Dois pinheiros e o mar e outras crônicas sobre meio ambiente

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NOTA Um dos traços mais conhecidos da personalidade de Rubem Braga é sua sincera paixão pela natureza. Uma paixão alimentada desde a infância, em Cachoeiro de Itapemirim, durante a qual tomava banho de rio, andava solto pelas matas e fazendas, convivendo alegremente com árvores e bichos de toda sorte. Já estabelecido na cidade do Rio de Janeiro, Rubem Braga aninhou-se na cobertura de um prédio situado no coração de Ipanema, onde criou seu célebre jardim, cultivando flores e frutas e criando passarinhos. Tamanha familiaridade e carinho de Rubem pelo mundo natural também se fizeram presentes em seus textos. Publicadas inicialmente em jornais e revistas, as crônicas que integram este volume revelam um escritor profundamente enternecido pelas coisas da natureza. Nelas, vê-se claramente o encanto do autor pela

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maravilhosa harmonia da vida dos animais, pela beleza do reino vegetal. É impossível não se deliciar com seu jeito saboroso de contar os mistérios envolventes das paisagens de terra, mar e ar. Nota-se também nestas crônicas a postura de constante preocupação do escritor diante dos efeitos negativos no meio ambiente que a inconsequente ação dos homens pode provocar. Neste livro, os jovens leitores são levados a se aventurar pelas trilhas do mundo natural. Um convite difícil de se recusar quando feito pelo mestre da crônica brasileira. Boa leitura!

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SUMÁRIO O jardim proibido .... 11 O papagaio .... 15 O Rio .... 19 O morro .... 23 Mare nostrum .... 27 Parque .... 33 Fazenda .... 37 Chuva .... 41 Praia .... 45 O paredão .... 49 Pitangueiras .... 53 O ocapi .... 57 Sob os cajueiros .... 61 Coisas do Brasil .... 65 Os homens práticos .... 69 A árvore .... 73 Ainda os esgotos .... 77 Não matem o jacu-verde! .... 81 Dois pinheiros e o mar .... 87 A lagoa e a Marinha .... 91 O aquário .... 95 Sobre o autor .... 99 Sobre o ilustrador .... 101 Sobre o selecionador.... 102 Referências das crônicas.... 103

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O JARDIM PROIBIDO Andei outro dia pelas minhas velhas ruas do Catete, onde tanto morei outrora. Lembrei coisas suaves e também aflições; peguei um lotação no Flamengo e vim para casa com a alma carregada dessas coisas, umas nobres, outras pitorescas, muitas tristes. Arquivem-se. O que eu queria dizer aqui é que repeti para mim mesmo uma pergunta que me ocorreu há muitos anos: Para que diabo quer o presidente da República um jardim tão grande para o seu Palácio? Já morei numa pensão cuja dona – sutil megera – anunciara pomposamente no Jornal do Brasil uma “confortável sala de frente com vista para os jardins do Palácio”. Usufruí os encantos presidenciais nessa vista durante coisa de mês e meio. Mas o jardim era meio triste porque estava sempre vazio. O doutor Getúlio Vargas não dava o ar de sua conhecida graça. Tampouco creio que o faça jamais o

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general Dutra. Ora, Catete e Flamengo são bairros de vida apertada. Não apenas no sentido financeiro da palavra, mas também no físico. Ali, entre o morro e a praia exígua, uma grande população se condensa em apartamentos, pensões e cortiços. O trânsito é ruim, as ruas são estreitas e barulhentas. Por que não dar uma parte do grande jardim para as crianças do bairro? Não proponho uma praça ajardinada com estátua no meio, mas um lugar aberto onde a garotada pudesse brincar debaixo das grandes e belas árvores. Um playground de verdade, para a molecada local. Assim como está, o jardim do Palácio me parece um luxo um tanto afrontoso em uma cidade tão estrangulada. O Catete podia guardar a metade, para manter sua precária dignidade palaciana. Mas acho de um mau gosto tremendo manter fechado e vazio o parque longo como um latifúndio. Haverá motivos que impeçam isso ou é apenas comodismo a duração daquele enorme jardim proibido? Seria muito gentil se a União entregasse metade de seu quintal número 1 à Prefeitura para a alegria da criançada. Seria um gesto cordial da Presidência, um gesto de boa vizinhança. A doação deveria ser feita em segredo, de maneira a que nada transpirasse no Senado e não chegasse aos ouvidos do senador Mário de Andrade Ramos – que certamente teria a ideia brilhante de aproveitar aquilo para a construção de um enorme bloco 12 Rubem Braga

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de edifícios “para renda”. E com uma cláusula que proibisse o general prefeito de cortar as árvores para desafogar o tráfego dos velocípedes e patinetes... 7 de maio de 1948

14 Rubem Braga

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