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Análise da Capacidade Armazenagem da Produção de Soja no Mato Grosso - Saulo Tomiyoshi Medeiros e outros
04 LOGÍSTICA
Análise da Capacidade Armazenagem da Produção de Soja no Mato Grosso
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Saulo Tomiyoshi Medeiros
Gerente de Cadastro e Credenciamento de Armazéns da Conab saulo.medeiros@conab.gov.br
Rafael Alves da Silva
Analista/Engenheiro Agrícola Gerência de Cadastro e Credenciamento de Armazéns Superintendência de Armazenagem - Conab
Stelito Assis dos Reis Neto
Superintendente de Armazenagem da Conab
Conforme estimativa da produção de grãos do Brasil (safra 2021/2022), o Brasil produzirá cerca de 291,07 milhões de toneladas, o que é 15,16% maior do que foi produzido na safra anterior (CONAB, 2021b). Se concretizado a estimativa, será a maior safra de grãos do país.
A previsão é de que somente o estado do Mato Grosso-MT produza cerca de 81,91 milhões de toneladas de grãos, representando 28,14 % da produção de grãos nacional. O Mato Grosso-MT tem a maior participação na produção de grãos do país, seguido dos estados do Paraná-PR (14,73%), Rio Grande do Sul (13,71%) e Goiás-GO (9,92%) (CONAB, 2021b).
Em termos de tipos de grãos produzidos, a safra 2021/2022 pode ser assim representada: soja (49,06%), milho (40,26%), arroz (3,94%), trigo (2,68%) e outros grãos (4,06%). Desta forma, o milho e a soja representam cerca de 89,32% da produção de grãos do Brasil. (CONAB, 2021b).
A produção de soja no Mato Grosso ocorre durante o início do ano e representam 47,43% dos 81,9 milhões de toneladas de grãos produzidos no estado e 13,34 % com relação da produção nacional de grãos.
Assim, diante da importância da safra de soja colhida no início do ano, entre janeiro e abril, no estado do Mato Grosso, é importante analisarmos o parque armazenador desse estado quanto a capacidade de receber, limpar, secar e armazenar os grãos.
Stelito Assis dos Reis Neto
Superintendente de Armazenagem da Conab
Como grande parte da produção de grãos é armazenada durante determinado período, várias regiões produtoras de grãos do Brasil têm enfrentado grandes problemas neste segmento agrícola em decorrência da capacidade estática limitada dos armazéns (Lima Júnior et al., 2012; Maia et al., 2013). De acordo com Elias (2003), a armazenagem é o processo de guardar o produto, associada a uma sequência de operações, tais como limpeza, secagem, tratamento fitossanitário, transporte, classificação, dentre outros, com o intuito de preservar as qualidades físicas, químicas e biológicas da colheita, até o abastecimento.
A limpeza e secagem dos grãos são importantes procedimentos realizados antes do armazenamento e que possuem o objetivo de manter a sua qualidade durante o período que ficarem armazenados. A retirada das impurezas e redução da umidade, são de extrema importância para evitar a perda de qualidade do produto.
Segundo Puzzi (1986), as Unidades Armazenadora podem ser classificadas em: fazenda, coletora, intermediária e terminal. Sendo importante que as capacidades de limpeza e secagem estejam nas Unidades Armazenadoras em nível fazenda e coletoras, que recebem produtos que possuem necessidade desses dois tipos de serviços.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA, 2011) define Unidade Armazenadora [UA] como edificações, instalações e equipamentos organizados funcionalmente para a guarda e conservação dos produtos agropecuários, seus derivados, subprodutos e resíduos de valor econômico. O MAPA separa as unidades armazenadoras em quatro tipos: 1) em nível de fazenda - localizada em propriedade rural, com capacidade estática e estrutura dimensionada para atender ao próprio produtor; 2) coletora - localizada na zona rural (inclusive nas propriedades rurais) ou urbana, com características operacionais próprias, dotada de equipamentos para processamento de limpeza, secagem e armazenagem com capacidade operacional compatível com a demanda local; 3) intermediária - localizada em ponto estratégico de modo a facilitar a recepção e o escoamento dos produtos provenientes das unidades armazenadoras coletoras, e; 4) terminal - localizada junto aos grandes centros consumidores ou nos portos, dotada de condições para a rápida recepção e escoamento do produto, caracterizada como unidade armazenadora de alta rotatividade.
A pessoa jurídica que executa a armazenagem dos produtos agropecuários tem o dever de solicitar sua inclusão no Sistema de Cadastro de Armazém de Produtos Agrícolas [SICARM], administrado e controlado pela CONAB (Brasil, 2001). Apesar da obrigação do cadastramento de armazéns no SICARM, pode acontecer de a UA estar operando sem realizar o seu cadastramento e ficar de fora da avaliação, uma vez que não há fiscalização e/ou multa pelo não cumprimento da obrigação.
Durante vistoria para o cadastramento de armazéns, os técnicos da CONAB coletam os dados do armazém, tais como: capacidade estática de armazenagem (em toneladas), capacidade de recepção (toneladas/hora), capacidade de limpeza (toneladas/hora), capacidade de secagem (toneladas/ hora), capacidade de expedição (toneladas/hora) e coordenadas geográficas.
A implementação de armazenagem nas fazendas de regiões produtoras de grãos, onde a demanda de armazenagem seja elevada poderá elevar o nível de renda do produtor, que terá redução nas perdas e nos riscos decorrentes das flutuações dos preços, contribuindo para o desenvolvimento da comercialização. A implementação também favorecerá os consumidores, com o abastecimento contínuo e benefícios com preços mais estáveis (Silva et al., 2008).
Uma UA, técnica e convenientemente localizada, constitui uma das soluções para tornar o sistema produtivo mais econômico, propiciando a comercialização da produção em melhores períodos, evitando as pressões naturais do mercado na época da colheita (D’Arce, 2009). A guarda de produto na propriedade apresenta inúmeras vantagens: a minimização das perdas quantitativas e qualitativas no campo; economia do transporte; maior rendimento na colheita por evitar a espera dos caminhões nas filas nas unidades coletoras ou intermediárias; a obtenção de financiamento por meio das linhas de crédito específicas para a pré-comercialização; redução dos custos de transação; disponibilidade do produto para utilização oportuna, além de implicar na redução das filas nos terminais de exportação, constituindo-se em alternativa para fugir dos gargalos logísticos (Nogueira Junior e Nogueira, 2007; Giovine e Christ, 2010).
Nesse contexto, objetivou-se identificar possíveis gargalos de armazenagem da produção de soja safra 2021/2022 do Mato Grosso-MT, sendo avaliado os dados de capacidade de estática dos armazéns
e da estimativa de produção de soja do Mato Grosso, assim como os demais dados dos armazéns do MT cadastrados no SICARM (capacidade de recepção, capacidade de limpeza, capacidade de secagem e capacidade de expedição) comparados com a velocidade de colheita da safra de soja.
Material e Métodos
Para a análise da falta de armazenagem (déficit de armazenagem), adotou-se a diferença entre a capacidade estática dos armazéns a granel e a estimativa de produção de soja (safra 2021/2022) por microrregião do Mato Grosso. Espera-se que as microrregiões com maior déficit de armazenagem correspondam às microrregiões com maiores demandas pelos serviços de armazenagem e, consequentemente, maior a oportunidade para instalação de novos armazéns. Nesta análise de déficit de armazenagem do Mato Grosso não foi considerado o estoque de passagem do milho que pressiona ainda mais a necessidade dos armazéns da região.
Para as demais análises, a estimativa de velocidade de colheita da soja no Mato Grosso foi transformada em toneladas por hora, considerando a progressão de colheita divulgado pela Conab na safra 2020/2021. O percentual colhido em cada período foi multiplicado pelo total produzido, previsão de safra 2021/2022, em cada localidade e dividido pela quantidade de dias do período considerando 8 horas de colheita diárias.
A análise da capacidade dos armazéns (capacidade de recepção, capacidade de limpeza, capacidade de secagem e capacidade de expedição) cadastrados no Sistema de Cadastro Nacional de Unidades Armazenadoras - SICARM/CONAB versus a produção de soja (safra 2021/2022) do Mato Grosso foi simplificada, considerado o mesmo ritmo de colheita, ou seja, o mesmo percentual de colheita, para todas as microrregiões. O que diferencia as microrregiões é a quantidade soja produzida.
Para elaboração dos mapas deste trabalho, utilizou-se: o software “QGIS”; coordenadas geográficas dos armazéns a granel obtidas no SICARM (CONAB, 2021a); arquivos vetoriais correspondentes à base digital do Brasil que dispõem dos polígonos delimitadores do Brasil, dos estados e microrregiões cada município do país no formato “shapefile”, disponibilizados no portal eletrônico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,2020b); dados da produção de grãos do Brasil safra 2021/2022, estimativa de 12/2021 (CONAB, 2021b); dados da produção de soja do Mato Grosso safra 2021/2022, estimativa de 12/2021 (CONAB, 2021b); mapeamento das áreas de cultivo de soja,
safra 2020/2021 (CONAB, 2021d) e produção agrícola municipal do SIDRA 2020 (IBGE, 2020a). Todos mapas foram elaborados no Datum SIRGAS 2000.
Resultados e Discussão
Ao avaliar a produção de grãos do Brasil por microrregião, observa-se na Figura 1 uma forte concentração da produção na região centro-oeste do país, com destaque para as microrregiões de Alto Teles Pires-MT, Parecis-MT, Sudoeste de Goiás-GO, Dourados-MS, Canarana-MT e Sinop-MT.
Figura 2 - Déficit de armazenagem no estado do Mato Grosso - Capacidade estática vs produção de soja Fonte: CONAB (2021a, b, c) e SIDRA/IBGE (2000)
Figura 1 - Previsão da Safra de grãos do Brasil, safra 2021/2022, estimativa de dezembro de 2021. Fonte: CONAB (2021b) e SIDRA/IBGE (2000)
O cenário de capacidade estática de armazéns cadastrados no Sistema de Cadastro Nacional de Unidades Armazenadoras - SICARM/CONAB versus a produção de soja (safra 2021/2022) do Mato Grosso é apresentada na Figura 2.
No balanço geral do Mato Grosso (capacidade estática versus produção de soja), para produção de soja de 38.320,50 mil toneladas e capacidade de armazenagem granel de 37.540,92, estima-se um déficit de armazenagem de 779,58 mil toneladas para armazenar a produção total de soja do estado.
O déficit é amenizado em razão do escoamento do produto que segue diretamente para a exportação, sem ficar armazenado por muito tempo, e pela utilização de estruturas emergenciais de armazenamento, como por exemplo os silos bolsa.
Conforme análise, as microrregiões com maiores déficits de armazenagem da soja foram Arinos, Paranatinga, Norte Araguaia, Canarana e Parecis (1.271.937, 847.428, 577.673, 568.897 e 404.664 t, respectivamente). No entanto, as microrregiões com superávit de armazenagem da soja foram Alto Teles Pires, Primavera do Leste, Rondonópolis, Sinop e Alto Araguaia (1.937.388, 1.535.818, 734.224, 259.896 e 227.473 t, respectivamente).
Acredita-se que o déficit de armazenagem de algumas microrregiões possam ser supridas por Unidades Armazenadoras localizadas em microrregiões vizinhas com superávit, como pode ser observado no estudo de caso da microrregião de Arinos (Figura 3). Neste caso, o mapa retrata as áreas de cultivo de soja e a localização das Unidades Armazenadoras da microrregião de Arinos-MT e de outras microrregiões limítrofes.
Figura 3 - Mapeamento das áreas de cultivo de soja da microrregião de Arinos-MT e outras microrregiões limítrofes e dos armazéns a granel cadastrado no SICARM. Fonte: CONAB (2021a, d)
No Gráfico 1, a seguir, foi realizado um comparativo da velocidade de colheita da safra de soja durante o período de janeiro a abril com a capacidade de secagem e limpeza. Nota-se que o período mais crítico poderá ocorrer entre o meio do mês de fevereiro e a primeira semana de março.
Na primeira semana de março a velocidade de colheita atinge 147.123 toneladas/hora, ultrapassando a capacidade de secagem do Mato Grosso que é de 146.995 toneladas/hora.
Rafael Alves da Silva
Analista/Engenheiro Agrícola Gerência de Cadastro e Credenciamento de Armazéns Superintendência de Armazenagem - Conab
Em contrapartida as capacidades de recepção, limpeza e expedição apresentam valores condizentes com a velocidade de produção, assim, não representarão um gargalo durante a colheita.
O modelo de análise foi simplificado e devido as características da soja, existe a possibilidade de armazenar o produto sem secar, em contrapartida a capacidade de secagem utilizada é média, podendo sofrer reduções significativas por problemas de manutenção e recebimento de produto com teor de umidade mais alto.
No Mato Grosso a distribuição das capacidades de limpeza e secagem estão aderentes com as funções dos armazéns, estando 80% concentrada nos armazéns coletores e nível fazenda, conforme Tabela 1.
É importante também observarmos quem opera o parque armazenador nesse estado, principalmente, quanto a possibilidade de prestação de serviços de armazenagem por parte dos detentores de equipamentos.
Através da Tabela 2, a seguir, pode-se verificar que 30% da capacidade de secagem é operada por pessoas físicas, que por lei
Grafico 1 - Velocidade da colheita de soja versus capacidade de secagem versus capacidade de limpeza versus capacidade de recepção versus capacidade de expedição (t/h). Fonte: CONAB (2021a, b, c)
Tabela 1 - Capacidades por função dos armazéns Fonte: SICARM - CONAB (2021a).
Tabela 2 - Capacidades de secagem e limpeza de grãos por tipo de agente armazenador Fonte: SICARM – CONAB (2021a).
(Brasil, 2001), não podem prestar serviços de armazenagem para terceiros. Além disso, outros 17% dessa capacidade está sendo operada por tradings, que de forma geral não prestam serviços para terceiros.
Desta forma, nota-se uma redução de 47% na capacidade de secagem que estará indisponível para prestação de serviços a terceiros. Esta informação é importante, uma vez que o produtor de soja terá dificuldades de encontrar armazém que prestem os serviços de limpeza e secagem do grão em MT.
Conforme análise, as microrregiões com maiores déficits de capacidade de secagem da soja foram Paranatinga, Arinos, Tangará da Serra e Colíder (3.543, 3.172, 1.348 e 1.320 t/h, respectivamente). No entanto, as microrregiões com superávit de capacidade de secagem de soja foram Alto Teles Pires, Primavera do Leste, Rondonópolis e Alto Araguaia (6.885, 4.896, 1.532 e 1.000 t/h, respectivamente).
De forma similar ao observado na análise de déficit de armazenagem, acredita-se que o déficit de capacidade de secagem da soja de algumas microrregiões possam ser supridas por Unidades Armazenadoras localizadas em microrregiões limítrofes, como pode ser observado para o estudo de caso da microrregião de Paranatinga-MT na Figura 5.
Figura 5 - Mapeamento das áreas de cultivo de soja da microrregião de Paranatinga-MT e outras microrregiões limítrofes e dos armazéns a granel cadastrado no SICARM. Fonte: CONAB (2021a, d)
Partindo para o detalhamento da análise, no nível mais local, analisou-se a Microrregião do Mato Grosso que possui maior gargalo em decorrência do déficit de secagem que é a Microrregião de Paranatinga.
A microrregião de Paranatinga apresenta armazéns com secagem e limpeza com função coletora e na fazenda, demonstrando que estão em áreas de produção recebendo produto diretamente da lavoura.
Os agentes detentores desses armazéns são na maior parte pessoas jurídicas, 66% do total da microrregião, o que pode possibilitar a prestação de serviços nessa microrregião.
Conclusões
As microrregiões que apresentaram maiores déficits de armazenagem da soja e, consequentemente melhores oportunidades para instalação de mais armazéns no Mato Grosso, foram: Paranatinga, Arinos, Tangará da Serra e Colíder (3.543, 3.172, 1.348 e 1.320 t/h, respectivamente).
Quanto ao maior gargalo operacional do complexo de armazenagem do estado, a capacidade de secagem foi a que apresentou a maior necessidade de ampliação, principalmente, nas microrregiões de Paranatinga, Arinos, Tangará da Serra e Colíder-MT.
Observou-se a necessidade de expandir a análise para a colheita da 2ª safra do Mato Grosso, assim como, o detalhamento das informações de armazenagem e produção por município.