições acadêmicas e à rede pública alunos de graduação de insti­ tuições federais do País pro­ curaram atendimento. dêmicos da instituição. O Serviço o Pronto Atendimento e o Samu, A psicóloga Magali Pioner, es­ de Atendimento Psicológico e de que estão preparados e prontos pecialista no tratamento de casos Orientação Psicopedagógica (SAP/ para atender”, salienta. de ansiedade e depressão, acredi­ Sepa) disponibiliza avaliação e Outra alternativa é o Centro de ta que buscar atendimento Valorização à Vida (CVV), que pres­ informações prestado por ta serviço voluntário e gratuito de com um pro­ estagiários e apoio emocional e prevenção do fissional da professores suicídio. Os contatos podem ser fei­ á­­­rea é uma do curso de tos pelo telefone 188, pessoalmen­ boa maneira Psicologia. te, ou pelo site www.cvv.org.br, por de amenizar Em Caxias chat e por e-mail. o descon­for­ do Sul, de Para a voluntária no CVV em to. “O aten­­ acordo com Caxias do Sul, Arminda Bertuzzi, a di­­mento psi­­ a diretora de relação entre os voluntários e quem cológico é Política de busca ajuda é de total empatia. “O um trabalho Saúde Men­ atendimento é feito de forma sigilo­ que busca o tal da Secre­ sa e principalmente sem julgamen­ bem-estar do ser humano, não se taria Municipal da Saúde (SMS), tos.” restringindo apenas a transtornos Elizabete Bertele, os jovens podem mentais”, explica Magali. buscar auxílio na rede pública de Reportagem: Ingrid Fochezatto, A Universidade de Caxias do Sul saúde. “É possível contar com as Laura Kirchhof, Carine Amaral, Edna Brasil e Gabriel Bressan (UCS) realiza atendimento a aca­ UBSs, os serviços de saúde mental,

O ATENDIMENTO PSICOLÓGICO É UM TRABALHO QUE BUSCA O BEM-ESTAR DO SER HUMANO

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SAÚDE

TODOS FAZEM SEXO, MAS NEM TODOS O FAZEM BEM-FEITO Mais de 50% da população brasileira não utiliza preservativos. Quando o assunto é DSTs, a falta de informação ainda se mostra um dos principais obstáculos Foto: João Perozzo

Embora a prática sexual ofereça benefícios para a saúde corporal e mental do ser humano, é importante usar proteção

Sexo é prazeroso. Durante a relação, o corpo produz diversas subs­

tâncias, entre elas a dopamina - neurotransmissor que ativa e estimula uma área do cérebro, que proporciona ao ser humano sensação de prazer e recompensa.

Sexo é esporte.

“O esforço de uma atividade sexual equivale, em média, a um trote a 7,5 quilômetros por hora”, estipula José Lazzoli, car­ diologista, em depoimento para a revista Saúde. Portanto, o ato sexual, dependendo de sua intensidade, pode queimar de 100 a 300 calorias. Não apenas isso: ativa a circulação de fluídos linfáticos, encarregados de eliminar substâncias como bactérias e toxinas.

Sexo é saudável. Outra substância produzida pelo corpo, durante um

ato sexual consensual, é a endorfina, também um neurotransmissor. Ao liberar essas moléculas, é possível que o indivíduo iniba sensações de dor e, possivelmente, sinta alívio. “Ela é o maior analgésico do nosso corpo”, afirma a médica Ruth Clapauch, da Sociedade Brasileira de Endocrinolo­ gia e Metabologia, para a Revista Saúde. Além disso, os efeitos produzidos por essa substância continuam mesmo após o fim da relação.

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NEM TÃO SAUDÁVEL O ato sexual, para que ocorra de forma saudável e segura, im­ plica o uso de camisinha entre os parceiros, visto que a região geni­ tal – tanto masculina quanto femi­ nina —­contém micro-organismos e bactérias. Uma relação sexual sem o uso da camisinha desencadeará a troca desses micro-organismos e bactérias. Uma série de patologias pode ser contraída por qualquer um dos parceiros. Dessas, as mais conhecidas são HIV, Sífilis e HPV. Caso o portador de uma dessas do­ enças sexualmente transmissíveis não busque tratamento adequado, pode sofrer graves consequências como: Imunodeficiência (HIV), de­


senvolvimento de câncer de colo de útero, pênis e ânus (HPV) e paralisia geral progressiva (Sífilis).

A descoberta Glademir Antonio Lorenzi, 51 anos, conta que há 18 anos desco­ briu que era portador do vírus HIV. Ele acredita que a infecção tenha se dado por meio de sexo oral. Mesmo assim, confessa não se cuidar to­ talmente quando se trata do vírus. Hoje, 5% da população acaba se in­ fectando quando não têm cuidado na prática do sexo oral.

AS PESSOAS NÃO SE ENGAJAM NA LUTA PELA PREVENÇÃO AO HIV HIV significa, em inglês, human immunodeficiency virus que, em tradução, lê-se vírus da imunode­ ficiência humana. Esse é o vírus

O QUE DIZ A LEI Um indivíduo que contrai uma ou mais dessas doenças e, mesmo assim, continua realizando sexo sem proteção, se torna um vetor para diversas doenças. De acordo com o art. 131 do Código Penal: praticar qualquer ato capaz de produzir o contágio, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, implica em reclusão de um a quatro anos e multa. Em outras palavras, uma pessoa portadora de DST, sabendo de sua condição, ao manter relações sexuais com terceiros, sem o uso de preservativo e do conhecimento do parceiro, comete o delito previsto no artigo, pois está agindo em detrimento da vida alheia.

que causa a AIDS, doença crônica e potencialmente fatal. Ela ocorre quando a pessoa infectada pelo HIV tem seu sistema imunológico dani­ ficado; portanto, interfere na capa­ cidade de o organismo lutar contra invasores que causam a doença, além de deixar a pessoa suscetível a outras, em função da baixa capa­ cidade de imunidade do organismo. É comum que pessoas, assim como Glademir, descubram que são portadoras de HIV por meio de exame para outras doenças, como toxoplasmose ou tuberculose. “Eu acabei descobrindo no Hospital de Clínicas. Fui fazer exame de cálculo renal, me pediram outros exames. Deu positivo para HIV.” Embora acredite que as coisas tenham mudado, ele acentua que ainda há muito preconceito ao se falar de HIV. “Agora, se você não é enrustido e é pró-ativo politicamen­ te, não fica refém do preconceito. Mas a gente percebe, ainda hoje que, infelizmente, as pessoas não se engajam na luta pela prevenção do HIV ou em assumir essa causa.” Nos últimos 20 anos, houve mui­

Nem só diversão tas mudanças na forma como o Es­ tado e como a sociedade encaram as doenças sexualmente transmissí­ veis. Hoje, existem diversas propa­ gandas e projetos que visam a cons­ cientizar o público acerca do uso de preservativos e dos benefícios disso para a vida sexual do indivíduo. Como podemos acompanhar no infográfico, o número de pessoas que morrem devido à AIDS ou ou­ tras DSTs desenha uma curva em parábola. É válido ressaltar que ne­ nhuma DST, em primeira instância, é capaz de matar o indivíduo. Mor­ tes ocorrem devido à falta de trata­ mento. De acordo com os registros dis­ poníveis no Datasus (Departamento de Informática do SUS), em 1996

houve 154 mortes decorrentes de infecções por transmissão predomi­ nantemente sexual. Já nas mortes decorrentes do ví­

rus HIV, o número ultrapassa as 15 mil. Devido ao grande número de campanhas públicas que incentiva­ ram o uso de preservativos, durante os anos 2000, o número de mortes cai, em 2005, para as duas moda­ lidades, sendo 26,01% para HIV e 29,8% para as demais infecções. Embora o esperado fosse que os números continuassem caindo, de­ vido aos movimentos de conscien­ tização, prevenção e tratamento, o resultado real contraria a expectati­ va. O número de mortes em 2015, nas duas taxas, voltou a crescer. No caso de HIV, a taxa aumentou 14%, em relação ao resultado anterior e, no caso das demais DSTs, a taxa cresceu 175%. Como forma de incentivar o tra­ tamento, o Ministério da Saúde dis­ tribui medicamentos direcionados à prevenção do HIV.

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SAÚDE Foto: Fábio Bielscki

Sexo com proteção é recomendado mesmo para casais em que os parceiros são fixos

COMO ENFRENTAMOS O CONTÁGIO Em entrevista, a coordenadora do serviço de infectologia da Secre­ taria Municipal de Saúde de Caxias do Sul, Grasiela Cemin Gabriel, afir­ ma que estamos passando por uma epidemia de sífilis. Isso ocorre por­ que a população deixa de utilizar preservativos. Grasiela explica que é impor­ tante que o paciente realizar teste para verificar sua saúde sexual, ao menos, uma vez ao ano. A coorde­ nadora também relata que a maio­ ria das pessoas, que comparecem ao Centro Especializado de Saúde (CES) para a realização de testes de verificação de DSTs, chega com diagnóstico tardio. Ou seja, já convi­ vem com uma infecção sexualmen­ te transmissível há anos. Além disso, ela afirma que é possível traçar relação entre as pes­ soas que chegam ao Centro para a realização de testes. “Hoje mesmo, todas as pessoas que chegam aqui têm nível de instrução altíssimo. Muitos formados, inclusive com doutorado. Pessoas muito orienta­ das. Sabem exatamente como fun­ ciona. Mas aí como fica lá na hora?” Essas afirmações ajudam a descons­ truir o estereótipo de que beleza, aparência e nível de formação não

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implicam que a pessoa esteja imu­ ne a essas infecções. Atualmente, a Secretaria Mu­ nicipal da Saúde de Caxias do Sul desenvolve um projeto de saúde nas escolas. Por meio dele, são de­ batidos temas como proteção, vio­ lência e saúde sexual. Ao realizar esse debate, espera-se que os estu­ dantes se conscientizem acerca de sexo seguro, aprendam a identificar e encorajem-se a denunciar casos de violência sexual. Já a Secretaria de Educação do município não tem projeto vigente e trabalha apenas diante de demandas vindas de ins­ tituições de Ensino Fundamental e Ensino Médio. De acordo com levantamento realizado pela Gentis Panel, em­ presa que realiza pesquisas de mer­ cado, que entrevistou mais de 2 mil pessoas de todas as regiões do Brasil; 52% dos brasileiros nunca ou raramente usam preservativos, 10% os utilizam às vezes e apenas 37% se protegem sempre ou frequente­ mente. De acordo com Grasiela, esse descaso com o uso de preservativo ocorre porque os indivíduos con­ fiam em seus parceiros e deixam de se prevenir; ou por saberem que a

AIDS e outras DSTs têm tratamento. Diversos motivos levam um indi­ víduo a abandonar o uso da cami­ sinha em uma relação. A psiquiatra Carmita Abdo destaca que os ado­ lescentes não parecem dar a devida importância ao preservativo. “Eles iniciaram a vida sexual sem apren­ der a usar a camisinha. Assim, têm dificuldade em fazer disso um cos­ tume”, explica. Outro fator que di­ minui o uso da camisinha é a pílula anticoncepcional, que é um método contraceptivo. As mulheres usam o comprimido, mas não buscam mé­ todos de prevenção contra infec­ ções. “Elas estão mais preocupadas em evitar a gravidez do que com as consequências de terem uma re­ lação desprotegida”, alerta Marta Franco Finotti, ginecologista, em entrevista à Revista Saúde.

E AGORA?

Após a prática sexual desprotegida, a pessoa deve se encaminhar a um Centro Especializado de Saúde (CES), para realizar o teste rápido, a partir da retirada de sangue. Essa etapa é a primeira e a mais básica, para que a pessoa descubra se contraiu alguma doença sexualmente transmissível. Depois da exposição, se houver dúvidas, é recomendado que a pessoa se encaminhe, o quanto antes, a um posto de saúde. Lá, será realizada uma série de exames e receitada a Profilaxia Pós-Exposição(PPE), uma variedade de medicamentos que o indivíduo deve ingerir no perío­do de um mês. Todo o tratamento é disponibilizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), de forma gratuita e anônima. Em Caxias do Sul, o CES está localizado na Rua Sinimbú, 2231, Centro. Atende de segundas a sextas-feiras das 7h às 18h. Para entrar em contato por telefone, o número é (54) 3901-1410. Reportagem: João Vítor Perozzo, Pedro Giles, Pietra Pauletti, Mateus Frazão


POLÍTICA

REFORMA ELEITORAL REDUZ CONTRATAÇÕES PARA CAMPANHAS POLÍTICAS, EM CAXIAS Alguns setores apresentaram queda de 50% na demanda de trabalho, durante o período eleitoral deste ano, na comparação com o pleito de 2014 Foto: Isadora Martins

Setor de distribuição de material impresso é o que mais contrata durante o período eleitoral

A campanha eleitoral é o perío­ do em que candidatos e partidos apresentam seu plano de governo e tentam conquistar o voto da po­ pulação. Esse período, que pode representar um incômodo para al­ gumas pessoas, para outras é sinô­ nimo de oportunidade. Campanhas demandam a execução de diversos serviços, como produção e distri­ buição de materiais gráficos, além de outras funções como coorde­ nação e planejamento. Para suprir essas demandas, trabalhadores temporários são contratados, tanto por partidos e candidatos quanto por empresas dos setores gráfico e especializados em distribuição de material, por exemplo.

As contratações variam de acor­ do com a demanda de cada área. Conforme Liliane Lorandi, diretora executiva da Folhetu’s ‒ empresa especializada na distribuição de im­ pressos em Caxias do Sul –, no pe­ ríodo eleitoral, as contratações ten­ dem a aumentar. “Chegamos a ter,

TIVEMOS UMA REDUÇÃO DE 50% DA DEMANDA DE PRODUÇÃO DE MATERIAL

em média, de 50 a 80 vagas além do quadro atual de funcionários. Essas vagas são, principalmente, para o setor externo-operacional, que são as equipes de distribuição de material de porta em porta ou em semáforos”, afirma. Já, no se­ tor gráfico, essa realidade mudou significativamente em 2018, devido às alterações da legislação que inci­ de sobre as campanhas eleitorais. “Não tivemos contratações neste ano, pois, com a redução do tem­ po da propaganda política, tivemos uma redução de 50% da demanda de produção de material impresso, se comparado com as eleições de 2014”, explica Eduardo Marcon, di­ retor da Gráfica Nordeste.

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POLÍTICA Foto: Isadora Martins

Contratações de partidos Nos partidos políticos, a siste­ mática de contratações ocorre de acordo com as verbas disponíveis para a campanha. Siglas com me­ nos representantes na Câmara dos Deputados e no Senado Federal re­ cebem uma parcela menor do Fun­ do Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), distribuído pelo Tribunal Superior Eleitoral. Para as eleições de 2018, o FEFC foi de R$ 1,7­ bilhão. Depois que os recursos são repassados aos diretórios na­ cionais dos partidos, eles os enviam para seus candidatos, conforme cri­ térios próprios.

CHEGAMOS A RECEBER CERCA DE 200 PESSOAS SOLICITANDO UMA VAGA DE TRABALHO De acordo com Alexandre Lova­ to, coordenador de campanha do partido Solidariedade, em Caxias do Sul, a contratação de pessoas neste ano foi restrita por falta de verba. “Nessa campanha conse­ guimos empregar 10 pessoas, de forma temporária. Como o perío­ do da propaganda política é curto, não temos como criar um vínculo empregatício, e essa prática nem é permitida pela legislação eleitoral. Mas chegamos a receber cerca de 200 pessoas solicitando uma vaga de trabalho na campanha”, afirma. Lovato ressalta que, com a falta de mão de obra contratada, é preciso recorrer aos voluntários, filiados e militantes do partido para colocar a campanha na rua.

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A nova legislação eleitoral diminuiu o tempo de campanha nos veículos tradicionais e alavancou a propaganda política na internet

CYBER CAMPANHA FOI A APOSTA EM 2018 Outra mudança ocasionada pela reforma eleitoral, aprovada pelo Congresso Nacional em 2017, foi a liberação parcial de propaganda paga na internet. Com essa medida, os candidatos puderam investir no impulsionamento de conteúdos nas redes sociais e nas ferramentas de busca, como o Google. Conforme dados do Tribunal Superior Eleito­ ral (TSE), os anúncios online, libera­ dos pela primeira vez na eleição de 2018, respondem por 1,6% de gas­ tos declarados pelos candidatos na primeira parte da campanha elei­ toral. Ou seja, R$ 17 milhões foram destinados ao impulsionamento de conteúdo entre os dias 16 de agosto e 8 de setembro. Além do impulsionamento de conteúdos, os candidatos também foram autorizados a criar um site próprio para fins de campanha. Os gastos com a criação e inclusão das páginas foram de mais de R$ 12,8 milhões nos primeiros 23 dias da corrida eleitoral. Conforme Lovato, o uso da in­ ternet não é unanimidade entre os candidatos. “Sabemos que a cam­ panha pela internet atinge um seg­

mento do eleitorado, mas há muitas pessoas que não têm acesso ou não utilizam essas ferramentas. Por isso, é preciso fazer uma avaliação sobre até que ponto o impulsionamento de conteúdos e os meios digitais po­ dem ser eficazes na área de abran­ gência da campanha.” Ele também afirma que a abordagem na rua e a entrega de material nas casas con­ tinuam sendo muito importantes para levar ao conhecimento do elei­ tor não somente informações do candidato, mas também informa­ ções sobre o processo eleitoral.

A DESINFORMAÇÃO

Devido à propagação de fake news durante a propaganda política 2018, o Tribunal Superior Eleitoral lançou uma página na internet, para ajudar a esclarecer o eleitorado brasileiro acerca das informações falsas e falaciosas, que foram disseminadas pelas redes sociais. O Whats App foi uma das plataformas mais utilizadas para difundir esse tipo de conteúdo, devido ao seu alcance entre a população brasileira. Reportagem: Isadora Martins


POLÍTICA

ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL NAS ESCOLAS É TEMA DE LEI NO RIO GRANDE DO SUL Proposta, que ainda depende de regulamentação, proíbe comercialização de determinados produtos em cantinas escolares do estado Foto: Laura Kirchhof

Projeto de Lei proíbe a comercialização de alimentos que contribuem para doenças como a obesidade

Em julho de 2018, o governo do Rio Grande do Sul decretou a Lei 15.216, que proíbe a comercializa­ ção de produtos que contribuem para a obesidade, a diabetes e a hipertensão, em cantinas das esco­ las públicas e privadas do estado. Entretanto, a aplicação da Lei ainda depende de regulamentação. Con­ forme a assessoria da Casa Civil do RS, um grupo interdisciplinar encar­ regado da fiscalização, dos padrões de classificação dos produtos e das formas de autuação e sanções, está sendo criado. O objetivo da Lei é oferecer alimentação saudável às crianças e aos adolescentes, atendendo a padrões de qualidade nutricional. Dentre os itens proibidos estão: ba­

las, biscoitos recheados, refrigeran­ tes, sucos artificiais e frituras. Além disso, os locais serão obrigados a oferecer, diariamente, pelo menos duas variedades de frutas.

OBESIDADE ATINGE 124 MILHÕES DE CRIANÇAS NO MUNDO Segundo estudo realizado em 2016, pelo Imperial College London, em parceria com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a obesi­

dade atinge 124 milhões de crianças no mundo. No Brasil, os números também são alarmantes. De acordo com estimativas, cerca de 30% das crianças brasileiras apresentam so­ brepeso ou são obesas. Para a nutricionista Renata Ge­ remia, a aprovação da lei vai ao en­ contro da legislação do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), que tem, dentre seus objeti­ vos, a formação de práticas alimen­ tares saudáveis aos alunos, durante o período letivo. “A escola é um ambiente de aprendizado contínuo, inclusive na formação dos hábitos alimentares, que engloba o conteúdo trabalhado em sala de aula e a socialização com o grupo escolar. Isso tudo também

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POLÍTICA depende do que é oferecido no lo­ cal. Dessa forma, a comercialização de produtos não saudáveis estará em desacordo com o preconiza­ do pelo programa e pela educação alimentar e nutricional promovida pela escola”, pontua Renata. Em Caxias do Sul, de acordo com a representante da 4ª CRE, Kalizia Dalla Zen, ainda não há um plano de ação para implementar as exi­ gências impostas pela lei. “Nem todas as escolas têm conhecimen­ to desta nova lei, mas as mesmas já estão cientes da importância da alimentação saudável e que todos os bares interessados em atuar nas escolas passam por processo de li­ citação e precisam estar dentro das regras”, garante ela. Enquanto a lei não entra em vi­ gor, a conscientização alimentar e projetos de alimentação saudável são promovidos nas escolas. “No úl­ timo ano, estivemos desenvolvendo projetos dentro de algumas escolas. Não podemos trabalhar alimenta­ ção saudável e exigir que o aluno não adquira alguns alimentos, se os pais não forem multiplicadores dentro de casa dos novos hábitos”, salienta Kalizia. Ainda de acordo com Kalizia, os alimentos orgânicos, livres de agro­ tóxicos, são uma alternativa para oferecer alimentação saudável aos alunos. “Sabemos que o alimento orgânico tem custo mais elevado que os demais e que nem todas as escolas têm condições de adquiri-­ los. Entretanto, todas são orienta­ das a dar preferência a esses produ­ tos”, enfatiza.

Foto: Ingrid Fochezatto

Projeto prevê alterações na Lei Federal 7.802/89, conhecida como Lei dos Agrotóxicos

AGROTÓXICOS VS. ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL Na contramão da Lei 15.216, que visa à alimentação saudável nas escolas gaúchas, e de projetos que defendem a agricultura orgânica e sem aditivos químicos, a Câmara dos Deputados avalia um projeto de lei (PL) que mudará as regras de aprovação e avaliação do uso de agrotóxicos. As alterações estão previstas na Lei 6.299, de 2002, e pretendem proibir apenas produtos que conte­ nham substâncias que apresentem “risco inaceitável”, além de mudar o nome dos agrotóxicos para “defen­ sivos agrícolas” e “produtos fitossa­ nitários. A PL é defendida pelo setor de agronegócio como uma alterna­ tiva ao demorado processo de libe­ ração de novos agrotóxicos. O coordenador do curso de agronomia do Instituto Federal do Rio Grande do Sul, Luís Fernando da Silva, crê que as mudanças des­ burocratizam a liberação de novos

QUANTO AGROTÓXICO VOCÊ CONSOME? De acordo com a Anvisa, o glifosato é o agrotóxico mais utilizado. Seu uso é recorrente em plantações de café, soja, milho, arroz e trigo, entre outras. Os alimentos com maior nível de contaminação por agrotóxicos são o pimentão, com 91,8%; o morango, 63,4%; o pepino, 57,4%; a alface, 54,2%; e a cenoura, 49,6%.

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agrotóxicos no mercado. “O projeto abre espaço para o lançamento de novos defensivos, com menos po­ der de intoxicação, em menor tem­ po, o que nos dias de hoje leva de cinco a oito anos”, explica. ONGs da área da saúde, Agên­ cia Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e outras instituições se posicionam contra o projeto, afir­ mando que os novos produtos se­ riam liberados somente com o viés lucrativo na produção agrícola, sem passar por fiscalização adequada, podendo aumentar o perigo de contaminação com produtos que causam danos à saúde e ao meio ambiente. “Pode ocorrer a libera­ ção de produtos que ainda estão em análise de risco de contamina­ ção”, avalia Luís Fernando. Há um longo caminho a se per­ correr até a possível aprovação da PL. Ainda é necessário que o proje­ to passe pelo plenário da Câmara e também pelo Senado, antes de receber a sanção presidencial. En­ quanto não ocorrem novas defini­ ções, a questão que permanece é: Até quando a saúde pública e a pro­ teção ao meio ambiente ficarão na sombra da produção lucrativa? Reportagem: Ingrid Fochezatto e Laura Kirchhof


LAZER

CICLOVIAS COMO MEIO DE GARANTIR A MOBILIDADE URBANA SUSTENTÁVEL Apesar do número ser pequeno na Serra gaúcha, implantação de ciclovias cresce no Brasil visando a melhorar o fluxo das cidades Foto: Ana Júlia Griguol

Além da sustentabilidade, as ciclovias geram benefícios ao turismo, comércio e às economia

VIAS COMPARTILHADAS Dados nacionais: No Brasil, as vias destinadas a bicicletas nas capitais tiveram um aumento de 133% nos últimos quatro anos. En­ quanto em 2014 o País possuía 1.414 km de ciclovias, ciclofaixas e ciclorrotas, em 2018 esse número saltou para 3.291 km. Apesar de a malha cicloviária ter mais que dobrado de tamanho no período, ela ainda corresponde a apenas 3,1% da malha viária total dos municípios (107.144 km). Ranking das capitais: As capitais com o maior número de vias destinadas às bicicletas são: São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro. Já as localidades que aparecem nas últimas posições do ranking são Porto Velho, São Luís e Macapá. A capital gaúcha, Porto Alegre, apa­ rece na 20ª posição. Investimento: A cidade de Rio Branco (AC) tem a maior pro­

porção de vias destinadas a bicicletas em relação à malha viária total (13,4%) e ao número de habitantes (3.570 por km de via). Fonte: Levantamento realizado pelo G1/GloboNews. Agosto de 2018.

Para garantir a mobilidade ur­ bana, nos últimos anos os municí­ pios passaram a buscar soluções criativas que visam à qualidade de vida da população. Conforme a Lei de Mobilidade Urbana 12.587/12, as ciclovias/ciclofaixas devem ser construídas para, além de promo­ ver o desenvolvimento sustentável, dar prioridade aos deslocamentos não motorizados, e, especialmente, garantir a segurança e eficácia na circulação urbana. Segundo o arquiteto e urbanista da Prefeitura de Cotiporã Guilher­ me Joner, a ciclovia encontra-se isolada da rua por meio de algum elemento, como, por exemplo, um canteiro. Enquanto a ciclofaixa é

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LAZER anexada à via de veículos, sendo diferenciada somente pela sua pin­ tura. Além de tornar as ruas mais de­ mocráticas e seguras, ao aderir ao uso da bicicleta, o cidadão evita a emissão de gases poluentes e há menos poluição sonora. O usuário ainda é favorecido financeiramen­ te, afinal, deixa de despender parte de seu orçamento em combustível, manutenção, estacionamento e ou­ tros gastos que teria com o uso do veículo. Apesar de todos os aspectos po­ sitivos, a estrutura cicloviária ainda está em fase de desenvolvimento no Brasil. Em muitos lugares, o moto­ rista divide o espaço com o ciclista, contribuindo para o aumento dos acidentes. O último levantamento do Ministério da Saúde, sobre aci­ dentes de trânsito, realizado em 2014, aponta que, no País, 1.357 ci­ clistas morrem por atropelamento. Muitos motoristas ainda não sabem como se portar diante dos ciclistas, e vice-versa. Para Joner, é preciso fazer um trabalho de cons­ cientização da população. “Somen­

te assim teremos ciclovias cada vez mais seguras, e uma relação har­ moniosa entre ciclistas, pedestres e motoristas”, pontua.

CICLOVIAS BEM-PENSADAS AUMENTAM A DEMANDA, A CADA DIA QUE PASSA Pouca adesão A implantação de ciclovias e ci­ clofaixas na Serra gaúcha ainda é tímida. Segundo levantamento fei­ to em 33 municípios que integram o Conselho Regional de Desenvol­ vimento da Serra (COREDE Serra), apenas sete possuem vias finaliza­ das para ciclistas. Para a construção, deve ser leva­ da em conta a localização, demanda

de usuários e velocidade do tráfego. Ainda, é preciso considerar dimen­ sionamento correto, pavimentação adequada, iluminação e sinalização. Joner defende que ciclovias bem pensadas atraem, cada dia mais, novos usuários. Todos os fatores devem ser es­ tudados, caso contrário, muitas pessoas deixam de utilizar a via. Exemplo disso, encontra-se na cida­ de de Caxias do Sul. Apesar de ser o segundo maior município do es­ tado, a cidade tem menos de 3 km de ciclovias, distribuídas em apenas dois trechos. As estruturas ficam localizadas nos bairros Forqueta e Interlagos, ambos deslocados do centro, o que contribui para que as ciclovias sejam pouco utilizadas. Para os ciclistas, é fundamental que a ciclovia seja, além de segura, sinalizada e confortável. “A ciclo­ via deve ser pavimentada, com o mesmo pavimento do asfalto, sem qualquer coisa que possa atrapa­ lhar ou gerar desconforto”, afirma o fotógrafo Diego Frigo, que reside em Farroupilha e utiliza a bicicleta para prática esportiva.

Arte: Mauricio Palma

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Foto: Jordana De Marco Giacomelli

As ciclofaixas podem ser utilizadas para prática esportiva, deslocamento e lazer

COTIPORÃ INVESTE EM CICLOVIAS E GERA QUALIDADE DE VIDA As ciclovias são construídas para auxiliar o desenvolvimento organi­ zado e sustentável dos grandes cen­ tros, tendo em vista o intenso fluxo de carros e, até mesmo, a redução da poluição. Com pouco mais de 4 mil habi­ tantes, o Município de Cotiporã, lo­ calizado a 154 km de Porto Alegre, construiu, desde o ano de 2013, duas ciclovias e uma ciclofaixa, que totalizam mais de 3 km de exten­ são. Segundo o Prefeito Municipal José Carlos Breda, o gestor públi­ co deve ser visionário. “Cotiporã, por ser ainda pequena, não sofre com problemas de trafegabilidade. Porém, o administrador não deve esperar a demanda acontecer para depois respondê-la,” afirma Breda. Segundo pesquisa realizada pela Prefeitura de Cotiporã, 60% dos participantes utilizam a bici­ cleta, seja para lazer, transporte ou

exercício físico. Desses, 30% passa­ ram a utilizá-las depois de 2013, in­ dicando um grande crescimento de ciclistas no município. Guilherme Joner, afirma que a decisão para construção de uma ciclovia parte da questão sobre qual cenário é mais agradável sob o ponto de vista urbano. “Será que preferimos uma via expressa lota­ da de veículos ou uma rua cheia de bicicletas? Com a construção de ci­ clovias, garantimos, desde a saúde até a qualificação dos espaços pú­ blicos,” pontua. Maicon Marcon, que reside em Cotiporã e há cinco anos é ciclista, ressalta que as ciclovias garantem segurança, além de possibilitarem o uso recreativo com bikes, caminha­ das e passeios com animais, incen­ tivando o respeito entre todos que as utilizam.

PRÁTICA SAUDÁVEL A fisioterapeuta especialista em saúde pública Bruna Moro, destaca que exercícios como andar de bicicleta e caminhar garantem resultados positivos na prevenção de doenças. “Estimula o organismo a produzir vitamina D, melhora a vida social, alivia as tensões diárias, reduzindo o estresse”, ressalta a fisioterapeuta. Para a educadora física Juliana Mancalossi, manter uma dieta equilibrada e introduzir uma atividade física na rotina garante bem-estar e gera qualidade de vida.

Reportagem: Ana Júlia Griguol e Gleiciane Trois

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CULTURA

BANDAS INDEPENDENTES MOVIMENTAM O CENÁRIO MUSICAL DA SERRA GAÚCHA O som que vem de garagens, bares e pequenas casas de shows pertence à cena underground que mostra uma identidade própria da música local Foto: Milena Soares

Banda Catavento no Festival Brasileiro de Música de Rua, que ocorreu no primeiro semestre de 2018

O cenário independente estru­ tura-se com músicos de diferentes vertentes, mas que têm em comum a vontade de fazer música. “Diferen­ te das décadas de 70 e 80, em que a cena musical não era tão dividida, hoje nos depa­ ramos com um contexto mais seg­­­­­­­­­mentado. São gru­­pos com di­ ferentes es­­tilos, cada um fazen­ do o seu som; porém sempre unidos pela mesma causa”, afirma Rudinei Picinini, 25, vocalista das bandas Borduna e Fiz do Dia Minha Nostalgia.

A segmentação também está presente entre as bandas que fa­ zem cover ou que trabalham com conteúdo auto­­ral. Matheus Kur­ mann da We are Revolution (WAR), comen­ ta que, na Serra, o cover funciona bem; porém, é um universo que se limita aos ba­ res e não tem um plano de carrei­ ra maior. No que se refere à pers­ pectiva autoral, o músico afirma: “É uma cena rica, mas não se tem um movimento entre bandas, para que haja uma união efetiva.”

HOJE NOS DEPARAMOS COM UM CENÁRIO MAIS SEGMENTADO

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Luta por espaço Muitas vezes, as casas de shows não cedem espaço para bandas in­ dependentes. “Assim, nós criamos nossos es­ paços, produzindo nossos próprios shows”, declara Jonas Bustince, 30, músico da banda Catavento. Sobre a situação das casas da re­ gião, Rudinei Picinini comenta: “Nós perdemos locais importantes, por­ que não podem mais realizar shows ou porque simplesmente fe­­charam. Porém, a galera que realmente quer tocar busca como alternativa trazer de volta as apresentações em sua própria casa.” Outra alternativa, se­ gundo Jonas, são os festivais que servem como porta de entrada para


Foto: Milena Soares

outros eventos, por serem pontos de encontro entre público, músicos e produtores. A luta por visibilidade não se restringe apenas a festivais e casas de shows. Os espaços nas rádios também são restritos. Muitas vezes, é necessário que a banda faça uma negociação com a emissora. Ma­ theus explica que isso funciona com uma troca de serviços ou de investi­ mento para que a música toque.

TOCAR É 5% DE TUDO. NÃO EXISTE A ILUSÃO DE SÓ FAZER ISSO Em 2017, uma pesquisa reali­ zada pela Deezer, plataforma de strea­ming, mostrou que o merca­ do da música digital chegou a movi­ mentar 330 milhões de reais nesse ano no Brasil. Esse dado represen­ ta quase a metade da receita gera­ da pelo mercado musical no País. Diante desse cenário, as bandas en­ contram nesses serviços uma alter­ nativa. Além de repassar os valores de direitos autorais às bandas, eles costumam abrir novas oportunida­ des, levando-as até um público que, muitas vezes, não teria acesso ao seu trabalho.

Foto: Stéfano Loscalzo

SELOS INDEPENDENTES COMO APOIO A vontade de tocar e a liberda­ de artística levam músicos ao mo­ vimento independente, resultado de um trabalho contínuo de quem quer viver de música. “As pessoas romantizam a questão de ser inde­ pendente e esquecem o preço de se ter uma banda autogerenciável”, declara Matheus, da WAR. Os selos, geralmente, funcionam como uma espécie de gravadora e produtora. No caso da Honey Bomb, ela surgiu inicialmente para lan­ çar bandas dos próprios integran­ tes, como Slow Briker, Descartes e Catavento, explica Jonas Bustince, membro do selo. “Nós trabalhamos com a Catavento e cuidamos da parte administrativa, não só o lado de executar a música, mas­ também fa­ zer­ tudo a­con­ tecer.” Jo­nas comenta que antiga­m ente, na in­­­­dús­­tria musical, as fun­ ções eram bem separadas. O manager cui­ dava da carrei­ ra do músico, a

gravadora prensava o material físico e cuidava da distribuição do disco, já o produtor agenciava os shows. Hoje, na cena independente, as­ funções se misturam. Já a Mito Records vem com a ideia de criar novos produtores. Éverton Severo, 24, integrante do selo e das bandas Borduna e Fiz do Dia Minha Nostalgia, afirma: “Tocar é 5% de tudo. Hoje, não existe mais a ilusão de só fazer isso. Precisamos administrar o negócio banda.” O selo busca fazer com que os músi­ cos adquiram experiência ajudando outras bandas, como uma comuni­ dade que se fortalece. Selos independentes são valori­ zados por sua sintonia com as ban­ das, eles permitem que as mesmas façam seu trabalho, apenas direcio­ nando-o para o melhor resultado. Jonas explica que o selo propor­ ciona liberdade artística. O músico afirma, no entanto: “Essa liberda­ de exige vários sacrifícios, pois es­ tamos sempre em função do selo.” Para Severo: “É a oportunidade de formar novos produtores e criar ex­ periência fazendo o que gostamos.”

Reportagem: Mauricio Palma, Milena Soares e Thais Strapazzon

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CULTURA

BIBLIOTECAS PÚBLICAS ENFRENTAM DESAFIOS COM NOVOS LEITORES Com a disseminação das tecnologias, sobretudo das plataformas móveis, as telas ganham o lugar das páginas na preferência dos brasileiros Foto: Jorge Alves Junior

O acervo da UCS está quantificado em um milhão de livros. Na foto, ujm dos corredores da Biblioteca Central

Quando pensamos em um livro, logo vem à mente seu peso, sua textura, o cheiro do papel e o som ao folhear as páginas. Porém, essas experiências sensoriais estão sendo substituídas pela bidimensionalida­ de e pelo brilho da tela do compu­ tador, tablet ou smartphone. Com essa migração do físico para o digi­ tal, alguns espaços têm presenciado a redução de seu público, como é o caso das bibliotecas públicas. Alguns movimentos de moderni­ zação desses locais estão em execu­ ção, como ocorre no município de Farroupilha. Com objetivo de apro­ ximar a comunidade da biblioteca e atrair novos usuários para esses instrumentos culturais, a Bibliote­ ca Pública de Farroupilha participa

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do programa nacional “Conecta Biblioteca”. Essa iniciativa promo­ ve a conexão entre 200 bibliotecas de todo a País e busca aumentar o número de visitantes em 60%, prin­ cipalmente entre jovens de 14 a 29 anos. Outro propósito do programa

INVESTIMOS PARA ATRAIR LEITORES, AFINAL O NÚMERO CAIU NOS ÚLTIMOS TRÊS ANOS

é fazer com que as pessoas conhe­ çam o acervo e o espaço destinado à leitura, que pertence à comunida­ de. Segundo Cristina Posa Arruda, bibliotecária do local, alguns passos no sentido de modernização já fo­ ram dados. “Agora o catálogo online está disponível para que as pessoas possam consultar reservar e reno­ var os livros pela internet”, afirma. Na Biblioteca Pública Municipal Dr. Demetrio Niederauer, de Caxias do Sul, o processo de modernização é semelhante. A consulta ao acervo, renovação de empréstimo e reserva de obras pode ser feita remotamen­ te pelo site <biblio.caxias.rs.gov.br> (link). Porém, no que diz respeito à digitalização de livros e criação de uma biblioteca virtual, o coordena­


dor da instituição, Cássio Felipe Im­ mig, afirma que não há projeto pre­ visto no curto prazo. “O que a gente tem eventualmente, sob demanda, é, por exemplo: quando um pesqui­ sador de fora solicita um material que é mais antigo, ou difícil de dis­ ponibilizar, nós digitalizamos a obra e enviamos pra ele. Mas não é algo sistemático ou frequente.” Ainda segundo Cássio, não existe deman­ da por um acervo digital entre os usuários da biblioteca pública. Em Carlos Barbosa, a Bibliote­ ca Pública Municipal Padre Arlindo Marcon conta com mais de 30 mil obras, mas não possui acervo digi­ tal. Segundo a bibliotecária Flávia Petersson de Freitas, o sistema in­ formatizado da biblioteca foi tro­ cado há pouco tempo, pois existe interesse em investir nesse tipo de material. “No momento, estamos em fase de teste da ferramenta. Ainda assim, estamos consultando o custo de plataformas de leitura para, futuramente, oferecermos mais este serviço aos nossos usuá­ rios”, afirma. Conforme Flávia, os investimen­ tos são para atrair novos leitores, porque o número de usuários caiu nos últimos três anos. Em abril de 2015, a biblioteca recebeu 1.973 vi­ sitas, entre empréstimos e renova­ ções de materiais, enquanto no mês de abril de 2018, foram 442 visitas. São 1.531 pessoas a menos usando os serviços da biblioteca. Essa reali­ dade reflete a tendência de migra­ ção dos suportes físicos para as pla­ taformas digitais. “Investimos para atrair leitores, afinal o número caiu nos últimos três anos.”

Foto: Jorge Alves Junior

Funcionária mostra a Bíblia do ano 1500, obra mais antiga do acervo da UCS

UCS INVESTE NA DIGITALIZAÇÃO DE OBRAS A Universidade de Caxias do Sul (UCS) desenvolveu um projeto de digitalização com apoio de um grupo de gestores. Essa iniciativa é voltada à digitalização de obras raras e documentos de grande im­ portância. Para isso, foi elaborada uma parceria com o Instituto His­ tórico da instituição, integrando, também, obras fotográficas raras. A coordenadora administrativa da bi­ blioteca, Michele Marques Baptis­ ta, explica que para digitalizar obras raras é preciso um equipamento especial para não danificar o papel dos livros. Trata-se de um scanner cujo valor chega a mais de R$ 200 mil. Michele também comenta que as obras já são de domínio público, por isso é possível digitalizá-las. A tecnologia avança e o aluno procura, cada vez mais, o livro di­ gital. Em contrapartida, existem

ACESSÍVEL À COMUNIDADE O acervo da UCS está quantificado em um milhão de livros, contando com as onze bibliotecas dos diversos campi da Universidade. A Biblioteca Central é a que possui o maior acervo, contabilizando um total de 500 mil livros. A biblioteca também é aberta à população que, com o número do CPF, consegue entrar e ter acesso aos livros.

alguns estudantes mais resistentes que se deslocam até a biblioteca e querem manusear os livros e levá-­ los para casa. Não querem ler em uma tela. Embora no livro digital também seja possível inserir mar­ cações, para alguns leitores a sen­ sação não é a mesma da leitura no exemplar físico. Segundo Michele, os acadêmicos se dividem meio a meio entre o online e o livro físico. Mas, de acordo com as estatísticas, a circulação de alunos na biblioteca diminuiu. A biblioteca da UCS começou a assinar bases de e-books em 2010. O investimento foi realizado quan­ do as plataformas digitais se popu­ larizaram. Porém, é preciso que o aluno acesse a ferramenta para que a biblioteca possa renovar os con­ tratos de e-books. Se não houver estatística de uso, a biblioteca não manterá o convênio com a platafor­ ma. Por isso, existe o incentivo ao aluno, tanto na leitura do livro físico quanto do virtual, principalmente por meio de campanhas nas redes sociais. Reportagem: Claudia Rossatto Jorge Alves Jr. e Paulo César Jr.

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CULTURA

PARADIGMA RELIGIOSO NO BRASIL MUDA COM AUMENTO DO NÚMERO DE EVANGÉLICOS Processo de mudança de paradigma religioso no Brasil deve se confirmar com o crescimento consolidado da Igreja evangélica Foto: Mateus Frazão

Número de adeptos do catolicismo diminuiu cerca de 31% nas últimas décadas, de acordo com o IBGE

Ao percorrer bairros de qual­ quer cidade, a predominância de igrejas evangélicas é evidente. Con­ gregações ocupam desde pequenos porões e casas humildes até prédios inteiros. O reflexo do crescimento da religião também é perceptível em nível político: discursos e cam­ panhas eleitorais utilizam o apelo evangélico para atrair eleitores e defender posicionamentos. No con­ siderado país mais católico do mun­ do, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), um novo cenário se consolida. De acordo com o último Censo Demográfico divulgado pelo IBGE, houve crescimento de 61% de evan­ gélicos no Brasil, entre 2000 e 2010. Ao todo, foram contabilizados, em 2010, cerca de 42,3 milhões de bra­ sileiros adeptos dessa religião, o

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equivalente a 22,2% da população total do País (em torno de 190 mi­ lhões na época). Trinta anos antes, em 1980, o contingente de evangé­ licos no País representava apenas 6,6% da população. O próximo levantamento so­ mente será divulgado em 2020 pelo IBGE, mas projeções já dão indícios do que está por vir. Em análise do perfil da população evangélica e da média de crescimento da religião, professores de Estudos Populacio­ nais e Pesquisas Sociais, da Escola Nacional de Ciências e Estatísticas (Ence) do IBGE, apontaram que até 2030 o número de católicos no País deve representar menos de 50% da população brasileira. Até 2040, os especialistas acreditam que deve haver empate percentual entre ca­ tólicos e evangélicos.

“Esse crescimento ocorre por­ que o mundo evangélico está no dia a dia das pessoas. Não é um univer­ so para onde se vai aos domingos. É fé prática, na porta, dentro da casa das pessoas e tem respostas pes­ soalizadas. Não é aquela coisa que você senta com dezenas de pessoas e ouve aquilo que a pessoa decidiu falar ou que está no cronograma”, afirma o presidente do Conselho das Igrejas Evangélicas de Caxias do Sul, pastor David Scherdien Santos. Em Caxias do Sul, não há uma estimativa precisa desse comparati­ vo. Porém, conforme o Tabelionato de Protestos de Títulos da Comarca local, são mais de 650 registros de Igrejas não católicas na cidade. O ín­ dice, entretanto, não dá a dimensão exata, uma vez que não necessaria­ mente os estabelecimentos são re­


gistrados com a nomenclatura de “igreja”. Ainda assim, dão indicativo da amplitude do cenário. Segundo informa o pastor, ao todo são mais de 300 denominações da Igreja evangélica em Caxias do Sul e cada uma delas tem várias congregações. Os números, no entanto, ele alega não serem a principal preocupação. “Se o número de cristãos (evan­ gélicos) está aumentando e a vio­ lência, a corrupção e a maldade também, o crescimento é só nomi­ nal, não adianta nada o número de adeptos crescer e a violência tam­ bém. Muitos que se dizem evangé­ licos não são praticantes do que o evangelismo prega, são desonestos, corruptos, basta ver a quantidade de políticos com esse perfil (evan­ gélico)”, ressalta Santos. Enquanto a Igreja evangélica apresenta expansão, o catolicismo perde adeptos. Apesar de ainda ocupar o posto de país com o maior número de católicos no mundo, se­ gundo o IBGE, a redução nas últi­ mas décadas chama a atenção. De 1940 para 2010, a religião deixou de ser praticamente hegemô­nica —­ quando abrangia 95% da popu­ lação — para representar, na última década, 64,6%, com um total de aproximadamente 123,2 milhões de católicos.

Pelo fim do preconceito David Scherdien Santos desem­ penha a função de pastor há 15 anos, mas afirma que “nasceu num ambiente evangélico”, numa época em que a religião sofria com inten­ sa discriminação. “Na minha infân­ cia era algo pejorativo, motivo de zombaria, escárnio. Era associado à baixa escolaridade, e estereóti­ pos econômicos, sociais e culturais. Muito mais por preconceito do que realidade. E éramos um número bem pouco representativo”, relata. Mesmo com o passar do tem­ po e o crescimento da religião, ele reitera que vencer o preconceito é ainda um dos desafios: “Quando a

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

sociedade pensa em evangélicos, pensa em extremistas ou carica­ turas. Muito por culpa dos grupos evangélicos que acabam passando imagem de radicalismo. E é aquela coisa: se você tem dez pessoas e uma está gritando, você olha para a que está gritando. Temos grupos evangélicos pacíficos, honestos, acessíveis. Mas há os grupos que são agressivos, exploradores. A so­ ciedade olha para eles e nos julga por isso.”

Em busca de renovação Ao todo, são 28 paróquias católi­ cas existentes em Caxias do Sul. Um número insignificante se compara­ do ao universo de igrejas evangéli­ cas. Para o vigário-geral da Diocese de Caxias do Sul, padre Leo­nardo Inácio Pereira, no entanto, a ideia de que há uma mudança de para­ digma religioso em andamento é relativa. Ele cita que há uma ge­ ração de adeptos surgindo, o que pode ser simbolizado pelo grande envolvimento de jovens em grupos religiosos e pelo interesse demons­ trado por adolescentes em se tor­ narem padres. Ainda assim, reconhece que a Igreja católica se distanciou da po­ pulação ao longo da História, o que, no entanto, deve mudar num fu­ turo próximo. Segundo ele, como uma das estratégias, o catolicismo

está retomando o chamado catecu­ menato, praticado pelo cristianis­ mo até o século XI e que consistia no batismo voluntário de pessoas quando adultas. “O batismo era fei­ to por adesão para pessoas adultas que conheciam a fé, a comunidade e aderiam por questão afetiva, pes­ soal. A partir do século XI, se criou o quase obrigatório batismo de crian­ ças, pois se pressupunha que todos nasciam cristãos e não precisava de esforço criativo para atrair as pes­ soas”,­explica. Ele conta que já estão se forman­ do missionários para resgatar a prá­ tica do conceito do catecumenato. “Vamos formar discípulos para irem nas casas das pessoas e convencer que, dentro da Igreja, elas podem ser mais felizes. Todas as igrejas pretendem restaurar essa prática.” Outra forma de aproximação, segundo ele, é instituir uma lingua­ gem mais acessível e direta, como a praticada pelo papa Francisco. “Com sua comunicação, o papa Francisco consegue falar daquilo que é essen­ cial, sem muitos rodeios filosóficos ou teológicos. A gente precisa con­ solidar essa forma de comunicação. O papa está conseguindo levar a mesma mensagem a todas as par­ tes do mundo”, defende. Reportagem: João Perozzo, Pedro Giles, Pietra Pauletti, Mateus Frazão

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