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Um mundo à parte Professores percorrem quilômetros para ensinar crianças no interior de Caxias Reportagem: Camila Ferreira Fotos: Camila Ferreira A Escola Municipal de Ensino Fundamental Erny De Zorzi, localizada no distrito de Vila Oliva, em Caxias do Sul, está localizada a 45 km da praça Dante Alighieri. Há quem diga que tal esforço é demasiado desgastante, visto que para chegar a tempo para a aula que se inicia às 7h25min da manhã, os professores muitas vezes acordam antes das 6h. Porém, as vagas nas escolas do interior são sempre bastante disputadas na Secretaria Municipal da Educação (SMED) pelos profissionais do ensino. Geralmente, o professor que consegue a vaga em escolas interioranas só sai quando se aposenta. Mas por que motivo vale tanto a pena sair uma hora antes de casa, podendo escolher uma escola mais próxima? Vice-diretora do turno da tarde, a professora Marlôva Pereira conta porque trabalhar em escolas do interior é uma preferência
quase unânime: “Sou professora do município há 26 anos, 22 deles eu dediquei a trabalhar no interior. Existe uma possibilidade de sair da correria e agitação da cidade grande. Há um contato maior com a natureza e a comunidade é mais unida e engajada com a escola. Talvez isso se deva ao fato de todo mundo conhecer todo mundo e a cultura interiorana mesmo. É próprio das pessoas daqui querer ajudar.” Quando perguntada sobre qual a maior adversidade de optar por um local de trabalho mais distante, a resposta é única e direta: acordar cedo. “Tenho que acordar às 5h20min todas as manhãs para conseguir chegar à escola na hora, são quase 50 minutos de viagem. No meu caso, que tenho 40 horas, passo o dia inteiro em Vila Oliva. É bastante desgastante, pois chego em
casa novamente às 19h. Mas vale a pena, não chega ser um sacrifício, é um desafio.” Fundada em dezembro de 2009, a escola de três andares tem 12 salas e uma estrutura mais antiga, com mais três salas, totalizando 15 espaços destinados aos alunos, incluindo Biblioteca, Sala de Arte, de Jogos e de Informática, uma quadra de esportes e um parquinho infantil. A instituição tem matriculados aproximadamente 280 alunos, moradores da vila e também de localidades vizinhas, com idades entre os quatro e os 14 anos. O corpo docente é formado por professores residentes do distrito, porém a maioria trata-se de educadores que moram no perímetro urbano do município de Caxias e viajam diariamente para ensinar.
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Dialeto, inclusão digital e rotatividade A professora de Língua Portuguesa Lúcia Andriolo, hoje aposentada, dedicou mais de duas décadas ao ensino no interior de Caxias. Nessa realidade, onde muitas famílias são de origem italiana, o dialeto italiano costuma ser usual entre as famílias, mas nem sempre influencia a aprendizagem do português. “Trabalhei por muitos anos na Escola Municipal de Ensino Fundamental Érico Veríssimo, localizada em Vila Seca. Com exceção dos alunos vindos de São Gotardo e Aparecida, os alunos não tinham uma grande influência do dialeto. Há localidades que possuem o sotaque mais acentuado, que é o caso
de Santa Lúcia do Piaí e Bevilaqua, nesses casos a influência não é somente na pronúncia das palavras, mas também na escrita delas.” O fato de a internet ter chegado ao interior, coisa que há 10 anos não se imaginava, colaborou muito para auxiliar no ensino e mantê-lo mais próximo dos alunos de escolas da cidade. Atualmente, as diferenças culturais são minimizadas com a inclusão digital. Qual seria, então, o maior desafio para ensinar no interior? Para as duas professoras, a resposta é a mesma: a constante mudança familiar que ocorre na maioria das famílias. “Muitas crianças são filhos de empregados das chácaras e fazendas
dos arredores, muitas vezes a estadia deles pela comunidade é efêmera. Alguns ficam apenas um ou dois meses porque é época de colheita.”, conta Marlôva. Na visão das educadoras, o excesso de mudanças causa prejuízos na aprendizagem dos alunos, pois não há um formato de ensino constante. As escolas não seguem um roteiro específico, cada uma tem o seu plano pedagógico e, por vezes, conteúdos fundamentais e básicos ficam pelo caminho devido às trocas de escolas.
A escola fica a mais de 40km do Centro de Caxias do Sul.
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Desafios na inclusão dos indígenas Em Farroupilha, falta de professores qualificados está entre os maiores problemas Reportagem: Morgana Pereira de Moraes | Fotos: Flávia Meneghini Era 19 de abril no Brasil, o que significa que o Dia do Índio chegou mais uma vez. Até então, nenhuma grande novidade, mas algumas escolas de Caxias do Sul juntaram seus alunos e foram até o interior de Farroupilha fazer uma visita à tribo Kaingang residente na região. O que chocou foi o fato de que aqueles estudantes da Escola Estadual Indígena Nivo, com seus rostos pintados e roupas típicas, não estavam fantasiados, como as crianças de tantas outras escolas fazem, aqueles jovens indígenas estavam celebrando e compartilhando sua cultura com os visitantes, honrando e firmando a cultura e história de seus ancestrais, povo sofrido, discriminado, manipulado e explorado, e que hoje é minoria. O que esses dois grupos de jovens estudantes que vivem tão perto e tão distantes têm em comum?
Talvez o fato de que ambos, em pleno século XXI, ainda enfrentam dificuldades no âmbito educacional? De um lado temos alunos lutando pelos seus direitos e por melhorias em suas escolas, enquanto do outro lado temos crianças estudando numa pequena escola, com apenas uma professora para todas as matérias que compõem o currículo, numa sala de aula multisseriada, que os acolhe somente até o 4º ano - os que desejarem dar continuidade aos seus estudos, têm que viajar alguns quilômetros até a escola mais próxima. A legislação garante que todos os alunos de tribos indígenas têm direito a uma educação bilíngue, em conformidade com as suas tradições. Na prática, a inclusão encontra desafios que vão desde a mobilização das famílias para as rotinas escolares até a falta de professores qualificados (ver box).
Quando o assunto é educação no Brasil, os questionamentos são tantos. Qual o real motivo de alguns serem tão privilegiados enquanto outros ficam nas sombras, isolados e esquecidos? Por que alguns recebem tanto espaço e visibilidade na mídia e outros não têm ao menos oportunidade de reclamar? Levando em conta todos os problemas que envolvem a educação brasileira, mas com foco no povo indígena, a Assessora Pedagógica Flávia Meneghini, da 4ª Coordenadoria Regional de Educação, respondeu alguns questionamentos sobre os alunos indígenas da região.
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Entrevista A Teia - Quantos alunos indígenas existem nas escolas que a 4ª Coordenadoria Regional da Educação abrange? Flávia Meneghini - A escola estadual indígena apresenta hoje 13 alunos. Eles são atendidos na educação infantil nos 1°, 2°, 3° e 4° anos, nos turnos manhã e tarde. Tem uma professora que atende essas classes multisseriadas. A Teia - Existe alguma previsão de melhorias na estrutura dessa escola? Flávia - A escola tá passando agora por um processo de autorização e credenciamento, porque na verdade ela não é uma escola estadual de ensino fundamental incompleto, ela é uma escola estadual indígena e ela precisa, como atende só até o 4° ano, ter a denominação de escola estadual indígena de ensino fundamental incompleto. Porque ela ainda não tem essas autorizações e credenciamentos. A tribo pede também que com essa expansão da escola, sejam incluídos mais anos do ensino fundamental, mas o espaço do terreno não permite grandes mudanças. O que está sendo negociada é a inclusão de mais um ano (5º ano). Senão, precisariam ser contratados professores de áreas e eles não estão disponíveis na região.
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A Teia - Quais os maiores problemas que esses alunos enfrentam? Flávia - Acredito que os maiores problemas que esses alunos enfrentam é que os recursos na verdade de cultura deles são bem escassos. Eles vivem dentro daquela comunidade e aquele é o mundo deles. E o que eles têm de conhecimento é que eles saem quando maiores para ir até o centro de Farroupilha vender o artesanato que é fabricado pelas mulheres e só. Eles têm só esse conhecimento de vida e de mundo. A Teia - Ainda existe preconceito com esses povos no âmbito educacional? Flávia - De certo ponto de vista o que se nota é que há mais um desconforto por parte dos indígenas do que o preconceito propriamente dito. A Teia - Existe algum programa que incentive esses jovens a continuar estudando? Flávia - O que existe, na realidade, são programas de educação continuada para professores indígenas.
A Teia - Existe algum dado de algum indígena matriculado no Núcleo Estadual de Educação de Jovens e Adultos (Neeja), ou algum tipo de supletivo? Flávia - Até o momento o único relato que tivemos foi justamente dessa professora que atua na escola . Ela concluiu o ensino médio no supletivo. A Teia - Existe mais alguma escola indígena na região? Flávia - Não existe outra escola puramente indígena, o que existem são escolas de Farroupilha, estaduais e municipais que acolhem esses alunos após os mesmos terminarem o 4º ano. E eles ganham transporte até as escolas da cidade, de ida e volta da sua comunidade. A Teia - A quantas anda a demanda de contratação de professores bilíngues? Flávia - No último edital que foi aberto, a única pessoa que se candidatou é fluente na língua Kaingang, porém ainda não havia concluído o ensino médio.
ENTENDA Conforme a Constituição Federal de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a coordenação nacional das politicas de Educação Escolar Indígena é de competência do Ministério da Educação (MEC), cabendo aos Estados e Municípios a execução para a garantia dos direitos indígenas, sendo estes: o direito a uma educação escolar específica, diferenciada, intercultural, bilíngue/multilíngue e comunitária. A Funai, órgão federal promotor das politicas indigenistas, tem como objetivo contribuir na qualificação dessas políticas e de, junto aos povos indígenas, monitorar seu funcionamento e eventuais impactos, ocupando espaços de controle social em âmbito nacional. Algumas das principais ações da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad) do Ministério da Educação para garantir uma educação escolar indígena de qualidade são o apoio financeiro à construção, reforma ou ampliação de escolas indígenas e formação de Professores Indígenas em Nível Superior (licenciaturas interculturais). O objetivo principal é garantir educação escolar de qualidade e ampliar a oferta das quatro séries finais do ensino fundamental, além de implantar o ensino médio em terras indígenas. O que só funciona na teoria, já que, na prática as condições são outras. As demandas de ofertas de vagas de Ensino Médio para indígenas é algo bem recente, de acordo com o censo escolar de 2010 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), das 2.836 escolas indígenas existentes no país, apenas 80 ofertam vagas de Ensino Médio.
A escola estadual indígena apresenta hoje 13 alunos.
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Bento Vôlei une esporte e educação Mais de 700 jovens estão inseridos no projeto social, em Bento Gonçalves Reportagem: Natália Zucchi Foto: Sulen Gomes Equipe conhecida pelo destaque no voleibol regional e que vem disputando campeonatos e ganhando títulos nos seus 16 anos de existência, o Bento Vôlei vai além do esporte para conquistar seu lugar na educação dos jovens de Bento Gonçalves. É responsável pelo projeto social Sacada Solidária, que atua desde 2005 com oficinas gratuitas de vôlei, informática e inglês para as crianças e adolescentes de escolas do município. Mais de 9 mil crianças da rede pública e privada de ensino já passaram pelo projeto. Abrangendo meninos e meninas entre sete e 17 anos, o projeto é realizado em 12 núcleos espalhados pela cidade. São oficinas de vôlei que ocorrem duas vezes por semana com horários diversificados em cada núcleo, pela manhã e à tarde, em times mistos, formados por cerca de 25 participantes com idades
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aproximadas. Nessas oficinais, as atividades têm início com o alongamento guiado e brincadeiras praticadas para o aquecimento, e em seguida os fundamentos do vôlei são ensinados de forma descontraída. Por fim, os jovens se divertem com os jogos, sempre supervisionados pelo professor e instrutor do núcleo. Os resultados são positivos para quem aprende e para quem ensina. Samuel Ferri, instrutor estagiário do núcleo SUSFA, conta como é emocionante interagir com as crianças e ver seu desenvolvimento. “Já trabalhei com outros públicos em academias, mas é muito diferente estar no projeto, tem outro significado. Principalmente nos núcleos de maior vulnerabilidade social, as crianças são afetuosas, nos recebem com abraços e perguntam como estamos”,
afirma. O estudante de educação física também fala sobre a importância do papel do instrutor: “As crianças perguntam sobre a nossa vida e pedem conselhos, é como se eu fosse um pai! Elas passam na rua e nos cumprimentam, nos valorizam. É gratificante”, se emociona. O projeto também sensibiliza os pais que acompanham as atividades. Muitos se deslocam dos seus bairros para buscar os filhos nos núcleos mais próximos e observam bons resultados. “O projeto é muito bom. Minha filha está mais engajada e participativa, nos estudos e no esporte” afirma Valnir Junior, pai de uma das estudantes.
Em 2016, foram mais de 700 crianças envolvidas com o projeto. Para a professora Ana Laura Tejera, os encontros têm grande importância na formação dos jovens e são essenciaispara algumas crianças. “Além de ser uma atividade esportiva gratuita, as crianças passam seu tempo aqui e formam amizades e valores,
aprendem com disciplina, e a gostar do esporte. É uma mentalidade que vai se criando. Alguns alunos já estão há mais de 3 anos no projeto” ressalta. A prática esportiva também abre portas para a profissão. Todo ano, os núcleos são visitados pelos professores da categoria de base do Bento Vôlei, onde
participam dos treinos para dar apoio aos grupos e também para conhecer os estudantes. Nessas visitas, os alunos que se destacam podem ser convidados a participar da categoria, sendo um incentivo ao esporte e ao atleta.
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A volta do Movimento Estudantil Os filhos do ‘Gigante’ e a ocupação das escolas em Caxias do Sul Reportagem: Kétlin Varela Se em meados de 2013, quando os brasileiros foram às ruas protestar sobre o aumento das passagens de ônibus e reivindicar direitos a frase mais dita era ‘O Gigante acordou’, temos que admitir que os filhos dele também estão de pé - e melhor, fazendo a luta. Protagonista de questões decisivas na história do Brasil como impeachment do ex-presidente Collor de Melo e símbolo também na resistência contra a Ditadura, nos últimos tempos a juventude se aquietou. Os programas sociais voltados ao ensino e a democracia foram conquistas alcançadas e plenamente desfrutadas. O movimento estudantil fechou os olhos brevemente, mas agora, os estudantes secundaristas vêm para a retomada. A ocupação das escolas públicas no estado de São Paulo, ano passado, mostrou que os nossos jovens estão conscientes das questões que lhe dizem respeito, e que estão
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dispostos a lutar por elas. Quando o governador de SP, Geraldo Alckimin, anunciou uma reforma que fecharia cerca de 90 escolas estaduais e geraria o remanejamento de mais de 300 mil alunos, os estudantes foram às ruas protestar, e também, além delas. Pela primeira vez no país, os estudantes ocuparam as escolas para lutar e se apropriar de tudo aquilo que têm por direito: educação de qualidade. O exemplo dos estudantes secundaristas de São Paulo que conseguiram êxito em suas reivindicações refletiu no país inteiro. A nova geração virou símbolo de esperança, de futuros adultos que não mais aceitarão tudo que lhes for imposto. No Rio Grande do Sul, não foi diferente. O estado, que não paga o piso salarial nacional dos professores e que atualmente está parcelando salários, gerou revolta. E mais uma vez, a revolta foi para dentro das salas de aulas de cidades como Porto Alegre, Canoas, Passo
Fundo e Caxias. #OcupaCaxias: estudantes mobilizados pelo ensino Professores mal valorizados, escolas sucateadas, merenda de baixa qualidade e ensino ultrapassado são os motivos pelos quais os estudantes caxienses se mobilizaram para ocupar as escolas da cidade. Atualmente, são cinco: Escola Estadual Apolinário Alves dos Santos, ocupada dia 18 de maio; Escola Henrique Emílio Meyer, na madrugada do dia 19; Instituto de Ensino Cristóvão de Mendonza, (19); Cavalheiro Aristides Germani, (20), e a Escola Estadual Técnica de Caxias do Sul, no dia 30.
Segundo o estudante Leonardo Cechin (17), da Comissão de Comunicação da ocupação no Cristóvão, muitas assembleias foram realizadas na escola para debater os problemas que vinham enfrentando e decidir o processo democrática e legalmente, demonstrando a maturidade das atitudes dos jovens. “Nós fizemos algumas assembleias, contatamos um advogado para ver como poderíamos ocupar dentro da lei. Também temos noção do desgaste na política, por isso não temos a ajuda de nenhum partido. Estamos fazendo tudo por conta própria”, conta o garoto, que
enfatiza que é um movimento político, mas apartidário. Em uma oportunidade particular, Leonardo visitou as ocupações em São Paulo. “Se eles conseguiram ocupar e alcançaram o objetivo, a gente também pode conseguir.” Comparando as escolas de São Paulo com as escolas caxienses, Leonardo declara “A precariedade do estrutura e dos materiais é praticamente a mesma, as salas também são lotadas. Infelizmente, não muda muita coisa nas escolas públicas.” A falta de participação do aluno dentro da escola e o ensino com modelo ultrapassado são queixas da
estudante Bianca Reis, de 16 anos. “O aluno não aprende a tomar frente, ele só aprende a obedecer. A experiência da ocupação é muito nova para todos, mas o aprendizado é constante, a cada dia que a gente vem aqui”, declara a filha de pais militantes, que são funcionários públicos. E quando se fala na experiência, os estudantes se referem às novas aulas e à própria organização para o bom convívio.
Ocupar é para somar e dividir Nem sempre a convivência entre os jovens é fácil. Pequenos conflitos causados por gostos diferentes e personalidades distintas acontecem a todo momento, mas são naturais em qualquer relacionamento de quem passa mais de cinco horas juntos diariamente. Porém, a ocupação das escolas e o propósito maior da educação gerou um efeito diferente do que seria
esperado. Colegas participativos e unidos, desde os “alunos-problema” até os alunos “nerd”, estão se empenhando em trazer palestras, oficinas e aulas diferentes para não ficar sem conteúdo, explica Gabriela da Cunha Zanelatto, do colégio Aristides Germani, que mostra com orgulho a chamada “Biblioteca da Ocupação”, com livros que
os colegas trouxeram de casa para trocar. Além disso, com os estudantes se dividindo em comissões de segurança, cozinha, limpeza e comunicação, foi realizada uma espécie de soma de esforços para manter a escola. Uma espécie de experimento da vida adulta. Ou até melhor que isso.
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Professores e comunidade: ocupam que posição? “É um resgate do movimento estudantil depois de uma estagnação, de uma ditadura que calou os jovens, parece que agora se tem um novo motivo para estar nas ruas, e que é grande também.” destaca o professor Leandro Fachin, da Escola Olga Maria Kayser, enquanto acompanha estudantes e professores grevistas durante uma manifestação realizada em frente à 4ª Cordenadoria Regional da Educação de Caxias. “O jovem na rua significa a conscientização que não dá para aguentar as escolas do jeito que são, sem laboratórios de informática, jovens até depois do meiodia sem merenda. Ainda falta muito e o número de jovens nas ruas podia ser bem maior, mas é o começo”, conclui o docente. Os estudantes entendem que participar de greves nem sempre é uma decisão fácil para os professores, que às vezes têm medo de represálias. Os professores
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mais antigos também veem o histórico de greves que não resultaram em conquistas significativas no estado e decidem não aderir. A coordenadora pedagógica da 4ª CRE (instância da Coordenadoria Regional da Educação, em Caxias) Ivanete Rocha de Miranda, disse que não adere mais à paralisação por essa razão, mas que acredita na mobilização dos estudantes para chamar atenção à causa, desde que a vontade daqueles que desejam ter aula também seja respeitada, sem a ocupação total de nenhuma escola. A posição dos pais também é diferente em cada família. Na casa de Bruna Zirbes, 16, estudante do 3º ano do EETCS, os pais não interferiram na decisão de participar da ocupação. “Meus pais entendem que eu tenho condições de decidir o que é bom para mim e que sou eu que vivo a realidade dentro da escola”, ressalta. Para Bianca Reis, o apoio
se demonstra nas pequenas ações: “A gente sente o apoio da comunidade. Eles nos ajudam com as doações, perguntam como está a ocupação, alguns estudantes do ensino superior oferecem aulas ou oficinas. Quem apoia geralmente não mostra as caras, mas quem discorda rasga nossos cartazes, xinga nas redes sociais. Com certeza, sinto que o apoio é bem maior”, conclui a militante. Em meio a tanta descrença política e um cenário nacional que não passa crédito nos poderes e nas instituições públicas, os jovens ocupando as salas de aula são quem estão passando a lição. Lutar por seus direitos, com responsabilidade, maturidade e de maneira pacífica é o que eles ensinam. Esperança nessa geração ativa e militante é o conteúdo da vez.
Arte para quê? Alteração curricular obrigatória deve contribuir para a formação humanizada Reportagem: Juliana Morás O Senado aprovou no ano de 2014 projeto que prevê a inclusão obrigatória de conteúdos na disciplina de Artes do ensino básico brasileiro: dança, artes visuais e teatro devem ser incorporados ao currículo. Antes, a lei só previsa música. As regras propostas pelo projeto valem tanto para escolas públicas e particulares, no nível básico. A medida, que altera a Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional, já havia sido aprovada pela Câmara dos Deputados, e seguiu para a sanção presidencial. Atualmente, a lei que trata do tema traz apenas a música como conteúdo obrigatório da disciplina de artes. O texto aprovado deixa expresso na legislação que artes visuais, dança e teatro também devem constituir a matéria de artes. De acordo com o projeto, os sistemas de ensino terão prazo de cinco anos para
implantar as mudanças. Esse Mas após a inclusão dessa período, segundo o texto, nova lei, mesmo sendo servirá para que os sistemas obrigatória apenas depois promovam a adequada de cinco anos, a escola formação de profissionais adicionou ao ensino em número suficiente. fundamental a música. Durante os primeiros meses A educação de aula, os profissionais básica é o primeiro nível dessa modalidade ensinam, do ensino escolar no Brasil. na teoria, aulas de música, Compreende três etapas: história da música e a a educação infantil (para importância desta conexão crianças com até cinco tanto para os estudos, como anos), o ensino fundamental para a vida. Após a segunda (para alunos de seis a 14 metade do ano, são dadas anos) e o ensino médio (para aulas de teclado e flauta, alunos de 15 a 17 anos). estimulando assim a prática. A diretora de A escola possui também, na coordenação pedagógica grade curricular, o inglês, do colégio Sagrado Coração e como extracurricular a de Jesus, Ana Lúcia Alves, opção de ballet. Educar destaca a importância da em arte é também atuar inclusão que esta lei veio com o meio ambiente, para proporcionar aos transformar o social, resistir alunos. Ana Lúcia esclarece ao conformismo e aprender que a escola, particular, já a utilizar os problemas como há muitos anos possui artes desafios de superação. no currículo escolar, porém Para o aluno apenas a arte em si, como Mateus Lopes, essa inclusão a história da arte, trabalhos veio de forma positiva, é relacionados ao mundo visível a interação deles com antigo e contemporâneo. a arte. Ele diz que todo este
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Segundo o estudante Leonardo Cechin (17), da Comissão de Comunicação da ocupação no Cristóvão, muitas assembleias foram realizadas na escola para debater os problemas que vinham enfrentando e decidir o processo democrática e legalmente, demonstrando a maturidade das atitudes dos jovens. “Nós fizemos algumas assembleias, contatamos um advogado para ver como poderíamos ocupar dentro da lei. Também temos noção do desgaste na política, por isso não temos a ajuda de nenhum partido. Estamos fazendo tudo por conta própria”, conta o garoto, que enfatiza que é um movimento político, mas apartidário. Em uma oportunidade
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particular, Leonardo visitou as ocupações em São Paulo. “Se eles conseguiram ocupar e alcançaram o objetivo, a gente também pode conseguir.” Comparando as escolas de São Paulo com as escolas caxienses, Leonardo declara “A precariedade do estrutura e dos materiais é praticamente a mesma, as salas também são lotadas. Infelizmente, não muda muita coisa nas escolas públicas.” A falta de participação do aluno dentro da escola e o ensino com modelo ultrapassado são queixas da estudante Bianca Reis, de 16 anos. “O aluno não aprende a tomar frente, ele só aprende a obedecer. A experiência da ocupação é muito nova para todos, mas o aprendizado é
constante, a cada dia que a gente vem aqui”, declara a filha de pais militantes, que são funcionários públicos. E quando se fala na experiência, os estudantes se referem às novas aulas e à própria organização para o bom convívio.
Pelo bem-estar coletivo Rim Viver reúne voluntários numa atuação dinâmica - todo afeto faz diferença Reportagem: Morgana Biondo A saúde, direito humano fundamental, é reconhecida como o melhor recurso para o desenvolvimento social. Suas condições implicam diretamente no que chamamos de “qualidade de vida”, uma maneira de medir o bem-estar de um indivíduo ou grupo, e que representa um desafio para muitas pessoas, principalmente para aquelas que carregam as dificuldades de alguma doença consigo, dia após dia. Há 23 anos, este é um dos objetivos da Associação dos Renais Crônicos de Caxias do Sul – Rim Viver: proporcionar aos seus pacientes renais crônicos uma ressocialização em prol de uma vida mais saudável. Fundada em 27 de junho de 1993, A Associação dos Renais Crônicos de Caxias do Sul – Rim Viver, presta serviços de assistência social no que diz respeito à melhoria da qualidade de vida da pessoa com
insuficiência renal crônica e seus familiares, sendo referência no atendimento socioassistencial. Inicialmente, encontros eram organizados por familiares de pessoas com insuficiência renal crônica nas próprias residências, para debates e trocas de informações sobre a patologia e seu tratamento. Passou a ser uma entidade civil em 2004, com personalidade jurídica, porém, sem possuir fins lucrativos. Tal feito fez com que houvesse uma interação extremamente proveitosa com as demais associações de renais do país, devido à troca mútua de experiências sobre a doença. Com o passar do tempo, percebeuse que a insuficiência não afetava apenas as questões orgânicas do paciente. Assim, surgiu a necessidade da criação de um espaço para atendimento, integração e inclusão social dos renais crônicos, dando vida ao projeto Rim Viver.
O atual presidente da Associação, Evandro Pinho Neckel, teve problemas de saúde em 2012 e realizou seu cadastro na entidade. Dois anos depois, foi eleito para o cargo e afirma que participar diariamente da Rim Viver fez a diferença e auxiliou na sua recuperação. “Hoje trabalho pela causa do renal, sempre buscando o melhor para os usuários e suas famílias. Contamos com uma equipe comprometida e atuante em busca de qualidade de vida, integração e sustentabilidade, mostrando que uma luta só é válida quando testemunhamos com nossas atitudes”, afirma Evandro. Os voluntários são agentes transformadores na associação. Alguns são profissionais da saúde, assistentes sociais, psicólogas, e até órgãos públicos e empresas privadas. Além de especialistas, pessoas de diversas áreas se dispõem
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a auxiliar, já que é uma experiência aberta a todos que estiverem dispostos a contribuir. Cada um tem sua missão, mas todos têm o mesmo objetivo: repletos de afeto, ajudam as pessoas, sem pedir nada em troca. Isso resulta em uma relação rica, humana e solidária. Atualmente, a entidade atende cerca de 527 pacientes e seus familiares, já participou de diversos congressos estaduais e nacionais, e realiza mobilizações de incentivo à doação de órgãos. A associação prova que solidariedade e diversão podem andar juntas através da realização de ações especiais, destinadas aos seus frequentadores, como rodas de conversa e de leitura, palestras, oficinas de artesanato e de corte e costura, reiki, além de atividades que envolvem
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a comunidade em geral, como feiras de produtos diversos, bingos, almoços beneficentes, brechó e sebo. Os renais crônicos ainda são contemplados com o Programa Qualidade de Vida. Seus benefícios englobam saúde bucal, cabeleireiro, e convênio com farmácias de manipulação. Os pacientes muitas vezes enxergam a Rim Viver como um estopim para desenvolverem seus potenciais, fazendo com que as atividades se tornem importantes aliadas para aliviar seu sofrimento e minimizar suas dores. Quando os renais têm contato com outras pessoas que já passaram ou estão passando pelas mesmas implicações causadas pela doença “há uma troca mútua de experiências, uma oportunidade de identificar no outro os problemas
semelhantes e compartilhar nossas vivências”, conta Leonardo Pereira, que participa das atividades sempre que possível. A diretoria da Associação frisa seu compromisso para com o paciente, acolhendo-o com carinho e respeito, mantendo o bom nome da entidade em nível de Estado e Brasil através da ampliação de programas já existentes e criação de novos projetos de capacitação, com o intuito de servir como um modelo para outras associações. Para ajudar, consulte mais informações no site: www. rimviver.org.br. A sede da Associação localiza-se na Avenida Rio Branco, nº 360, Bairro São Pelegrino, na cidade de Caxias do Sul RS e está de portas abertas para lhe receber! Seja um voluntário você também.
Relações Públicas nas ações comunitárias Por um mundo onde a responsabilidade social passe de um belo discurso à realidade Reportagem: Cassiane Grando Damin Foto: Leonardo Thiago Kehl O curso de Relações Públicas da Universidade de Caxias do Sul (UCS) está comemorando 45 anos. Uma das atuações menos difundidas desses profissionais é a gestão das ações comunitárias. Conforme Margarida Kunsch, uma renomada pesquisadora da área, a construção da cidadania é a base das Relações Públicas comunitárias, um trabalho comprometido com os interesses dos segmentos sociais organizados ou com o interesse público, cujos conceitos e fundamentos aplicam-se em diferentes frentes de atuação. Mestre em Comunicação e Informação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, doutoranda no mesmo programa e participante do Núcleo de Pesquisa em Comunicação Política e Pública, a professora do curso de Comunicação Social – Relações Públicas da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Fiorenza
Zandonade Carnielli, acredita que o momento é de concretizar as ações de cidadania com auxílio de uma comunicação eficiente - para além dos discursos. Junto ao curso, a professora ministra a disciplina Comunicação e Sustentabilidade no âmbito social, ambiental e econômico. Confira trechos da entrevista concedida à revista A Teia: A Teia - O conceito sustentabilidade é complexo e abrange os âmbitos social, ambiental e econômico. Que demandas comunicacionais tal conceito aciona? Fiorenza Carnielli A sustentabilidade significa uma decisão das organizações em pautar os seus negócios não apenas em busca do resultado exclusivo do lucro, mas sim na combinação dos três fatores: social, ambiental e econômico. Quando uma organização toma a decisão de ser sustentável, significa
que compreende que tem responsabilidades sobre o que faz no mundo, para que ele possa ser usufruído pelas gerações futuras de forma social, ambiental e economicamente justa. A sustentabilidade exige uma concepção comunicacional exatamente porque significa reconhecer que a empresa não está sozinha no mundo: ela estabelece relações, suas atividades produzem impactos positivos e negativos do ponto de vista social, ambiental e financeiro sobre a vida de outras pessoas e organizações. Ou seja, estamos falando dos públicos, das partes interessadas e, numa gestão sustentável, a relação com os públicos deve ser permanente e pautada pela responsabilidade e transparência. A Teia - A postura do profissional é essencial
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para um bom resultado em seu trabalho. Como o profissional de Relações Públicas pode se comportar nas questões sociais no ambiente corporativo ou em uma ONG? Quais são as principais diferenças que precisa considerar? Fiorenza Carnielli - Um RP deve trabalhar para promover uma comunicação simétrica, que reconheça a importância dos interesses não apenas da organização em que trabalha, mas dos públicos com os quais ela se relaciona. Além de reconhecer verdadeiramente a relevância dos públicos, é fundamental adotar práticas de comunicação não apenas para falar, enviar mensagens a esses públicos, mas para escutá-los. É fundamental ter ouvidos abertos para captar as demandas, percepções, críticas e sugestões dos públicos. E, se até há algum tempo, esses públicos não tinham espaço de fala, as redes sociais digitais abrem infinitas possibilidades para o ativismo e defesa de causas que impactam diretamente a organização. A Teia - A sustentabilidade tornou-se um dos grandes instrumentos de marketing das empresas e muitas vezes tem se distanciado do objetivo fundamental. Como o profissional de Relações Públicas pode se posicionar, mostrando ao mercado a seriedade desse trabalho? Fiorenza Carnielli - É preciso ir além do belo discurso. Nos últimos anos vimos uma profusão de relatórios e premiações em sustentabilidade sendo produzidos pelas áreas de comunicação das organizações. O desafio agora é dar um passo atrás e
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avaliar as práticas concretas que sustentam esses discursos. Se aprendemos a falar sobre sustentabilidade, é hora de usarmos esse conhecimento para avaliar as práticas e implantar melhorias para que elas possam incluir as partes interessadas de forma mais profunda e verdadeira. Significa que a comunicação tem que trabalhar não apenas para falar da sustentabilidade, mas para fazer com que ela aconteça – mais e melhor. A Teia - Quais ações devem ser consideradas essenciais pelo profissional? O que, de fato, ele precisa ponderar e por onde pode começar para trazer ações efetivas? Fiorenza Carnielli - O primeiro passo é conhecer os seus públicos: quem são, onde estão, o que pensam sobre o trabalho da organização, como posso ouvi-los? Depois, é colocar em prática ações de comunicação que sejam não apenas do interesse da organização, mas que sejam interessantes também para os públicos. E se perguntar sempre: isso que estou fazendo faz sentido para as pessoas com quem estou me comunicando? A Teia - Sabemos que muitas profissões têm passado por transformações. Quais as perspectivas de mercado para o profissional de RP no quesito Comunicação e Sustentabilidade? Há alguma mudança ou indícios que já podem ser antecipados ou percebidos? Fiorenza Carnielli Não tenho dúvidas de que a comunicação é requisito obrigatório para a sustentabilidade. Que outro profissional senão
o RP é mais habilitado para avaliar e trabalhar no contexto de relações de uma organização? Então, temos que estudar a matéria e ocupar espaço – e rápido! Biólogos, geógrafos, administradores e engenheiros, por exemplo, são fundamentais para a gestão da sustentabilidade, mas a comunicação para a sustentabilidade é uma tarefa ética que se impõe aos RPs. Outras atuações Devido à abrangência da atuação desse profissional, fica difícil definir o seu papel em poucas linhas. De acordo com Dan Lattimore, as Relações Públicas são praticadas desde organizações multinacionais ou pequenas agências de prestação de serviços e movimentos sociais. O autor afirma que o profissional tem como papel estabelecer e manter boas relações, podendo atuar em diversos setores ou equipes de comunicação corporativa, organizações sem fins lucrativos ou órgãos públicos. O principal papel é assumir uma função de liderança e gestão que auxilia a atingir os objetivos, facilitando a transformação da organização e até mesmo da sociedade. A comunicação pode ser tanto interna quanto externa, são diversos públicos que podem ser trabalhados, e por isso o curso é dinâmico e desenvolve uma diversidade de habilidades, desde consultoria, relações com investidores, gestão de crises, relações com a mídia, assuntos públicos, comunicação de marketing, relações comunitárias, entre outros.
O caminho de Tiago Frank até a Tocha Treinador da seleção brasileira de basquete em cadeiras de rodas fala sobre sua carreira dentro do esporterealidade Reportagem: Rafael Zanol Foto: Suelen Gomes O treinador da Seleção brasileira masculina de basquete em cadeira de rodas, Tiago Frank, será um dos condutores da Tocha Olímpica na cidade de Caxias do Sul, no dia 8 de julho. O caxiense percorrerá 200m do percurso determinado na cidade, carregando o símbolo da competição. O evento simbólico, na cidade da Serra gaúcha, também antecederá os jogos paralímpicos do Rio de Janeiro, principal competição da carreira do técnico.
A entrada no esporte Tiago Frank é fanático pelo basquete desde criança, já que seu pai foi professor de Educação Física e ele sempre conviveu com o mundo esportivo. O ainda jovem Tiago acompanhava pela televisão jogos da liga americana de basquete, a NBA, que na época ainda
era muito desconhecida dos brasileiros, e isso o incentivou a começar a jogar e estudar o esporte. Desde sempre, Frank jogou basquete com seus amigos, mas como uma forma de diversão, sem pretensão alguma de se tornar jogador no futuro. “Meu objetivo nunca foi ser jogador. O lado técnico sempre me interessou mais”, revela. Seguindo os passos de seu pai, Frank ingressou no curso de Educação Física na Universidade de Caxias do Sul (UCS), no ano de 2001. Durante seus anos de formação e após muito tempo treinando as categorias de base de basquete da UCS, em 2008, Tiago foi convidado para fazer parte do Centro Integrado das Pessoas com Deficiência de Caxias do Sul (CIDEF), projeto da própria Universidade
que promove atividades físicas para pessoas com deficiência. Tiago chegou para aprimorar as atividades relacionadas ao basquete. Frank conta que a passagem do basquete tradicional para o basquete em cadeira de rodas foi difícil na parte de adaptação, mas que o jogo em si não muda. “A minha vontade de aprender a trabalhar com aletas em cadeira de rodas era maior”, declara. Treinando a equipe do CIDEF por cinco anos, Tiago adquiriu novos conhecimentos na área paradesportiva, e reconhecimento nacional a partir do momento em que, em 2013, foi convocado pela Seleção Brasileira de Basquete em Cadeira de Rodas para treinar a seleção sub-21 nacional, para a disputa dos jogos 19
Parapanamericanos de Jovens, realizada em Buenos Aires, na Argentina, onde se sagrou campeão. “Esse foi o meu primeiro contato com a Seleção, a partir disso pude ser chamado para as Paralimpíadas deste ano”, diz. Treinando a Seleção Paralímpica Com o bom trabalho realizado com a Seleção sub-21, a Confederação Brasileira de Basquete em Cadeira de Rodas (CBBC) passou a acreditar mais na capacidade de Tiago Frank, o que resultou na sua convocação para conduzir a Seleção Brasileira da modalidade nos jogos paralímpicos deste ano, que acontecem entre os dias 7 a 18 de setembro, no Rio de Janeiro. Com pouco mais de três meses restando para o início da competição mundial, Frank conta que ainda não tem o grupo de jogadores definido.
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Apesar dos treinos já serem feitos da maneira que um elenco fechado faz, um jogador precisará ser dispensado para a disputa dos jogos. “Poderão ser convocados 12 jogadores, hoje temos uma lista consistente com 13”, esclarece. Para a definição final dos convocados, Frank fala que ainda serão realizados os jogos do SulAmericano de Basquete em Cadeiras de Rodas, na Colômbia, que começa no dia 26 de junho. Após a competição continental, segundo Frank, está programada uma série de partidas amistosas contra a Seleção da Alemanha, ainda sem datas definidas. Nas Paralimpíadas do Rio 2016, Tiago Frank ainda não consegue pensar em conquistar uma medalha de ouro, mas reconhece que seria um grande feito, ainda mais que a competição estará acontecendo no Brasil. Para o técnico, antes de imaginar uma conquista, é necessário trabalhar forte
para construir um time sólido e começar bem o campeonato. “Precisamos ter consistência. Só assim poderemos pensar em uma medalha no futuro”, alega. O técnico revela que não pensa na medalha de ouro como o objetivo principal para a competição hoje, somente no decorrer da competição ela pode passar a ser. “Podemos acabar a competição em uma posição ruim, mas jogando bem. Da mesma forma, estaremos contentes com o rendimento”, fala. O basquete em cadeiras de rodas nas Paralimpíadas terá, ao todo, 12 Seleções, que já foram divididas, por sorteio, em duas chaves. O Brasil está no grupo B, junto com Alemanha, Argélia, Estados Unidos, Grã-Bretanha e Irã. No grupo A, estão Austrália, Canadá, Espanha, Holanda, Japão e Holanda.
Conhecer para aceitar! Imigrantes e suas histórias de adaptação e solidariedade na Serra Gaúcha Reportagem: Ana Júlia Griguol Foto: Pietro Carlucci Alimentando o sonho de um futuro próspero, no ano de 2011 milhares de haitianos e senegaleses começaram a imigrar para o Brasil à procura de emprego e estabilidade. Aos poucos foram chegando e ocupando o seu espaço por todo o país, quebrando barreiras e enfrentando os mais diversos desafios. Na Serra Gaúcha, em pouco mais de cinco anos, a população migrante teve uma crescente superior a 15 mil pessoas, identificando nesta região grandes oportunidades de crescimento. Levando em consideração que a Serra é considerada como um dos principais polos industriais do Estado, os senegaleses e haitianos foram chegando nas mais variadas cidades, como Caxias do Sul, Bento Gonçalves, Veranópolis e Nova Araçá, que foi o caso do senegalês Cheikh Mbacke Gueye, de 27 anos: “Quando
cheguei no Rio Grande do Sul fui para Nova Araçá trabalhar em um frigorífico, já que era um emprego que não exigia que eu falasse” afirmou com pesar, sabendo que não dominar a língua portuguesa foi uma das maiores dificuldades pelas quais passou ao chegar ao Brasil. Atualmente, Cheikh domina cinco línguas: wolof, francês, português, árabe e parte do inglês. Além de não dominar o português, os imigrantes sofreram com a escassez de empregos ocasionada pela crise econômica crescente nos últimos anos, bem como o preconceito, por serem estrangeiros e negros. Com muitas portas se fechando, os imigrantes puderam contar com a ajuda do CAM- Centro de Atendimento ao Migrante, em Caxias do Sul, bem como a FAS- Fundação de Assistência Social, ligada à Prefeitura Municipal de Caxias do Sul. Organizações
voltadas a orientar, amparar e auxiliar o imigrante que aqui chega e quer se estabelecer. Segundo a presidente do Conselho Municipal de Direitos Humanos, Mirian Nora, uma das maiores lutas é poder atender todas as demandas da sociedade, tendo o Conselho total responsabilidade sobre a política de atenção a todos os segmentos do município. Ao ser questionada a respeito da situação atual dos senegaleses e haitianos no município de Caxias do Sul, Mirian, que também trabalha na FAS, afirma que todo imigrante possui o mesmo direito dos demais caxienses, sendo atendidos dentro das possibilidades e principalmente da legalidade. “Hoje Caxias percebe eles fazendo parte da Comunidade. Somos todos um só” finalizou. Hoje, com sorriso largo, Cheikh fala com mais tranquilidade sobre as
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dificuldades que enfrentou ao chegar em solo brasileiro, no qual buscava, além de emprego, conhecer novas culturas e estudos: “Existem pessoas educadas e mal-educadas. Algumas dificuldades só os negros passam, entende?”. Ainda hoje, o preconceito racial é uma das maiores mazelas da sociedade, interferindo na inclusão de pardos e negros em sociedades que possuem sua colonização europeia. Cheikh até brinca: “Se existe preconceito entre brasileiros, imagina com quem vem de fora. Infelizmente não tem como acabar com o preconceito, mas podemos melhorar”. Sobre sua interação com a sociedade, Cheikh afirma estar satisfeito, já que possui seu próprio negócio, além de ser casado com uma caxiense e ter uma filha de quatro meses: “Se atendermos bem as pessoas, sermos simpáticos e mostrarmos a elas que somos confiáveis, podemos
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viver muito bem” afirma. Em meio a diferentes dificuldades, os senegaleses e haitianos procuram saídas que os beneficie e que traga bons resultados para a sociedade em que vivem, como a criação do projeto “Senegal, Ser Negão, Ser Legal.” “Senegal. Ser Negão. Ser Legal.” A Campanha “Senegal, Ser Negão, Ser Legal.” foi lançada em 14 de maio deste ano, pelo senegalês Cheikh Mbacke Gueye, que através da combinação das palavras, sintetiza o orgulho de suas raízes. A primeira ação contou com a participação de professores, jornalistas, músicos entre outros, todos com o objetivo de pensar e organizar ações que possam contribuir para uma interação e inserção, em Caxias e na região, além de lutar pelo fim do preconceito. Estão previstas ações como palestras em instituições de ensino com a participação de imigrantes,
promoção de cursos de português para estrangeiros e de wolof (língua senegal) para brasileiros, além de compartilhar vivências, tradições e cultura. O grupo está à procura de voluntários, podendo se identificar através do e-mail senegalsernegaoserlegal@ hotmail.com. “Respeitar a si mesmo, em primeiro lugar. Respeitar os outros, não importa a religião, a idade, a cor. Entender e saber que ninguém é igual a ninguém. Devemos ajudar as outras pessoas, pode ser só com palavras de apoio e incentivo.”
Escola mais cedo Ensino obrigatório desde os quatro anos impacta na falta de vagas na rede pública local Reportagem: Djeison Silva Foto: Jéssica Braga Quando se fala em Educação Infantil, logo se pensa no pré-escolar, aquele período de ingresso que antecede a primeira série, ou primeiro ano. O que poucos sabem é que, em 2013, foi elaborada uma lei que regulamenta e antecipa a entrada das crianças na escola para os quatro anos de idade. A Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013, estabelece ensino obrigatório entre os quatro e 17 anos de idade. Os pais devem se responsabilizar pela permanência de seus filhos até completarem a maioridade. O decreto divide o ensino em três etapas: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Até então, o ensino brasileiro era constituído em ensino fundamental e médio. A emenda anexa a educação infantil ou préescola à etapa anterior do ensino fundamental e integra as crianças de quatro a seis anos de idade. Além disso, a Lei também
orienta quanto à avaliação das crianças nesta etapa de ensino, não havendo reprovação dos alunos nesse período, focando principalmente em aspectos de desenvolvimento psicomotor, cognitivo e social do aluno. O prazo para garantir a inclusão dessas crianças nas redes municipais e estaduais de ensino público termina este ano e, com isso, a demanda pela Educação Infantil nessa etapa cresceu bastante. Outro fator é a crise econômica, que aumentou a procura por escolinhas públicas. Adaptação no município Caxias do Sul disponibiliza cerca de 11 mil vagas em escolinhas para este ano, contudo, com a migração de alunos da rede particular para a rede pública e a obrigatoriedade da matrícula de crianças de quatro e cinco anos, o déficit pode chegar a 8,4 mil vagas para crianças de zero
a cinco anos, com base em dados obtidos pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE). Na tentativa de reduzir o déficit, segundo informações da Secretaria Municipal de Educação (Smed), a projeção é atender, via contratação de escolas privadas, 4,1 mil alunos. O município se vê forçado a essa medida pela incapacidade de acompanhar o ritmo de crescimento da cidade – e para responder, prioritariamente, às ações judiciais que sofre em consequência dessa demanda não atendida. Os pais das crianças que completaram quatro anos até o dia 31 de março deste ano, e que ainda não procuraram inscrever seus filhos, deverão procurar a Secretaria de Educação para formalizar a inscrição para o ingresso do aluno. Também é possível realizar a inscrição na escola ou on-line pelo site www.educacao.rs.gov.br. Ainda segundo a Smed, cerca de mil estão na
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espera de uma vaga, mas estar na fila há muito tempo não significa prioridade na matrícula. Como faltam vagas, o município faz uma triagem dos alunos, com base no zoneamento (onde reside a criança e qual a escola mais próxima) e na situação socioeconômica da família. São utilizados como critério de desempate para a vaga a menor renda e situação de vulnerabilidade. Por exemplo: uma mãe ou um pai desempregado precisa deixar seu filho na escolinha para procurar emprego, se a outra família tem o casal trabalhando, terá preferência na vaga. Do artigo 6º do decreto: “É dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos quatro anos de idade”, sob pena de multa de três a 20 salários-mínimos. No artigo 249 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), está prevista a detenção de 15 a 30 dias. Adaptação familiar que
Para as mães e pais recebem o auxílio-
creche das empresas em que trabalham, continua valendo a regra conforme o inciso XXV do artigo 7º da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), que determina que os trabalhadores têm direito a receber essa assistência a seus filhos e dependentes desde o nascimento até cinco anos e 11 meses de idade. Entretanto, os pais que recebem esse auxílio e o utilizam para contratação de babás, deverão matricular a criança, que completa os quatro anos de idade, em uma instituição préescolar e só terão direito ao benéfico (auxílio-creche) se comprovarem que a criança utiliza de babá em turno oposto ao da escola. A Operadora de telemarketing Mireli, 25, trabalha meio turno. Ela conta que seu filho Pedro, quatro, sempre ficou com sua avó e recebia o auxíliocreche do callcenter em que trabalha no valor de R$ 180,00, o qual utilizava para pagar a sua mãe. Agora que Pedro completou 4 anos, ela teve de matriculá-lo em uma rede pública de ensino e, dessa forma, perdeu o beneficio, já que a criança
está frequentando uma instituição pública e o seu turno de trabalho confere com o turno que a criança estuda. Mireli conta ainda que, no princípio, a adaptação do Pedro foi muito difícil. Ela acredita que é uma idade muito baixa para a criança ter esse tipo de desprendimento dos pais, mas admite que o projeto pedagógico é ótimo e já tem notado diferenças significativas no comportamento e no vocabulário do filho. “O Pedro estranhou muito nos primeiros dias, hoje ele se entusiasma em ir para escola. Ele traz trabalhinhos, desenhos e contos de fadas para lermos juntos. É ótimo como o projeto visa também o envolvimento dos pais com a comunidade escolar”, finaliza.
Saiba mais Para regulamentar essa nova etapa de ensino, algumas regras foram estabelecidas: • Avaliação mediante acompanhamento e registro do desenvolvimento das crianças; • Carga horária mínima anual de 800 horas, distribuída por um mínimo 200 dias letivos; • Atendimento à criança de, no mínimo, quatro horas diárias para o turno parcial e de sete horas para a jornada integral; • Controle de frequência pela instituição de educação, mínima de 60% do total de horas; • Emissão de pareceres que atestarão os processos de desenvolvimento e aprendizagem da criança.
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Por elas e para elas Um retrato da luta de grupos feministas contra o machismo da sociedade caxiense Reportagem: Alisson Patrick Oliveira Foto: Pietro Carlucci
O debate feminista vem ganhando força e destaque nos últimos meses. Porém, dizer que feminismo está “na moda” é reduzir a luta das mulheres por uma sociedade mais igualitária, menos machista e patriarcal a um surto passageiro. Ainda que grandes avanços tenham sidos sentidos e o
debate tenha se intensificado nos últimos anos – principalmente após a primavera feminista de 2015 - ainda há muito o que ser conquistado, e principalmente problematizado, no Brasil e em Caxias do Sul. Vemos cada vez mais nos meios de comunicação da região, notas de repúdio a atitudes sexistas, protestos contra personalidades associadas à violência contra a mulher e ações cobrando mais representatividade política. A visibilidade dessas ações é um retrato do protagonismo de grupos e coletivos feministas nas lutas sociais da cidade, como a Marcha Mundial das Mulheres e o Coletivo Juntas.
O primeiro, a Marcha Mundial das Mulheres de Caxias do Sul, surgiu em 2003 e é uma das referências na cidade da luta contra a violência à mulher. O movimento surgiu da organização de um pequeno grupo de mulheres caxienses, como conta Fabíola Papini, integrante da Marcha: “Em Caxias começamos nessa época, tínhamos um grupo de mais ou menos 10 mulheres, estudantes, sindicalistas, mulheres ligadas à cultura e gestoras municipais que já se organizavam como sujeito político, discutindo projeto de sociedade, garantia de direitos, e sentiam a necessidade de um espaço de fortalecimento das mulheres, reconhecendo as especificidades que uma sociedade patriarcal
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e capitalista implica para as suas vidas” , explica. Uma das primeiras atividades da Marcha na cidade foram ações contra a desigualdade salarial entre mulheres e homens – segundo dados do IBGE, em 2004 as mulheres recebiam em média salários 38% menores que o dos homens. 11 anos depois, houve uma ligeira melhora, esse número caiu para 25,5%, mas ainda está muito longe de qualquer igualdade. Na época, o grupo reuniu assinaturas para um abaixo-assinado e realizou debates sobre o tema, com foco no impacto do aumento real do salário na vida das mulheres. A Marcha reúne atualmente mulheres de diferentes setores da sociedade e a zona de atuação é ampla, segundo Fabíola: “São na sua maioria jovens, do movimento cultural, estudantil, sindical e mulheres de partidos políticos identificados com o campo da esquerda. Mas é difícil dizer quantas somos. Há períodos de maior e menor organicidade, depende das pautas e da conjuntura”, pontuou. Um desses períodos se deu no ano passado. Em meio à 4ª Ação Internacional da Marcha Mundial das Mulheres, que visa denunciar a violência imposta à mulher pela sociedade
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patriarcal, a Marcha uniu forças a grupos argentinos e uruguaios em Santana do Livramento. No encontro, chamado “Primavera Feminista: pelos corpos e vidas das mulheres”, foram discutidos temas relacionados à legalização do aborto nos países participantes. O evento, que reuniu mais de mil mulheres, se refletiu em ações conjuntas com outros órgãos de Caxias do Sul como sindicatos, Conselho Regional de Psicologia, movimentos estudantis e universitários com o intuito de trazer o debate à esfera pública. Já o coletivo Juntas é um dos mais novos na cidade. O grupo é a setorial feminina do movimento estudantil nacional “Juntos” e iniciou as suas atividades em abril deste ano, com um piquenique feminista no Parque dos Macaquinhos. O evento foi organizado através da página do Juntas no Facebook, o principal meio de contato e divulgação do coletivo. No último dia 25 de maio, o Juntas lançou a cartilha “A Luta das Mulheres
Muda o Mundo” em um evento realizado na quadra de esportes Andreata, em Caxias do Sul. A publicação, organizada por Luciana Genro, é uma iniciativa da bancada do PSOL na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. Com uma agenda clara e articulada, o grupo busca manter vivo o debate feminista e de temas polêmicos, como por exemplo, o aborto. Outra frente importante de atuação do coletivo é a luta por mais representatividade feminina em Caxias do Sul, principalmente na Câmara de Vereadores. Segundo a professora Karina Luiza dos Santos de Paula, integrante do “Juntas”, o grupo sente a necessidade de uma maior participação feminina no debate político da cidade:
“vemos uma evolução no debate sobre o feminismo, mas ele ainda está um pouco aquém do esperado. [A mulher caxiense] Precisa de mais representatividade, principalmente alguém que lute ativamente pelo feminismo”, apontou Karina. Representatividade política Atualmente, a bancada feminina na Câmara de Vereadores é composta por Ana Maria Corso e Denise da Silva Pessoa, ambas do PT. Apenas duas mulheres em um total de 24 vereadores. Uma representação de apenas 8%, que não condiz com as 221.952 mulheres que residem em Caxias do Sul e que juntas representam 51% do total de moradores da cidade, segundo o último censo do
IBGE realizado em 2010. O grupo frisa que não possuí ligação com nenhum partido político, pois engloba pessoas de várias frentes e ideologias. Porém, buscando aumentar a representação feminina na Câmara e manter o diálogo dos direitos femininos na agenda do município, o Juntas pretende lançar pelo PSOL uma candidata ao legislativo municipal já nas próximas eleições. O nome da candidata deve ser anunciado após a convenção do partido, ainda sem data marcada. A candidata ainda não está definida, mas o seu objetivo é bem claro: lutar ativamente pelos direitos da mulher na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul. Debate Feminista em Caxias do Sul e a tradição Muito mais que em outras regiões do Estado, o debate feminista em Caxias do Sul vem ganhando mais força e voz a cada dia. Porém, ainda existem questões que incomodam a mulher caxiense e tabus a serem derrubados, principalmente os que envolvem as tradições religiosas católicas,
um dos pilares da imigração italiana na cidade. A legalização do aborto é um deles. Condenado pela Igreja um atentado contra a vida - já que a fé católica prega que a vida se inicia no momento da fecundação do óvulo pelo espermatozoide - é até hoje um desafio no diálogo de grupos feministas com a sociedade. Fabíola Papini, integrante da Marcha Mundial das Mulheres, defende a importância de incluir o aborto nas discussões sociais: “A pauta da legalização do aborto é um tema delicado, mas que precisa ser encarado. Ela encontra a resistência daqueles que insistem em desconsiderar o estado como laico. Muitos grupos religiosos e hipócritas se esforçam para negar a realidade de prejuízos físicos, psíquicos, sociais e mortes que atingem as mulheres, que, independente da legalidade, recorrem à uma interrupção de gravidez”. Por outro lado, Karina Luiza dos Santos de Paula, integrante do coletivo “Juntas de Caxias do Sul”, sente uma ligeira melhora nesse quadro e um aumento do espaço para a discussão na cidade: “Percebemos que quando algumas pessoas que têm ressalvas quanto ao aborto abrem-se para o
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diálogo, muitas acabam entendendo nossos argumentos e até mudando de opinião. Tirando alguns com mais preceitos religiosos, que acabam prejudicando a discussão. Mas é um debate que tem cada vez mais espaço em Caxias”, afirmou. Uma das tradições mais antigas da cidade, o concurso de escolha da Rainha da Festa da Uva, é apontado por grupos feministas como um dos símbolos do machismo predominante em Caxias do Sul. O concurso vem sofrendo críticas ao longo dos anos, principalmente pela falta de uma representatividade real da população caxiense. Como em 2011, quando o então vereador Renato Nunes, do PRB, protocolou um pedido explicações ao Executivo sobre a falta de candidatas negras no concurso. Camila Tomazoni Marcarini, também da Marcha Mundial das Mulheres de Caxias do Sul, vê o concurso como uma prática machista, antiquada e que não reflete a própria cultura da cidade: “Essa continuidade de um concurso de beleza em Caxias que escolhe uma ‘rainha’ nos parece uma ação antiga, ultrapassada para nossos tempos e que reafirma um padrão de beleza, um padrão que inclusive pouco
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tem a ver com as mulheres italianas que aqui estiveram e trabalharam ”. Ela também aponta para o cunho publicitário e opressor que a escolha possui: “são padrões de beleza e comportamento que estão colocados. Mulheres brancas, magras, de cabelos longos e sempre pintadas como bonecas que representam que mulheres? Não as mulheres caxienses, mas apenas uma propaganda para o evento e que dialoga muito mais com o que os homens gostam de ver nas mulheres, com o que elas são de verdade ou gostariam de ter a liberdade de ser”. Semelhante a 2011, das 20 candidatas que concorreram à coroa de Rainha da Festa da Uva em 2015, nenhuma delas era negra. Eduardo Cunha e o retrocesso nos direitos da mulher Os recentes casos de estupro divulgados pela mídia reacenderam o debate em torno do aborto e do tratamento oferecido pelo Estado às vítimas de abusos sexuais. No centro dessas discussões está o
projeto de lei nº 5069/2013 de autoria do Deputado Federal Eduardo Cunha, do PMDB-RJ, e de outros membros do congresso. O texto do projeto, aprovado pelo Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, prevê penas de quatro a oito anos de reclusão para quem oriente a prática do aborto, mesmo nos casos permitidos pela Constituição, como em casos de estupro ou quando a gravidez coloca em risco a vida da gestante. No texto do projeto, o deputado Eduardo Cunha justifica que a legalização do aborto vem sendo imposta por organizações internacionais, que são financiadas por fundações norte-americanas ligadas a interesses capitalistas, com o objetivo promover um con-
trole populacional. Porém, grupos feministas apontam para o fato de que o projeto de lei inviabilizará o acesso de mulheres vítimas de estupro à informação e ao tratamento garantido na Constituição Federal, além de ser um claro retrocesso na luta pelos direitos femininos e por mais igualdade. No ano passado o projeto, que aguarda votação no plenário da Câmara, foi alvo de inúmeros protestos em todo o país. O movimento, que ficou conhecido como Primavera Feminista, levou milhões de mulheres às ruas para pedir o afastamento do então Presidente da Câmara dos Deputados – afastado do cargo no início de maio pelo Supremo Tribunal Federal – e colocou em pauta a discussão da legali-
zação do aborto no país. Grupos feministas defendem a legalização do aborto como um direito da mulher de ter a escolha de manter ou não uma gestação. Como questiona Karina Luiza dos Santos de Paula, integrante do coletivo Juntas, de Caxias do Sul: “Feminista nenhuma defende o aborto como método contraceptivo, mas sim como uma opção de escolha. Porque o homem não tem alguém legislando sobre o seu corpo. Aí temos alguém que vai determinar o que a mulher pode ou não fazer com o seu corpo? ”. Outro risco apresentado é o de que o projeto de lei estimule ainda mais os abortos clandestinos no país. Segundo dados de 2013 da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 1 milhão de abortos clandestinos são realizados por ano em todo país e, em média, 200 mil mulheres são internadas anualmente por complicações decorrentes dessa prática. Fabíola Papini, da Marcha Mundial das Mulheres de Caxias do Sul, aponta para a “elitização” do aborto no país,
que deixa as mulheres mais pobres vulneráveis a procedimentos que colocam em risco a sua saúde: “O aborto está legalizado no Brasil para as mulheres ricas, que podem, inclusive, viajar para países onde o aborto é legal para realizar tal procedimento, basta ter dinheiro para fazê-lo. Quem sofre mais com a proibição são mulheres pobres, na sua maioria negras, que precisam fazer abortos com métodos inseguros, sem recurso, sem informação, apenas com seu desespero e solidão. ”
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Cultura que humaniza Entre as iniciativas locais, dança, literatura e respeito à diversidade étnica Reportagem: Lucas Vazatta Gomes
Nosso país está marcado por lapsos de falta de humanidade, seja no cenário político pontuado por retrocessos, ou na ascensão de todo tipo de violência que tem marcado os noticiários. Nesse contexto, alguns se esquecem que a cultura pode resgatar essa humanidade. Mesmo com tantos obstáculos ainda existe muita gente lutando nos bastidores para manter a cultura viva. Localmente, basta uma leve busca com um olho mais atento para encontrar diversos projetos socioculturais, públicos ou privados. Como cita a coordenadora de Artes Visuais de Caxias do Sul, Carine Turelly, “todo projeto cultural é social em sua íntegra”. Dentre tantos projetos em execução podemos citar o Livros para Ouvir, da Biblioteca 30
Pública de Caxias do Sul, que consiste em organizar grupos de leitura de livros para cegos. Podemos também destacar a Casa das Etnias, localizada aos fundos do complexo do Centro de Cultura do Ordovás, no bairro Panazzolo em Caxias. A casa possui uma exposição permanente de diversos instrumentos que contam a história das várias etnias que formam a sociedade da nossa região. Além da exposição, eles oferecem cursos de línguas e danças tradicionais de cada nacionalidade. Resgatando a alma através dos movimentos do corpo Dentre os vários ramos da cultura, um dos mais antigos e marcantes é a dança, que desde os
tempos mais remotos expressa os sentimentos e a essência mais profunda da alma. Muitos desconhecem, mas Caxias do Sul conta com a Unidade de Dança, tendo como sua “casa” também o Centro de Cultura do Ordovás. A Unidade de Dança é atualmente coordenada por Marina Vilchez e conta com diversos profissionais envolvidos na administração do grupo. É totalmente financiada pela Prefeitura de Caxias do Sul. A unidade tem dois grupos vinculados, um deles é a Cia de Dança. Suas apresentações são regulares e abrangem um grande leque de estilos de dança. A compahia é composta por bailarinos profissionais e tenta sempre diversificar os coreógrafos, para se manter em desenvolvimento. Alguns desses bailarinos foram formados
dentro da própria companhia, vindos da Escola Preparatória de Dança. A Escola Preparatória de Dança (EPD) é o outro grupo vinculado à unidade. A EPD exerce um brilhante trabalho de formação de bailarinos. Seu currículo consiste em seis anos de preparação, com aulas práticas duas vezes por semana no turno inverso ao escolar das crianças, totalmente gratuitas. Infelizmente, a EPD não tem como contemplar todas as crianças que buscam participar, por isso é feita uma audição no início do ano. A escola, além de todo o trabalho técnico de formação profissional das crianças, concede muito mais. Em formação, Guilherme (11), Mariana (11) e Ana Sophia (12) têm brilho nos olhos quando o assunto é dança. Traduzem assim o seu sentimento: “Alegria”, diz Guilherme, liberando
um sorriso encantador. Mariana: “Me sinto muito bem, é difícil de explicar”. Rapidamente Guilherme emenda “Eu fico sorrindo, não consigo dançar sem sorrir”. O sentimento de satisfação e alegria nos três é evidente. Todos citam a importância das aulas nas outras tarefas do seu dia a dia, como concentração na escola e tranquilidade para lidar com diversas situações, além de melhorar sua comunicação e interação. Mesmo que nem todas as crianças sigam a carreira, a importância desse momento que estão vivendo na sua formação é muito importante. Janaína da Silva Cruz é bailarina da Cia. de Dança e formada na Escola Preparatória. Ela conta que sua transição foi muito natural e já atua profissionalmente na companhia há dez anos. Além de ter adquirido uma profis-
são, ela cita a importância da dança na sua capacidade de comunicação: “Eu sinto uma liberdade dançando que eu não consigo expressar verbalmente”. Outro bailarino da Cia. é David da Cruz, que é também professor na EPD. David reforça como a dança na vida das crianças pode ajudar em suas tarefas fora da escola. Nosso país está marcado por lapsos de falta de humanidade, seja no cenário político pontuado por retrocessos, ou na ascensão de todo tipo de violência que tem marcado os noticiários. Nesse contexto, alguns se esquecem que a cultura pode resgatar essa humanidade. Mesmo com tantos obstáculos ainda existe muita gente lutando nos bastidores para manter a cultura viva.
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