NEWSLETTER FMVG N.º 23 JUL-SET 2020 | CULTURA ALGARVE

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NEWSLETTER | N.º 2 3 | JUL - SET 2020

POSTAIS

DO ALGARVE Pandemias: reflexões de Guilherme d’ Oliveira Martins e dos médicos José Maria Guerreiro e Marco Ferreira p. 6-7 e 14-18

Luís Guerreiro recordado com ensaios inéditos a partir de obras do Centro de Estudos Algarvios p. 8

Nova rubrica:Postais do Algarve : a região estudada e sentida por mais de 100 autores p. 10-13 e 22-25


NEWSLETTER FMVG | N.º 23 | 2020

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Os textos são da responsabilidade dos seus autores e o uso do Acordo Ortográfico de 1990 é, por isso, uma opção dos mesmos.


POSTAIS

DO ALGARVE

CASA DE SOL ONDE OS ANIMAIS PENSAM erguida nos ares com raízes na terra ampla e pequena como um pagode com salas nuas e baixas camas casa de andorinhas e gatos nos sótãos grande nau navegando imóvel num mar de ócio e de nuvens brancas com antigos ditados e flores picantes com frescura de passado e pó de rebanhos ó casa de sonos e silêncios tão longos e de alegrias ruidosas e pães cheirosos ó casa onde se dorme para se renascer ó casa onde a pobreza resplende de fartura onde a liberdade ri segura ANTÓNIO RAMOS ROSA


ABERTURA

Algarve: encontro de culturas a Sul

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anuel da Fonseca registou num livro de 1986: «Vou escrever dois postais com vistas de Loulé, redigidos num cafezinho modesto em frente ao local de onde partem as camionetas de passageiros». Entre outros relatos, este é um dos que pode ser lido em Crónicas Algarvias. Três décadas mais à frente, as viagens viriam a ficar condicionadas, para não mencionar o exercício de reportagem, saídas de campo, aulas de laboratório e de todas as acções que impliquem próxima interacção. Em escassos meses, o nosso mundo ficou mais pequeno. Além da pandemia decorrente do novo coronavírus, coexiste outra que nada tem de novo e para a qual a Humanidade também ainda não conseguiu inventar o antídoto: o racismo. Esta doença, menos silenciosa do que a Covid-19, igualmente perversa - e por vezes fatal - contamina as sociedades em todos os quadrantes do globo. O medo do diferente Neste «mundo em crise» em que vivemos, como caracteriza o médico José Guerreiro no artigo de opinião publicado neste número da Newsletter FMVG, as ameaças à liberdade constituem o primeiro sintoma de uma doença de curto pavio e de graves sequelas. Evidencia-se a «instabilidade adaptativa sócio-emocional», lê-se na crónica assinada pelo médico Marco Ferreira. Na homenagem à vida literária de Nuno Júdice, na última edição do FLIQ - Festival Literário Internacional de Querença, Guilherme d’ Oliveira Martins destacava os perigos do isolamento cultural, a importância das identidades que permanentemente se enriquecem a partir da diversidade e da abertura. «São ameaças das identidades que alimentam o medo do outro, o receio relativamente ao diferente», podemos ler de forma completa neste número. A Literatura e o Conhecimento triangulam com a tolerância, porque colocam em diálogo diferentes culturas. Expandem horizontes, fronteiras, que só aparentemente poderão estar hoje mais estreitas, porque somos seres iminentemente sociais. Evocando o pensamento aristotélico, o nosso desiderato original é o de sermos para o outro. Na curva dos afectos, dos sistemas de saúde e da economia

leremos mais tarde o registo desta época, seja através da imprensa, dos diários, e-mails, publicações online, cartas efémeras, virtuais, mas essencialmente, da História, da Geografia, da Antropologia, da Filosofia, da Literatura. Michel Giacometti escreveu: «A Poesia é a forma mais directa e, ao mesmo tempo, mais natural de um povo contabilizar a sua história.»

Postais do Algarve Por essa razão também, a Fundação Manuel Viegas Guerreiro (FMVG) propõe-se oferecer nesta edição e ao longo das próximas, Postais do Algarve, a partir de Querença, do Algarve que em António Ramos Rosa é «casa onde se dorme para se renascer». O primeiro postal encontra-se na capa e será dos poucos ilustrados a comparecer a esta recolha. Trata-se de uma ilustração de Bernardo Marques e faz a capa do livro Vizinhos do Mar, de Julião Quintinha. O desafio será assim o de «contabilizar a história da região», valorizando-a, através das palavras de escritores, poetas, historiadores, geógrafos, arqueólogos, etnógrafos, filósofos, académicos, ensaístas. Quanto às imagens, irão ganhar a cor e a textura imaginadas por cada leitor. Em nome da liberdade, do conhecimento e da esperança. Evoca-se o Algarve de Estrabão, que «é não só o fim da Europa mas de toda a terra habitada» e de Estácio da Veiga, que registou a atracção dos «selvagens» de tempos remotos por este território, a quem «não escaparam pois aquelas encantadoras paragens». Algarve, terra de Cândido Guerreiro, «embalada pelas ondas» e de João Lúcio, «amada do luar e do sol ruidoso, ardente, imorredoiro...». Em prosa, o «reino do mato e da braveza» de José Saramago e a «paz da natureza no mundo humano» de Fernando Esteves Pinto, com um olhar para o «paraíso de vinhedos, de vergéis, de hortas, de pomares, écloga maravilhosa» de Júlio Dantas, «Vedado por montanhas / E abismos de água azul», na descrição de Teixeira de Pascoaes. Um Algarve «sempre em doce colóquio com o Mar!» - nota Nita Lupi -, o «leão piedoso» na poesia de João de Deus. Sempre com o infinito azul em fundo, onde «a terra que sobe insensivelmente até nós parece erguer-nos acima do Mundo real e fazer-nos pairar no Absoluto», escreveu Robert Chodat


no Guia de Portugal. Iremos percorrer o Algarve de Manuel Teixeira Gomes, esse que «dá vertigens caminhar assim, entre dois céus». Seguir o roteiro de Raul Brandão, por «lugares fora do tempo» ou, na imagética de Adília César, por «onde a semente do tempo apagou o dia em que nasci.» Registaremos também o regresso do poeta, «a última visita de álvaro de campos a tavira», de Pedro Jubilot. Mais a fortaleza que albergou o sonho do «primeiro inventor», segundo Cadamosto. Sagres, o cabo do mundo, aos olhos de Brandão, sempre sob a «luz animal que estremece e vibra como as asas de uma cigarra.» E vamos lembrar as cigarras de Sophia que «cantarão o silêncio de bronze.» Sentiremos o perfume dos «rapazinhos, malmequeres, goivos, sardinheira...» que florescem no Dia dos Prodígios. Também o aroma da flor de Luísa Monteiro, «essa verde flor de comer em tarde quente de cigarras e poeira / flor de carne pequena, de perfume com grainha de ficar no dente». Ao longo dos próximos números e pelas palavras de mais de uma centena de autores, subiremos às árvores algarvias. Das figueiras de Nemésio, «redondas e de ramos ao alcance da ávida mão da apanha...» às de Torga: «pequeninas, anãs, sem toco, onde nenhum Judas se possa enforcar de remorsos.» Imaginar as amendoeiras de João Braz cujas flores são a neve do Sul e pintar os medronhos de Tóssan - «pompons» - de cor alaranjada e vermelha. Junta-se a frescura da melancia e da romã de Bartolomeu Salazar Moscoso, as amoras madurinhas de Idália Custódio Farinho a fazerem lembrar a liberdade. Recordaremos as tardes alegres de Emiliano da Costa, que configuram outro dos Postais do Algarve: «Regozijo no campo. Já choveu. / Graças a Deus, há fava e há griséu!», mais a «Cidade dentro dum pátio sem telhas» de Zeca Afonso. Poetas a convocaram poetas. Lolita Ramirez lembra D'Abu Otma, Leonel Neves confessa: «Pouco mais sei de ti, ó Ibn Ammar, / mas comovidamente aqui te abraço, / moiro nascido no futuro Algarve!» Na voz do povo inflama o orgulho: «Nesses confins europeus, / Que são veia de Portugal, / Inventou João de Deus / A Cartilha Maternal.» E outros postais serão oferecidos, de lendas, milagres, bruxedos e do mártir S. Vicente, cantados

por Camões, Brás e Espanca. Mais a Nau Catrineta, o torvelinho dos bailes e as quadras de Aleixo. Viajaremos até à Voz Inicial, que fala da «casa onde a pobreza resplende de fartura», da infância de Gastão Cruz, onde havia «Na horta atrás da casa laranjeiras / figueiras e uma / romãzeira junto à nora». Teresa Rita Lopes evoca «o dorso tépido e trémulo dos animais / e sobretudo ah sim! o deslumbramento do mar», junto à horta dos avós de Cacela. E o Guadiana de Lutgarda Guimarães de Caires: «rio encantado / De mansas águas, suspirando amor!» Fixaremos o céu de Franklin Marques: «Terra de sol a brilhar, / num céu azul de mais cor» e de todas as outras. Dos campos «de um verde alacre, onde zumbem as cores», e do jardim de João Lúcio, «fremente de matizes, / Onde a cor dá concerto em sinfonias de oiro.» Dos poentes rubros de Julião Quintinha: «incandescentes lagos de carmim, laranja, violeta e oiro, onde o mar se tinge e embriaga com volúpia de pintor!». Ouviremos a alegria das rochas descritas por Natércia Freire: «As esculturas persas, assírias, egípcias dos rochedos riem-se das inovações de Moore e esperam que os homens as descubram e as interpretem». Visitaremos com Nuno Júdice a «A lota do Poema». Faremos a apanha do figo com Luís António dos Santos e a faina da sardinha, lado a lado com os homens que para Josefa de Lima são também aves. Subiremos à açoteia onde Casimiro de Brito dormiu em menino e ao «Terraço aberto», pela mão de Ramos Rosa, para respirar «através das flores / da chaminé / nos planos brancos / nos montes azulados / nas velas brancas / nas areias douradas (...) a claridade. «Aqui / na Torre do Sonho» de Stockler. E tal como Eugénio de Andrade, regressaremos ao longo das próximas edições às «águas novas desta luz antiga», onde Al-Mutamid cantou as «noites passadas lá no açude», onde Manuel da Fonseca quis esquecer-se das paisagens, das pessoas, usos e costumes, mas que, «insensivelmente», foi levado «de rua em rua». E sabe-se, porque aprendemos com António Pereira que, por cá, há sempre uma rua com o mar ao fundo.

Marinela Malveiro


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GUILHERME D´ OLIVEIRA MARTINS

VP

Conferência de Abertura da homenagem a Nuno Júdice no 4.º Festival Literário Internacional de Querença ganha actualidade face aos mediatizados ataques raciais de que Portugal também é palco. Recordamos por isso as palavras do administrador executivo da Fundação Calouste Gulbenkian.

«Não me sendo possível, como era meu desejo e como aconteceu em edições anteriores, estar presente no 4.º Festival Literário Internacional de Querença, na homenagem ao meu querido Amigo Nuno Júdice, não posso aqui deixar de exprimir, primeiro, o meu grande apreço pela ação da Fundação Manuel Viegas Guerreiro. É uma ação que tem sido extraordinariamente rica, extraordinariamente fecunda e que recorda uma personalidade muito marcante que tive o gosto de conhecer, com

quem tive o gosto de dialogar e de beneficiar do seu conhecimento e da sua sabedoria mas, simultaneamente, lembrar tudo aquilo que tem sido obra da Fundação, tudo aquilo que tem sido feito ao longo destes Festivais Literários Internacionais de Querença. Em boa hora nos encontramos aqui e homenageamos Nuno Júdice. Nuno Júdice é um grande poeta e uma referência fundamental da Cultura e da Língua Portuguesa contemporâneas. Nascido na Mexilhoeira Grande, é um algarvio dos quatro costados, e alguém que tem sabido, ao longo da sua criatividade literária, demonstrar a força e a riqueza desta cultura meridional, desta cultura que, antes de mais, recorda uma plêiade de grandes referências, entre as quais Manuel Teixeira Gomes tem um lugar muito especial. Se falo em Manuel Teixeira Gomes a propósito de Nuno Júdice, é justamente para dizer que, de algum modo, Nuno Júdice faz parte desse código genético que nos permite compreender a magia deste extraordinário Algarve, Algarve do Agosto Azul. Nuno Júdice, ao longo da sua carreira, em primeiro lugar tem-se afirmado como investigador,

«a literatura, a capacidade de criação e inovação ligada à riqueza da língua tem a ver afinal com a compreensão da especificidade e da diversidade da cultura»


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«no mundo contemporâneo há ameaças a que temos que saber responder com determinação, são ameaças das identidades que se fecham sobre si, das identidades que alimentam o medo do outro» ensaísta, como professor da Universidade Portuguesa de extraordinária qualidade e a sua coerência deve-se, justamente, a esta circunstância - sendo conhecedor, sendo investigador, sendo um ensaísta da primeira qualidade, é simultaneamente, alguém que na sua poesia, na sua criação literária, usa da criatividade, da imaginação para espraiar, para afirmar a riqueza, a diversidade e a complexidade da língua portuguesa. É por isso que esta homenagem do FLIQ a Nuno Júdice é uma homenagem natural. Eu diria que, mais tarde ou mais cedo, Nuno Júdice teria que estar na situação em que este ano está neste quarto Festival, uma vez que é de inteira justiça exprimir um grande apreço relativamente a tudo aquilo que ele nos tem dado. Nuno Júdice ensina-nos que hoje a literatura, a capacidade de criação e inovação ligada à riqueza da língua tem a ver afinal com a compreensão da especificidade e da diversidade da cultura. De facto, falar de identidades é falar de diferenças. E alguém originário do Algarve, alguém com raízes na nossa terra, pode compreender como poucos a força,

a importância de uma identidade que permanentemente se enriquece a partir da diversidade e a partir da abertura. Devo exprimir aliás, algo que sei que corresponde também ao pensamento, corresponde também à preocupação de Nuno Júdice e que é o seguinte: hoje no mundo contemporâneo há ameaças a que temos que saber responder com determinação, são ameaças das identidades que se fecham sobre si, das identidades que alimentam o medo do outro, o receio relativamente ao diferente. Quando lemos a obra de Nuno Júdice verificamos que há sempre essa preocupação fundamental que é a de abrir horizontes, é de dialogar, de pôr em contacto culturas diferentes. Nada melhor do que o Algarve para o compreender. Estamos no Mediterrâneo banhado pelo Atlântico, como disse Orlando Ribeiro. E este Mediterrâneo banhado pelo Atlântico leva-nos a lembrar todo o percurso poético, todo o percurso literário de Nuno Júdice, em ligação com a memória de Manuel Teixeira Gomes, que, no final da sua vida, quis manterse próximo do habitat natural do Algarve, junto ao mar, junto ao azul cobalto do Mediterrâneo, compreendendo afinal a força, a importância, daquilo que um dia ele disse ser o significado e a força da gente singular. E é isto, a compreensão da singularidade, a compreensão do pluralismo, a ideia cosmopolita, o apego à liberdade que tem estado bem presente relativamente à criação literária de Nuno Júdice. De quem tanto continua a esperar-se – e a quem envio um especial abraço.» Mensagem exibida em 3 de Maio de 2019


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Para além das casas, a estrada. Para além da estrada, o mato. Para além do mato, os figueirais, e as outras terras, e as outr as ainda. Para

IN MEMORIAM

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Luís Guerreiro com Idália Farinho Custódio, Maria Aliete Galhoz, Isabel Cardigos e Manuel Viegas Guerreiro e Eugénio Alte da Veiga. Claustros do Convento Espírito Santo, Loulé, década de 90

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Luís Guerreiro na abertura do Festival Literário Internacional de Querença, 2017

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Luís Guerreiro todos anima e estimula com o seu saber e suas histórias, 2017

Luís Guerreiro em entrevista à RTP, 2017

Luís Guerreiro recebe, na FMVG, alunos da EB2,3 Pde. João Coelho Cabanita, Loulé, 2015


além de todas as terras, o mar. Para além do mar o Sul, e no caminho do Sul mais extremo, o bojo da terra, e para além do bojo da terra.

«O livro é a grande memória dos séculos. Se os livros desaparecessem, desapareceria a história e, seguramente, o homem.»

TV

Jorge Luis Borges

VALORIZAÇÃO DO CEA Tributo a Luís Guerreiro Luís Manuel Mendes Guerreiro, bibliófilo e homem de Cultura, reuniu centenas de livros ao longo da vida, constituindo uma colecção que se pode encontrar em Querença, aldeia natal do «engenheiro das letras», na expressão de Joaquim Magalhães. Este fundo, o Centro de Estudos Algarvios (CEA), está alojado na FMVG, instituição a que presidiu da primeira hora em que foi criada até à última da sua vida. Luís Guerreiro faleceu a 14 de Agosto de 2017. Se fosse vivo, faria 60 anos no dia 4 de Setembro. Celebrando o seu legado, a FMVG convidou várias personalidades ligadas à Cultura para elaborar um breve ensaio a partir de um livro, símbolo de uma das paixões maiores de Luís Guerreiro. Os textos serão publicados semanalmente no site da Fundação e partilhados no Facebook e Newsletter FMVG. Mais tarde, será

editada uma brochura com todos os artigos reunidos. Esta é uma iniciativa que pretende valorizar o CEA e homenagear o seu fundador, revelando algumas das obras que compõem este acervo bibliográfico. Previamente à publicação dos ensaios, o CEA é, desde já, fonte da rubrica Postais do Algarve . Imagens para ler a seguir.

LÍDIA JORGE SOBRE O FALECIMENTO DE LUÍS GUERREIRO:

«É um choque terrível. Uma perda irreparável. O Algarve perde, mas também o perde o país». in Sul Informação, 14 de Agosto de 2017


NEWSLETTER FMVG | N.º 23 No fundo dos escuros, das noites e dos dias. Muito para além de tudo isso. Ainda para além do Sul tão extremo, que já passa a ser Norte em

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Toda a festa de luz que irrompe da poesia de

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JOÃO LÚCIO

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Porque é que tanto me enleia e confunde escrever meia dúzia de linhas sobre uma pai-

Do infinito azul onde céu e mar se confundem, a terra que sobe insensivelmente até nós parece erguer-nos acima do Mundo real e fazer-nos pairar no Absoluto. ROBERT CHODAT

sagem, um quadro, um monumento, que me estão diante dos olhos, e logo que se afastam, a ponto de não serem já perceptíveis, as observações, o discorrer, que esses motivam, tomam forma e (correctamente) a linguagem lhes dá expressão abundante e apropriada? Excesso de imaginação, talvez, que se sente

é o Algarve (...) E o Algarve é ainda e sortìlegamente terra moura que os seus poetas amaram estrondosamente e de cujo amor deixaram memória. NATÉRCIA FREIRE

restringida, limitada, cerceada, pelo testemunho do modelo em presença, e que pode trabalhar livremente sobre ele, quando está

«como falar de ti, Silves,

ausente. E enquanto lhe escrevia a minha última carta, mais de uma vez me acudiu à

sem que uma lágrima me caia

lembrança a promessa que fiz, já não sei a

IBN AMMAR

quem – ao Jaime Cortesão, se me não engano – de dar para o Guia de Portugal dos rapazes da Seara Nova, a descrição de «uma copejada de atum». Fiquei sempre pensando que era agora – de longe – boa ocasião de a fazer. Pois vou tentá-lo hoje, e se lhe parecer que pode servir, guarde-a para o caso de eles

« O Algarve tem o seu lugar bem definido entre a Riviera di Ponente e Málaga, a afamada estação espanhola do Mediterrâneo.

um dia a pedirem.

GERALDINO DE BRITES MANUEL TEIXEIRA GOMES

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De claridade vive em terra estranha a extensa cinza fraca lua das praias

A nossa antiquíssima região, cadinho de povos e de culturas, secularmente motivou e convocou múltiplas e sortílegas vozes poéticas. ANTÓNIO ROSA MENDES

de firmeza canção rasgando o fogo magoado contente da nudez GASTÃO CRUZ

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A Terra do Sonho Aqui na Torre do Sonho a vida perdura sossegadamente rosas vermelhas nas orelhas da terra (...) Aqui sim os poetas podem sentar-se nos largos ombros da manhã há milénios acesa dentro dos olhos dos homens J. SANTOS STOCKLER

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Barca lunar

iluminada pelas películas mais finas «

Longe de procurar Nice, Biarritz ou Saint-Jean-de Luz, era aqui, para este esplêndido sanatório hibernal, erguido em frente a um mar fagueiro e plácido, que os portugueses de saúde combalida deveriam vir aquecer-se ao Sol. RAUL PROENÇA


POSTAIS

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DO ALGARVE

LÍDIA JORGE

relação ao que ainda resta, nessa direcção. Dormirá o soldado se ainda por essas bandas for hora de dormir .

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Não se confunde com a terra andaluza próxima, nem com a província alentejana contígua, nem se assemelha à nesga do continente africano fronteiro. (...) O mar, a planície, a montanha, o céu sempre azul, o ar sempre transparente e limpo criaram este quadro geográfico, de uma beleza própria. SILVA TELES

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... mui singularmente um dilatado tracto de rocha eruptiva, que, na serie paleozoica, rompendo os schistos, atingiu nos seus pontos mais elevados as altitudes de 903 e 755 metros sobre o nível do mar, como foram as serras da Foya e da Picota de Monchique... ESTÁCIO DA VEIGA

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Esta pequena região é uma orla de cerros calcários e planícies litorais que nunca mede mais de 20 quilómetros de largura e se afila nas extremidades. ORLANDO RIBEIRO

« Um pequeno pedaço de território onde a diversidade se unifica numa harmonia singela, do alto das serras ao mar espraiado, do sotavento ao barlavento. Aqui! Tudo é diferente do resto que se conhece. SÉRGIO BRITO inédto

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Quantas noites passadas lá no açude Sinuosas deslizavam as correntes do rio Como manchadas serpentes AL-MUTAMID

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Antecâmara de África, o Algarve dispõe-se em anfiteatro, abraçando um mar chão que se estende sem obstáculos até à outra margem, como se houvesse continuidade com a terra africana, e o mar calmo não fosse mais do que um grande lago. FERNANDO SILVA GRADE

No Algarve não há silêncio e impassividade: há o movimento constante, o falar, o cantar de uma população como a dos gregos das ilhas, ora embarcados nos seus navios costeiros, ora ocupados nos seus campos, que são jardins. OLIVEIRA MARTINS

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A costa, olhada do mar, é baixa, ondula, cresce, de arvoredo escuro, denso. Ao fundo, soergue-se a serra do Caldeirão, também conhecida pela do Mu, de recortes distantes, amaciados de sombras lilases.

Esta serra que para a direita se estende, em vagas sucessivas que nunca atingem os seiscentos metros, mas que a espaços levanta agudos picos, e onde as ribeiras se cansam para levar a sua água avante, é o Caldeirão, também chamado Mu. É o reino do mato e da braveza.

MANUEL DA FONSECA

JOSÉ SARAMAGO

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falésias abruptas chocando com um oceano tranquilizado pela doçura do céu

Nesses confins europeus, Que são veia de Portugal, Inventou João de Deus A Cartilha Maternal.

Um mar que é outro mar, Um sol que é outro sol

E vejo agora o Reino dos Algarves, / Vedado por montanhas E abismos de água azul.

MIGUEL TORGA

TEIXEIRA DE PASCOAES

POPULAR

SIMONE DE BEAUVOIR

de cal... CASIMIRO DE BRITO

Figueiras verdes do sul

Não era a velha, não era o burro, não era o cesto nem o chinelo no pé Não era a nora, não era a açoteia, não era o pátio nem a chaminé Não era a aroeira, não era a amendoeira, não era a alfarrobeira Era a flor, essa verde flor de comer em tarde quente de cigarras e poeira flor de carne pequena, de perfume com grainha de ficar no dente era o figo verde, somente rei absoluto do caminho, nascido do que é singelo e natural baloiçando livremente nos ramos pelo barrocal. LUÍSA MONTEIRO inédito


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No meio das montanhas há um vale de brilho róseo chão de coral.

« Duas impressões se fixam no meu espírito para sempre: a noite extraordinária, a luz maravilhosa. A luz sustenta. Basta esta luz para ser feliz.

No meio dos vales há uma montanha onde o grito feroz se assanha. No meio das montanhas há um vale onde a musa escuta o canto do pardal. O coral solitário erige os altos campanários onde o pardal constrói o ninho. No litoral a água com a sua pele de arminho corrompe os basaltos lendários. (...) À noite o polvo solar amalha-se na noite coutada. A terra revolve as entranhas lavradas e acolhe as vítimas da foice de Morfeu. JÚLIO CARRAPATO

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RAUL BRANDÃO

Noites a desaguarem assim,

estrelas de um céu tão próximo e antigo. Escuro e macio. Tela

imensurável, recetora de tanto sentir, antes de adormecer. MARTA DUQUE VAZ

« Dormimos sob a lua com o coração destapado FERNANDO CABRITA

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Só no cantar do Sul o tempo dura AFONSO DIAS

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Lindo país de mouras encantadas,

Tão longe... que eu vos veja, recordando

Onde o amor tece lendas e onde as fadas

Noivas amendoeiras branquejando,

Em castelos de lua dançam rondas…

Sob um céu de safira, luminoso...

Minha Terra embalada pelas ondas,

CÂNDIDO GUERREIRO

Campos do meu Algarve esplendoroso,

MARIA VELEDA

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Ao longe o mar se ouviu, leão piedoso,

Um ai soltar; Pelas praias se ouviu gemer ansioso, Ao longe o mar! JOÃO DE DEUS

« Eis-me novamente abeirado de terras do sul, onde aportei na pacífica demanda de alguns dias de pousada, para encher os olhos de mar, sorver o aroma dos campos, provar o sangue do oximel... JULIÃO QUINTINHA


POSTAIS

DO ALGARVE

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mar

A fita do ao fundo, como uma divisa de fumo atravessada entre a serra e as nuvens, que se levantam de trás, e se vão extinguir no Sul dos ventos. LÍDIA JORGE visita-nos mesmo no Dá vertigens caminhar assim, entre dois céus, na temerosa suspensão fictícia a que os sentidos abonam realidade. MANUEL TEIXEIRA GOMES espelho. Ao crepúsculo, um sangue alaranjado aflui ao rosto das casas. Depois do Vermelhas são as rosas a meu A ria é largo espelho Algarve jardim de rosas vermelhas mar, Passam sós e por sonho aquela cinza emoldurado Algarve brancura de pedra e cal Cruzando ali e largo atrás esse sinal por verdes margens rente ao mar! sulcamos JOSÉ AFONSO Nosso vermelho o verde tanto azul VICENTE CAMPINAS a terra, a MARIA ALIETE GALHOZ caminho da noite, viajamos a brisa, na fugitiva Laranjais, amendoais, milagres... fontes ... sinto-me num paraíso inabitado, Uma mulher espreitando num postigo; Que são a voz nostálgica dos montes, virgem, eu diria. Tão virgem e geneum carro velho abandonado liberdade Sempre em doce colóquio com o ! roso que me acolhe, eu, visitante um cão vadio na esquina, dos nossos descrente, mas rendida, agora e uma linha de sombra sonhos. NITA LUPI

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ANTÓNIO RAMOS ROSA

incondicionalmente, a tanta beleza natural. CRISTINA CARVALHO

casas, açoteias e mirantes, calor e estagnação deste Sul luminoso e inóspito.

ANTÓNIO JOSÉ VENTURA

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O sobreiral das umbrias não move uma folha. Nem homens, nem aves, nenhum indício de vida animal. Um silêncio absoluto de sonho e de mistério. Quase me parece sacrilégio misturar palavras ao divino sossego da Natureza.

MANUEL VIEGAS GUERREIRO

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Província onde nasci, amada do luar e do sol ruidoso, ardente, imorredoiro... Lírio fresco e azul deitado à beira-mar. com o cálix gentil a orvalar-se em oiro.... JOÃO LÚCIO

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Era um verdadeiro pagode As longas tardes de Verão Mas à noite era outra história Nesse tempo a mata era um autêntico bosque Tinha dez vezes mais árvores que hoje JOSEL DUGARB E luz nenhuma

o mediterrâneo empurrado pelo vento levante esgueira-se diligentemente para cá do estreito

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Nos desejos adolescentes a inocência talhada será sempre assim o Junho de noventa e oito de novo aqui e o cheiro a ria eu deitado na sombra nocturna da casa fechada na praia da ilha o vento sussurra será sempre assim (...) em frente da casa o estreito desenhado nos canais diluindo no mar o céu e a terra MIGUEL GODINHO

PEDRO JUBILOT


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OPINIÃO

COVID -19 Saber e Cultura A Covid-19 instalou-se bruscamente com grande agressividade e capacidade de contágio. Transformou-se em pandemia e impôs medidas de confinamento. O conjunto, com consequências sanitárias e económicas gravíssimas, coloca em sobressalto agentes políticos, económicos, científicos e de saúde, perante o dilema economia-saúde. Hoje a pandemia controla-se melhor do que no início, graças ao saber que se foi adquirindo do coronavírus SARS-COV-2, bem como da doença. Deposita-se grande esperança na comunidade científica e nas investigações em curso, no sentido de conhecer melhor o vírus, seus mutantes e formas de contágio, além de vacinas e medicamentos. Aliás, o poder político no geral, excepto alguns casos de despotismo ignorante, prefere consultar organismos do saber técnico-científico antes de tomar decisões sobre o assunto, o que só lhe fica bem. O saber atual, altamente complexo, é gerado em instituições próprias, quer públicas quer privadas, onde se devem destacar as universidades, devendo aplicar-se em proveito de todos. A sua divulgação será o pilar principal da formação das sociedades modernas através da educação.

«A Covid-19 surge num momento de tensão entre superpotências e até tem alimentado algumas teorias da conspiração» Os seres vivos forjam-se numa luta biológica contínua com a finalidade de preservar o indivíduo e a espécie. Os humanos, apesar dos padrões civilizacionais adquiridos ao longo de milénios, não fogem a essa regra. Esses padrões são um conjunto de conhecimentos, normas e valores que antropologicamente podemos designar por cultura e constitu-

em a memória coletiva dos povos, com singularidades próprias de lugar e época. O grande desenvolvimento tecnológico do pós-guerra com enfâse nas últimas décadas onde a informática e as tecnologias da informação fizeram a maior revolu-

«Talvez se vá assistir a movimentos migratórios inversos, centrífugos das cidades para os campos» ção da história da humanidade criaram novos padrões culturais. Estão a transformar o mundo numa globalização centralizadora, onde predomina o comércio e o consumo, e em novos poderes económicos e políticos. A capacidade desses poderes em tratar, criar e transmitir informação é enorme e influencia as populações. Vivemos um mundo em crise, devido à transformação acelerada sem tempo para sedimentar instituições e novos padrões, numa globalização e novos poderes contaminados por alguns perigos. Todos estes processos são dinâmicos e interativos com contradições próprias que os obrigam a modificar-se. Acreditamos que uma sociedade, apesar dos seus elevados padrões civilizacionais, quando baseada no desperdício, na poluição e em profundas desigualdades, transporta em si o gérmen que a conduzirá noutras direções. Talvez, num futuro não muito longínquo, se vá assistir a movimentos migratórios inversos, centrífugos das cidades para os campos criando comunidades locais e regionais, cooperantes, autossuficientes e centros de contrapoder. A Covid-19 surge num momento de tensão entre superpotên-


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POR JOSÉ MARIA GUERREIRO Médico radiologista e vice-presidente do Conselho de Administração da FMVG

cias e até tem alimentado algumas teorias da conspiração. No imediato todos saem fragilizados, particularmente os mais fracos. No entanto, nalgumas situações contribui para a percepção da necessidade de união, como é o caso da União Europeia que, em vias de desagregação, tocou a rebate para preservar e fomentar a unidade. E as populações? Como irão reagir numa crise económica e social que se adivinha grave? Para além de reivindicações legítimas no contexto das dificuldades esperadas, irão consciencializar-se da necessidade de discriminar o essencial do secundário, particularmente em padrões de consumo e culturais? A essência da vida é a própria vida e esta vive-se na maioria dos casos, em liberdade na interação dos indivíduos com pequenos jogos de poder e sedução, em sociedades organizadas que procurarão garantir as necessidades básicas e superestruturais. É este conjunto plural, tolerante e criativo, com as suas tensões e contradições próprias, resolvidas preferencialmente através do diálogo, entendimento e cooperação, que deve constituir os alicerces das sociedades do futuro, numa dinâmica e devir contínuos, em mudança permanente. Um físico português, investigador na área da Medicina Espacial, inicia as suas conferências com uma imagem da Terra vista do espaço, penso que a foto de Gagarine, e a legenda «Caravela da Humanidade». Frase brilhante. Talvez quando o homem interiorizar esta sua situação de confinamento e navegante no espaço, todos metidos no mesmo barco, sinta necessidade de não o deixar meter água e melhorar a vida a bordo, pois o naufrágio pode acontecer, embora eu acredite que tal caso, a existir (lagarto, lagarto...), será sempre por causas intrínsecas do planeta ou cósmicas.

JOSÉ MARIA GUERREIRO | Médico especialista em radiologia, quando ainda não existia TAC nem Ressonância Magnética. Nasceu no lugar da Amendoeira, Querença, onde foi à escola até aos 10 anos. Ao longo dos anos académicos de medicina, em Lisboa, estudava os dramas da Guerra Civil de Espanha e da II Guerra Mundial. José Maria Guerreiro assume hoje uma corrente humanista com a liberdade como valor absoluto.

«O saber atual, altamente complexo, é gerado em instituições próprias, quer públicas quer privadas, onde se devem destacar as universidades, devendo aplicar-se em proveito de todos. A sua divulgação será o pilar principal da formação das sociedades modernas através da educação»


POR MARCO FERREIRA Médico, especialidade em Medicina Geral e Familiar

O Tempo e o Modo de uma nova Era Ficámos muito admirados ao ver imagens da China na TV com os seus habitantes citadinos a usarem diariamente uma máscara na face para proteger da poluição.

MARCO FERREIRA | Natural da Freguesia da Sé, Porto, frequentou o ensino secundário na Vila de São Pedro do Sul. Licenciou-se na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, especialidade em Medicina Geral e Familiar em Portalegre. Médico na Extensão de Saúde de Querença durante cerca de 2 anos, até Março 2015. Constituem valores de vida, o Humanismo, a Ética, o Profissionalismo, o Respeito e a Democracia.

«O SNS é fundamental a um País como o nosso e que a sua defesa é primordial para a saúde das pessoas»

Quem não se lembra da palavra de ordem do aparentemente longínquo ano de 2019? Essa palavra era “Ambiente”, em tempos onde a jovem Greta Thunberg se destacava numa acção exemplar para miúdos e graúdos na luta pela defesa da natureza, contra uma poluição enormemente assustadora que nos contaminava tudo, os 3 elementos essenciais –Terra, Água e Ar! Este já é um velho problema da Humanidade e aqui gostava de lembrar uma figura, para mim um exemplo, que não podemos esquecer; já muitos anos antes, ainda aquela menina aprendia a correr, já esse ilustre político democrata americano chamado Albert Arnold Gore Jr., defendia estas questões e fazia a luta ao mais alto nível, alertando os governos, pugnando pelos bons ideais para o Planeta, tendo sido até laureado com o prémio Nobel da Paz em 2007. Enfim, os anos foram passando e nada de consistente se tem visto por par-

«faziam-se votos por esse mundo fora de um futuro ainda melhor, com mais projectos, trabalho, rendimentos, produtividade» te das grandes potências mundiais, as grandes poluidoras do nosso globo. Infelizmente a poluição foi crescendo, e parece que ninguém a consegue travar. Passou-se a crise financeira da década anterior e agora, chegados a Janeiro de 2020, faziam-se votos por esse mundo fora de um futuro ainda melhor, com mais projectos, trabalho, rendimentos, produtividade (essa palavra traiçoeira), dando corda a uma máquina avassaladora chamada ambição desmedida do ser humano! Naquela altura ficámos muito admirados ao ver imagens da China na TV com os seus habitantes citadinos a usarem diariamente uma máscara na face para proteger da poluição. Nada parecia poder mudar, não conseguíamos ver uma saída para esta


terrível situação internacional e tentava-se prever o futuro como se de um jogo se tratasse. Mas, como diz o povo, o futuro a Deus pertence! Eu próprio nas minhas reflexões, inclusive pensando sobre o ano novo que estava a começar, não me ocorria nenhuma

Esta nova realidade trouxe à vida das pessoas alguns sentimentos que no seu todo geraram o que poderemos designar de instabilidade adaptativa sócio emocional. Desde logo as nossas crianças ficaram muito assustadas com a existência de uma coisa que não se vê, que é má e para a qual não há remédio. Os seus pais que tiveram de adap«Esta nova realidade trouxe tar-se e viver num dilema terrível que é a necessidade de à vida das pessoas alguns sair de casa, ir trabalhar para governar a vida, mas ao mesmo tempo com a sensação de que a qualquer momento sentimentos que no seu todo algo poderia correr mal. E depois os seus avós receosos geraram o que poderemos de contraírem essa infecção várias vezes mais letal do designar de instabilidade que uma gripe forte e que por isso, já não podiam abraçar adaptativa sócio emocional» os seus netos. E assim, todos começamos a ter de usar a boa e forte solução para a desgraça que estava a acontecer tal máscara, algo tão estranho mas que já era hábito conao Planeta! Como poderíamos mudar este estado de coisas, solidado no poluidíssimo mundo oriental. se os políticos do mundo não se uniam todos nesse fulcral Surgiu depois o Estado de Emergência (que vigorou quase desígnio, nem na América, nem em Bruxelas, nem em Davos, nem em parte nenhuma? Em consciência muitos de «essas raízes essenciais à vida nós sabíamos que a situação tinha que mudar, mas como?! da árvore, que é a família, a Qual seria esse caminho? sociedade – evoco aqui com E digam lá, alguém imaginava o que veio a seguir? Penso enorme admiração as que não. palavras de D. José Tolentino Curiosamente e qual “ironia do destino”, como diria a sabede Mendonça» doria popular, um pequenino ser invisível (“é uma doença que mata sem se ver”, como dizia uma minha Utente), uma dois meses, entre Março e Maio) que obrigou a quase todos nova estirpe do tal vírus coroado (do latim “corona”) de ver- a ficar em casa e a ter muita paciência a fim de mitigar o melho (a cor do sangue – a cor da vida e da morte), daí ser stress que se foi instalando ao longo das semanas, agora já chamado de Coronavírus, veio baralhar-nos completamente vários meses. Para uma parte dos idosos o estar em casa as nossas vidas, obrigando-nos finalmente a abrandar... não foi nada de novo mas, a terrível mudança, foi não pode-


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rem conviver com a família, não poder abraçar os filhos nem beijar os netos! Não se poderem juntar a uma mesa a conversar e comer, algo tão genuinamente popular e de que todos nós gostamos! Que sofrimento atroz a que todos fomos submetidos, mas lembro especialmente aquelas avós e aqueles avôs, que vivem em lares ou que por algum motivo estão longe dos seus descendentes (essas raízes essenciais

«falta de alimentação adequada, ansiedades, doenças psíquicas e seu agravamento, instabilidade pessoal e familiar» à vida da árvore, que é a família, a sociedade – evoco aqui com enorme admiração as palavras de D. José Tolentino de Mendonça em 10/6/2020). Quanto a mim, sobre este período não posso deixar de partilhar convosco que senti medo também de ficar doente mas, mantive a coragem para trabalhar e ajudar ao Serviço; fiquei triste por não ter pessoas na consulta (fazíamos tudo pelo telefone), por ver as ruas desertas por onde passava no meu dia-a-dia entre Loulé e Quarteira, algo incrível e que era impensável acontecer. Como sabem, gosto imenso de conversar com as pessoas e houve dias em que a angústia e a solidão também me assolaram bastante. Estamos pois numa nova Era determinada por uma Pandemia viral que está longe de ter um fim. Surgiram necessidades diversas, onde a ajuda intergeracional e comunitária tiveram um assinalável nobre momento na fase de maior confinamento mas que deverá servir de exemplo para “os nossos futuros”. Estamos todos afectados por esta nova realidade mas, há que termos a consciência e a certeza de que esta vaga não aflige a todos por igual. Por isso, mais do que nunca temos de pensar e reforçar o altruísmo na vida (como referiu recentemente na TV o meu colega Dr. Manuel Pedro Magalhães/Hosp. da Cruz Vermelha), essa ajuda humanista, sem interesses, defendendo os princípios que regem as comunidades mais evoluídas no que respeita à coesão e integração sociais.

O Algarve em particular, região que me abraçou com todo o carinho e amizade como se de um filho seu se tratasse, está a sofrer de um “tsunami” devastador chamado falta de trabalho (foram registadas 26.140 pessoas desempregadas no final de Junho; mais 231% face ao período homólogo, segundo dados do IEFP), onde a diminuição de rendimentos das famílias começa a ser muito preocupante, gerando crescentes problemas em saúde – falta de alimentação adequada, ansiedades, doenças psíquicas e seu agravamento, instabilidade pessoal e familiar, dificuldades de mobilidade pessoal no acesso aos diversos serviços públicos, em especial o de saúde. É pois imperioso para a nossa região (e também para o País), que se continue a reforçar o Serviço Nacional de Saúde (SNS), onde o Estado, que deve ser o garante da equidade, tem a obrigação de olhar para o território com muita atenção, especialmente para a interioridade, desenvolvendo estratégias efectivas de descriminação positiva, contrariando a desertificação. Com efeito, esta Pandemia do novo Coronavírus veio demonstrar categoricamente que o SNS é fundamental a um País como o nosso e que a sua defesa é primordial para a saúde das pessoas, sendo também decisivo em contextos adversos de calamidade pública. Sabemos também há demasiado tempo, que precisamos de uma nova infraestrutura hospitalar, que possa realmente atrair, fixar e formar mais profissionais de saúde, fruto das suas melhores condições de trabalho, para assim servir melhor a população algarvia e os seus visitantes, que são o incontornável garante de muitos postos de trabalho na hotelaria e restauração. Por fim, nunca é demais realçar que há um conjunto de mudanças que temos de manter nas nossas actividades de vida diária para nos protegermos. Essas novas atitudes simples mas muito importantes, das quais destaco o distanciamento social, o uso de máscara e a lavagem frequente das mãos, são digamos assim um certo garante para mantermos afastado “o tal bicharoco”, até que chegue a vacina. Não esqueçamos nunca que “o seguro morreu de velho” e mantenhamos pois a esperança num futuro melhor para a humanidade.


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DIÁRIO DE CAMPO

JG

Presidente da República em Querença

Da esq. para a dir.: Fernando dos Santos Pessoa, Vítor Aleixo e Marcelo Rebelo de Sousa no Percurso Eco-Botânico Manuel Gomes Guerreiro, Querença

A visita oficial de Marcelo Rebelo de Sousa ao concelho de Loulé, no passado dia 26 de Julho, culminou no Percurso EcoBotânico Manuel Gomes Guerreiro (PEB-MGG), em Querença. O chefe de Estado reconheceu que este configura um conceito único no país. O PEB-MGG, caracterizado por valorizar a paisagem mediterrânica, é a mais recente iniciativa da FMVG. Fernando dos Santos Pessoa, arquitecto paisagista que assina a autoria do projecto, foi anfitrião do périplo. Desenvolvido em parceria com a Câmara Municipal de Loulé, o PEB-MGG constitui um dos projectos estruturantes para o interior do concelho. A aguardar data de inauguração, começa a adquirir um coberto vegetal com alguma exuberância. Recorde-se que Marcelo Rebelo de Sousa deslocou-se ao Algarve no âmbito da pandemia Covid-19 e do anúncio da

atribuição de uma verba de 300 milhões de euros, negociados em Bruxelas, para a revitalização económica da região. Após o clássico mergulho no mar, desta feita em Quarteira, o Presidente da República reuniu com a comunidade britânica residente em Loulé e, ao final do dia, com todos os autarcas algarvios no restaurante Tasquinha do Lagar, em Querença. Na parte inicial da visita, o chefe de Estado marcou presença em Boliqueime, no Lar de Idosos da Santa Casa da Misericórdia, que registou o maior foco de Covid-19 no Algarve (cinco mortes e 40 infectados). Na Igreja Matriz de S. Sebastião de Boliqueime, decorreu a sessão reservada à comitiva de Marcelo Rebelo de Sousa, com intervenções da escritora Lídia Jorge e do presidente da Câmara Vítor Aleixo.


Saúde e ambiente aproximam presidentes Marcelo e Aleixo com esta dimensão: «Ainda desconhecemos a devastação das consequências sociais, mas trabalhamos já, a fim de nos prepararmos para estar prontos quando for preciso, com uma mão amiga, solidária e para nos relembrar que esta pandemia, por mais que nos leve, não nos levará nunca a nossa Antes de visitar Querença, no dia 26 de Julho, Vítor Aleixo humanidade». Considerando que a saúde, em especial dos recebeu o Presidente da República em Boliqueime numa mais idosos e dos mais desprotegidos é uma prioridade do sessão solene e carregada de simbolismo. O presidente da Câmara Municipal de Loulé começou por abordar o vírus que seu mandato, Aleixo diz ter alocado todos os recursos matemudou o mundo e as rotinas: «O medo e a ansiedade ganha- riais e morais na gestão do foco de Covid-19 no Lar de Boliqueime. O edil adiantou que a autarquia investiu 90 mil euros ram terreno à segurança das rotinas na vida de cada um. A saúde física e mental de muitas pessoas foi submetida a dura para debelar rapidamente a situação, fazendo notar que isso não coloca um preço em qualquer vida humana: «A vida dos prova. As estruturas hospitalares felizmente aguentaram-se graças ao SNS, mas não nos deixaram tranquilos quanto ao nossos idosos não tem preço. Tem, tão só, o valor que é igual a todas as outras vidas humanas». Saúde e Ambiente, faces da mesma moeda? Vítor Aleixo colocou ainda a tónica no Ambiente: «Há muito que vozes autorizadas como Miguel Bastos Araújo e José Gil vêm chamando a atenção para a relação que parece existir entre a desregulação ambiental e, muito concretamente, a redução drástica da biodiversidade e o surgimento de pandemias como a atual». Algo que dá razão, segundo Aleixo, à estratégia de investimento crescente nesta área por parte do actual Executivo: «Em Loulé, há já alguns anos, que colocámos o ambiente e a ação climática no centro das nossas futuro que continua uma incógnita», alertou. «Perderam-se políticas municipais», garantiu. vidas, algumas de entes queridos, familiares e amigos, em A visita do Presidente da República insere-se num conjuncircunstâncias especialmente dolorosas. Perdeu-se economia to de deslocações semanais ao Algarve com o objectivo de de forma traumática», acrescentou Aleixo. encontrar, juntamente com os autarcas da região, novas forNuma autarquia com um peso ímpar no Algarve e no país, o mas de relançar a economia algarvia, fora do paradigma sol e executivo accionou rapidamente várias medidas sociais e de mar, fórmula que está esgotada e que não garante a retoma apoio às empresas. O autarca acredita que o factor humano da economia regional. será sempre decisivo para ultrapassar as dificuldades, mesmo JG

A proximidade de Marcelo ao Algarve já era conhecida, em especial às praias junto à Quinta do Lago, de que é frequentador regular. Desta vez, revelou uma nova paixão: o interior do concelho de Loulé.


L.E.R. Cãofiante na TV ma-ram saídas de campo às histórias da Nossa Casa Comum, lidas na Fundação, em casa com os familiares e na sala de aula, em articulação com a professora e a educadora da escola de EB1/JI Querença. Em parceria com a biblioteca da escola EB1 Francisca de Aragão, Quarteira, participaram no ciclo do azeite. MM

O projecto de promoção de aprendizagem da leitura e da escrita fez parte do alinhamento do programa da RTP2 Sociedade Civil, que elege acções interventivas na comunidade nas mais variadas áreas. Os animais foram os protagonistas da emissão de 25 de Junho. Em Querença, a literacia emergente, a consciência fonológica e a motivação para a leitura são trabalhadas nas crianças do pré-escolar e 1.º ciclo. Face à pandemia, as últimas sessões cumpriram-se online. Os resultados evidenciam a pertinência da continuidade deste projecto.

Gráfico de fluência e precisão leitoras que demonstra a evolução de três alunas acompanhadas ao longo do ano lectivo

Além deste, Maria José Mackaaij, bibliotecária e colaboradora da Câmara Municipal de Loulé, desenvolve na FMVG o projecto Vemos, Ouvimos e Lemos. Multissensorial, optimiza-se em sintonia com a natureza. Que o digam @s alun@s de Querença, com idades compreendidas entre os quatro e os onze anos e que, ao longo deste ano lectivo, aprenderam um novo olhar sobre o ambiente que os rodeia. Recolheram folhas para a criação de um herbário e semearam bolotas de uma azinheira centenária. So-

O MoMo é o Golden Retriever que une os futuros leitores à vontade de ler, compreender e escrever.

As metodologias e dinâmicas de aprendizagem são trabalhadas em articulação com as professoras como garante de sucesso dos projectos em curso. PODE VER O EXCERTO DO PROGRAMA DA RTP2 AQUI


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A ti Mafamede, imperador dos Turcos, faço saber que a mim me foi notificado onde vivo no cabo do Mundo, do

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Aqui, disse ESTRABÃO, «é não só o fim da Europa mas de toda a terra

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Podem ler-se em Zurara, em Duarte Pacheco, em João de Barros, em Damião de Góis as causas ou razões que moveram o Infante D. Henrique a descobrir terras e mares pela costa ocidental da África. Importa porém não confundir estas e outras teorizações mais ou menos romanceadas, dos cronistas coetâneos ou posteriores (bem como as de outros teorizadores, porventura mais perspicazes ou fantasiosos dos nossos dias) com o que terá sido, na realidade, o determinismo psicológico e objectivo da grande empresa dos descobrimentos, em que, sem dúvida, D. Henrique figura, no dizer acertado de Cadamosto, como “o primeiro inventor”. (...) D. Henrique (...) acabara de enviar nesse ano de 1433, numa barca, a passar o cabo Bojador, o algarvio Gil Eanes, natural de Lagos, seu criado de moço pequeno, o qual, como os dos anos das tentativas anteriores, não conseguiu afinal passar das Canárias... (...) Com Marrocos ficara o Algarve em relações de toda a espécie desde a tomada de Faro (1249), defendendo-se os algarvios da pirataria tradicional por suas próprias forças... Assim, teria o Infante encontrado já criado aqui o ambiente próprio e a gente preparada, sabendo ir e voltar dos mares atlânticos, tendo pois aproveitado noutro sentido a actividade e sabedoria do mar dos algarvios... e por isso teria acabado por vir assentar arraiais no Algarve, fazendo de Lagos o grande porto de armamento.

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Foi nesta solidão varrida pelos ventos que o Infante D. Henrique, fugindo ao bulício da corte, veio meditar o seu sonho de conquistas e descobrimentos.

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Não há em toda a costa portuguesa aspecto de conjunto com tão erma e trágica beleza, nem seria fácil encontrar refúgio e cenário mais propício para um pensamento obstinado de He-

ORLANDO RIBEIRO

rói ou de Profeta. JAIME CORTESÃO

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… a linha do Equador passa aqui perto e em portulanos de Gênova e de Sagres fui sonhado: Vicente Yañez Pínzón e Cristóvão Colombo e Pedro Álvares Cabral e Bartolomeu Perestrello e o Infante Dom Henrique e Isabel, a Católica, me caçavam no mar entre hipocampos. GERARDO MELLO MOURÃO BARÃO

FRANCISCO FERNANDO LOPES

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Passam lendas e sonhos e milagres! Passa a Índia, a visão do Infante em Sagres, Em centelhas de crença e de certeza! FLORBELA ESPANCA

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O HOMEM DE PEDRA ESTÁ DIANTE DESTE INFINITO AMARGO E SÓ VÊ O SONHO QUE O DEVORA. RAUL BRANDÃO

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Promontório divino onde descansa a sombra eterna que p’r’o Mar avança - alma do Infante luminosa, à vista! NITA LUPI

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… acordam de repente os bandos de gaivotas que trazemos adormecidos na alma e somos envolvidos pelas memórias da maresia os mitos e os feitos das grandes navegações em que fomos amamentados CARLOS BRITO


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DO ALGARVE

movimento que fizestes em tomar Constantinopla, e trabalhares de guerrear a Cristandade. INFANTE D. HENRIQUE

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habitada».

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… É a via sacra que começa. RAUL BRANDÃO

Havia 20 séculos, um grego, de nome Artemidoro, por ali vagueara (...) e de cálamo em punho tomara apontamentos respeitantes a costumes dos povos bárbaros do Cyneticum iugum (promontório dos Cynetes), onde os deuses se reuniam de noite, e se faziam cerimónias misteriosas.

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Naquela praiazinha ao pé de Budens tão cheia de silêncio, de mistério, com restos do que foi um grande Império MOURA JÚNIOR

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- Pise com cuidado. Olhe que estes rochedos, desde a Ponta de Sagres, eram o lugar dos Deuses. Deuses amáveis, que erguiam libações no promontório e davam aos homens exemplos de amor à vida e à beleza.

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E depois que do Mártir Vicente O santíssimo corpo venerado Do Sacro Promontório conhecido À cidade Ulisseia foi trazido... CAMÕES

MANUEL DA FONSECA

LEITE DE VASCONCELOS

«... a serra adormece na sua longuidão e dela brotam guerrilhas imagi-

nárias, estevas e rosmano. O grito da revolta e da liberdade ainda se escuta no seu sopro. Do seu timbre nascem baluartes que protegem os irmãos de baixo, e o silêncio é ouro que não se agarra… SÉRGIO BRITO

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- Olhe aquela casa – segreda-me, de olhos atemorizados. – Está a ver? (...) - Foi ali que morreram os reis de Portugal... Páro, duvido do que oiço. - Vamos andando – pede-me, em voz baixa e assustada. – Os reis ainda lá estão, no subterrâneo. - E também estão os tesouros!... Olha-me abanando a cabecita. - Ninguém pode ali entrar, pois não? Sossego-a. - Como poderiam entrar se lá estão os reis? - Tem a certeza? - Se tenho! - E sair? - Também não. Mas como sabes tu essas coisas? - Contaram-me. E até vem no meu livro de História uma lição que conta a morte de um rei, cá em Alvor. É onde eles vinham morrer. - Nunca esquecerei a menina de Alvor. MANUEL DA FONSECA

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Lopo Barriga admirou o mar revolto que se desfazia contra a falésia alvejada pelo sol, em êxtase de espuma, como se essa fosse a sua forma de venerar aquele lugar sagrado. O local era a dianteira da Europa, rasgando o mar e, ao mesmo tempo, apontandoa como destino de Portugal. LUÍS BARRIGA

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A minha rua tem o mar ao fundo Sou Algarvio E a minha rua tem o mar ao fundo. Sempre que passa aqui algum navio Passam, aqui, navios de todo o mundo… ANTÓNIO PEREIRA


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O Algarve, bem como qualquer outra região do País, não é apenas cenário ou panorama (...) é realidade social, com seus mitos gravados no inconsciente colectivo; problemas e aflições.

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Esta vila da minha infância é afinal uma cidade estrangeira. (Estou à vontade, como sempre, perante o estranho, o que me não é nada) Sou forasteiro tourist, transeunte. E claro: é isso que sou. Até em mim, meu Deus, até em mim. ÁLVARO DE CAMPOS

DAVID MOURÃO-FERREIRA

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Adeus, ó terra de Olhão, Cercada de morraçais És a mãe dos forasteiros, Madrasta dos naturais. POPULAR

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RENATO BOAVENTURA

URBANO TAVARES RODRIGUES

MM

Na costa algarvia o turista pode, em pleno Inverno, matar a sua «fome de sol».

Quem desce até às praias do Algarve são ainda os peregrinos do Norte, gauleses da alta burguesia e ingleses frescos e circunspectos que o BelaVista acolhe aristocrática e provincialmente, nos seus terraços acariciados pela brisa, na serenidade feltrada de uns salões que o azulejo personaliza.


POSTAIS

DO ALGARVE

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Que bom sair! Ser estrangeiro! Ser sangue permanentemente novo! Especialmente aqui onde todos são estrangeiros... E tudo é mistério TIAGO NENÉ

O barco sulcava as águas espumosas, empurrado pela breve brisa do poente. Quando o breu rodeou a velha carcaça do saveiro… VÍTOR GIL CARDEIRA

« O turisme que deu de quemér agente, deu cabe do mê Algarve. SÉRGIO BRITO

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A mudança, cá em Quarteira, e em todo o Algarve, rompeu em grande quando, há poucos anos, vieram os estrangeiros. Agora, já não são banhistas ou veraneantes, chamam-lhes turistas. Eu até creio que foi esta palavra que deu origem a tudo, sei lá! MANUEL DA FONSECA

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Eh Algarvios duma figa, Que ninguém vos leva a palma!!! JOÃO BRAZ (a Julião Quintinha)


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BIBLIOGRAFIA

POSTAIS

DO ALGARVE

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28 DE JULHO DE 2020

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E a cortina cai sobre a paisagem algarvia. MANUEL DA FONSECA

FICHA TÉCNICA EDIÇÃO | FMVG TEXTOS | Guilherme d’Oliveira Martins, José Maria Guerreiro, Marco Ferreira, Marinela Malveiro RECOLHA E SELECÇÃO de Postais do Algarve | Marinela Malveiro APOIO À PRODUÇÃO | Miriam Soares PAGINAÇÃO E DESIGN | Marinela Malveiro ILUSTRAÇÃO | Bernardo Marques FOTOGRAFIA | acervo FMVG, cedência dos autores/artigos de opinião, Filipe da Palma, Jorge Gomes, Marinela Malveiro, Telma Veríssimo, Vítor Pina SECRETARIADO | Fátima Marques IMPRESSÃO | Gráfica Comercial Arnaldo Matos Pereira, Lda., Zona Industrial de Loulé Lt. 18, Loulé | T. 289 420 200 www.fundacao-mvg.pt


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