Caderno ABEA 26 - Habitação e Mobilidade e seu Ensino

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XXI ENSEA - Encontro Nacional Sobre Ensino de Arquitetura e Urbanismo

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XXVII COSU - Conselho Superior da ABEA

ISSN 2177-3734


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ABEA - CADERNO 26 Realização:

XXI ENSEA Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo

Apoio:

Encontro Nacional sobre Ensino de Arquitetura e Urbanismo XXVII COSU

MÚTUA

CAIXA DE ASSISTÊNCIA

Conselho Superior da ABEA

DOS P ROFI S S I ON A I S DO CR EA

Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de São Paulo

HABITAÇÃO E MOBILIDADE E SEU ENSINO

UNICENTRO BELAS ARTES DE SÃO PAULO

São Paulo/SP 2004

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DIRETORIA ABEA BIÊNIO 2000/2001 DIRETORIA EXECUTIVA Presidente Vice-Presidente Secretário Sub-Secretário Secretário de Finanças Sub-Secretário de Finanças

José Roberto Geraldine Júnior - Unifran/SP Gogliardo Vieira Maragno – UFMS/MS Fernando J. De Medeiros Costa - UFRN/RN Wilson Ribeiro Dos Santos Junior Puc-Campinas/SP Cláudio Listher Marques Bahia – Puc-Minas/MG Angela Canabrava Buchman - UEL/PR

XXI ENSEA Encontro Nacional sobre Ensino de Arquitetura e Urbanismo XXVII COSU

DIRETORIA

Conselho Superior da ABEA

Ana Elisea Costa Carlos Eduardo Nunes Ferreira Euler Sobreira Muniz Gilson Jacob Bercoc José Akel Fares Filho – Unama/PA José Antônio Lanchoti - Moura Lacerda/SP Lino Fernando Bragança Peres - UFSC/SC Maria De Lourdes Costa – USU/RJ Nireu De Oliveira Cavalcanti Ubirajara Perci Borne

Habitação e Mobilidade e seu Ensino

CONSELHO FISCAL Titulares

COMISSÃO ORGANIZADORA ABEA

Ester J.B. Gutierrez - UFPEL/RS Isabel Cristina Eiras de Oliveira - UFF/RJ Itamar Costa Kalil - UFBA/BA

Suplentes Débora Pinheiro Frazatto Verde dos Santos – PUC-CAMPINAS/SP Paulo Romano Reischilian - UNITAU/SP Júlio de Lamonica Freire - UNIC/MT

Organização editorial: Aloisio Joaquim Rodrigues Jr

Capa: Aloisio Joaquim Rodrigues Jr

Jose Roberto Geraldine Junior - Presidente ABEA Gogliardo Vieira Maragno - Vice-Presidente ABEA Débora Frazzato Verde dos Santos - Diretora ABEA Fernando José de Medeiros Costa - Diretor ABEA Claudia Maria de Carvalho - Secretária ABEA

COMISSÃO ORGANIZADORA UCS Sergio Augusto Malacrida Turgnev R. de Oliveira

Impressão e Acabamento: ABEA - Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo Rua Fernando Ferrari, 75 - Botafogo - RJ -CEP 22231-040 Tel.:0xx21 25535446 e-mail:abea.arq.urb@uol.com.br www.abea-arq.org.br

ISSN:

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26 a 28 de agosto de 2004 Centro Universitário Belas Artes de São Paulo São Paulo - SP

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APRESENTAÇÃO Com a criação do Ministério das Cidades e suas quatros Secretarias Nacionais, quais sejam, Habitação, Saneamento, Programas Urbanos e Trãnsito e Mobilidade Urbana, a demanda de profissionais arquitetos e urbanistas começou a se deparar com a ausência de determinados conhecimentos específicos deste profissional cuja lacuna na formação começou a ser trabalhado dentro da ABEA.

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SUMÁRIO PROGRAMAÇÃO___________________________________8 ATA CONJUNTA

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Dois destes temas - Habitação e Mobilidade - nortearam as discussões do XXI Encontro Nacional Sobre Ensino de Arquitetura e Urbanismo ENSEA - que aconteceu no Centro Universitário Belas Artes de São Paulo entre os dias 26 e 28 de agosto de 2004.

O CONFORTO DO AMBIENTE CONSTRUÍDO E SUA ACESSIBILIBILIDADE

O XXI ENSEA, com o título HABITAÇÃO E MOBILIDADE E SEU ENSINO abriu a discussão sobre formas de abordagem das temáticas Habitação e Mobilidade nos cursos de arquitetura e urbanismo. O ensino destes conhecimentos específicos faz parte da grande gama de informações que os alunos recebem durante os cinco anos de sua formação , já previstos de forma direta (ou indireta) na Portaria Ministerial MEC n°. 1.770/94.

O ENSINO DE PROJETO ARQUITETÔNICO: HABITAÇÃO VERTICAL

A abertura deste evento contou com a presença do Arquiteto e Urbanista AUGUSTO VALIENGO VALERI, Gerente do Programa de Mobilidade Urbano da Secretaria Nacional de Transporte e Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades, apresentando o Programa Brasil Acessível do Ministério das Cidades, o qual a ABEA participou efetivamente com o diretor José Antonio Lanchoti em sua configuração. O presente Caderno ABEA n°. 26 apresenta alguns trabalhos com a temática do evento, possibilitando uma reflexão sobre as questões defendidas o qual, não necessariamente refletem o pensamento da ABEA. Vale destacar que os eventos organizados pela ABEA sempre possibilitam a apresentação e defesa de temas e posturas individuais dos docentes que dele participam, de forma democrática, sem nenhuma forma de censura ou restrição, cabendo ao(s) autor(es) toda a responsabilidade pelo tex1o enviado e publicado.

Patrícia Alonso, Sheila Freire e Amélia Panet

Andréa Câmara, Paulo Andrade, IsabellaTrindade e Márcio Erlich

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POTENCIAL DO DESENHO URBANO NA REQUALIFICAÇÃO DO ESPAÇO TERCIÁRIO NAS VIAS ARTERIAIS DEGRADADAS EM SANTO ANDRÉ Ismael Andrade Pescarini

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MORADIAS ASSISTIDAS: O FUTURO DA CRESCENTE POPULAÇÃO Maria Bestetti

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CAPACITAÇÃO PROFISSIONAL: O PARADIGMA DO AMBIENTE Marta ROMEROe Daniela Diniz

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George Da Guia.

A DIRETORIA

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PROGRAMAÇÃO DIA 26 (QUINTA-FEIRA) 14:00 HS REUNIÃO DIRETORIA ABEA 20:00 HS ABERTURA 21:30 HS COQUETEL DIA 27 (SEXTA FEIRA) 08:30 HS CREDENCIAMENTO 09:00 HS ABERTURA 09:30 HS PALESTRA – MINISTÉRIO DAS CIDADES – Secretaria Nacional de Habitação / Secretaria Nacional de Transporte e Mobilidade Urbana 10:30 HS PALESTRA - PAPEL DAS ENTIDADES ACADÊMICAS E DE PESQUISA NA POLITICA URBANA: ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO 11:30 HS DEBATES 12:30 HS ALMOCO 14:00 HS O CONSELHO NACIONAL DAS CIDADES – DESENVOLVIMENTO DOS TRABALHOS Expositores: ABEA, ABES, ANTP, IAB, ANPPUR, ANTAC, ANPET e AGB 17:00 HS DEBATES 18:00 HS ENCERRAMENTO DOS TRABALHOS DO DIA DIA 28 (SÁBADO) 08:30 HS PAINÉIS – ENTIDADES ACADÊMICAS E DE PESQUISA – HABITAÇÃO E MOBILIDADE PAINÉIS – ESCOLAS, FACULDADES E CURSOS DE ARQUITETURA E URBANISMO EXPERIÊNCIAS DESENVOLVIDAS NO ÂMBITO DAS IES REFERENTE A HABITAÇÃO E MOBILIDADE – EXPERIÊNCIAS DE EXTENSÃO E PROGRAMA DAS DISCIPLINAS ENCAMINHAMENTOS

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12:30 HS 14:00 HS DA ABEA

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ENCERRAMENTO DO XXI ENSEA ALMOCO XXVII REUNIÃO DO CONSELHO SUPERIOR PALESTRA: Prof. Adalberto Grassi Carvalho – Comissão Nacional de Avaliação – MEC : “Panorama atual da Avaliação no Ensino Superior” PAUTA: · REFORMA UNIVERSITÁRIA · SISTEMA NACIONAL DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR (SINAES) · EXAME NACIONAL DE DESEMPENHO DOS ESTUDANTES – ENADE · AVALIAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE ENSINO · ATUALIZAÇÃO DAS CONFIGURAÇÕES ESSENCIAIS DOS LABORATÓRIOS · CONSELHO FEDERAL DE ARQUITETURA E URBANISMO · CURSOS DE PAISAGISMO / URBANISMO · RESOLUÇÃO 218/73 (CONFEA) DIA 29 (DOMINGO)

(10 HS)

REUNIÃO DIRETORIA ABEA

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Ata conjunta do XXVII Conselho Superior da ABEA (COSU) e XXI Encontro Nacional sobre Ensino de Arquitetura e Urbanismo (ENSEA) Às 21:00 horas do dia 26 de agosto de 2004, no auditório do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, foi iniciada a seção solene de abertura do XXVII Conselho Superior da ABEA (COSU) e XXI Encontro Nacional sobre Ensino de Arquitetura e Urbanismo (ENSEA) conduzida pelo presidente da ABEA Prof. José Roberto Geraldine Jr, com a presença das seguintes autoridades: Dr. Paulo Antonio Gomes Cardim, Reitor do UNICENTRO Belas Artes; Engenheiro Sérgio Augusto Malacrida, PróReitor Acadêmico do UNICENTRO Belas Artes; Arquiteto e Urbanista Turgnev Roberto de Oliveira, Coordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo do UNICENTRO Belas Artes; Arquiteto e Urbanista Valter Caldana, representando o Presidente do CREA/SP; Arquiteto e Urbanista Demetri Anastassakis, Presidente do IAB/DN; Arquiteto e Urbanista José Eduardo Tibiriçá, Representando o Presidente da ASBEA; Arquiteto e Urbanista Eduardo Bimbi, Presidente da FNA; Arquiteto e Urbanista Nabil Bonduki, Vereador do Município de São Paulo; Arquiteto e Urbanista Augusto Valeri, da Secretaria Nacional de Trânsito, Transporte e Mobilidade Urbana, representando o Ministério das Cidades e do Acadêmico Maurílio Chiaretti, Presidente da FENEA. Após a palavra de todos os membros da mesa, o Magnífico Reitor Prof Paulo Antônio Gomes Cardim deu as boas vindas aos participantes, declarou abertos os eventos, após o que foi servido um coquetel aos presentes.

Presentes os representantes das seguintes Instituições: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21

Centro Universitário 9 de Julho, Campus Vila Maria, São Paulo, SP; UNINOVE Centro Universitário Barão de Mauá, Ribeirão Preto, SP; BARÃO DE MAUA Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, São Paulo/SP UNICENTRO Centro Universitário FEEVALE, Novo Hamburgo/RS FEEVALE Centro Universitário Filadélfia, Londrina/PR UNIFIL Centro Universitário FUMEC, Belo Horizonte/MG FUMEC Centro Universitário Luterano de Manaus, Manaus/AM CULM Centro Universitário Moura Lacerda, Ribeirão Preto/SP MOURA LACERDA Centro Universitário Positivo, Curitiba/PR UNICENP Centro Universitário UNIFIAM-FAAM São Paulo/SP UNI FIAM-FAAM Centro Universitário UNIVATES, Lajeado/RS UNIVATES Conselho Federal de Engenharia Arquitetura e Agronomia CONFEA Conselho Regional de Engenharia Arquitetura e Agronomia - RS CREA/RS Faculdade de Arq. e Urb. da Universidade de São Paulo/SP FAU/USP Faculdade de Arquitetura Ritter dos Reis, Porto Alegra/RS RITTER DOS REIS Faculdade de Ciências Humanas de Aracruz, Aracruz/ES FACHA Faculdades Dom Pedro II, São José do Rio Preto/SP DOM PEDRO II Federção Nacional dos Estudantes de Arquitetura e Urbanismo FENEA Instituto de C. J. e Soc. Prof. Camillo Filho / ICF - Teresina/PI ICF Ministério da Educação MEC Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campinas/SP PUC-Campinas

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Pontifícia Universidade Católica de MG, Belo Horizonte/MG Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, PR; Pontifícia Universidade Católica do RJ, Rio de Janeiro/RJ Secretaria Nacional de Trânsito, Transporte e Mobilidade Urbana Universidade Bandeirantes, São Paulo/SP Universidade Católica de Pernambuco, Recife/PE Universidade de Brasília, Brasília/DF Universidade de Campinas, Campinas/SP Universidade de Caxias do Sul/RS Universidade Estácio de Sá, Rio de Janeiro/RJ Universidade Estadual de Goiás, Goiânia/GO Universidade Estadual de Londrina, Londrina, PR; Universidade Federal da Bahia, Salvador/BA Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte/MG Universidade Federal de Pelotas, Pelotas/RS Universidade Federal de Pernambuco, Recife/PE Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia/MG Universidade Federal de Viçosa, Viçosa/MG Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, Campo Grande, MS; Universidade Federal do Mato Grosso, Cuiabá/MT Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro/RJ Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN; Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre/RS Universidade Federal Fluminense, Niterói/RJ Universidade Federal Rural do Rio Janeiro, Seropédica/RJ Universidade Des. do E. e da Reg. do Pant., Campo Grande/MS Universidade Regional de Blumenau, Blumenau/SC Universidade Santa Cecília, Santos/SP Universidade São Francisco, Itatiba/SP Universidade Vale do Rio dos Sinos, Canoas/RS Universidade Vale do Rio dos Sinos, Canoas/RS Escola da Cidade

PUC-Minas PUC-PR PUC-RJ SEMOB UNIBAN UNICAP UnB UNICAMP UCS UESA UEG UEL UFBA UFMG UFPEL UFPE UFU UFV UFMS UFMT UFRJ UFRN UFRGS UFF UFRRJ UNIDERP FURB UNISANTA USF UNISINOS UNISINOS Escola da Cidade

XX ENSEA O XXI ENSEA foi realizado em seções de mesas redondas, palestra e apresentações de trabalhos. O evento contou com a mesa redonda que tratou do tema Habitação e Mobilidade e o seu Ensino e foi composta pelo Arquiteto e Urbanista Augusto Valeri, da Secretaria Nacional de Trânsito, Transporte e Mobilidade Urbana, pelo Arquiteto e Urbanista Demetri Anastassakis, da Direção Nacional do IAB, e pelo Arquiteto e Urbanista Nabil Bonduki, Vereador do Município de São Paulo. Uma das palestras foi proferida pelo Arquiteto e Urbanista Nazareno Afonso, membro titular da Conferência das Cidades representando as entidades de transportes, que falou sobre o tema da mobilidade urbana e seus efeitos. A outra palestra foi proferida pelo senhor Adalberto Carvalho do MEC, membro da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior que falou sobre o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior SINAES. Dos trabalhos encaminhados para o evento, foram apresentados nas seções do dia 27 à tarde e na manhã do dia 28 de agosto os seguintes trabalhos: 1) Moradias Assistidas: o futuro da crescente população idosa

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brasileira – Professora Maria Luíza Trindade (UNIDERP/MS); 2) O Ensino de Projeto Arquitetônico – Habitação Verticalizada – Professora Andréa Câmara (UNICAPE); 3) Habitação: Ensino a partir de referências teóricas – Professora Isabella Trindade (UNICAPE); 4) Corredores ou Boulevares? Potencial do desenho urbano na requalificação do espaço terciário nas vias arteriais degradadas em Santo André – Professor Ismael Andrade Pescarini (ININOVE). A partir das exposições e calcado no exíguo prazo ocorrido entre divulgação do evento e envio dos trabalhos, a mesa e os participantes destacaram: a importância das temáticas; que as mesmas não tiveram suas discussões esgotadas; que é importante reforçar as interfaces do tema com as práticas de ensino, pesquisa e extensão em arquitetura e urbanismo como forma de reforço do projeto político pedagógico dos cursos; que conceitos como acessibilidade e mobilidade urbana devido a seu caráter multidisciplinar não se esgotam no interior de disciplinas devendo haver a busca de integrações horizontais; a necessidade de valorização do projeto pedagógico e do papel do coordenador do curso; a reafirmação da necessidade de avaliações contínuas, coletivas e públicas, como forma de retro-alimentar as práticas didáticas e o projeto pedagógico. XXVII COSU Na tarde do dia 28, o presidente da ABEA deu início aos trabalhos do XXVII COSU com os informes a respeito da mudança da sede da ABEA para Brasília, a respeito do registro do novo estatuto da ABEA aprovado no XII CONABEA em Caxias do Sul, e a respeito do convênio INTERLEGIS de Educação à distância envolvendo a ABEA, FNA, FISENG, CONFEA E Senado Federal. Pauta proposta e aprovada:

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UFMG, informou que os professores do seu curso que participam do curso de paisagismo, não o fazem representando a UFMG e sim como profissionais autônomos. O professor Francisco Segnini Junior relata um trabalho desenvolvido junto ao Ministério do Trabalho para a elaboração do Catálogo Brasileiro de Ocupações – CBO, para a descrição das atividades profissionais, onde a arquitetura e urbanismo aparece como profissão generalista e som a descrição detalhada das atividades relativas à nossa formação, informando ainda que durante o desenvolvimento desse trabalho, o Ministério recebeu ações no sentido da inclusão do urbanismo separado da arquitetura. Após as discussões ficou aprovado: 1) Reafirmação da unicidade da Profissão de Arquitetura e Urbanismo juntamente com as Entidades Nacionais já reunidas no fórum de criação do conselho próprio; 2) Ações junto ao ministério do Trabalho reafirmando a descrição da profissão de arquitetura e urbanismo constante do CBO – Catálogo Brasileiro de Ocupações, e se posicionando contrariamente a separação de qualquer atividade já definida para a profissão no CBO; 3) Ofício a o CRA/BA assinado pelas Entidades Nacionais, solicitando informações sobre a emissão de Carteiras de Urbanista por aquele Conselho Regional; 4) Localizar em Minas Gerais, a fonte da iniciativa de criação do Conselho de Paisagismo; 5) Ações junto ao MEC sobre a extrapolação de cursos de tecnólogos no que se refere à atribuição de “intervenção em ambientes internos e externos”; 6) Informar o CREA/MG a elaboração de Planos Diretores sob a responsabilidade de Geógrafos da UFMG; 7) Manter contato com o curso de Arquitetura Urbana e Rural no sentido de esclarecer sobre a inadequação do nome e do título a ser conferido ao formando. 2 – Diretrizes Curriculares

O presidente introduziu o assunto comentando os documentos distribuídos entre os participantes do evento a respeito do Curso de Urbanismo da Universidade Estadual de Salvador, Curso de paisagismo e a criação da profissão de Design. Aberta as discussões o professor Cesar Gualtieri, coordenador do curso de arquitetura e urbanismo da

O presidente abiu a palavra ao professor Itamar Kalil que fez um breve relato sobre o histórico do assunto desde a publicação da Portaria MEC1770/94 até a última reunião com o relator da nossa proposta de diretrizes curriculares no CNE, o professor Roberto Cláudio, que ocorreu na semana anterior a este COSU. Pelo relato, apesar dos avanços alcançados em relação ao posicionamento inicial do relator, quanto ao Trabalho Final de Graduação o mesmo continua contrário à realização do mesmo após a integralização das demais disciplinas do curso e também contrário à participação externa na banca de avaliação. Após as discussões ficou aprovado o seguinte: Encaminhar documento ao relator do processo de diretrizes curriculares Professor Roberto Cláudio contendo: 1) um histórico da construção coletiva da área tanto na a atual Portaria MEC1770 quanto na proposta de diretrizes encaminhada ao CNE 2) reafirmação dos pontos da proposta considerados essenciais como a

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1. Unicidade da Profissão; 2. Diretrizes Curriculares; 3. Alteração da resolução 218 do CONFEA; 4. Criação do Conselho Federal de Arquitetura e Urbanismo; 5. Próximo encontro da ABEA. 1 – Unicidade da Profissão


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participação externa na banca examinadora, e a realização do TFG após a integralização das demais atividades baseado no princípio da atividade como síntese da formação. 3 – Alteração da Resolução 218 do CONFEA O ponto de pauta foi introduzido com o esclarecimento do presidente a respeito dos documentos distribuídos entre os participantes e com a informação de que até o presente momento a ABEA não emitiu nenhuma manifestação oficial a respeito do projeto de alteração da resolução 218 do CONFEA ora em tramitação naquele conselho e que para tanto reuniu diversos documentos e os remete à discussão na plenária do COSU para posicionamento oficial da entidade. É feita a leitura da relação de documentos vigentes sobre as atribuições profissionais, e uma série de documentos decorrentes da tramitação da minuta de reformulação emitidos por áreas e segmentos profissionais envolvidos. O professor Itamar Kalil, representante da área de ensino da arquitetura e urbanismo no CONFEA, pede apalavra e passa a relatar e apresentar aos presentes os principais pontos de reformulação da proposta. O presidente informa à plenária que está programado para data próxima a confirmar um fórum de discussão na área da arquitetura e urbanismo com a participação de representantes das entidades Nacionais no CONFEA em Brasília, para deliberar sobre o ponto de pauta. Aberto o debate, foram aprovadas as seguintes deliberações: 1) Não aprovação da proposta neste momento; 2) Posicionamento de suspensão da tramitação do processo de alteração da resolução 218; 3) Montagem de um calendário para a área discutir o assunto através de um fórum discussão nacional; 4) Construção de uma unidade de posição com as demais entidades da área; 5) Pautar como marco de discussão a defesa da sociedade e não a defesa de mercado. 4 – Criação do Conselho Federal de Arquitetura e Urbanismo

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atribuições, o novo conselho deverá ter como objetivo fundamental a defesa da sociedade, e a realização de uma consulta ampla e irrestrita aos profissionais a respeito da criação do novo Conselho; 3)Ação junto à Comissão de Assuntos Sociais do Senado onde o projeto de Lei encontra-se em tramitação levando a posição da ABEA. 5 – Próximo encontro da ABEA O presidente informa aos presentes que está aberto o processo eleitoral para renovação da representação da área de ensino da arquitetura e urbanismo no CONFEA e que a referida eleição deverá ser realizada no próximo encontro. Informa ainda haver a candidatura, já registrada em eventos anteriores, formulada pela Universidade de Salvador – UNIFACS, para sediar um evento da ABEA. O período deverá coincidir com a data da eleição já marcada pelo CONFEA. O tema sugerido foi............ A proposta foi aprovada pelo plenário. Na continuidade e tendo cumprido a pauta estabelecida, o presidente professor José Roberto Geraldine Jr agradeceu em seu nome e em nome de toda a diretoria da ABEA a presença de todos assim como agradeceu o apoio indispensável e fundamental do Centro Universitário Belas Artes na pessoa de seu Coordenador Professor Turgnev Roberto e do PróReitor Acadêmico Professor Sérgio Malacrida. Nada mais tendo a tratar, o presidente deu por encerrado o XXVII COSU, do qual lavro a presente ata. São Paulo, 28 de agosto de 2004

Fernando José de Medeiros Costa Secretário da ABEA

O Presidente inicia o ponto de pauta relatando o processo de construção do projeto de lei ora em tramitação no Senado Federal e das ultimas ações nos fóruns de discussões nos quais a ABEA tem participado. Informa ainda que está programada uma reunião entre das entidades nacionais em data próxima para deliberação sobre o assunto. Abertas as discussões, ficou aprovado: 1) Reafirmamos que somos favoráveis à criação de um Conselho Próprio; 2) Continuamos defendendo aqueles princípios definidos desde o início das negociações e acordados com as demais entidades Nacionais, ou seja, Formação única em Arquitetura e Urbanismo, o diploma como exigência única para a concessão de

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O CONFORTO DO AMBIENTE CONSTRUÍDO E SUA ACESSIBILIDADE - UMA EXPERIÊNCIA NO CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO DO UNIPÊ Patrícia Alonso Profa. Mestre Coordenadora adjunta do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ) – e-mail: patalonso@ig.com.br Sheila Freire Profa. Especialista do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ) – e-mail: sheilaafreire@bol.com.br Amélia Panet Profa. Mestre Coordenadora do Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ) – e-mail: map2001@terra.com.br Curso de Arquitetura e Urbanismo - Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ – BR 230 Km 22 – Água Fria – Cep 58053-000-Cx Postal 318 – João Pessoa – PB. Fax (+55) 0 (XX) 83 2311130 Tel. (+55) 0 (XX) 83 2106 9278

Resumo A experiência de ensino que relatamos nesse artigo faz parte do desafio necessário de conscientizar e capacitar toda uma nova geração de profissionais, educando-os e contribuindo no desenvolvimento das ferramentas e valores para a transformação, e para a solução de problemas, que tanto afligem a nossa população, no que cabe a profissão de arquiteto e urbanista. Procura conscientizar os alunos com relação à responsabilidade social que o arquiteto possui no desenvolvimento da cidade, e tem o objetivo de mostrar-lhes a importância de se projetarem espaços que atendam às condições de acessibilidade. Através da experiência vivenciada pelos alunos, a acessibilidade passa de variável abstrata do projeto arquitetônico para a condição de realidade a ser tratada no processo projetual. Palavras Chaves Acessibilidade, Mobilidade, Experiência Pedagógica, Universal Design 16

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Considerações Teóricas O ensino da arquitetura hoje passa por uma série de reflexões sobre as atribuições e os desafios do profissional arquiteto e urbanista, frente às transformações da nossa sociedade desigualmente moderna, na tentativa de contribuir para a formação de um profissional pleno de valores e posturas, além dos tão necessários conhecimentos e habilidades. Essa consciência social e ética deve estar presente como princípio norteador de qualquer projeto pedagógico na formação de profissionais que possuam um compromisso com questões pertinentes à produção projetual das nossas cidades, com a justiça social, e sensíveis às diferenças e dificuldades humanas. Para nós, já se passou o tempo em que arquitetos acreditavam na capacidade de melhorar o mundo com suas belas formas, produções de obras de arte. A arquitetura não deve ser superior às necessidades humanas. É um desafio necessário conscientizar e capacitar toda uma nova geração de profissionais arquitetos e urbanistas, educando-os e contribuindo no desenvolvimento das ferramentas e valores para a transformação, e para a solução de problemas, que tanto afligem a nossa população, como a falta de moradias, de escolas, de postos de saúde, de destinos adequados para os dejetos, de presidiárias, de espaços públicos de lazer e cultura, enfim, de cidades que proporcionem uma maior qualidade de vida à população residente, tornando possível sua sustentabilidade e o futuro das gerações vindouras, como nos é de direito pelo ´Estatuto da Cidade‘ e, sobretudo, respeitando o direito de ir e vir de todo cidadão com relação à acessibilidade externa e interna a todas as edificações e diante de todas as diferenças e situações humanas. Esse desafio torna-se ainda maior com relação ao ensino da arquitetura devido à característica multidisciplinar da profissão de arquiteto, que incorpora atributos e conhecimentos de outros campos cognitivos, na intenção de conseguir sua expressão máxima. Dentre esses atributos e conhecimentos,

estão presentes as questões sócio-culturais imprescindíveis ao exercício responsável da profissão. A experiência de ensino que relatamos nesse artigo faz parte desse desafio e procura conscientizar os alunos com relação à responsabilidade social que o arquiteto possui no desenvolvimento da cidade, e tem o objetivo de mostrar-lhes a importância de se projetarem espaços que atendam às condições de acessibilidade. Entenda-se, aqui, por acessibilidade a “possibilidade e condição de alcance para utilização com segurança e autonomia de edificações, espaços, mobiliários e equipamentos urbanos” (NBR 9050). Entretanto, existe uma parcela considerável da população que, por algum tipo de restrição, possui sua mobilidade reduzida e, por conseguinte, sua acessibilidade limitada. Encontram-se nesse grupo os idosos, obesos, mulheres grávidas e os portadores de deficiência transitória ou permanente. O fato estimulador dessa experiência se deu com os resultados do último censo do IBGE, em 2000, onde foram incluídas pela primeira vez informações sobre esse último grupo. A porcentagem da população com essas características, no país, foi de 14,45%, ou seja, 24,52 milhões de habitantes são portadores de algum tipo de deficiência (física, auditiva, visual ou mental). Se incluíssemos, nessa estatística, os idosos, os obesos, as gestantes, esse número se elevaria para mais de 39,28 milhões de pessoas, ou seja, mais de 23,13% da população. O fato que mais nos inquietou foi saber que o Estado com o maior índice de ocorrência, de acordo com esse censo, é a Paraíba, com 18,74%, sendo que na capital, João Pessoa, dos 600 mil habitantes, 14,85% são portadores de deficiência, o que corresponde a 88.789 mil habitantes. Esses números causaram uma certa surpresa pela sua grandeza e diversidade, mas principalmente, por nos questionar sob o fato de: onde estão essas pessoas, porque elas não são vistas? Isso abre um parêntese para algumas considerações sobre a cidade de João Pessoa e seus moradores, necessário para a compreensão do contexto em que se insere a proposta pedagógica.

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Sobre a cidade de João Pessoa João Pessoa é uma cidade que, apesar do seu franco crescimento, ainda guarda, em alguns dos seus recantos, aspectos das pequenas cidades. Estes, nós vemos como uma qualidade diante do caos urbano em que estão mergulhadas algumas das cidades brasileiras. No entanto, sabemos que apesar de suas virtudes, João Pessoa sofre com o descaso acumulado de várias gestões, que fecham os olhos para os problemas mais simples, aqueles mais evidentes como: saneamento básico, transporte público, habitação digna para todos e espaços públicos adequados para o convívio. A cidade enfrenta um processo visível de privatização de seus espaços públicos, seja com a colocação de bancas de jornal e barracas das mais diversas atividades em passeios públicos, seja com a invasão de praças e das nossas tão esburacadas calçadas pelos automóveis e placas luminosas cada vez maiores. Esse descaso é, também, fruto da tolerância dos seus moradores, que não possuem uma consciência arquitetônica que, necessariamente, não precisa ser adquirida numa escola de arquitetura, mas apenas implica no discernimento para exigir os seus direitos, escolher e selecionar o que serve e o que não serve para a sua vida e para a sua cidade e, sem dúvida, na responsabilidade com os deveres do cidadão. Há práticas em outros países que visam educar para a “vida urbana” e é esse, mais um dos princípios que norteiam o curso de arquitetura dessa experiência. Essas práticas são decorrentes de uma visão da arquitetura e do urbanismo como conhecimentos de utilidade pública. Essa visão traduz a grandiosidade do campo de atuação do profissional arquiteto e a nossa responsabilidade enquanto educadores e formadores de opinião. Entretanto, enquanto profissionais dessa área, sabemos que o desenvolvimento de uma cidade não é tarefa apenas de uma categoria de profissionais, mas de um conjunto de decisões democráticas, onde o arquiteto e urbanista deve contribuir diretamente, não se omitindo frente aos problemas urba20

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nos, entre eles a tarefa de tornar a cidade acessível. É importante, pois, conscientizar o futuro arquiteto da sua responsabilidade frente ao desenvolvimento de sua cidade, para que ele não olhe apenas para o seu pequeno universo, fazendo projetinhos e fachadinhas para deixar a sua marca, ignorando o fato de que está fazendo um pedaço da cidade, e que, qualquer intervenção por menor que seja, interfere na paisagem e no comportamento dos seus habitantes. O fato de não encontrarmos, na cidade de João Pessoa, essa quantidade significativa de pessoas portadoras de alguma necessidade especial, desperta para as razões dessa realidade e de como nós, arquitetos, podemos contribuir para transformá-la. Essa transformação é lenta, pois não envolve apenas questões técnicas de design e de infra-estrutura na adequação do espaço público e privado em atender suas necessidades específicas. Não se trata apenas de calçadas inexistentes ou com revestimentos inadequados, de existência de obstáculos nos passeios públicos ou de falta de rampas de acesso e de faixas de travessias, mas, pressupõe toda uma conscientização, educação e conhecimento sobre as diferenças humanas, seus direitos, deveres e o exercício da cidadania para que não perdure essa situação de exclusão social. Onde está o problema? No que diz respeito à legislação que garante o direito de ir e vir de todo cidadão sem distinção, esta já é suficiente e existe nos diferentes níveis, em forma de leis, decretos e/ou portarias a exemplo da Lei Federal nº 10.098/2000 que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiências ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação e, também, o Projeto de Lei do Senado nº 6, de 2003 que institui o estatuto do portador de deficiência. 21


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No entanto, o obstáculo maior parece ser a inexistência de uma consciência desse problema, por todos os cidadãos, e de como superar essa barreira sócio-cultural. Reforçando esse aspecto, segundo PRADO (2001), a maioria dos ambientes construídos apresenta barreiras visíveis e invisíveis. As barreiras visíveis são todos os impedimentos concretos, entendidos como a falta de acessibilidade dos espaços e, as invisíveis encontram-se na forma de como as pessoas, na maior parte das vezes, representadas pelas suas deficiências e não pelas suas potencialidades, enfrentam o problema e são vistas pela sociedade. É possível que a ausência de uma preocupação constante com as questões de mobilidade e acessibilidade nos projetos de arquitetura e urbanismo decorram da herança dos ideais modernistas, que pregam o racionalismo gerando uma arquitetura insensível às necessidades humanas. As cidades modernistas foram projetadas de “aviões”, em escalas monumentais, com os arquitetos posicionados à distância, possivelmente, abstraídos de detalhes necessários ao convívio humano e ao uso democrático de seus espaços. Assim sendo, os profissionais de arquitetura precisam rever sua maneira de conceber os espaços, atualizarem-se tecnologicamente e renovarem seus conhecimentos, devendo levar em consideração a diversidade dos usuários nos espaços construídos, buscando atender às suas necessidades. Nesse sentido, entendemos que o Universal Design é um caminho que atende, ou busca atender, a esses anseios, na medida em que tem por princípio planejar, projetar e construir o entorno físico considerando o envolvimento das necessidades de qualquer pessoa. (UBERNA, 1997). É importante lembrar, segundo Cohen e Duarte, que os espaços construídos não devem ser adequados apenas às pessoas com deficiências, pois isso poderá aumentar a exclusão espacial e a segregação desses grupos, mas, sobretudo, utilizar-se de medidas técnico-sociais destinadas a acolher todos os usuários em potencial. (COHEN e DUARTE, 2003). 22

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Relato da Experiência e de sua Metodologia Tais considerações nos levaram a desenvolver, desde 2002, na disciplina Conforto Ambiental I, localizada no 4° período do curso de Arquitetura e Urbanismo do UNIPÊ, uma experiência pedagógica cujo objetivo é conscientizar os alunos com relação ao papel do arquiteto e urbanista nesse verdadeiro processo de democratização espacial, como um profissional que deve considerar o usuário como agente participativo no seu processo projetual. O aluno é incentivado a analisar, criticamente, a qualidade dos espaços construídos; avaliar seus níveis de acessibilidade e de mobilidade; compreender a importância desses aspectos para a qualidade de vida da população; conhecer a legislação existente sobre o assunto; e propor soluções viáveis às questões de acessibilidade no ato de projetar. A metodologia utilizada consiste em fazer os alunos vivenciarem, concretamente, situações do dia a dia, em diversas áreas da cidade, simulando mobilidade reduzida ou deficiência, aliando a essa experiência uma posterior e ampla discussão sobre o que é acessibilidade; qual a sua abrangência; sua normativa; como a sociedade a compreende; como tais questões se colocam atualmente para a cidade de João Pessoa; e sobre qual a responsabilidade do arquiteto e urbanista frente a essa problemática. O método utilizado consiste na seguinte seqüência de passos: 1. Escolha de um espaço ou edificação de uso público existente na cidade, considerando-se a possibilidade de desenvolvimento, no local, de atividades variadas e corriqueiras, tais como: deslocamento; uso de telefone público; travessia de ruas; utilização de sanitários e de bebedouros; trânsito entre desníveis; 2. Visita ao local escolhido. Os alunos, acompanhados pela professora, visitam o local para nele se desloca23


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rem e realizarem atividades, fazendo uso de cadeiras de rodas, muletas e de vendas nos olhos, ou simulando situações de mobilidade reduzida tais como carregar pacotes, ou empurrar carrinhos de bebê; 3. Elaboração de relatório. Os alunos elaboram um relatório, analisando a experiência, descrevendo as sensações vividas e identificando os elementos construídos que possam dificultar ou auxiliar a realização de atividades.

Fotos 01 e 02 - Alunos vivenciando a experiência da travessia de ruas com mobilidade reduzida

Os problemas mais freqüentemente encontrados são: rampas com inclinações inadequadas; portas com largura inferior a 80cm; sanitários mal adaptados aos portadores de deficiência ou de mobilidade reduzida; telefones públicos com altura inadequada para cadeirantes; ausência de pisos tácteis para deficientes visuais. Quanto às sensações experimentadas durante a atividade, as mais relatadas são: desorientação; insegurança; impotência; falta de autonomia; incômodo com o olhar constante das pessoas; indignação com os arquitetos e com os profissionais envolvidos na execução do projeto;

Foto 03 – Dificuldades encontradas no acesso aos equipamentos urbanos Foto 04 – Aluna relatando sua experiência em programa de tv para conscientização da população

4. Discussão em sala de aula. Expostas as impressões e constatações resultantes da experiência, a turma, junto à professora, constrói o conceito de acessibilidade, discute sua importância, estuda a legislação vigente e é apresentada ao conceito de Universal Design; 5. Com o conhecimento apreendido na atividade, realiza-se a adaptação de uma área edificada (banheiros, balcões, estações de trabalho, etc.) às condições de acessibilidade requeridas pela normativa e essenciais para o uso integral, democrático e confortável do espaço construído.

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Fotos 05 e 06 – Sensação de insegurança e impotência vivenciadas pelos alunos

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Fotos 08 e 09 – A aluna percebe que os equipamentos adaptados não funcionam

nem autonomia e mobilidade a um número cada vez maior de pessoas, mesmo aqueles com mobilidade reduzida ou portadores de necessidades especiais. Dessa forma, poderemos ter projetos que atendam aos princípios do desenho universal, onde o usuário final interaja de forma confortável e segura com o espaço construído, e formar cidadãos conscientes das diferenças humanas, do necessário e positivo que é conviver com elas e da sua responsabilidade face a incorporação de tal diversidade à vida urbana.

Conclusão

Bibliografia

É importante dizer que a experiência relatada não é isolada, a ela somam-se outras, como a de Cristiane Duarte e Regina Cohen, realizada no curso de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, e a pesquisa de Angélica Pinto et al. no Departamento de Design da UFPE. Com ela, o aluno transforma a sua percepção da relação do usuário com o projeto arquitetônico. Na medida em que se coloca na sua posição, com as suas possíveis limitações e situações previsíveis, o aluno passa a perceber mais atentamente que o usuário é o motivo maior do ato de projetar, pois é para ele, e para o desenvolvimento de suas mais diversas atividades, que os espaços são projetados e construídos. O que antes poderia ser visto como uma variável abstrata do projeto arquitetônico passa à condição de realidade a ser tratada no processo projetual. Com efeito, é com satisfação que observamos que, após cursar a disciplina de Conforto Ambiental I, os alunos têm demonstrado sensibilidade e preocupação bem mais apuradas, no que diz respeito à acessibilidade como variável imprescindível de seus projetos arquitetônicos e urbanísticos. Despertamos o aluno para uma preocupação ausente no processo de formação de muitos arquitetos, que é a concepção de edifícios e espaços urbanos acessíveis, que proporcio-

DUARTE, Christiane Rose, COHEN, Regina. (2003) “Methodologies d´Enseigment de l´Architecture Inclusive: Creant des Outils pour la Qualite de Vie pour Tous”. News Sheet 65. European Association for Architectural Education. Association Europeenne pour l´Enseignement de l´Architecture. Leuven, 2003. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, Censo 2000. NBR 9050. “Acessibilidade de Pessoas Portadoras de Deficiências a Edificações, Espaço, Mobiliário e Equipamentos Urbanos” – Rio de Janeiro ABNT, 1997. PINTO, Angélica Leite Peixoto et al. (2002) “Ergonomia e Arquitetura: Contribuição da Ergonomia na Formação Acadêmica/Profissional do Arquiteto. ABERGO 2002. In: Anais ABERGO 2002. Recife,2002. PRADO, Adriana Romeiro de Almeida (2001). Ambientes Acessíveis, In Município acessível ao cidadão, São Paulo: CEPAM, 2001. UBIERNA, José Antonio Juncá (1997), Diseño Universal: Factores Claves para la Accessibilidad Integral, Castilla-La Mancha: Ed. COCEMF, 1997.

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O ENSINO DE PROJETO ARQUITETÔNICO: HABITAÇÃO VERTICALIZADA Andréa Câmara Profa, M.Sc, Departamento de Engenharia e Arquitetura, Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP)- e-Mail: andrea@unicap.br Paulo Andrade Prof, M.Sc, Departamento de Arquitetura, Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)- e-Mail: pauloraposoarq@uol.com.br IsabellaTrindade Profa, M.Sc, Departamento de Engenharia e Arquitetura, Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) - e-Mail: faks@hotlink.com.br Márcio Erlich Estudante de Arquitetura e-Mail: marcioerlich@hotmail.com

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produzida no Recife, de modo que possam constituir estruturas conceituais úteis na prática e no ensino do projeto arquitetônico. Foram estudadas duas tipologias habitacionais: o edifício quadra e o edifício torre. Os conceitos do edifício quadra e edifício torre foram explorados na pesquisa de iniciação científica desenvolvida pelo aluno Márcio Erlich sob a orientação da professora Andréa Câmara, no ano de 2003. Palavra-chave: arquitetura verticalizada; tipologia arquitetônica; ensino de projeto INTRODUÇÃO

No Recife, é na década dos 40 que se inicia o processo de verticalização urbana com o surgimento dos primeiros “arranha-céus”. Na origem desse processo de verticalização, estava a crescente escassez de terrenos vazios (sobretudo nos bairros centrais), as pressões do mercado imobiliário pelo máximo aproveitamento econômico dos terrenos disponíveis, a difusão de inovações tecnológicas tais como o concreto armado e o próprio elevador, bem como um desejo coletivo de “modernização” da cidade. Ao longo das décadas seguintes a multiplicação desses edifícios verticais, de uso comercial, habitacional, ou misto, foi modificando profundamente a paisagem da cidade e o modo de vida de seus cidadãos. Hoje, o edifício vertical de habitação multifamiliar —isto é, a torre de apartamentos— constitui elemento definidor da paisagem da cidade e tema recorrente na prática profissional do arquiteto e também no ensino da arquitetura. O presente trabalho tem como objetivo definir e formular ‘padrões tipológicos’ da arquitetura habitacional verticalizada

No Recife, é na década dos 40 que se inicia o processo de verticalização urbana com o surgimento dos primeiros “arranha-céus”.1 Na origem desse processo de verticalização, estava a crescente escassez de terrenos vazios (sobretudo nos bairros centrais), as pressões do mercado imobiliário pelo máximo aproveitamento econômico dos terrenos disponíveis, a difusão de inovações tecnológicas tais como o concreto armado e o próprio elevador, bem como um desejo coletivo de “modernização” da cidade. Ao longo das décadas seguintes a multiplicação desses edifícios verticais, de uso comercial, habitacional, ou misto, foi modificando profundamente a paisagem da cidade e o modo de vida de seus cidadãos. Hoje, o edifício vertical de habitação multifamiliar —isto é, a torre de apartamentos— constitui elemento definidor da paisagem da cidade e tema recorrente na prática profissional do arquiteto. É a arquitetura do edifício vertical de habitação multifamiliar que constitui o objeto de estudo da presente pesquisa. Considerando o universo da arquitetura residencial verticalizada produzida no Recife nas cinco décadas analisadas, é evidente à primeira vista a enorme diversidade de formas, arranjos e soluções arquitetônicas realizadas.

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Rua Alfredo Fernandes, 285. Casa Forte. Recife. PE. CEP 52060-320 Tel/Fax: (+55) 0 (XX) 81 3268 4858

RESUMO


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Todavia, uma hipótese que fundamenta a pesquisa é a de que, por trás da aparente diversidade e variedade de obras específicas, estão alguns poucos ‘tipos arquitetônicos’ invariáveis, os quais constituiriam ‘padrões tipológicos’ determinados e definidos, dos quais as inúmeras obras concretas constituem reflexos ou variações. Os ‘padrões tipológicos’ referidos são representações simplificadas e inteligíveis de determinado conjunto de obras arquitetônicas concretas. Tais padrões permitem categorizar, classificar, organizar, em um todo sistemático, o que era até então visto como um conjunto de casos aparentemente diversos, singulares e mais ou menos desconexos. Em arquitetura, um ‘padrão tipológico’ pode ser definido por um determinado arranjo planimétrico, altimétrico, volumétrico, espacial, geométrico, topológico, funcional, cromático… O crucial é que tal arranjo defina e determine qualidades essenciais do objeto arquitetônico analisado. Para autores como Aldo ROSSI, um ‘padrão tipológico’, enquanto princípio geral que unifica fatos particulares, constituiria uma espécie de “arquétipo arquitetônico”. Esses padrões se conformam através de longos, lentos e complexos processos de “sedimentação histórica”; no fim do quais determinadas soluções arquitetônicas “cristalizam-se”; não como modelos dogmáticos, mas sim como fontes e pontos de partida para a criação e a inovação arquitetônica É óbvio que, na pesquisa arquitetônica, a formulação de tais ‘padrões tipológicos’ não é um processo aleatório ou arbitrário. Tais padrões são formulados para servir a determinados propósitos definidos, eles são como lentes empregadas para enxergar melhor um conjunto de objetos arquitetônicos. O que interessa na investigação tipológica são os traços invariáveis de um determinado conjunto de objetos arquitetônicos. O que se procura são as propriedades essenciais desses objetos para —abstraindo a partir destas propri-

edades— construir classificações e categorias, de modo que possam constituir estruturas conceituais úteis na prática e no ensino do projeto arquitetônico.

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ARQUITETURA RESIDENCIAL VERTICALIZADA: O EDIFÍCIO TORRE E O EDIFÍCIO QUADRA A pesquisa desenvolvida teve como foco a arquitetura residencial verticalizada classificadas em dois grupos de acordo com sua tipologia de implantação no lote. O que chamamos de edifício-quadra constituia edifício que ocupava o perímetro do lote, não possuia recuos em relação a este e está relacionado à arquitetura tradicional da cidade e ao que se chama ‘rua corredor’. No bairro da Boa Vista e bairros próximos está a maior concentração de edifícios-quadra da cidade do Recife, justamente por serem bairros onde surgiram os primeiros edifícios verticais da cidade. Esses edifícios são marcados pela predominância do uso misto com térreo e sobrelojas destinados a comércio e os pavimentos superiores a apartamentos de uso residencial. Com a presença do comércio no pavimento térreo e seus diversos acessos às lojas, caracteriza um edifício permeável, sendo um acesso exclusivo para os apartamentos. Não existia estacionamento nos edifícios-quadra, surgindo posteriormente nos edifícios-torre. Os primeiros edifícios-quadra apresentam volumetria tripartida bem definida. O pavimento térreo é recuado, criando um passeio coberto pela calçada. No edifício Duarte Coelho, projetado em 1943 [FIGURA 1], deixa-se à mostra alguns de seus pilares, enquanto no edifício Ouro (1950) [FIGURA 2] projetam-se marquises em balanço. O coroamento desses edifícios é destacado por estar recuado em relação ao corpo dos demais pavimentos, criando um terraço, e a esta altura são projetados balcões em balanço.


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FIGURA 01: Edifício Duarte Coelho. 1943. Planta Baixa – 10º pavimento. Fonte: NASLAVSKY, Ghilah.

FIGURA 02: Edifício Ouro. 1950. Planta Baixa – Térreo e 6 Pavimemnto. Fonte: Prefeitura da Cidade do Recife.

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Nos edifícios-quadra pode ser encontrada uma grande diversidade de apartamentos-tipo, sendo em sua maioria apartamentos compactos, com programas mínimos. O programa dos apartamentos-tipo pode variar num mesmo pavimento, podendo ir de 1 cômodo apenas a apartamentos de 15 cômodos, bem como variar de pavimento para pavimento. O programa básico é de sala, quartos, varanda, cozinha e banheiros sempre um de uso social e um de serviço. Os edifícios-quadra têm geralmente uma circulação vertical2 comum aos apartamentos. Em alguns casos eles possuem uma segunda circulação vertical que dá acesso a um número menor de apartamentos. Em muitos edifícios-quadra não há distinção entre hall social e hall de serviço; é comum encontrar um único corredor para acesso a todos os apartamentos, ao elevador e à escada. A partir dos anos 60, a elaboração de uma nova legislação de uso e ocupação do solo, muda definitivamente o modo de construir na cidade. Esta nova legislação baseada na postura modernista definida por Gropius, que em 1930, argumentava que “quanto mais alta a edificação, maiores as distâncias para o limite do lote”, determinou o modo de ocupação das novas edificações nos bairros afastados do centro, cuja ocupação era essencialmente de casas. Essas novas edificações constitui o outro grupo de edifícios estudados, o edifício-torre. Essa nova fase da arquitetura, provocada pela mudança da legislação, estabeleceu uma nova relação entre o edifício e a rua. Observa-se um distanciamento entre os edifícios e a rua e o surgimento dos muros como elementos que definem uma nova paisagem para a cidade. O muro, como uma barreira urbana, rompe a ligação direta entre o edifício e a rua, característica do edifício-quadra, restringindo o acesso dos pedestres ao edifício. Os edifícios-torre são predominantemente de uso residencial, mas, como conseqüência da ampliação do uso 33


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do automóvel, surge a necessidade de inserir nesses novos edifícios, local apropriado para a sua guarda. Então surgem os pavimentos-garagem, uma nova edificação que ultradassa os limites de projeção da torre e que define a base da volumetria da edificação. Um acesso independente para o veículo tornou-se essencial para os novos edifícios. A volumetria dos edifícios-torre, em quase sua totalidade, é tripartida. Na base estão os pavimentos-garagem, os pavimentos-tipo formam o corpo e o coroamento é feito por uma deformação do pavimento-tipo (apartamento duplex) ou pela criação do pavimento-cobertura, geralmente destinado a uso comum dos moradores. A circulação vertical passa a compreender um volume independente do bloco do edifício, acentuando a marcação de verticalidade. [FIGURA 03 e 04]

FIGURA 04: Edifício Artemis. 1999. Planta Baixa do pavimento Tipo. Fonte: Prefeitura da Cidade do Recife.

FIGURA 03: Edifício Bonneville. 2003. Planta Baixa do pavimento Tipo. Fonte: Prefeitura da Cidade do Recife.

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O programa dos edifícios-torre se ampliam e aparece a chamada área de lazer, que constitui espaços de uso comum e podem estar localizados entre acima dos paviemntos-garagem ou no último pavimento. O programa para os apartamentostipo passa a ser único e o número de apartamentos-tipo por pavimento se reduz para um ou dois. O número de banheiros cresce no edifício-torre. Já se encontra suítes, e em alguns edifícios, mais de 1 quarto suíte. O tamanho dos quartos diminuem e os banheiros são menos equivalentes do que nos apartamentos do edifício-quadra, com 1/3 da área dos quartos. O espaço do apartamento-tipo é mais fluido, apresentando espaços mais amplos, menos compartimentados, e sem cômodos intermediários entre os ambientes, e por esta razão, mais inte-

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grados. O hall comum dos apartamentos é dividido em hall social e hall de serviço, que são conectados entre si. O hall de serviço se comunica com a escada UM METODO DE ENSINO DE PROJETO O fato de estarmos sempre partindo de um conhecimento existente para gerar novos conhecimentos, ao contrário do que se pode pensar, nos dá a liberdade de criação. Segundo Quatremére de Quincy [1832] “a arte de edificar nasce de um germe preexistente; nada vem do nada…o tipo é uma espécie de cerne em torno do qual, e de acordo com ele, são ordenadas todas as variações de que um objeto é suscetível”. Essa citação já indica que a partir do conceito de tipos é possível se ter uma metodologia de projeto que seja baseada no estudo aprofundado de certos padrões tipológicos. O conceito de tipo pode ser empregado tanto para analisar os fenômenos históricos da arquiettura como também para projetar arquitetura. Os ‘padrões tipológicos’ buscados na pesquisa servirão de referências, não modelos, para a prática projetual em sala de aula. A partir da definição de dois tipos de edifícios residenciais verticais, o edifício-quadra e o edifício-torre, será possível elaborar estruturas que auxiliem os estudantes a encontrar o partido arquitetônico e a desenvolverem o projeto da edificacão. Abstraindo-se da composição da edificação e detendo-se aos padrões das relações existentes de suas partes, será possível elaborar um conjunto de possibilidades arquitetônicas cabíveis. Portanto espera-se que as soluções arquitetônicas possuam uma consistência teórica e fundamentos mais sólidos, resultando numa composição menos formalista. Segundo Mahfuz [2002] “Uma consequência importante do emprego do método tipológico é a implicação de que as formas não são eternamente ligadas às funções para as quais foram projetadas. Pelo contrário, formas arquitetônicas tem o potencial de conter, e de fato contém, uma multiplicidade de funções através do tempo. Mas, talvez, o benefício mais im-

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portante que se possa obter do entendimento do conceito de tipo é que nos possibilita fazer uso de toda história da arquitetura como fonte de pesquisa e inspiração, já que, ao estudar essa história desde um ponto de vista tipológico, o que o arquiteto extrai dela são princípios , não formas literais.” BIBLIOGRAFIA LARA, Fernando. Marques, Sônia. Desafios e conquistas da pesquisa e do ensino de projeto. Rio de Janeiro: Editora Virtual Cientéifica, 2003. MAHFUZ, Edson. O clássico o poético e o erótico e outros ensaios. Porto Alegre: Editora Ritter dos Reis, 2002. MONTANER, Josep Maria. A modernidade superada. Barcelona: GG, 2001. NASLAVSKY, Ghilah. Modernidade Arquitetônica no Recife. Tese de Mestrado, MDU – UFPE. PASSOS, Luiz Mauro do Carmo. Edifícios de apartamentos.Belo Horizonte: AP Cultural, 1998. REIS FILHO, Nestor Gourlart. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Editora Perspectiva, 1990. ROSSI, Aldo. A Arquitetura da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

NOTAS 1 (Na verdade, desde 1928 estavam licenciados pela Prefeitura os primeiros projetos de arranha-céus no Recife. Todavia só em 1948 foi terminado o edifício ‘Duarte Coelho’, que, com seus 14 pavimentos, abrigando apartamentos residenciais, salas comerciais e o cinema ‘São Luiz’, foi anunciado como o primeiro arranha-céu da cidade.) 2 A circulação vertical compreende o elevador e/ou escada.

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POTENCIAL DO DESENHO URBANO NA REQUALIFICAÇÃO DO ESPAÇO TERCIÁRIO NAS VIAS ARTERIAIS DEGRADADAS EM SANTO ANDRÉ

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RESUMO O Objetivo deste artigo é discutir relações favoráveis e desfavoráveis de desenho urbano para o “programa” espacial que a sociedade determina para alguns de seus espaços mais significativos, no caso as grandes avenidas arteriais. Através da legislação urbanística e das relações econômicas e ecológicas na cidade, a sociedade imputa papéis urbanísticos ou espaciais para as diversas partes de seu território. Assim imaginamos, projetamos e legislamos para que áreas residenciais tenham mais isolamento e sossego, para que as áreas comerciais possam desfrutar de acessibilidade e densidade de poder de compra, também do mesmo modo procuramos dotar de significância alguns espaços urbanos dos quais nos orgulhamos, tais como largos, praças, parques e grandes avenidas. Esse espaços, tal como lhes atribuia Lynch ( 1985) no trabalho sobre a boa forma das cidades, possuem, ou pelo menos tentamos com que possuam, um sentido urbano, mais ou menos, algo relacionado com o que deles esperamos e com atributos de desempenho favoráveis. O desenho das grandes avenidas contemporâneas tem sua origem no princípio do desenho urbano barroco que o concebeu como grande eixo articulador de espaços dotados de grande significância, ao mesmo tempo as grandes avenidas ou Bulevares seriam indutoras de fluxos entre polos de

atração e também elas mesmas o palco do movimento, onde o voyerismo, o flanar e o desfile são atos inseridos no contexto de uma nova modernidade capitalista. As grandes avenidas, na forma de Bulevares, esplanadas ou corredores, são assim espaços de passagem mas ao mesmo tempo símbolos de modernidade, são abrigos do setor terciário e podem ser também destinadas ao uso residencial de camadas específias da população adeptas do agito da metrópole e que dispensem um maior isolamento interior do bairro. Hoje porém, muitas metrópoles brasileiras encontram-se corroídas pela importância exacerbada que o trânsito superficial e, principalmente, o transporte superficial de massas, assumiu no controle da mobilidade urbana. Os urbanistas e legisladores espremidos pela necessidade de solucionar esse problema não tem apresentado soluções adequadas, embora se saiba que somente amplas redes de metro e uma redistribuição de atividades incomodas poderiam ser a resposta. O desenho de avenidas com corredores centrais de ônibus é um paliativo menos custoso e, ao nosso ver, mais adequado que deixar o ráfego de ônibus acumular-se junto aos passeios públicos. Esse acúmulo como causa do refreamento do sentido urbano das avenidas também ocasiona a perda de um potencial urbano e imobiliário imenso, pela descaracterização do território lindeiro, pelo impacto ambiental negativo exagerado causado pelo tráfego de ônibus e caminhões junto aos passeios e pela perda de infraestrutura já instalada em áreas nobres da cidade. SENTIDO URBANO DAS AVENIDAS Um dos tipos de espaços urbanos mais importantes em nossas cidades contemporâneas é o das grandes avenidas, ou vias arteriais. Isso se deve ao sentido urbano das avenidas, qual seja de permitir a mobilidade nas modernas cidades e a articulação de “nódulos” urbanos, em geral espaços com sentido de centralidade ou grande presença simbólica. Essa configuração, conforme assinalado no resumo deste

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Ismael Andrade Pescarini Islum@uol.com.br ou pescarini@uninove.br

O movimento, nas grandes cidades, não é simplesmente produto da organização espacial, mas causa de sua existência Hillier (1996).


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artigo, foi proposto durante o período Barroco e transformado em paradigma quando das reformas de Paris e Viena no século XIX. Quando esses espaços se degradam, dada a visibilidade e força simbólica que apresentam no contexto urbano, ocorrem duas principais conseqüências: Uma é a migração de atividades comerciais para ruas laterais ou paralelas, desconfigurando e compromentedo o conforto e o equilíbrio ecológico do setor residencial adjacente, como tem acontecido em vários bairros de São Paulo principalmente naqueles em torno do corredor das avenidas Nove de Julho e Santo Amaro. Outra conseqüência desastrosa é a perda de infra estrutura instalada em uma porção de território urbano com singular capacidade de integração entre diversos setores, à semelhança do que ocorre nas regiões centrais. Essa degradação manifesta-se no estado de conservação precário dos edifícios, no abandono de imóveis e mesmo na substituição de usos, principalmente naqueles que construiram uma certa identidade com a localização por usos genéricos ou especulativos, como no caso da Santo Amaro que perdeu os espaços de cinemas e restaurantes (MARCONDES, 2000 e Imprensa Oficial) ou da Celso Garcia, anteriormente local de importantes magazines (Imprensa Oficial). Todos compreendemos o drama que se instala perante a classe dos proprietários de imóveis urbanos, frente ao sentimento de perda de domínio sobre o território que estas pessoas imaginam-se possuidoras, o qual é, na verdade, um sentimento que confronta uma relação humana e ancestral, muito mais ampla do que se possa discutir em um simples artigo, mas essencial na ecologia e sobrevivência da economia urbana. Muitos teóricos do urbanismo chamam esse processo de desterritorialização. A importância de recuperar esses espaços repousa, portanto, na possibilidade de melhoria ecológica e na reposição do sentido de território, exemplificados pela redistribuição de

atividades incômodas nos bairros residenciais, no resgate da construção de edifícios de uso misto nas avenidas arteriais, como já foi antigamente proposto por Prestes Maia, na década de 40 e, também, no melhor rendimento do solo pela verticalização adequada desses espaços. Ao se estudar esse processo, vemos primeiramente que existe um vínculo histórico entre o fenômeno da degradação das avenidas e a intensificação das barreiras do trânsito. Esse fenômeno já havia sido magistralmente enfocado pelo urbanista norte americano David Appleyard (APPLEYARD, 1981), contemporâneo de Kevin Lynch, em estudos sobra a perda de convívio em diversas ruas de São Francisco a partir de maiores volumes de tráfego. Em São Paulo, o urbanista Cerqueira César também teceu inúmeras considerações sobre a incompatibilidade da existência de corredores de transporte de massas com os setores comerciais, bem como a impropriedade da implantação de sistemas de transporte de massas na superfície.

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“O metrô foi projetado para trabalhar em conjunto com o transporte de superfície e não para eliminar esse (onibus e automóveis convergiriam para o metrô), especialmente para as estações de ponta que estão dimensionadas como estações de transfer. O metrô opera na área mais adensada e os onibus e tróleibus operariam na periferia, onde haveria condições de permanencia do transporte de superfície. O metrô é caro e tem capacidade alta para trabalhar apenas na faixa marginal próxima, operando nessas condições seria anti econômico e oneroso” (Jornal ESP, 10/05/70 e Jornal ESP, 31/05/70). A exposição de motivos de Cerqueira Cesar leva à compreensão que onde existe a maior conectividade do tecido, onde o tecido é mais denso, onde a cidade possui maior interação entre o arruamento construído, é onde efetivamente


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esta degradação é acentuada pela disposição do transporte público junto aos passeios, o qual funciona como setor conector entre o público detentor de potencial de compra e as atividades econômicas localizadas no território lindeiro à via. No gráfico abaixo (Simões, 1997) vemos os eixos de ruas de Santo André com o gradiente de integração analisado sintaticamente. Os tons quentes (vermelho e amarelo) representam os mais integradores, os mais frios (verde e azul) possuem menor integração. As avenidas analisadas são a av Dom Pedro II, nº1; que integra Santo André a São Caetano do Sul, a Av. Perimetral, nº2, ligação com Mauá e com a parte sudeste do municipio, onde há muitos bairros populares e a de nº 3, Av. Ramiro Colleoni, que é uma das mais importantes ligações entre Santo André e o Centro de São Bernardo do Campo.

se concentra a maioria dos postos de trabalho e onde é mais necessário proteger a diversidade de modos de acessibilidade com a restrição do uso intenso do sistema viário pelo tráfego superficial, principalmente o de ônibus e automóveis particulares. A acessibilidade ao comércio é favorecida por essa restrição, na medida em que o ato da compra depende da possibilidade de escolha, que nos espaços públicos está associada ao flanar. Os argumentos utilizados por Cerqueira Cesar, deixam clara a importância da coerência entre capacidade de carga das modalidades de transporte público e sua posição dentro da estrutura urbana, por isso a obviedade da necessidade de uma articulação dos diversos modos: metrô, ônibus, micro ônibus, ônibus expressos, etc. Essas afirmações de urbanistas conceituados poderiam levar à conclusão de haver uma uniformidade de condições de degradação nas avenidas tomadas pelo trânsito intenso. No entanto vemos, na prática, que lugares mais articuladores ou integradores de fluxos podem estar mais degradados que outros dependendo do desenho urbano que possuam, para distribuir o tráfego pesado e o transporte público, minimizando ou acentuando, em alguns casos, os prejuízos à acessibilidade ao território lindeiro e, também que, menor tende a ser o abandono naquelas onde há maior integração e articulação, mesmo frente à possibilidade de migração do comércio para porções de ruas próximas, as quais, por sua vez, poderiam enfrentar fenômeno semelhante de saturação de tráfego. Usou-se a metodologia de analisar sintaticamente, isto é, através da análise do potencial integrador dos eixos urbanos como proposto por Hillier e outros, para identificar uma escala de integração na malha urbana de Santo André; depois a partir de uma investigação de campo com fotos e entrevistas, estimou-se o grau de degradação no território lindeiro dos eixos analisados e confrontou-se com a hipótese levantada, de que há mais degradação em áreas menos integradas e que

A Avenida Dom Pedro II possui um desenho tradicional com um simples canteiro central, não há divisões enrtre os espaços destinados aos veículos de carga nem ao transporte público, em várias porções a acessibilidade é extremamente prejudicada pelo excesso de veículos. A avenida D pedro, no

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Diagrama sintático de Santo André, fonte Simões, 1997.


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entanto, é totalmente articulada com o sistema viário lateral, e pertence a uma região economicamente favorecida pelo potencial de compra dos habitantes, os bairros Jardim e Campestre. A atividade comercial nessa avenida é bastante intensa e já conta com mais de 40 anos de desenvolvimento. Apresenta, em geral, boas condições de ocupação e apropriação territorial, apesar do tráfego intenso, observando-se a existência de comércio estabelecido em pequenas propriedades mesmo nas que não possuem estacionamentos, ver foto 1. A Avenida Perimetral possui um trecho significativo construído com via rebaixada, por onde circulam predominantemente os automóveis e demais veículos de carga, quando de passagem. Os coletivos circulam na parte superior e são eles que teoricamente constituem os fluxos ao território lindeiro. Observa-se nessa via a quebra da conectividade com a malha lateral, pela interposição da calha rebaixada, e uma paisagem de degradação e desuso maiores que nas outras vias analisadas, ver foto 2. A existência de comércio e serviços com maior visibilidade ocorre justamente no trecho onde a via deixa de ser rebaixada e onde, por consequência, o transporte individual aproxima-se das laterais e a conectividade com as demais vias transversais é restabelecida, ver foto 3. Na Av de nº3, Av Ramiro Colleoni, há um terceiro padrão de desenho urbano representado por um corredor de ônibus central. Apesar dessa proposição também representar uma espécie de fratura urbana na avenida, observa-se ao longo das últimas duas décadas a renovação comercial de usos com a criação de um importante Shopping Center, ABC Shopping, antigo Mappim, a criação mais recente de um grnade centro automotivo e a expansão de um centro universitário, além da manutenção de investimentos no setor residencial, em pontos isolados. Ver fotos 4 e 5.

A avenida perimetral assume a condição de maior eixo degradado, no centro do município. Sobram imóveis para locação comercial fechados, há muita pichação, algum vandalismo e presença de comércio destinado ao automóvel, acessórios e carros usados, o qual tradicionalmente em São Paulo tem ocupado espaços de menor valor agregado e destinados à especulação imobiliária.

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A condição de via rebaixada para o trânsito de passagem o qual é, principalmente, constiuído de automóveis particulares e a existência de um tráfego pesado de transporte coletivo, na parte superior, deixam o território lindeiro afastado do espaço por onde circulam as pessoas com maior poder de compra. Mesmo essa via estando na borda da região central da cidade ela não consegue conectar fluxos destinados ao comércio tendo em vista seu afastamento pela calha rebaixada.O mesmo não ocorre com a Avenida Ramiro Colleoni, que apesar de possuir uma cicatriz urbana, representada pelo corredor de ônibus, possui visibilidade para quem trafega pelas laterais e possibilidade de atração desses fluxos, por isso ela viu surgir e desenvolver importantes blocos comerciais e de serviços nas duas últimas décadas e, mesmo com a falência do Mappim, o shopping ABC, sobreviveu e expandiu-se. A avenida D Pedro II encontra-se em situação intermediária. Apesar de conhecer um comércio e serviços constantes, ela não apresenta os mesmos parâmetros de crescimento imobiliário, mesmo com o dobro de tempo de consolidação desse setor em seu território. Esse eixo sofre com a mistura de tráfego, porém tendo emvista que ela é, dos três exemplos analisados, a mais constiuída sintaticamente, isto é, mais articuladora de fluxos laterais, sua territorialidade sobrevive e permite que não haja degradação.


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Foto 3, Av Perimetral, trecho plano

Foto1, Av.Dom pedro II

Foto 4 , Av Ramiro Colleoni, vista em direção ao Centro Foto 2, Av Perimetral, trecho em calha rebaixada

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Fotos 5, Av Ramiro Colleoni, vista em direção à São Bernardo

CONCLUSÃO A requalificação dos territórios lindeiros, que englobam o espaço ocupado pelos edifícios frontais às principais vias arteriais das grandes cidades e também os espaços de transição, como calçadas, canteiros e recuos de estacionamentos, passa por duas instâncias de resolução: a instância global, onde a relação de acessibilidade ao território lindeiro é definida pelas estratégias de mobilidade urbana e a instância local onde a requalificação é definida pelas características locais e particulares, que possam subsidiar estratégias identitárias para a criação de localizações (VARGAS, 2001; PESCARINI 2003). Essa escala local é favorecida pela capacidade da via de comunicar-se com a malha viária lateral, ganhando assim, o que chamamos de maior sintaxe espacial. Vias com maior sintaxe favorecem mais os encontros e a visibilidade, tão importante ao setor comercial. Essa visibilidade, no entanto, é dirigida, não aleatória. Ela segue as regras de mercado e harmoniza-se com a concentração de poder de 48

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compra, a densidade de consumidores potenciais. Estes deslocam-se mais pelo trnasporte individual do que com o coletivo, conforme atestam os indicadores de mobilidade urbana presentes nas pesquisas de deslocamento. Nesse sentido a requalificação de qualquer espaço urbano é indissociável das estratégias de mobilidade, que criem identidades entre o eixo principal e as formas de apropriação do território. Os eixos demonstram sua vocação mediante o tipo de articulação com os espaços de significancia não com os bairros, portanto a sintaxe dos eixos é consequência dos processos de apropriação do território, em consonância com o tipo de acessibilidade predominante, se a pé, ônibus, metrô ou carro, na qual estas estratégias de mobilidade são pilares de sua sustentação. A sintaxe espacial dos eixos é uma característica morfológica que assegura um maior número de encontros casuais e deve estar aberta à conexão e acessibilidade das camadas da população que possuem maior poder de compra e se deslocam pelo território No entanto, sem poder posicionar-se claramente em relação à necessidade de garantir funcionalidade e conforto para todas as classes sociais que habitam nossa metrópole, a estrutura de mobilidade adotada pela aglomeração urbana não logrou resolver a questão da separação dos fluxos de passagem dos fluxos locais, sejam estes de cargas ou passageiros, adotando, infelizmente e por força das adversidades da conjuntura macro econômica brasileira, sempre carente de recursos para resolver os graves problemas urbanos, um modelo exclusivamente baseado na malha viária superficial e no trânsito sobre pneus. As soluções de desenho urbano, soluções espaciais, portanto, que mantém mais abertas as possibilidades de conexão entre os eixos por onde circulam as atividades múltiplas, não apenas as de passagem, representadass em grande parte pelo transporte coletivo, mostram-se mais eficazes. O espaço em nossas metrópoles contemporâneas se flexibilizou com a facilidade de locomoção (WEBBER M., 1963) 49


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e, ao mesmo tempo, em que contribuiu para “estandartizar” a paisagem, trazendo como vantagem a adequação dos diversos sub territórios aos diversos usos, como desvantagem trouxe a monotonia. Conforme propõe Lynch deve haver prazer nas viagens (LYNCH, 1984, pg.142) e existe uma forte relação entre o acesso fácil, a vitalidade e a boa adequação.

MORADIAS ASSISTIDAS: O FUTURO DA CRESCENTE POPULAÇÃO IDOSA BRASILEIRA

BIBLIOGRAFIA

Se hoje sabemos que o turista é aquele que sai do seu lugar de origem, visita outros lugares por um período determinado e retorna, e considerando que a flexibilidade dos pacotes turísticos tem permitido inúmeras combinações de trechos e destinos, pensar em indivíduos que vivam períodos de média duração em lugares remotos à sua origem não soa completamente impossível. A concepção dos apart-hotéis, inclusive, vem de encontro a essa expectativa, pois a transitoriedade das relações pessoais e profissionais está em progressiva flexibilidade, também. Porém, já se vislumbra uma mudança significativa no turista do século XXI, de acordo com Yasoshima & Oliveira1 :

APLLEYARD D. Livable Streets, Chicago, MIT Press, 1981 CÉSAR Roberto C. São Paulo, Jornal OESP , Seçaõ Urbanismo, 1970 HILLIER, Bill. A Lógica Social do Espaço Hoje, Excertos, Universidade de Brasília-Fac. De Arq. E Urb, trad. Prof Frederico Holanda, Brasília , 1986 HILLIER, Bill. Space is the Machine, NY, Cambridge-University Press, 1996. LYNCH Kevin. La Buena Forma de la Ciudad: Barcelona, Ed. Gustavo Gilli, 1985 PESCARINI Ismael. Requalificação de Avenidas em São Paulo. São Paulo, Artigo www.vitruvius.com.br, 2003. SIMÕES Luciana L P. Localizações Urbanas, uma Nova Proposta Metodológica, Dissertação de mestrado, Brasília, Universidade de Brasília-Dep. De Urbanismo, 1997 VARGAS Heliana C. Espaço Terciário, São Paulo, Ed. SENAC, 2001

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Maria Bestetti UNIDERP

1 - O turismo permanente ou a moradia nômade: a mudança de paradigmas para o século XXI.

“- Os novos turistas serão pobres em tempo e ricos em dinheiro, o que significa que eles terão à sua disposição tempo relativo pequeno para suas férias, por outro lado terão recursos suficientes para gastarem nessa atividade; - Como conseqüência da falta de tempo, os novos turistas darão preferência a viagens regionais, para locais próximos à sua origem; - As viagens serão curtas e divididas em várias saídas durante todo um ano de trabalho, com diferenciação de atores: no verão viagem com os filhos, na meia-estação viagens do casal, no inverno viagem dos filhos sozinhos, etc; - Alguns destinos que sofreram a conseqüência da deterioração de suas imagens poderão ter um processo de revitalização, com o aproveitamento da infra-estrutura exis-

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tente, remodelada e modernizada; - Os novos turistas darão muita importância aos componentes culturais em suas viagens. As diferenças culturais serão atrativos altamente valorizados num mundo em que globalização é responsável pela padronização de grande parte de serviços e produtos, tornando as cidades cada vez mais parecidas; - Os novos turistas procurarão aliar o entretenimento das viagens com a educação, fazendo com que cada viagem seja uma forma de aprendizagem e instrução; - Elevação da consciência ambiental e social, fazendo que a escolha dos destinos seja precedida por uma análise da situação em relação à proteção ambiental e o respeito ao entorno social; - Os padrões do turismo serão transformados pela crescente diversidade de estilos de vida dos viajantes; - Para os próximos 20 anos, residentes de nações desenvolvidas na faixa de 45-65 anos irão crescer substancialmente. Esses indivíduos terão cada vez mais tempo, renda e desejo para viajar; - A competição de mercado se tornará em uma poderosa arma para a manutenção dos custos das viagens sob controle, e permitir que o turismo permaneça acessível para um grande parte da população; - Os viajantes do futuro serão receptivos para novas tecnologias e serviços que facilitem a viagem, reduzam os custos; - Tendo em vista o baixo nível de penetração tecnológica no turismo, há um grande potencial para ganhos significantes no desempenho e produtividade em termos de melhor planejamento e fornecimento dos serviços turísticos; - Problemas relacionados com a saúde e a segurança tenderão a ser os maiores fatores inibidores na escolha dos

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destinos de férias; - O crescimento da insatisfação com os sistemas e processos governamentais podem levar a um novo paradigma para o turismo, formado por entidades civis, organizações não governamentais e empresas privadas; - Exigência cada vez maior com a questão da qualidade dos produtos e serviços turísticos, cuja aquisição será vista cada vez mais como investimento na qualidade de vida, do que como gasto supérfluo ou consumo conspícuo; definido por Veblen no começo do século; - Crescimento da China e dos Estados Unidos como principais destinos turísticos mundiais, como se pode verificar nas previsões do movimento do turismo mundial em 1999, que mostra a China em 5o lugar entre os dez maiores destinos do turismo mundial com 27.047 milhões de chegadas internacionais e um crescimento de 7,9% em relação ao ano de 1998. - Adoção de uma identidade eletrônica multiuso, baseada em dados biométricos (íris, por exemplo), proporcionando maior segurança nos controles de fronteira e maior confiabilidade dos dados relativos à movimentação de turistas no mundo inteiro.” Acrescentando-se a isso a aposentadoria ou mesmo a mudança de atividade profissional a partir da terceira idade, os possíveis reencontros com amigos ou familiares ou, até mesmo, a realização de simples desejos pela visita a lugares novos e exóticos, pensar em moradias temporárias demonstra ser uma possibilidade muito viável. Embora soe como uma melancólica volta ao nomadismo, evidente característica cultural de determinados povos, podemos considerar esses viajantes como pessoas que estariam já desvencilhados de compromissos em seus lugares de origem para a permanência como uma única perspectiva de uso do tempo livre. O segmento da terceira idade configura-se como um importante gru-

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po consumidor de produtos turísticos, em especial pela crescente participação ativa no mercado. De acordo com Moreira2 : “Além de reduzir a taxa de crescimento populacional, entre as mais significativas conseqüências da redução do nível da fecundidade encontra-se a profunda mudança na distribuição etária da população nacional. Em conseqüência da queda da fecundidade, a participação relativa do grupo etário jovem (menores de 15 anos) declinou de 41,8%, em 1950, para 28,6%, em 2000 e, em contraposição à fração da população adulta (entre 15 e 64 anos) ampliou de 55,7 para 66,0% e a população idosa (acima de 65 anos) mais do que duplicou a sua importância relativa, passando de 2,4%, em 1950, para 5,4%, em 2000. (...) As projeções da população brasileira por grupos de idade até 2050 mostram que, entre 2000 e 2050, a participação da população jovem continuará cadente, passando de 28,6% para 17,2%, enquanto ocorrerá um modesto declínio no peso da população adulta (de 66,0 para 64,4%) e todo o aumento concentrará na população idosa que ampliará a sua importância relativa de 5,4%, em 2000, para 18,4%, em 2000, intensificando sobremaneira o envelhecimento demográfico brasileiro (Moreira, 1997).” A medicina já desenvolveu soluções que permitem monitoramento à distância, reduzindo também os temores em relação a possíveis abalos de saúde. Além disso, hoje ela já é tratada de modo preventivo e não curativo, aumentando muito as condições de segurança contra doenças naturais graves, que podem ser retardadas ou mesmo amenizadas. Segundo Leopoldo e Menai3 : “Vive-se mais e melhor. Um brasileiro nascido em 1900 tinha expectativa de vida de cerca de 34 anos. Um bebê que nasceu em 2000 pode esperar viver 70 anos ou mais. É o dobro. Para o americano Roizen, esse salto, dado em um século, é indicador de que a expectativa de vida deve chegar a 98 anos em algumas décadas devido aos avanços da ciência médica e da instrução cada vez maior das pessoas sobre ques54

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tões de saúde. Diz Roizen: “A cada cinco anos, o número de pessoas maduras com problemas de saúde cai 1%. Parece pouco, mas é muito quando se lembra que a maioria das pessoas ainda se alimenta mal, fuma e não faz exercícios.” A globalização da economia permite a facilitação das trocas, pois as moedas referenciais também permitem maior mobilidade e melhor compreensão das especificidades mercantis de cada local, mesmo quando não se tem o domínio de idioma estrangeiro. Assim sendo, por que não? 1.1 – A disponibilidade dos combustíveis e o futuro do turismo como atividade econômica. Refletindo sobre a questão que envolve o combustível à base de petróleo e de quanto estamos dependentes desse meio, e de como alternativas energéticas continuam mostrando pouca eficiência no sentido de redirecionar a situação desastrosa que se configura, é preciso que se questione, também, o futuro do turismo dentro dos padrões de transporte que são praticados hoje. Ao vislumbrar a derrocada da aviação comercial em função da carência e do conseqüente aumento de preços dos combustíveis, assim como sabemos que o sistema ferroviário que decaiu no país há muitos anos e poderia ser, como em outros países já foi providenciado como solução lógica para o transporte de massa a grandes distâncias, qual o destino da atividade turística sem a viabilização através de um sistema de transportes acessível? Prevê-se que a aviação comercial sofra transformações a curto e médio prazo. De acordo com Yasoshima e Oliveira4 , algumas tendências são irreversíveis: “- Prevê-se a desregulamentação total das empresas aéreas em todo o mundo a exemplo do que ocorreu nos Estados Unidos em 1978 com o Airline Deregulation Act. - Aumento das fusões de empresas aéreas com uma concentração do poder nas grandes companhias aéreas;

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- Aumento do contrato de code-sharing a exemplo do que ocorre hoje na Star-Alliance que conta com um total de 2.000 aeronaves, servindo 800 destinos em mais de 112 países e transportando mais do que 250 milhões de passageiros anualmente; - Aumento do conforto da classe econômica. Depois de anos concentrando-se no arranjo da primeira e da classe executivo, as empresas devem se voltar para a classe econômica na tentativa de torná-la um pouco mais confortável. A American Airlines já iniciou o processo de reconfiguração de todas a sua frota, aumentando o espaço e conforto da classe econômica; - Aperfeiçoamento do yield e revenue management (gerenciamento do lucro) para aumentar a rentabilidade dos vôos; - Criação de amenidades a bordo (computador, games, fitness, etc) para proporcionar um leque de opções de entretenimento maior para o passageiro; - Superjumbos para transporte de até 1000 passageiros que deverão servir as rotas mais movimentadas (New York – Tokio, New York – Londres, etc); - Utilização do Gerenciamento de Fluxo ou o ATFM - Air Traffic Flow Management para minimizar os gargalos de operação nos aeroportos de maior movimento.” Considerando-se já em 2003 a privatização das rodovias e a implantação dos pedágios, boa solução quanto à manutenção e apoio a esses trechos de estradas, porém com acréscimo no custo das viagens, também o transporte rodoviário começa a determinar limitações que incidem diretamente na movimentação turística. Ao considerarmos que a maioria da população idosa brasileira (e até mesmo a mundial, informação a ser confirmada) não tem condição financeira suficiente para viabilizar viagens de longa distância e duração, as solu-

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ções mais acessíveis apresentam-se, também, ameaçadas. Segundo Moreira5 : “O processo de envelhecimento da população brasileira acontece sob uma conjuntura sócio-demográfica que, além das conseqüências imediatas e indiretas das variações nos níveis e padrões das variáveis demográficas e aqueles outros elementos considerados até o momento, aponta por um enfraquecimento da base familiar como suporte na velhice; a erosão da base contributiva para os programas de previdência social, em razão da ampla fração populacional alijada do mercado de trabalho, seja pelo desemprego ou sub-emprego e a fragilidade de mecanismos institucionais de transferência de renda em favor dos mais pobres. Neste sentido, as mudanças nos arranjos familiares, envolvendo desde uma redução no número de parentes até a constituição dos domicílios dos idosos, ao lado das tensões entre o suporte familiar e as fragilizadas formas institucionais de suporte à velhice, por uma política neoliberal que coloca em segundo plano as políticas sociais, juntamente com os fenômenos apontados, têm que ser considerados no diagnóstico e na formulação de políticas, projetos e ações que visam o bem estar da população idosa brasileira e a sua futura qualidade de vida.” O padrão financeiro dessas pessoas, assim como as condições físicas dos empreendimentos turísticos, esses sim em fase de reestruturação para um modelo dentro do Desenho Universal, determinam um tipo de turismo que tende a extinguir-se. Portanto, é preciso pensar em como essas limitações de deslocamento afetarão o próprio comportamento do mercado e da sociedade em geral. 1.2 – O advento dos home offices e apart-hotéis para racionalização dos custos e do tempo. Há mudanças perceptíveis no mercado hoteleiro: novas

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abordagens estão sendo discutidas a respeito dos meios de hospedagem. Estudos comprovam que:6 “- No Brasil é esperado o crescimento de hotéis de três e quatro estrelas para suprir as necessidades desse tipo de estabelecimentos; Fim do luxo exacerbado e dos megaempreendimentos hoteleiros; O luxo, sinônimo de alto custo será substituído pela elegância, sinônimo de criatividade; Quartos dos hotéis equipados com vídeo, cd player, tomada para laptop, carregador de bateria de celular, escritório virtual para o atendimento das necessidades do turista de negócios; Hotéis, mesmo os mais simples, equipados com fitness center, personal trainers, menus balanceados e dietéticos e menus sob medida a pedido Ambientes concebidos com simplicidade e bom gosto dentro do conceito “sua casa longe de casa”; Comprometimento cada vez maior do hotel com o entorno, onde estiver inserido, servindo como espaço cultural e de organização de eventos para a comunidade local; Competição mais acirrada dos meios de hospedagem para se posicionar num mercado com crescente oferta de vagas.” Já faz alguns anos que as habitações complementadas por serviços hoteleiros conquistaram o mercado, abrigando profissionais em períodos de estadia temporária, pessoas solteiras ou descasadas e, mais recentemente, casais ou indivíduos da terceira idade. Aliás, Le Corbusier já preconizava em seus artigos publicados em “Por uma Arquitetura” que, em 1922, “os domésticos estão ficando raros”, sugerindo que condomínios com serviços de manutenção cotizados seriam inevitáveis. Traz uma economia no tempo dedicado à manutenção da unidade habitacional e provoca uma flexibilização do espaço através do uso de equipamentos móveis mais leves e fáceis de transportar. Além disso, a evolução tecnológica permitiu a compactação de máquinas, especialmente na cozinha, gerando mais 58

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praticidade e facilidade de manuseio. Porém, essa é uma solução de alto custo, não ficando compatível com a realidade da maioria dos brasileiros, em especial dos aposentados. Mas outra solução, mais operacional do que física, veio compensar esse desgaste de poder aquisitivo maximizado nos últimos anos: a recente mudança de postura profissional, a partir do advento da Internet, possibilitou que houvesse a produção profissional à distância, flexibilizando espaços, resolvendo problemas familiares, principalmente de mulheres com filhos pequenos, e reduzindo o custo de deslocamento diário à empresa, tanto em transporte quanto em impactos ambientais, o que afeta positivamente toda a comunidade. Produz-se mais e melhor, e o tempo livre que pode ser dedicado ao lazer e ao aperfeiçoamento profissional também contribui para a melhoria na qualidade de vida dessas pessoas. Portanto, há aqui duas alternativas importantes e que afetam diretamente o espaço residencial e suas possibilidades. Podemos remeter as vantagens do home office também aos indivíduos aposentados, que podem continuar ou, até mesmo, criar novas atividades intelectuais. Além disso, agilizam suas vidas através de diversas comodidades, que vão de serviços bancários a pedidos de refeições, sem esquecer do importante contato com parentes e amigos como coadjuvante contra a solidão. 1.3 - A tecnologia como meio de garantir conforto e segurança aos espaços destinados ao idoso. Essas pessoas que usufruirão dessa nova visão da atividade turística, como já acontece com o pequeno, porém crescente, grupo que já a pratica, determinam um nível de exigência que se baseia na constante evolução da tecnologia, seja ela relacionada ao mobiliário, aos tecidos ou aos sistemas eletroeletrônicos de áudio, vídeo e iluminação. Assim sendo, desde o momento em que se busca uma opção de destino turístico, passando pela operacionalização desse processo até o em59


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barque, quando efetivamente começa a experiência, muitos dispositivos devem garantir aos indivíduos idosos que mantenham um nível de qualidade de vida que lhes permita esses deslocamentos. Não só o financeiro e o físico devem ser fatores determinantes de uma vida saudável, mas, também, e principalmente, o emocional, que pode ser equilibrado através de boas condições de habitabilidade e prazer nos espaços de moradia. Tal situação é sempre alcançada pelas novas descobertas e aperfeiçoamentos tecnológicos, que surgem conforme são demandadas as necessidades do mercado. “Através da história, a arquitetura tem tanto acomodado quanto restrito os comportamentos das pessoas. Daí que não é surpreendente que tenha havido considerável discussão da pesquisa comportamental aplicada ao projeto arquitetônico.”7 Hoje já contamos com dispositivos eletrônicos que possuem sensores inteligentes para captar sinais de fumaça, excesso de sol, economizar energia e até identificar os usuários da residência pela voz. Os aparelhos eletrônicos ficam cada vez mais leves e menores, e o aumento do seu consumo determina também uma redução do custo para compra. Diversos dispositivos acessórios facilitam o manuseio de móveis, além de revestimentos mais fáceis de manter e que também reduzem o trabalho doméstico. Os meios de comunicação tornam-se a cada dia mais versáteis e acessíveis, possibilitando até as operações bancárias, entregas rápidas a domicílio e outras facilidades, inclusive a educação à distância. O aproveitamento da energia solar, do gás natural e o reaproveitamento de águas servidas tornaram-se indispensáveis para a redução de consumo dos recursos naturais, pois é irreversível a necessidade de basearem-se as fontes de energia em outros princípios que não sejam somente os que dependem de petróleo ou de recursos hídricos. Pensar em conforto e segurança, hoje, significa considerar os avanços tecnológicos constantes e a descartabilidade que eles impõem. Portanto, flexibilidade nos espaços residenciais é a

única forma de ajuste possível e conseqüente atualização desse conforto. 1.4 - A transitoriedade do habitar ou a habitação portátil: quando até a tecnologia é descartável. Freqüentemente comento com os meus alunos de Projeto Arquitetônico sobre a necessidade de refletirmos quanto aos novos sistemas construtivos que as inovações tecnológicas oferecem. A busca por materiais e técnicas mais leves e perfeitos, com o intuito de acelerar o processo construtivo, comprova que o nosso habitar tornou-se mais consumível, pois passa a ter uma vida útil menor e mais sujeita aos desgastes provocados pela natureza e pelo uso. E interfere diretamente na forma como as pessoas se acomodam nesse espaço, eliminando divisórias, resumindo eletrodomésticos e readeqüando as dimensões dos móveis básicos. A própria inserção de novos equipamentos eletrônicos, facilitadores à nossas ações, passam a ser necessidades que adquirimos por força de valores repensados, tais como o uso do tempo livre, a racionalização das atividades domésticas e mudança nas relações sociais. Passamos a nos proteger dos possíveis invasores e nossas possibilidades de relacionamento com os vizinhos diminuem: muros altos, cercas eletrificadas, sistemas de segurança. Tecnologia a favor da praticidade: equipamentos eletrodomésticos compactos e eficientes, conforto ambiental através dos artifícios de criação do clima mais conveniente e racionalização do uso da cozinha por sistemas de congelamento, cocção por microondas e fácil eliminação de resíduos indesejáveis. Aparelhos de TV maiores, com tecnologia de transmissão a cabo, na tentativa de substituir as salas de cinema e computadores com programas que permitem o acesso instantâneo às informações e às pessoas em qualquer parte do mundo: ócio criativo (Domenico de Masi) que provoca a necessidade de mini-academias dentro de casa. Não é de hoje que países que se caracterizam pelo consu-

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mo resolvem economicamente a moradia de classe média através de kits de montagem escolhidos por catálogos. Mesmo na área de hospitalidade temos um exemplo marcante, apresentado pela rede Accor através dos seus hotéis Formule 1, que usam racionalização e a flexibilidade de espaço produzidos por sistemas de montagem com painéis leves. Porém, a agilidade que tal solução confere à construção representa também a fragilidade desse objeto, pois usam materiais leves, facilmente substituíveis e com algum problema de acústica, o que aumenta a hipótese de rumarmos para soluções de morar sempre em situações transitórias e sem qualquer apego com os objetos que compõem esses espaços. O equipamento que compõe esses apartamentos, também, demonstram a tendência à racionalização, conforme relato de experiência do jornalista Fernando Souza8 : “A cama de casal fica na transversal de quem entra, deixando um espaço de circulação que dista meio metro da parede. Tem uma escrivaninha, uma cadeira, uma TV de 14 polegadas (com cinco canais por assinatura), janela e um cabideiro sem portas. Uma escadinha azul com degraus tubulares leva ao alto do beliche. O espaço é bem aproveitado. (...) Há uma pia e, em portas separadas, sanitário e chuveiro... (...) Telefone no quarto não tem. Existe um aparelho público no corredor de cada pavimento. Nos andares ímpares, puseram-se máquinas de auto-atendimento, com café, refrigerantes, salgadinhos e chocolates. No hall do térreo, pode-se acessar a internet...” Outro aspecto importante para a diminuição dos custos refere-se ao serviço oferecido: não há carregadores, o café da manhã é pago à parte, usando utensílios descartáveis e numa sala confortável mas despojada. A vaga na garagem também é paga, a diária compreende o uso do apartamento para até três pessoas e tudo é pago antecipadamente. Até mesmo jardins, montados a partir de mudas desenvolvidas em estufas podem ser refeitos a qualquer tempo, e não há aquele acompanhamento que existia quando eram semea-

2 - As sensações espaciais e a exposição à violência: a cidade como um grande shopping center. A psicologia e a arquitetura têm buscado, em estudos recentes, quais as relações sensoriais dos indivíduos inseridos em espaços, quer sejam particulares, quer sejam públicos. Criou-se uma matéria já denominada Psicologia Ambiental e que desenvolve pesquisas sobre a percepção sensorial, analisando-se o bem-estar do usuário nesses espaços. Sabe-se que os estímulos provocados por cores, texturas, sons, odores e sabores podem trazer a quem os experimenta as mais diversas sensações, que são codificadas de acordo com suas experiências anteriores, além da cultura adquirida no meio familiar e social. Existe, então, a determinação de preferências

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dos, cuidados e apreciados como verdadeiras obras de criação: não há apego, apenas deleite fugaz. Se não há valores que justifiquem a permanência, se a convivência social não se amplia, se os equipamentos são descartáveis, não é difícil imaginar que o habitar pode tornar-se transitório e o pouco a que nos apegarmos poderá nos acompanhar com facilidade, pois o portaremos. Assim, um novo turista se configura, aquele que busca destinos a visitar e permanece lá até desejar novo, pois não há o que justifique não mudar. Se mesmo trabalhando pode mudarse, pois pode manter o contato virtual de qualquer lugar onde haja eletricidade, e considerando o advento da medicina preventiva que estimula a exames rotineiros de verificação das condições de saúde, a liberdade de escolha torna-se acessível e possível, e o custo dessas escolhas pouco se modifica, pois não deixam despesas permanentes pendentes. Essa transitoriedade determina uma associação da atividade turística com o próprio habitar permanente, criando alternativas que estarão relacionadas com o lazer e as necessidades de preenchimento do tempo livre. Pode ser uma tendência: possível, viável, provável....


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que estabelecerão os aspectos de conforto ambiental, equacionados de acordo com as características de cada indivíduo, considerando-se faixa etária, padrão sócio-econômico, origem étnica e cultural, dados antropométricos e de saúde, enfim, códigos que tornam cada pessoa um ser único e capaz de perceber de modo único. “Muito da moderna arquitetura tem assumido que comodidade + firmeza = prazer. No entanto, se aceitarmos o modelo vitruviano, o prazer parece ser composto tanto da estética “formal” quanto da estética “simbólica” e também “comodidade” associada a comportamento espacial, em todas as suas manifestações.”9

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Mas há motivos que transformam essa equação fundamental: situações traumáticas, alterações emocionais, submissão na convivência social. E esse pode ser o ponto que resuma, atualmente, o surgimento de diversas novas doenças associadas ao medo gerado pela violência urbana, oprimindo a liberdade de expressão, acelerando a passagem por percursos agressivos e impedindo experiências satisfatórias de percepção do espaço das cidades. E isso foi levado para o âmbito privado, pois os muros altos, as grades nas portas e janelas, as muitas formas de trancar quem estava fora acabaram por

fazê-lo com quem estava dentro, criando limites aos cinco sentidos. Além disso, essa opressão causou a necessidade de artifícios que amenizassem essa sensação de desamparo e desproteção, e o comércio passou a concentrar-se em ruas fechadas, cobertas e guardadas, imitando praças e criando climas ideais. Assim passou também a acontecer com os serviços e, pouco a pouco, com o lazer. E as cidades originais, expostas mas sinceras, que não determinam padrões de apresentação e nem selecionam seus usuários, passam a pedir socorro, pois temem não sobreviver. O comércio passa a abusar das placas, gritando para ser ouvido, e cria ruídos na compreensão das mensagens. Segundo Almeida Prado10 : “A conquista da autonomia e da independência é uma das características da cidadania e parte desse processo tem relação direta com o bem-estar do indivíduo no meio em que ele vive.” Esse desafio aos governantes municipais provocou a revisão dos conceitos e, associados a entidades que se reuniram para discutir a cidade, passaram a pensá-la estimulante, mas não despersonalizada, revitalizando praças e ruas através de equipamentos e sistemas de sinalização mais condizentes com as expectativas dos cidadãos contemporâneos e de acordo com as características regionais, num resgate de cultura para manutenção das especificidades. O conceito de shopping center transfere-se para a cidade, mas a segurança ainda representa um elemento inibidor aos passeios descontraídos, pois calçadas estreitas, em ruas de alto fluxo, iluminação inadequada e falta de policiamento acabam por reduzir o prazer da experiência do passear. Caminhar é um dos exercícios mais recomendados para todas as faixas etárias, e se essa ação de caminhar for associada a exercícios mentais de leitura em vitrines, conversas com amigos, alimentação saudável e outros motivos, as pessoas com tempo livre o ocuparão de modo sadio e proveitoso, ampliando seu prazer na convivência social. Os indivíduos da

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terceira idade são consumidores potenciais de produtos oferecidos nas ruas em lojas ou mercados, pois a procura pode se tornar uma atividade prazerosa, porém a ameaça perpetrada pela falta de segurança os afasta dessa experiência. De acordo com Moreira11 : “O mais elevado crescimento da população urbana vis-àvis o incremento da população rural resulta em um processo de urbanização do envelhecimento populacional. O processo de concentração dos idosos nas áreas urbanas é mais visível em termos absolutos, pois acompanha o movimento geral de urbanização da população. Em termos relativos, a urbanização do envelhecimento é amortecida pelo fato de que as populações rurais apresentam níveis de fecundidade mais elevados do que as populações urbanas e, conseqüentemente, estruturas etárias mais jovens, que são exportadas para as áreas urbanas através da migração, retendo os contingentes mais idosos, apresentando, assim, populações relativamente envelhecidas.” Como analisar essa situação da virada do século XXI e compreendê-la nessa proposta de hospedagem de idosos? A cidade não deveria ser ameaçadora, mas é. Os indivíduos não deveriam ser reféns de suas próprias moradias, mas são. Pensar o habitar nas cidades sem esse impacto é o desafio a ser enfrentado. 2.1 - Clusters como hipótese inicial e razões p/ não persistir: estímulo à segregação etária? Na primeira reflexão sobre a consistência do tema que escolhi para desenvolver como tese de doutorado, percebi que havia um aspecto fundamental do turismo que poderia comprometer qualquer sistematização de dados antropométricos e comportamentais dos idosos que viajam, e por um motivo muito simples: a dinâmica da sociedade da informação, que muda rapidamente e, cada vez mais, tornam descartáveis até mesmo os relacionamentos.... Analisando possíveis rumos a partir desta perspectiva, pas66

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sei a buscar informações sobre os clusters e seu processo de formação, com o intuito de perceber se haveria (ou não) a possibilidade de evolução para possíveis agrupamentos de atividades relacionadas ao lazer, à saúde e ao crescimento cultural que poderiam ser oferecidos em aglomerados habitacionais que favorecessem uma vida confortável e segura às pessoas com mais de 60 anos de idade ou que estivessem na condição de portador de necessidades especiais. Seriam como centros produtivos de assistência basicamente a pessoas idosas, mas que estariam vivendo nessa comunidade com o atendimento de todas as suas necessidades mais prementes, inclusive a de estações de embarque para o transporte a outras localidades ou áreas da cidade. Tal situação aplicar-se-ia, logicamente, às mega-cidades como São Paulo, Nova Iorque, Tóquio ou outras nesse porte. Mesmo nos raros exemplos que encontramos no Brasil, há a preocupação com a inserção no meio urbano, sem a alienação a essa dinâmica, conforme é anunciado no site do Residencial Santa Catarina, em São Paulo: “A privacidade de um apartamento, o conforto de um hotel, os cuidados de um spa, o lazer de um clube, a comodidade de estar pertinho da avenida Paulista.”12 Percebi que, mesmo considerando estruturas habitacionais com apoio de hotelaria, em unidades de pequenas, mas confortáveis dimensões, e com todo o potencial tecnológico que o mercado oferece diariamente, essa é uma visão reducionista e preconceituosa, já que, ao invés de oferecer conforto e segurança, estaria criando uma segregação mascarada pela hipocrisia de tratar essas pessoas de maneira igual e massificada, como num grande resort, só que permanente. Não oferece a convivência múltipla nem as experiências ricas que a cidade completa permite vivenciar, portanto não tem sentido como solução aceitável. 2.2 - O turista idoso com raízes frágeis e buscando motivos para manter-se vivo e participativo.

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O filme COCOON (1985 - Produção de Steven Spielberg e direção de Ron Howard) narra a estória de alienígenas que teriam vivido na Terra há milhares de anos, na Lendária Atlântida. Obrigados a abandonar o planeta às pressas, deixam alguns de seus companheiros em “Cocoons” no fundo do Oceano em animação suspensa e são transferidos a uma piscina antes de serem levados para a nova morada. Porém, moradores de um asilo vizinho à casa onde estavam os “Cocoons” depois de resgatados, descobriram que a água da piscina que os mantinham conservados possuía poderes rejuvenescedores, gerando o dilema entre a vida dos alienígenas e a saúde daquelas pessoas. Os personagens idosos que participam da trama demonstram estarem buscando objetivos que resgatem seu prazer com a vida e, ao receberem a energia extra, passam a exercer atividades prazerosas, mas já abandonadas em função das suas fragilidades físicas. Apenas um mantém-se distante e, justamente, é o que não mergulha na piscina especial, pois não deseja continuar vivendo por muito tempo. Estranha a mudança repentina na atitude dos amigos e é nesse contexto que o tema central, o desânimo com a degeneração natural do organismo, determina aspectos importantes para reflexão. As perdas naturais ao longo da vida: companheiros que morrem, a falta de atividade produtiva e reconhecida através do sucesso e da remuneração e, até mesmo, a diminuição da capacidade física de mover-se, ver e ouvir pode trazer frustrações que muitas vezes levam a processos depressivos e à falta de vontade de viver. Também as relações familiares e sociais apresentam condições nem sempre favoráveis à mudanças: na década de 50 as mulheres procuravam um espaço além do âmbito dos seus próprios lares e já passavam a determinar mudanças de comportamento (ANEXO I). A atividade turística tem demonstrado ser muito atraente àqueles que redescobrem interesses e motivações, quer seja pela experiência de visitar e conhecer novos luga-

res quer seja pela convivência com outras pessoas com características semelhantes. As cobranças familiares de convivência e controle já existem em graus bem menos significativos e, portanto, já não exigem mais encontros constantes. Além disso, conforme foi exposto no item 1.1.4, o apego a objetos e lugares está muito menor e o mercado oferece, cada vez mais, produtos consumíveis e descartáveis, fragilizando as relações do homem com seus objetos, ficando as lembranças restritas a registros fotográficos, hoje também digitalizados. Podemos transportar nossas lembranças onde quer que nos instalemos, e nossa personalidade pode ser representada de modo quase cenográfico, como uma montagem de caráter transitório e limitado. Além disso, o consumo do produto turístico assim pensado gera um outro prazer que hoje existe em empreendimentos que praticam o sistema de tempo compartilhado ou time sharing: períodos de média duração, com propriedade da unidade no imóvel naquela temporada e podendo comercializá-la, geralmente em hotéis localizados em estâncias hidrominerais ou praias. Há mais tempo para decidir como e onde utilizar esse tempo, criando condições mais prazerosas ao adaptarse o tempo utilizado ao ritmo de cada indivíduo. Mais ainda, a liberdade de mudar a qualquer momento sem estar atrelado a um programa pré-determinado e nem subjugado às decisões de um grupo guiado. Os meios de informação ágeis ora disponíveis dão conta de estimular novos programas e meios de visitação, com independência e adequação ao orçamento desses indivíduos. Portanto, ao invés de pensar a estadia em temporadas nesses empreendimentos, podemos imaginar possíveis passagens por eles no caminho para novos destinos, ou seja: temporadas em lugares diferentes, sem considerar o retorno para “casa”, já que ela é, agora, o lugar onde se está, e não há a necessidade do retorno, mas a ampla e variada possibilidade de novos lugares. Pressupõe-se a oferta do serviço, e não mais a propri-

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edade, tal como funcionam nos serviços de um apart-hotel. Como ficar deprimido numa perspectiva de vida assim? 2.3 - O “turismo” virtual como produto para uma sociedade das experiências descartáveis. Baseado num conto de Philip K. Dike, chamado “We Can Remember It For You Wholesale”, foi realizado um filme protagonizado por Arnold Schwarznegger, Total Recall (1990 – Dirigido por Paul Verhoeven e escrito por Ronald Shusett), onde o personagem comprava um pacote de viagem virtual e adquiria, também, um chip a ser implantado no seu cérebro, que o manteria com a memória de todas as sensações advindas dessa experiência. Já Woody Allen protagonizou em Sleeper (1973 – Dirigido por Woody Allen e escrito por Woody Allen e Marshalll Brickman) um personagem, Miles Monroe, que vivia 200 anos no futuro e que utilizava equipamentos que supriam o contato físico para a satisfação de suas necessidades eróticas, preconizando os prazeres virtuais quando os computadores pessoais ainda eram um sonho ou um argumento de ficção científica. Esses autores, visionários ou, simplesmente, criativos, anteviram meios de usar máquinas como dispositivos para satisfação de desejos, de modo racional, prático e sem riscos. Em ambos algo inesperado derruba essa certeza, e um novo sentido deve ser tomado em prol da naturalidade das experiências reais. Porém, tal como preconizado nesses filmes, discutem-se temas como escassez de recursos, mudanças de comportamento e aceleração da sociedade, premida pela urgência de informações que os meios rápidos de comunicação geraram. Tal aceleração, mais do que exigir velocidade física, quase obriga aos consumidores que se mantenham sempre atualizados quanto a tendências, rumos da economia global e transitoriedade dos relacionamentos sociais, fragilizando as raízes desses indivíduos e o contato com seus lugares de atuação. Assim, não só a competitividade profissional (e a conse-

qüente disputa por honorários mais gratificantes...), como também as dificuldades de deslocamento, que os custos das viagens têm gerado, faz-nos pensar sobre o advento dessa forma de conhecer lugares, e não apenas por imagens e sons limitados em pequenos aparelhos eletrônicos. Para quem desejar lugares longínquos e não possuir rendimento compatível com os custos que seriam gerados, tal recurso poderia satisfazer essa necessidade e por um prazer semelhante, mesmo artificial. Todos os sentidos deveriam ser satisfeitos, e a memória da experiência armazenada, mesmo que por um breve tempo. Construir registros pictográficos já não se constitui um mistério, a partir dos softwares de fotografia e construção de imagens, já amplamente utilizados. No que tange às necessidades dos idosos, somam-se aos argumentos anteriormente citados motivos para preenchimento do tempo livre e a criação de objetivos para manterem-se auto-estima e equilíbrio emocional, já que a longevidade em franco crescimento fará com que surjam aqueles indivíduos saudáveis fisicamente, mas fragilizados pela espera do fim, se não direcionarem suas intenções para atividades produtivas, quer sejam relacionadas a praticar a fé, quer sejam saciar sonhos. Não se podem descartar hipóteses como essas...

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2.4 - As acomodações turísticas e as perspectivas de projeto dentro do conceito de Desenho Universal. Nessa fase de conjecturas, sinto-me impelida a buscar precedentes notáveis quanto a instalações hoteleiras e habitações destinadas a acomodar comunidades da terceira idade. Há exemplos importantes espalhados pelo mundo, assim como há novas iniciativas na busca de soluções mais arrojadas e adequadas ao público idoso contemporâneo. Considerando o aumento da longevidade, causado pela melhoria da saúde através dos avanços da medicina, a capacidade física das pessoas também melhorou, o que estimula ainda mais a busca por atividades que preencham o tempo livre e determinem um complemento de experiências que dêem


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sentido à vida das pessoas. Assim como se explica que o turista que se afasta do seu contexto social e assume atitudes completamente opostas, tais como usar roupas muito diferentes (até ridículas), participa de programas que não aceitaria normalmente e, aparentemente, muda sua personalidade, as pessoas que deixam uma rotina profissional de muitos anos, e mesmo as que convivem diretamente com elas, necessitam relaxar quanto às cobranças impostas para que seja mantido um nome, uma atitude, um currículo. Espaços concebidos a partir da variedade de necessidades que esses indivíduos trazem consigo podem atender a esse anseio por bem-estar. A arquiteta Cybele Barros desenvolveu um trabalho sobre a arquitetura para a maturidade13 : “É interesse do setor técnico que os projetos das moradias e das áreas de comércio, indústria e de serviços atendam às necessidades dos usuários, fornecendo condições de habitabilidade e de trabalho que permitam o melhor aproveitamento com o máximo conforto, praticando custos compatíveis com estas necessidades. Neste aspecto toma força e se impõe firmemente a adoção de parâmetros construtivos que atendam ao conceito de Desenho Universal, onde diretrizes e indicadores balizam as condições adequadas para o pleno atendimento às necessidades da população atual como um todo.” Assim, analisar hotéis que recebem públicos de faixas etárias variadas e, com a mesma sistematização, analisar condomínios concebidos e ocupados para a terceira idade, certamente trará informações importantes quanto às condições recomendáveis para cada atividade, ou mesmo, à fusão delas. Quanto à acessibilidade, atender a esses requisitos de modo a garantir segurança e conforto é uma prioridade que já faz parte incontestável de qualquer análise espacial quanto a recomendações de projeto arquitetônico. “A importância de adequar os espaços a todas as pessoas vem sendo gradativamente absorvida pelos responsáveis pela criação de espaços, objetos e produtos. Esse conjunto de

ações faz parte de um processo visto como um caminho sem volta.”14 O Desenho Universal atenderá as exigências que garantam a inclusão física de quaisquer indivíduos nesses espaços projetados, mas certamente não garantirá a interação, já que depende de outras questões de matriz cultural, que dependerá sempre do público alvo a quem se destina o empreendimento.

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Bibliografia: ALMEIDA PRADO, Adriana Romeiro de (coord.). Município Acessível ao Cidadão. São Paulo: Fundação Prefeito Faria Lima – CEPAM, 2001, 276 p. BARROS, Cybele F. M. de. Casa Segura – uma arquitetura para a maturidade. Rio de Janeiro: ed. Papel Virtual, 2000, 115 p. LANG, Jon, BURNETTE, Charles, MOLESKI, Walter, VACHON, David. Questões Emergentes em Arquitetura. Acesso em abr./2004. In: http://www.unb.br/fau/pos_graduacao/cadernos_eletronicos/ questoes_emergentes/questoes.pdf LEOPOLDO, Ana Maria & MENAI, Tânia. Jovem dos 30 aos 60 anos. São Paulo: ed. Abril, revista Veja, ed. 1806, 11/06/2003. MOREIRA, Morvan de Mello. Envelhecimento da População Brasileira: aspectos gerais. In: http:// www.abep.nepo.unicamp.br/docs/anais/PDF/1998/a252.pdf SOUZA, Fernando. O hotel de R$ 39,00. São Paulo: ed. Abril, revista Veja SP, 22/08/2001, p. 29 e 30. YASOSHIMA, José Roberto & OLIVEIRA, Nadja da Silva. Turismo na Sociedade Pós-Industrial: tendências e perspectivas. In: http://www.abbtur.com.br/CONTEUDO/trabalhos/trab05.htm

NOTAS: 1 YASOSHIMA & OLIVEIRA – Turismo na Atividade Pós-Industrial: Tendências e Perspectivas. 2 MOREIRA, Morvan de Mello – Envelhecimento da População Brasileira: Aspectos Gerais. 3 LEOPOLDO & MENAI – Jovem dos 30 aos 60.


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4 Yasoshima e Oliveira in Turismo na Atividade Pós-Industrial: Tendências e Perspectivas. 5 MOREIRA, Morvan de Mello – Envelhecimento da População Brasileira: Aspectos Gerais. 6 YASOSHIMA & OLIVEIRA – Turismo na Atividade Pós-Industrial: Tendências e Perspectivas. 7 LANG, Jon, BURNETTE, Charles, MOLESKI, Walter, VACHON, David. Questões Emergentes em Arquitetura, p. 12. 8 SOUZA, Fernando – O hotel de R$ 39,00 (Revista VEJA SP) 9 LANG, Jon, BURNETTE, Charles, MOLESKI, Walter, VACHON, David. Questões Emergentes em Arquitetura, p. 14. 10 ALMEIDA PRADO, Adriana R. de – Ambientes Acessíveis in Município Acessível ao Cidadão. 11 MOREIRA, Morvan de Mello – Envelhecimento da População Brasileira: Aspectos Gerais. 12 Site do Residencial Santa Catarina na internet - http// :www.residencialsantacatarina.com.br 13 BARROS, Cybele – Casa Segura: uma arquitetura para a maturidade. 14 ALMEIDA PRADO, Adriana R. – Ambientes Acessíveis in Município Acessível ao Cidadão.

CAPACITAÇÃO PROFISSIONAL: O PARADIGMA DO AMBIENTE CONSTRUÍDO SUSTENTÁVEL

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Marta ROMERO, Arquiteta, Doutora; Daniela Diniz, Arquiteta, Mestre; George Da Guia. Programa de Pós Graduação – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Brasília – UnB – ICC Norte 70910-900 – Tel 307 2454 bustosromero@terra.com.br

RESUMO Este trabalho apresenta projeto estabelecido em quatro cidades, duas capitais brasileiras e duas cidades estadunidenses. O objetivo principal consiste, no desenvolvimento e na aplicação de teorias instrumentais para o ensino e para a formação de arquitetos e urbanistas que contribuam para o conhecimento e para a identificação das necessidades reais da comunidade, seus interesses e formas de participação, e na incorporação desses conhecimentos aos programas de graduação de arquitetura. Com particular enfoque nos desenvolvimentos local e global, o modelo de interação multidisciplinar e transdisciplinar, com inscrição de rede acadêmica internacional, tem oferecido uma plataforma única para a elaboração de indicadores de sustentabilidade. Ao enfocar cidades de diferentes regiões, em distintos estágios de desenvolvimento e com particulares antecedentes sócio-econômicos, o trabalho tem propiciado uma melhor compreensão das similaridades e das diferenças relacionadas às diretrizes, aos desafios e às potencialidades para uma definição de projeto e para um ambiente construído sustentável. Embora cada local estudado enfrente desafios particulares e apresente forças atuantes com diferentes capacidades, já identificamos um importante elemento comum, indutor da exclusão, do desperdício e do extermínio de recursos: a inadequada formação técnico-profissional. A partir de relações de troca comunitária, habilita os alunos de arquitetura e urbanismo a distinguir e a resolver as necessida-


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des de habitat da “população periferizada”, contando com o conhecimento e os recursos dessa mesma população. A concretização de canais que sistematizem trocas de informações, associados a mecanismos participativos de interlocução e inclusão técnica, tem facilitado na identificação e no atendimento das necessidades das comunidades, bem como no apoio ao desenvolvimento de suas potencialidades, além de, paradoxalmente, resgatarem as qualidades do lugar, atenuarem, em médio prazo, os impactos da ocupação urbana desordenada e reduzirem, em curto prazo, os desperdícios gerados pelos deslocamentos intra-urbanos. Complementa a formação acadêmica do estudante ao configurar e ao tentar responder às demandas das parcelas de moradores excluídos. Palavras chave: Capacitação profissional – Sustentabilidade – Urbanismo – Educação – Habitat. 1. APRESENTAÇÃO A intensificação dos níveis de danos e de comprometimento ambiental no País é visível. O território do Distrito Federal, após décadas de urbanização de terras públicas, não escapa deste quadro crítico, particularmente nas áreas afetadas por uma urbanização de natureza periférica, caracterizada pela redução da qualidade de vida, fruto de planos e de desenhos urbanos insatisfatórios. A população pobre e ignorante (de seus direitos e de como lidar com a imposição de um desenho urbano desestruturador da sua comunidade, mas com muito conhecimento prático de sustentabilidade na região do cerrado) distribuída ao longo de periferias das capitais brasileiras, não consegue ver suas necessidades de habitat espelhadas no ambiente construído em que mora; mesmo destituída de canais de expressão competentes, ainda que despojada de vocabulário, de recursos físicos-financeiros e de competência técnica, atua intensamente sobre o ambiente urbano. Ao não encontrar respostas arquitetônicas às suas demandas, acentua o processo contínuo de degradação e de desfiguração dos ambientes locais iniciado pelo Estado. 76

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Em estudos anteriores (Romero, 1996, 1999, 1999 a), detectamos, que no processo de periferização, o ato de degradar o urbano decorre, muitas vezes, de lacunas na caracterização da demanda (necessidades e intenções) e de imperícias técnicas no desenvolvimento da intervenção (ações e propostas); por exigirem reflexão, constituem um singular material para estudos críticos e, principalmente, para a elaboração de situações propícias à criação, à formulação e à renovação da situação a ser diagnosticada e resolvida pelo projeto arquitetônico. Citamos, à guisa de exemplo: partidos urbanísticos que em nada lembram os assentamentos de origem; alteração das relações entre as escalas pública e privada, e conseqüente supressão da escala semi-pública; implementação de sistemas viários excludentes, determinando a utilização majoritária do automóvel para deslocamentos cotidianos; vulgarização da previsão de equipamentos comunitários etc. É na lógica do “consumo urbano” que alguns conceitos diretamente afetos ao exercício do arquiteto são elaborados: a pobreza é associada ao baixo desempenho educacional; a falta de escolaridade é convertida em causa da degradação ambiental; os baixos padrões de vida são devidos à limitada capacidade de iniciativas de amplos setores da população; ser cidadão passa a ser sinônimo de pessoa provida de educação formal. Esta ideologia resgata a educação como fonte de novo iluminismo. Neste contexto, proliferam teorias que colocam o conhecimento, a comunicação ou a informação no centro da vida social. A educação à distância tem sido evocada como solução para grande parte das carências do homem contemporâneo. Novos implementos técnicos – chats, cursos on line, vídeo aulas etc potencializam o ensino formal à distância, reforçando este conceito. Sugerem a intensificação do esforço educacional e a ampliação do seu alcance social. As tecnologias educacionais dão a crer que possam atenuar disparidades em várias partes do mundo. O ensino da arquitetura e do urbanismo, particular-

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mente o de projeto, tem se voltado, desde muito, para práticas e didáticas que reforçam essa lógica de ênfase em sujeitos e em objetos, desvinculados do cidadão brasileiro. Novas tecnologias vêm incrementar, ainda mais, uma tendência que já é antiga. Diferentemente de uma “clássica” proposta de ensino à distância, nossos propósitos têm um duplo enfoque: Por um lado, a partir de relações de troca comunitária, habilita os alunos de arquitetura e urbanismo a distinguir e a resolver as necessidades de habitat da “população periferizada”, contando com o conhecimento e os recursos dessa mesma população. Em um primeiro momento, o exercício acadêmico, respaldado na realidade factível, explicita as várias competências profissionais do arquiteto atualmente delegadas ao arbítrio; posteriormente, complementa a formação acadêmica do estudante ao configurar e ao tentar responder às demandas dessa parcela de moradores do DF e de seu entorno; Por outro lado, por intermédio de pequenas intervenções, oferece subsídios técnicos para as comunidades que habitam o espaço urbano através de propostas práticas dos estudantes de arquitetura, procurando contribuir para a revitalização das complexas situações de áreas urbanas degradadas, bem como considerar as práticas fundadas e detidas por essas comunidades, advindas de um uso sustentável do ambiente. O objetivo principal consiste, então, no desenvolvimento e na aplicação de teorias instrumentais para o ensino e para a formação de arquitetos e urbanistas que contribuam para o conhecimento e para a identificação das necessidades reais da comunidade, seus interesses e formas de participação, e na incorporação desses conhecimentos aos programas de graduação de arquitetura. Com isso, distinguimos claramente, para professores, pesquisadores e alunos participantes, os ingredientes básicos das

relações complexas que se manifestam nas condutas profissionais de arquitetos e urbanistas: incerteza, imprevisibilidade, multiplicidade. Diferenciam-se, portanto, de um mero saber operacional, implicam o abandono do sonho de uma “fórmula única” e demandam a convivência com os sujeitos em seus habitats. Ao “mal-estar na cultura”, onde a técnica tem levado à uma alienação, procura-se interpor um “tempo lento”, quando o contínuo refazer leva à manutenção do ambiente por força de “rituais de cooperação”. Para oferecer à comunidade – acadêmica e social – o exercício da cidadania, faz-se necessário sinalizar os caminhos e os mecanismos metodológicos. Relacionar Ensino e Direito talvez seja a principal característica de um processo atípico e singular, que denominamos de “projeto comunitário sustentável”.

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1.1 Projeto comunitário sustentável É importante e indispensável salientar que um projeto comunitário sustentável não visa desenvolver padrões ou sistemas de construção que dialogam, hermeticamente, com o desenho. O projeto comunitário sustentável é algo além do objeto concreto. Ele busca estudar os caminhos da conscientização ambiental. Assim, seguindo uma metodologia desenvolvida pela convivência com os sujeitos em seus habitats, e com a identificação de suas necessidades mais imediatas, é iniciado um processo de aproximação da equipe – professores e alunos – com os moradores e, em seguida, da interação de ambos no desenvolvimento da proposta e na execução da obra. O projeto comunitário é observado como atividade complementar ao projeto pedagógico que se configura na inserção do aluno, em qualquer período do curso de arquitetura e urbanismo, para a realização de programas, ações, projetos e obras que façam uma dimensão social explícita, a ser desenvolvida por práticas profissionais que impactem, concretamente, a população carente das periferias urbanas.


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A construção de equipamentos urbanos em comunidades carentes somente se realiza de maneira satisfatória se for o resultado de uma ação que possa corresponder às demandas das mesmas (Freire, 1996). Porém, aqui se colocam banais, mas importantes questões: Como identificar e qualificar demandas reprimidas? Como fazê-las expressar seus direitos, muitas vezes chamados de necessidades? Como qualificar, junto a essas demandas, o papel do arquiteto? Como enfocar, para cyberestudantes de arquitetura, o estudo dessas comunidades periféricas? O projeto urbano, por sua vez, é visto como um dos instrumentos de transformação social, ao lado de outras propostas e ações, e o lugar é onde estão enraizadas as experiências, táticas e práticas simples que formam uma biblioteca invisível de soluções para a construção de uma ambiente sustentável e para a formação profissional do arquiteto (Spink, 2001). O desenvolvimento de comunidades sustentáveis implica no delineamento de um ou mais modelos de qualidade de vida comunitária, envolvendo: · Objetivos ambientais claros e fisicamente tangíveis; · Objetivos sócio-econômicos justos e individualmente passíveis de avaliação; · Objetivos políticos dignos que possam ser avaliados pelas instâncias de participação e representação comunitária, bem como pela diversidade dessa representação. As ações se justificam em torno da interação e da relação estabelecida entre os sujeitos e seus espaços de vida, considerando a influência do ambiente no indivíduo. Conforma-se a hipótese de que a ação no ambiente, levando à vitalidade, à dignidade e ao equilíbrio, insere o sujeito em uma situação, a um lugar de fala, a um espaço de direito. Espera-se, ao longo do desenvolvimento do Projeto, relatar modificações no discurso relativo ao Espaço Ambiente e em mudanças nas condições de acesso à fala e à formulação de encomendas sociais, conseguidas a partir de metodologia especifica.

1.2 Paradigma do ambiente construído sustentável A concretização de canais, ou relações de aliança, que sistematizem trocas de informações, associados a mecanismos participativos de interlocução e inclusão técnica, tem facilitado na identificação e no atendimento das necessidades das comunidades, bem como no apoio ao desenvolvimento de suas potencialidades, além de, inexoravelmente, resgatarem as qualidades do lugar, atenuarem, em médio prazo, os impactos da ocupação urbana desordenada e reduzirem, em curto prazo, os desperdícios gerados pelos deslocamentos intra-urbanos. A expansão do pensamento ambientalista nos últimos anos, aliada ao poder reivindicatório da sociedade civil organizada, fez com que a maioria dos ordenamentos urbanos inserisse em seus textos normativos - planos diretores, códigos de posturas etc - a tutela do equilíbrio sócio-ambiental. Esse fato indica que novos valores estão se consolidando configurados em direitos individuais e sociais, o que leva a crer numa possível reconciliação entre as unidades ambiente-homem-desenvolvimento. Depois da Conferência do Rio em 1992 e do Habitat II em 1996, houve uma mudança na abordagem do problema da sustentabilidade. As principais razões para este fato advêm da conclusão de que as cidades constituem uma realidade que pode ser transformada para melhor, em vez de constituírem apenas um problema a ser evitado. No novo modelo, ainda não plenamente consolidado, a coletividade, por meio de suas instituições representativas, participa da formulação, implementação e gestão da totalidade de ações desenvolvidas pelo ente público. Neste cenário, desde que se efetive o modelo cooperativo, é possível consolidar o Estado Democrático, por co-responsabilizar a coletividade e por estimular a edificação da cidadania. Aqui, fica implícito que o cidadão atua e constrói direitos e deveres sócioambientais a partir do exercício da cidadania, seja em movimentos sociais, seja em Conselhos, seja em pranchetas uni-

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versitárias, figurando como sujeito ativo. No entanto, esse modelo ainda não conseguiu inserir-se na prática como instrumento democrático para discussão e formulação de políticas e projetos urbanos. Muitas ONG’s têm procurado construir um modelo participativo, discutindo, formulando e, em alguns casos, denunciando os mecanismos empregados pelo Estado ou iniciativa privada na elaboração de instrumentos normativos urbanos, no desenvolvimento de projetos de assentamentos populares, na formulação de planos diretores e na ocupação do solo urbano. A Universidade, na maioria das vezes, tem ficado de fora deste Processo. Logo, a eficácia daquele modelo de cooperação EstadoColetividade exige consciência de participação, autonomia em relação às tentativas de imposições do Estado e pleno exercício da cidadania, assegurando a construção de novos padrões de formação profissional e de desenvolvimento sustentável, onde reste consolidado o equilíbrio sócio-ambiental. A formação de Consórcio Acadêmico de Cooperação representa uma tentativa de aliança para a criação de oportunidades e para a superação de carências regionais. Inicialmente se constituem como fóruns voluntários para mobilização de recursos e preocupação, “parecem que levam tempo e bastante disposição política para serem criados, mas são difíceis de parar uma vez iniciados” (Spink, 2001). Trata-se de novo arranjo pedagógico, a que chamamos de uma “nova academia social”, que se refere não ao desenho de prédios e casas, mas ao desenho e construção de organizações e formas de coordenação entre diferentes organizações e locais (Spink, 2001). O Programa de Consórcio em Educação Superior CAPES/FIPSE apresenta um projeto estabelecido em quatro cidades, duas capitais brasileiras (Brasília e Porto Alegre) e duas cidades estadunidenses (State College e Syracuse). Com particular enfoque nos desenvolvimentos local e global

– mediante uma aproximação colaborativa, multidisciplinar e participativa, combinando pesquisa, projeto urbano, projeto de produto e capacitação recíproca – o modelo de interação multidisciplinar e transdisciplinar, com inscrição de rede acadêmica e comunitária internacional, tem oferecido uma plataforma única para a elaboração de indicadores de sustentabilidade. Embora cada lugar estudado enfrente desafios particulares e apresente forças atuantes com diferentes capacidades, já identificamos um importante elemento comum, indutor de exclusão, do desperdício e do extermínio de recursos: a inadequada formação técnico-profissional. Este programa visa desenvolver e compartilhar um currículo interdisciplinar, aplicável tanto para os alunos brasileiros como para os americanos através do Programa de Consórcio em Educação Superior CAPES/FIPSE. Busca preparar profissionais para trabalhar as estratégias relativas ao Projeto Urbano Sustentável e à Ação Comunitária baseada na Gestão de Recursos, como passos necessários à diminuição da pobreza urbana e ao incremento da saúde e do bem estar da comunidade. O projeto inclui universidades, ambientes urbanos e organizações não governamentais nos Estados Unidos e no Brasil (figura 1), com as seguintes compensações bilaterais no ensino da arquitetura: Brasil, teoria e projeto urbanos em contextos de exclusão e miséria; Estados Unidos, ação e serviço comunitários pela gestão de recursos (humanos e ambiental). As instituições integrantes são as seguintes: · Universidade de Brasília – UnB, líder Brasil; · Universidade de Rio Grande do Sul – UFRGS, parceira Brasil; · The Pennsylvania State University – PSU, líder USA; · The State University of New York at Syracuse – SUNY, parceira USA.

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· Produtos urbanos ambientais: mapeamento e análise de sistemas, planejamento ambiental e de bacias hidrográficas; · Pobreza urbana: repensando a pobreza e construção e com os recursos orgânicos da comunidade; · Aplicações da informática e transferência de técnicas: aplicação do SIG e tecnologias comunitárias.

A programação inclui ações de aquisição da língua e ensino interdisciplinar presencial para a compreensão do contexto urbano. Analisando o ambiente e a infra-estrutura na escala de bacia hidrográfica e da vizinhança, o programa prepara os alunos para obter uma compreensão ambiental nas escalas macro e micro. Por exemplo do estudo, da análise e do diagnóstico da forma de uso e ocupação do solo urbano, podemos identificar os níveis de degradação do meio natural e sua influencia na qualidade de vida da população. Desta forma, os resultados do programa poderão contribuir para que as comunidades pobres e excluídas sejam capazes de tomar decisões e influir no incremento do seu habitat. O ponto central do interesse de cada instituição é preparar os futuros arquitetos para trabalhar em beneficio da cidade sustentável e na criação de ambientes saudáveis (ambiente e sistemas naturais, economias locais, equidade social e habilitação de comunidades), considerando: · Envolvimento da comunidade: planejamento e projeto participativo; · Conhecimento das questões de âmbito público: pesquisa aplicada direcionada ao incremento da vida cívica;

1.3 Estrutura das disciplinas acadêmicas O consórcio CBPS foi criado com a intenção de incrementar a formação profissional do arquiteto e urbanista, criando dentro do programa de graduação disciplinas que trabalhem com premissas de sustentabilidade, projeto participativo, arquitetura da paisagem e eficiência energética. Teorias instrumentais contribuem para o conhecimento e identificação das necessidades reais da comunidade, seus interesses e formas de participação. No primeiro ano do consórcio, no primeiro semestre de 2003, a disciplina de Projeto da Arquitetura – Problemas Especiais – PAPE, foi reformulada passando a ter um enfoque maior na teoria do projeto participativo sustentável. A Vila Varjão foi escolhida como local de trabalho, e as categorias estruturadoras do ambiente urbano – ambiental, identidade, vulnerabilidade e mobilidade – foram trabalhadas para a preparação de um diagnóstico que retratasse a realidade local. Embasamento teórico e metodologia de pesquisa foram fundamentais para a elaboração do produto final. No segundo semestre de 2003, a disciplina tomou outra forma e se tornou Ateliê de Projeto de Arquitetura e Urbanismo Sustentável. Os objetivos foram mudados e o enfoque trabalhado o foi também. A disciplina se tornou mais prática, a parte teórica foi composta pela bibliografia dada pelos professores, mas também pelo material produzido em PAPE. Houve aprofundamento na parte de pesquisa da comunidade, onde novos procedimentos para recolher dados foram empregados, além de ser elaborada uma proposta de intervenção.

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Figura 1 – Organograma Consórcio.


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1.4 Métodos para coleta de dados e investigações de campo A Vila Varjão foi escolhida a partir da movimentação existente na comunidade em favor de melhoria de qualidade do ambiente. Isso tem favorecido a análise das etapas do trabalho e a futura comparação de discursos e motivações com habitante de outra área a ser definida. O maior desafio desta etapa relaciona-se a um momento posterior do trabalho: como medir resultados e quais resultados medir para confirmar as ações que de fato são sustentáveis para o ambiente urbano. Etapas para coleta de dados: - levantamento bibliográfico; - identificação, por intermédio de indicadores socioeconômicos, das características da população; - pesquisa de campo: questionários estruturados; - pesquisa de campo: cadastro físico-territorial; - aproximação equipe e habitantes: dinâmicas de grupo; - pré-diagnóstico, identificando e confirmando demandas reprimidas: dinâmicas de grupo; - Identificação, através da participação comunitária, de facilidades, potencialidades e obstáculos nos processos de: estruturação das demandas comunitárias; formulação de demandas e sua transformação em encomendas de serviço; encaminhamento a instituições; implantação de soluções/ propostas; - pesquisa sobre perfis institucionais: rede comunitária, rádio comunitária e levantamento de formas institucionais de acolhimento de encomendas sociais. 2. A ORDENAÇÃO DO ESPAÇO ARQUITETÔNICO Dentro da amplitude de ação da prática arquitetônica é reconhecido um corpo central de conhecimento que se situa no campo mais específico do espaço edificado, intra e interedificações. Na direção da escala menor, são estabelecidas relações de parentesco com o desenho do objeto; na direção da escala maior, com o planejamento regional. Mas, estes con86

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figuram campos outros, com teoria e método que lhes são específicos, embora ambos se relacionem com a escala “intermédia”, ou seja, com a escala do espaço arquitetônico propriamente dito. É esta relação, a qual deve ser entendida como mutuamente alimentadora entre as várias escalas, que exige a realização de um trabalho multidisciplinar, não apenas entre aqueles que tratam dos aspectos distintos de uma mesma escala, mas também entre aqueles que lidam com escalas distintas do meio ambiente em sua globalidade. A necessidade de pontes entre as várias escalas referidas exige que as escolas de arquitetura incluam, em sua atuação, atividades que esclareçam, fundamentalmente, as relações entre o desenho do objeto e o espaço da edificação, assim como entre o planejamento regional e o espaço da cidade. Por outro lado, a abordagem analítica e, principalmente, didática, da ordenação do espaço arquitetônico, exige sua caracterização em função de determinados aspectos que a constituem. Em outras palavras, o espaço ordenado, para fins humanos, constitui pelos menos: · um artefato, pelo qual também se ordena a prática humana, através de sistemas de barreiras e permeabilidades de vários tipos, que criam diferenciações ou hierarquias espaciais congruentes com determinados modos de interação social; · um filtro, que, interagindo com o meio ambiente do sítio físico, pode ou não modificar essas condições no sentido de melhor adequá-las às nossas exigências biológicas, face às atividades desenvolvidas; · um símbolo, pelo qual a identidade cultural se reconhece, se reproduz e/ou se transforma; · uma apropriação e/ou transformação de materiais da natureza, resultando na realização de elementos - chãos, paredes, tetos -pelos quais se define o espaço da Arquitetura, seja ao nível do simples edifício, seja ao nível do assentamento humano maior.

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As categorias sugeridas acima abrigam, aproximadamente, os grandes eixos em torno dos quais tem se dado à organização didática e a investigação em sustentabilidade, naquilo que diz respeito aos aspectos constituintes do nosso objeto de trabalho ou, dito de outra forma, o papel que a arquitetura exerce enquanto “modificador” de circunstâncias anteriormente dadas. São muitas as disciplinas que se ocupam do ambiente físico em que se move o homem, da física à geografia, da climatologia à topografia; isso nos obriga a especificar o ponto de vista do objeto e finalidade de nossa disciplina. A Arquitetura é uma resposta significativa, ou seja, poética, ao problema do habitar; projeta e constrói todo o ambiente físico de acordo com este objetivo. Não existe cidade homogênea, pelo contrário, há uma diversidade interna que merece ser respeitada e assumida como um recurso. A cidade surge, portanto, resultante de uma dualidade entre a estrutura acumulada de memória e a materialidade física, onde o tempo se apresenta como elemento unificador desses acontecimentos, estabelecendo uma relação de continuidade entre o presente e o passado através do papel determinante da memória coletiva dos habitantes. O projeto sustentável exige propostas para a estruturação do ambiente, estas propostas dizem respeito à definição espacial dos serviços do habitar humano, em toda a escala dimensional. No contínuo aprendizado do projeto reencontramse os traços principais de uma formação pré - científica: o fazer prevalece sobre o saber, o implícito sobre o explícito, a intuição sobre o raciocínio, e a correção dos erros sobre a sua prevenção. O desenho, linguagem abstrata utilizada do projeto, tem sido empregado como um fim, e não como um meio. Sua abstração se manifesta através de formas desligadas do uso do espaço arquitetônico, dos materiais, da técnica de construção, do processo de produção. A pesquisa da realidade, executada através do desenho desta realidade, permitirá a su-

peração de tal abstração. A busca de conhecimento deve impregnar, passo a passo, todos os ramos do projeto urbano sustentável. Deve, ao mesmo tempo, incorporar integralmente os aspectos ambientais no processo formal de materialização, como elementos práticos e instrumentais que permitam recriar, no desenho, sua adequação a cada meio, cultura e realidade. Realizado de uma maneira ativa, o acesso ao conhecimento científico põe em jogo os recursos intelectuais: sensibilização, observação, correlação, classificação, análise, imaginação, experimentação, comprovação, síntese. É preciso que o aluno, a comunidade, professores e profissionais se sintam interessados pelo conteúdo e se comportem como agentes e atores da sua própria atuação, Batista, 2002. Dentro dessa ótica, há uma renúncia em apresentar o saber como um edifício impressionante, acabado e definitivamente compartimentado. A preparação de um profissional comprometido com a realidade nacional e regional requer sensibilizá-lo para que haja reconhecimento das potencialidades locais e a demanda: · Analisar a pobreza urbana e o comprometimento ambiental através de métodos teórico e prático; · Desenvolver projeto sustentável e ação comunitária baseada na gestão de recursos; · Envolver comunidades locais através de métodos participativos e aplicação de instrumentos advindos da estruturação dos projetos desenvolvidos dentro das disciplinas acadêmicas. A coerência entre o ensino e a realidade será feita mediante uma estrutura de disciplinas, assim caracterizadas: · Que apresentem o sentido de mutabilidade, ou evolução, da própria realidade, (objetivos voltados para as necessidades reais da sociedade e métodos que permitam o equacionamento dos problemas apresentados pela concretização de tais objetivos); · Que sejam aplicáveis à realidade em questão (evitando a transposição pura e simples de modelos, aplicáveis a ou-

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A maioria da população das periferias das grandes cidades é a parcela populacional carente de assistência em quase todos os serviços sociais prestados por empresas privadas e estatais. Um deles é o planejamento urbano, onde os habitantes da periferia não conseguem ver suas necessidades de habitat espelhadas no ambiente construído em que mora. O urbanismo sustentável refere-se à manutenção e preservação da diversidade de culturas, valores e práticas existentes, que integram ao longo do tempo, as identidades dos povos, quer dizer, apóia-se na sustentabilidade cultural, aquela que segundo Sachs (1993) busca de raízes endógenas dos modelos de modernização e dos sistemas rurais integrados de produção, privilegiando processos de mudança mo seio da continuidade cultural e traduzindo o conceito normativo de ecodesenvolvimento em uma pluralidade de soluções particulares, que respeitem especificidades de cada ecossistema, de cada cultura e de cada local. Assim como na sustentabilidade social quando objetiva a melhoria da qualidade de vida e redução dos níveis de exclusão. Quer dizer, entendida como a consolidação de um processo de desenvolvimento baseado em outro tipo de crescimento e orientado por outra visão do que é a boa sociedade. O objetivo é construir uma civilização do “ser”, em que exista maior equidade na distribuição do “ter” e de renda, de modo a melhorar substancialmente os direitos e as condições de amplas massas de população e a reduzir a distância entre os padrões de vida abastados e não abastados. Tendo visto a abordagem ambiental, acrescentou-se ainda a mobilidade e a vulnerabilidade da comunidade como temas

importantes no estudo do projeto comunitário sustentável, resumindo em quatro categorias a estruturação do ambiente urbano: ambiental, identidade e patrimônio cultural, vulnerabilidade, mobilidade. Tais categorias são as mais representativas do que seja a problemática de uma comunidade; sua descrição elaborada em PAPE, 2003, se apresenta abaixo: Ambiental Þ tema abordado pela importância bioclimática, de conforto (térmico, acústico, luminoso, ambiental), apropriação do solo, equipamentos urbanos e infra-estrutura. É importante verificar a relação do homem com o meio no qual ele está inserido, não só o quanto o meio interfere no conforto humano, mas também como o homem preserva ou degrada esse ambiente. Identidade Þ É necessário considerar a preservação do patrimônio natural e cultural como um ato político. Preservar para construir. Preservar não no sentido imobilizador, mas sim como instrumento ativo transformador da realidade, com o objetivo de resguardar a produção da natureza e do homem como um testemunho do modo de vida, possibilitando avaliação e compreensão do presente para projetar o futuro. (PAPE, 2003). Vulnerabilidade Þ A título de análise, o que se espera é a caracterização da parcela da população mais vulnerável, para se estabelecer um diagnóstico (problemas e necessidades) da comunidade nos casos mais sensíveis. Portanto, os portadores de deficiência, crianças, mulheres e idosos seriam os grupos populacionais mais representativos. Mobilidade Þ Mobilidade urbana sustentável está ligada a medidas que visem: A redução do volume de veículos de transporte individual motorizado em circulação nas malhas viárias principais das cidades;

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tras realidades, supostamente similares à nossa). · Que reflitam uma visão global do fenômeno arquitetônico (a correlação dele com as variáveis dos fenômenos humanos e físicos, existentes em nossa realidade); 2.1 Categorias estruturadoras do ambiente urbano


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A redução dos congestionamentos e dos desgastes das vias, com conseqüente queda na necessidade de investimentos no sistema viário; A diminuição dos custos com a perda de tempo durante o deslocamento, com a emissão de poluentes em níveis indesejáveis, com o desperdício de combustível e com as mortes e a invalidez causada por acidentes de transito nas áreas urbanas; Uma perspectiva positiva de sustentabilidade energética; A melhoria de qualidade de vida nos aglomerados urbanos; A redução do volume necessário para investimentos em infra-estrutura urbana; Os benefícios de medidas de proteção ambiental e de preservação da acessibilidade urbana sobre as gerações futuras; A redução da pobreza e da marginalidade social; A ocupação e o uso mais eqüitativo do espaço público urbano.

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formações, associados a mecanismos participativos de interlocução e inclusão técnica, tem facilitado na identificação e no atendimento das necessidades das comunidades, bem como no apoio ao desenvolvimento de suas potencialidades, além de, paradoxalmente, resgatarem as qualidades do lugar, atenuarem, em médio prazo, os impactos da ocupação urbana desordenada e reduzirem, em curto prazo, os desperdícios gerados pelos deslocamentos intra-urbanos. Este caminho ainda permitirá que as Parcerias criadas, os Projetos implementados e os Trabalhos desenvolvidos constituam uma forte aliança com os lugares de vida (em contraposição da noção de mercadoria que tem adquirido o solo urbano). 4.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

3. Algumas Conclusões O objetivo principal das ações empreendidas neste fazer didático conduziu para o desenvolvimento e na aplicação de teorias instrumentais para o ensino e para a formação de arquitetos e urbanistas que contribuam para o conhecimento e para a identificação das necessidades reais da comunidade, seus interesses e formas de participação, e na incorporação desses conhecimentos aos programas de graduação de arquitetura. Criada a escala dimensional tem-se a área de atuação do profissional para a estruturação do ambiente e a definição espacial dos serviços. Dessa maneira, o planejamento urbano se faz a partir de uma visão sustentável, tornando-se, portanto, projeto sustentável. A concretização de canais que sistematizem trocas de in-

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