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Coluna Agronegócios

No pós-pandemia, tecnologia ganha mais importância

Éindiscutível o fato de a tecnologia haver acompanhado a agropecuária desde seus primórdios. Selecionar as melhores frutas ou espigas, ou os animais que mais bem resistissem ao estresse, era atividade intuitiva desenvolvida pelos primeiros agricultores. Com o avanço da Ciência, o desenvolvimento tecnológico ganhou impulso e vem solucionando a maior parte das constrições para a produção de alimentos.

Porém, a sociedade quer mais. Já não basta produzir, é necessário ser sustentável. E, no pós-pandemia, seguramente surgirão mais exigências da sociedade global, impondo regras estritas de inocuidade e segurança dos alimentos, que se desdobrarão em outras exigências com respeito à sustentabilidade social e ambiental.

O PANO DE FUNDO

Evoluímos muito nas últimas décadas, porém, apesar dos benefícios das inovações nos sistemas de produção agropecuária, alguns desafios ainda persistem. É recorrente o debate que envolve a mudança do uso do solo para explorações agrícolas ou pecuárias, o aumento das emissões de gases de efeito estufa, o uso da água, a contaminação de lençóis subterrâneos ou cursos de água por fertilizantes e pesticidas, para permanecer nos temas mais discutidos e controversos.

Tudo isto é emoldurado pela desigualdade social que grassa no mundo – em especial no Hemisfério Sul – e que foi ressaltada durante a pandemia de Covid-19. Embora, em nosso entender, a fome que insiste em persistir no mundo seja decorrente de falta de renda para acessar alimentos, o agronegócio como um todo é cobrado para aumentar a produção, de forma sustentável e a menores custos, como forma de reduzir a iniquidade da falta de acesso a alimentos por mais de 10% da população global.

Costumo afirmar que a velocidade do desenvolvimento tecnológico no século 21 é estonteante, e levará ao museu em pouco tempo tecnologias ora consideradas na fronteira do conhecimento. Cada vez mais será encurtado o tempo entre a pesquisa básica e a inovação, com inúmeros concorrentes disputando em paralelo a primazia do ingresso no mercado de tecnologias, rompendo com o passado e descortinando novos cenários.

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Nos próximos anos, um verdadeiro arsenal de opções tecnológicas estará disponível para enfrentar desafios do sistema alimentar em vários contextos institucionais e políticos. Algumas tecnologias serão altamente disruptivas e que, até pouco tempo, mais pareciam ficção científica ou wishful thinking. Pode-se elencar fotossíntese artificial, carne produzida em laboratório, embalagens inteligentes, nanodrones, impressão 3D ou agricultura urbana vertical. Tudo emoldurado pela interconectividade da agricultura 4.0.

Tecnologias associadas à agricultura digital e à substituição de alimentos e rações para animais e peixes compõem um conjunto de tecnologias maduras ou que estão chegando lá. Em algumas ciências – como a física, ou no ramo da informática – não existem as restrições enfrentadas pela biologia, como a época de plantar e de colher, o tempo a esperar para obter os dados, a forte interação entre genética e ambiente, entre outras. Por isto a velocidade da inovação e a redução de custos das tecnologias digitais, seguidas de sua ampla adoção em países de qualquer nível de renda, estão chegando em uma onda avassaladora, porque seu desenvolvimento é mais rápido e mais barato.

OPORTUNIDADES E DESAFIOS

Novas oportunidades estão surgindo no seio das cadeias produtivas. Atualmente, a carne mais consumida no mundo é a de peixes, crustáceos e outros produtos da aquacultura. Ocorre que, em sua avassaladora maioria, os aquacultores ainda mantêm um sistema de produção de baixa intensidade tecnológica, em especial no que tange ao material genético, ao manejo, à nutrição e à sanidade. Esse setor se delineia como uma enorme oportunidade de desenvolvimento tecnológico, cujos impactos modularão o futuro de outras cadeias de carnes e de algumas cadeias de grãos.

No conjunto da agricultura, novas exigências e tendências modificarão rumos; as novas tecnologias consolidarão estes rumos. A bioeconomia é um aspecto transversal que precisa ser analisado com cuidado. A recente política pública de bioinsumos, lançada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), se insere neste contexto. Ganham espaço insumos biológicos (como o controle biológico) e são valorizados os serviços ecossistêmicos (polinização, conservação de água, controle de pragas, solubilização de nutrientes, fixação biológica, entre outros).

RUPTURA

Entrementes, vislumbramos um aspecto em que a ruptura será mais visível: a antecipação do cronograma de imposição de severas regras de inocuidade e segurança dos alimentos e a sua rastreabilidade, desde a produção dos insumos até a mesa do consumidor. Rígidas determinações legais e certificações privadas mais estritas serão uma decorrência.

Os impactos desta mudança de atitude não serão apenas na melhoria da saúde do consumidor, mas criarão um contexto produtivo, em que o conceito de sustentabilidade vai ter peso cada vez maior no mercado. E isso significará desenvolvimento tecnológico com um forte viés de preservação do ambiente e de sustentabilidade social, sem nunca relevar a rentabilidade das cadeias produtivas.

Finalizando, é necessário ter em conta que este novo comportamento da sociedade global vai impor o incremento constante da produtividade sustentável, lembrando a todos que cada 1% de aumento de produtividade significa 1% menos desmatamento. Perfeitamente possível com o uso de tecnologia adequada.

Decio Luiz Gazzoni O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja

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