revista
Entrelinha Revista da disciplina de Design de notícia do Curso de Jornalismo da UCS
Projeto Sociocultural aprimora talentos Há 7 anos, o Projeto Acorde reúne crianças e adolescentes em busca de conhecimento cultural (p. 9)
Editorial
A palavra que caracteriza esta edição da revista Entrelinha é a diversidade. O tema diz respeito não apenas à cultura de uma comunidade, mas ao seu comportamento, divergências sociais e políticas. Vivemos em um mundo que não se resume ao certo e errado ou ao bem e ao mal mas, sim, em que diversas possibilidades surgem em nossos caminhos. Essa pluralidade de escolhas reflete uma uma sociedade cada vez mais complexa e que exige de seu cidadão um posicionamento crítico. Ao longo desta revista, pretendemos criar uma reflexão a respeito da sociedade moderna, demonstrando que vivemos em constante mudança e que visões de mundo atuais podem ser, ultrapassadas. Assim, os acadêmicos da disciplina de Design de Notícia convidam o leitor a conferir assuntos divergentes, e ao mesmo tempo, complexos quando se trata do comportamento da sociedade atual.
Professora Dra. Marlene Branca Solio
Reitor D. Antônio Kuiava
Alunos
Pró-Reitor Acadêmico Dr. Marcelo Rossatto
Bruna de Oliveira Marini Bruno Tomé de Oliveira Claudia Debona Claudia Palhano Débora Debon Diélen Fontana Gabriel da Rosa Rodrigues Gustavo Rodrigues de Vargas Luciane Karen Modena Luísa Biondo Pâmela Pelizzaro Ricardo Augusto de Souza
Diretora do Centro de Ciências Sociais Dra. Carolina Gullo
Coordenador Curso de Jornalismo Dra. Álvaro Benevenutto Júnior Universidade de Caxias do Sul - UCS Francisco Getúlio Vargas, 1130 CEP 95020-972 Telefone(54)32182100
Reportagens
3 Eles precisam apenas de amor e carinho 4 Ajude você também 5 A juventude que muda o mundo 8 A ideologia presente nos processos de produção 9 Às sombras do sucesso 10 Projeto social aprimora talentos 12 Caxias da cultura 13 Nômades contemporâneos 14 A crença que construiu uma comunidade 16 A democracia representativa em crise 18 De quem é a terra?
PROTEÇÃO À VIDA ANIMAL
Eles precisam apenas de amor e carinho Há sete anos, a ONG União Pela Vida Animal, de Flores da Cunha, se dedica à realização do trabalho voluntário. • Bruna de Oliveira Marini Foto: Angelo Luís Scopel
Centenas de animais estão abrigados na chácara da entidade
Q uem nunca se deparou com um bichinho abandonado na rua e teve von-
tade de levá-lo para casa? Se você já se sensibilizou com um animal ignorado, às margens do desprezo, saiba que existem diversas maneiras de ajudá-lo. Só no Brasil, segundo a Organização Mundial da Saúde, o número de animais que vivem nas ruas é 30 milhões, dos quais 10 mi lhões são gatos e 20 milhões são cães. A tualmente, muitas Organizações Não Governamentais (ONGs) trabalham em prol da defesa da vida animal. Há sete anos, o amor incondicional pelos bichinhos fez com que um pequeno grupo de voluntários criasse a União Pela Vida Animal, mais conhecida como Upeva, em Flores da Cunha. Hoje, a ONG conta com cerca de vinte voluntários e possui uma chácara, onde abriga os animais retirados das ruas. A presidente da entidade, Justina Inês
4
Sugari, relata que, mesmo com a verba recebida da prefeitura municipal, os gastos são bastante elevados. A Upeva atende, atualmente, 140 cães que estão abrigados na chácara e mais de 100 cães que vivem nas casas das voluntárias. Além disso, a ONG cuida de vários gatos. A entidade é responsável pela alimentação, castração, vacinação e medicação dos animais, além de todas as despesas de manutenção e conservação da sede, a qual foi cedida pela prefeitura. Em função disso, “a ONG já não consegue, somente com o repasse mensal da prefeitura, arcar com todas as despesas, conta Justina. Mesmo com todas as dificuldades que a ONG encara, os voluntários e voluntárias não medem esforços para amparar os bichinhos que precisam de um lugar para morar, além de conscientizar as pessoas para que não maltratem nem abandonem os animais. Os envolvidos com a causa
arregaçam as mangas e dão todo o suporte e amor necessário para aqueles que também os amam sem esperar nada em troca.
A recompensa da adoção Há quatro anos, a família da estudante de engenharia química Nicolle Costa ganhou um motivo especial para comemorar: a adoção do cachorro vira-lata Chicão. Na época, o recém-nascido não precisou ir para a sede da Upeva, pois foi adotado pelo pai de Nicolle. O Chicão foi o primeiro cachorro a chegar à casa da estudante, que atualmente tem quatro vira-latas. “Com a chegada do Chicão, eu passei a conhecer a triste realidade do abandono e o quanto os bichos podem sofrer nas mãos humanas. Isso me motivou e à minha família, a termos outros cães e abrigar os que nos fosse possível até conseguirmos alguém com condições de adotá-los. Hoje, eu não poderia mais imaginar minha vida sem os meus vira-latas, cada um com suas cores, formas e personalidade encantadora”, enfatiza Nicolle. Atitudes como essa são engrandecedoras, tanto para os animais adotados quanto para as pessoas que os adotam. Ter um bichinho em casa é uma terapia, pois além de serem uma ótima companhia, eles estão sempre cheios de amor para dar.
Mais
A página da Upeva no Facebook viabiliza o processo de adoção dos animais. “A divulgação é uma oportunidade para os bichinhos serem adotados sem precisarem ir para a sede da ONG”, destaca o voluntário Angelo Luís Scopel, um dos gestores da rede social.
ONG
Ajude você também Parceiros Voluntários oferece caminho para para ajudar as entidades • Diélen Fontana
valor, o que o torna mais ativo socialmente e ciente do que ocorre ao seu redor. A importância do voluntariado desperta o nosso lado mais humano, todavia, muitas vezes, não se sabe por onde começar, talvez por falta de informação. Uma opção é procurar a Parceiros Voluntários, criada em 1997, com o objetivo de mobilizar, articular, formar e estimular o voluntariado organizado. A entidade orienta as pessoas que têm interesse em iniciar um trabalho voluntário, indicando qual instituição é realmente séria e necessita de alguma atenção especial. Facilita esse caminho de modo profissional, auxiliando na escolha da ins tituição e no trabalho a desenvolver, explorando conhecimentos e disponibilidade de tempo. A Parceiros apoia, ainda, as organizações da sociedade civil e escolas públicas com a mesma responsabilidade e qualificação, trabalhando aspectos de gestão, planejamento e conceitos de redes de colaboração. O primeiro passo é agendar uma Reunião de Conscientização. Nela, a pessoa recebe informações sobre o trabalho voluntário organizado e sobre responsabilidade social individual, o que auxilia na escolha da área em que pretende atuar como voluntário. Toda pessoa com mais de 14 anos, que tenha vontade de disponibilizar seu tempo, conhecimento e emoção em prol de sua comunidade, pode se candidatar. O voluntário é inteiramente livre para escolher os dias e horários em que poderá estar na instituição e iniciar ou parar de voluntariar no momento em que julgar oportuno. Uma das principais ações da Parceiros Voluntários é: Tribos nas Trilhas da Cidadania – ali os jovens são incentivados a voluntariar, desenvolvendo ações sociais dentro das três trilhas sugeridas: Educação para a Paz, Meio Ambiente e Cultura. Maria Helena Boff, 41 anos, é voluntária há três anos. Ela divide suas experiências:
Foto: Paulo Pasa
T rabalhar as qualidades internas faz despertar no indivíduo seu verdadeiro
Centro Educativo Esperança “Trabalho como voluntária no Centro Educativo Esperança, que atende crianças com vulnerabilidade social.” O trabalho é realizado uma vez por mês, por meio de oficinas com brincadeiras e histórias, nas quais a honestidade e a luta pelos sonhos são sempre instigadas. “É muito gratificante sentir que a cada nova oficina as crianças sentem mais confiança na pessoa voluntária e começam a contar suas histórias, muitas vezes tristes.” Segundo ela, o choque de realidade traz a certeza de que somos muito pequenos e que falta muito para o ser humano ser o que pensa que é. “Enquanto existir uma criança sendo maltratada e sobrevivendo de forma desumana, não existe significado real para a tal racionalidade de que os “seres humanos” se orgulham”. Em Caxias do Sul, a Parceiros Voluntários iniciou atividades em 1999, e é dirigida por um conselho de empresários voluntários. Funciona como um elo entre pessoas, empresas, entidades e escolas que querem disponibilizar tempo e conhecimento para atender as demadas sociais do município por meio do Voluntariado Organizado.
Como participar CIC – Câmara da Indústria, Comércio e Serviços de Caxias do Sul Rua Ítalo Victor Bersani, 1134 BairroJardim América 95050-520 - Caxias do Sul - RS Fone/Fax: 54 3218 8085 E-mail: comunicacao@parceiros.org.br
5
SOCIAL
A juventude que muda o mundo Satisfação pessoal e alegria de contribuir na construção de um mundo melhor são alguns dos valores vivenciados por jovens voluntários • Gabriel Rodrigues Foto: Marlon Roth
Estatuto da Juventude reforça o papel dos jovens na mudança do comportamento social
N o Brasil, segundo o Estatuto da Juventude, oficializado por meio de lei no ano
de 2013, são considerados jovens todos aqueles com entre 15 e 29 anos, aproximadamente 25% da população. Por meio do Estatuto, são determinados os direitos dos jovens, que devem ser garantidos e promovidos pelo Estado brasileiro, independentemente de quem esteja à frente da gestão dos poderes públicos. O que faz o Estatuto é detalhar, dentro das garantias já previstas pela Constituição, quais são as especificidades da juventude que precisam ser afirmadas. Entre esses direitos estão, por exemplo, igualdade, lazer, liberdade de expressão, cultura, mobilidade, segurança pública, profissionalização, saúde, educação, participação social e cidadania. E ao falar de cidadania, fala-se da cons trução de uma sociedade mais justa e na
6
qual seja fácil viver. Mas qual o papel do jovem neste processo de construção de um mundo melhor? Steve Jobs, em 1997, lançou na Apple a campanha “Pense Diferen te”. Dizia que os loucos e rebeldes, como muitas vezes é considerada a juventude, são os que veem as coisas de forma diferente; são as peças redondas nos buracos quadrados. Mas “enquanto alguns os veem como loucos, nós os vemos como gênios. Porque as pessoas que são loucas o suficiente para achar que podem mudar o mundo são as que, de fato, mudam”, aponta a campanha.. Porém, existem os loucos que acreditam ser capazes de mudar o mundo, e assim o fazem, tal como dizia Jobs. Como um exemplo dessa juventude que se comporta diferentemente de outros jovens, e valoriza a cidadania e a busca de uma vida melhor, podemos citar os jovens que inte-
gram o Movimento Escoteiro. Ajudar o próximo em toda e qualquer ocasião para construir um mundo me lhor: essa foi a motivação de mais de 300 jovens, de 18 a 21 anos, que estiveram reunidos no município de Estância Velha no final de semana de 16 e 17 de maio (2015), na realização do 37º Mutirão Regional Pioneiro dos Escoteiros do Brasil, Região do Rio Grande do Sul. A atividade destaca-se pelo desenvolvimento de atividades comunitárias e pela formação de caráter por meio do trabalho voluntário. As ações sociais foram desenvolvidas em dez escolas municipais, envolvendo trabalhos de reforma, pintura, plantio de árvores, entre outros. Eventos como esse buscam contribuir para que o jovem assuma seu próprio desenvolvimento pessoal e se torne um cidadão ativo, que inspire mudanças positivas em sua comunidade.
Fotos: Aquila Paz da Rosa
Dessa maneira, busca-se que o jovem se realize como indivíduo e desempenhe um papel construtivo na sociedade. Segundo Bruno Konrad, um dos organizadores do evento, “a motivação para a organização do mutirão foi para fechar o nosso ciclo como jovem dentro do movimento. Estamos juntos desde criança e acreditamos que cumprimos com a nossa missão nessa etapa. Estamos satisfeitos e orgulhosos pelo trabalho realizado. Não é simples um evento para 300 pessoas e com tantas ações simultâneas e diferentes, pensadas, planejadas e aplicadas de jovens para jovens, como foi o mutirão”. Konrad também destaca que o maior legado que atividades como essa deixam para a comunidade não é a simples pintura de uma parede, mas, sim, a valorização da sociedade pelo trabalho realizado e o envolvimento comunitário. “Estive na Escola Municipal Nicolau Becker, no bairro Rincão, e lá os alunos trabalharam junto com os escoteiros na pintura das salas. Acredito que com essa participação da comunidade eles darão muito mais valor ao que foi feito. Irão cuidar melhor porque sabem que eles também são os responsáveis pelo trabalho”. Konrad, assim como os mais de 300 participantes desse evento, são exemplos da parcela da juventude que muda o mundo e reforça o papel do jovem como um importante agente de mudança do comportamento social. O Movimento Escoteiro, assim como tantos outros movimentos educacionais, voluntários e voltados à formação juvenil em todo o mundo, cumpre com uma função cada vez mais importante diante das mudanças pelas quais a sociedade passa. Pensar no coletivo, agir localmente, arregaçar as mangas em prol do próximo e auxiliar na construção de um mundo me lhor ainda são características de poucos. Talvez seja esse o caminho que devemos percorrer, e o jovem é a grande força motriz dessa virada que a sociedade precisa para avançar. Dessa forma, a juventude não será uma questão de idade, mas, sim um estado de espírito, tornando as comunidades mais inovadoras, sonhadoras, saudáveis e dispostas a pensar redondo nos buracos quadrados, buscando soluções para uma sociedade melhor, tentando deixar o mundo um pouco melhor do que aquele que encontrou .
7
ORGANIZAÇÃO
A ideologia presente nos processos de produção
Elas podem estar nas grandes capitais, ou, até mesmo, em algum bairro do interior da Serra Gaúcha •Claudia Palhano Foto: Divulgação.
comenta ela. Os livros em madeira, assim como os marcadores de páginas de Tita, são peças únicas e feitas conforme sua inspiração. “Não trabalho com encomendas, pois trabalho sozinha, então não daria conta”, ressalta a artesã, que ainda complementa: “Prefiro trabalhar sozinha, faço as coisas com amor, do meu jeito”. Lógica do Consumo
E m tempos em que dedicar-ser a uma atividade significa inteirar-se de seus pro-
cessos de funcionamento, é importante observar que essa atividade exigirá nuito tempo de dedicação e que, talvez, ela não seja viável. A mesma lógica se aplica aos produtos. Eles podem ser produzidos com determinado material, de determinada forma, em determinado tempo. Do mesmo modo, frente a um leque de opções, a escolha errada gerará maior ou menor tipo de prejuízo. Mas a artesã Tita Hart não pensa dessa forma. O que para alguns seria prejuízo, para ela não é. Tita mora em Canela e produz livros em madeira (uma espécie de compensado) que, depois de trabalhada, recebe desenhos ou as antigas pinturas da mãe da artesã. Ela costuma dizer que reuniu os prazeres dos pais falecidos, já que um pintava enquanto o outro trabalhava com a madeira. Na oficina de uma só pessoa, o trabalho cresceu e exigiu o registro da artesã, o que lhe possibilita expor em feiras e também
8
garante valores baixos de frete para fora da região. O trabalho de Tita pode ser conferido em site e redes sociais. Não seria de admirar que uma designer gráfica com experiência na criação e desenvolvimento de sites não colocasse a sua mais nobre arte ao alcance de outras pessoas. Por isso, a “Dona Coisi nha”, nome de sua rede, dá pistas da artista sem expô-la e liberando a imaginação do leitor. Segundo Tita, as pessoas podem imaginá-la da forma que elas quiserem, livres de alguns conceitos. É assim que ela prefere. Seus trabalhos circulam pelo Brasil, assim como um dia ela também circulou, e da mesma maneira que variados trabalhos sem autores chegam ao público. Ela diz gostar da forma como faz suas “coisinhas”. “Esse é o diferencial de um trabalho artesanal. Ele tem todo um processo de produção que o faz único. E eu gosto de ver a reação das pessoas que se identificam. Sou livre, não crio padrões”,
Quando Tita fala das coisas de seu jeito, com amor, ela está falando de uma alternativa à lógica consumista, onde só se produz porque é necessário produzir para que se consuma “pois é necessário”. Essa lógica do consumo não pode ser encontrada nos produtos de Tita, mas é encontrada nitidamente em grandes lojas, aquelas que revendem produtos padronizados, feitos em grandes quantidades. Em conversa com a fevista Entrelinha, o mestre em economia pela UFRGS David Fialkow Sobrinho, deixa clara a lógica de que quanto mais se produz em massa, maior a possibilidade de o produto ser barateado e isso atinge o consumidor, o que é positivo. No entanto, ele acredita que a publicidade como ferramenta de divulgação faz parecer necessário aos consumidores algo que talvez não seja tão necessário assim. O economista entende que os órgãos de regulamentação publicitária podem interferir mais, assim como profissionais ligados às redes de ensino e a própria família já que os mais atingidos pelos comerciais são o público infantil. “Às vezes certos mecanismos de alta competição podem gerar um individualis mo muito grande, uma frustração muito grande e perdas de valores humanos”, observa Fialkow Sobrinho.
EDUCAÇÃO
As sombras do sucesso
Considerada país exemplo no sentido educacional, a Coreia do Sul carregou muitos problemas em seu outrora impecável modelo de ensino • Gustavo Rodrigues de Vargas
Desde a Guerra da Coreia e a independência da península Norte de forma definitiva, a industrialização e o desenvolvimento no território cresceram rápida e qualificadamente, e a educação foi uma das principais responsáveis pela ascensão econômica da nação – tanto que é considerada uma das mais eficazes em todo o mundo, e seu modelo é copiado por outras nações em desenvolvimento, como, a vizinha Singapura. Mas nem tudo são flores em um cenário que se avizinhava perfeito. Estudantes dificilmente conseguem praticaralgum esporte ou até mesmo brincadeiras comuns para adolescentes no horário inverso ao das aulas. As formas comuns de diversão foram trocadas por cadernos, lápis, canetas, livros e computadores. E essa mudança ocorre a cada vez mais precocemente. O objetivo de dez entre dez pais (e dos próprios filhos) coreanos é ver os filhoss estudarem ao máximo, conseguire, as melhores notas possíveis e depois entrarem na mais renomada universidade. Essa é uma questão de tempos antigos, como nos detalha Eliane Machado Cardoso Corrêa, mestre no curso de História da UCS (Universidade de Caxias do Sul). “Os coreanos historicamente sofrem da chamada ‘febre de educação’. Durante a Dinastia Choson (1392-1910), ter um filho que passasse no exame para o serviço civil administrado pela corte real era visto como uma garantia de sucesso social e material de toda a família”, explica. O mercado de cursos extras para alunos do ensino médio atinge mais de R$ 60 bilhões por ano. Além disso, segundo cálculos do Ministério da Educação do país, 100% dos alunos das escolas estão fazendo algum curso no turno inverso ao da aula. Mas até quando essa obsessão pelo conhecimento pode ser transformada em loucura? A linha é muito tênue, conforme explica Daniel Orlandi, formando em Pedagogia. Segundo ele, o fato de desde
Foto: Hong Seung-hui/divulgação.
A educação é, sem dúvida, a preocupação maior existente na Coreia do Sul.
Alunos coreanos desde cedo são incentivados aos estudos cedo a criança sofrer pressão diária por bons resultados pode acarretar problemas graves para ela no futuro. “O garoto ou a garota com uma idade tão baixa na maior parte das vezes não tem nem possibilidade de escolha. A sociedade é assim, as outras crianças também sofrem a mesma pressão de seus respectivos pais, então acaba se tornando uma coisa normal. Mas, à longo prazo, tamanha cobrança pode fazer mal à criança. Deficit de atenção, cansaço e até mesmo um caso extremo de depressão”, podem ocorrer, explica. Essa busca incessante pelos melhores resultados e, consequentemente, por melho res empregos, acaba fazendo com que serviços mais banalizados pela sociedade acabem deixados de lado. Por mais que o país seja prodígio a ponto de produzir médicos, professores e engenheiros de alto nível, empregos como os de encanador, faxineiro e garçon, fundamentais em qualquer sociedade, acabam sendo esquecidos. Outro problema encontrado com muita frequência em solo coreano é a falta de aproximação dos pais com seus filhos. Preocupados em vê-los somente com bons resultados escolares e apostando em cursos extracurriculares, além de incentiválos a inúmeros períodos diários de estudo, o conceito de “família” praticamente ine xiste no país. Cada vez mais cedo, jovens vão perdendo seu laço familiar para se
dedicar única e exclusivamente aos estudos. Portanto, mais do que não ter uma infância dedicada especialmente à arte de brincar como em muitos lugares do mundo, os estudantes coreanos sofrem com o modelo escolar e com os conceitos estabelecidos pela sociedade local.
Professores como heróis nacionais Os professores são extremamente bem pagos e qualificados. O processo de seleção é rigoroso, com aproximadamente uma vaga para quarenta candidatos em escolas de ensino médio. Assim, a taxa de qualificação dos docentes é a mais alta possível. Ser professor na Coreia do Sul é digno de orgulho e de admiração. A carreira docente está entre as mais disputadas, graças aos bons salários (um professor sul-coreano do Ensino Fundamental chega a ganhar seis vezes mais do que um brasileiro e está entre os 10 mais bem pagos do mundo, com um mínimo de quatro mil dólares por mês) e boas pers pectivas de futuro (o prestígio e o salário só aumentam). Após quatro anos árduos de graduação, todos os futuros docentes têm de cursar um mestrado, o nível mínimo de formação para se dar aulas. Além disso, não sobram professores sem lugar no mercado: como os que conseguem terminar a formação são extremamente bem preparados, todos são absorvidos pelas escolas. O cargo de professor é o mais celebrado pela sociedade na Coreia.
9
PROJETO SOCIOCULTURAL
Projeto Sociocultural aprimora talentos
Há 7 anos, o Projeto Acorde reúne crianças e adolescentes em busca de conhecimento cultural • Cláudia Debona Fotos: Dandy Marchetti
Orquestra do projeto trabalha para se tornar a Orquestra Sinfônica de Bento Gonçalves
O Projeto Acorde foi fundado em abril de 2008, com 42 crianças, e começou com
aulas de Canto Coral. Idealizado e gerido pelo Instituto Tarcísio Vasco Michelon, em parceria com a Associação de Moradores do Bairro Vila Nova II e com outras instituições, é uma associação sem fins lucrativos, que desenvolve atividades socioculturais direcionadas a crianças e jovens. Atualmente, 150 crianças e adolescentes integram o projeto em aulas continuadas de sopros, cordas, percussão e bateria, teoria musical, canto coral infantil e juvenil, prática orquestral e práticas musicais em grupo. Ele também acolhe 50 crianças e jovens em atividades culturais paralelas, como danças tradicionalistas, artesanato e outros cursos profissionalizantes. Comprovadamente, as atividades desen-
10
volvidas reduzem a criminalidade, a vio lência nas ruas, o ócio e o uso de drogas. As crianças recebem orientação sobre valores de cidadania, influenciando, inclusive, as famílias e despertando para a profissionalização por meio de seus talentos. As ações desse projeto sociocultural incentivam o desenvolvimento social em diversos bairros de Bento Gonçalves, oferecendo acesso ao conhecimento, valo rização da produção cultural em uma estrutura de conhecimento que promove o aumento da autoestima e estimula a percepção do potencial e talento coletivo. Em parceria com órgãos públicos e privados, o Instituto Tarcísio Michelon promove a inclusão social de crianças e adolescentes, proporcionando o desenvolvimento humano e comunitário.
O Grande Hotel Dall’Onder abriga as atividades do Instituto, oferecendo gratuitamente seus locais para as aulas e os ensaios das crianças, lanches e todo o atendimento do pessoal que trabalha no hotel. As aulas ocorrem de segundas a sextas em contraturno escolar e nos sábados pela manhã. Além disso, o Instituto Tarcísio Michelon é responsável pela realização e organização do Simpósio Internacional de Escultores, que ocorre anualmente em Bento Gonçalves. Shayanne Zorzin Franceschini, 16 anos, aprendiz de violoncelo, diz que ao entrar no projeto, em 2008, com apenas oito anos de idade, teve contato com um mundo totalmente diferente daquele em que estava acostumada a viver, abrindo seus horizontes desde criança e valorizando
culturas, línguas e composições diversas. “Me encaminho para cursar bacharelado em violoncelo na universidade, o que não teria sido possível se eu não tivesse entrado no projeto”, completa a garota. As crianças e adolescentes passam a ter contato com a música clássica e com a música erudita, o ciclo de amizades foi expandido, mantendo até hoje amizades construídas naquele ambiente. Desenvolve ram a musicalidade e a coordenação motora, o que ajuda a aprimorar a disciplina em sala de aula, respeitar os professores, ter seriedade e responsabilidade, além do senso crítico e gosto por música de qualidade. “Através do projeto pude conhecer realmente como são as pessoas e como lidar com cada uma delas. Aprendi a ser uma pessoa mais compreensíva, amiga e ter minhas próprias responsabilidades. Aprendi, também, a gostar cada vez mais de música e de outras atividades artísticas, a ver que sem música o mundo não teria graça”, relata Karen Casagrande, 19 anos, integrante do coro. A coordenadora do projeto, Raquel de Marco, 32 anos, avalia que a participação é reforçada quando a comunidade percebe o envolvimento das crianças e seu desenvolvimento, o que, segundo ela, não ocorre no primeiro momento. “Os pais precisam perceber a evolução de seus filhos. Quando isso acontece, o envolvimento deles é natural”, afirma a diretora do instituto, que garante: “Muitas mães participam ativamente das atividades de forma voluntária. O Acorde conta com ajuda de uma Assistente Social, que veio suprir a necessidade de estreitarem os vínculos do Instituto com as famílias de crianças e jovens atendidos, procurando melhor entendimento da realidade individual de cada aluno, assim como a vontade de envolver a família com o Projeto”. Raquel também destaca a importância de eventos para as crianças. “ As apresentações dão oportunidade a todos de estaremem um palco toda semana, o que, para quem é músico, é de extrema importância no sentido de melhorar a cada dia”. “Posso dizer que a expansão do Projeto me deu o presente de atender mais crianças e jovens, aumentar a família do Instituto e essa corrente do bem, que muda a vida de tantas pessoas. Me sinto muito gratificada com meu trabalho”, finaliza Raquel.
Núcleo: Sopros Sabiás
Núcleo: Pequenos Cantores de Bento
11
CULTURA
Caxias da cultura
A cidade está cada vez mais cultural. Grande parte disso se deve a pessoas que trabalham com a paixão pela arte, como os grupos teatrais • Bruno Tomé Foto: Márcio Silveira
A mais nova peça do Grupo Ueba, “As Aventuras do Fusca a Vela”
P
asso a passo, Caxias do Sul se torna uma cidade cultural. Em 2008, o município foi eleito Capital Brasileira da Cultura. Parte importante desse crescimento vem de grupos que promovem o teatro na região. Um desses grupos é o “Tem Gente Teatrando”, fundado em 1989 pela atriz Zica Stockmans. A diretora da empresa tea tral conta que está há 30 anos em Caxias,e que no começo não existia uma cena na cidade. Mas, a necessidade de um espaço físico e a demanda de aulas, leva ram à criação do grupo, que é dividido em quatro módulos: escola de teatro, teatro para empresas e uma companhia de peças, além de espaço para apresentações. A ‘Tem Gente’ cresceu junto com a cena cultural na cidade. Segundo a diretora, a troca é positiva para ambos os lados. “Por exemplo, nós trabalhamos muito na formação de plateia. Éramos muito teimosos. Não tinha lugar para onde não se levasse um espetáculo”, recorda a atriz. Outro ponto, quem levanta é o ator e produtor Sandro Martins: “A escola também atua na região. A gente recebe alunos de Garibaldi, Farroupilha, Nova Prata, Bento Gonçalves, então todo mundo acaba vindo para cá, para se especializar”. Para a promoção da cultura, a empresa tra-
12
balha em algumas frentes. A atriz destaca que uma delas é a qualidade das aulas. “Nosso aluno recebe um professor normalmente com mestrado em Teatro e outro requisito para o professor é que ele seja atuante no cenário”. No final das aulas, os estudantes produzem uma peça para apresentação. O trabalho entra na Mostra Tem Gente Teatrando, que está no 19° ano. Martins comenta que, geralmente, é a primeira vez que alunos e familiares acompanham uma peça de teatro por meio desse projeto da escola. Atualmente, a empresa está com seis peças em circulação. Entre elas, “Memórias de Uma Solteirona”, estrelada pela própria diretora. Zica conclui que, hoje, a empresa passa por um momento de transição. “Estamos passando de uma fase de construção para uma de elaboração. Agora, podemos nos dar ao luxo de elaborar melhor e andar para um caminho mais artístico”. Ueba na Rua Seja com o teatro no palco, ou seja com o teatro de rua, mais uma companhia na cidade também é responsável pela aproximação dos diferentes públicos com o teatro: o “Grupo Ueba”. Fundado em 2004 pelos atores Jonas Piccoli e Aline Zilli, o
grupo de teatro surgiu da paixão pela arte, pois antes tudo era um hobby. Hobby – que levou o grupo a se apresentar em todas regiões do Brasil, em países da América Latina e na Itália. A atriz Aline Zilli comenta que é mais difícil trabalhar com a cultura. O ator, e também diretor e dramaturgo, Jonas Piccoli, complementa dizendo que a dificuldade está em vender algo que as pessoas acreditam que não querem, pelo fato de não conhecerem. Nesse contexto, o “Grupo Ueba” entra com uma de suas maneiras de atrair o público: o teatro de rua. Piccoli conta que uma das maiores preocupações do grupo é fazer o teatro de rua, justamente para levá-lo diretamente ao público. Um ponto importante para o ator é a maneira como as pessoas lidam com esse tipo de apresentação, “É democrático, porque tu chega ali, tu olha, gostei ou não gostei e vai embora”. Ainda sobre esse tipo de teatro, o diretor comenta a peculiaridade de se apresentar na rua.“É o teatro de risco. Nele nunca uma apresentação é igual à outra. Sempre vai ter uma interferência”. Se o teatro muda as pessoas, ele pode mudar pelas pessoas. Uma pesquisa de 2010, do IBGE, mostra que apenas 21% do Brasil conta com casas de teatro. Assim, as peças de palco são adaptadas para algumas regiões. Mas, Aline Zilli não vê problema nisso. Para ela, o teatro precisa chegar nas pessoas. Ela comenta que a essência das peças vai tocar as pessoas, independentemente de onde estão sendo apresentadas. Assim, o “Grupo Ueba” é mais um dos pontos de crescimento da cultura caxien se, fazendo o teatro do seu jeito, querendo explorar novos universos, como diz Aline, sobre os objetivos da companhia: “Mostrar a forma como a gente vê o mundo, compartilhar com as pessoas e, quem sabe, proporcionar uma transformação de pensamento”.
ESTRADA
Nômades Contemporâneos
Para eles, a felicidade está na bagagem de experiências e o que importa não é apenas o objetivo, mas todo o trajeto a seguir • Luísa Biondo
principal motivo para alguns colocarem a mochila nas costas e viajar pelo Brasil vivendo da sua arte: o artesanato. Assim são os Malucos de Estrada, ou de BR, muitas vezes identificados pela aparência (dreads, roupas largadas, tatuagens e barba por fazer) e confundidos com hippies dos anos 60. O documentário Malucos de Estrada, produzido pelo coletivo “A beleza da margem, à margem da beleza” apresenta em cerca de uma hora todo esse movimento que ganha cada vez mais notoriedade. De forma resumida, esse grupo, que vive desarticuladamente pelo Brasil, mantém a ideologia hippie da paz e do amor, de ser contra a estrutura social e de viver do artesanato. Adicionado a isso, o maluco é principalmente um viajante, um nômade, alguém que se impregna de experiências e vivências. Segundo Camile Vergara, antropóloga e pesquisadora do Imagens, Narrativas e Práticas Culturais (INARRA) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – em Arte, Contracultura e Nomadismo: O Corpo em Movimento Contra a Autoridade –, o nomadismo move um sentimento muito forte de solidariedade, que também está ligado aos fundamentos anarquistas. “Os princípios e as consequências da vida nômade são definidos pela necessidade, os pontos de passagem são alternados, e o que importa é o trajeto que é traçado e depois se apaga como as pegadas no deserto. São espaços que são ocupados e, em seguida, se desterritorializam, conforme o fluxo”, completa a pesquisadora. Vida de Maluco Gilberto Rodrigues Luiz (Tom), 35 anos, Maluco desde os 18 anos, conta que no início ficava com seus amigos nos postos de gasolina cerca de três dias a espera de carona. “Agora, as pessoas sentem medo”, justifica. Apesar disso, ele acredita que o
Foto: Luiza Biondo
Isistema nsatisfação com a atual estrutura do econômico, político e social é o
O Maluco é, principalmente, um viajante, que se impregna de vivências e experiências preconceito das pessoas, assim como a repressão que sofrem da polícia e da fiscalização, vêm diminuindo. “Acho que as pessoas hoje estão diferentes, mais abertas. Os jovens principalmente.”, relata. Há 17 anos na estrada, Tom só não conhe ce Roraima e este ano veio ao Rio Grande do Sul pela primeira vez. Dentre os lugares que conheceu, o seu preferido é o nordeste. Ele, já pensou em começar uma faculdade na época que dividiu quarto com alguns estudantes de história. Mas, relata, os próprios alunos o incentivaram a continuar viajando. Hoje, ele reconhece que não conseguiria ficar preso em um só lugar. “Eu gosto de fazer novas amizades, conversar com as pessoas, fazer artesanato e conhecer os lugares diferentes, novas paisagens”, afirma. O importante, para os Malucos como Tom, é viajar e poder viver da arte que produzem. Em Caxias, Tom mora com Charles Rzewuski, 33. Natural de Caxias do Sul, Charles viaja pelo Brasil há 15 anos e, com exceção do Acre, já conhece todos os estados do país. Voltou para a terra natal há cerca de um ano e, assim como Tom, é um dos artesãos que esporadicamente aparecem sentados na Av. Júlio de Castilhos, Caxias do Sul, confeccionando
e vendendo filtros dos sonhos, colares, pulseiras, brincos... Charles diz que no seu trabalho o que vale não é a quantidade. Ele acredita que gostar do seu trabalho e colocar sua energia nele é o bastante para que as coisas dêem certo. “Vai da tua ambição e do que você busca. Eu busco paz de espírito. Viver e ser feliz como todo mundo. E isso é uma luta diária da mente, corpo e espírito, tu tens que estar bem contigo mesmo para as outras coisas fluírem”, completa. Para Charles, uma hora cada um deve escolher o que é melhor para si. Por isso, ele pretende que sua filha, que hoje está na quarta série do ensino Fundamental, também tenha essa chance de escolha. “Minha filha até pede para aprender (artesanato), mas eu não quero ensinar. Eu mando ela ler um livro, porque ela vai ter a vida inteira para aprender artesanato. Agora, é o momento de estudar. Depois, quando ela fizer 18 anos, aí ela decide a vida dela.” A fórmula da felicidade não existe, mas Charles e Tom encontraram a sua nas experiências adquiridas ao longo da vida e as lembranças dos lugares por onde passaram. “Isso ninguém te tira”, garante.
13
140 ANOS DA IMIGRAÇÃO ITALIANA
A crença que construiu uma comunidade No interior da pequena cidade de Nova Pádua, a Capela das Almas tornou-se símbolo de fé • Débora Debon e Pâmela Pelizzaro Foto: Pâmela Pelizzaro
Capela das Almas, Nova Pádua
A chegada dos primeiros imigrantes italianos no Rio Grande do Sul completa
140 anos no dia 20 de maio (2016). Com o sonho de encontrar uma terra de prosperidade, muitas famílias atravessaram o Atlântico em navios a vapor. Além da esperança de uma vida melhor e da vontade de trabalhar, trouxeram características peculiares da sua terra, mais tarde incorporadas à cultura brasileira. Entre os legados que permanecem, estão o dialeto talian, a gastronomia e, principalmente, a fé, que propagou a religião católica no Brasil. Os imigrantes conheciam a história dos santos e, com profunda devoção, participavam de rezas e procissões em sua homenagem. Quadros com imagens que simbolizavam a crença não faltavam na bagagem dos viajantes que construíram capelas e capitéis para orações. Seguindo o passo dos conterrâneos, o italiano Angelo Arcaro trouxe um retrato com a imagem das Almas do Purgatório, cuja fé o salvou de uma emboscada no
14
Travessão Divisa, interior de Nova Pádua — conhecida hoje como Pequeno Paraíso Italiano. Conforme a pesquisadora Vera Tatto Pan, o episódio aconteceu no início dos anos de 1900, quando Arcaro, que trabalhava como escrivão da igreja, era perseguido por revolucionários. A história conta que em uma noite, ao terminar suas tarefas na paróquia, o dono de uma bodega (como eram conhecidos os bares da época) o alertou de que correria perigo. Quando voltava para casa a cavalo, um grupo armado saiu atrás de Arcaro para matá-lo. “A vizinhança ouviu o tumulto. A mãe do meu pai contou que no dia eles escutaram como se fossem pessoas brigan do, discutindo e que tiros foram disparados” explica Vera. Após grande perseguição, com fervor, ele invocou as Almas do Purgatório para que o ajudassem. Aos poucos, os revolucionários, que queriam eliminar padres e envolvidos com a religião, recuaram e sumiram na direção do mato.
No dia seguinte, ao entrar na bodega que servia como ponto de encontro de amigos, Arcaro conversou com os mesmos revolucionários e perguntou porque eles haviam fugido. A resposta o impressiou. Ao redor dele e de seu cavalo, o grupo rival avistou inúmeras pessoas protegendo-o. O religioso afirmou que estava sozinho e que as pessoas que o circundavam eram as Almas do Purgatório. Para fazer algo como forma de agradecimento, ele pediu que o vizinho Martino Tatto cedesse uma pequena área de suas terras para a construção de um capitel. “Ele marcou o lugar em que teria ocorrido o fato e, no dia seguinte, foi procurar meu bisavô. Depois de contar a história, disse que gostaria de colocar uma cruz e construir um pequeno capitel para agradecer por ter saído ileso”, relembra a pesquisadora. A igrejinha de madeira foi registrada em cartório no ano de 1909, em nome das almas que o salvaram. Com o tempo, houve a necessidade de ampliar o capitel. Por isso, em 1925, os fundadores, juntamente com os associados da comunidade, cons truíram a nova igreja em alvenaria. Os tijolos foram feitos pelos próprios moradores em formas de madeira. No altar do templo, o quadro das Almas do Purgatório foi pendurado e permanece lá. Além disso, Santa Bárbara, Santa Lúcia e São Pelegrino também foram nomeados padroeiros da comunidade. Com o passar dos anos, o local, denominado Capela das Almas, foi mantido como símbolo de fé, marcando a religiosidade dos imigrantes italianos que se estabeleceram na região. Em 2000, visando a construir um espaço mais amplo para receber os fiéis, teve início a obra de uma nova igreja. Durante a inauguração, em 2004, o bispo Dom Moreto, da Diocese de Caxias do Sul, orientou os moradores a manterem a antiga capela como relíquia. “Quando fizemos a nova igreja, algumas pessoas pensavam que não precisaríamos mais da velha. Mas, o bispo pediu oficialmente na celebração
que o templo antigo permanecesse como símbolo da continuidade da fé. O quadro original que veio da Itália continua lá. Mas na igreja nova foi colocada uma cópia”, esclarece Vera. A capela de quase 100 anos foi restaurada em 2008, de maneira simples, com recursos de doações. Hoje, ela é aberta para visitação nos fins de semana. Em abril, mês da escrituração do terreno, e em novembro, mês das almas, são realizadas celebrações na pequena igreja e almoço junto ao salão da comunidade. Rascunhos que viraram livro A história da Capela das Almas ganhou um capítulo a parte com a pesquisa feita pela funcionária pública Vera Tatto Pan. Bisneta de um dos fundadores do pequeno capitel, ela queria deixar um legado por escrito, explicando detalhes dos fatos que deram nome à comunidade onde mora. Em 2006, Vera teve que enfrentar um câncer pela segunda vez. Neste período, os filhos Igor e Isis precisaram colher informações sobre sua descendência e sobre o local onde residiam, para um trabalho escolar. Emocionada, Vera lembra que, por estar muito debilitada na época, não conseguiu auxiliar na tarefa. Quando recebia visitas, para evitar falar sobre a doença, procurava conversar sobre a história da comunidade. “Fui buscando informações, mas não havia muita coisa. Naquele ano eu estava ruim, passando por um período difícil e não tinha como ajudar meus filhos. Isso me marcou muito, e eu pensei: que legado deixaríamos para nossos filhos quando nos perguntassem sobre nosso passado?”, recorda. Vera começou a perceber que muitos líderes atuantes na comunidade, que poderiam ter contribuído para a construção da história, já haviam morrido. Os poucos que restaram tinham idade avançada, e ela não poderia deixá-los partir antes de registrar seus relatos. Assim, começou a rascunhar em papéis os depoimentos que coletava durante o tratamento da doença. Para sua surpresa, quatro anos depois, ao passar as anotações para o computador, os rascunhos renderam um livro de 115 páginas. “Não tinha ideia que iria virar essa pesquisa, mas fui me interessando e acabei me aprofundando. Imprimi poucas có-
pias, deixei na comunidade e na paróquia. Minhas colegas começaram a falar que eu tinha feito muita coisa para deixar apenas nesses locais e que uma hora dessas poderia ser perdido. Mas minha ideia não era fazer mais cópias”. Em 2010, a estrada do Travessão Divisa foi asfaltada. O momento foi muito especial e marcante para os moradores. A fotografia das capelas divididas por uma pavimentação asfáltica se tornou a capa do livro de Vera. Depois disso, digitou mais 20 páginas com outros fatos que julgava importante deixar registrados e resolveu anexar a sua pesquisa. Voltando à paróquia para levar cópias do novo material, constatou que as folhas haviam sido extraviadas, como as colegas tinham alertado. “O material tinha sido perdido. A partir disso, comecei a pensar no que minhas colegas falaram. Então, eu encadernei o material e distribui na biblioteca pública e na prefeitura. Depois disso, começaram a ligar para pedir cópias e, hoje, acredito que todas as famílias da comunidade tenham”, conta. A pesquisa de Vera é a mais completa e detalhada sobre a história do Travessão Divisa. No memorial é possível encontrar os fatos que marcaram a origem, a formação e evolução daquela comunidade, que até hoje conserva com orgulho as tradições culturais e religiosas. Cemitério de imigrantes italianos As primeiras 86 famílias italianas que se estabeleceram no Rio Grande do Sul foram se multiplicando e se adaptando ao novo país ao longo dos anos. Com a distribuição dos lotes, os imigrantes começaram a erguer moradias, organizar propriedades e fazer plantações, iniciando, assim, o convívio em comunidade. Porém, nas últimas décadas, antigos casarões deram espaço a grandes prédios, fazendo com que muitos legados se perdessem. Segundo a historiadora Gissely Lovatto Vailatti, um dos últimos cemitérios de imigrantes italianos que mantém praticamente todas as características originais está localizado no Travessão Martins, interior de Flores da Cunha, às margens da antiga estrada que conduzia aos fundos da localidade. Uma cruz preta indica a entrada do local escondido em meio a árvores. Uma taipa de pedras de 130 anos
cerca o cemitério de 400 metros quadrados, onde corpos de mais de 80 italianos foram enterrados entre os anos de 1890 e 1940. Covas são demarcadas com cruzes de ferro artesanais. Em algumas, ainda é possível ler epitáfios escritos em italiano. Um pequeno pedaço de chão, chamado limbo, era utilizado para enterrar suicidas, homicidas, não católicos, e crianças não batizadas. “Uma cova comum guarda os corpos de 40 revolucionários mortos numa emboscada no Travessão Alfredo Chaves. Brasileiros dos Campos de Cima da Serra, que lutavam por ideais políticos, comumente chamados de negros pelos moradores locais, estão enterrados no limbo. Por isso, já se ouviu tanto falar: ‘tem 40 negros da Revolução Estadual Libertadora de 1923 naquele cemitério’”, explica a historiadora. O lugar é cuidado pela família de Domingos Caldart, que conta, atualmente, com a ajuda dos filhos e neto. Além de manter o espaço limpo e organizado, antigamente, no Dia de Finados, seu Domingos refazia os montes de terra que sinalizavam as covas. “A criançada ficava enlouquecida vasculhando tudo e pensando mil coisas sobre o que havia sete palmos abaixo da terra”, comenta Gissely. Como o cemitério não integra o patrimônio histórico e cultural, corre o risco de um dia desaparecer. Para a historiadora, a sobrevivência do campo santo deveria ser motivo de orgulho. “Temo um dia acordar e ouvir alguém dizendo: ‘foi decretada a retirada daqueles italianos e daqueles revo lucionários de lá, não há de sobrar pedra sobre pedra daquela velha taipa’”. Um grupo de pessoas luta pela preservação do espaço. Em 2005, a então vereadora do município Claudete Gaio Conte encami nhou uma indicação para o tombamento do local. Pela falta de um Conselho Municipal de Cultura, o projeto foi arquiva do. Atualmente, uma das filhas de seu Domingos, Fátima Caldart Galiotto, está em busca do reconhecimento do cemitério como bem histórico junto à Associação de Amigos do Museu, Associação Amigos de Sospirolo e da comunidade. Uma das alternativas cogitadas é fazer o tombamento provisório até que se crie o Conselho, que terá reponsabilidade de viabilizar o processo definitivo.
15
POLÍTICA
A democracia representativa em crise É preciso ser mais direto • Ricardo Augusto de Souza Foto:s Ricardo de Souza
Protestantes a favor da Intervenção Militar
O ano é 2015. O mês, março. O cenário político, 12 anos de governo do Partido
dos Trabalhadores. Governo esse que, com inúmeras ressalvas, possibilitou alguns avanços sociais para o país. Talvez o mais gritante deles esteja relacionado à diminuição da pobreza. Estima-se que cerca de 36 milhões de pessoas deixaram a extrema pobreza no período de governo petista. Em outubro de 2014, as eleições ─ acirradíssimas ─ decretaram a reeleição da presidenta Dilma Roussef (PT) por mais quatro anos. Menos de seis meses depois, no dia 15 de março de 2015, milhares de pessoas saem às ruas em todo o Brasil para protestar. As principais bandeiras de luta são o fim da corrupção e o pedido de impeachment da presidenta. Em Caxias do Sul, segundo a Brigada
16
Militar, 40 mil pessoas foram às ruas no domingo 15 de março. Os cartazes pediam desde mais dinheiro para saúde e educação até a saída da presidenta Dilma. Alguns, mais exaltados e de memória fraca, clamavam por intervenção militar. Outros, desinformados, imploravam para que o Brasil não se tornasse uma república bolivariana. Os manifestantes, muitos em família, marcharam pelas ruas Júlio de Castilhos e Sinimbu aos gritos de “Fora PT”. A maioria vestia camisa da seleção brasileira e se divertia com as câmeras dos smartphones durante o ato. É fato que os brasileiros que foram às ruas no dia 15 não fazem parte dos 36 milhões que saíram da linha da pobreza durante o governo do PT. E essa afirmação não se fundamenta no argumento de que esses 36 milhões não têm motivos para reclamar das administrações
Lula e Dilma, muito pelo contrário. Ela é fruto da observação de que a manifestação do dia 15 foi, sobretudo, uma manifestação da elite. Não necessariamente era a elite que estava nas ruas, mas os valores dela, com certeza, marcharam junto com as pessoas. Ao analisar a história do Brasil, é possível perceber inúmeros momentos nos quais o país sofreu duros golpes das camadas mais privilegiadas da população. Desde a colonização ─ com a vinda da corte portuguesa para cá ─ até os anos de chumbo da ditadura militar, o maior país em extensão da américa latina viveu à mercê de uma elite que não aceita ser derrotada, como aconteceu nas urnas ano passado. Segundo a Cientista Política Ramone Mincato, “na história brasileira tivemos poucos períodos democráticos. O autoritarismo
nos priva da informação e de maneira geral as pessoas entendem que o que não sabem não existe. Então, pensam equivocadamente que nos regimes autoritários não existe corrupção”. As manifestações do dia 15 de março, porém, significam muito mais que uma mera manifestação ideológica com os valo res da elite. Quando os brasileiros foram às ruas em junho de 2013, a maioria das reivindicações eram outras, mas há algo em comum. É possível perceber nas entrelinhas que, no Brasil, há um esgotamento da capacidade de os partidos políticos entenderem as demandas da população. Segundo Ramone, isso se dá principalmente pela forma como o país é governado hoje. “Os partidos são fortes no sistema político brasileiro atual. Eles são fracos na sociedade civil porque a população não se sente representada. A causa principal está no presidencialismo de coalizão, na dinâmica de funcionamento do sistema político brasileiro que requer a formação de coligações para vencer eleições e, depois das eleições, as coalizões para assegurar maioria parlamentar e um mínimo de governabilidade”, defende. Além disso, outras questões contribuem para o esgotamento do modelo político atual. Talvez a mais gritante delas esteja no financiamento privado das campanhas. Em 2014, por exemplo, estima-se que os 25 mil candidatos para os diferentes
cargos gastaram cerca de 74 bilhões nas campanhas. Isso, em um país em que o poder econômico se sobrepõe ao político, é praticamente um atestado de que os mais ricos governam o país. Outro fator que causa descontentamento é a ausência de um espaço público oficial para manifestação política. A câmara dos deputados, o senado, ou mesmo as câmaras de verea dores estão muito distantes da realidade da população. Mas, como proceder diante desse sistema que parece cada dia suprimir a cidadania? O estudante de jornalismo André Sebben Ramos, juntamente com a professora e cien tista política da Universidade de Caxias do Sul Ramone Mincato, tiveram a ideia de aproveitar a popularização da internet para criar um mecanismo online de democracia direta. O governo, principalmente em nível estadual, realizou uma experiência semelhante quando propôs que a população votasse as principais demandas por meio do orçamento participativo. As leis de iniciativa popular, mesmo que sirvam mais como um método de fazer pressão, também podem ser consideradas um mecanismo de democracia direta. A democracia direta não surge com o intuito de substituir a democracia representativa, mas de aperfeiçoá-la. Para Sebben “todo mundo sabe que é necessário fazer algo, mas até agora não foi apresentada uma proposta que realmente possa mudar a situação.” Diante dessa situação descon-
fortável, o estudante propõe a criação de um mecanismo em que o cidadão exerça seu poder de ecolha por meio de uma plataforma online. “Estamos traba lhando na Rede Cívica, que seria um braço do Poder Legislativo para aqueles que não querem mais serem representados, mas participar efetivamente da política. Porém, para aqueles que querem manter o atual sistema, a representatividade continua. Logo, a Rede Cívica não substitui, mas amplia as formas de democracia”, esclarece. O projeto ainda está em fase de desenvolvimento e divulgação, mas segundo André a ideia é implantá-lo primeiramente na cidade de Caxias do Sul, onde as pessoas poderão se emancipar politicamente em nível municipal e votar as demandas do legislativo da cidade. Mas para o estudante, se a Rede Cívica for pensada a longo prazo há possibilidade de reduzir consideravelmente os abusivos gastos do poder legislativo no país. “Além de ser o mais caro do mundo proporcionalmente à riqueza gerada no país, os políticos brasileiros não exercem suas tarefas com competência. Estamos falando em Congresso Nacional, 27 assembleias legislativas e 5.564 câmaras de vereadores (remunerados). Segundo cálculos preliminares, o custo por ano ultrapassa 20 bilhões de reais. Alguém em sã consciência afirma que eles [políticos] valem o que custam?”
17
COMPORTAMENTO
De quem é essa terra? Caxias prosperou com o italiano, mas persevera com todos os outros imigrantes • Luciane Modena Foto:s Luciane Modena
Monumento Nacional do Imigrante, Caxias do Sul.
O Monumento Nacional ao Imigrante é o símbolo de Caxias do Sul. A determi-
nação veio a partir de lei sancionada em maio deste ano. Na cripta abaixo da estátua, inaugurada em 1954, há fotografias da imigração de diversos países para o Brasil. Mas, inicialmente, a estrutura de bronze homenagearia apenas a imigração ita liana. Um ano antes da inauguração, uma lei determinou que fossem homenageadas todas as etnias que contribuíram para a povoação brasileira. Assim, o monumento tornou-se nacional. O cenário de crescimento econômico no século XX acabou por trazer, ao longo dos anos, outros migrantes e imigrantes para a cidade. Pessoas de todo o Brasil vêm a Caxias do Sul para tentar o sucesso. No último ano, cerca de 400 ganeses chegaram à região de uma só vez. Os motivos lembram o dos italianos de 140 anos atrás: melhores empregos e qualidade de vida. O problema é que muitos deles não são bem recebidos. Preconceito, xenofobia e temor em relação à crise econômica atual estão presentes.
18
Sentimento de posse Para o doutor em Psicologia Social Marlon Xavier, é natural que imigrantes se sintam proprietários da terra após anos de ocupação. Marlon, que é professor de Psicologia na UCS, entende que o preconceito contra imigrantes africanos se deve a um racismo presente em todo o País. Segundo o professor, no Norte da Itália, de onde veio boa parte da imigração, o preconceito faz parte da vida das pessoas. “Existe um racismo muitíssimo arraigado em Verona, Vicenza e região do Vêneto. As pessoas não pensam ou questionam esse racismo que, na verdade, é irracional. Acredito que haja essa herança aqui na Serra”, explica. Primeiro, os índios Não apenas de imigrantes se fez uma Caxias do Sul. Pesquisas encontraram 48 sítios arqueológicos no território caxiense, que mostram a ocupação de índios caingangues antes dos imigrantes europeus.
Quando o homem branco chegou, os ín dios, em sua maioria, haviam desocupado a terra. Segundo a historiadora Tania Tonet, eles vinham do centro do país em busca de água, proteção e alimento, especialmente pinhão, numa ocupação que durou 800 anos. A sede da ocupação ficava onde hoje é a Praça da Bandeira, território doado pelo Estado sob o nome original de Campo dos Bugres. Os índios ficavam numa das regiões mais movimentadas da cidade atualmente, compreendida entre a Praça da Bandeira e a Estação Férrea, num quadri látero entre as ruas Olavo Bilac, Ernesto Alves, Feijó Junior e Marechal Floriano. “É importante entendermos que somos a soma de muitas culturas e que Caxias do Sul tem espírito cosmopolita. Isso é maravilhoso, mas a população ainda não tem essa consciência”, explica a historiadora. Inversão do estigma Doutor em Ciências Sociais, o antropólogo Rafael José dos Santos defende que o
sentimento de posse sobre a terra não é exclusividade de Caxias do Sul, mas comum em regiões do país com desenvolvimento via colonização. Rafael explica que houve um processo de inversão do estigma do colono, a partir do centenário da imigração, em 1975. Antes disso, o imigrante italiano era visto como pobre e ignorante. “Eles eram discriminados pelos próprios descendentes, que moravam na cidade e trabalhavam no comércio”, informa. Segun do o antropólogo, criou-se uma figura ambígua. “O preconceito era contra a vida rural, contra o fato de as pessoas serem, de certa forma, caipiras. Isso é interessante porque do próprio espaço urbano vai surgir o discurso de reversão do estigma de colono”, comenta. Segundo Santos, que é professor do Doutorado em Turismo e Hospitalidade na UCS, essa mudança ocorre por meio da Universidade e da contribuição de empresários. Entretanto, a inversão teria levado ao extremo oposto: o heroísmo do colono. Conforme o antropólogo, ninguém pode negar que esses descendentes trabalharam e fizeram a cidade progredir, mas não foi devido a qualidades étnicas intrínsecas. Dentre outros motivos para o progresso no século XX, o antropólogo destaca três: a industrialização brasileira, o crescimento econômico e os financiamentos do governo federal. No entendimento do professor, há resistência em mostrar diversidade, mesmo com pequenos avanços. Para Santos, mesmo que haja herança cultural relativa ao preconceito, é preciso fazer crítica e tomar iniciativas para mudar. “Todo preconceito é fundado em ignorância, ausência de informação. Isso já é mais do que comprovado”, define.
19