O quarador de borboletas

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2ª edição São Paulo / 2015 EDITORA AQUARIANA

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A poesia é um torvelinho. Uma teia. Uma costura de andaimes. Um inacabado trabalho de rejuntar sentimentos, de soldar emoções, de fundir os ferros do tempo. O poema esmera-se e constrói sua estrutura de aço, fogo e ferro, mãos e trabalho, sentimentos, choro, presunção de amor. Muito incomum e muito lógico o encontro. O poeta que reverbera nos seus andaimes de palavras, e o amor que se aloja no vão das construções não sólidas. Aquele, o poeta, é o infatigável pedreiro de uma obra sempre inacabada. Este, o arrumador de andaimes, o eterno engenheiro de uma obra que tem no fim, sua recompensa anímica do começo, da sedução. Matemático um, este que é o engenheiro dos andaimes perfeitos. Arranjador de números o outro, o da palavra, apenas tentando se equilibrar nos andaimes das frases, pendentes. Ambos se justapõem. O homem cru que é o poeta aprende a inflexibilidade da perfeição das estruturas. Quebradas de ventania e impurezas escondidas e incontidas. O poeta nu, de sarcástica nudez de alma, pênsil em suas verrugas de saudade, empresta a flexibilidade das palavras bailarinas ao que não sabe. Ambos, poeta e amor, desfilam no espaço inconcebível de ambos. Indefinidamente. Fernando Coelho

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FERNANDO COELHO, O QUARADOR DE BORBOLETAS Toda amizade tem uma história, seja de alegria, encontro e prazer. Minha história de amizade com Fernando Coelho tem tudo isso prá contar. E o algo mais: a afetuosidade, a fraternidade entre poetas, coisa já rara hoje em dia nas prateleiras da vida. Foi assim: no início da década de 80 (prá ser mais precisa, em 1982), eu lançava o quinto livro, MAGMA, saudado pela imprensa e crítica como o 1.o todo em poesia erótica escritor por uma mulher no Brasil. Gilka Machado o fizera antes, mas eram alguns poemas eróticos num livro, não todos nessa temática. Após o lançamento no Rio de Janeiro, lancei em São Paulo. Aí, na época, costumava-se lançar o mesmo livro em 2, 3, até 10 lugares diferentes. Amigos me disseram que havia um bar em Perdizes, perto da PUC, cujo dono, poeta e jornalista, homenageava outros escritores e poetas da sua devoção nos drinques da casa. Assim, coquetéis eram batizados de Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Cecília Meireles, Clarice Lispector, Chico Buarque de Holanda entre

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outros mais e esta que escreve este prefácio. Levaramme a conhecê-lo: era Fernando Coelho. Que homenageava esta poeta, sem conhecê-la, só pelo texto. Confesso que fiquei encantada com tanta gentileza. E não deu outra: fui talvez o primeiro escritor a lançar livro no ARMAZÉM DO POETA (que era bar, espaço cultural e confraria de poetas). Todos os frequentadores, nem todos escritores, adquiriram exemplares, esgotando todos os que estavam à venda naquela noite. Entre as dezenas de lançamentos que me convidaram a fazer por esses brasis afora, este foi dos mais felizes e prazerosos, pelo calor fraterno com que o dono da casa soube conduzir o evento. Coisa de poeta. Depois ficamos afastados por cidades, ele em São Paulo, eu no Rio. Mas nunca longe. Amizade assim resiste à distância, ao tempo. Aqui do Rio de Janeiro, estou sempre antenada com tudo o que acontece com este baiano universal, apaixonado por este nosso país privilegiado em beleza e alegria de viver. Acompanhei Fernando Coelho escrever sete livros de poesia e dois poéticos e úteis guias turísticos (tipo diário de bordo da viagem sobre a sua Bahia, de um sabor que só jornalista-poeta saberia captar e passar ao leitor). Nascido numa pequena cidade do recôncavo baiano, Conceição do Almeida, em 1947, Fernando está radicado em São Paulo desde 1966.

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e te amar agora onde sou ruga de anĂŞmonas

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apaixonados insetos corroem fímbrias e medulas de açúcar

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como roรงar o olho de cogumelos chocados no infinito de tuas partes

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De quem? Da natureza, da amada? Com certeza das duas musas – natureza e amada – deste poeta que sabe amar as duas, igualmente: “na tarde dispo teu casulo/ venda bruta de escarlate/na esquina foliácea”. Que poeta sabe dizer que ama? Nessa raiz de cheiro verde, com resina de juras e ovos quebrados, este aqui sabe. E quem inventa de amar o amor que ele ama, no maispueril ninho, vai saborear filé de nódoa, quando tudo é pura festa, puro sol, quando tudo acaba sem sombra. Amor e poesia, para Fernando Coelho, era infância, água, sal, vento e orégano – orégano, paixão também de outro poeta, o chileno Pablo Neruda. “E eras o caminho da água/e nem sabes do voo das gotas”. E há, ainda, “o lápis do vento que te tenta/e o girassol da nuvem/que te amarga pousos e partos”.

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e te amar como quem fareja visgo comer de sempre tua hera

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nas ovelhas nem os cristais onde amacias teu balé trêmulo saudade rasgada na beirada de mim

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