Cultivar 215

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C

Cultivar Grandes Culturas • Ano XVIII • Nº 215 • Abril 2017 • ISSN - 1516-358X

Cultivar

Destaques

Nossa capa

Danos continuados - 20

Como realizar o manejo adequado de percevejos, pragas que provocam prejuízos em soja mesmo depois da colheita

André Shimohiro

Índice Diretas

04

Reflexos da crise da carne

09

Tratamento de sementes em milho

10

Diagnose do crestamento por cercóspora 14

Blindagem inicial - 10

O papel do tratamento de sementes contra pragas iniciais, nematoides e doenças em milho

Mosca-branca em soja

16

Evento - Novos Horizontes Arroz

19

Capa - Manejo de percevejos

20

Desafios da ferrugem-asiática

30

Manejo de nematoides

34

Cultivares de trigo

37

Qualidade do solo em cana

40

Murcha de fusário em feijão

44

Coluna Mercado Agrícola

48

Coluna Agronegócios

49

Coluna ANPII

50

Sem cessar - 30

Os desafios incessantes da ferrugem asiática e a luta para preservar as ferramentas de manejo

Expediente Fundadores: Milton Sousa Guerra e Newton Peter

REDAÇÃO • Editor

Gilvan Dutra Quevedo

• Redação

Rocheli Wachholz Karine Gobbi

• Design Gráfico e Diagramação

Cristiano Ceia

• Revisão

CIRCULAÇÃO

Aline Partzsch de Almeida • Coordenação Simone Lopes

COMERCIAL • Coordenação

Charles Ricardo Echer

• Vendas

Sedeli Feijó

Rithieli Barcelos José Luis Alves

• Assinaturas

Natália Rodrigues Clarissa Cardoso

• Expedição

Edson Krause

GRÁFICA: Kunde Indústrias Gráficas Ltda.

Grupo Cultivar de Publicações Ltda. CNPJ : 02783227/0001-86 Insc. Est. 093/0309480 Rua Sete de Setembro, 160, sala 702 Pelotas – RS • 96015-300 Diretor Newton Peter www.grupocultivar.com cultivar@grupocultivar.com Assinatura anual (11 edições*): R$ 269,90 (*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan)

Números atrasados: R$ 22,00 Assinatura Internacional: US$ 150,00 Euros 130,00 Nossos Telefones: (53) • Geral 3028.2000 • Comercial: • Assinaturas: 3028.2065 3028.2070 3028.2066 • Redação: 3028.2067 3028.2060

Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: cultivar@grupocultivar.com Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.


DIRETAS Túnel

A Adama apresentou na Expodireto o “Túnel do Tempo da Ferrugem Asiática”. Por meio de sons e imagens, o público pôde compreender a evolução da doença e conhecer a solução que vem sendo desenvolvida pela empresa para combater o fungo. “A ferrugem asiática está presente em 12 estados brasileiros e pode ser responsável pela redução de até 80% da produtividade de uma lavoura. Além disso, a doença custa, atualmente, cerca de dois bilhões de dólares aos agricultores”, explica o gerente de Produto da Adama, Leandro Garcia. O Sistema Integrado de Manejo (SIM) para soja e milho, os inseticidas Voraz e Galil e o pacote para tratamento de sementes XSeed também foram apresentados.

Integração

DuPont Proteção de Cultivos e DuPont Pioneer apresentaram suas tecnologias integradas para milho e soja na Expodireto Cotrijal. O novo fungicida Verssarya foi um dos destaques. "Trata-se de uma solução tecnológica inovadora, que dispensa o uso de adjuvantes e proporciona resultados excepcionais na comparação às demais tecnologias do mercado", destacou o gerente de Marketing Brasil da DuPont, Raphael Godinho. Já a DuPont Pioneer destacou seus lançamentos em híbridos precoces. O gerente de Conta da DuPont Pioneer para o Rio Grande do Sul, Jose Fernando Malta Herzog, explicou que a companhia também levou ao evento os híbridos de milho com a tecnologia Leptra de proteção contra insetos, formada pela associação das tecnologias Agrisure Viptera, YieldGard, HerculexI e Liberty Link.

Digital

A Monsanto mostrou em Não-Me-Toque o Climate Corporation, conceito de agricultura digital. Além disso, a empresa agrupou em seu estande diferentes áreas: melhoramento genético, biotecnologia, práticas agronômicas e análise de dados. “Quando opta por plantar soja, por exemplo, o produtor precisa tomar decisões diversas, que vão desde a escolha do tipo de semente, a forma de adubação, o uso de defensivos, até a época de colheita, a escolha de equipamentos, o armazenamento, o transporte e a comercialização, dentre outras”, justificou o líder comercial para a Climate na América do Sul, Mateus Barros.

Equipe

O destaque da FMC na Expodireto foi o campo demonstrativo com o foco no combate a doenças e pragas que atingem as culturas de soja e milho. Robson Sandri, Desenvolvimento de Mercado da FMC, listou as soluções em inseticidas. "O Hero diminui a população de percevejo em soja e milho, o Talisman é recomendado para a fase reprodutiva e o Mustang possui um excelente efeito de choque e rápido controle de percevejos." Também foram apresentados os benefícios do inseticida Rocks.

Presença

Altair Bizzi

O coordenador de Marketing para o Rio Grande do Sul e Santa Catarina da DuPont CropProtection, Altair Bizzi, destacou a importância da Expodireto Cotrijal para a companhia. "É uma ótima oportunidade de interação com o agricultor. Nosso objetivo na feira é o relacionamento, reforçando o compromisso com nossos clientes e mostrando inovações de maneira integrada com a DuPont Pioneer", explicou.

04 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br

Participação

O diretor de Marketing da FMC, Ricardo Almeida, destacou a importância da Expodireto. "Essa feira ao longo de sua história vem contribuindo muito para o agronegócio brasileiro, e a nossa participação no evento confirma o nosso compromisso com os agricultores”, disse.

Ricardo Almeida


Híbridos

Com mais de 70 anos de história, a Sementes Agroceres apresentou seus híbridos na Expodireto. "Temos o AG8780 PRO3, recomendado para a abertura do plantio da safrinha, período que possibilita explorar todo o potencial do híbrido proporcionando uma maior produtividade e retorno do investimento; o AG9025 PRO3 de ciclo superprecoce, que permite o escalonamento da colheita, além de reduzir os riscos contra veranicos, e o AG8690 PRO3 direcionado ao cultivo de milho para silagem", detalhou o gerente comercial Fabrício Bazanella.

Oportunidade

O coordenador de Marketing da BioGene, João Dreher, destacou os lançamentos da companhia e a importância de participar da Expodireto. "Tivemos a oportunidade de sanar as dúvidas dos nossos clientes e também de apresentar nossos destaques como BG7046VYH, BG7640VYH, BG7640VYHR e BG7720VYHR e, também, para produtividade acima da média, o BG7318YH, com diversos resultados acima de 230 sacas/hectare."

Agroeste

No ano em que completa 45 anos, a Agroeste lançou na Expodireto o híbrido A1757 PRO3 que apresenta tolerância a mancha branca e cercóspora. "A marca se consolidou no mercado por oferecer um amplo portfólio com sementes para os principais sistemas de produção do Brasil", disse o gerente comercial, Ivonei Dalacorte. Também para o milho, a Agroeste apresentou os híbridos AS1666 PRO3 e AS1677 PRO3. Já para a cultura da soja a empresa destacou as variedades AS3590 Ipro e AS3570 Ipro.

Cultivares

Além do lançamento de cultivares de soja para a próxima safra, a Nidera destacou na Expodireto a NS 5445 Ipro, indicada para abertura de plantio. Também apresentou o híbrido de milho NS 56 PRO que possui alta qualidade de grão e potencial produtivo. "A companhia está focada no agricultor, buscando sempre agregar valor ao negócio de nossos clientes", garante Nélio Reis, Marketing e Comunicação da Nidera Sementes.

Grãos

Durante a Expodireto Cotrijal a Morgan apresentou três lançamentos em híbridos de milho para lavouras de alto investimento: o MG580, o MG300 e o lançamento do ano para a região, o MG320, indicado para produção de grãos em lavouras de alto investimento. A marca também apresentou parcelas com híbridos já consagrados no mercado como 30A37, 20A78 e 30A77. Os agricultores também puderam conferir a qualidade da silagem de planta inteira dos híbridos. Os franqueados da marca e os times de marketing e desenvolvimento de produtos da Morgan também apresentaram as características do portfólio de híbridos e indicaram ao agricultor como extrair o melhor de seu potencial produtivo.

Portfólio

A Arysta levou para a Expodireto seu portfólio completo, com o novo herbicida SelectOne Pack, o Vitavax e o fisioativador Biozyme para o tratamento de sementes. "A Arysta é uma empresa parceira, que conhece o negócio e está comprometida com a busca de soluções inovadoras e confiáveis. É o caso das Biossoluções que envolvem o uso de produtos sustentáveis, que respeitam o ambiente e proporcionam alta produtividade", exemplificou o gerente de Marketing, Ricardo Dias.

www.revistacultivar.com.br • Abril 2017

05


Banco

Durante a Expodireto, o diretor de Sementes da Dow AgroSciences, Mozart Fogaça, destacou que a companhia conta com um dos maiores bancos de germoplasma do País, além da tecnologia PowerCore para o controle das principais lagartas-alvo na cultura do milho. “A tecnologia PowerCore apresenta um milho com cinco genes estaqueados aprovado no Brasil, aliando o controle de algumas das principais pragas do milho à tolerância a dois tipos de herbicida, o glifosato e o glufosinato. Outro grande diferencial da tecnologia é a inserção de três diferentes proteínas Bt. Com isso, a possibilidade da praga-alvo desenvolver resistência simultânea para essas três proteínas é reduzida”, opinou Fogaça.

Mozart Fogaça

Feira

A Nufarm levou à Expodireto tecnologias para as culturas de milho, soja e trigo, como os herbicidas Agritone, Crucial e ZethaMaxx, e o tratamento de sementes inseticida Inside. O coordenador de Trade Marketing da Nufarm, Rubens Fiorin, assinala que o herbicida ZethaMaxx, lançado nesta safra, surpreende produtores e pesquisadores pela eficiência no controle de plantas daninhas monocotiledôneas e dicotiledôneas, na dessecação para pré-plantio e na pré-emergência.

Fungicida

O fungicida Approve foi o carro-chefe da Ihara na Expodireto Cotrijal. Trata-se da nova tecnologia da empresa para o combate de várias doenças, em diversas culturas. Além de proteger a soja contra a ferrugem asiática, o produto controla mofo branco, antracnose, mancha alvo e ácaros em culturas como algodão, feijão, milho, soja e tomate. Também foram apresentados resultados obtidos com o fungicida Certeza.

06 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br

Soja e milho

A UPL apresentou na Expodireto seu portfólio direcionado ao cultivo de soja e milho, com o fungicida protetor Unizeb Gold, com potencial multissítio, e o Unizeb Glory que, além da ação contra ferrugem, também controla a mancha-branca do milho. Além da linha de fungicidas, a UPL levou para a feira o inseticida Perito, com foco na sojicultura.

Linhas

A Rigrantec expôs seus lançamentos e tradicionais produtos, com destaque para a linha de tratamento de sementes com polímeros, pó secante e enraizadores. “As soluções tiveram excelente aceitação e muitos negócios foram realizados. A linha ColorSeed de polímeros teve uma grande procura, assim como o PolyDry para acabamento e secagem. Os enraizadores Alga CoMo+ e Alga MoZn foram mostrados com plantas expostas no evento. Neste ano o foco principal da Rigrantec foi a linha de nutrição, e a feira possibilitou a evidenciação disto para nossos parceiros”, explicou o diretor Nelson Azambuja.

Tratamento de sementes

O diretor de Marketing Seedcare da Syngenta, Francois Burghgraeve, participou do lançamento do Fortenza Duo, inseticida voltado para o tratamento de sementes, em Carazinho, Rio Grande do Sul. Aproximadamente 400 agricultores e distribuidores puderam conferir os resultados do produto, por meio de tecnologia de realidade virtual e de palestras ministradas por representantes da empresa. O evento também contou com um talk show liderado pelo professor e consultor do mercado de sementes, Paulo Dejalma Zimmer, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).


Informação

A Dow AgroSciences levou aos visitantes da Expodireto Cotrijal acesso a informações de diferentes tipos de culturas como soja, milho, trigo, pastagem e a linha de sementes de milho e soja e eventos biotecnológicos. Quem visitou o estande encontrou conteúdo técnico diferenciado por meio de ferramentas multimídias. O objetivo foi ajudar o produtor a ampliar seus conhecimentos sobre a linha de sementes de milho e soja e controle de plantas daninhas e insetos, o auxiliando a entender os diferentes mecanismos de ação dos herbicidas e inseticidas que podem ser utilizados no controle, reforçando a importância de realização da rotação dos produtos e o uso correto e seguro de defensivos.

Inauguração

A Stoller do Brasil inaugurou nova fábrica na cidade de Cosmópolis, São Paulo, para a produção de soluções biológicas. O investimento de aproximadamente R$ 30 milhões resultou em uma estrutura de seis mil metros quadrados. “Sentindo os anseios ainda maiores da agricultura por novas ferramentas, a Stoller iniciou nos últimos anos um programa para o desenvolvimento de produtos na área de defensivos biológicos, fazendo com que o produtor tenha uma melhor rentabilidade e que permita uma convivência harmônica e respeitosa com o meio ambiente. Atuamos por meio de soluções integradas que possibilitam ao agricultor aproveitar o máximo potencial genético das plantas, com objetivo de oferecer um portfólio completo contribuindo para uma melhor produtividade e qualidade no campo”, disse o CEO da Stoller, Rodrigo Oliveira.


Inseticida para TS

Durante o lançamento do Fortenza Duo, no Rio Grande do Sul, o gerente SeedCare Sul, Felipe Fett, ressaltou as características do inseticida da Syngenta. “Fortenza Duo foi desenvolvido pensando na necessidade real do produtor. Produto moderno, robusto e de amplo espectro, que vai levar o tratamento de sementes para outro patamar de controle e proteção do potencial produtivo da soja, do milho e do algodão.”

Soluções e serviços

A Syngenta apresentou suas soluções e serviços na Expodireto. Os destaques ficaram por conta do fungicida Elatus e das quatro estações de conteúdo, recheadas de informações, com depoimentos e vídeos sobre a efetividade e as características diferenciais do tratamento de semente industrial Fortenza Duo, do inseticida Engeo Pleno e também da biotecnologia Agrisure Viptera para milho, entre outras tecnologias do portfólio Syngenta. “Elatus contabiliza resultados superiores em termos de proteção da produtividade e de controle da ferrugem asiática da soja, além de oferecer até 21 dias de residual”, opina o Desenvolvimento Técnico da empresa, Laércio Hoffmann.

Produtos e serviços

A Bayer esteve presente em mais uma edição da Expodireto, onde além de apresentar os seus produtos e serviços ofereceu palestras sobre boas práticas no campo. “Acreditamos em uma solução integrada para o campo, por isso, além de produtos, oferecemos serviços e acesso fácil e rápido às informações necessárias para um trabalho seguro e eficiente no campo”, explicou o gerente comercial da Bayer para a região de Passo Fundo, Marcos Cernescu.

Manejo

O manejo preventivo e de resistência para as principais doenças da soja foi um dos temas abordados pela equipe da Basf durante a 18ª edição da Expodireto. Durante a feira a empresa deu destaque para os fungicidas Ativum e Orkestra, que compõem o seu portfólio de soluções para o controle de importantes doenças na lavoura da soja. Outro importante destaque foi para o lançamento do Granouro, um inoculante biológico de longa vida para a fixação de nitrogênio na cultura da soja.

Laércio Hoffmann

Nutrição

A Agrichem levou à Expodireto o Programa Agronômico de Monitoramento Nutricional (PAMnutri). De acordo com o engenheiro agrônomo da empresa, Felipe Pozzan, trata-se de uma solução que permite explorar cada detalhe da nutrição em busca da máxima produtividade e melhoramento contínuo da fertilidade do solo. “Entrega uma recomendação de nutrição inteligente, através de um método diferenciado de diagnose da disponibilidade de nutrientes no solo, um sistema exclusivo que utiliza de modelagem avançada e o maior banco de dados sobre a demanda nutricional em cada fase do cultivo, aliado à experiência de nossos especialistas e parceiros na harmonização nutricional com base na ambição de produtividade do agricultor e a especificidade da região. Juntamente com nossa linha de produtos de altíssima absorção e eficácia, permite atingir novos patamares produtivos.”

Inoculante

O inoculante Granouro foi um dos destaques da Basf na Expodireto. “Trata-se de um manejo importante na cultura da soja, pois auxilia na fixação de nitrogênio, um dos principais responsáveis pela boa produtividade das lavouras. O inoculante biológico Granouro chega ao mercado para dar mais flexibilidade ao sementeiro e ao produtor, já que sua vida útil na armazenagem é de até 45 dias”, explicou o gerente de Desenvolvimento de Mercado da Basf, Sergio Silva.

Produtividade

Rafael Marcon

08 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br

Sergio Silva

A Basf destacou na Expodireto os fungicidas Ativum e Orkestra. “Algumas técnicas e o bom manejo da ferrugem asiática no campo podem assegurar que o produtor rural tenha uma maior produtividade, porém o grande desafio está no uso de soluções eficientes que contribuam para o manejo de resistência do fungo. Pensando nisso, a Basf lançou o fungicida Ativum, único no mercado com triplo mecanismo de ação e que proporciona um excelente controle de doenças nas lavouras de soja”, disse o gerente de Marketing da Basf, Rafael Marcon.


Mercado

Efeito colateral Fotos Cultivar

Em ano de safra recorde mercado interno de grãos corre risco de ser atingido por impacto indireto da crise que afetou a carne brasileira. Efeito tende a ser passageiro, mas exigirá ainda maior atenção dos produtores às oportunidades de negócios

A

crise enfrentada no mercado de carnes, após a divulgação dos resultados da operação batizada pela Polícia Federal (PF) como Carne Fraca, tende a trazer reflexos indiretos à comercialização de grãos, com impactos principalmente em milho e soja destinados ao consumo interno. As compras do setor de ração permaneceram praticamente paralisadas, enquanto são aguardados os desdobramentos das restrições impostas por diversos países importadores a produtos brasileiros de origem animal. De acordo com o consultor Vlamir Brandalizze, da Brandalizze Consulting, o impacto maior poderá ser sentido em milho, cujo mercado brasileiro de ração consome em torno de 55 milhões de toneladas dos 90 milhões de toneladas projetadas para a safra. “O setor da soja tem impacto menor porque da safra, estimada em 110 milhões de toneladas, deve haver consumo interno de 14 milhões de toneladas de farelo e mais um milhão de toneladas de óleo, ou seja, 15 milhões de toneladas do grão, o que não representa 15% do total produzido. Já em milho significa mais de 60% da safra nacional”, explicou. Os primeiros efeitos já podiam ser sentidos na terceira semana de março. “Os compradores de milho e de farelo de soja do setor de ração estão parados, trabalhando

com os estoques à espera do rumo que o setor irá tomar. Todos pararam as compras nestes últimos dias afetando a demanda interna. O tamanho do estrago ainda não pode ser avaliado, mas será significativo, porque grandes embarques na exportação de carnes não deverão ocorrer”, estima. Os reflexos da crise na carne chegam aos grãos em um ano de estimativa de comercialização lenta e de cotação baixa do dólar. “Ainda há grande parte do milho por negociar e isso irá ocorrer de modo lento neste ano. A demanda interna tende a cair um pouco, mas espera-se que a diminuição não passe de 10%. O grão terá de ser exportado, porque se ficar como estoque no Brasil irá atrapalhar a comercialização do ano que vem”, projeta.

Milho tende a ser o mais impactado, mas exportadores podem absorver eventual volume excedente

A boa notícia reside no fato de que o mercado externo pode absorver facilmente eventuais sobras não consumidas pelo setor de ração. “O mercado externo tem fôlego para consumir, há forte avanço na demanda mundial de milho e soja”, afirma. Em ano de cotações do dólar mais baixas, colheita de uma grande safra e reflexos dos problemas com a carne brasileira, a receita é agir com prudência. “Neste momento a calma é a arma mais importante para não perder. Haverá uma comercialização longa e toda baseada na exportação. Certamente o governo também irá trazer apoio via pregões de PEP ou Pepro para escoar o milho. Enquanto isso a soja deverá fluir sozinha porque está com boas cotações no mercado internacional”, analisa. O cenário é também de grandes oportunidades em 2017 para quem apostar no planejamento e se mantiver atento. “Este pode ser o ano mais importante da vida de boa parte dos produtores, porque haverá muitas notícias fluindo e a boa interpretação destes fatos pelos agricultores será fundamental para que possam fazer bons negócios e planejar a nova safra”, orienta. Para Brandalizze os efeitos negativos tendem a ser passageiros e servirão de lição. “Acho que a crise irá passar de modo rápido, mas certamente deixará estragos. No final tenderemos a ficar mais eficientes. É o ano em que os produtores e o setor de carnes terão de acompanhar o mercado, participar de seminários e de palestras para debater os rumos que tomará o setor. Seguiremos como líderes mundiais no agronegócio, com carnes e grãos, mas passaremos alguns meses com aperto e tendo de dar muitas explicações aos países importadores”, C reconhece.

Brandalizze avalia impacto da crise no setor de carnes sobre comercialização interna de grãos

www.revistacultivar.com.br • Abril 2017

09


Milho

Blindagem inicial Cultivar

O tratamento de sementes em milho híbrido pode ser realizado com segurança, especialmente quando adotada a modalidade industrial. Uma combinação de produtos pode proteger, de forma integrada, contra pragas iniciais, doenças e nematoides

A

tualmente o tratamento de sementes de milho híbrido para fins de semeadura é uma realidade no setor, com números perto da totalidade do volume que é produzido. A aplicação dessa tecnologia promove a devida proteção à semente, plântula e futura planta, que atualmente tem um alto custo por trazer características agregadas que conferem alto potencial produtivo. As sementes de milho híbrido direcionadas para média a alta tecnologia são capazes de proporcionar alta resposta ao investimento realizado pelo produtor. Alguns materiais de

ponta têm condições de alcançar produtividades próximas ou superiores a 250 sacos por hectare, em áreas irrigadas. As produtividades também podem ser muito altas quando as condições de cultivo em sequeiro apresentam, principalmente, uma distribuição ideal de chuvas ao longo do ciclo. Em experimentos com condições ambientais muito controladas os híbridos modernos de milho alcançaram produtividades variando de 32 toneladas por hectare a 36 toneladas por hectare. Claro que diversos fatores podem impactar na redução do potencial produtivo de uma lavoura de milho, como as condições climáticas, pelos estresses por falta ou excesso de água e

Teste de germinação de sementes tratadas

Sementes sem tratamento e tratadas para avaliação da qualidade fisiológica

10 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br

temperaturas baixas ou altas por longos períodos. As doenças de raízes, de colmo, foliares e da espiga, a interferência das plantas invasoras em constante competição com a cultura e a fertilidade do solo e seu manejo também são aspectos a serem considerados. Outro ponto importante a ser lembrado é a qualidade das sementes, seja genética, fisiológica, física ou sanitária, atributos bastante trabalhados pelas empresas produtoras no Brasil. A concorrência entre essas empresas, pelo mercado, força a ofertar cada vez mais sementes bem produzidas e com elevado padrão de qualidade. Em destaque, a qualidade fisiológica, que de forma simples deve ser entendida como a germinação e o vigor de uma semente. Essas características fisiológicas contribuem para uma germinação rápida e emergência de plântulas uniformes, garantido o estande recomendado de plantas por hectare para cada híbrido em específico. Com relação à ocorrência de pragas em milho, a classificação pode ser feita da seguinte maneira: pragas que vivem no solo ou subterrâneas, pragas de superfície, pragas da parte aérea, pragas do colmo, pragas da espiga e até as pragas dos grãos armazenados. É grande o potencial dos danos das pragas iniciais na redução do estande, uma vez que o milho híbrido, com uma população recomendada na maioria das semeaduras de 60 mil a 80 mil plantas por hectare, por exemplo, produz quatro plantas por metro semeado para a maior população. Diferentemente das lavouras de soja com estandes elevados, que variam de 300 mil a 500 mil plantas/ ha ou o algodão adensado em torno de 250

Avaliação da germinação de sementes tratadas em laboratório


Fotos UNB

Teste de emergência de plântulas com sementes tratadas após o TSI

mil plantas/ha. Neste caso, qualquer perda de estande impactará na redução drástica da produtividade e para o milho o “Fator de Compensação” (termo usado em soja e algodão para se referir aos cultivares de ciclo médio ou tardio que conseguem, dentro de certo limite, compensar a produção mesmo com um estande de plantas abaixo do recomendado) praticamente não existe ou não é significativo. Portanto, reduções no estande de plantas deveriam estar fora de cogitação ou serem inaceitáveis no manejo das práticas culturais em milho. Além do mais, lavouras com estandes reduzidos abrem uma porta para maior gasto com o manejo de daninhas devido à maior a incidência de raios solares que chegam ao solo, quebrando a dormência da maioria das sementes de infestantes, porque não se tem plantas de milho para fazer o sombreamento ideal da área. As pragas iniciais de uma lavoura podem ser agrupadas pelo modo de ataque e divididas em três categorias: as subterrâneas, as de superfície e a Spodoptera frugiperda, que está presente, praticamente, em todas as fases da planta de milho, atacando desde plântulas até as espigas em enchimento. A primeira categoria inclui as pragas subterrâneas (corós ou bicho-bolo, cupins, percevejo castanho-da-raiz, larva-arame, larva-angorá, larva-alfinete e nematoide-das-lesões) que atacam as sementes no sulco de semeadura e as radículas e raízes que estão se formando. A segunda categoria das pragas de superfície (lagarta-elasmo, lagarta-rosca, cigarrinha-do-milho, percevejos verde e barriga-verde e tripes) que atacam as plântulas recém-emergidas. A terceira categoria inclui a Spodoptera frugiperda, que ataca da fase inicial da plântula para planta, provocando sintomas semelhantes aos da lagarta-rosca (cortar ou seccionar as plantas logo acima da superfície do solo ou em uma planta um pouco mais desenvolvida abrir uma galeria na base do colmo e provocar o chamado coração morto), ataque esse semelhante ao da lagarta-elasmo. Especificamente entre as pragas iniciais um enfoque mais detalhado será dado aos

Sementes tratadas após TSI e ensacadas

danos da larva-alfinete, do nematoide-das-lesões e dos percevejos verde e barriga-verde nas plantas de milho. Sendo assim, a larva-alfinete (Diabrotica speciosa) alimenta-se das radículas e raízes, matando a plântula. Podem ser encontradas várias larvas destruindo o sistema radicular, com os maiores danos ocorrendo nas primeiras semanas após a emergência do milho. Apresenta um grave problema nos EUA, contudo, existem relatos de surtos na Itália e França e no Brasil, principalmente na região Sul, devido às condições favoráveis de clima e solo e aos cultivos de inverno as perdas de produtividade por causa dos ataques da larva alfinete podem chegar a 20%, como foi verificado na safra 2012/2013. Os nematoides-das-lesões, principalmente a espécie Pratylenchus brachyurus, são endoparasitos migradores, com penetração e movimentação dos nematoides no interior das raízes, o que provoca a destruição dos tecidos e causa lesões escuras no sistema radicular, o que justificaa nomenclatura de nematoides-das-lesões-radiculares. No sistema produtivo sob plantio direto no Centro-Oeste esse nematoide é o mais comum nas lavouras de soja, com valores muito mais altos que outros nematoides (Heterodera glycines, Meloidogyne spp. e Rotylenchulus reniformis), além de

Aspecto das sementes tratadas com inseticidas + fungicidas + nematicida + polímero em TSI

que o esquema de rotação de culturas mais empregado nessa região é o cultivo de soja com gramíneas (milho, braquiárias e sorgo), sendo todas essas suscetíveis ao ataque do nematoide, permitindo seu aumento ou, no mínimo, a manutenção da população nessas áreas. Os percevejos verde (Nezara viridula) e barriga-verde (Dichelops furcatus e Dichelops melacanthus) causam dano na fase inicial de desenvolvimento do milho. As plântulas são atacadas na região do colo e têm suas folhas perfuradas pelos estiletes, para sucção da seiva, provocando pequenas perfurações que à medida que a planta cresce e abrem as folhas, as lesões apresentam-se simétricas. As toxinas injetadas provocam distúrbio no metabolismo da planta, fazendo com que fique toda retorcida e comece a emitir perfilhos não produtivos. Os percevejos que atacam a soja e, consequentemente, outras culturas em sucessão, como o milho, estão sendo considerados como um novo grupo de pragas, que vem aumentando de importância a cada safra, uma vez que a tecnologia transgênica existente ainda não tem capacidade de controlá-los. Para evitar ou, pelo menos, reduzir o

VANTAGENS DO TRATAMENTO INDUSTRIAL - Eliminar a necessidade de aquisição de máquinas e ambiente físico para o tratamento - Ganho de segurança por evitar o risco do contato dos funcionários com os produtos químicos - Economizar tempo e mão de obra nas operações de tratamento das

sementes - Evitar o risco do uso de doses e dosagens incorretas, com sobra ou falta de produto, gerando um tratamento de baixa qualidade - Minimizar o risco de acidente ambiental e a necessidade de descartar corretamente as embalagens utilizadas

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Deborah Pereira de Oliveira

Nematoide Pratylenchus brachyurus, fase juvenil (esquerda) e fêmea do nematoide Pratylenchus brachyurus

ataque de insetos em milho e seus estragos na produtividade deve ser considerada a implantação de um sistema de manejo integrado de pragas (MIP), com destaque para as seguintes tecnologias: o monitoramento de insetos das áreas; o manejo de inseticidas em pulverização; o uso de agentes de controle biológico; o emprego de milhos híbridos modificados com resistência incorporada Bt; e o tratamento das sementes com inseticidas, para o controle das pragas iniciais até os 15-20 dias após a emergência. Em apoio ao MIP, o uso de milho híbrido transgênico com o gene Bt, da bactéria Bacillus thuringiensis, vem avançando muito. O gene incorporado ao genoma do milho é letal para algumas espécies de insetos da ordem Lepidoptera, à qual pertence a lagarta-do-cartucho (Spodoptera frugiperda), a broca-da-cana (Diatraea saccharalis), a lagarta-da-espiga (Helicoverpa zea), a lagarta-elasmo (Elasmopalpus lignosellus) e a lagarta-rosca (Agrotis ipsilon). Existem híbridos de milho com até três agentes Bt e há duas safras foi colocada à disposição dos produtores de milho uma nova proteína Bt voltada exclusivamente para o controle do ataque da larva alfinete (Diabrotica speciosa). Importante lembrar que as recomendações de adotar área de refúgio e de coexistência devem ser respeitadas para que seja mantido o uso eficiente dos milhos híbridos com gene Bt por mais tempo. Tratamentos de sementes em milho são dois. Um deles se refere ao período de armazenamento, no qual as sementes são tratadas com fungicidas e inseticidas, mais um corante vermelho, por lei, para passarem até seis meses protegidas contra o ataque de fungos (Aspergillus e Penicillium) e ataque de pragas (carunchos e traças). O outro, para a semeadura em campo, entendido como uma das práticas de aplicaçãodo MIP e uma ferramenta de apoio ao sistema para proteger e garantir alta produtividade.

Fotos UNB

Comparação de sementes sem tratamento (esquerda) e tratadas (direita)

Desta forma, uma modalidade de tratamento que se tornou forte é o feito dentro da própria empresa produtora de sementes de milho, tratando e ensacando as sementes, definido como Tratamento de Sementes Industrial ou pela sigla TSI. Essa grande e rápida adoção pelas empresas produtoras de sementes do Brasil é estimulada por uma série de vantagens que proporciona ao produtor rural. O TSI garante entregar sementes de alto valor, tratadas com qualidade, com a dose e a dosagem corretas e distribuição perfeita sobre sua superfície; uso de polímeros proporcionando uma melhor fixação dos produtos junto às sementes, o que evita a formação de pó ou poeira, além de auxiliar no fluxo das sementes dentro da semeadora; as sementes tratadas na empresa são avaliadas rigorosamente quanto à qualidade da germinação; sementes tratadas estão prontas para a semeadura, com ganho de tempo nas operações de plantio. Além da segurança de poder contar com a empresa produtora de sementes caso algum problema que envolva a germinação e emergência das sementes seja detectado. Por fim, o tratamento de sementes com inseticidas para o controle de pragas iniciais (subterrâneas, de superfície e S. fru-

giperda) envolve diversos princípios ativos como: tiametoxan; tiodicarb; clotianidina; imidacloprid + thiodicarb; carbofuran; fipronil; carbosulfan; cabofuran + Zn; furatiocarbe; abamectina (específica para nematoide-das-lesões). Na decisão de uso de qualquer desses produtos deve ser levado em conta o histórico de problemas com pragas na área, a distribuição das pragas, a suscetibilidade ou resistência do milho híbrido, com o objetivo de proteger sementes, plântulas e plantas iniciais e garantir o estande recomendado. A novidade no mercado de sementes de milho é poder ter no TSI a inclusão do nematicida que protege o sistema radicular contra o nematoide-das-lesões (Pratylenchus brachyurus) pela sua ação de contato. O tratamento de sementes contra pragas iniciais do milho híbrido pode ser feito, com segurança e de preferência em TSI, usando uma combinação de produtos que vão proteger de forma integrada, além das pragas, contra doenças e nematoides. Todo o esforço tem um objetivo maior, que é o de garantir o estande final de plantas e C a alta produtividade da lavoura. Marcelo Fagioli e Karine Noronha Silva, UnB

Sementes sem tratamento (amarelas) e as demais com diversos tratamentos

Fagioli e Karine abordam efeitos do tratamento de sementes na cultura do milho

12 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br



Soja

Como identificar Fotos Marcelo Madalosso

Patógenos necrotróficos, recorrentes na cultura da soja, não raras vezes acabam classificados como doença de final de ciclo (DFC). É o caso da mancha parda e em especial do crestamento por cercóspora, facilmente confundido com outras doenças foliares. Sua evolução ocorre através da fitotoxina cercosporina, que auxilia diretamente na assertividade da diagnose do sintoma foliar

A

localização geográfica do Brasil confere privilégios agroclimáticos específicos de uma macrorregião localizada em torno dos trópicos. Essas condições permitem a sobrevivência, o desenvolvimento e a reprodução da grande maioria das espécies do planeta, sejam de interesse agrícola ou não. Neste particular, seres vivos que utilizam o cultivo agrícola como substrato para sua perpetuação têm horizonte vasto para sobreviver, devido ao sistema de monocultivo. Este ambiente permite que uma grande gama de patógenos encontre condições excelentes para sobreviver por alguns meses do ano, mesmo com a ausência da cultura. Os patógenos necrotróficos têm habilidade de sobreviver

sem o hospedeiro vivo, através de estruturas de resistência no solo ou em atividades saprofíticas, nutrindo-se da matéria orgânica. Alguns dos patógenos necrotróficos, recorrentes na cultura da soja, eram chamados, antigamente e de modo incorreto, de doenças de final de ciclo (DFC). Recebiam este nome pelo desconhecimento de sua epidemiologia, somente por sua observação sintomática, presente no final do ciclo da cultura da soja. Dentre os patógenos com estas características, encontram-se a mancha parda (Septoria glycines) e o crestamento por cercóspora (Cercospora kikuchii). Especialmente este último possui características bem específicas de infecção e apresenta sintomas que podem

Sintomas de crestamento de cercóspora visualizados nas folhas superiores

14 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br

ser confundidos com outras doenças foliares em soja. A evolução da doença ocorre através de uma fitotoxina produzida pela C. kikuchii, que auxilia diretamente na assertividade da diagnose do sintoma foliar.

A CERCOSPORINA

A fitotoxina chamada Cercosporina teve o primeiro relato no Japão, por volta dos anos 70, onde os pesquisadores descreveram a rota de biossíntese desse composto (Okubo et al, 1975). Concluíram que a rota inicia-se com a condensação das moléculas de acetato e malato, estabelecendo a rota dos policetídios, uma grande classe de metabólitos secundários presentes em bactérias, fungos, plantas e

No terço inferior das plantas prevalece a mancha parda


Esquema 1

Esquema 2

alguns animais. Um fator fundamental para sua produção e virulência é a presença de luz (Ehrenshaft et al, 1991). A molécula de cercosporina absorve comprimentos de onda na faixa do visível, entre 400nm e 600nm, ou seja, do roxo ao amarelo. Com isso, o gatilho para produção desta fitotoxina é disparado imediatamente com a presença de luz, sendo suprimido com o escuro. Além disso, temperaturas acima de 30°C inibem a produção de cercosporina. Isso auxilia para o entendimento de que em regiões mais quentes, a presença dos sintomas de crestamento de cercóspora fica visível em anos mais amenos ou muito no final do ciclo da cultura. Com a absorção de luz, a cercosporina é produzida, se energiza rapidamente e é convertida em um estado tripleto Cerc* (espécies tripletas geradas enzimaticamente capazes de transferir energia a vários aceptores). Nesta forma, a Cerc* transfere energia para a clorofila, tornando-a tripleta (Chl*), que por sua vez irá transferir a energia para o aceptor mais ávido por elétrons, o oxigênio. Com elétrons despareados, inicia-se a produção em cascata de Espécies Reativas de Oxigênio (EROs) na célula vegetal, como oxigênio singleto (1O2), radical superóxido (-O2), radical peroxila (HO2), peróxido de hidrogênio (H2O2) e radical hidroxila (OH-). As EROs, provocam a peroxidação

lipídica (Esquema 1), destruindo a integridade celular, induzindo o extravasamento do conteúdo citoplasmático (Esquema 2), causando a morte da célula (Daub & Ehrenshaft, 2000). Algumas hipóteses direcionam que o extravasamento de nutrientes do citoplasma para os espaços intercelulares facilita o crescimento e a esporulação do fungo (Daub et al, 1983).

A CERCOSPORINA NO PROCESSO DOENÇA

A produção de cercosporina é realizada pela C. kikuchii para auxiliar no processo de infecção e virulência sobre o hospedeiro suscetível. O primeiro relato dessa associação foi feito por Upchurch et al (1991), observando que mutantes do patógeno, que não produziam cercosporina, não eram capazes de causar infecção em folhas de soja. Em outros trabalhos, Almeida et al (2005) encontraram uma relação de 83% entre os patógenos que produzem cercosporina e a severidade da doença na planta. Abordaram, ainda, que isolados que apresentaram mais halos roxos a vermelhos em meio de cultura, também foram aqueles que produziram mais cercosporina e, portanto, foram os mais virulentos. Além disso, isolados que produziram baixos níveis da fitotoxina causaram lesões muito pequenas e de baixa taxa de progresso. Outro fator importante nesta relação

e expressão dos sintomas é a presença de luz. Diversos estudos comprovaram que no escuro ou sombreado, a penetração e evolução dos sintomas foi menor, quando comparado com a condição sob luz direta. Essa característica elucida a diagnose, ora confusa, com a expressão sintomática da doença. Os sintomas de crestamento de cercóspora são visualizados nas folhas de cima da cultura e dificilmente no terço inferior, onde a prevalência é da mancha parda. A partir do estádio de formação do grão até o seu enchimento ocorre o momento de maior expressão dos sintomas de crestamento. Nas folhas de cima, inicia-se o processo de expressão sintomática, através de um leve bronzeamento na região entre-nervuras do folíolo, facilmente confundido com fitotoxidade de adjuvante. Com o avanço do ciclo da cultura, provido de molhamento foliar para hidratação dos conídios e produção de cercosporina, os sintomas evoluem, passando rapidamente para clorose, seguida de necrose e torção da borda do folíolo. Em alguns casos, ainda é possível verificar um arroxeamento de nervuras, hastes e legumes, finalizando o ciclo do patógeno C no hospedeiro, com o grão. Marcelo Gripa Madalosso, Instituto Phytus e URI/Santiago

Leve bronzeamento na região entre-nervuras do folíolo, necrose, torção da borda, arroxeamento de nervuras, hastes e legumes

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Soja

Quebra de ciclo Cultivos sucessivos são altamente favoráveis a infestações de pragas como a mosca-branca, que na proporção de dez ninfas por folha tem levado a prejuízos da ordem de 12 sacas por hectare em soja. As aplicações de inseticidas, sempre aliadas a outras estratégias de manejo integrado, devem ser realizadas na primeira cultura implantada no campo, a fim de quebrar o ciclo e evitar novas gerações do inseto

A

região do Cerrado brasileiro caracteriza-se pela presença de áreas extensas e altamente mecanizadas. O agroecossistema utilizado apresenta-se altamente favorável à multiplicação de pragas, pois prevalece um sistema de produção em que a soja é a principal cultura a se estabelecer na grande maioria das áreas, sendo rotacionada muitas vezes com algodoeiro ou milho em determinados anos e regiões. Esse cultivo sucessivo fez com que muitas pragas se adaptassem ao sistema. Aliado a isto, outros fatores, como condições climáticas favoráveis, com altas temperaturas e inverno ameno, tornam-se ideais para a multiplicação dos insetos. Entre as pragas, a mosca-branca, Bemisia tabaci biótipo b, tem causado grande preocupação e prejuízos para alguns produtores das culturas de soja, algodão, feijão, entre outras. A mosca-branca, Bemisia tabaci biótipo

b (Gennadius, 1889), é um inseto polífago, cuja reprodução já foi observada em mais de 500 diferentes espécies vegetais, pertencentes a diversas famílias botânicas. Pertence à ordem Hemiptera e à família Aleyrodidae. O ciclo biológico da mosca-branca pode variar de 17 dias a 45 dias, sendo influenciado principalmente pela temperatura. Os adultos apresentam tamanho de cerca de 2mm de comprimento com quatro asas membranosas de coloração branca. A fêmea pode colocar mais de 200 ovos. Os ovos de coloração verde-claro a castanho-claro são colocados na face inferior das folhas. Eclodindo, as ninfas são móveis em seu primeiro estádio. Após selecionarem um local, introduzem seu estilete e fixam-se, não se movendo mais. Os adultos emergem depois de quatro estádios. Por ser um inseto sugador, durante a sucção de substâncias ricas em nutrientes

16 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br

e água das plantas, a mosca-branca pode introduzir toxinas que provocam desenvolvimento desuniforme na planta e queda na produtividade. Além disso, secreta substância açucarada sobre as folhas que favorece o crescimento de fungos oportunistas, no caso do gênero Capnodium spp., levando ao recobrimento da folha por este fungo, comumente chamado de Fumagina. Isto leva à redução de área foliar e da taxa fotossintética e, consequentemente, da produtividade. Outra característica é a habilidade na transmissão de viroses, em especial do gênero Begomovirus – Geminiviridae, além do gênero Carlavirus Cowpea mild mottle virus – CpMMV (que leva à necrose da haste e posterior morte de plantas). Algumas áreas no Brasil têm apresentado plantas com virose, que levam a pequenos prejuízos. No entanto, é necessário que


Fotos Germinson Tomquelski

Presença de fumagina nas folhas, fruto de substância secretada pela mosca-branca

os técnicos, ao perceberem a presença de plantas anormais, façam a coleta e o envio a laboratórios para identificação das possíveis viroses. Este problema em soja deve ser tratado com grande importância, uma vez que é a principal commodity brasileira no agronegócio. O biótipo Q ou do mediterrâneo já se encontra no Brasil, sendo alvo de estudos por entomologistas da IAC e Embrapa Arroz e Feijão. Os estados de Rio Grande do Sul e São Paulo já tiveram sua ocorrência

reportada. Este biótipo teve sua introdução nos EUA por volta de 2004 e a ocorrência identificada no Uruguai e na Argentina em 2012. Na cultura da soja a mosca-branca pode começar sua ocorrência nos primeiros dias, em algumas regiões de pressão maior da praga. O seu prejuízo comumente só é percebido na fase do enchimento dos grãos, pois as plantas tendem a terminar o seu ciclo antes do prazo normal, com os grãos menores e consequentemente diminuindo a produção. Isso ocorre muitas vezes pela presença da fumagina. Altas infestações em soja, quando não controladas ou mantidas em populações que não comprometam a produtividade, podem vir a migrar para culturas adjacentes ou mesmo em sucessão. É o caso de algumas regiões onde o sistema de produção é mais intensivo, como nos Chapadões, e mesmo nas áreas irrigadas de Mato Grosso, Goiás, Tocantins, Minas Gerais, Bahia e Maranhão, com culturas como feijão, soja e algodoeiro.

Lavoura com sintomas característicos do ataque de mosca-branca

Na cultura do algodão a mosca-branca pode ainda causar o problema de manchas nas fibras, com a ocorrência da fibra açucarada (caramelização), causando decréscimo na qualidade, principalmente no tipo. A sua dispersão pode ocorrer por ventos, o que a leva a grandes distâncias. Apresenta distribuição desuniforme nas lavouras, devendo o técnico se atentar às bordaduras que porventura podem receber populações migrantes de outros talhões/culturas. O monitoramento desta praga no início das infestações pode ter como foco a presença dos adultos e com o desenvolvimento da cultura deve ser dada atenção às ninfas e aos ovos da praga, em função da colonização. Nesta fase o auxílio de lupas de aumento de 20x ou mais deve estar dentro das ferramentas a serem levadas para o campo ou mesmo a coleta de folhas para se remeter aos laboratórios. Com o advento da soja Bt, tem se observado certo descuido em função da menor ocorrência de lagartas, levando o técnico e o produtor a uma falsa sensação

A mosca-branca pode introduzir toxinas que provocam desenvolvimento desuniforme na planta e queda na produtividade

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de tranquilidade em relação às pragas, que acabam por atingir altas populações, sendo percebidas de forma tardiamente para o seu manejo. Normalmente as medidas de controle para a mosca-branca devem ser intensificadas nos períodos quentes, quando ocorrem aumentos populacionais do inseto. O produtor e seu técnico, quando da presença comum da praga na região, ou mesmo na propriedade, deve traçar estratégias para diminuir a população. O manejo integrado desta importante praga faz necessário evitar o plantio escalonado de culturas, pois isso tende a aumentar as populações nos plantios finais. Recomenda-se eliminar restos culturais, retirando plantas com viroses e hospedeiras, como daninhas. A utilização de armadilhas amarelas com óleo para monitoramento pode também diminuir a população. O índice de controle para esta praga ainda faz parte de estudos de diversas instituições no Brasil. No entanto, vale destacar que em trabalhos na cultura da soja, a planta convivendo com uma média de dez ninfas por folha levou a prejuízos na ordem de 12 sacas por hectare (Tomquelski et al, 2011). A alternativa mais utilizada e prática é o controle químico no qual se faz uso de neonicotinoides como acetamiprid, clothiadinim, imidacloprid, thiacloprid e thiametoxan, inseticidas de maior sucesso, utilizados com ação sobre adultos e formas jovens. No mercado existem ainda os reguladores de crescimento que atuam sobre as formas jovens como cyantraniliprole, pyriproxyfen, espiromesifeno e buprofezin com ação sobre ovos e ninfas. Novos inseticidas estão sendo desenvolvidos como misturas prontas (neonicotinoides + juvenoides) para o produtor, além de novas moléculas. É possível citar o dinotefuran, além do flupyradifurone, com excelente ação sobre ninfas.

Fotos Germinson Tomquelski

Presença de mosaico nas folhas provocado pela incidência do inseto

O controle biológico é uma ferramenta interessante para o manejo, uma vez que existem poucos inseticidas ativos no controle desta praga. Beauveria bassiana é a espécie mais utilizada para o controle da mosca-branca. Os inseticidas devem ser aplicados no final do dia e com umidade para um controle satisfatório do inseto. Inseticidas biológicos também podem ser utilizados dentro de programas de manejo, intercalados com o químico ou mesmo associados, em determinados momentos. Vale ressaltar, neste caso, que o produtor deve consultar a empresa fabricante sobre a compatibilidade. Em alguns trabalhos desenvolvidos na Fundação Chapadão têm se observado eficiências interessantes. O que se observa muitas vezes é a aplicação tardia para o controle desta praga, em alguns casos por falta de conhecimento ou má amostragem. Algumas aplicações em altas infestações podem não surtir o efeito desejado em função da tecnologia de aplicação e de outros fatores. Neste

caso deve-se analisar as sobras da praga no sistema, levando a reaplicações para o controle. Quando da presença de cultivos sucessivos na propriedade, as aplicações devem ser realizadas na primeira cultura implantada no campo, a fim de evitar que os últimos talhões venham a apresentar altas infestações. Esta prática de atacar ovos e ninfas muitas vezes deve ser analisada como a quebra do ciclo da praga, evitando as novas gerações. Nesta batalha, o conhecimento da mosca-branca, a boa amostragem e as definições de estratégias integradas de controle são ferramentas que auxiliam o produtor no controle e consequentemente propiciam o aumento da produtividade na C cultura da soja. Mariana Yamada, Gustavo Ribeiro Camargo, Yara Barbosa e Germison Vital Tomquelski, Fundação Chapadão

Porcentagem de eficiência de alguns inseticidas na população de ninfas de B.tabaci biótipo B na cultura da soja. Fundação Chapadão. Chap. Sul/MS. 2016.G.39

Fungo oportunista na folha, comumente conhecido como fumagina

18 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br


Empresas

Transferência de tecnologia Fotos Dow

Evento anual promovido pela Dow AgroSciences reúne distribuidores para orientar quanto às melhores formas de manejar e potencializar a vida útil do portfólio da marca

T

ransmitir conhecimentos técnicos sobre tecnologias de herbicidas e fungicidas seletivos à cultura do arroz foi o objetivo do Novos Horizontes Arroz, evento promovido pela Dow AgroSciences na Estação Experimental do Arroz (EEA), em Cachoeirinha, no Rio Grande do Sul. O evento anual ocorreu em março, destinado à cadeia de distribuidores e revendedores da marca nos estados de Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Realizado por diversas edições na Estação Experimental da marca em Mogi Mirim, São Paulo, desta vez a intenção foi abordar no evento as soluções e os desafios específicos para as regiões produtoras dos distribuidores. “Optamos por esse local para estarmos cada vez mais próximos às realidades que a lavoura arrozeira encontra aqui no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina”, afirmou o gerente de Marketing para Arroz no Brasil, Luiz Grines. Nesta edição os participantes assistiram a palestras com gerentes e agrônomos da Dow, especialistas na cultura do arroz e visitaram ensaios a campo. Nesses ensaios foi possível visualizar, na prática, a melhor maneira de aplicar os produtos, a fim de obter maior eficácia. Aliada à eficácia, a sustentabilidade da tecnologia também esteve em foco, com orientações sobre o manejo integrado de resistência, para que o distribuidor saiba auxiliar o agricultor na manutenção da durabilidade dessa

tecnologia. “Além de lançar novas tecnologias, temos a preocupação de mantê-las por um período mais longo, e é aí que entra o manejo integrado de resistência, que usa desde técnicas adequadas de época de semeadura, condições de aplicação, rotação de ativos, rotação de variedades. Uma série de atitudes para aumentar a vida da tecnologia”, ressaltou o gerente de Pesquisa e Desenvolvimento para o Brasil, Rogério Rubin. Para a companhia, fundamentar as informações que são passadas à cadeia distribuidora e mostrar seu resultado é essencial. “A Dow é uma empresa de pesquisa, nós geramos informação. Então todos os nossos conceitos são gerados e validados internamente, seja por trabalhos produzidos no Rio Grande do Sul, seja por outros estados que têm condições diferenciadas, ou na nossa estação experimental em Mogi Mirim. Com esses ensaios, a gente acaba descobrindo a melhor maneira de se usar nossos produtos, a melhor maneira de se extrair as características do produto, que a gente adapta pra uma recomendação pontual. E é isso que a gente está fazendo aqui, mostrar o porquê da nossa recomendação”, explicou Rubin. O evento possuía duas estações: uma voltada para herbicidas e uma para fungicidas. Na estação de fungicidas, os distribuidores puderam conhecer as práticas adequadas para o combate das principais doenças que atacam a cultura do arroz,

como brusone, mancha parda, mancha estreita, entre outras. Nas parcelas foram demonstrados os Kits Duo e Trio Dinâmico - focados em variedades mais suscetíveis a brusone; e os Kits Duo e Trio Manchas focados em variedades mais suscetíveis a manchas. A doença fúngica brusone é um dos maiores desafios dos orizicultores, podendo até comprometer 100% da lavoura em casos extremos. A doença pode atacar a folha, a panícula e até a base da panícula, essa sendo chamada de brusone de pescoço. Quando na fase inicial, a brusone atacando a folha pode matar a planta. Uma pesquisa feita pela companhia aponta que em uma lavoura de arroz, quando 15% das panículas são afetadas por algum tipo de doença, o orizicultor chega a perder cerca de 30 sacas por hectare. “No arroz irrigado, nós recomendamos aplicação a partir da emissão da panícula, no período reprodutivo. Em alguns casos, com variedades muito suscetíveis e condição climática favorável, ela ocorre no período vegetativo, e então também devemos fazer aplicação. Por isso a necessidade do monitoramento da área, verificando o surgimento de doenças na fase vegetativa. Na fase reprodutiva, trabalhamos com aplicações preventivas”, detalhou Rubin. Com parcelas testemunhas, parcelas com aplicações realizadas preventivamente na fase reprodutiva, e parcelas com aplicações realizadas após o surgimento da doença, a marca conseguiu demonstrar no evento como potencializar o uso dos produtos com a aplicação na época correta, atingindo o menor índice de perda possível. “O maior custo da lavoura é aplicando o produto de forma errada. Por isso apresentamos diversas parcelas para demonstrar a importância da aplicação preventiva”, informou Grines. Já na estação de herbicidas, os produtos Ricer e Clincher foram apresentados também em diversas situações de aplicação. Os efeitos do Ricer foram demonstrados em pré e pós-emergência. “Aqui nós recomendamos um programa de aplicação, utilizando o pré-emergente, e após o surgimento de invasoras, realiza-se a escolha do produto ideal para o combate daquela planta ou plantas específicas”, afirmou Angela Bundt, que atua na área de pesquisa e desenvolvimento da Dow AgroSciences. Para Luiz Grines, a dinamicidade do mercado, com a entrada de novas tecnologias e novos desafios sendo observados pelos agricultores ano após ano, faz com que o evento se mantenha relevante e necessário. Além do Novos Horizontes, outras ações voltadas à cultura do arroz seguem durante o ano de 2017, como treinamentos regionais para distribuidores e consultores. C

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Soja

Danos continuados Com potencial para afetar de maneira irreversível a quantidade e a qualidade da produção de soja, o ataque de percevejos pode resultar em prejuízos mesmo após a colheita, sob determinadas condições de armazenamento. O manejo integrado e racional destes insetos, com ações regionalizadas, que incluam outras ferramentas além do controle químico, é indispensável para enfrentar este grande problema nas lavouras

Q

indo além dos descontos no momento da comercialização. É o caso dos danos provocados pelos percevejos Euschistus heros e Piezodorus guildinii, espécies consideradas, dentro do complexo de percevejos fitófagos da soja, de maior incidência. Representam mais de 90% da população total de pentatomídeos que ocorrem na

André Shimohiro

uando há em uma lavoura de soja um grupo de insetos que pode incidir de maneira irreversível na quantidade e na qualidade da produção, o risco da sua presença passa a ser grande e se o problema não for tratado a tempo esses danos tendem a acarretar prejuízos até mesmo em pós-colheita,

20 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br

cultura, com predominância de uma ou de outra espécie, de acordo com região, ano ou cultivar utilizada. Embora a colonização pelos percevejos se inicie na metade ou no final do período vegetativo da cultura, sua presença é preocupante, principalmente na fase reprodutiva da soja, pois a partir do aparecimento


Fotos Cecilia Czepak

das vagens, as populações desses fitófagos aumentam de forma considerável, com seus indivíduos se alimentando, principalmente dos grãos em desenvolvimento, ocasionando a murcha e a má formação de sementes e vagens (Figura 1). Além do que, em alguns casos, as plantas de soja atacadas não amadurecem normalmente, permanecendo verdes na época da colheita. O problema é que ao danificarem os grãos, estes percevejos, promovem grandes prejuízos, mesmo com uma única picada. Basta que consigam romper o tegumento e atingir o cotilédone e então esse grão começa um processo que altera de forma irreversível a umidade e o equilíbrio interno, além de facilitar a penetração de microrganismos e água. Consequentemente o processo de fermentação pode se iniciar já nas lavouras, principalmente em períodos chuvosos, e continuar no pós-colheita dependendo das condições de armazenamento. Vale lembrar que durante todo o

Figura 1 – Vagens com grãos danificados devido à alimentação dos percevejos. Goiânia/GO. 2017

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Matheus Le Senechal Nunes

Figura 2 - Grão apresentando “mancha branca”, provocada pela alimentação do percevejo

processo de condução da cultura há um investimento alto para se alcançar boas produtividades. Porém, muitas vezes a qualidade dos grãos fica a desejar e neste caso os problemas começam a ser detectados no momento da classificação desses grãos, quando chegam às unidades de armazenagem, isto é, antes da comercialização e do acondicionamento dos lotes nos armazéns. Por meio dos padrões oficiais aprovados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e com base na instrução normativa Mapa 11/2007 determinam-se o grupo, a classe e o tipo dos grãos de soja. Para tanto, uma amostra é analisada e, especificamente, os grãos que apresentarem uma “mancha branca” - conforme observado na Figura 2 -, provocada pela alimentação do percevejo, são identificados como defeito “leve” e denominados grãos “picados”. Neste tipo de defeito o desconto não é total, como ocorre com os outros defeitos observados na mesma classificação. Isto porque a partir da obtenção dos percentuais de grãos picados, estes são divididos por quatro e então somados ao total de grãos avariados. Com isso, se dá o deságio, de acordo com os limites excedidos, aplicando-se os descontos nos lotes de grãos comercializados. Porém, o problema pode se intensificar ao longo do tempo, quando dependendo das condições de armazenagem, ocorrer um processo de fermentação daqueles grãos “picados”, que passam a ser denominados como grãos “fermentados”. Portanto, com base na normativa, o desconto neste caso será total (não será mais dividido por quatro, como ocorreu no momento do recebimento desse grão após a colheita)

e os prejuízos virão nas comercializações futuras e ficarão a cargo das empresas armazenadoras e/ou para o produtor que armazena na própria fazenda. Além dos prejuízos já mencionados, este grão fermentado também provoca alterações na matéria-prima que vai para indústria, promovendo mudanças na cor e aumento na acidez do óleo, o que eleva os custos no processo de branqueamento e neutralização dessa acidez e como consequência há um menor rendimento na extração desse óleo. Esse dano muitas vezes não pode ser evitado, pois conforme se verifica na Figura 3, mesmo com populações sob controle, não foi possível impedir que uma pequena parte dos grãos fosse danificada, porém, resta saber se este percentual de grãos picados, ainda que seja inferior ao

limite aceito pelas normas do Mapa, venha a ocasionar um processo lento de fermentação dentro das unidades armazenadoras, comprometendo todo o lote. É de suma importância estabelecer ou retomar o manejo integrado de pragas nos cultivos de soja, com o intuito também de minimizar todo esse processo danoso ocasionado pelos percevejos. As táticas de controle para esse complexo de pentatomídeos são conhecidas há anos, mas, infelizmente, a maioria tem como hábito a aplicação pura e simples de inseticidas, e o que é pior, de forma calendarizada, isto é, com base no desenvolvimento da cultura ou pegando “carona” com os fungicidas, portanto sem o monitoramento prévio. Como é de conhecimento público, o uso de inseticidas em mistura de tanque com herbicidas, ou mesmo fungicidas, apesar de não regulamentado é prática corriqueira para os sojicultores, e este procedimento, que tem como justificativa o aproveitamento de operações, tem elevado os problemas com relação ao controle, simplesmente porque a praga-alvo não está presente, ou, ao contrário, já está presente, mas em altas populações e, provavelmente, a eficácia do inseticida pode ficar comprometida, sem citar as reduções na quantidade e na qualidade dos grãos que serão colhidos. Quando se fala em manejo integrado de pragas, muitos têm em mente a ideia de uma agricultura orgânica, sem agroquímicos, mas não é esse o escopo. Pelo contrário, os químicos estão presentes, fazem parte do processo, mas não são nem podem ser a única ferramenta a ser adotada. É preciso incluir dentro do sistema produtivo, além dos agroquímicos, táticas de controle biológicas, como as liberações de inimigos

Figura 3 – População média de percevejos ao longo do ciclo da soja e seus respectivos percentuais de grãos danificados obtidos a partir de diferentes tratamentos (A, B e C) à base de neonicotinoides + piretroides. Goiânia/GO, 2017

24 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br


Fotos Cecilia Czepak

Figura 4 - Procedimento para monitoramento de artrópodes em cultivo de soja utilizando o método da batida de pano. Goiânia/GO, 2017

naturais das pragas-chave e sua manutenção por meio do uso de inseticidas mais seletivos e/ou adotando também o controle microbiano na cultura. São táticas fundamentais para o estabelecimento do manejo integrado de pragas, pois possibilitam que inimigos naturais possam também atuar no controle de percevejos fitófagos. Além do mais, muitas técnicas relacionadas ao controle cultural são aplicáveis à agricultura intensiva de grande e pequeno porte, tendo como exemplos a combinação de rotação de cultivos, a destruição dos restos de safra para interromper os ciclos de vida dos fitófagos, a temporização ou disposição cuidadosa dos plantios para evitar sincronia com as pragas, a destruição de plantas hospedeiras e o cultivo de plantas armadilhas para atração e controle dos percevejos. Ou, ainda, aquelas que possam conservar a população de inimigos naturais próximas às lavouras. É importante considerar que com a colheita, a população normalmente decresce

e os percevejos começam a dispersão para as plantas hospedeiras e, em seguida, se abrigam em áreas de palhada, permanecendo até a próxima safra de soja, sobretudo no caso do percevejo-marrom. Sendo assim, a identificação dos locais onde estes insetos se refugiam para, eventualmente, controlá-los, seria uma forma bastante eficaz se efetuada no final ou no início da safra, evitando, com isso, a entrada ou a saída destes percevejos para as áreas de refúgio. Portanto, várias são as opções além do controle químico, que têm como objetivo diminuir as populações de percevejos fitófagos na soja. Porém, é importante que se saiba que a base para todo o manejo de pragas está na correta identificação e quantificação dos insetos presentes na lavoura, e isto só se consegue com monitoramentos sucessivos e frequentes, o que não é prática usual dos sojicultores. No monitoramento, o produtor deverá contratar pessoal treinado para o rápido reconhecimento das pragas e dos inimigos

naturais presentes na lavoura de soja, e seguir com o mais simples dos métodos, o da batida de pano, utilizando, para isso, tecido ou lona de cor clara, com 1m de largura e 1,40m de comprimento, fixado em duas varas. O pano deverá ser disposto cuidadosamente entre as fileiras de soja, desenrolando-se uma parte e ajustando-a na base das plantas que serão batidas, e a outra parte estendida sobre as plantas de soja da fileira adjacente. Em seguida, as plantas deverão ser agitadas vigorosamente sobre o pano, promovendo a queda dos insetos que deverão ser identificados e quantificados, primeiramente os adultos e em seguida as formas jovens (Figura 4). De modo algum o produtor deverá tomar decisões com base em avaliações visuais, pois não são representativas e podem levar a equívocos. Trabalhos realizados em Goiás demonstraram que no pano de batida, independentemente do horário, a extração dos percevejos foi aproximadamente dez vezes maior quando comparada a uma

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Figura 5 – Extração de percevejos em lavouras de soja, em três horários distintos e utilizando dois métodos de amostragem, pano de batida (1,0 x 1,4) e visual. Goiânia/GO, 2017

avaliação visual das plantas (Figura 5). É de conhecimento que os adultos são visualizados com mais frequência pelo produtor. Entretanto, nos monitoramentos comprova-se a permanência maior das ninfas nas partes medianas da soja, aparentemente escondidas entre as vagens, causando danos e prejuízos semelhantes àqueles causados pelos adultos e apesar do percevejo conseguir se alimentar de várias partes da planta, é a vagem com seus grãos o alimento de maior preferência. Assim, as pulverizações com inseticidas devem ser direcionadas para que alcancem essa população presente, principalmente nos terços médio e inferior da soja. Além disso, estudos mostram que ninfas de primeiro instar não se alimentam. Por outro lado, as ninfas de terceiro, quarto e quinto instares são capazes de alcançar com seus estiletes os grãos em formação, danificando-os de forma irreversível. É preciso lembrar ainda que, nesta fase, a forma jovem não faz outra coisa a não ser se alimentar e tende a direcionar todas as energias para este propósito. Por isso, representam uma ameaça na reta final do cultivo, quando se definem o rendimento e a qualidade da semente. Já os adultos se alimentam como as formas jovens, mas voam e gastam uma parte do tempo também com acasalamentos e oviposições, objetivando perpetuar a espécie. A intensidade do dano dependerá, fundamentalmente, da espécie de percevejo e de seu estádio de desenvolvimento, do estágio fenológico das plantas e do tempo em que estes insetos permanecerão se alimentando, além, é claro, do nível populacional existente na lavoura. As amostragens devem ser realizadas

semanalmente, durante todo o ciclo da soja e em número de dez a cada 100 hectares e intensificadas, dependendo da fase de desenvolvimento da cultura e plantios adjacentes. O incremento deste procedimento no período reprodutivo da cultura é imprescindível e a média de todos os pontos amostrados deverá ser o indicativo para a adoção de medidas de controle, ou não. Para isso, têm-se os níveis de controle recomendados pelos órgãos de pesquisa (dois percevejos/m para soja grão e um percevejo/m para soja semente). Porém, estes níveis têm sofrido questionamentos por pesquisadores e técnicos da área, que os consideram, dentro do panorama atual da soja, excessivamente elevados, inflexíveis e ultra-

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passados. Há uma tendência em se adotar 0,5 percevejo/metro, independentemente do destino da produção, principalmente nas sojas tardias. Em relação ao controle antes do aparecimento das vagens, a maioria dos estudos concorda que os percevejos nesta fase não causam reduções no rendimento e na qualidade dos grãos. Sendo assim, medidas de controle não se justificariam. Porém, com frequência são observadas, no final do período vegetativo e início do período de florescimento, áreas com altas densidades de percevejos adultos, provenientes de refúgios ou de cultivos mais adiantados. Neste caso, a manutenção destes insetos, muitas vezes, pode desencadear níveis populacionais difíceis de serem controlados, pois eles deixarão descendentes que em poucos dias estarão nas vagens em formação e consequentemente danificando grãos. Portanto, a decisão de controlar pode ser uma alternativa a se considerar, sendo o diferencial quando se tem, dentro do sistema produtivo, cultivos de soja em diferentes fases de desenvolvimento. É necessário salientar que a planta de soja pode vir a compensar as perdas advindas dos insetos que atacam os grãos. Porém, somente quando os danos ocorrerem ainda no início da formação das vagens, quando são capazes de contrabalançar o dano, aumentando o peso do grão ou retendo mais vagens. Contudo, isso não será possível se houver a presença constante de percevejos ao longo do desenvolvimento da cultura, especialmente entre R5 e R6, pois

Figura 6 – Ciclo biológico do percevejo-marrom Euschistus heros


nestas fases o dano na vagem pode resultar em significativa perda de produção, sem falar na qualidade que pode ser afetada, e, neste último caso, é conhecida somente no momento da comercialização. Acompanhar os cultivos, mesmo nas fases finais de maturação da soja (R7 e R8), é importantíssimo, pois as altas populações provenientes de outras lavouras, ou populações remanescentes, podem ainda prejudicar a qualidade dos grãos, sobretudo se o cultivo é para semente, além do que, possivelmente, estas populações migrarão posteriormente para outras lavouras ou para refúgios, perpetuando o problema desses sugadores na área. Enquanto os impasses na pesquisa não forem resolvidos, o melhor é contar com o bom senso, pois a eficácia de controle dependerá de vários fatores, como localização da lavoura, fases da cultura e do inseto, plantios de soja nas circunvizinhanças, cultivares utilizadas, equipamentos disponíveis para aplicação, horário de aplicação, escolha do inseticida, entre outros. O importante é esclarecer que 33 milhões de hectares de área plantada com soja (safra 2015/16) não podem ser conduzidos sob as mesmas recomendações, pois a agricultura é um processo dinâmico e tende a sofrer grandes ou pequenas variações ao longo do tempo e entre as diferentes regiões de cultivo. Enfim, é necessária uma regionalização do Manejo Integrado de Pragas (MIP) nos sistemas produtivos brasileiros, adotando-se ferramentas sustentáveis sob o ponto de vista socioambiental, com o objetivo de se alcançar safras cada vez mais produtivas por unidade de área, mas com grãos de boa qualidade, já que o mercado de soja se baseia, principalmente, no óleo e no teor

Fotos Cecilia Czepak

Figura 7 - Adulto, ovos e ninfas de Euschistus heros em cultivo de soja, Goiânia/GO. 2017

de proteínas.

MORFOLOGIA E BIOLOGIA Euschistus heros (percevejo-marrom) O percevejo-marrom vive predominantemente nas regiões tropicais e subtropicais, correspondendo às principais áreas produtoras do grão no Brasil. Como o nome comum já sugere, sua coloração é marrom. O adulto apresenta dois prolongamentos laterais pontiagudos no pronoto (os espinhos). As ninfas têm coloração variada, desde o esverdeado ao marrom-escuro. Os ovos, de cor bege, em pequeno

número (cinco a oito por postura), são depositados nas folhas e vagens da planta e quando estão prestes a eclodir, apresentam uma mancha rósea. As ninfas recém-eclodidas apresentam comportamento gregário e não causam danos à cultura. É a partir do terceiro estágio que passam a se dispersar, principalmente entre as vagens do terço médio das plantas, com o intuito de sugar os grãos de soja (Figuras 6 e 7).

Piezodorus guildinii (percevejo verde-pequeno) Percevejo com aproximadamente 1cm de comprimento. Possui coloração verde-clara com uma faixa transversal marrom,


Figura 8 – Ciclo biológico do percevejo verde-pequeno Piezodorus guildinii

a 30 ovos, preferencialmente nas vagens, mas também podem ser encontradas em folhas, caule e ramos. As ninfas logo após

Cecilia Czepak, Universidade Federal de Goiás Jose R. Quirino, Caramuru Alimentos Matheus Le Senechal Nunes, Lucielcio M. Oliveira, Lucas C. G. Sila, Gustavo R. de Jesus, Daniel Miranda, Marcos V. M. dos Anjos, Vinicius S. Magalhaes e Rafael F. Silvério, Universidade Federal de Goiás

Fotos Cecilia Czepak

vermelha ou amarelada sobre o protórax. As posturas, de cor escura, se apresentam em fileiras duplas contendo de dez ovos

eclodirem possuem abdome avermelhado e cabeça e tórax escuros. Nesse período, à semelhança das ninfas do percevejo-marrom, permanecem agrupadas próximas aos ovos. Quando estão mais desenvolvidas, adquirem cor verde com manchas escuras e avermelhadas no tórax e abdome e se dispersam pelas plantas de soja atacando, principalmente, grãos em formação (Figuras 8 e 9). C

Figura 9 - Adulto, ovos e ninfa de quarto instar de Piezodorus guildinii em cultivo de soja, Goiânia/GO. 2017

28 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br



Luis Carregal

Soja

Sem cessar De modo contínuo e agressivo a ferrugem-asiática segue a tirar o sossego da cadeia produtiva da soja. Cenário que reforça a necessidade de rígida obediência ao vazio sanitário, monitoramento e atenção redobrada aos preceitos técnicos de manejo integrado da doença e uso de estratégias focadas em diminuir a pressão de seleção de resistência de modo a preservar e aumentar a longevidade das ferramentas disponíveis para o controle químico

D

esde a safra 2001/02 o fungo causador da ferrugem-asiática causa perdas na produção da soja brasileira. Até a implementação do vazio sanitário as perdas eram enormes e vários agricultores amargavam prejuízos substanciais. Inicialmente as dificuldades estavam relacionadas à identificação da doença a campo, à falta de informações e à incredulidade dos agricultores. À medida que os pesquisadores de diferentes instituições começaram as pesquisas e, principalmente, a divulgar as informações em palestras e dias de campo, o agricultor foi conhecendo melhor o problema. Com a construção desse conhecimento, foi possível minimizar as perdas. Após a implantação do vazio sanitário, os problemas com a doença também foram reduzidos. Boa parte da sociedade rural

passou, então, a menosprezar a importância da ferrugem-asiática. O uso de triazóis isolados, em virtude de alta eficiência, menor preço e presença de genéricos, dominou o mercado de fungicidas em soja. O excesso de aplicações, associado à redução de doses e às aplicações erradicativas, aumentou a pressão de seleção e, na safra 2006/07, verificou-se nos experimentos conduzidos em Rio Verde, Goiás, redução drástica na eficiência dos fungicidas pertencentes a esse grupo químico (Fitopatologia Brasileira, 2008 - Suplemento). Nos resultados obtidos pelo pesquisador Luís Henrique Carregal constatou-se que os produtos que apresentaram maior queda de eficácia nesses experimentos foram flutriafol, tebuconazol e ciproconazol, respectivamente. Nesta mesma safra, o flutriafol também apresentou queda de

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eficácia no Mato Grosso, embora tenha sido atribuída a problemas de formulação. Na safra 2007/08, a mesma falha de controle para tebuconazol e ciproconazol foi verificada no Mato Grosso por outras instituições de pesquisa, como a Agrodinâmica (Valtemir José Carlin) e Fundação MT (Fabiano Siqueri). Daí em diante, o Consórcio Antiferrugem (CAF), coordenado por pesquisadores da Embrapa Soja (Cláudia Godoy), ganhou forças e auxiliou sobremaneira na divulgação de resultados na forma de alertas aos agricultores, por meio do site do CAF (www.consorcioantiferrugem.net). Com a menor eficácia comprovada dos triazóis, os agricultores passaram a utilizar preferencialmente as misturas com estrobilurinas e triazóis para o controle da doença. Além desses fungicidas, algumas


E AGORA, JÁ É A HORA DAS CARBOXAMIDAS?

Algumas áreas comerciais no Mato Grosso do Sul apresentaram alta severidade de ferrugem-asiática na safra 2016/17. Nessas áreas tinham sido realizadas aplicações de fungicidas, até então, altamente eficazes no controle da doença contendo carboxamida + estrobilurina. Os problemas foram também relatados em outros municípios do Mato Grosso do Sul e no Paraná. Entretanto, nem toda falha de controle a campo deve ser precipitadamente encarada como resistência. A eficácia de um fungicida depende do momento de aplicação, dose aplicada, tecnologia de aplicação, número e intervalo entre as aplicações, tipo de fungicida, perda de aplicações por chuva etc. Caso não seja identificado nenhum desses fatores e o controle proporcionado esteja abaixo do esperado, a causa pode ser a resistência do fungo, devendo ser con-

firmada por meio de bioensaios e análises moleculares de mudanças do sítio de ação do fungicida no fungo. A utilização de misturas de dois ingredientes ativos com diferentes modos de ação constitui-se uma estratégia antirresistência. No entanto, para ser efetiva, ambos os componentes da mistura devem ter eficiência, isolados para controle do alvo, o que não ocorre com as misturas atuais contendo carboxamidas. Desta forma, desde o seu lançamento em 2013, esse grupo está sob forte pressão de seleção. A redução de eficácia relatada no Mato Grosso do Sul e Paraná já vem sendo relatada no Paraguai desde 2016. Nos ensaios em rede, redução de eficiência vem sendo observada para as misturas comerciais de carboxamida e estrobilurina desde a primeira safra de teste (2012/13). No dia 8 de março de 2017, O Frac (Fungicide Resistance Action Committee) compartilhou com a sociedade científica resultados parciais do monitoramento de fungicidas realizados no Brasil para esse grupo, relatando que em áreas com histórico de uso intensivo de carboxamidas e em condições de alta pressão de doença foram detectados casos de redução de eficiência desses fungicidas. Também foi detectada já na safra 2015/16 a presença uma mutação na subunidade C na posição I86F no fungo P. pachyrhizi. No entanto, é importante salientar que não houve reclamações na maioria das áreas comerciais dos diferentes estados brasileiros. Nas áreas experimentais da Agro Carregal Pesquisa e Proteção de Plantas, durante a safra 2016/17, não houve alterações de eficácia dos fungicidas

contendo carboxamidas e estrobilurinas. Nos mais diferentes experimentos, fungicidas desse grupo químico permanecem como os mais eficientes. É importante salientar que nesses experimentos houve a redução acentuada de eficiência das misturas tradicionais já comercializadas há mais tempo. Nas áreas experimentais da Agrodinâmica em Deciolândia e Campo Novo do Parecis, observou-se redução drástica na eficiência de carboxamidas + estrobilurinas e também de triazóis + estrobilurinas, inclusive dos produtos mais recentes lançados no mercado. Esta constatação foi apresentada na 8ª Jornada Técnica, onde muitos participantes puderam verificar isso in loco. Estes dados corroboram os de outros pesquisadores em áreas de Mato Grosso e também em áreas comerciais de plantios tardios (principalmente em novembro), os quais apresentaram alta severidade da ferrugem-asiática e drástica redução na produtividade. Desta forma, acredita-se que os isolados mutantes para resistência às carboxamidas não estejam amplamente disseminados, o que confere a possibilidade de adoção de medidas que minimizem o risco. Como os pesquisadores de instituições públicas e privadas não têm acesso às carboxamidas isoladas (não são comercializadas isoladamente), o monitoramento da dispersão de isolados resistentes será realizado pelas companhias detentoras das moléculas ou verificadas a campo nas próximas safras. Há pouca informação até o momento, mas acredita-se que a resistência seja cruzada e que haja diferenças na sensibilidade

Embrapa Soja

empresas passaram a recomendar o uso de estrobilurinas isoladamente em aplicações antecipadas (vegetativo). Desta vez, a pressão de seleção passou a ser sobre as estrobilurinas, uma vez que o outro grupo químico constituinte da mistura já estava com problemas de eficácia (triazóis). Não demorou muito e os problemas de redução de eficácia também foram detectados para as misturas contendo estrobilurinas. Para os pesquisadores da Agro Carregal Pesquisa e Proteção de Plantas, da Agrodinâmica e alguns outros profissionais da região Central, os problemas iniciais foram verificados durante a safra 2011/12, quando os resultados indicavam redução drástica de eficácia das misturas mais utilizadas a campo (piraclostrobina + epoxiconazol e azoxistrobina + ciproconazol). As pesquisas continuaram e, durante a safra 2013/14, comprovaram-se mudanças significativas na sensibilidade in vitro de Phakopsora pachyrhizi às estrobilurinas (Carregal, 2014 – trabalho apresentado junto ao Eagle Team em Campinas, SP; Wegner, 2014 – monografia apresentada junto à UniRV, sob orientação de Luís H. Carregal). Em novembro de 2014 a empresa DuPont relatou junto aos pesquisadores do Expert Team a detecção da mutação F129L em Phakopsora pachyrhizi, que confere menor sensibilidade do fungo a esse grupo de fungicidas (Klosowski et al, 2015). Os resultados dos ensaios cooperativos, apesar de trabalharem com uma média nacional, também apontavam, desde 2011/12, reduções de eficácia no controle dessa doença (Godoy et al, 2012).

Desde a safra 2001/02 a ferrugem asiática tem causado perdas na produção da soja brasileira

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Instituto Phytus

Agricultores: parte dos agricultores, na ânsia de reduzir os custos de produção, normalmente não segue todas as recomendações técnicas, utilizando doses abaixo das recomendadas, aplicando de forma curativa/erradicativa, com baixos volumes de calda sem a adequada tecnologia de aplicação ou, até mesmo, não obedecendo aos intervalos entre as aplicações. Além disso, os órgãos que representamos agricultores precisam tomar suas decisões atendendo aos interesses da coletividade e baseados em aspectos técnicos (amparados por profissionais e entidades habilitadas), quando tratarem de temas como as alterações no vazio sanitário e cultivo da soja safrinha. Soja safrinha na atual conjuntura (com resistência múltipla do fungo causador da ferrugem-asiática e sem resistência genética) é um crime contra os próprios agricultores e a economia do país. Recomendantes: infelizmente a assistência técnica no Brasil é precária, estando muitas vezes nas mãos das revendas de defensivos, cooperativas (que em muitos casos são como as revendas, com a diferença de serem multimarcas) e consultores particulares. Como em qualquer atividade, existem bons e maus profissionais. O mais importante seria que todo e qualquer profissional que difunde a informação ao agricultor, a fizesse de forma séria e transparente, onde o lado comercial não se sobreponha ao técnico. Dentre os principais equívocos recomendados a campo, verificam-se: redução na dose do fungicida (sistêmico ou de contato - multissítios), retirada total ou parcial do adjuvante recomendado (que é essencial para eficácia de estrobilurinas e carboxamidas); troca de adjuvante; mistura de tanque com dois fungicidas, sendo ambos em subdoses etc. Pesquisadores: o papel da pesquisa é primordial para desenvolver soluções a curto, médio e longo prazo, mas, como

do fungo a cada princípio ativo, assim como ocorre para a mutação F129L para as estrobilurinas.

RESISTÊNCIA DE FUNGOS A FUNGICIDAS

Mas, afinal, o que é a resistência de fungos a fungicidas? Como e por que ocorre? A resistência pode ser evitada ou, pelo menos, atrasada? Uma mesma espécie de fungo poderia ficar resistente a diferentes grupos químicos? A resistência de fungos a fungicidas é um fenômeno estável e hereditário, podendo ser verificada a campo pela redução parcial ou total no controle proporcionado por determinado produto ou grupo químico. Essa redução pode ocorrer de forma abrupta de uma hora para outra (resistência qualitativa) ou acontecer de forma constante e gradativa (resistência quantitativa). Os fatores que estão relacionados à resistência dependem das características de cada espécie de fungo (exemplo: variabilidade genética), do fungicida (exemplo: sítio de ação) e da forma como o fungicida é recomendado e utilizado (exemplo: momento de aplicação, dose etc). Mesmo em fungos onde a produção de esporos ocorre de forma assexuada existe variabilidade genética, principalmente por um processo natural e aleatório denominado mutação. A taxa de mutação (número de indivíduos mutantes formados) é de 106, ou seja, a cada um milhão de esporos, um é geneticamente

diferente. Normalmente as mutações são deletérias, ou seja, ruins para os fungos, que acabam morrendo. Entretanto, nas espécies que produzem muitos esporos ou que apresentem maior frequência de mutação (número de indivíduos mutantes que permanecem na população), existe maior probabilidade da ocorrência de resistência. É importante salientar que os fungicidas não induzem a mutação. Trabalham como selecionadores dos indivíduos que naturalmente são resistentes e estão em menor frequência na população. É em virtude disso que produtos com sítio de ação específico (só matam o fungo em um determinado ponto) devem ter recomendação controlada, assim como ocorre na saúde humana com os antibióticos. Quanto mais exposto for o produto, dependendo do sítio de ação, maior será a probabilidade da seleção de indivíduos resistentes. É importante salientar que pode haver variações entre os grupos químicos, sendo diferente o risco para cada um deles e, dentro de um mesmo grupo químico, pode haver diferença na magnitude da resistência entre os produtos. O tempo tem indicado que a forma como os fungicidas são utilizados a campo é o que mais tem interferido nos problemas de resistência. O objetivo não é indicar culpados, mas algumas análises devem ser realizadas de forma imparcial, onde serão considerados: agricultor, recomendantes, pesquisadores e empresas de defensivos.

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Fotos Divulgação

Até a implementação do vazio sanitário as perdas eram enormes e os produtores amargavam grandes prejuízos

Carregal e Carlin alertam para os cuidados necessários no manejo sustentável da doença


As principais estratégias para reduzir a pressão de seleção são: - Obedecer ao período de vazio sanitário e expandir para os estados que ainda não têm essa regulamentação, como Santa Catarina e Rio Grande do Sul; - Estabelecer um calendário de semeadura regionalizado e flexível em virtude das safras (atraso por condições climáticas), mas que seja o mais restrito possível, para todos os estados; - Proibir nacionalmente o cultivo tardio de soja, seja após soja ou outra cultura como feijão (soja safrinha); - Desenvolver um acordo na América do Sul (principalmente Paraguai e Bolívia) sobre o cultivo da soja, para que as normativas de regulamentação de semeadura, vazio sanitário e monitoramento de resistência, sejam adotadas nesses países; - Monitorar a doença na lavoura, informando os laboratórios credenciados para que as primeiras ocorrências sejam regis-

tradas no site do Consórcio Antiferrugem; - Aplicar os fungicidas preventivamente e em intervalos adequados; - Não reduzir ou aumentar doses recomendadas; - Definir as estratégias de controle químico baseadas no calendário de semeadura; - Utilizar fungicidas multissítios em todas as aplicações, independentemente do programa de fungicida sistêmico adotado; - Rotacionar, dentro do possível, os modos de ação e, até mesmo, os princípios ativos, pois há diferenças na sensibilidade dos fungos aos mesmos; - Limitar o número de aplicações de determinados grupos químicos. Os tempos atuais exigem mudanças. E, que estas, ocorram de forma séria e ética. C Estamos preparados? Luís Henrique Carregal, Agro Carregal Pesq. e Prot. Plantas Valtemir José Carlin, Agrodinâmica Pesq. e Consult. Ltda

Carolina Deuner

tudo que ocorre no Brasil, está havendo uma banalização da pesquisa. Profissionais que não têm essa formação ou sequer experiência nessa atividade estão solicitando credenciamento de suas estações de pesquisa por todo Brasil, gerando resultados inconsistentes. Informações seguras e com histórico são imprescindíveis para direcionar o manejo da resistência de forma correta. Empresas de defensivos: embora possuam área técnica capacitada, muitas vezes as decisões dos posicionamentos não são exclusivamente técnicas, no que diz respeito a doses, intervalos de aplicação e, até mesmo, número de aplicações a serem realizadas. O posicionamento meramente comercial prioriza o portfólio da empresa, que muitas vezes não possui opções para um sistema de rotação ideal como estratégia antirresistência. Os programas acabam determinados pelo “marketing” que enfatizam principalmente a lucratividade máxima a ser obtida. Erros recorrentes ocorrem quando as empresas oferecem aos clientes Pacotes (normalmente chamados de Soluções) sem que haja rotação de grupos químicos e quando apenas os pontos fortes dos programas são evidenciados, sem enfatizar as demais estratégias de controle além do controle químico. Vale salientar também que no Brasil existem os que aproveitam a onda. Empresas que possuem adubos foliares, bioestimulantes, indutores de resistência recomendam seus produtos como um modo de ação diferenciado, sem, sequer, terem sido testados ou mesmo estarem registados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para tal finalidade. A introdução de fungicidas protetores no mercado tem “arrastado” uma série de produtos não validados pela pesquisa, e muitos deles podem não apresentar eficiência alguma, bem como piorar a eficiência de alguns produtos. Como gerenciar a resistência múltipla de Phakopsora pachyrhizi a triazóis, estrobilurinas e carboxamidas? As estratégias para gerenciamento de resistência não estão pautadas apenas no uso de fungicidas, mas, principalmente, nos fatores que aumentam a pressão de seleção em todos fungos que incidem na cultura da soja, pois os problemas de resistência não se limitam à ferrugem-asiática. Comprovadamente já existe resistência dos agentes causadores da mancha-alvo aos benzimidazóis e às estrobilurinas, da ferrugem-asiática a triazóis, estrobilurinas e carboxamidas e do crestamento-foliar-de-cercospora às estrobilurinas.

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Nematoides

Batalha interminável Fotos Paulo Santos/ Phytus Club

Nematoides parasitas de plantas, presentes em praticamente todos os solos agricultáveis, são fonte de preocupação crescente entre os produtores. Com número amplo de espécies capazes de provocar reduções na produção em cultivos como soja, milho, algodão e cana-de-açúcar, o manejo destes micro-organismos demanda sucessão adequada de culturas, promoção de condições ideais para o bom desenvolvimento das plantas e integração de ferramentas químicas, biológicas e genéticas existentes no mercado

A

relevância de produzir mais alimentos, com menos recursos, em um sistema agrícola intensivo e altamente produtivo, alocados em cenários tropical e subtropical, contrasta também com as condições extremamente favoráveis para ocorrência e incidência de pragas e doenças. Fatores estes que ocorrem durante qualquer fase do ciclo de desenvolvimento das culturas e que culminam na redução de produtividade. O grupo de micro-organismos que tem adquirido status preocupante nos últimos anos é o de nematoides parasitas de plantas. Praga de solo, organismos biotróficos (dependem única e exclusivamente das plantas para se alimentar e se reproduzir), possuem alto grau de

polifagia (capacidade de parasitar um vasto número de plantas de diferentes famílias botânicas) e está presente praticamente em todos os tipos de solos agricultáveis. Há aproximadamente 20 anos, a problemática envolvendo estes micro-organismos era praticamente restrita a duas espécies de importância econômica, ambas pertencentes ao mesmo gênero, quadro já ultrapassado nos dias atuais. Considerados alguns cultivos, como: cana-de-açúcar, milho, soja, algodão, feijão entre outros, o número de espécies capazes de provocar reduções na produção destas culturas é bastante amplo (Figura 1). Os sintomas nas raízes das plantas infectadas por fitonematoides, de modo geral, podem variar desde engrossamen-

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tos no sistema radicular (conhecidos como galhas), diminuição no volume e crescimento (principalmente em raízes secundárias) e destruição parcial (acompanhada por lesões escuras em vários pontos). Esse complexo de injúrias compromete o funcionamento fisiológico da planta, interferindo diretamente no fluxo de absorção e translocação de água e nutrientes, culminado na redução de produtividade. Na lavoura, os sintomas na parte aérea das plantas ocorrerão em manchas ou reboleiras, formadas por plantas amarelecidas, seguidas de crescimento irregular, e, quando em períodos mais secos, “veranicos”, podem apresentar um quadro de murchamento nas plantas. Porém, não é uma regra para todas


as culturas, pois depende dos fitonematoides envolvidos, da sua densidade populacional presente na área e dos fatores genéticos ligados à suscetibilidade da cultura frente ao parasitismo. A exemplo disso, é possível citar a cana-de-açúcar e o milho, que são mais tolerantes sobre ataques desses parasitos, podendo ou não apresentar tais sintomas. Um método de controle amplamente utilizado é a rotação de culturas, prática que consiste na troca ou substituição de uma determinada cultura hospedeira, por uma resistente ao nematoide. No Brasil, considerando os principais sistemas de cultivo intensivo, a adoção desta importante ferramenta quase sempre não é utilizada, devido a questões ligadas a logística de trabalho, limitação de cultivos, entre outras. Em razão disso, a maioria dos produtores adota o esquema de sucessão de culturas, porém não com o objetivo de controlar nematoides e sim maximizar o uso da terra, podendo proporcionar condições favoráveis para o aumento destes micro-organismos no ambiente. Entretanto, é possível utilizar a sucessão de maneira adequada para reduzir o aumento desta praga no solo. Atualmente, o aumento progressivo deste grupo de parasitos tem sido alertado por muitos pesquisadores e instituições de pesquisa, apontando os inúmeros casos de áreas onde o potencial produtivo já se encontra interligado ao bom convívio com essa praga de solo. Cabe salientar que a erradicação ou a eliminação dessas espécies, quando estabelecidas em áreas de cultivo a níveis de dano, é praticamente impossível, principalmente pela notável capacidade de sobrevivência e competição desses micro-organismos no solo, pela questão dos custos e pelo tempo de operacionalização. Se analisarmos alguns dos fatores associados ao aumento desta praga de solo, levando em consideração o seu

Sintomas em raízes de soja atacadas por fitonematoide

Figura 1 - Principais espécies de cultivo associadas às principais espécies de fitonematoides

ciclo biológico, pelo menos três importantes eventos estão interligados. O primeiro ligado ao cultivo contínuo de culturas suscetíveis ao longo de anos, fator que tem contribuído significativamente para o rápido crescimento populacional dessas espécies no solo, bem como sua preservação. O segundo aspecto relaciona-se ao não cuidado com trânsito de máquinas e implementos agrícolas de áreas infestadas para áreas não infestadas, contribuindo significativamente para sua disseminação. Vale ressaltar aqui que a capacidade de mobilidade deste grupo de micro-organismo no solo é muito baixa, próxima a um metro por ano. O terceiro ponto, não menos importante, é o diagnóstico do problema, quando muitos dos prejuízos causados pelos fitonematoides não são creditados pelos produtores. Seja por falta de conhecimento, confundindo-os com outros eventos - como compactação do solo, encharcamento, deficiência nu-

tricional e a outros patógenos de solo -, ou até mesmo ao descrédito com a praga que, no início, provoca sutis perdas, um quadro extremamente momentâneo, pois as populações evoluem rapidamente no solo de uma safra para outra. Nos últimos anos, o Instituto Phytus tem acompanhado diversas lavouras com sérios problemas de nematoides. Contudo, o que chama a atenção é que na maioria das áreas problemáticas, os cenários que se observam são de solos com baixa fertilidade, níveis baixíssimos de matéria orgânica, solos sem cobertura e, em alguns casos, visivelmente compactados. Ao analisar estes pontos é possível entender o quanto é complexa a tarefa de qualquer profissional na mensuração das perdas, advindas do parasitismo destes micro-organismos. Além destes pontos, fatores climáticos, características intrínsecas de cada espécie, característica genética das culturas ligadas à resposta de defesa frente

Milho em área infestada por Meloidogyne javanica e Pratylenchus brachyurus, não apresentando sintomas na parte aérea e no sistema radicular

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Figura 2 - Esquema simples de coleta de solo e raízes para análise

contado patogênico do nematoide com as raízes, por um determinado período de tempo. Esse processo interfere diretamente na demanda de alimento dessa praga no solo, culminando na morte por inanição (falta de alimento), reduzindo a população no solo. Em áreas onde ocorre a presença de mais de uma espécie parasita, o cuidado deve ser redobrado, pois as opções de rotação e/ ou sucessão acabam ficando limitadas. Uma das saídas é a rotação com plantas antagonistas, que apresentam altíssima eficiência na redução populacional dos nematoides no solo. Estas plantas possuem características, tanto de imunidade ao parasitismo dos fitonematoides, quanto da liberação de substâncias tóxicas que atuam diretamente na mortalidade dos nematoides e contribuem para a rápida redução populacional no solo. Dependendo da cultura e da espécie do fitonematoide, pode atingir valores que variam de 30% a 70%. As principais espécies deste grupo de plantas são Crotalarias, Brachia-

rias, Tagetes, Mucunas, entre outras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escolha adequada da cultura, no esquema de rotação e/ou sucessão, é um ponto-chave no manejo desta praga de solo, porém é preciso olhar a problemática como um todo, pois não existe uma medida única e isolada capaz de resolver o problema. É necessário uma junção de práticas para otimizar o controle. Pode-se dizer que a presença do nematoide associado à baixa produtividade é o ponto principal. Entretanto, os produtores devem promover condições ideias para o bom desenvolvimento da planta. Feito isto, deve-se integrar as ferramentas químicas, biológicas e genétiC cas existentes no mercado. Paulo Santos, Andrezza Lopes e Gracieli Rebelatto, Instituto Phytus Victor Snovarski e Mateus A. Silva, Univ. Federal de Santa Maria

Fotos Paulo Santos/ Phytus Club

ao ataque das diferentes espécies de fitonematoides, bem como densidade populacional destes micro-organismos no solo, podem também determinar o grau de perda na produtividade. Produtores devem ter cuidado com os diferentes esquemas de rotação e/ ou sucessão em áreas infestadas por fitonematoides. É recomendado sempre optar por culturas que não hospedem as espécies-pragas presentes na sua lavoura, caso contrário, serão proporcionadas condições favoráveis para aumento populacional no solo. Para isso, é fundamental realizar a identificação e a quantificação de qual ou quais espécies estão presentes em sua lavoura, para, assim, optar por um esquema (rotação ou sucessão) onde não proporcione tais condições. A coleta para análise pode ser realizada no estádio de florescimento das culturas ou no período de 50 dias - 70 dias após implantação da lavoura. Para uma análise mais consistente, é necessária a coleta de solo e raiz em diferentes pontos da área afetada (cinco pontos por hectare – dez pontos por hectare), retirando ao final uma quantidade de 1-2kg de solo e 50g de raiz (Figura 2). Após isso, providenciar para que a amostra chegue o mais rápido possível a um laboratório para realização da análise e se possível acondicioná-la em uma caixa de isopor, para evitar qualquer alteração brusca na temperatura. O efeito da rotação ou sucessão com plantas não hospedeiras pode reduzir a densidade populacional do nematoide no solo. A troca da cultura principal quase sempre hospedeira favorável, por uma cultura não hospedeira, impede o

C

Fotos aéreas de lavoura comercial de soja infestada por fitonematoides

36 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br


Trigo

Escolha certa

Marlo Adriano Bison Pinto

Decidir de modo correto qual cultivar de trigo plantar é um dos principais pilares para garantir o sucesso da lavoura. O manejo adotado pelo triticultor e as condições edafoclimáticas também impactam os resultados produtivos

D

e acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa/2016), o Brasil dispõe de 244 cultivares de trigo, adaptadas às mais diversas condições edafoclimáticas. No entanto, apenas esta informação torna obscura a decisão do triticultor na hora da escolha. Assim, faz-se necessário a realização de experimentos com amplitude de condições ambientais e com distintas cultivares para identificar o(s) melhor(es) genótipo(s) para cada ambiente. Em virtude do sucesso da produção de trigo ter como um dos principais pilares a escolha correta da cultivar e consequentemente da qualidade de sementes, um experimento foi realizado com diferentes cultivares e alguns de seus componentes de produtividade para a região central do Rio Grande do Sul. Com isso, busca-se auxiliar os produtores durante a seleção que mais se adapta para o próximo

cultivo. O experimento foi realizado no ano agrícola de 2016, na área experimental do Departamento de Fitotecnia do Centro de Ciências Rurais, localizada no campus da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Foram utilizadas 15 cultivares de trigo (Tabela 1), todas semeadas em 16 de junho de 2016. O delineamento experimental foi o de blocos ao acaso com quatro repetições. A semeadura foi realizada com condições ideais de umidade do solo, utilizando uma semeadora-adubadora previamente regulada para distribuir 375 sementes por m², com espaçamento de 0,2m entre sulcos e 460kg/ há de fertilizante da fórmula comercial 0520-20, de acordo com a necessidade prevista pela análise de solo. Na sequência realizou-se a adubação nitrogenada em cobertura, dividida em três parcelas, totalizando 120kg de N/ha. Os demais manejos foram realizados conforme

Informações Técnicas para a Cultura do Trigo e Triticale (Reunião da Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale, 2016). A colheita foi realizada no dia 17 de novembro de 2016, quando foram analisadas as variáveis: produtividade de grãos (PG), massa de hectolitro (MH) e massa de mil grãos (MMG). Apesar da ausência de diferença estatística entre os valores de massa de hectolitro, observa-se que dentre as 15 cultivares avaliadas, apenas quatro (Ametista, BRS 331, BRS Reponte e Esporão) alcançaram valor de MH igual ou superior a 78kg/hl. Isto evidencia o grave problema da ocorrência de elevadas e contínuas precipitações pluviométricas após a maturação fisiológica dos grãos. Contudo, deve-se observar que a variabilidade dos valores de PH é devido a problemas de amostragem, aferimento dos aparelhos, dentre outros condicionantes. A massa de hectolitro caracteriza-se como


Thomas Newton Martin

uma medida indireta do rendimento farináceo por ocasião da moagem. Esse valor representa a porcentagem de reservas em relação às camadas evolventes, juntamente com a organização do amido e proteínas nas células do endosperma. Desta forma, utiliza-se desta medida pela agilidade e simplicidade de determinação, respondendo como uma avaliação indireta da qualidade dos grãos (Mundstock, 1999). No Brasil a comercialização do trigo utiliza 78kg/hl como valor de MH de referência, determinando o preço pago. No entanto, a ocorrência de chuva em momentos próximos ao da colheita reduz a MH em um curto espaço de tempo. Além disso, fatores como as características varietais, grãos malformados e impurezas junto aos grãos são determinantes de um baixo valor de MH. Analisando os valores de produtividade de grãos (Figura 1) observou-se que as cultivares Marcante (92,5sc/ha), Sinuelo (96,4sc/ha), Mestre (95,1sc/ha), Reponte (94,59sc/ha), Supra (96,52sc/ha), Iguaçu (88,47sc/ha e Toruk (94,88sc/ha) apresentaram resultados superiores. Todavia, destaca-se que a produtividade é uma característica quantitativa controlada geneticamente, acarretando em elevada dependência do sistema de manejo

Área didática-experimental do Grupo de Pesquisa em Manejo de Grandes Culturas de Coxilha

adotado e das condições edafoclimáticas durante o cultivo. No que diz respeito aos condicionantes climáticos ressalta-se que no período de 4 de setembro a 4 de outubro não houve precipitação. Esse é o período que o trigo tem o maior crescimento e maior desenvolvimento culminando com a antese. Com isso, houve uma quantidade de radiação solar maior que a média para o período, com uma umidade relativa do ar mais baixa. Fazendo com que os tratamentos fitossanitários tenham maior

TRIGO E CULTIVARES

A

agricultura competitiva é uma das áreas mais dinâmicas dentro do setor produtivo. Mesmo com o início da colheita da safra de verão (milho e soja) em março e abril, o produtor já deve estar atento para as decisões futuras de forma a planejar a safra de inverno 2017. Acertar na escolha da cultivar de trigo pode representar maior lucro para o produtor. No caso do trigo, há produto da safra passada nos armazéns e a comercialização do cereal está lenta e com preços em queda. Este cenário compromete a competitividade de qualquer sistema agrícola a ser estabelecido, exigindo do agricultor orientação na escolha das cultivares mais adequadas para a região e que se adaptem às condições tecnológicas da propriedade. Somado a isso, deve-se considerar que o consumo brasileiro de trigo está estabilizado na faixa de dez milhões de toneladas. A produção brasileira nunca ultrapassou os seis milhões de toneladas. E, em média, a substituição das cultivares de trigo permite a ampliação da produtividade em 44,9kg/ha/ano. Em um país essencialmente agrícola,

a dependência de importação de aproximadamente 50% do volume consumido se torna um problema. Dentre os principais motivos para a pequena produção nacional estão a restrita área de cultivo e a baixa produtividade. Lavouras tritícolas brasileiras apresentaram na safra 2015 produtividade média de 2.206kg/ha (Conab, 2016), valor significativamente inferior à média de lavouras europeias na mesma safra, 5.170kg/ha (Mars, 2016). Estes valores evidenciam a baixa eficiência da triticultura no Brasil. Práticas de manejo como a semeadura no período indicado pelo zoneamento agrícola, construção da fertilidade do solo e semeadura com qualidade proporcionam incremento na eficiência e na competitividade da triticultura brasileira. Todavia, para que se alcance o sucesso nos manejos, é de extrema importância a escolha correta da cultivar de exploração. A seleção da cultivar que melhor se encaixa dentro das peculariedades edafoclimáticas da região está entre os fatores primordiais para alcançar altas produtividades.

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eficiência principalmente para a doença de mais difícil controle que é a giberela. Quanto à variável massa de mil grãos, pode-se observar (Figura 2) que as cultivares Reponte (42,25g) e Esporão (40,08g) sobressaíram-se. A variável MMG tem elevada importância para a indústria, que a utiliza para fins de classificação dos grãos formando lotes com o propósito de reduzir as perdas durante o beneficiamento (Costa et al, 2008). Assim, enfatiza-se a importância da manutenção da sanidade da planta desde o início até o final de seu ciclo. A MMG é fortemente influenciada pela atividade fotossintética e aporte de nitrogênio durante a fase de acúmulo e translocação de nutrientes e fotoassimilados. Condições ótimas para a máxima expressão da cultivar são obtidas a partir de um ambiente propício, conjuntamente a um excelente manejo cultural e fitossanitário. Para isso, é de extrema importância a escolha correta da cultivar de exploração. A partir dos dados apresentados, infere-se que a cultivar Reponte é a mais apta ao cultivo na região central do Rio Grande do Tabela 1 - Cultivar, obtentor, ciclo e classe das cultivares testadas. Safra 2016, Santa Maria (RS) Nº 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15

OBTENTOR CULTIVAR CICLO Biotrigo TBioSinuelo Tardio Biotrigo TBioToruk Médio Biotrigo TBio Sintonia Precoce Biotrigo TBio Sossego Medio Biotrigo TBio Iguaçu Médio Biotrigo Tbio Mestre Médio LG Supra Limagrain do Brasil Médio LG Cromo Limagrain do Brasil Precoce LG Oro Limagrain do Brasil Tardio BRS Parrudo Embrapa Trigo Precoce Embrapa Trigo Superprecoce BRS 331 BRS Reponte Embrapa Trigo Precoce BRS Marcante Embrapa Trigo Precoce OR Sementes Ametista Precoce Coodetec Esporão Precoce

CLASSE Pão Melhorador Melhorador Pão Pão Melhorador Pão Pão Melhorador Melhorador Pão Pão Pão Pão Pão


Figura 1 - Produtividade de grãos e massa de hectolitro de cultivares de trigo indicadas para o Estado do Rio Grande do Sul pelo Zoneamento Agrícola do MAPA - Região I (Júlio de Castilhos, Passo Fundo, São Gabriel e Vacaria), conduzidas na safra 2016/2016. Santa Maria, RS, dezembro de 2016

Figura 2 - Massa de mil grãos de cultivares de trigo indicadas para o Estado do Rio Grande do Sul pelo Zoneamento Agrícola do MAPA - Região I (Júlio de Castilhos, Passo Fundo, São Gabriel e Vacaria), conduzidas na safra 2016/2016. Santa Maria, RS

Média geral produtividade de grãos 5195,27 kg ha-1, CV: 8,85%. Média MH: 76,83, CV: 2,97%.

Média MMG: 37,1 g, CV: 6,44%

Sul. Esta cultivar apresenta produtividade de grãos próxima à obtida por lavouras europeias, elevada massa de mil grãos e massa de hectolitro satisfatória, especialmente sob as adversidades edafoclimáticas que antecederam o momento da colheita. Todavia, é preciso levar em conta o forte controle

genético que é importante à produtividade, altamente dependente do manejo praticado pelo triticultor e das condições edafoclimáticas durante o cultivo. Dessa forma, além da escolha da cultivar que possuiu melhores produtividades no ano anterior, deve-se levar em consideração os

fatores de manejo e o ambiente, adequando esses elementos para que se possa ter produC tividades adequadas no sistema. Marlo Adriano Bison Pinto, Thomas Newton Martin e Gustavo Posser, UFSM

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Cana

Qualidade do solo O teor de matéria orgânica (MOS) tem grande importância em áreas de cultivo da cana-deaçúcar. A colheita mecanizada pode ser benéfica neste sentido, pois permite o aporte e a manutenção da palha residual e também oportuniza aumentar os estoques de carbono no solo

Sandro Brancalião

O

s solos agrícolas apresentam uma amplitude de densidade de 0,9g cm-3 até 1,8g cm-3, influenciada por fatores pedogenéticos e uso de manejo. Essas diferenças de densidade e amplitude dificultam a comparação entre solos. A densidade relativa (Dsrel) tem sido utilizada para caracterizar o estado de compactação, sendo menos influenciada por alguns atributos, como tipo de minerais, granulometria e teor de Matéria Orgânica do Solo (MOS). Consiste na divisão da densidade do solo atual pela densidade máxima do solo obtida pelo teste de Proctor. Assim, a utilização da Dsrel é uma forma de evitar essas diferenças entre os solos, permitindo compará-los quantitativamente. Assim, solos com valores de densidade relativa próximos a 1 (ou 100%) apresentam-se em estado de maior compactação. As densidades relativas acima de 0,9 (ou 90%) revelam uma condição extremamente preocupante, pois, havendo qualquer adversidade climática (falta ou excesso de água), o desenvolvimento das plantas será seriamente afetado.

A degradação física é um dos componentes do processo de degradação do solo, geralmente associado às perdas de matéria orgânica e da integridade estrutural dos solos. O C Orgânico do Solo (COS) não é propriamente uma propriedade física do solo, mas influencia direta e indiretamente a maioria delas, de modo que a redução do COS está relacionada com a degradação física dos solos. A vulnerabilidade do solo à compactação pode ser modificada pelos sistemas de uso e manejo do solo via modificações nos teores de COS e, por consequência, na capacidade de suporte de carga dos solos. Estudos recentes indicam que o aumento no teor de COS amplia a capacidade de suporte de carga dos solos, bem como a resiliência do solo às cargas aplicadas. Para os sistemas de ocupação do solo, o cultivo de cana-de-açúcar foi o que apresentou o menor teor de COS (Figura 1), o maior valor de densidade do solo (Ds) (Figura 2) e de Ds máxima (Figura 3) (Dsmax = 2,03mg m-3, obtido pela curva de compactação) e o menor teor de água crítico (Figura 3b) (TAC). Os maiores teores de argila e matéria orgânica do solo provocam redução na amplitude das

40 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br

curvas de compactação, diminuindo, consequentemente, a Dsmax e aumentando o teor de água crítica (TAC). A correlação negativa entre a Dsmax e as concentrações de COS nas diferentes áreas estudadas (Figura 3a) sugere que o aumento do COS é o principal responsável pelo decréscimo da Dsmax. O mecanismo mais importante para a redução da Dsmax com o aumento da concentração do COS deve-se à sua baixa densidade, elevada área superficial específica, propriedades elásticas e alta capacidade de adsorção de água pela matéria orgânica do solo. Em condições de clima tropical e em solos com baixos teores de argila, os desafios para o incremento da MOS são maiores, já que as temperaturas médias elevadas e a umidade aumentam a atividade microbiana, elevando as taxas de decomposição. Essa dificuldade em aumentar os teores de MOS é ainda maior em solos com baixos teores de argila, onde é limitada a formação de agregados, reduzindo a interação entre a fração orgânica e a mineral do solo, deixando a MO exposta e vulnerável à degradação, o que demanda um elevado e constante aporte de matéria seca (MS) e carbono (C) ao solo. Em regiões tropicais e



Figura 1 - Teores de carbono orgânico do solo (COS) e estoques de carbono (EC) de um Latossolo Vermelho sob mata nativa e em áreas cultivadas com pastagem, mandioca e cana-de-açúcar, na camada de 0m a 0,10m. As barras indicam o intervalo de confiança (95%). As médias são estatisticamente diferentes quando não ocorre sobreposição das barras

Figura 4 - Valores médios de matéria orgânica, porcentagem de agregados maiores que 2mm e diâmetro médio geométrico (DMG), de duas áreas de cultivo de cana (com colheita mecanizada de cana crua e com colheita manual de cana queimada), comparando ainda com uma área de mata nativa, em um Latossolo Vermelho eutroférrico). Médias seguidas pela mesma letra para a mesma variável, não diferem pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade

C

Figura 2 - Curva de compactação de um Latossolo Vermelho sob mata nativa e em áreas cultivadas com pastagem, mandioca e cana-de-açúcar, na camada de 0m a 0,10m

Figura 3 - Correlação entre a densidade do solo máxima (Dsmax) e os teores de carbono orgânico do solo (COS) (a); correlação entre os teores de água crítico (TAC) e os teores de COS nas áreas estudadas (b)

42 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br


Divulgação

Fotos Sandro Brancalião

IACSP95-5000, segundo corte, boa quantidade de palha no sistema. Usina da região de Ribeirão Preto

subtropicais as perdas de COT chegam a 50% nos primeiros anos de cultivo. Nesse sentido, apesar dos sistemas de cultivo de cana-de-açúcar acelerarem o processo de decomposição da MOS pela mobilização intensa do solo, principalmente na reforma dos canaviais, a colheita mecanizada permite o aporte e a manutenção da palha residual na área, configurando uma excelente oportunidade de aumentar os estoques de C no solo. Na camada superficial do solo (0cm-20cm) que o teor de carbono variou de 13,13g kg-1, na cana queimada a 22,34g kg-1, na cana crua, indicando a melhoria nos atributos químicos do solo com a colheita da cana crua. Essa MOS será importante em solos arenosos, ditos mais frágeis, pois além de aumentar a fertilidade, irá incrementar a retenção e o armazenamento de água no solo, melhorando agregação, o que propicia boa infiltração de água, menor escorrimento de sedimento e consequentemente baixa taxa de erosão. Estudos mostram que a MO (húmus) pode reter mais de cinco vezes o seu peso em água, devido à sua elevada microporosidade

e superfície específica, podendo ser determinante nos períodos de escassez de chuva em momentos de elevada demanda por água. Para os solos de textura mais argilosa, a matéria orgânica terá função importante na formação de macroagregados, equilibrando a relação entre macro e microporos. Os solos argilosos têm como característica o elevado volume de microporos em relação ao volume de macroporos, proporcionando baixa aeração e infiltração de água. Além disso, as partículas de argila, por possuírem tamanho reduzido, acabam ocupando o espaço poroso, ou seja, aumentando a compactação do solo e restringindo o crescimento radicular em profundidade. Além disso, o pequeno tamanho e o baixo peso das partículas de argila quando se apresentam na forma individualizada em solos desestruturados, aumentam a probabilidade de ocorrência de perdas de solo por erosão, seja pela ação da água das chuvas e/ ou pelo vento. Desta forma, a MO assume importante papel por constituir relação direta com o aumento do tamanho e estabilidade dos agregados, reduzindo a perda de solo por erosão, além de melhorar a relação entre

Sistemas de cultivo de cana-de-açúcar demandam mobilização intensa do solo

Brancalião analisa atributos que interferem na qualidade do solo em cana-de-açúcar

macro e microporos. Por outro lado, também pode ser uma grande oportunidade de aumentar os teores de MOS (Figura 4), tendo em vista o sistema de colheita mecanizada de cana crua, incrementando, sobremaneira, e se sobressaindo em relação à cana queimada, obstante a comparação com a mata. Em sistemas com pouco revolvimento do solo e tráfego de máquinas pesadas ocorre compactação do solo até 0,4m. Para o sistema de colheita mecanizada (cana crua) observaram maiores valores de C densidade do solo até 0,1m. Sandro Roberto Brancalião, Marcos Guimarães de A. Landell e Márcio Aurélio Pitta Bidóia, Centro de Cana do Inst. Agronômico Juliano Carlos Calonego, FCA/Unesp/Botucatu Antonio Lúcio Mello Martins, Polo Reg. do Centro Norte/DDD/APT

O teor de materia orgânica é fator de grande importância nos canaviais

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Feijão

Cultivar

Disseminação barrada

Doença agressiva em feijoeiro, favorecida por temperaturas maiores que 20ºC e por solos arenosos, ácidos, compactados e com pouca drenagem, a murcha de fusário tem nas sementes infectadas um potente canal disseminador. Para prevenir prejuízos o tratamento de sementes com fungicidas ou agentes biológicos é um importante aliado do produtor

O

intenso cultivo do feijoeiro em várias épocas do ano, juntamente com o uso da irrigação via pivô central, expõe as lavouras a uma série de fatores limitantes, incluindo, por exemplo, as doenças causadas por patógenos do solo. Destaca-se a murcha ou amarelecimento de fusário, causada pelo fungo Fusarium oxysporum Schlecht. f. sp. phaseoli Kendrick & Snyder (Fop). No Brasil, a doença ocorre em todo o território e pode levar a perdas em torno de 30% nas produções brasileiras do grão. O complexo Fusarium oxysporum é o agente causal de doenças vasculares em muitas espécies de plantas, sendo que os isolados que são patogênicos ao mesmo hospedeiro, ou que possuem a mesma amplitude de hospedeiros, são designados formae speciales; sabe-se que mais de 70 já foram descritas. Quando há um alto nível de especialização, formae speciales podem ser associadas à patogenicidade em apenas uma espécie hospedeira. Muitas formae speciales podem ser subdivididas em raças, tendo-se como base

a sua virulência em diferentes cultivares de um hospedeiro. As raças que causam a murcha ou amarelecimento especificamente na cultura do feijoeiro, recebem a taxonomia de Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli (Fop). Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli pertence ao filo Ascomycota, ordem Hypocreales, família Nectriaceae. O fungo produz três tipos de esporos assexuados, denominados de macroconídios, microconídios e clamidósporos. A sobrevivência do fungo ocorre, principalmente, no solo, onde vive saprofiticamente em restos de cultura e na matéria orgânica. Em longo prazo, o fungo sobrevive na forma de clamidósporos na ausência do seu hospedeiro. Além disso, outras espécies podem se comportar como hospedeiras alternativas de Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli, incluindo Dolichos lablab L. (lablab), Phaseolus lunatus L. (feijão-de-lima), Mucuna aterrima (mucuna preta), Canavalia ensiformes (L.) (feijão de porco), Crotalaria spectabilis (crotalária), Cajanus cajan (guandu). A disseminação do fungo de um cam-

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po para outro ocorre principalmente por sementes infectadas, ou como esporo aderido à sua superfície. Este processo é ainda facilitado pelo vento e água de irrigação, que carregam conídios e solos infestados a partir de plantas mortas pelo patógeno e por implementos agrícolas contaminados. O patógeno é capaz de penetrar nos tecidos radiculares do hospedeiro, como também no hipocótilo e em tecidos radiculares mais velhos, geralmente por ferimentos ou aberturas naturais. A infecção pode ocorrer em qualquer fase do ciclo da cultura, sob temperatura ótima de 28°C. A safra das "secas" é considerada o período crítico de infecção do patógeno, principalmente quando a planta se encontra nos estádios entre V4 (terceira folha trifoliada) e R6 (florescimento). Os nematoides Meloidogyne incognita, Meloidogyne javanica e Pratylenchus spp. são responsáveis pelos ferimentos e aberturas que podem favorecer a entrada do patógeno pelo sistema radicular do feijoeiro. Após a penetração, a hifa do fungo é capaz de colonizar a planta, atingindo o seu sistema vascular. O fungo permanece


Loiola (2014)

Campos e Faganello (2015)

num (Agrofit, 2015).

Sintomas de amarelecimento e murcha causados pelo fungo F. oxysporum f. sp. phaseoli (Fop)

confinado nos vasos do xilema até a doença atingir estádios mais avançados de desenvolvimento, causando os sintomas de murcha nas plantas. Por fim, o patógeno move-se para outros tecidos e começa o processo de esporulação na superfície da planta morta. A severidade da doença é maior a 20°C e, em condições de campo, o desenvolvimento do patógeno é favorecido em temperaturas entre 26ºC e 28°C. Solos arenosos, ácidos, sob condições de estresse hídrico, compactados e com pouca drenagem também podem agravar a severidade da doença.

MANEJO DA MURCHA DE FUSÁRIO

Para o controle da doença é importante impedir a introdução do patógeno em áreas indenes, pois uma vez detectada a presença no campo, a erradicação do inóculo torna-se muito difícil através de práticas culturais e pelo controle químico. Atualmente, a doença tem sido um problema, pois a sua ocorrência está relacionada com a introdução em novas áreas de cultivo de feijoeiro, em decorrência da utilização de grãos portadores de F. oxysporum e pelo cultivo intenso de feijoeiro nas mesmas áreas infectadas com o patógeno. Estas circunstâncias obrigam, de certa forma, os produtores a conviver com a doença no campo. Embora o uso de cultivares resistentes seja a opção mais eficiente para controlar a doença, muitos produtores ainda optam por utilizar cultivares suscetíveis, devido às características agronômicas desejáveis e pela preferência do mercado consumidor. Entre as cultivares mais utilizadas no país, cerca de 70% correspondem às do grupo Carioca. Desse modo, a análise da qualidade sanitária das sementes, em conjunto com o tratamento, consiste em medidas preventivas fundamentais para o manejo da doença. Considerando-se o manejo integrado de doenças, o tratamento de sementes constitui um método eficaz na sua prevenção, seja por meio de fungicidas ou do uso de agentes biológicos. Esta prática tem como objetivos não somente erradicar ou reduzir o

IMPORTÂNCIA DA SEMENTE

Colonização de Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli em plantas de feijoeiro

inoculo transportado pelas sementes, como também proporcionar uma proteção parcial às sementes contra patógenos ou, então, presentes no solo. Dentre os benefícios oferecidos pelo tratamento de sementes, destacam-se o baixo custo e a garantia do estabelecimento das culturas, pois oferece proteção contra fungos de solo durante os períodos de pré e pós-emergência das plantas. Para a cultura do feijoeiro, o tratamento químico de sementes é uma medida muito utilizada pelos agricultores para o manejo de diversos fungos. Além de atuarem como protetores, os fungicidas aplicados nas sementes impedem, principalmente, a penetração dos fungos infectantes de raízes e os aderidos à semente na superfície, evitando, assim, a colonização dos órgãos aéreos ou radiculares. Atualmente, para o controle de Fop, o Sistema Agrofit, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), apresenta o fungicida captana e os fungicidas-inseticidas metalaxil-M, fludioxonil, tiabendazol e tiametoxam. Com relação aos produtos biológicos, existem apenas dois produtos à base de Trichoderma spp., registrados para a cultura do feijoeiro, recomendados para o controle de Fusarium solani e Rhizoctonia solani, representados pelas espécies de T. asperellum e T. harzia-

Especialmente para a cultura do feijoeiro é muito comum os produtores utilizarem como semente o material oriundo de áreas destinadas para grãos. Na safra de 2013/2014, o uso de sementes certificadas no Brasil foi de, aproximadamente, 20%, representando um valor muito inferior quando comparado com outras culturas (Anuário Abrasem, 2014). A qualidade dessas sementes "salvas" se caracteriza, de maneira geral, por apresentar baixa pureza, alto grau de umidade, baixa germinação e vigor, infestação por insetos e, principalmente, pela presença de patógenos associados. Dentre as doenças de importância econômica para a cultura do feijoeiro, cerca de 50% são disseminadas pelas sementes e são responsáveis por perdas significativas na produção. Os fungos que representam este quadro são Alternaria spp., Colletotrichum lindemuthianum, Pseudocercospora griseola, Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli, Fusarium solani f. sp. phaseoli, Macrophomina phaseolina, Rhizoctonia solani, Sclerotinia sclerotiorum, Sclerotium rolfsii e outros. No caso da murcha de fusário, a semente de feijão é a principal fonte de inóculo e ainda pode veicular o patógeno externamente, na forma de esporos aderidos à superfície do tegumento, ou internamente, como micélio dormente. Já foi constatado que as estruturas do patógeno presentes nas sementes permaneceram viáveis durante o período de armazenamento superior a oito meses e podem constituir o inóculo primário para o desenvolvimento de epidemias na cultura do feijoeiro. Desse modo, trabalhos que envolvem o efeito da transmissão deste patógeno via sementes de feijão são relevantes, pois levam a compreender como a doença pode afetar fatores primordiais para uma boa

Sintomas de amarelecimento e murcha em plantas de feijão, aos 25 dias após a semeadura, oriunda de sementes inoculadas artificialmente, após 48 horas de contato com o isolado IAC 11.299-1 de F. oxysporum f. sp. phaseoli

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Tabela 1 - Germinação (%) das sementes de feijão submetidas a diferentes períodos de contato com Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli, sob condição de laboratório Isolados Testemunha Fus-AV Fus-CB IAC 11.299-1 Média C.V.(%)

Períodos de contato (horas) 96 48 144 96 aA 96 aA 96 aA 50 aB 78 aA(1) 43 aB 37 bB 70 aA 46 aB 57 aB 80 aA 44 aC 48 B 76 A 44 B 18,01

Média 96 a 57 a 51 b 60 a

Tabela 2 - Valores do índice de velocidade de emergência (IVE) de sementes de feijão inoculadas com Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli, em função de diferentes períodos de contato com o patógeno Períodos de contato (horas) 96 48 144 Testemunha 3,41 bA 3,41 bA 3,41 bA Fus-AV 3,72 bA(1) 2,89 aB 2,06 aC Fus-CB 4,04 aA 2,37 bB 1,80 aC IAC 11.299-1 3,47 bA 2,57 bB 2,19 aC 2,61 B Média 3,74 A 2,02 C 9,07 C.V. (%) Isolados

Tabela 3 - Porcentagem de emergência de sementes de feijão, aos 12 dias após a semeadura, inoculadas com Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli, em função de diferentes períodos de contato com o patógeno

Média

Isolados

3,41 b 2,89 a 2,74 a 2,75 a

Testemunha Fus-AV Fus-CB IAC 11.299-1 Média C.V. (%)

Períodos de contato (horas) 96 48 144 96 aA 96 aA 96 aA 92 aA(1) 70 aB 53 aC 59 bB 94 aA 46 bC 63 bB 84 bA 56 aB 72 B 92 A 62 C 7,38

Média 96 a 72 a 66 b 68 b

(1)Médias seguidas pela mesma letra minúscula em cada coluna e mesma letra maiúscula em uma linha não diferem estatisticamente pelo teste de Scott-Knott, ao nível de 5% de probabilidade.

(1)Médias seguidas pela mesma letra minúscula em cada coluna e mesma letra maiúscula em uma linha não diferem estatisticamente pelo teste de Scott-Knott, ao nível de 5% de probabilidade.

(1)Médias seguidas pela mesma letra minúscula em cada coluna e mesma letra maiúscula em uma linha não diferem estatisticamente pelo teste de Scott-Knott, ao nível de 5% de probabilidade.

produtividade, como a germinação e o vigor das sementes.

Os tratamentos testemunhas consistiram em sementes sem o patógeno. O efeito dos diferentes períodos de contato das sementes com Fop foi avaliado através dos testes de sanidade, germinação e índice de velocidade de emergência das plântulas. De acordo com a análise sanitária, verificou-se que o método de inoculação foi muito eficiente, pois se constatou 100% de incidência do patógeno nas sementes, independentemente dos tempos de contato. Na Tabela 1 observa-se que houve uma redução significativa da germinação das sementes após 96 horas de contato com o patógeno, independentemente do isolado. O contato das sementes durante 144 horas levou a uma redução de 40% a 50% da germinação. Os índices de velocidade de emergência (Tabela 2) e porcentagens de emergência (Tabela 3) corroboram os resultados obti-

dos no teste de germinação, confirmando a redução do vigor à medida que houve o aumento do tempo de exposição das sementes com o patógeno, independentemente de isolado. Para o menor período de contato, foram observadas plantas de feijoeiro com sintomas típicos da murcha-de-fusário, caracterizadas pela necrose do colo da planta e amarelecimento das folhas. Já nos tratamentos onde o tempo de inoculação foi de 96 horas e 144 horas, não foram identificados tais sintomas. Com base nesse fato e na porcentagem de emergência das sementes (Tabela 3), pode-se inferir que o período de 48 horas permitiu o desenvolvimento das plantas e, posteriormente, a reprodução dos sintomas, e, em contrapartida, os períodos de 96 horas e 144 horas foram determinantes na morte das sementes. C

O ESTUDO

Fotos Divulgação

Um estudo realizado no Laboratório de Patologia de Sementes, situado no Departamento de Fitopatologia e Nematologia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Piracicaba/SP) objetivou verificar o efeito da inoculação do fungo Fusarium oxysporum f. sp. phaseoli (Fop) nas sementes de feijão em condições de laboratório e de casa de vegetação. Foram utilizados três isolados de Fop, cultivados em placas de Petri com meio de cultura BDA. Sementes de feijão cultivar IAC Alvorada foram colocadas sobre as colônias do patógeno, permanecendo em contato por 48, 96 e 144 horas sob fotoperíodo alternado de 12 horas de luz e temperatura de 20ºC ± 2°C.

Mariane Sayuri Ishizuka e José Otávio M. Menten, Esalq/USP

O FEIJÃO

O

Mariane e Menten abordam o tratamento de sementes contra doenças como murcha de fusário em feijão

46 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br

feijoeiro-comum, Phaseolus vulgaris L., é uma espécie vegetal cujos grãos compõem uma importante fonte proteica na alimentação dos brasileiros. Atualmente, o Brasil posiciona-se como o terceiro maior produtor mundial de feijão, com uma produção anual aproximada de três milhões de toneladas, sendo superada pelo Mianmar e pela Índia. Na safra de 2015/2016, a produção nacional atingiu 3,18 milhões de toneladas, concentrando-se, principalmente, nos estados do Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso, Goiás e São Paulo (Conab, 2016).



COLUNA MERCADO AGRÍCOLA

Safra recorde exige mais atenção do produtor em 2017 Os produtores percebem que os investimentos realizados na safra deste ano estão dando bons resultados, com colheita plena de milho, soja, arroz, feijão... O resultado é a maior safra da história do Brasil, com estimativa de 110 milhões de toneladas para a soja, outros 90 milhões de toneladas para o milho (30 milhões de toneladas da primeira safra e 60 milhões de toneladas da safrinha). O arroz caminha para a casa de 12 milhões de toneladas, com colheita cheia no Rio Grande do Sul, estado que pode fechar os números na faixa de 8,5 milhões de toneladas e sozinho representar mais de 70% da safra brasileira do grão. O feijão, depois de frustração da safra de 2016, vem com boas cotações aos produtores e safra superando três milhões de toneladas. A safra de trigo ainda segue indefinida, porque os produtores tiveram dificuldade na comercialização no último ano e mesmo com boa produtividade e qualidade do grão houve baixa liquidez. Este fato pode ser decisivo para que os produtores plantem uma área menor com o cereal. Mas há indicativos de que pelo menos cinco milhões de toneladas da safra sejam colhidos. Desta forma, somando estes principais grãos, o Brasil vai ter mais de 220 milhões de toneladas colhidas e a maior parte deste volume já está garantida, com riscos pequenos de perdas. Os produtores estão enchendo os silos e observam que a oferta de armazéns é muito menor do que deveria, forçando muitos a vender na colheita com cotações baixas. Os piores momentos do mercado devem ser registrados a partir do final de abril. O fato importante é que o Brasil está evoluindo forte na produtividade e isso serve para derrubar os custos de produção. Para ganhar, o país precisa manter esta linha de continuar avançando em altas produtividades com custos unitários menores. Existe uma grande safra para ser comercializada neste ano, o que vai obrigar os produtores a acompanharem o mercado bem de perto, porque os negócios vão ser lentos e longos. ser negociado mais ou menos 50 milhões de toneladas, que serão vendidas de maneira pontual nos próximos meses. Se o clima O milho da primeira safra está na reta final de colheita, se nos EUA trouxer problemas a partir de maio, pode agitar um aproximando da casa de 30 milhões de toneladas, frente a 22 pouco a Bolsa de Chicago e resultar em níveis mais atrativos ao milhões de toneladas colhidas no ano passado. Com isso há mais mercado brasileiro. oferta e mais pressão de baixa nos indicativos, cenário que ocorre FEIJÃO desde o começo do ano e, aparentemente, já alcançou o fundo Colheita avançou e mercado firme do poço. Aos poucos a tendência é de alguma correção positiva, O mercado do feijão teve uma boa primeira safra, com bom principalmente depois de fechada a colheita e de cessar a entrega direta de milho pelos produtores aos consumidores. O quadro é volume colhido, mas grande parte do produto já negociado. de calmaria porque há uma boa safra e pouco volume negociado Desta forma, neste segundo trimestre do ano, se observa alta na exportação. Isso deve seguir dando tranquilidade aos consu- nos indicativos, porque a demanda segue aquecida. O escândalo midores. Para os produtores o ideal é acompanhar os níveis na gerado em torno da carne brasileira tende a aumentar o consumo exportação, que se melhorados podem ser uma alternativa para de produtos básicos como arroz e feijão. Neste momento está criar mais liquidez. As cotações externas estão na faixa de 9,50 sendo plantada a segunda safra (em algumas regiões já em fase dólares a 10,00 dólares a saca nos portos. São bons níveis, porém de desenvolvimento), com números menores de área devido o problema para os negócios continua sendo o dólar barato no aos problemas sanitários, principalmente relacionados à mosca Brasil. Desta forma haverá comercialização lenta no ano, obrigando branca, o que limita o potencial de colheita. Seguem boas as o produtor a acompanhar de perto o mercado e a não perder as expectativas para o setor. oportunidades que surgirem. ARROZ Safra cheia e mercado calmo SOJA A safra de arroz no Rio Grande do Sul está na reta final da Produtor entregando contratos e fechando a colheita O mercado da soja no Brasil mostra os produtores entregando colheita e mostra bom volume. Com isso as cotações recuaram os contratos que fecharam no ano passado (algo em torno de 40%) abaixo de R$ 40,00 a saca no estado gaúcho e os produtores com níveis acima de R$ 90,00 a saca nos portos, liquidando na buscam segurar o produto para negociar no futuro. A saída tem faixa de R$ 75,00 a R$ 85,00 a saca no interior. Enquanto isso o sido buscar Empréstimo do Governo Federal (EGF) ou outros grão disponível tem remunerado R$ 20,00 abaixo. Os negócios, recursos para segurar o grão, porque a oferta e a demanda deste até o momento, levaram pouco mais de 55% da safra que está ano seguirão apertadas. Não há grandes sobras, porque há creschegando (estimada em 110 milhões de toneladas), restando para cimento de demanda e o mercado tende a se recuperar. MILHO

Safra na reta final da colheita

CURTAS E BOAS TRIGO - O mercado do trigo está atento à nova safra, que dá sinais de queda de área e produção no Brasil. Tende a ser um ano melhor para o setor. UCRÂNIA - O plantio da safra de milho do país está fluindo e o clima tem sido irregular. Ainda não há definição da nova safra, que pode vir com 25 milhões de toneladas a 30 milhões de toneladas, frente aos 28 milhões de toneladas colhidas no último ano.

CHINA - As importações seguem fortes e o país vai bater 90 milhões de toneladas de soja compradas neste ano. ARGENTINA - A safra está em boas condições e o clima melhorou. A colheita apresenta bons números, com indicativos de 55 milhões de toneladas em soja e 37 milhões de toneladas em milho. EUA - O país está a poucos dias do plantio e tudo indica que C vai aumentar o cultivo de soja e diminuir o de milho. Vlamir Brandalizze

brandalizze@uol.com.br • Twitter@brandalizzecons • brandalizzeconsulting.com.br

48 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br


COLUNA AGRONEGÓCIOS

Inovação tecnológica, a única porta para o futuro

F

ilósofos contemporâneos apontam que um dos maiores triunfos do progresso humano reside no fato que, atualmente, a maioria das pessoas não mais trabalha na terra. Nada contra a agricultura, afinal é louvável o crescimento da produtividade agrícola, que permite alimentar cada vez mais gente nas cidades, com cada vez menos trabalhadores no campo. O ponto central é o fato de permitir que cada cidadão busque o que considera melhor para a sua vida. Em 1900, aproximadamente 41% da força de trabalho dos EUA se encontrava na área rural. Agora, a proporção é inferior a 2%. No Brasil de 2017, cerca de 80% dos habitantes vivem nas cidades. O efeito é menos marcado em países pobres, mas a direção é a mesma. A participação dos citadinos na população total do mundo chegou a 50% em 2010 e ainda está subindo implacavelmente, mas a proporção cada vez menor de pessoas que vivem na zona rural tem se mostrado capaz de alimentar a maioria urbana. O processo vai continuar pelas próximas décadas, com duas consequências visíveis: aumentar a produtividade dos trabalhadores que ficam no campo e encolher a proporção de pequenas propriedades no seio do agronegócio. As razões do esvaziamento da área rural são muito bem conhecidas. Os jovens são atraídos para a área urbana pela menor penosidade do trabalho, pelas oportunidades de carreira, pela oferta de lazer e cultura, pelas facilidades de moradia, comunicação, transporte, saúde e educação e, último, porém não menos importante, os elevados riscos a que está sujeita a atividade rural. Sobram no campo os antigos proprietários, portanto, a cada ano que passa, aumenta a média de idade do pequeno produtor rural. Quando ele não mais consegue antepor-se aos desafios da atividade agrícola, restam poucas alternativas: a propriedade é arrendada ou vendida. Com isto, ocorre uma reforma agrária às avessas, independentemente da vontade de governos ou da sociedade, imposta pelos ditames da vida moderna. Somam-se a esta contingência duas outras, não menos importantes: será marginal o crescimento da área total utilizada pela agricultura, em escala global;

Outro fenômeno emergente é a ine, embora paire sobre qualquer atividade econômica a navalha das mudanças cli- tensificação da agricultura, que será marmáticas globais, é na agricultura que o seu cante nas regiões tropicais e subtropicais, sendo o Brasil o grande laboratório para impacto terá maior intensidade. exportação do modelo para outras regiões do planeta. No Norte e Oeste do Paraná e O CENÁRIO É DE OPORTUNIDADES Entrementes, postas essas forças que no Centro-Oeste brasileiro, o padrão atual se constituem em ameaças ao atendimen- é o sistema de safra e safrinha. Em alguto da demanda mundial por produtos mas propriedades o modelo foi estendido agrícolas, nos próximos anos, há outra para uma terceira safra e, em outras, no força monumental, atuando em sentido período seco, de junho a setembro, a área inverso, que tem se mostrado mais forte é ocupada por pastagens para engorda que todas as demais: o desenvolvimento do gado. Nas áreas irrigadas, a ocupação cobre o ano inteiro. O fenômeno paralelo tecnológico. É possível antever algumas tendências é o uso de sistemas de integração lavouraportadoras de futuro. A sustentabilidade -pecuária-floresta (ILPF), com todas da produção é uma delas, impondo cri- as vantagens agronômicas e financeiras térios transversais de caráter econômico, advenientes. Políticas públicas deverão ambiental e social nos sistemas de pro- reincorporar as áreas degradadas, que dução. Em consequência, a agricultura passam a ser essenciais, em virtude das de precisão vai se espalhar a partir de seu fortes limitações para expansão da área centro de origem nos EUA, tornando-se agrícola. Finalmente, muito será exigido na rotina na Europa, e em algumas partes da América do Sul – como a Argentina área de controle de pragas. Com o aumene o Brasil -, onde as grandes explorações to acentuado do comércio internacional, agrícolas predominam. Sem, no entanto, pode-se antecipar que, até o final deste deixar de permear outras regiões, como século, todas as pragas que possam se a China e a África, embora com menor adaptar a uma cultura/região, lá estarão intensidade. A agricultura de precisão presentes. Os sistemas de defesa agropeé uma ferramenta essencial para obter cuária tudo farão para atrasar o ingresso incrementos de produtividade, ao longo de novas pragas, mas é uma tarefa inglória, é quase impossível evitar que um do tempo. dia ingressem. As mudanças climáticas e a intensificação da agricultura criarão novos ambientes, que serão propícios à adaptação das pragas a novos hospedeiros e regiões. Cresce, consequentemente, a Com o aumento necessidade de novas tecnologias para acentuado evitar que os estresses bióticos deprimam a produtividade agrícola. do comércio Embora eu não compartilhe da teointernacional, ria de Thomas Malthus, reconheço que pode-se antecipar ele tem seus apologistas modernos. E o mesmo ocorre com os seguidores de Ned que, até o final Ludd, o líder que comandou a destruideste século, ção das máquinas durante a revolução industrial. Neoludismo, a reação antatodas as pragas gônica ao progresso tecnológico, é uma que possam se ameaça sempre presente que certamente pode retardar o desenvolvimento e a adaptar a uma adoção de novas tecnologias. Em minha cultura/região, lá visão de futuro, comida não faltará nas próximas décadas, desde que as estarão presentes. inovações tecnológicas adequadas para sustentabilidade do processo agrícola sejam desenvolvidas, a sociedade as aceite e o agricultor as adote. C

Decio Luiz Gazzoni O autor é engenheiro agrônomo, pesquisador da Embrapa

www.revistacultivar.com.br • Abril 2017

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COLUNA ANPII

Ensino da FBN ANPII monta curso a distância, com todos os princípios básicos da fixação biológica, para abordar de forma prática o uso de inoculantes na lavoura para todos que vão prestar assistência técnica ou administrar lavouras

É

notório o pouco tempo dedicado pela maioria das escolas de Agronomia ao ensino da Fixação Biológica do Nitrogênio (FBN), tanto em sua parte conceitual como na prática do uso de inoculantes nas lavouras de leguminosas espalhadas pelo país. Isto resulta que os agrônomos formados têm de buscar estes conhecimentos em outras fontes. Tendo em vista a relevância da FBN para a vida na terra e seu papel vital no cultivo de leguminosas, com destaque para a soja, o agrônomo que sai da faculdade e se depara com a necessidade de orientar o agricultor no uso de inoculantes tem de procurar em outras fontes o conhecimento que ficou faltando em sua formação profissional. Mas para quem está no campo nem sempre é fácil encontrar estes conhecimentos de forma ordenada, com resultados e orientações consolidadas. Com o objetivo de minimizar esta lacuna, a ANPII montou um curso a distância, com todos os princípios básicos da fixação biológica e contemplando de forma muito enfática a prática, ou seja, o uso de inoculantes na lavoura. Fruto de longa vivência no campo da inoculação em seus diversos aspectos, a ANPII com a forte colaboração dos departamentos técnicos das empresas associadas criou este curso para mostrar os caminhos iniciais da tecnologia do uso do nitrogênio biológico como forma de suprir as plantas neste nutriente. O curso está formatado em cinco módulos: o primeiro é uma explicação da importância da FBN para a vida na terra, dos princípios bioquímicos do processo da fixação, quais tipos de bactérias participam do processo e como se formam os nódulos a partir da associação planta/bactéria. O módulo 2 já entra mais na parte prática, conceituando o inoculante,

os tipos existentes, as características que identificam o que seja um bom produto. O módulo 3 é destinado a mostrar resultados do uso do inoculante no aumento da produtividade, a neces-

Tendo em vista a relevância da FBN para a vida na terra e seu papel vital no cultivo de leguminosas, com destaque para a soja, o agrônomo que sai da faculdade e se depara com a necessidade de orientar o agricultor no uso de inoculantes tem de procurar em outras fontes o conhecimento que ficou faltando em sua formação profissional

sidade da inoculação anual, o uso em outras leguminosas além da soja e a utilidade do inoculante não só para a cultura na qual ele é usado, mas os efeitos benéficos sobre a cultura seguinte. O módulo 4 é destinado a mostrar como usar o inoculante, quais as práticas na lavoura que permitem tirar o máximo benefício desta técnica, a interação do inoculante com outros nutrientes e tudo o mais que permita que o inoculante expresse seu máximo potencial no suprimento de nitrogênio. Finalmente, no módulo 5, encontra-se o inoculante para gramíneas. Seu funcionamento, os excelentes resultados da pesquisa, mostrando aumentos de produtividade, como usar e também falando sobre a coinoculação. Ao final encontram-se links para acessar os principais centros de pesquisa que trabalham com a FBN, bem como para acesso direto a trabalhos para aqueles que desejam aprofundar seus conhecimentos no tema. Encontram-se também os links para as empresas associadas. Este curso está sendo divulgado inclusive junto às escolas de Agronomia e de técnicos agrícolas, para que os professores que ministram este assunto tenham em mãos um material sucinto, como ponto de partida para incrementar cada vez mais o uso desta tecnologia que traz economia para o agricultor e para o País, com incontáveis benefícios para o ambiente. Periodicamente o curso será atualizado e novos conhecimentos serão incorporados sempre que surgir algo relevante neste tema. O compromisso da ANPII é manter o tema FBN sempre atualizado, para que o agricultor brasileiro sempre possa tirar o máximo proveito da tecnologia de inoculação para aumentar sua produtividade. O curso está disponível no site da C ANPII: www.anpii.org.br.

Solon C. de Araujo, Consultor da ANPII

50 Abril 2017 • www.revistacultivar.com.br




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