Cultivar Grandes Culturas • Ano XXI • Nº 266 • Julho 2021 • ISSN - 1516-358X
Destaques
Expediente
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Fundadores Milton Sousa Guerra, Newton Peter e Schubert Peter
Dicas de ouro
Grupo Cultivar de Publicações Ltda. CNPJ: 02783227/0001-86 Insc. Est. 093/0309480 Rua Sete de Setembro, 160, sala 702 Pelotas – RS • 96015-300 Diretor Newton Peter
Como construir altas
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produtividades de modo
Assinatura anual (11 edições*): R$ 269,90 (*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan) Números atrasados: R$ 22,00 Assinatura Internacional: US$ 150,00 Euros 130,00
correto e sustentável
REDAÇÃO • Editor Gilvan Dutra Quevedo • Redação Rocheli Wachholz Cassiane Fonseca • Design Gráfico e Diagramação Cristiano Ceia • Revisão Aline Partzsch de Almeida COMERCIAL • Coordenação Charles Ricardo Echer • Vendas Sedeli Feijó José Geraldo Caetano CIRCULAÇÃO • Coordenação Simone Lopes
Quem causa
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Rosetas bangelas
Cuidado ao identificar o agente
Como manejar a
causal da mancha púrpura da
lagarta-das-rosetas
semente e do crestamento
em café
foliar de cercospora, pois nem
• Assinaturas Natália Rodrigues
tudo é Cercospora kikuchii
• Expedição Edson Krause
Índice
GRÁFICA: Kunde Indústrias Gráficas Ltda.
Diretas
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Informe Spraytec
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www.instagram.com/revistacultivar
Controle da lagarta-do-cartucho
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www.facebook.com/revistacultivar
Viroses em milho
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Manejo de cercospora em soja
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Eternos desafios da ferrugem-asiática
24
Como aumentar a produtividade em soja
30
Campeões do Desafio Cesb em soja
34
Informe Alltech
39
Controle do bicudo em algodoeiro
40
Desafios da colheita mecanizada em cana
43
Lagarta-das-rosetas em café
46
Coluna Agronegócios
48
Coluna Mercado Agrícola
49
Coluna ANPII
50
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46
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Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: contato@grupocultivar.com Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.
Nossa Capa
Crédito: Wenderson Araújo Sistema CNA
Diretas
Herbicida A Ihara utilizou as parcelas de solo do parque do Show Rural Coopavel Edição de Inverno como campo de testes para mostrar a eficiência do pré-emergente para o trigo Yamato. Seletivo e de ação sistêmica, do grupo químico pirazol/isoxazolina, o herbicida possui ação contra plantas daninhas como capim-colchão, capim-amargoso, capim-pé-de-galinha, azevém e capim-marmelada. Técnicos da Ihara prepararam parcelas com e sem a aplicação do produto para a demonstração. “O resultado é alta performance no controle do azevém, de considerável redução na aveia e de diminuição de 60% no nabo, todas plantas daninhas de difícil combate”, explicou o administrador técnico de vendas da Ihara, Rafael Scapini de Oliveira.
Rafael Scapini de Oliveira
Biossoluções A UPL anunciou a criação da unidade de negócios Natural Plant Protection (NPP). A nova marca abarcará o portfólio de insumos e tecnologias agrícolas de origem natural e biológica da companhia. A NPP – que, em português é a sigla para "proteção natural de plantas" – atuará como uma marca independente, consolidando mundialmente a atual linha de biossoluções da UPL, bem como uma rede de laboratórios e instalações de pesquisa e desenvolvimento (P&D). Atualmente, esse negócio representa 7% da receita total da empresa. "A NPP pode mudar o mundo. Ela possui capacidade, mentalidade, habilidades e recursos técnicos certos para conduzir uma nova era de mudanças positivas e progressivas na agricultura", opinou o novo head global de soluções sustentáveis da NPP, Fabio Torretta.
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Fabio Torretta
A ICL (NYSE: ICL) (TASE: ICL) anunciou que concluiu a aquisição da Divisão Agrícola da Compass Minerals América do Sul, por aproximadamente 420 milhões de dólares. A empresa está presente em 25 dos 26 estados brasileiros e atende mais de 32 mil fazendas de forma indireta e direta, sendo esta última responsável por aproximadamente 50% das vendas totais. "Estamos muito satisfeitos por incorporar esse negócio e dar as boas-vindas a todo o time da Divisão Agrícola e aos clientes à ICL. Essa transação, junto à recente aquisição da Fertiláqua, posiciona a ICL como a empresa líder em nutrição e fisiologia de plantas especializada no Brasil, um dos mercados agrícolas de crescimento mais rápido do mundo. Este passo importante cumpre nossa estratégia de estabelecer a liderança no mercado de nutrição e fisiologia de plantas e acelera nosso progresso em direção à liderança global de longo prazo para nossa Divisão de Soluções Inovadoras para o Agronegócio", explicou o presidente e CEO da ICL, Raviv Zoller.
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Luto Morreu de modo precoce, no mês de junho, o pesquisador Valtemir Carlin, de 49 anos. Formado pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), atualmente era diretor da Agrodinâmica Pesquisa e Consultoria Agropecuária, localizada no município de Tangará da Serra, no Mato Grosso. Referência na área de fitopatologia, por inúmeras vezes contribuiu com os leitores da revista Cultivar Grandes Culturas. Gentil, acessível e generoso ao dividir o conhecimento que acumulou ao longo dos anos de experiência e estudos, Carlin deixa um grande vazio na pesquisa e entre aqueles que tiveram o privilégio de privar de seu convívio.
Nutrição
Aquisição
Raviv Zoller
Valtemir Carlin
Desde 2015 a divisão Plant Nutrition tem atuado no segmento de nutrição vegetal e fertilizantes especiais em linha, com a meta de ser uma referência global em nutrientes de soja com inovação, qualidade e sustentabilidade. “Desenvolvemos um portfólio amplo que explora a nutrição multifuncional com nobres matérias-primas associadas ao uso de aminoácidos, extrato de algas, extratos vegetais, complexantes orgânicos, fosfitos, ácidos orgânicos e vitaminas, além de uma exclusiva Patente Verde e a Tecnologia V-CompleX”, explica o COO da CJ Selecta, Alessandro Reis. Para o executivo, esse segmento faz sentido com a demanda do mercado. “São produtos que fazem sentido na cadeia produtiva e inovações tecnológicas para uma agricultura diferente, inteligente e com consideráveis ganhos para nossos parceiros do campo”, avalia.
Alessandro Reis
Divulgação
Informe publicitário
Nutrição equilibrada durante todo o ciclo Além de nutrir as plantas para a máxima expressão de seu potencial produtivo, Tractus Kit Evolution é uma excelente ferramenta no manejo de plantas daninhas, com alto sinergismo com glifosato e reflexos positivos nos componentes de rendimento da soja
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Tractus Kit Evolution aumenta a massa de grãos, o número de vagens por planta e a produtividade da soja, além de contribuir no manejo integrado de plantas daninhas. O fornecimento do micronutriente boro, de forma equilibrada, durante o ciclo de cultivo da soja é essencial para a obtenção de altas produtividades. Pois o boro é necessário para crescimento de parte aérea e raízes, síntese e transporte de carboidratos, produção e viabilidade do grão de pólen, enchimento de grãos, além de contribuir na inte-
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gridade das membramas e paredes celulares. Entretanto, seu teor nos solos brasileiros é baixo e as fontes convencionais utilizadas, mesmo em altas doses, têm baixa eficácia agronômica e muitas perdas do nutriente no sistema. Ou seja, o boro aplicado na dessecação pré-plantio não estará disponível no período de maior demanda da planta, que é durante o florescimento. Nesse contexto, a Spraytec desenvolveu o Tractus Kit Evolution, um pacote tecnológico que alia nutrição equilibrada com duas fontes de boro de alta qualidade, aminoácidos essenciais
e um adjuvante premium. No quesito tecnologia de aplicação, Tractus Kit Evolution melhora a qualidade da calda e da pulverização durante o manejo integrado de plantas daninhas. Tractus Kit Evolution é altamente compatível com defensivos, e não apresenta efeito salino, evitando corrosão e desgaste de equipamentos, além de não deixar resíduos no tanque, e assim aumentar a eficácia no manejo de plantas daninhas. Na planta, Tractus Kit Evolution auxilia nos processos de desenvolvimento vegetal durante todo o ciclo, promove maior
arranque inicial e estabelecimento da cultura no campo. Durante os estágios reprodutivos, reduz o abortamento de flores, permite maior produção e viabilidade do grão de pólen, além de aumentar o enchimento de grãos, o número de vagens e a produtividade da área. Tractus Kit Evolution é um produto de vanguarda e que atende aos anseios do campo, pois vai além da simples nutrição da planta. Dessa forma, a utilização do produto é uma ferramenta eficaz e segura, podendo integrar as estratégias de manejo nutricionais, com reflexos positivos na tecnologia de aplicação, resultando no aumento de produtividade.
OBJETIVO
Avaliar a eficicácia agronômica do pacote tecnológico Tractus Kit Evolution, utilizado na dessecação em pré-semeadura da cultura da soja.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi conduzido na fazenda São José, localizada no município de Maringá, Paraná, durante o ano agrícola 2019/20. A cultivar de soja utilizada foi a NA 5909 RG. Os tratamentos aplicados na dessecação foram (L ou kg p.c./ha): Padrão Glifosato (2,0), Padrão Glifosato + Tractus Kit
Evolution (2,0 + 1,0), Padrão Glifosato + Ácido Bórico (2,0 + 3,0) e Padrão Glifosato + Octaborato de Sódio (2,0 + 2,5). Acompanha Tractus Kit um adjuvante multifuncional Premium (0,2L/ha), favorecendo a qualidade da aplicação. O delineamento experimental foi o de blocos casualizados, utilizando-se quatro tratamentos e quatro repetições. Foram avaliados o controle de plantas daninhas aos sete, 14 e 21 DAA (dias após a aplicação) e os componentes de rendimento massa de grãos, número de vagens e produtividade após a colheita. As variáveis foram submetidas à análise de variância e ao teste de Tukey (p < 0,05), utilizando-se o sistema para análise estatística Sisvar.
RESULTADOS
De acodo com a Figura 1, aos 21 dias após a aplicação o tratamento Tractus Kit Evolution associado ao glifosato obteve o melhor controle de plantas daninhas (88,3%), em relação ao ácido bórico (78,2%), ao octaborato de sódio (72,4%) e ao glifosato isolado (72,1%). Conforme a Figura 2, o tratamento Tractus Kit Evolution associado ao glifosato aumentou a massa de grãos, o número de vagem por planta e a produtivida-
Figura 1 - Eficácia de Tractus Kit Evolution no manejo de plantas daninhas
de da soja, em relação ao ácido bórico, ao octaborato de sódio e ao glifosato isolado. A produtividade por hectare para glifosato isolado foi de 63,2 sacas, glifosato com octaborato de sódio 64,1 sacas, glifosato com ácido bórico 65,4 e glifosato com Tractus Kit Evolution 69,9 sacas. Em relação ao glifosato isolado, o incremento médio por hectare na produtividade do Tractus Kit Evolution foi de 6,7 sacas, com ácio bórico de 2,2 sacas e com octaborato de sódio de 0,9 saca.
CONCLUSÃO
Tractus Kit Evolution, além de nutrir as plantas para a máxima expressão de seu potencial produtivo, é uma excelente ferramenta no manejo de plantas daninhas com alto sinergismo com glifosato e reflexos positivos nos componentes de rendimento da soja, se destacanto dos tratamentos convencionais ácido bórico e octaborato de sódio. O emprego de cultivares de alto potencial genético associado ao desenvolvimento sustentável exige produtos inovadores e disruptivos como o C Tractus Kit Evolution. Julio R. Fagliari, Departamento de Pesquisa Grupo Agrolatina
Figura 2 - Eficácia de Tractus Kit Evolution nos componentes de rendimento e produtividade
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Milho
Injúrias reduzidas De que forma o silício age nas plantas e em que circunstâncias o uso deste elemento pode auxiliar no manejo integrado de pragas como a lagarta-do-cartucho na cultura do milho
A
lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda) é a principal praga desfolhadora da cultura do milho, causando perdas severas à produção. Ao eclodirem, as lagartas começam a se alimentar dos tecidos foliares, provocam o sintoma conhecido como “folha raspada”, o que indica a presença de lagartas jovens nas plantas. Quando estão mais desenvolvidas passam a furar o cartucho das plantas, podendo danificá-las completamente. A ocorrência de S. frugiperda no milho se dá logo após a emergência das plantas, e o ataque das lagartas pode ocorrer durante praticamente todo o desenvolvimento da cultura. A suscetibilidade das plantas à lagarta-do-cartucho é diferente de acordo com seu estádio de desenvolvimento, sendo que o período de maior suscetibilidade ocorre em torno de 40 dias após a semeadura (Cruz; Turpin, 1982). Dependendo da intensidade do ataque pode ocorrer morte das plantas mais novas, resultando na redução do estande. Em plantas maiores as injúrias tendem a comprometer o desenvolvimento da cultura, e no estádio reprodutivo as lagartas podem se alimentar também das espigas, reduzindo o número de grãos, além de proporcionar uma porta de entrada para patógenos. Um dos principais métodos de controle utilizados para a lagarta-do-cartucho no milho é o químico, por meio de inseticidas. Seu uso inadequado, contudo, pode causar efeitos negativos, como o surgimento de lagartas resistentes. Além disso, na fase larval esses insetos apresentam o hábito de se alimentar e se manter protegidos dentro do cartucho das plantas, fazendo com que a eficiência dos inseticidas seja limitada. Outro método muito empregado é a utilização de plantas transgênicas Bt. Estas plantas foram modificadas geneticamente para produzirem proteínas tóxicas da bactéria Bacillus thuringiensis e que têm ação específica no intestino médio das lagartas. Híbridos transgênicos de milho têm sido amplamente cultivados nos últimos anos devido aos diversos benefícios para os produtores, como a redução no número de aplicações de inseticidas e o aumento na produção de grãos pela diminuição de perdas pelo ataque das lagartas. Entretanto, a evolução da resistência em populações da lagarta-do-cartucho a várias proteínas Bt tem sido uma das limitações do uso dessa tecnologia. Dessa forma, há a necessidade de se avaliar e desenvolver estratégias de manejo que integrem de forma compatível outros métodos para o aumento da eficiência do controle da lagarta-do-cartucho-do-milho. A utilização do silício pode ser considerada uma alternativa
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porcionada pela deposição de sílica entre a epiderme e a cutícula das folhas, podendo reduzir o consumo foliar pelos insetos e interferir de forma crônica no seu crescimento e reprodução. A ação indireta ocorre pela expressão de genes de defesa e consequente síntese e acúmulo de metabólitos secundários (compostos fenólicos, compostos nitrogenados, terpenos), que afetam a alimentação, o desenvolvimento e a reprodução dos insetos. A aplicação de silício também pode estimular as atividades de enzimas antioxidativas, que atuam na eliminação de espécies reativas de oxigênio, também conhecidas como radicais livres. Espécies reativas de oxigênio são moléculas produzidas em função de alguma condição de estresse sofrida pela planta, e que podem causar diversos danos ao seu metabolismo quando em excesso. Dessa forma, o silício atua na eliminação das espécies reativas de oxigênio tóxicas através da maior expressão das atividades de enzimas antioxidativas, contribuindo para o melhor desenvolvimento das plantas. Outro benefício do silício é proporcionar melhor desenvolvimento na arquitetura das plantas, permitindo que as folhas fiquem mais eretas, beneficiando a penetração de luz nas folhas, consequentemente aumentando a taxa fotossintética. Esses efeitos também podem contribuir para a diminuição de perdas por acamamento e quebramento. Além disso, o silício pode promover
redução na acumulação tóxica de Mn, Fe, Al e outros metais pesados. Os solos brasileiros possuem uma baixa quantidade de silício disponível por serem altamente intemperizados. Assim, há necessidade de fazer a reposição desse nutriente através da aplicação de silício na forma de fertilizantes ou corretivos com fontes silicatadas. Uma fonte de silício que tem finalidade agrícola deve apresentar algumas características importantes, como: alto conteúdo de silício solúvel, facilidade para aplicação mecanizada, boa relação cálcio/magnésio, baixo custo e ausência de potenciais contaminantes do solo. Dessa forma, é importante investigar as fontes de silício disponíveis e que apresentam tais características para um bom desempenho. Das fontes de silício existentes comercialmente para aplicação via drench no solo têm-se silicato de cálcio, silicato de magnésio, silicato de alumínio, metassilicato de sódio e metassilicato de cálcio. Os silicatos quando aplicados no solo causam o mesmo efeito que o calcário quanto à capacidade de aumento do pH, neutralizando o alumínio e outros elementos tóxicos às plantas. Além da aplicação de fontes silicatadas via drench, o silício pode ser fornecido via pulverização foliar. Embora existam formulações no mercado para esse fim, ainda não está totalmente esclarecido se a aplicação foliar também é capaz de induzir genes de resistência, uma vez que os transportadores de
Fotos Amanda Cristina Guimarães Sousa
viável para o manejo da lagarta-do-cartucho, principalmente pelo fato de o milho e outras gramíneas serem considerados plantas acumuladoras deste elemento. Embora o mineral não seja considerado um nutriente essencial para o desenvolvimento das culturas, quando absorvido pelas plantas desempenha diversas funções no seu crescimento, nutrição mineral e proteção a diversos tipos de estresses bióticos e abióticos. O silício é o segundo elemento mais abundante presente na crosta terrestre, porém sua maior parte ocorre na forma insolúvel, como quartzo, feldspato, mica e augita. Destes, o feldspato é o que sofre o processo de intemperização mais rápido, sendo a principal fonte de silício disponível para as plantas na solução do solo. O silício é absorvido pelas raízes das plantas na forma de ácido silícico [Si(OH)4] através de proteínas transportadoras presentes nas raízes, e então é transportado via xilema para a parte aérea, onde se acumula entre a epiderme e a cutícula das folhas como sílica amorfa (SiO2.nH2O). Após este processo, o silício não é mais remobilizado, formando uma barreira física/mecânica. Dessa forma, as plantas adubadas com silício terão folhas mais duras, dificultando a alimentação dos insetos. A ação negativa do silício sobre os insetos pode ocorrer de duas formas: direta e indireta. A ação direta ocorre devido à barreira física/mecânica pro-
Figura 1 - Lagartas de 2º instar de Spodoptera frugiperda na folha de milho (esquerda) e furos nas folhas do cartucho causados por lagartas mais desenvolvidas (direita)
Figura 2 - Aplicação de silício via drench em experimento com milho; raiz de milho com (esquerda) e sem (direita) aplicação de silício via solo
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Fotos Amanda Cristina Guimarães Sousa
Figura 3 - Consumo foliar da lagarta-do-cartucho em experimento com folhas de milho e disposição dos vasos com plantas de milho em casa de vegetação
silício ainda não foram detectados nas folhas, como nas raízes. Assim, há a necessidade de mais estudos que avaliem se a aplicação foliar teria um efeito apenas mecânico e localizado ou se também pode induzir genes de defesa. Alguns trabalhos já demonstraram efeitos benéficos da aplicação de silício contra a lagarta-do-cartucho. Goussain et al. (2002) demonstraram um ligeiro aumento na mortalidade e no canibalismo de lagartas de S. frugiperda quando alimentadas com folhas de plantas de milho tratadas com silício, bem como desgaste nas mandíbulas das lagartas alimentadas com plantas tratadas com silício. Em outro trabalho realizado por Nascimento et al. (2014), houve redução no consumo foliar em folhas de milho tratadas com silício, possivelmente devido à maior dureza dos tecidos foliares. Oliveira et al. (2017) avaliaram as injúrias da lagarta-do-cartucho em milho não Bt, milho não Bt + aplicação de silício, milho Bt (Cry1Ab) e milho Bt (Cry1Ab) + silício, e relataram que houve redução nas injúrias de S. frugiperda nos tratamentos com aplicação de silício. Além disso, a sobrevivência de lagartas e pupas foi inferior nos tratamentos com aplicação de silício. Há debate a respeito dos efeitos promovidos pelo silício quanto ao aumento de resistência das plantas, levantando questões se os efeitos são realmente de indução de resistência, isto é, condição onde as plantas teriam maior nível de resistência com a aplicação por si só de silício ou se os efeitos estariam relacionados à indução de memória (priming), onde as respostas induzidas de defesa seriam ativadas apenas após o ataque inicial da praga em plantas fertilizadas com silício. Outra abordagem questiona se os maiores efeitos do silício estariam 10
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mais relacionados com o aumento do vigor e a tolerância das plantas, e não resistência pelo fato de os efeitos negativos em parâmetros do desenvolvimento biológico dos insetos não serem tão fortes; neste caso, a aplicação de silício proporcionaria às plantas maior crescimento vegetativo (vigor) e assim maior capacidade em suportar o ataque das pragas, fazendo com que as injúrias nas plantas não resultem em quedas em produtividade (tolerância). Dando suporte às questões levantadas, outros estudos também não encontraram efeitos negativos tão fortes e evidentes sobre insetos-praga, como evidenciados nos trabalhos aqui já mencionados de Goussain et al. (2002), Nascimento et al. (2014) e Oliveira et al. (2017), mas sim efeitos positivos no crescimento das plantas. Nascimento et al. (2017) não encontraram efeitos negativos na sobrevivência de S. frugiperda em plantas de arroz tratadas com silício. Entre os efeitos significativos sobre o desenvolvimento dos insetos, a longevidade dos adultos foi diminuída apenas nas plantas tratadas via solo em comparação com plantas tratadas via foliar e plantas sem aplicação. Além disso, fêmeas oriundas de lagartas que se alimentaram de plantas com aplicação de silício via solo tiveram a viabilidade dos ovos reduzida em 50%. No mesmo trabalho, apenas quando o silício foi aplicado via solo houve incremento no crescimento vegetativo do arroz; as plantas fertilizadas com silício apresentaram maior altura, massa seca, índice de clorofila e teor de silício acumulado nas folhas. Em outros trabalhos com resultados similares, Nogueira et al. (2014) observaram aumentos na massa seca da parte aérea e raízes de plantas de arroz fer-
tilizadas com silício. Este trabalho também constatou que não houve diferença significativa na duração do período larval de S. frugiperda entre plantas com e sem aplicação de silício. Neri et al. (2005) não encontraram diferenças significativas na mortalidade de lagartas de S. frugiperda em plantas de milho fertilizadas com silício em comparação com a testemunha. Rodrigues et al. (2018) verificaram ligeira redução na preferência da lagarta-do-cartucho em função do aumento da dose de silicato de potássio em feijoeiro, porém sem fortes efeitos negativos em parâmetros do desenvolvimento biológico do inseto. Nesse contexto acredita-se que os efeitos do silício no metabolismo das plantas possam estar mais relacionados à indução de tolerância que à indução de resistência aos insetos. Essas questões estão sendo atualmente investigadas mais a fundo em um trabalho de mestrado no Departamento de Entomologia da Universidade Federal de Lavras (Ufla), avaliando-se os efeitos da aplicação de silício via solo em plantas de variedade e híbrido de milho na presença ou ausência da herbivoria pela lagarta-do-cartucho por meio de avaliações na alimentação e no desenvolvimento das lagartas, no crescimento radicular e de biomassa das plantas, bem como nas atividades de enzimas oxidativas. A expectativa é de que os resultados auxiliem no esclarecimento dos efeitos do silício nas plantas e favoreçam a elaboração de estratégias eficientes para o uso deste elemento em programas de manejo integrado de C pragas. Amanda Cristina Guimarães Sousa e Bruno Henrique Sardinha de Souza, Universidade Federal de Lavras
Milho
Combate eficaz Fotos Aildson Duarte
Além da cigarrinha-do-milho, os pulgões e também variantes mais severas de vírus já conhecidos têm tirado o sossego dos produtores de milho. É preciso estar atento para não confundir os sintomas, nem as ações de manejo
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M
uito se tem falado sobre a cigarrinha-do-milho, que é o vetor dos patógenos responsáveis pelo enfezamento do milho. No linguajar comum do campo, a “doença da cigarrinha” está trazendo muitos prejuízos na maioria das regiões produtoras e é preciso combatê-la de forma eficaz. O objetivo deste artigo é ampliar a abordagem dos agentes causais e dos vetores dos sintomas que estão sendo tratados como “enfezamento” que, na verdade, incluem também as viroses. Parte dos sintomas observados no campo, por não terem o mesmo agente causal, é diferente daqueles clássicos, mostrados nas publicações sobre a cultura do milho. Isso se deve ao aumento da ocorrência das viroses, sendo algumas transmitidas pela própria cigarrinha e outras pelo pulgão do milho. Soma-se a este fato o surgimento de novas variantes mais severas de vírus conhecidos, como, por exemplo, o mosaico comum do milho, ou Sugarcane mosaic virus. O enfezamento refere-se a dois patógenos pertencentes à classe dos molicutes: o fitoplasma do milho pertencente ao subgrupo 16SrI-B, Candidatus Phytoplasma asteris, causador do enfezamento vermelho, e o espiroplasma do milho, Spiroplasma kunkelii, causador do enfezamento pálido. No entanto, há dificuldade de separação dos sintomas no campo, pois os patógenos muitas vezes ocorrem simultaneamente na mesma planta. Esses patógenos são transmitidos pela cigarrinha-do-milho, Dalbulus maidis. Dentre os principais vírus incidentes na cultura encontram-se o mosaico comum do milho, causado pelo Sugarcane mosaic virus (SCMV), do gênero Potyvirus, o mosaico amarelo do milho causado pelo Maize yellow mosaic virus (MaYMV), do gênero Polerovirus, am-
Quadro 1 - Frequência de viroses em 80 amostras de plantas sintomáticas na rede de ensaios de milho do Instituto Agronômico (IAC), em diferentes localidades no estado de São Paulo, em 2019 e 2020. Análises realizadas no Instituto Biológico. Fonte: Gonçalves & Duarte, 2020 Incidência de VIROSES em 2019 e 2020 80 amostras analisadas no Instituto Biológico VÍRUS Sugarcane mosaic virus (Mosaico comum do milho) Maize yellow mosaic virus (Mosaico amarelo) Maize rayado fino virus (Risca do milho) Maize striate mosaic virus (MSMV)*
INSETO vetor Rhopalosiphum maidis (pulgão do milho) Rhopalosiphum maidis
Dalbulus maidis (cigarrinha do milho) Dalbulus maidis
FREQUÊNCIA nas plantas sintomáticas 31 % 88% em conjunto com MaYMV 59% 92% conjunta com 1 ou + vírus 49% 82% em conjunto com MaYMV 79% 66% em conjunto com MaYMV 24% em conjunto com MRFV
* Avaliado apenas em 2020 (48 amostras verão e safrinha). Fonte: Gonçalves & Duarte, 2020
Planta com sintoma “clássico” do enfezamento do milho. Espiroplasma do milho (Spiroplasma kunkelii)
bos transmitidos pelo pulgão do milho Rhopalosiphum maidis (Gonçalves et al., 2007, 2011, 2017, 2020) e o vírus da risca do milho (Gonçalves et al., 2007), causado pelo Maize rayado fino virus (MRFV), gênero Marafivirus, transmitido pelo mesmo vetor dos molicutes, a cigarrinha D. maidis. Recentemente, identificou-se no Brasil mais um vírus transmitido pela cigarrinha-do-milho, denominado Maize striate mosaic virus ou MSMV (Fontenele et al., 2017), um Mastrevirus, gênero que engloba outras espécies de vírus conhecidos por causar grandes perdas na cultura do milho, em especial no continente africano. Os sintomas típicos da infecção pelo mosaico comum do milho manifestam-se pela presença de folhas com manchas verdes entremeadas por manchas amarelas, em padrão de mosaico. No ano de 2017, foi relatada em lavouras no estado de São Paulo a presença de um novo vírus no País, o Maize yellow mosaic virus, ou mosaico amarelo do milho, que, como o nome sugere, causa um tipo de amarelecimento foliar, por vezes, também associado a um mosaico em faixas. É importante observar que outros vírus ainda não relatados no País, como o Maize chlorotic mottle virus (MCMV), que em infecção mista com o SCMV (mosaico comum) pode causar a devas-
tadora doença conhecida como necrose letal do milho, ou mesmo vírus emergentes e pouco conhecidos, apesar de ainda não detectados, podem estar presentes. Há que se considerar também a variabilidade genética dos patógenos transmitidos pelos insetos vetores, em especial os vírus, que devido ao seu pequeno genoma constituído de sequências curtas, na sua maioria de RNA, podem sofrer mutações e recombinações genéticas, gerando novas variantes mais agressivas, podendo causar epidemias e consequentemente maiores danos e perdas econômicas. Um fator, até há pouco tempo negligenciado, é que esses patógenos podem infectar simultaneamente uma mesma planta. Nesses casos, é comum
ocorrer o sinergismo das infecções e a consequente intensificação dos sintomas foliares, além de nanismo, necroses de colmo e folhas e até a morte das plantas infectadas. Em levantamentos recentes sobre a incidência de viroses em plantas sintomáticas, realizados no estado de São Paulo, pelos Institutos Biológico (IB) e Agronômico (IAC), verificou-se a ocorrência do Sugarcane mosaic virus, do Maize yellow mosaic virus, do Maize striate mosaic virus e do Maize rayado fino virus, em infecções simples, mas na maioria das vezes em infeções múltiplas de dois ou mais vírus (Quadro 1). Os dois vírus transmitidos pelo pulgão do milho, ou seja, SCMV e MaYMV, estão frequentemente associados causando sintomas de mosaico
Plantas com sintomas iniciais de infecção mista por fitoplasma, espiroplasma e do mastrevírus Maize striate mosaic virus
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Fotos Aildson Duarte
Sintomas na espiga (necrose da palha) e nas folhas (mosaico e amarelecimento) em planta com infecção conjunta dos vírus Sugarcane mosaic vírus e Maize yellow mosaic virus
comum e amarelo, mas também provocando sintomas de mosaico severo e necrose, o que resulta em maior dano. Atualmente, as recomendações de manejo que minimizam os prejuízos decorrentes dessas doenças indicam práticas para reduzir a população da cigarrinha-do-milho, embora parte dessas recomendações seja válida também para o controle do pulgão do milho, Rhopalosiphum maidis. É importante salientar que o controle químico da cigarrinha, quando necessário, deve ser realizado somente com inseticidas registrados para esse inseto, evitando a seleção de indivíduos resistentes. Deve-se dar preferência ao controle com inseticidas via tratamento de sementes, o que é mais eficiente, além de preservar inimigos naturais de pragas que podem reduzir efetivamente a população desses insetos, e em associação com o controle biológico. Atualmente, já existem no mercado produtos biológicos comerciais, à base dos fungos entomopatogênicos Isaria fumosorosea e Beauveria bassiana, indicados para o controle de D. maidis, Quando necessário, o controle químico desses insetos deve ser feito nos primeiros estádios da cultura, sobretudo nas quatro primeiras semanas após a implantação, porque os danos e as perdas causados por esses patógenos são mais severos quanto mais cedo ocorrer a incidência dos seus respectivos vetores e a 14
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Sintomas de infecção conjunta pelo vírus Maize yellow mosaic virus e espiroplasma do milho
consequente infecção das plantas. O pulgão do milho, por sua vez, tem diferentes hábitos alimentares. Na sua forma alada, realiza voos sobre o campo e, atraído por estímulos visuais, como coloração amarela da cultura, pousa e realiza picadas de prova de curta duração na seleção de plantas hospedeiras. Durante essas picadas, pode transmitir os vírus de forma não persistente, como o SCMV, responsável pelo mosaico comum. Nesse caso, o inseto adquire
o vírus que fica aderido no seu estilete e pode transmiti-lo para novas plantas apenas com as primeiras picadas rápidas de planta em planta. O SCMV infecta os tecidos epidérmicos das folhas e os vasos do xilema, facilitando a sua aquisição rápida pelos pulgões. Por outro lado, a transmissão do MaMV (mosaico amarelo) por R. maidis ocorre de forma mais lenta, sendo necessárias horas ou dias de alimentação para que a transmissão efetivamente ocorra para
C
Quebramento de plantas no estádio de enchimento dos grãos em plantas apresentando infecção por molicutes (enfezamento) e vírus
uma nova planta sadia. O pulgão tem ampla gama de gramíneas hospedeiras (milho, sorgo, capim massambará, entre outros) que também podem ser infectadas pelos dois vírus e servir como fontes de inóculo. Esse afídeo é notado, na maioria das vezes, tardiamente nas lavouras quando forma colônias e as ecdises liberam resíduos facilmente visíveis. Devido às suas características, o manejo do pulgão é mais complexo em relação ao da cigarrinha-do-milho, que se multiplica e infecta apenas o milho, embora possa se abrigar em diversos tipos de gramíneas, nas quais pode sobreviver temporariamente, mas não se reproduzir e formar novas colônias. O controle químico do pulgão não promove um combate efetivo do mosaico comum, porque a transmissão se dá na picada de prova, antes da sua possível morte pelo inseticida. No entanto, o seu uso pode desfavorecer a disseminação para fora da lavoura, reduzindo novas infecções. Por outro lado, o controle do mosaico amarelo pode ser mais eficiente com o controle químico do pulgão, devido à sua aquisição e transmissão mais lenta pelo vetor. O controle biológico natural de pulgões é, em geral, eficiente, por serem muito procurados por insetos predadores, como joaninhas, e também vespas parasitoides. No entanto, é importante observar que o uso indiscriminado, e por vezes desnecessário, de inseticidas para o combate à cigarrinha pode eliminar a presença desses inimigos naturais. As epidemias ocorrem principalmente devido aos cultivos contínuos e ao uso de cultivares de milho suscetíveis a essas doenças. No caso das viroses, observa-se que algumas cultivares apresentam expressiva tolerância, pois, apesar dos sintomas foliares, apresentam boa produtividade. No entanto, nota-se a falta de melhores estudos em relação ao comportamento de alguns híbridos atualmente comercializados, pois alguns não apresentam os sintomas visuais clássicos do mosaico comum, mas ao atingirem o estádio de enchimento de grãos, tornam-se sintomáticos, com necrose na palha, má formação de espigas e quebramento de plantas, comprometendo a produção e a colheita.
Plantas de milho com colônias do pulgão Rhopalosiphum maidis, nas folhas próximas do pendão
Uma das práticas que precisam ser aperfeiçoadas é o controle do milho safrinha resteva, resistente ao glifosato (RR), nas lavouras de soja RR implantadas em sucessão cultural. O atraso na aplicação de graminicidas amplia a ponte verde, favorecendo a multiplicação do pulgão e a sobrevivência da cigarrinha, com a consequente manutenção dos patógenos no ambiente.
De uma maneira geral, o controle dos vírus e molicutes aqui descritos, assim como dos seus respectivos vetores, cigarrinhas e pulgões, é efetivamente alcançado por uma combinação de diversas medidas. Dentre elas encontra-se a adoção da rotação de culturas, de preferência com não gramíneas, que podem servir de hospedeiras tanto para os patógenos quanto para os vetores; a eliminação de restos culturais e eliminação de perdas na colheita, evitando o surgimento de tigueras; eliminação de gramíneas da vegetação espontânea hospedeiras de patógenos e vetores; evitar a semeadura tardia e, com o auxílio dos sistemas regionais de extensão rural, sincronizar a semeadura do milho na região; e, especialmente, a adoção de cultivares resistentes ou tolerantes aos patógenos. A adoção em conjunto dessas medidas possibilita realizar um manejo integrado das doenças e de seus vetores-chave, minimizando o uso de inseticidas e tornando os ambientes de produção ambientalmente e econoC micamente sustentáveis. Marcos Cesar Gonçalves, Instituto Biológico (IB) Aildson Pereira Duarte, Instituto Agronômico (IAC)
Resteva de milho em sucessão com lavouras de soja, servindo como “reservatórios” de vírus e molicutes
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Soja
Quem causa Por que é fundamental identificar as espécies que atualmente causam a mancha púrpura da semente e o crestamento foliar de cercospora em soja no Brasil, assim como determinar a concentração efetiva dos fungicidas para que, ao longo do tempo, seja possível monitorar a alteração da sensibilidade dessas espécies de cercospora aos principais grupos químicos utilizados na cultura
A
mancha púrpura da semente (MPS) e o crestamento foliar de cercospora (CFC), são doenças que se encontram disseminadas nas principais regiões produtoras de soja no Brasil. O agente causal mais conhecido e relacionado a essas doenças é o fungo Cercospora kikuchii (Mats. & Tomoy.) Gardner. Contudo, estudos recentes demonstraram a existência de outras espécies associadas a essas doenças, sendo C. cf. flagellaris e C. cf. sigesbeckiae as espécies mais recorrentes (Soares et al., 2015; Sautua et al., 2020). As estratégias de manejo para a MPS e o CFC incluem principalmente os controles genético (cultivares resistentes), cultural (rotação de cultura) e químico. O controle químico poder ser realizado através do uso de fungicidas no tratamento de sementes, sendo esse eficiente apenas nos estádios iniciais da cultura, conferindo proteção pelo efeito residual dos produtos (Godoy et al., 2014; Kimati et al., 2005) por isso deve ser complementado com aplicações na parte aérea da cultura. Os principais grupos químicos utilizados para essas doenças são benzimidazol (metil benzimidazois carbamatos, MBC), triazol (inibidores da desmetilação, IDM), estrobilurina (inibidores da quinona externa, IQe), carboxamida (inibidores da succinado desidrogenase, ISDH) e multissítios (ditiocarbamato e isoftalonitrila). Apesar da aplicação de fungicidas na parte aérea ser uma estratégia de manejo importante para o controle dessas doenças, a perda de sensibilidade de alguns isolados tem comprometido esse controle. Estudos recentes relatam a perda de sensibilidade de isolados de Cercospora spp. aos fungicidas dos grupos químicos MBC e IQe em diversos países, incluindo os Estados Unidos (Price III et al., 2015), a Argentina (Sautua et al., 2020) e recentemente o Brasil (Mello et al., 2021). No campo, os fungicidas do grupo IQe quando aplicados isoladamente apresentam baixa eficiência de controle do complexo MPS e CFC 18
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M.Silva (UPF) e Syngenta, 2021
Figura 1 - Distribuição e percentual dos 25 isolados de Cercospora provenientes de diferentes regiões produtores de soja do Brasil. Syngenta, Uberlândia/MG, 2021
Mancha púrpura da semente (MPS) e crestamento foliar de cercospora em folha
em soja (Godoy, 2017). Entretanto, não existem informações sobre a eficiência dos grupos químicos de fungicidas para controle de novas espécies de Cercospora em soja. Diante desse cenário, é fundamental identificar as espécies que atualmente causam a MPS e o CFC em soja no Brasil, assim como determinar a concentração efetiva (CE50) dos fungicidas, para que ao longo do tempo seja possível monitorar a alteração da sensibilidade dessas espécies de Cercospora aos principais grupos químicos de fungicidas utilizados em soja.
MATERIAL E MÉTODOS
Esse estudo foi conduzido em duas etapas. A primeira etapa foi a identificação molecular das espécies de Cercospora e o sequenciamento da região do gene cytb para verificação da mutação G143A, conforme metodologia descrita em Sautua et al. (2020), sendo esta mutação que confere perda de sensibilidade aos fungicidas do grupo da estrobilurina (IQe). Para isso, foram utilizados 25 isolados de Cercospora spp. coletados de folhas e sementes de soja, provenientes de diferentes regiões do Brasil (DF, GO, MG, MS, MT, PR, SC, SP e RS). As análises moleculares para a identificação das espécies de Cercospora foram realizadas através do sequenciamento da região ITS (região interna do espaçador transcrito), região do DNA comumente usada para identificação de gênero e espécie de fungos (White et al., 1990). A segunda etapa foi a determinação in vitro da CE50 (concentração efetiva)
de dois isolados de C. cf. flagellaris aos fungicidas IQe (azoxistrobina e picoxistrobina) e IDM (difeconazol e propiconazol) utilizando o método de inibição do crescimento micelial, seguindo a metodologia descrita por Price III et al. (2015) e Sautua et al. (2020). Os isolados utilizados nesse estudo foram codificados como CS-013 (Itaberá-SP) e o CS-01 (Uberlândia, Minas Gerais), ambos isolados de sementes de soja. As concentrações de fungicidas adicionados ao meio de cultura Batata Dextrose Ágar (BDA) foram: 0,1mg/L, 1mg/L, 5mg/L, 10mg/L, 25g/L, 50mg/L, 75mg/L e 100mg/L, sendo o tratamento controle 0mg/L. Vinte dias após a transferência dos fungos para o meio de cultura, com o fungicida nas diferentes concentrações, procedeu-se a mensuração do crescimento micelial do fungo. A CE50 é a quantidade de fungicida em mg/L que controla 50% da germinação do esporo ou do crescimento micelial do fungo, sendo que após determinar os valores dessa variável é possível monitorar ao longo do tempo se há alteração na sensibilidade do fungo aos fungicidas. Para que um fungicida seja considerado altamente tóxico ao fungo, o valor da CE50 não deve ultrapassar 1mg/L; quando a CE50 está entre 1mg/L e 10mg/L, os fungicidas são moderadamente fungitóxicos; quando o valor está entre 10mg/L e 50mg/L, são pouco tóxicos; e acima de 50mg/L são atóxicos ao fungo (Edgington et al., 1971). Desse modo, a classificação proposta é um parâmetro para determinar alterações na sensibilidade dos fungos aos fungicidas. Os dados foram subme-
tidos à análise de regressão não linear, utilizando o programa estatístico RStudio versão 1.2.5033 (Team and DC, 2019).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dos 25 isolados estudados, verificou-se que 73% (18) foram identificados como C. cf. flagellaris, seguidos de 15% (4) dos isolados identificados como C. canescens, 8% (2) dos isolados como C. dichondrae e 4% (1) identificados como C. helianthicola (Figura 1). Esses resultados são similares aos relatados por Sautua et al. (2020), em estudo desenvolvido na Argentina, onde identificou diversas espécies de Cercospora, sendo a espécie C. cf. flagellaris a mais recorrente. O resultado do sequenciamento da região do gene cytb demonstrou a presença da mutação que leva à substituição G143A em todos os isolados, independentemente da espécie identificada. A mutação também está presente em 73% dos isolados de Cercospora spp. analisados que foram coletados durante nove safras em diferentes estados brasileiros (Mello et al., 2021). Com relação aos fungicidas do grupo químico triazol (Figura 2), o difenoconazol apresentou os menores valores de CE50, 0,61mg/L e 0,09mg/L, respectivamente, para os isolados CS-013 e CS-01, seguido do propiconazol (2,93mg/L e 0,27mg/L), sendo esse grupo químico classificado com moderadamente fungitóxico. Com relação ao grupo químico estrobilurina (IQe), azoxistrobina e picoxistrobina apresentaram valores de www.revistacultivar.com.br • Julho 2021
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Figura 2 - Crescimento em meio de cultura de C. cf. flagellaris (CS-013) em diferentes concentrações dos fungicidas do grupo químico triazol (difenoconazol e propiconazol). UPF, Passo Fundo/RS, 2021
CE50 maior que 100mg/L para ambos os isolados (Figura 3), sendo classificado como pouco tóxico. Este fato causa grande preocupação, visto que estudos confirmam que pode haver resistência cruzada, ou seja, fungos resistentes a um fungicida também são resistentes aos demais produtos que possuem o mesmo mecanismo de ação. A ocorrência da variação da CE50 dos fungicidas está relacionada com a adaptabilidade do patógeno aos ingredientes ativos, além da diversidade dentro das populações do patógeno, que, por consequência, resulta na diminuição da performance dos fungicidas e seleção de organismos resistentes. Price III et al. (2015) observou alteração na sensibilidade de C. kikuchii para o grupo químico IDM (flutriafol, propiconazol e tetraconazol). Alteração na sensibilidade também foi confirmada para o grupo químico IQe (azoxistrobina, picoxistrobina e piraclostrobina), sendo associada às mutações G143A e E198A no Brasil (Mello et al., 2021), assim como nos Estados Unidos (Price III et al., 2015) e na Argentina (Sau-
tua et al., 2020).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O monitoramento constante da eficiência dos fungicidas para diferentes patógenos em soja torna-se vital para identificar variabilidade na população e, assim, prenunciar possível alteração na sensibilidade aos fungicidas, com possibilidade de adotar medidas que reduzam o impacto no controle das doenças. Dos fungicidas disponíveis para o controle de C. cf. flagellaris, o grupo químico triazol permanece classificado como moderadamente fungitóxico (CE50 de 0,09mg/L a 2,93mg/L), enquanto que o grupo químico estrobilurina apresenta valores acima de 100 mg/L, sendo classificado como pouco tóxico. Por isso que para esse grupo químico é necessário ter cautela no seu uso, devido à resistência cruzada, além de ser um grupo químico que vem perdendo controle no campo para as espécies de Cercospora desde 2018. Por isso, a utilização de estratégias antirresistência, como aplicação preventiva
de fungicidas, melhoria na tecnologia de aplicação, alternância de fungicidas de diferentes grupos químicos e associação de fungicidas sistêmicos (triazol, estrobilurina, carboxamida) com fungicidas multissítios (ditiocarbamato, isoftalonitrila e cobre), torna-se fundamental para manter o controle eficiente. Esta pesquisa segue em desenvolvimento para as demais moléculas dos grupos químicos IDM e IQe, assim como para benzimidazol (MBC), carboxamida (ISDH) e multissítios (ditiocarbamato e isoftalonitrila). Antes desse estudo em desenvolvimento, não havia informação sobre os valores de CE50 para C. cf. C flagellaris. Monikéli Aparecida da Silva e Carolina Cardoso Deuner, Universidade de Passo Fundo Flávia Elis de Mello, Sandra Marisa Mathioni, Ricardo Francisco Desjardins Antunes e Daniel Dias Rosa, Syngenta Proteção de Cultivos, Pesquisa e Desenvolvimento de Fungicidas
Figura 3 - Crescimento em meio de cultura de C. cf. flagellaris (CS-013) em diferentes concentrações dos fungicidas do grupo químico estrobilurina (azoxistrobina e picoxistrobina). UPF, Passo Fundo/RS, 2021
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Soja Pedro Singer
Descuidar nunca O conjunto de estratégias adotadas ao longo dos anos no manejo da ferrugem-asiática permitiu ao Brasil chegar a um patamar onde a doença se mostra sob controle, mesmo com a menor sensibilidade do fungo aos fungicidas. Porém é preciso manter atenção sempre para que esse cenário não mude
A
ferrugem-asiática da soja é uma doença com potencial de causar grande impacto na produtividade da cultura, desde que as condições ideais estejam presentes. São elas presença do inóculo do patógeno em quantidade suficiente para causar infecções, hospedeiro suscetível à doença e um ambiente (condições do tempo e clima) favorável. Essas condições exis24
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tem em praticamente todas as regiões do Brasil onde se semeia soja. O patógeno está sempre presente em climas subtropical e tropical que favorecem a sobrevivência do inóculo e as cultivares são, em sua maioria, suscetíveis. Tal fato fez com que a ferrugem-asiática tenha se tornado a principal doença da cultura e exigiu modificações profundas no manejo, no curso de 20 anos, para que se
pudesse chegar a bons níveis de controle da doença nos dias atuais. O sucesso do manejo exige a combinação de táticas que, em conjunto, reduzem a quantidade de inóculo inicial do patógeno, bem como a velocidade de progressão das epidemias. Além disso, existem táticas que reduzem o tempo de duração total da epidemia. Neste artigo usamos a teoria epidemiológi-
Figura 1 - Grupo de táticas de controle que atuam podendo reduzir o valor de três componentes de uma epidemia de ferrugem-asiática da soja. O asterisco representa a transformação de um modelo logístico
ca para tentar explicar os motivos que sustentam o fato de a ferrugem estar aparentemente bem controlada atualmente, o que exigiu muitos anos de experiência e adoção de esforços coletivos para o uso de práticas mais efetivas que atuam de maneira combinada. Algumas dessas práticas ocorreram por mudanças no sistema produtivo, que não tiveram como objetivo o controle da ferrugem, mas que indiretamente tiveram grande impacto no manejo da doença.
ENTENDENDO A EPIDEMIA
A ferrugem é uma doença policíclica e, como tal, ocorrem vários ciclos reprodutivos do patógeno após as infecções iniciais. Seu início, no entanto, depende de um inóculo (esporos) externo à lavoura (a ferrugem não se transmite por semente e não se mantém em restos culturais), o qual deve estar sobrevivendo em plantas vivas de soja ou outras hospedeiras, e ser capaz de se deslocar por correntes de vento e atingir uma planta de soja ainda em condições de causar infecções. Considerando os seguintes fatores: a) a grande área cultivada no Brasil, e em período anterior à safra no Brasil e em países vizinhos (exemplo Bolívia); b) a presença de plantas de soja voluntárias; c) o grande número de hospedeiras do fungo; e d) a alta capacidade de transporte aéreo a longa distância, pode-se dizer que o inóculo está sempre presente. No entanto, duas condições são incertas: quando exatamente e com que quantidade os esporos chegarão a uma lavoura específica no início da safra. Uma forma de se obter conhecimento sobre a pre-
sença do inóculo é usar armadilhas coletoras, uma prática que vem sendo intensificada em sua adoção no Brasil como forma de auxiliar na tomada de decisão de controle, junto com outros fatores - e ressalte-se que somente a presença de esporos não é um critério para decisão. Uma vez que a epidemia tem início, novos esporos são produzidos na lavoura, os quais contribuem efetivamente para as novas infecções. A partir daí é irrelevante monitorar o inóculo em armadilhas, pois a epidemia avançará de maneira "autônoma". A velocidade com que a epidemia avança é determinada pela "taxa de infecção", a qual sumariza as condições necessárias para a ocorrência das novas infecções, sendo principalmente aquelas de natureza meteorológica como chuva, umidade e temperatura do ar. Nas condições ótimas de ambiente (temperaturas amenas e chuvas frequentes), a epidemia avançará e tomará conta dos tecidos sadios que ainda restam na planta, enquanto os tecidos infectados continuarão produzindo esporos por praticamente todo o ciclo de cultivo, enquanto existirem tecidos sadios a serem
infectados. Nesse sentido, o tempo que a epidemia tem para se desenvolver até que haja tecido "infectável" é também um componente importante. Por exemplo, quanto mais tarde um inóculo chega à lavoura ou menor a sua quantidade inicial, a epidemia sofre um retardo no seu avanço, podendo ter um fim precoce cujos níveis de severidade (final) podem ser suficientemente baixos para não causar prejuízos fisiológicos ou econômicos. O período máximo de duração da epidemia, portanto, junto com o inóculo e a taxa de infecção, é um componente-chave na equação epidemiológica. Veja-se a equação linearizada que resume uma epidemia do tipo policíclica, com os seus componentes-chave e as táticas de controle de ferrugem que atuam em cada componente (Figura 1). A equação acima é aplicável para qualquer doença policíclica, porém a importância relativa de cada um dos parâmetros dependerá da doença específica em função da magnitude dos valores. Por exemplo, existem doenças que: progridem a taxas mais altas que outras, em que o inóculo está mais ou menos abundante no início da safra e, por fim, que a duração da epidemia é mais ou menos variável. No caso da ferrugem-asiática, essas condições variam também em função da região, do clima predominante, da paisagem etc. Portanto, é importante ter um olhar e uma interpretação específica para a condição que se pretende analisar.
AS ARMAS CONTRA A FERRUGEM-ASIÁTICA
Quanto às práticas de manejo, o efeito sobre cada uma delas nos componen-
Figura 2 - Problemas e soluções no manejo da ferrugem-asiática no Brasil ao longo de duas décadas
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Fotos Marcelo Madalosso
Doença tem alto potencial para causar impacto na produtividade da soja
tes da epidemia pode ser determinado de maneira muito clara. No caso da ferrugem-asiática, a primeira tática de manejo adotada no Brasil, ainda de maneira isolada, durante os primeiros cinco anos após a ferrugem ter sido relatada de forma epidêmica no Brasil, foi o controle químico, cujo efeito se dá diretamente na redução da velocidade com que as epidemias ocorrem. Com a proteção dos tecidos da planta, um número menor de lesões será formado e, consequentemente, menor será a produção de esporos, fazendo com a epidemia avance de maneira mais lenta - mesmo em condições de umidade e temperatura ótimas. O controle químico, no entanto, não é 100% eficaz e não evita a chegada do inóculo inicial na lavoura, portanto não atua, pelo menos diretamente, no inóculo. Uma maneira indireta de atuar é que, reduzindo a produção de inóculo em uma área, esse inóculo estará em menor quantidade para se disseminar para outras lavouras. Portanto, há um efeito indireto do controle químico no inóculo inicial, o que se torna significativo em grandes áreas de cultivo como no Brasil. Porém, como a ferrugem produz uma quantidade muito grande de esporos, somente o controle químico é insuficiente. Adotado isoladamente, além de mais custoso, é pouco sustentável, já que os produtos sítio-específicos selecionam isolados resistentes aos princípios ativos. Como atuar, então, diretamente na redução do inóculo? A resposta está na adoção do vazio sanitário como medida de redução do inóculo em escala regional. Não é uma medida 100% 26
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eficiente, uma vez que o fungo apresenta outros hospedeiros, há sobra de plantas voluntárias e o Brasil possui países vizinhos (exemplo: Bolívia) que não adotam essa mesma medida. No entanto, comparada com a situação anterior (sem a adoção do vazio sanitário) houve um atraso nas primeiras ocorrências na safra, principalmente em regiões onde havia cultivo de soja no inverno sob irrigação. O vazio sanitário foi implementado após os cinco primeiros anos de ferrugem no Brasil, período que coincidiu com a redução de níveis de controle associados com o surgimento de populações menos sensíveis aos triazóis, os principais produtos usados de maneira muito intensa no Brasil que até então dependia apenas de uma tática isolada de controle. Em um segundo momento, houve necessidade de ajustar o controle químico com a introdução de novas misturas prontas e sua priorização de uso. A calendarização das aplicações se tornou uma prática comum, tendo em vista a dificuldade de monitoramento dos primeiros sintomas e o tamanho de áreas, principalmente no Cerrado. O vazio sanitário foi expandido para outras regiões. Nos últimos cinco anos novos ajustes foram percebidos com a introdução de produtos multissítios como medida de garantir melhores níveis de controle, coincidindo sua introdução com o aumento das populações menos sensíveis às estrobilurinas (2013) e mais tarde às carboxamidas (2015). Outro fato importante foi a antecipação da semeadura, quando possível, associada ao uso de cultivares de ciclo mais precoce, como medida de "escape" à doença. Em teoria, uma lavoura semeada mais cedo estaria exposta a uma menor quantidade de inóculo, mas, mais importante que isso, um ciclo mais curto faz com que a janela da epidemia seja encurtada, não dando condições para que o patógeno consiga completar muitos ciclos reprodutivos. Essa associação da semeadura cedo com cultivares precoces teve grande estímulo pelo crescimento da segunda safra de verão no Brasil, em grande parte com milho e, em menor proporção, com algodão, feijão e outras culturas. A Figura 2 sumariza alguns problemas identificados e soluções adotadas no manejo.
SIMULANDO AS EPIDEMIAS: CENÁRIOS DE CONTROLE, INÓCULO E CICLO
Para simular epidemias de ferrugem-asiática, usou-se um modelo clássico de crescimento populacional, chamado logístico, o qual tem sido bem ajustado a diversas curvas de progresso para essa doença. As simulações foram realizadas no programa R usando o pacote epifitter (https://github.com/AlvesKS/epifitter). Para rodar o modelo são necessários dois parâmetros: o inóculo inicial (y0, intensidade da doença em proporção) e a taxa “aparente” de infecção r (unidade de doença por unidade de doença, por dia) da doença. Esses valores são estimados a partir do ajuste do modelo às curvas e, portanto, podem ser obtidos em consulta à literatura. Para condições ótimas de crescimento da doença até 100%, tomou-se por base um estudo conduzido no Cerrado para determinar os valores de taxa de infecção. No estudo de Moreira et al. (2015; https://doi.org/10.1094/PDIS-10-14-1029-RE), um valor de taxa de infecção (r) para epidemias completas (que chegam a até 100% em R7) comparando várias epidemias nas con-
dições do Cerrado, foi estimado em 0,1. A redução desse valor simula situações de ambiente menos favorável à infecção ou então o uso de alguma medida que impacta diretamente na taxa de progresso, que é o caso do controle químico. A seguir há três cenários onde os valores de taxa, inóculo inicial e tempo de duração da epidemia foram simulados de forma a exemplificar o efeito isolado e combinado de fatores que afetam esses coeficientes nos modelos.
Se adotado de forma isolada o controle químico é insuficiente para o manejo adequado da ferrugem
Cenário 1 (2003 a 2008): Controle químico e dois níveis de inóculo
N
este cenário de uso de cultivares de ciclo longo (140 dias), assumiu-se que os esporos da ferrugem estão presentes em dois níveis de inóculo que representam, por exemplo, regiões geográficas mais ou menos distantes das fontes ativas de inóculo. Poderia ser o caso do Cerrado Brasileiro nos primeiros anos de combate à doença, antes da adoção do vazio sanitário. Uma região com menor concentração de inóculo poderia ser o Sul do Brasil. No pior cenário, 3% de severidade (y0 = 0,03) são percebidos durante a detecção dos primeiros sintomas aos 20 dias após o plantio.
Com isso, sem controle químico e no cenário de inóculo mais alto, a doença avança, a uma taxa de infecção (r) 0,05 a 0,1 (do modelo logístico), e atinge 80% a 100% de severidade em R7, dependendo das condições ambientais. O uso do controle químico atua reduzindo a taxa de infecção em 80%, o que ao final também resulta em 80% de redução da severidade - níveis de controle esses obtidos com aplicações sequenciais de fungicidas eficazes nos primeiros anos de combate à doença (Figura 3A). Já no cenário de inóculo mais re-
duzido, a doença é percebida com 0,3% de severidade aos 20 dias, mas avança mais lentamente, pois há um "atraso na curva" com o inóculo mais reduzido combinado com condições ambientais menos favoráveis. Esses casos de severidade baixa eram comuns no Sul do Brasil, e ainda continuam sendo, em anos desfavoráveis mesmo com inóculo presente em quantidade suficiente para as epidemias. O controle químico é bastante eficaz nesses casos, pois mantendo-se as aplicações, consegue-se manter a severidade em níveis muito baixos (Figura 3B).
Figura 3 - Simulação de epidemias de ferrugem-asiática utilizando um modelo logístico no cenário de inóculo mais alto (A) e inóculo reduzido pela metade (B). Cada simulação foi feita com duas taxas de infecção, sendo uma mais alta simulando uma situação sem controle químico e outra mais baixa (⅓ da primeira) simulando uma situação com controle químico
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Cenário 2: Reduz inóculo isoladamente para epidemia severa e moderada
N
esse cenário, sem controle químico, nota-se que quando as condições ambientais são extremamente favoráveis às epidemias (taxa de infecção de 0,1), a redução de inóculo pouco tem efeito na severidade final, já que seu
efeito é apenas de "atrasar" a epidemia, que tem "tempo" suficiente para atingir níveis elevados de severidade em R7 (Figura 4A). No entanto, o efeito de redução de inóculo é percebido em condições ambientais menos favoráveis ao pro-
gresso da doença ou quando se aplicam medidas de controle que reduzem a taxa de infecção. Os níveis de severidade podem ser reduzidos a níveis satisfatórios somente com medidas que reduzem o inóculo - no caso o vazio sanitário.
Figura 4 - Simulação de epidemias de ferrugem-asiática utilizando um modelo logístico no cenário de epidemia severa (A) e moderada (B) simulada com duas taxas de infecção. Cada simulação foi feita com três taxas de infecção
Cenário 3 (atual): Inóculo baixo, uma taxa e ciclo precoce
N
ote-se agora uma situação de uso do vazio sanitário (inóculo bastante reduzido) com o efeito isolado do ciclo de maturação das cultivares considerando uma taxa de infeção (0,1) e uso de cultivares com ciclo reduzido em 20 dias ou 40 dias. No cenário mais favorável ao progresso da
doença, é perceptível que o atraso a partir de 20 dias na entrada da doença (devido ao menor ciclo da soja) já tem um bom efeito reduzindo a severidade final de 35% a 40% do valor de uma cultivar de ciclo longo. Já o atraso em 40 dias permite obter redução de até 80% na severidade final - similar a
um nível de controle com os melhores fungicidas. Em um ambiente menos favorável (estiagens ou uso de controle químico), a redução de ciclo combinado com controle químico pode reduzir a níveis de doença em R7 que causam pouco ou nenhum dano na produtividade (Figura 5).
Figura 5 - Simulação de epidemias de ferrugem-asiática utilizando um modelo logístico em três cenários de duração de ciclo da soja
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PODE DESCUIDAR?
306, que institui o Programa Nacional de Controle da Ferrugem-asiática da Soja e regulamenta o calendário de semeadura da soja, período único, de até 110 dias consecutivos, para as datas de início e término de semeadura da soja, com objetivo de racionalização do número de aplicações de fungicidas e redução do risco de desenvolvimento de resistência do fungo P. pachyrhizi aos fungicidas. Cada estado terá o seu período de semeadura, o que reduzirá as semeaduras tardias, embora ainda seja possível dentro desse intervalo. As semeaduras tardias passam a ser regionais, em função das condições específicas de cada estado, o que pode fazer com que o fungo se dissemine das regiões que semeiam mais cedo para as regiões que semeiam mais tarde e também áreas de excepcionalidade para pesquisa ou produção de semente fora do calendário poderão
continuar existindo, a critério de cada Superintendência Federal de Agricultura, Pecuária e Abastecimento em cada unidade da federação. As simulações mostram que o conjunto de estratégias adotadas no manejo da doença permitiu chegar a um cenário onde a ferrugem se mostra sob controle mesmo com a menor sensibilidade do fungo aos fungicidas. Porém, estratégias de manejo que não dependam exclusivamente do controle químico continuam sendo adotadas e revisadas continuamente para que esse cenário não mude, garantindo a sustentabilidade da cultura. Com a ferrugem não se pode C descuidar! Emerson M. Del Ponte e Kaique dos S. Alves, Universidade Federal de Viçosa Cláudia V. Godoy, Embrapa Soja
Marcelo Madalosso
Com base nas simulações utilizando um modelo matemático ajustado com os parâmetros epidemiológicos estimados para epidemias de ferrugem-asiática no Brasil, com valores variados, nota-se que as diferentes estratégias de manejo impactaram, em diferentes magnitudes, a severidade de ferrugem. Os valores simulados refletem as situações observadas no campo nos últimos anos. Com destaque, a crescente adoção de cultivares precoces para tornar possível uma segunda safra de verão, indiretamente auxiliou nesse controle pelo escape, reduzindo o tempo das epidemias e levando a reduções nos níveis de doença. O vazio sanitário deslocou as epidemias de ferrugem para as semeaduras tardias. No entanto, isso não é possível de ser adotado em todas as regiões do Brasil. A partir de 1º junho de 2021 entrou em vigor a portaria no
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Dicas de ouro Wenderson Araújo/Sistema CNA
Zelo com o solo, atendimento de necessidades ambientais mínimas, cultivares adaptadas, arranjo correto de plantas e manejo sanitário adequado são alguns dos muitos aspectos que compõem a construção de altas produtividades em soja, resultado de interações complexas, cujos pilares são identificados nos mais diversos cenários agrícolas
A
busca por altas produtividades é sempre o grande objetivo dos produtores rurais. O Concurso de Máxima Produtividade do Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb) é um perfeito indicador desta ambição. A evolução no ganho de produtividade, à medida que as edições do concurso foram se sucedendo, tem ratificado a agricultura brasileira como a grande liderança mundial na produção de alimentos (Tabela 1). Desde as primeiras edições, os campeões de produtividade dirigiram suas ações para otimizar a relação solo x água x planta. O solo, inicialmente, como fator de sustentação e fornecimento de água e nutrientes para a planta. Esta, manejada e protegida, viabiliza a expressão genética na direção das altas produtividades. Na tentativa de eleger aspectos técnicos relevantes para o atingimento da
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máxima produtividade, é provável que se possa pecar por uma análise simplista. A produtividade dos cultivos é resultado de interações complexas, cujos pilares são identificados nos mais diversos cenários agrícolas, o que é traduzido através de um robusto acervo técnico construído ao longo de sua história.
MANEJO DO SOLO
A construção de um perfil do solo com alta eficiência agronômica, climática e biológica é determinante para a alta produtividade. O solo é o grande armazenador de água que impacta em até 75% da produtividade. Além disso, possibilita à planta um desenvolvimento radicular satisfatório que, mesmo sob estresse hídrico, químico ou biológico, mantém o potencial produtivo da planta. A camada de solo entre 0cm e 20cm de produtividade, com oferta constan-
te de água e suprimento adequado de nutrientes, permite ao sistema radicular rápido crescimento em profundidade (dois metros já aos 20 dias após a emergência), minimizando a interferência de pragas e patógenos. Para tanto, deve ser pensado um conjunto de práticas que atinjam a estrutura física e química do solo. Análises de solo realizadas periodicamente auxiliam na identificação e na correção de desequilíbrios ou carências nutricionais através da utilização de calcário e gesso, e correção da fertilidade em taxa fixa, seguido de taxa variável. Ações corretivas específicas podem ser necessárias, tais como a aplicação de micronutrientes (boro, zinco, molibdênio e enxofre) e macronutrientes (fósforo e potássio). No âmbito de ações que podem interferir na estrutura física do solo, a utilização de plantas de cobertura, as rotações e
sucessões culturais, ou diminuição do tráfego de máquinas, são práticas importantes.
NECESSIDADES AMBIENTAIS MÍNIMAS
Os recursos ambientais são fundamentais e apresentam impacto sobre diversas funções fisiológicas da planta de soja, destacando-se temperatura do solo e do ar; radiação solar, luz visível (LUX) e radiação fotossintética ativa (PAR); quantidade e distribuição de chuva durante o ciclo da cultura da soja; evapotranspiração (Penman-Monteith); potencial hídrico (umidade tensiométrica); condutividade elétrica (CE) e oferta de nutrientes (macro e micronutrientes). Temperatura do ar e do solo
A semeadura deve ser realizada na faixa de 20°C a 30°C; acima de 33°C pode ocorrer germinação defeituosa e abaixo de 15°C, a germinação é inviabilizada. O crescimento vegetativo é mínimo abaixo de 10oC; acima de 40oC ocorrem distúrbios na floração e diminuição na retenção de vagens. Esses problemas são acentuados por déficits hídricos. A floração na soja é favorecida no intervalo entre 20°C e 30°C; temperaturas elevadas promovem floração precoce podendo também acarretar diminuição na altura da planta. Insuficiência hídrica e/ou fotoperiódica durante a fase de
crescimento também provoca impacto sobre a estatura da planta. Diferenças na floração entre cultivares, ainda que na mesma época de semeadura, devem-se à resposta diferencial das cultivares ao comprimento do dia (fotoperíodo). De maneira geral, as cultivares mais afetadas pela temperatura são aquelas menos sensíveis ao fotoperíodo. A maturação é acelerada pela ocorrência de altas temperaturas, principalmente se associadas a períodos de alta umidade. As altas temperaturas diminuem a qualidade da semente e, se associadas à baixa umidade, predispõem a semente a danos mecânicos na colheita. Na colheita, temperaturas baixas associadas a períodos chuvosos ou de alta umidade provocam atraso e podem causar haste verde ou retenção foliar. Radiação solar e adaptação varietal
A soja é uma das espécies cultivadas mais sensíveis ao comprimento do dia, que regula a indução floral e o crescimento das plantas. A resposta à radiação solar não é linear durante o ciclo da cultura, pois existem subperíodos em que ela é incapaz de perceber esses sinais. No subperíodo vegetativo pré-indutivo ou juvenil, compreendido entre a emergência e a primeira folha verdadeira (estádio V1), as plantas de soja não percebem variações no fotoperíodo. Nos estádios subsequentes os estímulos são
percebidos, embora determinados pelo grau de sensibilidade do genótipo. A sensibilidade fotoperiódica crítica é o principal determinante para a adaptação das diferentes cultivares, existindo determinado limite de comprimento de dia suficientemente curto para induzir a floração e suficientemente longo para impedi-la. Neste sentido, a faixa de adaptabilidade de cada cultivar varia à medida que se desloca em direção Norte-Sul. Cultivares podem apresentar a característica “período juvenil longo”, possuindo adaptabilidade mais ampla, possibilitando sua utilização em faixas mais abrangentes de latitudes (locais) e de épocas de semeadura. Disponibilidade hídrica
A necessidade total de água na cultura da soja varia entre 450mm/ciclo e 800mm/ciclo, dependendo das condições climáticas, do manejo da cultura e da duração do ciclo. O aprofundamento do enraizamento possibilita maior absorção de água e nutrientes, favorecendo o crescimento adequado da parte aérea da planta, com benefício direto sobre a fotossíntese. O decréscimo no conteúdo de água na planta afeta as taxas fotossintéticas, a respiração, a síntese de proteínas e a taxa de elongação celular. A diminuição da elongação é um fator importante na fotossíntese, visto que determina a redu-
Tabela 1 - Concurso de Máxima Produtividade do Cesb (Comitê Estratégico Soja Brasil) – evolução das produtividades. Fonte: Cesb (2021)
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Figura 1 - Quadro simplificado mostrando os pilares fundamentais para a construção de altas produtividades: A - Clima e água; B - Manejo agronômico; C - Manejo sanitário; D - Qualidade e produtividade
Equipamento no formato de biruta gira em seu próprio eixo, conforme o direcionamento do vento
ção quantitativa e qualitativa da superfície fotossintetizadora, afetando a taxa de desenvolvimento da cultura. Durante o estádio de germinação-emergência, tanto o excesso quanto o déficit prejudicam a uniformidade do estande de plantas. A semente de soja necessita absorver no mínimo 50% de seu peso em água para a germinação, sendo que o conteúdo de água no solo não deve exceder 85% nem ser inferior a 50% do total máximo de água disponível. Durante o estádio de floração-enchimento de grãos, a necessidade de água é máxima (7mm/dia a 8mm/dia). Neste período, déficits hídricos expressivos provocam o fechamento estomático, o enrolamento de folhas, a queda prematura de folhas e flores, o abortamento de vagens e a redução da produtividade.
equilíbrio entre populações de organismos antagonistas e patógenos do solo, acarretando na diminuição no dano sobre as raízes das plantas. A aplicação de produtos de origem biológica, cujo foco são os patógenos de solo, demanda um ambiente no solo que promova sua rápida adaptação. O aumento na eficiência biológica do solo é um processo integrado às ações ligadas ao manejo do solo como um todo. Correções na fertilidade e física do solo, associadas às práticas de rotação de culturas e sucessão com culturas de cobertura do solo, compõem um conjunto de ações propício ao desenvolvimento radicular, com consequências importantes no desenvolvimento da parte aérea das plantas e na produtividade da cultura.
EFICIÊNCIA BIOLÓGICA DO SOLO
As flutuações anuais do rendimento, para uma mesma época, são, principalmente, determinadas por variações climáticas. Uma prática para evitar tais flutuações é a semeadura de duas ou mais cultivares, de diferentes ciclos. A ampliação dos períodos críticos da cultura, minimizando seu efeito sobre a floração, a formação de grãos e a maturação, conforme já discutido no item 1.2, evitam que extremos climáticos comprometam o resultado da propriedade.
O aumento na população de organismos antagonistas na profundidade de 20cm é extremamente importante e pode ser viabilizado por meio do aumento na oferta de CO2 superficial facilitado pelo aumento de palha com elevada relação C:N. Por se tratar de um processo de longo prazo, demanda sistemática rotação e sucessão cultural com diferentes culturas. Se implementado, promove
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CULTIVARES ADAPTADAS
A data de semeadura, acompanhada da seleção adequada do grupo de maturação da cultivar e da determinação do estado hídrico do solo no momento da semeadura, é prática de manejo mais econômica quando se busca garantir alto quociente fototérmico e baixo risco de déficit hídrico durante os estágios reprodutivos.
ÉPOCA DE SEMEADURA
A época ideal de semeadura é um dos fatores que mais influenciam o rendimento da soja. Como a cultura da soja é termo e fotossensível, é sujeita a alterações fisiológicas e morfológicas quando suas exigências não são satisfeitas. A época de semeadura determina a exposição da soja à variação dos fatores climáticos limitantes. Semeaduras em épocas inadequadas podem afetar o porte, o ciclo e o rendimento das plantas e aumentar o risco de dano na colheita. A altura das plantas está igualmente relacionada à população de plantas, à cultivar utilizada e à fertilidade do solo. O Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc), publicado anualmente pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), indica, para todas as regiões produtoras do Brasil, as épocas preferenciais de semeadura para a cultura da soja, levando em considera-
ção as condições climáticas e os diversos tipos de solo.
ARRANJO DE PLANTAS
A combinação entre o aumento na precisão das semeadoras, a adaptação das cultivares, a melhoria da capacidade produtiva dos solos, a adoção de práticas conservacionistas, a cobertura vegetal do solo e a semeadura direta é fator que propiciou ajuste na população de plantas de soja. A população ideal de plantas possibilita a expressão do potencial produtivo que cada cultivar demanda, podendo variar em função da cultivar e/ou do regime de chuvas da região (volume e distribuição) no período de implantação e de crescimento das plantas e da data de semeadura. O arranjo de plantas de soja é relacionado ao porte e ao ciclo das cultivares, sendo indicado o espaçamento entre fileiras de 40cm a 50cm. Espaçamentos mais estreitos que 40cm resultam em
Fatores são integrados e interdependentes, alerta Balardin
fechamento mais rápido da cultura, contribuindo para o controle das plantas daninhas, mas dificultando a realização de operações de cultivo entre fileiras, além de prejudicarem o controle químico de pragas e doenças.
MANEJO SANITÁRIO
O manejo sanitário de invasoras, pragas, patógenos e nematoides é fundamental para evitar dano fisiológico irreparável sobre a produtividade das plantas de soja. As práticas de rotação de culturas, manejo do solo, melhoria do perfil do solo, equilíbrio nutricional, observação das restrições gerais das cultivares, qualidade de sementes e utilização de defensivos químicos de forma apropriada, visando à redução dos pro-
blemas de forma antecipada, são alguns dos principais componentes dos programas de controle sanitário aos quais uma lavoura de soja deve ser submetida para que sua produtividade não seja comprometida. Embora o manejo sanitário comprometa aproximadamente 15% da produtividade, seu impacto está diretamente relacionado ao resultado final da propriedade. Deve ser entendido que, embora analisados de forma isolada, todos os fatores relacionados à obtenção de altas produtividades são absolutamente integrados e interdependentes. A otimização das práticas, cujo decurso pode representar vários anos de investimento, representa a maturidade do sistema de produção no sentido de alcançar as produtividades elevadas que tanto são C buscadas. Ricardo Balardin, Instituto Phytus
Figura 2 - Processo fisiológico que demonstra a fase de acumulação de energia seguido do processo de acúmulo de carboidratos na forma de produtividade (kg/ha)
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Produtivos e susten Em ano de recorde de inscrições no Desafio de Máxima Produtividade do Cesb, campeão alcança 129,16 sacas de soja por hectare em área no estado do Paraná. Além do foco nos resultados econômicos, Comitê avalia o desempenho ambiental dos participantes
O
Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb) anunciou em junho os vencedores de mais um Desafio Nacional de Máxima Produtividade. O grande campeão deste ano vem de uma área no município de Pinhão, no estado do Paraná, pertencente à família Milla, onde foram colhidas 129,16 sacas por hectare. A Fazenda Fundo Grande, de propriedade da família Milla, tem área total de 1,1 mil hectares dos quais 496 hectares são destinados ao cultivo de soja. A média de produtividade total ficou em 90 sacas de soja por hectare. O sistema de plantio direto, com rotação de quatro culturas (soja, aveia preta, milho e cevada) é utilizado pelos Milla há sete anos. A área auditada pelo Cesb para o concurso compreende 2,52 hectares. O retorno financeiro obtido no espaço foi de R$ 2,80 para cada real
investido. Essa não é a primeira vez que a família é premiada pelo Cesb. No ano passado, o condomínio Milla, administrado pelos produtores Ernest e Robert Milla, de Baixa Grande do Ribeiro, Piauí, foi o campeão Norte/Nordeste com a marca de 101,79 sacas por hectare.
MORTE DO PATRIARCA
O prêmio deste ano foi recebido pelo produtor Karl Milla, filho de Ernest Milla, que morreu em abril, aos 76 anos, por complicações da Covid-19. “Meu pai teve a felicidade de poder acompanhar esta lavoura. Estava animado, falava que nunca tinha visto uma soja desse jeito”,
Pioneer
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relatou Karl. Austríaco, Ernest veio para o Brasil aos nove anos, como refugiado de guerra, em companhia da mãe, irmãos e de mais 500 famílias. A partir da década de 1950 passou a trabalhar com os irmãos na região de Guarapuava, no Paraná. “Naquela época não havia tecnologia, eram anos complicados, pré-Era Verde. O pai sempre teve um perfil arrojado. Não tinha estudo formal, mas conversava com todo mundo, desde o peão até o pesquisador graduado”, relembra Karl. Outra característica de Ernest residia na preocupação com a sustentabilidade. “Sempre esteve preocupado com a conservação do solo, foi pioneiro no plantio direto e tinha por meta a longevidade do sistema. Come-
ntáveis
REGIÃO SUL
çou a plantar essa área há mais de 50 anos, com longo tempo de práticas conservacionistas, o que também demonstra a importância do trabalho de longo prazo”, aponta Karl. Há 20 anos à frente da área onde a família se sagra campeã agora, Karl relata que sempre conversou muito com Ernest, para que a tradição de trabalho fosse mantida. “Meu pai nunca se contentou com explicações simples, como se a produtividade dependesse exclusivamente de chuva ou de seca. Nos ensinou a chamar a responsabilidade, ver onde errou e construir a própria realidade.” Para o consultor técnico da área campeã, Luiz Gabriel de Moraes Júnior, o que fez a diferença foram o material genético, a presença de palhada, a correta adubação do sistema e o perfil do solo químico, físico e biológico. “Além de fazer o básico bem feito”, resumiu.
CAMPEÃO REGIÃO CENTRO-OESTE (SEQUEIRO)
A área campeã no Centro-Oeste pertence à SLC Agrícola, com produtividade de 100,33 sacas por hectare. A fazenda Pamplona, localizada no município de Cristalina, Goiás, Tony Oliveira/Sistema CNA
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REGIÃO CENTRO-OESTE tem extensão de 19,2 mil hectares. Possui 13,4 mil hectares destinados a cultivos, sendo pouco mais de 9,5 mil hectares plantados com soja. A produtividade média de soja na fazenda é de 77,8 sacas por hectare. As lavouras da Pamplona utilizam sistema de plantio direto há mais de sete anos, com cinco culturas: milho, algodão, soja, milheto e nabo. A área auditada pelo Cesb foi de 3,54 hectares e o retorno financeiro obtido para cada real investido foi de R$ 1,90. Para o consultor Diego André Goldschimidt os fatores que fizeram a diferença para obtenção da produtividade premida foram clima, qualidade de sementes e plantabilidade, manejo biológico e o capricho da equipe. O prêmio foi entregue ao diretor de Operações Agrícolas da SLC, Gustavo Lunardi.
CAMPEÃO NORTE/NORDESTE (SEQUEIRO)
REGIÃO NORTE / NORDESTE
O campeão na categoria Norte/Nordeste foi o Grupo Goergen, do produtor João Antônio Gorgen, com a marca de 113,26 sacas por hectare. A fazenda Cabreúva e Paz, em Formosa do Rio Preto, na Bahia, destina cinco mil hectares ao cultivo de soja e tem produtividade média de 81,7 sacas por hectare. A fazenda também utiliza o sistema de plantio direto há mais de sete anos, com quatro culturas: milho, algodão, soja e braquiária. A área auditada pelo Cesb foi de 2,80 hectares. Um dos fatores que chamam a atenção no caso da Cabreúva e Paz foi o excelente retorno financeiro. Foram obtidos R$ 4,90 para cada real investido. Para o consultor Ednei Antonio Fugalli, o que fez a diferença e ajudou a receber a premiação tem a ver com clima, genética, qualidade de sementes, manejo e correção de solo, além do básico bem feito.
CAMPEÃO SUDESTE (SEQUEIRO)
O vencedor na região Sudeste foi o produtor Marcus Felippe Reis Veiga, da Fazenda São João das Vitórias, em Madre de Deus de Minas, Minas Gerais, com o resultado de 113,99 sacas por hectare. De origem portuguesa, a família, que já está na quarta geração, se dedica à agricultura há mais de 100 anos. A propriedade de 490 hectares destina 121 hectares ao cultivo da soja, com produtividade media total de 84,35 sacas por hectare. O sistema produtivo é de plantio direto nos últimos três anos, com sucessão de cinco culturas: maçã, feijão, milho, soja e trigo. A área auditada pelo Cesb foi de 2,64 hectares. O retorno financeiro obtido alcançou R$ 1,80 para cada real investido no espaço destinado ao concurso. Para o consultor Auac Breno Lafe a excelente produtividade foi influenciada por conhecimento do ambiente, uniformidade de chuvas, qualidade das sementes, monitoramento e qualidade das operações. 36
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REGIÃO SUDESTE CAMPEÃO DA CATEGORIA IRRIGADO
O ganhador do Desafio na Categoria Irrigado foi o produtor Silvio Langleberto Maluta, da Fazenda Fratelli, em Itapeva, São Paulo. Na área auditada pelo Cesb de 3,79 hectares foram obtidas 121,29 sacas por hectare. De descendência italiana, a família Maluta, que já está na segunda geração, se dedica à agricultura desde 1959. A fazenda Fratelli tem produtividade média total em soja de 81 sacas por hectare em sequeiro e 92 sacas por hectare irrigado. Dos 1,9 mil hectares destinados à produção de soja, 1,6 mil são cultivados em sequeiro e o restante com a utilização de irrigação. A propriedade tem área total de 3,2 mil hectares. Utiliza sistema de plantio semidireto há mais de sete anos, com sucessão de seis culturas: soja, trigo, milho, feijão, batata e mandioquinha-salsa. O retorno financeiro na área do concurso foi de R$ 2,20 para cada real investido. Para o consultor Robson dos Santos, fizeram a diferença para o aumento da produtividade a construção do perfil do solo, a rotação de culturas, a correção do solo de acordo com as exigências da cultura, o clima favorável, o monitoramento semanal das áreas e o uso da agricultura de precisão, além do básico bem feito.
EFICIÊNCIA AMBIENTAL
CATEGORIA IRRIGADO
Já vai longe o tempo em que produtividade a qualquer preço poderia parecer sinônimo de bom negócio. Por isso no concurso do Cesb, além do foco nos resultados econômicos está a avaliação do desempenho ambiental, medida através de análise de ecoeficiênca. “Não basta produzir, é preciso ser sustentável. E isto não é apenas um bordão, mas exigência dos mercados”, lembra o pesquisador Décio Gazzoni. Menor impacto ambiental e menor custo de produção são dois aspectos perseguidos por quem busca produzir de modo sustentável. Entre os dados aferidos pela ferramenta utilizada pelo Cesb, alguns são bastante animadores. Se, por exemplo, toda a produção da região Sul apresentasse o perfil de emissões de carbono do campeão da categoria, a redução alcançaria 27 milhões de toneladas a menos de CO2 na atmosfera. O resultado equivale a um milhão de viagens rodoviárias do Brasil até a China. Já em relação à região Sudeste, se toda a produção apresentasse o mesmo perfil de uso da terra do campeão do Cesb seria possível a redução de 1,5 milhão de hectares.
RECORDE DE INSCRIÇÕES
Em sua 13ª edição o Desafio Nacional de Máxima Produtividade de Soja contou com mais de seis www.revistacultivar.com.br • Julho 2021
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mil sojicultores inscritos. O número representa um acréscimo de aproximadamente 15% em relação à edição anterior. O Desafio teve aumento de inscrições de todas as regiões: Sul (+17,8%), Norte (+8,3%), Nordeste (+6,2%), Centro-Oeste (+6,2%) e Sudeste (+20,3%). Na avaliação
do presidente do Cesb, Leonardo Sologuren, o concurso se firmou como uma real oportunidade para o agronegócio brasileiro utilizar ainda mais práticas sustentáveis de excelência no cultivo de soja, além de incentivar o compartilhamento de informações entre os agentes
de todo o sistema produtivo. “Essa empreitada ajuda os produtores a encontrarem maneiras de obter crescimento da produção de forma vertical, ou seja, visando ao aumento da produtividade, de forma sólida, sustentável e rentável", C pontua.
Produtividades Campeãs Campeão Nacional Fazenda Fundo Grande/Família Milla Produtor: Karl Milla Consultor: Luiz Gabriel de Moraes Júnior Produtividade: 129,16 sacas por hectare
Campeão Nacional Irrigado Fazenda Fratelli, Itapeva, São Paulo Produtor: Silvio Langleberto Maluta Consultor: Robson dos Santos Produtividade: 121,29 sacas por hectare
Campeão Sudeste Fazenda São João das Vitórias, Madre de Deus de Minas, Minas Gerais Produtor: Marcus Felippe Reis Veiga, de São João Del Rei (MG) Consultor: Auac Breno Lafe Produtividade: 113,99 sacas por hectare
Campeão Centro-Oeste Fazenda Pamplona do Grupo SLC Agrícola – Cristalina, Goiás Diretor de Operações Agrícolas da SLC, Gustavo Lunardi Consultor: Diego Goldschmidt Produtividade: 100,33 sacas/hectare
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Campeão Norte/Nordeste Sequeiro Fazenda Cabreúva e Paz Produtor: João Antônio Gorgen - Grupo Gorgen Consultor: Ednei Fugalli Produtividade: 113,26 sacas/hectare
Alltech
Informe
Matura melhor A importância do equilíbrio nutricional na fisiologia da maturação das plantas de cana-de-açúcar
O
ciclo de desenvolvimento das plantas de cana-de-açúcar é dividido basicamente em quatro estádios fenológicos: brotação e emergência, perfilhamento, período de grande crescimento vegetativo e maturação. Sendo que, em cada estádio ocorrem alterações morfológicas, em função de específicos estímulos fisiológicos, como os diferentes balanços hormonais, que estão relacionados à genética e aos fatores externos, como a temperatura, a luminosidade, a água e os nutrientes. Além disso, sabe-se que cada variedade possui em sua característica genética exigências nutricionais e climáticas específicas para atingirem seus respectivos potenciais produtivos e qualitativos. Para alcançar estes maiores potenciais é necessário atender cada fator destas exigências, que vão desde a escolha de um local adequado para o plantio, o preparo físico do solo e a escolha de toletes ou mudas pré-brotadas (MPBs) de qualidade. O produtor também deve se atentar à escolha da cultivar adequada para a região e à data de plantio, além de propiciar um solo anteriormente cultivado com plantas de rotação de culturas e/ou que possui um adequado equilíbrio da microbiota. E ainda há outros dois fa-
tores fundamentais, como o emprego de um manejo nutricional equilibrado e de um bom controle fitossanitário durante o desenvolvimento das diferentes fases de desenvolvimento do cultivo. No entanto, mesmo buscando por meio do manejo cultural atender às exigências da necessidade do material genético, todos os anos, há nas diferentes regiões produtoras de cana-de-açúcar no Brasil, situações de estresses, como o excesso ou a falta de chuvas, variação na temperatura e luminosidade, que podem proporcionar o desequilíbrio nutricional, afetando, assim, o crescimento e a maturação dos colmos das plantas de cana-de-açúcar. Na fase de maturação, momento em que ocorre o intenso acúmulo de sacarose nos colmos, é fundamental que as plantas estejam equilibradas nutricionalmente para o desenvolvimento contínuo dos processos fisiológicos, assim como na manutenção da atividade fotossintética. Todos os elementos nutricionais são importantes para o desenvolvimento das diferentes fases do cultivo, no entanto, para a fase de maturação, alguns elementos estão relacionados diretamente ao acúmulo de sacarose nos colmos. Pode-se destacar o fósforo (P), que participa da
produção de ATP (adenosina trifosfato) para as atividades enzimáticas e outros processos metabólicos, o potássio (K) no transporte de carboidratos e atividade estomática/taxa fotossintética; o magnésio (Mg) na síntese de clorofila, influenciando também na atividade fotossintética; o nitrogênio (N) e o molibdênio (Mo) no metabolismo de enzimas, com destaque para a fixação de CO2, no processo de fotossíntese; o boro (B), que além de participar da formação da parede celular e na produção de raízes absorventes na fase de maturação, participa do transporte de açúcares e na formação e balanço de fito-hormônios. Os demais micronutrientes, como cobre (Cu), manganês (Mn) e zinco (Zn), participam do metabolismo da atividade fotossintética e, ainda, estão relacionados com a atividade de compostos antioxidantes, que agem reduzindo as espécies reativas de oxigênio. Por isso, é fundamental proporcionar um melhor equilíbrio nutricional e fisiológico das plantas, para que estas consigam obter um melhor desempenho, minimizando assim o efeito dos estresses ambientais. Na agricultura, atualmente, há soluções a base de aminoácidos e extratos vegetais que combinados com os elementos nutricionais, proporcionam incremento na eficiência da absorção foliar dos nutrientes, auxiliando na manutenção dos níveis fisiológicos, reduzindo a condição estressante e, assim, favorecendo um melhor desenvolvimento do cultivo. A Alltech Crop Science possui uma importante solução, o Honey, que é constituído por aminoácidos e extratos vegetais, combinados com os elementos nutricionais potássio (K), boro (B) e molibdênio (Mo). Quando aplicado no início da fase de maturação dos colmos de cana-de-açúcar ou, ainda, aos 90 dias antes da colheita, a tecnologia da Alltech auxilia em uma maior intensificação do transporte dos fotoassimilados para os colmos, mantendo o equilíbrio das plantas para a atividade fotossintética, resultando ao final em um maior incremento de Açúcar Total Recuperável (ATR) e de C peso dos colmos. Marcos Revoredo, Alltech Crop Science
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Algodão
Fotos Angela Bernardino Barbosa
Controle eficiente
A escolha dos inseticidas é etapa fundamental no manejo do bicudo, por se tratar de uma praga muito agressiva e de difícil controle, que não tolera erros. Por isso é importante conhecer a eficiência relativa dos defensivos disponíveis no mercado, para subsidiar a rotação de moléculas necessária ao manejo da resistência e orientar sobre os produtos regionalmente mais adequados
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O
bicudo, Anthonomus grandis (Coleoptera: Curculionidae), é a principal praga do algodoeiro em todas as regiões produtoras da fibra no Brasil. Sua origem é no México, onde foi coletado pela primeira vez no início da década de 1830 (Manessi, 1997). No Brasil, o primeiro registro do inseto ocorreu em 1983, na região de Campinas, São Paulo (Barbosa et al., 1986), e atualmente encontra-se amplamente disseminado nos principais polos produtivos da cultura nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste. A primeira constatação na Bahia ocorreu em 1986, no Nordeste do estado, causando forte redução da produção, com enorme impacto na economia regional. Sua entrada nos municípios do Oeste da Bahia, onde a cotonicultura é muito tecnificada, não é bem conhecida, pelo menos de forma documentada. Contudo, acredita-se que o ingresso se deu já nos primeiros anos de plantio da cultura na região. Seu ataque à cultura começa pela bordadura da lavoura, com a migração de insetos vindos das áreas de refúgio, compreendidas, geralmente, pela vegetação que circunda a lavoura. Inicialmente, causam danos às estruturas vegetativas da planta (folhas, pecíolo e gema apical), formando reboleiras de ataque. Permanecem nestes locais aguardando a emissão dos botões florais, estimulando uma maior movimentação do inseto pela lavoura. Os adultos utilizam os botões florais e as maçãs para alimentação e reprodução. O ataque da praga aos botões florais causa a abertura das brácteas e, posteriormente, sua queda ao solo. Quando ocorre nas flores, estas ficam com aspecto de “balão” devido à não abertura normal das pétalas. As maçãs apresentam perfurações externas, decorrentes do hábito de alimentação e oviposição do inseto, sendo que internamente as fibras e sementes são destruídas pelas larvas, que impedem sua abertura normal (“carimã”), deixando-as enegrecidas. Ao final do ciclo da cultura ou após a destruição das soqueiras, a maioria dos adultos se dirige aos abrigos (matas, capinzais
etc.) existentes ao redor da área cultivada. Nesses locais se mantêm com metabolismo reduzido, alimentando-se esporadicamente de grãos de pólen de diferentes espécies vegetais. Muitos sobrevivem até a safra seguinte, embora quanto maior a entressafra menor a taxa de sobreviventes dos adultos. No Brasil, o bicudo se mantém em atividade durante todo o ano, e sua reprodução está condicionada à existência de estruturas frutíferas do algodão. Seu manejo envolve medidas integradas de controle, estando incluído o uso de inseticidas químicos, cujas aplicações começam pouco após a emergência das plantas e se estendem até o final do ciclo da cultura junto ao desfolhante e previamente à operação de destruição das soqueiras. A escolha dos inseticidas é uma etapa importante, por se tratar de uma praga muito agressiva e de difícil controle, cujo erro nesta etapa tem consequências desastrosas. Neste contexto é importante conhecer a eficiência relativa de controle dos inseticidas disponíveis no mercado, a fim subsidiar a rotação de moléculas necessária para o manejo da resistência e para orientar sobre os produtos regionalmente mais adequados para o manejo da praga. Com o objetivo de gerar informações atualizadas referentes à eficiência de inseticidas no controle do inseto, a Universidade do Estado da Bahia, em parceria com a empresa Círculo Verde Assessoria Agronômica e Pesquisa, conduziu, nas safras 2019/20, dois ensaios, sendo um em contaminação tarsal (caminhamento dos insetos em
Os adultos utilizam os botões florais e as maçãs para alimentação e reprodução
plantas pulverizadas) e outro em contaminação por contato (aplicação dos inseticidas sobre os insetos). Foram utilizados bicudos adultos, com até dez dias de idade, nascidos em laboratório a partir de botões florais e maçãs infestadas coletadas na Estação Experimental da Círculo Verde Pesquisa, em Luís Eduardo Magalhães, Bahia, em junho/2020. O delineamento experimental foi o inteiramente casualizado (DIC), com quatro repetições e dez tratamentos. As aplicações dos tratamentos foram realizadas com pulverizador costal pressurizado a CO2, volume de calda equivalente a 150L/ha, sobre bandejas plásticas (30cm x 40cm) contendo dez insetos/bandeja (repetição) (contaminação por contato) ou sobre
plantas de algodão da variedade TMG 44 B2RF cultivadas em sacos para muda de polietileno (50cm x 30cm) contendo duas plantas/vaso (repetição) (contaminação tarsal). Após 15 minutos da pulverização os insetos de cada bandeja/repetição foram transferidos para caixas gerbox transparentes (11cm x 11cm x 3,5cm) contendo dois botões florais sem resíduos de inseticidas para alimentação, e mantidas em câmara BOD a 25±1°C e 12 horas de fotófase (contaminação por contato). No ensaio de contaminação tarsal, após 20 minutos da pulverização, com a secagem completa do produto nas plantas, cada vaso (repetição) foi recoberto por um saco de tecido voil (70cm x 40cm) e então liberados dez insetos/vaso. Os vasos infestados foram mantidos em estufa. As avaliações foram realizadas após uma, três, seis, oito, 24, 32, 48 e 56 horas da aplicação sobre os insetos (contaminação por contato) e diariamente por sete dias consecutivos (contaminação tarsal), determinando-se em cada caixa gerbox ou vaso (repetição): 1) insetos mortos (caídos e imóveis); 2) insetos vivos caídos, e com movimentos lentos das pernas; 3) insetos vivos caídos, e com movimentos ativos das pernas; 4) insetos vivos em posição normal, mas parados; 5) insetos vivos em posição normal, andando lentamente; 6) insetos vivos em posição normal, andando ativamente; 7) insetos vivos alimentando-se ou acasalando. Os dados de mortalidade de insetos foram transformados em porcentagem e, então, submetidos à análise de variân-
Tabela 1 - Porcentagem de mortalidade potencial (mortos + caídos com movimentos lentos) diária do bicudo-do-algodoeiro, Anthonomus grandis Boheman, pelo efeito dos diferentes tratamentos, em experimento por contaminação tarsal. Universidade do Estado da Bahia (Campus IX), Barreiras/ BA, agosto/2020 Tratamento 1. Testemunha 2. etiprole 200SC + Aureo 3. etiprole 200SC + Aureo 4. malationa 1000EC 5. carbosulfano 6. fenitrotiona + esfenvalerato EC 7. profenofós + cipermetrina 400/40EC 8. fipronil 9. acetamiprido + bifentrina 10. acetamiprido + bifentrina 1
Dose/ha ---750,0 mL + 0,5 L 1,0 L + 0,5 L 1,0 L 1,0 L 600,0 mL 1,0 L 130,0 mL 250,0 g 300,0 g
1 DIA1,2 0,00 a A 42,50 a C 67,50 a D 57,50 a D 40,00 a C 22,50 a B 45,00 a C 70,00 a D 0,00 a A 25,00 a B
2 DIAS 0,00 a A 55,00 a C 95,00 b E 92,50 b E 45,00 a C 45,00 b C 50,00 a C 95,00 b E 25,00 b B 67,50 b D
3 DIAS 0,00 a A 80,00 b C 92,50 b D 100,00 b D 65,00 b C 77,50 c C 60,00 a C 100,00 b D 27,50 b B 67,50 b C
4 DIAS 0,00 a A 82,50 b C 100,00 b D 100,00 b D 75,00 b C 75,00 c C 77,50 b C 100,00 b D 35,00 b B 75,00 b C
5 DIAS 0,00 a A 85,00 b C 100,00 b C 100,00 b C 77,50 b C 90,00 d C 87,50 b C 100,00 b C 35,00 b B 82,50 c C
6 DIAS 0,00 a A 95,00 c C 100,00 b C 100,00 b C 87,50 c C 97,50 d C 92,50 b C 100,00 b C 42,50 c B 85,00 c C
7 DIAS 0,00 a A 95,00 c C 100,00 b C 100,00 b C 90,00 c C 100,00 d C 95,00 b C 100,00 b C 50,00 c B 90,00 c C
Médias seguidas por letras iguais na coluna (maiúscula) e minúscula (linha) não diferem entre si pelo Teste de Scott & Knott (1974) ao nível de 5% de probabilidade. 2Dias após a infestação.
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Tabela 2 - Porcentagem de mortalidade potencial (mortos + caídos com movimentos lentos) diária do bicudo-do-algodoeiro, Anthonomus grandis Boheman, pelo efeito dos diferentes tratamentos, em experimento por contaminação por contato. Universidade do Estado da Bahia (Campus IX), Barreiras/BA, agosto/2020 Tratamento 1. Testemunha 2 etiprole 200SC + Aureo 3 etiprole 200SC + Aureo 4. malationa 1000EC 5. carbosulfano 6 fenitrotiona + esfenvalerato EC 7. profenofós + cipermetrina 400/40EC 8. fipronil 9. acetamiprido + bifentrina 10 acetamiprido + bifentrina 1
Dose/ha 750,0 mL + 0,5 L 1,0 L + 0,5 L 1,0 L 1,0 L 600,0 mL 1,0 L 130,0 mL 250,0 g 300,0 g
1 hora1,2 0,00 a A 65,00 a C 85,00 a D 52,50 a C 100,00 b D 55,00 a C 35,00 a B 56,67 a C 67,50 a C 93,33 a D
3 horas 0,00 a A 95,00 b C 90,00 a C 57,50 a B 70,00 a B 62,50 a B 55,00 b B 73,33 a B 90,00 b C 83,33 a C
6 horas 0,00 a A 97,50 b D 97,50 a D 72,50 b C 67,50 a C 97,50 b D 52,50 b B 66,67 a C 80,00 b C 73,33 a C
8 horas 0,00 a A 95,00 b D 95,00 a D 80,00 b C 85,00 b C 97,50 b D 60,00 b B 83,33 b C 80,00 b C 80,00 a C
24 horas 0,00 a A 100,00 b C 100,00 a C 87,50 b C 92,50 b C 97,50 b C 75,00 c B 100,00 c C 72,50 a B 80,00 a B
32 horas 0,00 a A 97,50 b D 100,00 a D 90,00 b D 100,00 b D 100,00 b D 85,00 c C 96,67 c D 65,00 a B 80,00 a C
48 horas 0,00 a A 100,00 b C 97,50 a C 90,00 b C 97,50 b C 100,00 b C 80,00 c B 96,67 c C 70,00 a B 80,00 a B
56 horas 0,00 a A 100,00 b C 97,50 a C 85,00 b B 100,00 b C 100,00 b C 82,50 c B 100,00 c C 70,00 a B 70,00 a B
Médias seguidas por letras iguais na coluna (maiúscula) e minúscula (linha) não diferem entre si pelo Teste de Scott & Knott (1974) ao nível de 5% de probabilidade. 2Horas após a aplicação dos inseticidas.
cia e comparação de médias por meio do teste de Scott-Knott (1974) a 5% de probabilidade, utilizando o programa Sisvar (Ferreira 1999). Como descrito na metodologia, os insetos foram classificados em sete categorias durante as avaliações, com os vivos sendo alocados em uma dentre seis categorias possíveis, desde a condição mais crítica de intoxicação (caído e com movimento lento das pernas) até o inseto aparentemente saudável (em posição normal e andando ativamente e/ou se alimentando). Essa abordagem permitiu extrair mais informações dos efeitos dos inseticidas e, consequentemente, forneceu subsídios para uma análise mais ampla e factível com o que pode ocorrer na lavoura após a aplicação. Neste contexto, a análise estatística foi realizada utilizando-se a soma de insetos mortos com os vivos caídos e com movimentos lentos das pernas, embasada na suposição de que os insetos vivos desta categoria apresentam chances reduzidas de sobrevivência na lavoura, pois é grande a chance de caírem das plantas e morrerem por inanição, desidratação, predação por formigas, afogados e/ou soterrados após uma chuva. Os resultados desta análise são descritos como “mortalidade potencial” (mortos + vivos caídos e com movimentos lentos). Os resultados de mortalidade potencial do bicudo em contaminação tarsal são apresentados na Tabela 1. Não houve mortalidade de insetos na Testemunha (T1= sem aplicação) ao longo de todo o período de avaliação, uma demonstração inequívoca da ótima sanidade dos bicudos utiliza42
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dos e dos cuidados na condução do seticidas foram eficientes, com valores trabalho. Todos os inseticidas, com entre 60% e 97,5% de insetos mortos exceção de acetamiprido + bifentrina com oito horas após a aplicação. Com na dose de 250g/ha (dose comercial), 24 horas ocorreu uma definição do foram muito eficientes no controle do controle pelos produtos e suas doses, inseto em contaminação tarsal, com havendo pequena variação nos valores valores acima de 85% após seis dias médios a partir desta avaliação. Com da infestação, e entre 90%-100% aos 56 horas, as duas doses de acetamisete dias. Contudo, etiprole na maior prido + bifentrina (250g e 300g/ha do dose (T3= 1L/ha), malationa e fiproproduto comercial) proporcionaram nil foram mais rápidos em causar a 70% de controle, e entre 82,5% e 100% morte do inseto, atingindo patamares para os demais produtos (Tabela 2). mais elevados de controle em menos As duas doses de etiprole 200 SC atintempo que os demais inseticidas, com giram valores iguais ou superiores a valores superiores a 92% já aos dois 90% de controle com três horas após a dias após a infestação das plantas com aplicação, sendo a mais rápida entre os os bicudos (Tabela 1). Já etiprole 200 produtos, enquanto para fenitrotiona SC na dose de 750ml/ha (T2), carbo+ esfenvalerato EC ocorreu com seis sulfano, fenitrotiona + esfenvalerato, horas; carbosulfano e fipronil com 24 profenofós + cipermetrina e a maior horas e malationa com 32 horas (Tabedose de acetamiprido + bifentrina la 2). (T10= 300g/ha) apresentaram desemOs resultados dos dois experimenpenho muito semelhante entre si dutos demonstram que os produtos rante todo o período de avaliação (Taetiprole 200 SC, malationa 1000 EC, bela 1). A contaminação tarsal ocorre carbosulfano, fenitrotiona + esfenvade maneira gradual e é influenciada lerato EC, profenofós + cipermetrina pelo estado de atividade do inseto (se 400/40 EC, fipronil e acetamiprido + caminhando pouco ou ativamente), bifentrina são eficientes no controle por esta razão a sanidade do lote de do bicudo provenientes do Cerrado C insetos no teste é tão importante. O do Oeste da Bahia. bom desempenho pela contaminação tarsal é fundamental para o controle Marco Antonio Tamai, dos insetos que estão nas plantas, Universidade do Estado da Bahia mas que não são atingidos pelas gotíMônica Cagnin Martins e culas no momento da aplicação, como Fábio Cruz da Silva, também para aqueles que chegam na Círculo Verde Assessoria Agronômica e Pesquisa planta após a aplicação, como os proVitória Santos Xavier da Cruz e venientes de migração de outras laKarine Ninos Viana, vouras e dos adultos que nascem dos Centro Territ. de Educ. Prof. da Bacia do Rio Grande botões florais caídos no solo. Jackelyne de Castro Oliveira, Na contaminação por contato, moUniversidade do Estado da Bahia dalidade em que a aplicação é feita diGilvan Rodrigues da Silva, retamente sobre o inseto, todos os in- Círculo Verde Assessoria Agronômica e Pesquisa
Cana
Desafios pontuais Com o advento da colheita mecanizada em cana-deaçúcar implicações biológicas e agronômicas têm ocorrido, como o favorecimento de doenças foliares por resíduos provenientes da ausência de queima do palhiço. Contudo, se trata de um entrave a ser enfrentado sem perder de vista os benefícios proporcionados pelos restos culturais no solo
A
resíduos que é deixada sobre o solo, e isso tem implicações biológicas e agronômicas. Na verdade, o que se observa é que a história se repete: quando o Sistema de Plantio Direto de grãos (soja, trigo, milho etc.) começou a se expandir no Brasil, as manchas foliares também se expandiram e aumentaram de intensidade. Os fitopatologistas então alertaram: com os restos culturais mantidos
Cesar J. Silva, Embrapa
mudança de tecnologia para colheita mecanizada da cana-de-açúcar é, sem dúvida, um grande avanço no cultivo dessa espécie em termos agronômicos, ambientais, sociais, econômicos etc. Mas, como em tudo na vida, a natureza sempre impõe uma contrapartida: a colheita da cana crua, sem queima do palhiço, gera uma grande quantidade de
sobre o solo, as plantas terão mais doenças foliares. Os fitotecnistas, por sua vez, justificaram (e estavam certos): é necessário reduzir o revolvimento do solo, pois as vantagens superam os desafios. E hoje todos colhem os frutos dessa acertada escolha. O mesmo comportamento se espera (e tem sido observado) com relação à colheita mecanizada da cana-de-açúcar, já que os restos culturais ficam no ambiente. Apesar do revolvimento do solo ainda ser necessário para a operação de plantio das mudas, a lavoura passa por um período de vários anos (socas) com expressiva quantidade de restos culturais dos cortes anuais deixados sobre o solo. Estes restos culturais abrigam fungos necrotróficos (que se alimentam de tecido vegetal em decomposição) e servem, assim, de fonte de inóculo de doenças, principalmente as causadoras de manchas foliares, para as próximas brotações das plantas. Mas novamente aqui, a manutenção, ao menos parcial, dos restos culturais no solo “é necessária”, e o aumento
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Fotos Alexandre D. Roese
Presença da mancha-anelar (Leptosphaeria sacchari)
da incidência e severidade de doenças, como já destacado pelos colegas da Embrapa Meio Ambiente (Comunicado Técnico 53, 2016), é um dos desafios que devem ser enfrentados. Em diversas situações as indústrias recolhem o palhiço, principalmente em lavouras mais próximas das usinas, para aumentar a geração de energia elétrica ou produzir etanol de segunda geração, e isso dá a oportunidade para avaliar o efeito da manutenção ou retirada do palhiço sobre as doenças. Já constatamos que essa prática (recolher o palhiço) faz diminuir a mancha-anelar, causada pelo fungo Leptosphaeria sacchari 44
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(Cultivar Grandes Culturas, v. 251, p. 14-15, 2020). Avaliando apenas por este aspecto, a manutenção do palhiço prejudica a lavoura. Mas será que somente a redução de doenças foliares seria suficiente para justificar a remoção do palhiço? Certamente que não. É preciso lembrar os benefícios proporcionados pelos restos culturais no solo. A história já nos ensinou isso de diversas maneiras, a exemplo do Sistema de Plantio Direto. Além do avanço na tecnologia de colheita, com todos os benefícios já observados (praticidade, rendimento, redução de custo operacional e de
degradação ambiental e social), a manutenção do palhiço na lavoura apresenta ainda diversas outras vantagens, como redução da exportação de nutrientes; amenização da compactação causada pelo tráfego de máquinas, tornando viável a reforma do canavial em plantio direto; melhoria do balanço de gases de efeito estufa, que pode render créditos de carbono; e melhoria da microbiota do solo, responsável pela supressividade a doenças radiculares, vasculares e nematoses. Por exemplo, no mesmo trabalho relatado anteriormente, em que observamos redução de mancha-anelar com a retirada do palhiço, também constatamos aumento de incidência de “pokkah boeng”, causado por Fusarium moniliforme, um fungo habitante do solo. Já se espera, realmente, que a retirada dos restos culturais da lavoura reduza a severidade de doenças foliares, porém aumente a incidência de doenças provocadas por patógenos habitantes do solo, já que o solo empobrece com a retirada dos restos culturais. Portanto, o palhiço pertence ao solo. Se não todo ele, pelo menos a maior parte, já que a viabilidade do recolhimento é limitada pela distância da lavoura em relação à usina, pela época do ano, pelo preço pago pela energia etc., e mesmo nas áreas com recolhimento uma boa quantidade de palhiço ainda fica no solo após essa operação. Temos de nos adaptar a isso. Mas o que isso significa em termos práticos? O caminho a seguir, naturalmente, deve ser definido de acordo com as necessidades do setor produtivo e sob a liderança de cientistas das áreas de melhoramento genético, fitotecnia, fitopatologia, dentre outros. Mas algumas ações já podem ser implementadas de imediato no campo, como: 1) dar preferência para o recolhimento do palhiço em áreas com maior severidade de manchas foliares e evitar esse recolhimento em áreas com maior incidência de patógenos de solo, como Fusarium moniliforme; e 2) substituição de cultivares muito
Roese ressalta benefícios dos restos culturais no solo
manchadas por outras menos manchadas: o campo vai se adaptando. A pesquisa, por sua vez, contribui oferecendo conhecimento e estratégias para o manejo de doenças, tanto através de variedades resistentes, quanto através do controle das doenças no campo. Neste sentido, é necessário: 1) selecionar variedades de cana-de-açúcar em ambiente com palhiço, para aumentar a pressão dos fungos causadores de manchas e assim evitar a oferta de cultivares muito suscetíveis; 2) avaliar o real impacto das manchas foliares na produtividade e nos custos de produção; e 3) estabelecer estratégias de controle químico e cultural das doenças. Por exemplo, avaliando a eficácia (se reduz as doenças) e a eficiência (se vale a pena) da aplicação de fungicidas (químicos ou biológicos), desde alguns dias antes da brotação até que as plantas fechem as entre linhas, a fim de proteger as folhas novas do ataque inicial de doenças, principalmente quando a chuva incide dire-
Sintomas de pokkah boeng (Fusarium moniliforme): enrolamento das folhas do ponteiro e apodrecimento apical
Folha de cana com lesões características da mancha-anelar
tamente no chão e lança o inóculo das doenças nas folhas. Resultados nessas direções precisam ser obtidos e atualizados. Com relação à avaliação da reação de variedades às manchas foliares, já publicamos um diagrama
Mancha-ocular (Bipolaris sacchari)
de área padrão para avaliação da mancha-anelar (Sugar Tech, v. 20, n. 6, p. 770-774, 2018), no entanto, a avaliação também poderia ser realizada considerando manchas em geral, sem distinguir espécies. Esta avaliação tanto pode ser dependente de infecção natural, proporcionada pelo inóculo presente no campo de avaliação, como ser dependente de inoculação artificial dos patógenos, quando o ambiente não oferecer as doenças naturalmente. E para as demais ações que podem ser implementadas em curto prazo - avaliação de perdas devido às manchas foliares, substituição de variedades e aplicação de fungicidas - os aspectos econômicos devem ser as balizas principais (imediatas), ainda que outros aspectos fitotécnicos importantes, mas não tão urgentes, também devam ser avaliados. Ou seja, temos um caminho pela frente. Na verdade ele já está traçado e precisamos apenas melhorar o pavimento. Afinal, a cana-de-açúcar ainda será importante por muitos anos como fonte de energia, de modo que o investimento na geração de resultados vale C a pena, com certeza! Alexandre D. Roese, Embrapa Agropecuária Oeste www.revistacultivar.com.br • Julho 2021
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Café
Wenderson Araujo Sistema CNA
Rosetas banguelas
Comum em videiras, a lagarta-das-rosetas é uma praga polífaga, de pequeno tamanho e alto potencial de prejuízos ao cafeeiro. Seu manejo exige lançar mão de inseticidas, já registrados para a cultura, mas também utilizados no controle de outros insetos como a broca e o bicho-mineiro
N
a cafeicultura dos estados de Minas Gerais, em especial do Cerrado mineiro, Rio de Janeiro, Paraná e Espírito Santo tem ocorrido a infestação de uma pequena lagarta, de coloração marrom a castanho-escura, com a cabeça preta, identificada como Cryptoblabes (Ephestia) gnidiella (Millière, 1867) (Lepidoptera: Pyralidae, Phycitinae). É uma espécie muito comum em videiras (Vitis spp., Vitaceae), onde é conhecida como traça-dos-cachos ou broca-dos-cachos, porém é uma praga polífaga, que ataca diversas plantas. Em cafeeiro (Coffea spp.) recebe o nome comum de lagarta-das-rosetas. A lagarta vive nas rosetas do cafeeiro, onde tece teia (característica do ataque da lagarta), e quando completamente desenvolvida mede em torno de 12mm de comprimento. Pode atacar a região basal do fruto verde, no estágio de chumbo e chumbão, próximo ao pedúnculo, perfurando-o
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para sua alimentação (Figuras 1 e 2). O inseto adulto é uma pequena mariposa (microlepidóptero) que mede cerca de 15mm de envergadura e 6mm de comprimento. Possui as asas anteriores acinzentadas com duas faixas transversais e as asas posteriores são acinzentadas e brilhantes, com nervuras e margens escurecidas (Figura 2). Em Minas Gerais, a infestação desse inseto em cafeeiro arábica (Coffea arabica L.) foi constatada pela primeira vez em uma lavoura no município de São Roque de Minas, no Oeste do estado, em dezembro de 1996. Na cafeicultura do Cerrado mineiro, foi constatada pela primeira vez em uma lavoura no município de Serra do Salitre em janeiro-fevereiro também de 1996. Em novembro de 1998 ocorreu em algumas lavouras de Araguari, voltando a ocorrer em Coromandel em dezembro de 2001, e posteriormente em 2005 e 2006. Em todas essas ocorrências requereu controle químico para
Divulgação
Fotos Paulo Rebelles Reis
Figura 2 - Adulto da lagarta-das-rosetas (15mm de envergadura)
Figura 1 - Lagarta-das-rosetas sobre frutos de café (esquerda) e frutos perfurados pela lagarta na região basal (direita)
evitar perdas. Anualmente tem ocorrido em cafeeiros.
DANO DA LAGARTA-DAS-ROSETAS
O ataque da lagarta-das-rosetas ocorre de novembro a janeiro-fevereiro, ou seja, somente ataca na fase de frutificação do cafeeiro, ocasião em que as lavouras devem ser sempre inspecionadas, buscando-se constatar seu ataque, que é imprevisível e restrito a alguns talhões das lavouras, ou seja, não é de ocorrência generalizada. No início do ataque as lagartas roem o pedúnculo dos frutos e a casca da base, o que pode causar queda, deixando a roseta “banguela” ou mesmo sem nenhum fruto (Figura 3). Também já foi constatado que os frutos nos estágios mais avançados,
chumbo e chumbão, podem ser perfurados ainda muito verdes e aquosos pela lagarta (Figura 1), frutos que secam nas rosetas e depois de certo tempo caem, reduzindo a produtividade da lavoura (Figura 3).
CONTROLE DA LAGARTA-DAS-ROSETAS
Constatada a ocorrência da praga nos cafezais, por meio da presença de teias de seda e rosetas banguelas (Figura 3), é recomendável a aplicação de inseticida organofosforado (por exemplo clorpirifós registrado para bicho-mineiro e broca em cafeeiro), mais um espalhante adesivo, em pulverização a alto volume. Os inseticidas do grupo químico das antranilamidas também são bons lagarticidas e possuem registro para uso em cafeeiro no
controle do bicho-mineiro e da broca-do-café. Um dos inseticidas usados no controle da traça-dos-cachos em videira é o metaflumizone, do grupo químico semicarbazone, que também tem registro para o controle da broca-do-café. Nenhum inseticida aplicado no solo apresenta eficiência no controle dessa praga. Em cafeeiro Conillon (Coffea canephora Pierre & Froehner), assim como ocorre no controle da broca-do-café, o grande número de frutos por roseta e a permanência, por muito tempo, das flores secas nos frutos se constituem em grandes obstáculos para que as gotas pulverizadas atinjam internamente as rosetas, local onde se alojam as lagartas, tornando mais difícil C o seu controle. Paulo Rebelles Reis, CropTest Júlio César de Souza, Consultor em Entomologia
Figura 3 - Ramos de cafeeiros após o ataque da lagarta-das-rosetas; frutos danificados e teia produzida pela lagarta; roseta banguela
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Coluna Agronegócios
Os consumidores da geração Z: impacto no agronegócio
N
ovas gerações, novos hábitos. Podem ser hábitos completamente novos, ressuscitação ou ressignificação de hábitos que estavam esquecidos ou que já existiam, mas que tinham baixa penetração. E, tão importante quanto, alguns hábitos desaparecem ou são estigmatizados. Ainda vivemos o impacto da geração do milênio na modulação dos negócios do campo. Não seria diferente agora, com a chegada da Geração Z ao mercado, não fora a velocidade estonteante de inovações que a Ciência está produzindo – e produzirá nos próximos anos; a escalada vertiginosa das interações via redes sociais; e a velocidade como as novas crenças e os hábitos interferem no mercado e emitem sinais a montante das cadeias de valor do agronegócio. A Geração Y promoveu rupturas, a Z as aprofundará. Portanto, não é surpresa verificar que diversos setores (marketing, entretenimento, política) prestem atenção à voz rouca desta turma que, daqui a 20 anos, estará nas cadeias de comando. Mas que, antes disso, já provocará mudanças, pelos valores que preza e que alteram o perfil de consumo.
GERAÇÃO Z
Não há precisão na definição do que está sendo alcunhado de “Gen Zers”, mas há um entendimento de que abarca os nascidos entre 1997 e 2010. Isso significa que, em 2021, os membros da Geração Z têm idade entre dez e 24 anos. É uma geração com maior diversidade étnica, social, geográfica e de gênero, de toda a História da Humanidade. Tudo isto graças à enorme facilidade de comunicação e interatividade provocada pelo alcance e baixo custo das redes sociais. O inglês é a língua desta geração e neologismos pululam em todos os países, sendo incorporados rapidamente aos idiomas locais. Como essa geração cresceu em meio à cultura da internet, é natural que constituam a gênese do "marketing de influência" que começa nas redes e termina na mesa. O que aparentemente poderia gerar uma babilônia transformou-se em convergência, pela congruência de três vertentes: são conscientes de sua força, são politicamente ativos e compartilham um conjunto de novos valores e escolhas. E, muitos deles, apontam claramente para as cadeias do agronegócio. 48
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Estudiosos do fenômeno consideram os Gen Zers “desreguladores da cultura alimentar” pelas suas habilidades culinárias. Surpresa? Não, isso se deve aos tutoriais e às receitas da internet, que reforçaram o valor latente de que “comida caseira é melhor” (ressuscitação!), e aí também entram considerações de preço, qualidade e ética. Reforçam os nichos de mercado já existentes e criam novos nichos, por isto estão se tornando os maiores consumidores de produtos orgânicos e similares, ampliando a trilha onde já trafegavam seus antecessores (Millenials), porém impondo sua própria visão.
GEN ZERS CONSUMIDORES
Tenho dito que a pandemia não muda a agenda das transformações, apenas antecipa para o início da década metas e fatos que deveriam ocorrer no final da mesma. Para os Gen Zers, o consumo é modulado por exigências como saúde, ambiente, qualidade e transparência. Conscientes nas escolhas, com valores claros, e mais abertos às inovações que chegam ao campo, sem obnubilar valores já vigentes e com os quais aquiescem. E aí vem uma novidade: um estudo realizado pela consultoria Ketchum, “Food Tech Consumer Perception” (ketchum.com/ news/food-technology-trends-a-rising-generation-of-food-consumers-is-more-open-to-new-food-technology-says-ketchum-study/), demonstrou 77% de aceitação de alimentos derivados de transgênicos ou produzidos com tecnologia CRISPR, por jovens da Geração Z. Muito embora a percepção do levantamento de que se trata de uma geração etnicamente mais diversa e amplamente influenciada pelas redes sociais, com espaço para dietas e alimentos menos convencionais, como paleo, ceto, vegano e vegetariano. Essa característica indicaria que o mesmo ocorreria com a carne alternativa, “carnes” vegetais ou produzidas em laboratório, mas... o estudo também mostrou que 72% dos entrevistados não aceitavam esses produtos- aliás, citavam “sentir nojo” deles. Uma sobrevida para as cadeias de carnes.
GEN ZERS E A AGRICULTURA
Alguns membros desta geração serão agricultores ou, ao menos, atuarão nos elos das cadeias de valor da agricultura. Além de
suas perspectivas alternativas, foi observado entre os Gen Zers o desejo de papéis mais diversificados no setor. É o que transparece de um dos raros estudos na área, “Farmers of Tomorrow: Generation Z’s Future in Agriculture” (michiganfarmnews.com/are-you-ready-for-gen-z-farmers-recent-study-shows-perception-gaps-between-generations), contrastando com as gerações anteriores. Os respondentes foram jovens cuja família está vinculada à agricultura e 89% deles afirmaram participar ativamente do negócio agrícola. Em relação ao futuro, meros 54% manifestaram desejo de permanecer na propriedade. Entrementes, muitos indicaram o anseio de seguir carreiras relacionadas à agricultura. O que é uma confirmação da tendência das gerações anteriores, reforçada com a maior velocidade de inovações tecnológicas e as consequentes oportunidades para jovens trabalharem nas cadeias agrícolas, sem o alto risco do campo, o trabalho duro e os custos de oportunidade de restringir-se a uma propriedade. Os autores do estudo referem que a Geração Z expressou visão positiva de entidades governamentais, incluindo entes de controle ambiental, de agroquímicos e de produtos alimentares. Entretanto, são muito menos leais a marcas e empresas, mesmo as consolidadas no mercado. Particularmente, mostram-se muito propensos ao uso de bioinsumos, particularmente biopesticidas. Não são rebeldes, estão mais para pragmáticos e focados!
JANELA PARA O FUTURO
Assim como ocorreu em outras passagens de bastão, mudanças virão. Nesta década, elas serão mais significativas pela plêiade de possibilidades, resultantes da interação entre velocidade de inovação e de comunicação. O que não muda é o fato de alimentos sempre serem um tema em pauta e a consolidação de uma variável diretriz muito clara: a preocupação com sustentabilidade, governança e transparência, particularmente com segurança dos alimentos e proteção ao ambiente. São estes sinais que as nossas cadeias agrícolas devem capturar e introjetá-las até os agricultores. Afinal, o consumidor sempre tem razão. C
Décio Luiz Gazzoni O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja
Coluna Mercado Agrícola
Brasil prepara-se para mais uma grande safra de 2021/22
O
agro brasileiro já pode classificar como sucesso a safra atual. Apesar de grandes perdas na safrinha, houve recorde de colheita, com a soja estimada em 136 milhões de toneladas frente a 124,5 milhões de toneladas da safra passada. O milho, com os problemas da safrinha e da safra de verão, vai para níveis próximos de 96 milhões de toneladas. O arroz encheu os silos com colheita de 11,6 milhões de toneladas. Some-se a isso mais de 6,5 milhões de toneladas de trigo e três milhões de toneladas de feijão. Grandes grãos do Brasil que somam mais de MILHO A safrinha está em colheita forte neste momento. Houve atraso e dessa forma chegam grandes volumes de milho em julho, com tendência de continuidade em agosto. Cenário que provoca calmaria no mercado, que vai seguir de olho na exportação porque há uma safra que ainda está incerta, entre 60 e 70 milhões de toneladas e consumo potencial de 40 milhões de toneladas neste segundo semestre. Sendo assim, será necessário exportar e o valor da exportação deve comandar parte dos negócios internos. No final de junho os indicativos nos portos estavam na faixa dos R$ 77,00 a R$ 80,00 a saca para embarques a partir de outubro. SOJA O mercado da soja em junho registrou forte queda em Chicago, sendo que no dia 17 as cotações na Bolsa recuaram mais de 100 pontos, assustando os operadores do mercado. Houve efeito manada com corrida
253,1 milhões de toneladas. Se adicionados sorgo, triticale, pipoca e outros grãos, se chega a uma safra de 262 milhões de toneladas, superando os 257 milhões de toneladas do ano passado. As boas cotações também deram aos produtores condições para avançar em tecnologia para esta nova safra, que em poucas semanas começará a ser plantada com busca novo recorde e tendência de crescimento em quase todos os grãos, com fôlego para colher entre 280 e 300 milhões de toneladas. Projeta-se novamente um grande ano pela frente para o setor agrícola brasileiro.
de liquidação na Bolsa e atropelo de vendas no Brasil. Os produtores deixaram de comercializar quando o dólar estava cotado a R$ 5,80 e a soja em 16 dólares em Chicago para observarem em junho cotações abaixo de 13,50 dólares e o dólar próximo de R$ 5,00. Desta forma os fechamentos se deram em torno de R$ 30,00 por saca, abaixo dos melhores momentos do ano. Mesmo assim as cotações seguiam positivas e dando lucros aos produtores, mas obrigaram o setor a prestar mais atenção ao mercado e a fazer contas da relação de troca pelos insumos, que é o maior marcador de bons negócios. FEIJÃO O feijão já mostra fechamento da colheita da segunda safra, e o grão das lavouras irrigadas, ou da terceira safra, deve chegar em agosto e setembro. Nas próximas semanas e meses haverá poucas ofertas e desta forma o mercado, que viu a segunda safra comprometida pelo clima seco, terá de operar
em cima de uma oferta menor de grãos, de produto que normalmente tem alta qualidade e que está na mão de produtores capitalizados que vendem escalonadamente. Há, portanto, boas expectativas de cotações, porque a demanda do feijão tende a seguir forte no varejo. ARROZ O mercado do arroz deve seguir calmo em julho. As indústrias seguem com silos cheios e pouco interesse em compras, portanto mesmo que os produtores segurem as ofertas, ainda assim há poucas chances de mudanças no curto prazo. Mas os níveis já bateram no fundo do poço e devem ter algum ganho de agosto em diante ou quando novos negócios na exportação aparecerem. Espera-se por estabilidade e calmaria nas cotações, mas haverá boa movimentação de venda no varejo, que seguirá com apoio do Auxílio Emergencial para os consumidores. Seguirá sendo o ano do arroz com feijão e ovo.
Curtas e boas TRIGO - O mercado do trigo está de olho no plantio da safra, que neste ano aumentou entre 15% e 20% em área, com apelo para colher mais de sete milhões de toneladas e diminuir um pouco a dependência do grão importado, que normalmente cobre mais da metade do consumo brasileiro. Os indicativos devem seguir favoráveis aos produtores, que tendem a obter bons ganhos nesta temporada que está começando. EUA - Os produtores plantaram a safra e o início, que era de seca, se normalizou. O quadro vinha mantendo bom potencial de safra no final de junho, com a soja na casa de 120 milhões de toneladas e o milho acima de 380 milhões de toneladas. Agora em julho é que os níveis se alinham para uma definição, porque vêm florescimento e formação de vagens e espigas, onde se necessitam de umidade e temperaturas adequadas. Se houver calor acima de 35ºC, parte do potencial se perde. Mas se as condições forem boas poderão colher até um pouco mais. CHINA - A China desde maio vinha tentando derrubar as cotações das commodities, apoiada por notícias de alta de juros nos EUA. Com a ajuda de empresas locais conseguiu dar uma freada
na onda de alta e derrubar as cotações no mês de junho, trazendo-as para patamares mais calmos. Mas esta pressão de baixa pode não ser duradoura, porque os valores das commodities já estão em patamares maiores e a demanda deve seguir forte neste pós-pandemia pelo mundo afora. Há demanda reprimida que irá voltar e assim a fase de baixa não deve ser grande. Seguirão como maiores importadores mundiais de commodities, agrícolas, minerais e energéticas. ARGENTINA - Os argentinos seguem em colheita, com safra comprometida pelo clima. A soja agora é estimada em 43,5 milhões de toneladas e o milho na faixa de 47 milhões de toneladas. Com reclamação generalizada do setor produtivo contra o governo, devido à alta carga tributária e ao aumento dos custos, que comC prometem a capacidade de investimento dos produtores.
Vlamir Brandalizze Twitter@brandalizzecons www.brandalizzeconsulting.com.br Instagram BrandalizzeConsulting ou Vlamir Brandalizze www.revistacultivar.com.br • Julho 2021
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Coluna ANPII
Ciência para os inoculantes Trabalhos e investimentos em pesquisa são fundamentais para uma agricultura forte. O contrário representa atraso grave e muitas vezes irrecuperável em um contexto de geração frenética de inovações pelo mundo
O
tão decantado salto da agricultura brasileira, que fez o País passar em poucos anos de importador para exportador de alimentos, tem diversas causas que propiciaram este avanço, o que merece um estudo amplo, pois perpassa por mais de 50 anos. Entretanto, escolhemos dois para analisar no momento: um é a contribuição da ciência e o outro é a disposição do agricultor brasileiro para a adoção de novas tecnologias. Abordaremos aqui o primeiro ponto. Podemos dizer que a agricultura brasileira é movida a ciência. O melhoramento genético das plantas atualmente cultivadas, com produtividades muito acima das que eram plantadas há 40 ou 50 anos, o uso de fertilizantes cada vez mais apropriados para solos e cultivos brasileiros, o ferramental para controle de pragas e doenças e, mais recentemente, a entrada da agricultura na “era dos biológicos”, tiveram em todas as fases evolutivas a forte presença da Ciência. As pesquisas em institutos, universidades e empresas públicas ou privadas geraram conhecimentos que rapidamente se transformaram pelos trabalhos de desenvolvimento em tecnologias, em produtos ou processos que hoje fazem parte da rotina das modernas plantações. Seguidamente há certa incompreensão frente aos trabalhos de pesquisa, muitas vezes chamadas pejorativamente da “busca do sexo dos anjos”, no sentido de que seriam perda de tempo, não teriam uma finalidade específica. Embora não se faça mais a antiga divisão entre pesquisa “pura” e “aplicada”, na prática existem trabalhos de efeito mais imediato, geralmente para resolver um problema imediato. Mas existem também, e são fundamentais, os trabalhos de prospecção do conhecimento, gerando novo arcabouço que servirá de base para uma nova tecnologia. Por isso existem os departamentos 50
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de P&D, ou seja, a pesquisa prospecta e o desenvolvimento leva ao produto, ao processo, ao procedimento. Uma bactéria isolada de um solo, devidamente identificada em suas características, pode ficar anos na prateleira até que apareça a oportunidade para ser resgatada e utilizada em alguma ferramenta para aumentar a produtividade agrícola. No caso da fixação biológica do nitrogênio e da evolução dos inoculantes no Brasil, houve desde o início, e continua havendo, uma forte sinergia entre o setor oficial e a empresa privada, tornando-se esta parceria uma forte identidade do setor. A primeira fábrica de inoculantes do Brasil surgiu da tecnologia concebida na Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul. O conhecimento transmitido através de assistência técnica gerou o sistema de produção em escala maior. No início da década de 1970, a duas então maiores fábricas de inoculante do Brasil surgiram da tecnologia gerada no instituto de Biologia e Pesquisas Tecnológicas do Paraná (que depois se desdobrou nos atuais Tecpar e Iapar). Em São Paulo, IAC e IPT também desenvolveram conhecimentos que foram utilizados por empresas do estado. A Embrapa Agrobiologia e a Embrapa Soja tiveram e têm um importante papel nas pesquisas que culminaram na seleção de estirpes de Azospirillum eficientes para gramíneas que culminaram no desenvolvimento, pelas empresas, do
A primeira fábrica de inoculantes do Brasil surgiu da tecnologia concebida na Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul
inoculante para culturas que não as leguminosas. A técnica da coinoculação, rapidamente adotada pelas empresas, teve seu início na pesquisa. Isto sem falar na contribuição fundamental que é a seleção de estirpes, um dos muitos casos de sucesso na pesquisa agrícola brasileira. Assim como se selecionam plantas e animais por sua maior produtividade ou resistência a doenças, as bactérias que irão compor os inoculantes são selecionadas em um extenso sistema que começa em laboratório e termina em testes de campo em rede nacional. As primeiras estirpes, algumas delas ainda em uso no Brasil, foram selecionadas na década de 1970 pela Fepagro e a UFRGS. A seguir, a Embrapa também selecionou excelente material usado por praticamente todos os inoculantes atualmente. Assim fica claro que a Ciência é primordial para uma agricultura forte. O mesmo ocorre em outras áreas da vida diária, como na saúde que só evolui, só preserva mais vidas e produz vidas mais saudáveis pelas inovações trazidas pela ciência. Desta forma, reduções em recursos para a pesquisa trazem um forte atraso para um país que não está no rol dos mais desenvolvidos tecnologicamente no mundo atual. Um atraso em um ou dois anos nas pesquisas representa não apenas um ou dois anos, mas um período muito maior, muitas vezes irrecuperável no atual processo ultradinâmico de geração de inovações pelo mundo. É fundamental que a sociedade, como um todo, permaneça atenta, lutando para que a ciência no Brasil seja cada vez mais uma política de estado, mantendo-se em constante crescimento, independentemente da alternativa política que estiver nos governos. C Solon Araujo, Consultor da ANPII