Cultivar 231 Agosto de 2018 - Avanço da mosca-da-haste da-soja

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Destaques

Índice Diretas

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III Seminário Phytus

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Custos com o bicudo no algodoeiro

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Mancha-de-ramulária em algodão

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Como manejar nematoides

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Global Agribusiness Forum

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Como utilizar corretamente o monitoramento e

Capa - Avanço da mosca-da-haste da soja

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o manejo integrado para enfrentar a mosca-da-

Pressão de pragas na cultura da soja

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Capim-pé-de-galinha e caruru-palmeri

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Manejo correto de plantas daninhas

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Evento anual Climate FieldView

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Tratamento de sementes com inseticidas

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Mancha branca em milho

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Controle de pragas iniciais em trigo

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Coluna Agronegócios

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Coluna Mercado Agrícola

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Coluna ANPII

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Avanço detectado

haste da soja Melanagromyza sojae

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Fibra ameaçada

Conheça os impactos da mancha-de-ramulária na qualidade da fibra de algodão e as estratégias de manejo para controlar a doença

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Dupla hostil

Qual o caminho mais seguro para manejar o capim-pé-de-galinha e o caruru-palmeri, com importância crescente nas lavouras brasileiras Cultivar Grandes Culturas • Ano XIX • Nº 231 Agosto 2018 • ISSN - 1516-358X Crédito de Capa: Fabio Santos

Grupo Cultivar de Publicações Ltda. CNPJ : 02783227/0001-86 Insc. Est. 093/0309480 Rua Sete de Setembro, 160, sala 702 Pelotas – RS • 96015-300 Diretor Newton Peter www.grupocultivar.com cultivar@grupocultivar.com Assinatura anual (11 edições*): R$ 269,90 (*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan)

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Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: cultivar@grupocultivar.com Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.

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Diretas Fungicida

A UPL apresentou durante o III Seminário Phytus o fungicida Triziman. De acordo como gerente de Marketing de Cultivos Sul, Edson Pitta, o produto apresenta três modos de ação diferentes, em uma combinação única. “É ideal para o manejo da resistência, com ação sistêmica e multissítio, assegurando o potencial produtivo da soja”, salientou. Pitta destacou ainda a importância do uso de multissítios no controle da ferrugem-asiática.

Aplicativo

A Basf aproveitou a terceira edição do Seminário Phytus para apresentar soluções digitais, como o aplicativo Basf Agro, que serve para auxiliar o produtor na identificação de doenças e sugestões de manejo. Outro destaque no estande da companhia foi a exposição da máquina SpekSolo Scan usada para dar agilidade às operações de análises de solo.

Soluções

A Bayer levou para o III Seminário Phytus soluções alinhadas com a temática do evento. “O agronegócio passa por uma fase de sucessão, em que jovens filhos de produtores assumem os negócios. Por isso precisamos estar preparados para acolher esse novo perfil de cliente com as ferramentas digitais que ele utiliza”, avaliou o consultor de Desenvolvimento de Mercado, Eduardo Goulart. O Programa de Pontos da companhia, através da rede Agroservice, foi um dos destaques da marca. Em produtos, a Bayer levou para o seminário o fungicida Fox XPRO.

Registro

A Alta (América Latina Tecnologia Agrícola) obteve registro para um novo produto no Brasil. Cartago é um herbicida à base de cletodim, registrado contra diversas gramíneas anuais e perenes em uma variedade de culturas, como soja, algodão, café e feijão. Em conjunto com o Venture (Haloxifope), a Alta oferece dupla força para amplo espectro de ação no controle de folhas estreitas. “Estamos sempre atualizando nosso portfólio, buscando oferecer formulações inovadoras, eficientes, de qualidade para o mercado de proteção de plantas e adequados à realidade do agronegócio”, disse o gerente de Marketing e Supply Chain da Alta, Ernesto Bellotto.

Presença

A Syngenta participou do III Seminário Phytus. Durante painel com participação de outras empresas de agroquímicos, o gerente de Marketing Digital Brasil, Celso Batistella, abordou conceitos de agricultura 4.0, uso de ferramentas digitais no campo, seu emprego nas empresas e oferta ao produtor. Na avaliação de Batistella, essas ferramentas irão ajudar o produtor a tomar melhores decisões, de maneira integrada, otimizada com protocolos para realidade de cada cliente e de cada talhão, aumentando a produtividade e diminuindo custos e riscos.

Celso Batistella (direita)

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Eventos

Digital e útil

Seminário Phytus chega à terceira edição, com foco no uso de ferramentas digitais que efetivamente possam auxiliar na tomada de decisão no campo. Evento reuniu 300 participantes, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul

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ebater o uso das ferramentas digitais na tomada de decisão no campo foi o objetivo da 3ª edição do Seminário Phytus, realizado em julho, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Com público estimado de 300 profissionais ligados ao agronegócio, o evento

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contou com debates, apresentação de resultados de pesquisas técnicas e o lançamento de uma plataforma digital voltada para auxiliar no manejo da ferrugem-asiática, doença que constitui um dos piores pesadelos dos sojicultores. Ajudar o produtor a identificar

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entre as ferramentas digitais, que se multiplicam a cada dia, aquelas que realmente podem se traduzir em bons resultados no campo esteve entre as preocupações expressadas pelo CEO do Instituto Phytus, Ricardo Balardin. “A tecnologia tem que fazer sentido, ter o conhecimento técnico muito


Fotos Cultivar

A visão por parte dos produtores quanto às suas necessidades por ferramentas digitais que auxiliam no manejo e controle sanitário coube a Enoir Pellizaro, da C. Vale, e Ronei Sana, da SLC Agrícola. Em seguida, Rodrigo Alff, da Climate, braço Digital da Monsanto, abordou a plataforma Fieldview, desenvolvida para gerenciamento agrícola. Um painel sobre como a integração de ferramentas e demandas por parte do produtor são analisadas pelo setor financeiro coube a Guilherme Bellotti de Melo, do Itaú BBA, e a Mario Di Croce, da Markel Seguros.

LANÇAMENTO

O Seminário Phytus também marcou o lançamento da plataforma de gestão de manejo de doenças na soja, DigiFarmz, que considera variáveis bióticas e abióticas para auxiliar produtores, técnicos e empresas do agronegócio no controle da ferrugem da soja (Phakopsora pachyrhizi). O DigiFarmz tem por objetivo ajudar na definição de quais fungicidas utilizar e em quais combinações, considerando dezenas de algoritmos, fatores de correção, rotinas de sistemas e um conjunto de bases de dados. A apresentação da tecnologia foi realizada por Alexandre Chequim.

AGRO CONECTADO E RESULTADOS DE PESQUISA

No segundo dia do evento foram abordadas temáticas referentes ao novo agro conectado e à integração entre lavouras, máquinas e pessoas, bem como às ferramentas digitais no manejo de nematoides e resultados e aos algoritmos no manejo fitossanitário. O foco das apresentações também esteve voltado para resultados de pesquisa do Phytus Group e de safra, nas áreas de herbologia, tratamento de sementes, entomologia, tecnologia de aplicação e manejo de doenças em cultivares Inox. Os participantes interagiram com envio de questionamentos aos palestrantes, através do portal Phytus Club. O encerramento do evento ocorreu com um debate em mesa-redonda entre os pesquisadores Phytus Group. C presente, senão será apenas mais uma bugiganga”, alertou. Entre os debatedores estiveram representantes de empresas de agroquímicos, de máquinas agrícolas e também de produtores. O painel inicial contou com Almir Silva, da Basf, André Pereira, da Bayer, e Celso Batistella, da Syngenta, que abordaram conceitos de agricultura 4.0, uso de ferramentas digitais no campo, seu emprego nas empresas e oferta ao produtor. Na sequência foi a vez das fabricantes de máquinas agrícolas enfocarem o tema da mecanização e do uso de ferramentas digitais no campo. Participaram Niumar Dutra, da AGCO, Maurício Menezes, da John Deere, e Rodrigo Ribas, da Trimble.

Balardin enfatizou a necessidade de que a tecnologia faça sentido para o agricultor

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Algodão

Tamanho do prejuízo Principal praga da cultura do algodoeiro e com alto potencial destrutivo, o bicudo é responsável por perdas superiores a 200 dólares por hectare, o que equivale a quase 10% do custo total de produção. Monitoramento, destruição de restos culturais, eliminação de plantas tigueras e uso de armadilhas na entressafra integram o conjunto de medidas que devem ser adotadas regionalmente contra o inseto

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sucesso da cotonicultura no Cerrado brasileiro não ocorre por acaso e sem percalços. Para garantir sua alta produtividade, que coloca o Brasil como o país mais eficiente na produção de algodão no sistema de sequeiro, o manejo da cultura é oneroso e complexo. Um dos grandes desafios continua sendo o potencial destrutivo da principal praga da cultura, o bicudo. Pelos dados das últimas quatro safras, a infestação média de bicudo nas lavouras do Centro-Oeste chegou a 8% na safra 2014/2015, mas baixou para 4% na safra passada (Figura 1). Na prática, significa dizer que os esforços de controle realizados pelos produtores nos últimos anos têm gerado bons resulta-

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dos, mas o inseto continua presente e causando prejuízos à produção de pluma. Somente o custo do bicudo, devido aos gastos com controle e às perdas ocasionadas, ultrapassa 200 dólares por hectare (Figura 2). Por estes números, considerando um custo médio de produção de algodão da ordem de aproximadamente 2.300 dólares por hectare, calcula-se que o impacto econômico da presença do bicudo nos algodoais brasileiros corresponde a quase 10% do custo de produção da cultura. Pulverizações com inseticidas são a principal ferramenta de controle do inseto, sendo utilizadas entre 18 vezes e 23 vezes por safra (Figura 3) e, mesmo assim, perdas ainda são


Fotos José Ednilson Miranda

registradas. Por que, mesmo com tanto esforço, o bicudo continua sendo tamanho problema? Apesar do grande número de pulverizações realizadas a cada safra, com seu enorme impacto econômico e ambiental, os dados apresentados demonstram a fragilidade do manejo dessa praga. Somente os adultos do inseto podem ser atingidos pelos inseticidas; ovos, larvas e pupas ficam protegidos no interior dos botões florais do algodoeiro. Se o monitoramento falhar, a detecção tardia da praga na lavoura dará tempo suficiente para que as fêmeas ovipositem seus ovos nas estruturas da planta de algodão, antes que o inseticida as controle. Mesmo que o controle químico dos adultos seja efetivo, uma nova geração da praga estará se formando e um novo surto do inseto na lavoura fatidicamente ocorrerá cerca de duas semanas depois.

MONITORAMENTO PARA CONTROLE IMEDIATO

Dispositivo atrai-e-mata é um aliado no manejo integrado do bicudo

Monitorar é preciso. O monitoramento constante e eficiente é uma das chaves para reduzir a pressão populacional do bicudo nas lavouras de algodão, pois permite a detecção da chegada dos adultos em tempo hábil para uma rápida intervenção. Esta tarefa pode ser realizada de duas formas: por amostragens visuais de monitores no campo e através da coleta de bicudos em armadilhas instaladas nas lavouras. Amostragens visuais requerem empenho e dedicação de profissionais treinados e estimulados. Precisam ser adotadas com frequência de no máximo cinco dias de intervalo, durante todo o período de cultivo do algodoeiro. Plantas escolhidas ao acaso, em número mínimo de 50 por talhão de 200 hectares, são vistoriadas à procura de bicudos ou de sinais de danos de ataque. Os dados são registrados em planilhas físicas ou eletrônicas e rapidamente enviados à gerência técnica da fazenda, que toma as decisões necessárias, em tempo hábil, para controlar focos.

CONTROLE COMPORTAMENTAL DO BICUDO

O segundo método, com o uso de armadilhas, se baseia no comportamento do bicudo, sendo por isso denominado controle comportamental. E como funciona? Se para humanos a visão tende a ser o sentido mais importante, para o bicudo – e para todos os outros insetos -, o olfato se destaca como o sentido mais utilizado. É através da percepção de sinais químicos (odores) que os bicudos conseguem localizar as plantas de algodoeiro e também seus pares. As plantas de algodão emitem odores que são captados de longe pelas antenas e outros órgãos sensoriais do inseto, que por sua vez localiza outros indivíduos de sua espécie através de feromônios captados pelo olfato. O conhecimento deste comportamento e de quais são os sinais químicos específicos destas relações permite a utilização de tecnologia denominada controle comportamental. As substâncias químicas usadas na comunicação dos insetos são denominadas de semioquímicos, o que quer dizer “sinais químicos”. Os semioquímicos podem ser divididos em aleloquímicos, usados nas relações interespecíficas (entre espécies diferentes) e feromônios utilizados nas relações intraespecíficas (entre indivíduos da mesma espécie). Em decorrência da importância do bicudo-do-algodoeiro para a cotonicultura, grandes esforços de pesquisa foram direcionados para essa praga ao longo do tempo. Estudado desde a década de 1960, o feromônio do bicudo empregado em armadilhas tem sido eficiente tanto no monitoramento de entressafra para correlação com o nível populacional do inseto na safra, como na detecção do início de sua colonização no plantio, auxiliando na determinação da época adequada de controle. Sabe-se que o bicudo ataca na fase reprodutiva do algodoeiro, perfurando os botões florais para se alimentar ou ovipositar, o que leva à queda de botões florais, flores e maçãs novas. No final do ciclo da cultura, quando não há mais estruturas reprodutivas de algodão, o

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Figura 1 – Infestação média de bicudo nas lavouras de alguns estados produtores de algodão

Figura 2 – Prejuízo ocasionado pelo ataque e gastos com o controle do bicudo no Brasil

bicudo se desloca para áreas de mata que servirão de refúgio durante a entressafra. Nesses ambientes, os insetos reduzem o metabolismo e alimentam-se esporadicamente de grãos de pólen de diferentes espécies vegetais. É nesse momento que são instaladas as armadilhas com feromônios na bordadura da lavoura colhida (Figura 4). Para a obtenção do índice populacional de bicudo, as armadilhas com feromônios são mantidas por nove semanas ao longo do perímetro da área de algodão, em intervalos entre 150m e 300m entre si, e são inspecionadas semanalmente. A reposição do feromônio é efetuada a cada 14 dias. Como durante o período de entressafra não há plantas de algodão, não haverá competição com semioquímicos emitidos pelas plantas. As capturas darão ideia da intensidade de infestação de bicudos naquele talhão.

De acordo com o nível médio de infestação de bicudos capturados por armadilha, é obtido o “índice de bicudo por armadilha por semana” (BAS), que classifica o talhão de algodão em cores e permite a tomada de decisão (Tabela 1). Desta forma, determina-se o critério de manejo químico no momento mais crítico da lavoura, o início da fase de florescimento.

ATRAI-E-MATA

Outra forma eficiente de se realizar o controle comportamental é através do uso de dispositivos atrai-e-mata (Figura 5). Nas grandes extensões de área cultivada com algodoeiro do Cerrado brasileiro, estes dispositivos são aliados no manejo integrado do bicudo, complementado com as diversas medidas de controle químico e cultural utilizadas no período de safra.

Figura 3 – Número de pulverizações por safra para controle das pragas do algodoeiro no Cerrado brasileiro

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Figura 4 - Armadilha com feromônio para atrair o bicudo próxima à lavoura de algodão

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Fotos José Ednilson Miranda

Tabela 1 - Tomada de decisão de controle do bicudo de acordo com o armadilhamento de entressafra Índice de bicudo por armadilha por semana (BAS) 0 0,1 a 1 1,1 a 2 Mais que 2

Cor do talhão Verde Azul Amarelo Vermelho

Decisão1 Não pulverizar Uma pulverização Duas pulverizações Três pulverizações

Figura 5 – Dispositivo atrai-e-mata ao lado de plantas de algodoeiro

Consiste de tubo de papelão amarelado impregnado com inseticida malationa e óleo de algodão. No seu interior é colocado um feromônio do bicudo mais concentrado que o da armadilha, por isso tem vida útil bem maior, de 55 dias a 60 dias. Sua instalação deve ser realizada logo após a destruição dos restos de cultura e o dispositivo permanecerá no campo por dois meses (Figura 6). Em seguida, se instalam as armadilhas. Na lavoura seguinte, pode-se instalar novamente os dispositivos aos 30 dias antes da semeadura. Diferentemente das armadilhas, os dispositivos atrai-e-mata não precisam ser instalados ao longo de toda a bordadura da área cultivada, mas apenas nas faixas onde mais se capturam bicudos, pois aí está a rota de migração dos insetos da lavoura para a mata e vice-versa. Diferentemente da armadilha, que serve para o monitoramento da área, a utilização de dispositivos atrai-e-mata, como o nome já sugere, tem a finalidade de reduzir a população do inseto na área. Seu uso é estratégico e controla os bicudos remanescentes de final de safra, que migrariam para as áreas de refúgio e voltariam na safra seguinte para produzir nova geração. Um ensaio realizado no Mato Grosso demonstrou que o controle cultural (destruição de restos culturais), o controle

Figura 6 – Dispositivos atrai-e-mata alocados no perímetro da área de algodão

químico (aplicação de inseticida após a colheita) e o controle comportamental (instalação de dispositivos atrai-e-mata) dão melhor resultado quando combinados (Figura 7). As três medidas usadas em conjunto reduziram mais de 80% da população de bicudos. Assim, muito mais do que a simples adoção do controle químico, o esmero na execução das ações de monitoramento, a destruição de restos culturais, a eliminação de plantas tigueras, o vazio sanitário de pelo menos 60 dias e o armadilhamento de entressafra formam o conjunto de medidas que devem ser adotadas por toda a região produtora de algodão. Finalmente, é importante ressaltar que o manejo do bicudo deve ser coletivo, regionalizado e organizado, com ações conjuntas executadas pelos produtores da região. A consciência coletiva é o ponto fundamental para o sucesso do combate C ao bicudo. José Ednilson Miranda e Sandra Maria Morais Rodrigues, Embrapa Algodão

Figura 7 – Número de bicudos capturados em armadilhas na entressafra. Campo Verde, MT. DRC = destruição de restos culturais; I = aplicação de inseticida após a colheita; A-M = dispositivos atrai-e-mata.

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Algodão

Fibra ameaçada Com efeitos bastante conhecidos na produtividade, a mancha-deramulária tem poder também para interferir na qualidade da fibra de algodão. Por isso, manter a doença sob controle até que as maçãs atinjam a maturidade é medida indispensável para prevenir prejuízos Fotos Phytus Club

A

mancha-de-ramulária do algodoeiro, causada pelo fungo Ramulariopsis gossypii (sin. Ramularia areola), é a doença mais importante da cultura do algodoeiro na atualidade. A enfermidade pode causar reduções de produtividade de até 75%, dependendo da suscetibilidade da cultivar, do inóculo inicial, das condições de ambiente e das práticas de manejo empregadas para controle. Os sintomas da mancha-de-ramulária são bem característicos e aparecem em ambas as faces da folha, inicialmente como manchas branco-azuladas na face adaxial e presença de micélio branco na face abaxial, devido à esporulação abundante. A doença pode causar danos às células do mesófilo, às membranas, ao funcionamento da maquinaria enzimática, na abertura e no fechamento dos estômatos, afetando a transpiração, o influxo do CO2 e a taxa fotossintética. O início do processo infeccioso ocorre a partir de conídios ou ascósporos produzidos sobre restos culturais de algodão ou em plantas de algodão perenizadas, constituindo-se no inóculo primário. O inóculo secundário é formado a partir da infecção das primeiras folhas e então se dissemina através de chuva, irrigação, vento, pessoas e máquinas. Desse modo, áreas com histórico de cultivo com algodão tendem a ter maior severidade da mancha-de-ramulária. Os efeitos dessa doença sobre a produtividade do algodoeiro são bem conhecidos por cotonicultores e pesquisadores. Entretanto, além de reduzir a quantidade, a mancha-de-ramulária

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Figura 1 - Severidade da mancha-ramulária aos 100 dias após emergência do algodão e produtividade do algodoeiro em tratamentos com e sem aplicação de fungicida, em experimento conduzido em Cristalina/Goiás.

pode prejudicar também a qualidade da fibra de algodão, afetando características tecnológicas como micronaire, comprimento e resistência. Essas características, juntamente com outras determinadas através da análise de HVI (High Volume Instrument), são utilizadas para definir a qualidade do lote de algodão e, consequentemente, se haverá ágio ou deságio sobre o valor da venda. A análise e classificação das fibras são indispensáveis no mercado do algodão, auxiliando produtores e compradores nas tomadas de decisão a respeito do comércio da pluma. Atualmente, o padrão de classificação oficial do algodão no Brasil é determinado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), por meio da Instrução Normativa número 24, de 14 de julho de 2016. A fibra produzida nas lavouras precisa atender aos padrões mínimos estabelecidos pela indústria têxtil e exigidos pelo consumidor final para que o algodão possa ser comercializado e industrializado. A obtenção de uma fibra de qualidade depende de diversos fatores de ordem biótica e abiótica, dentre os quais estão inclusos a genética da cultivar, o tipo de solo, a nutrição, as condições de ambiente e a ocorrência de pragas, doenças e plantas daninhas.

Figura 2 - Qualidade da fibra do algodão, representada pelas características comprimento, resistência e uniformidade, em experimentos conduzidos em Cristalina/GO com e sem aplicação de fungicida, sob alta severidade da mancha-de-ramulária.

fungicida (Figura 2). A fibra de algodão é constituída principalmente por celulose, que representa aproximadamente 90% do seu peso seco. O processo de deposição de celulose, responsável pela formação da fibra, é afetado diretamente pela oferta de carboidratos produzidos através da fotossíntese. A mancha-de-ramulária afeta a capacidade fotossintética da planta e consequentemente as características de qualidade da fibra. Esses resultados alertam para o fato de que é importante manter o monitoramento das lavouras de algodão e a doença sob controle até que as maçãs atinjam a maturidade, evitando assim redução na qualidade da fibra. O controle da doença tem sido obtido através de rotação de culturas, adubação equilibrada, resistência genética de cultivares, época de semeadura C adequada, manejo cultural e aplicação de fungicidas. Nédio Rodrigo Tormen, Luiz Eduardo Bassay Blum e Ricardo Silveiro Balardin, Instituto Phytus

EXPERIMENTOS DE CAMPO

Foi realizado experimento de campo com a cultivar BRS 336 em Cristalina, Goiás, com o objetivo de determinar os danos causados pela mancha-de-ramulária sobre a produtividade e a qualidade da fibra do algodão. Foram avaliados tratamentos com e sem a aplicação de fungicidas e as variáveis mensuradas foram a severidade da doença, a produtividade de algodão em caroço e as características tecnológicas da fibra micronaire, comprimento e resistência. Com base nos resultados obtidos, pode-se concluir que a severidade da mancha-de-ramulária foi maior nas parcelas que não receberam aplicação de fungicida, que por consequência obtiveram menor produtividade (Figura 1). A diferença de produtividade entre a testemunha e o tratamento com aplicação de fungicidas foi de 76 arrobas/ha (24,5%). A qualidade da fibra obtida, representada no presente trabalho pelas características tecnológicas micronaire, comprimento e resistência, foi afetada negativamente pela mancha-de-ramulária. Os valores obtidos para cada uma dessas características foram menores nas parcelas que não receberam aplicação de

Tormen avalia os impactos da ramulária sobre a qualidade da fibra de algodão

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Nematoides

Associação compatível Diversas estratégias podem ser empregadas no manejo de nematoides na cultura da soja. Associar, sempre que houver compatibilidade, agentes de controle biológico e moléculas pode favorecer o estabelecimento inicial das plântulas, promover aumento do efeito residual e proporcionar maior redução populacional do patógeno

Fotos Fernando Godinho de Araújo

M

ais de 100 espécies de nematoides envolvendo aproximadamente 50 gêneros estão associadas à cultura da soja. No Brasil, as espécies que causam maiores danos são Meloidogyne javanica, Meloidogyne incognita, Heterodera glycines,

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Pratylenchus brachyurus e Rotylenchulus reniformis. A importância dessas espécies para o país se deve a aspectos relevantes, como a presença endêmica em diversas regiões produtoras (M. javanica e M. incognita), elevada variabilidade genética (H. gly-

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cines) e risco potencial de dano com o incremento da área cultivada com espécies suscetíveis (P. brachyurus e R. reniformis). Os sintomas relacionados ao ataque desses fitoparasitas se assemelham muito. Em áreas com a presença de nematoide é comum encontrar reboleiras com plantas atrofiadas e cloróticas. Em casos extremos, com densidades populacionais elevadas, pode ocorrer a morte de plantas. No entanto, esses indicativos não podem ser únicos para diagnosticar uma área com fitonematoides. A presença de reboleiras pode estar associada a manchas de calcário e à clorose com uma deficiência nutricional, déficit hídrico e compactação do solo. Dessa forma, realizar análises específicas para a identificação correta da espécie do nematoide presente na área é de extrema importância para o sucesso no seu manejo. Diversas estratégias podem ser empregadas no manejo de nematoides na cultura da soja, com destaque para aquelas baseadas na utilização de produtos químicos e biológicos. Esses produtos geralmente podem ser aplicados via tratamento de sementes ou sulco de plantio e têm por objetivo a redução populacional do patógeno e dos danos ocasionados. Os nematicidas químicos geralmente são produtos aplicados no solo e podem ser divididos em duas classes distintas quanto à sua movimentação: fumigantes e não fumigantes. Os produtos fumigantes são geralmente muito tóxicos e de difícil utilização em grandes áreas/culturas. Já os não fumigantes são produtos que apresentam menor espectro de ação contra os organismos presentes nos solos e são eficientes em menores dosagens. Para a cultura da soja, o principal entrave para utilização do controle químico é encontrar produtos que sejam eficientes, a uma baixa dosagem, que permita a utilização em grandes áreas e que tenha uma relação benefício/custo satisfatória. Nematicidas químicos são aplicados em trata-


mento de sementes ou em sulco de plantio e têm o objetivo de proteger as plântulas na fase inicial de seu desenvolvimento (30 dias a 45 dias após o plantio). Uma planta que consegue ter um desenvolvimento inicial mais vigoroso acaba conseguindo resistir melhor ao ataque dos nematoides. Até a safra 2017/18 tinham-se disponíveis no mercado três produtos químicos registrados para o manejo de fitonematoides na cultura da soja, dois utilizados no tratamento de sementes (abamectina e imidacloprido + tiodicarbe) e um no sulco de plantio (cadusafós). No final de 2017, foi registrada mais uma abamectina e no início de 2018 a molécula fluensulfona, ambas para aplicação em sulco de plantio. Com previsão de serem lançadas nos próximos anos, as moléculas fluazaindolizine, fluopyran e tioxazafen estão em fase de registro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e em processo de avaliação

Fêmeas do nematoide do cisto da soja (esquerda) e sintomas do nematoide das lesões radiculares

tanto pelas empresas desenvolvedoras, como por nematologistas. É interessante ressaltar que o controle químico na cultura da soja reduz a população de nematoides somente na fase inicial de desenvolvimento da cultura, permitindo o crescimen-

to populacional do patógeno com o fim do efeito residual dos produtos. No entanto, é comum observar incrementos de três a cinco sacas por hectare na produtividade da cultura quando se utilizam essas moléculas. Tais resultados são frutos do adequado


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Fernando Godinho de Araújo

estabelecimento inicial das plântulas, que respondem em produtividade, e não da redução direta da população do patógeno no solo. Os produtos biológicos para o manejo de nematoides em soja vêm ganhando bastante destaque em função do seu maior período de ação e por sua sustentabilidade. Configuram-se como uma alternativa viável pela facilidade de aplicação, pelo menor custo, por não causar danos ao ambiente, pela facilidade de aplicação, por evitar a seleção de formas resistentes de nematoides e o desequilíbrio da biota do solo. O controle biológico baseia-se na relação antagonista entre micro-organismo e nematoide, tendo como mecanismos de ação antibiose, predação, indução de tolerância da planta, produção de enzimas e toxinas, micoparasitismo, colonização da rizosfera das plantas hospedeiras e produção/ liberação de enzimas hidrolóticas que atuam degradando a parede celular do nematoide. Atualmente, existem dois principais grupos de micro-organismos que são empregados no manejo de nematoides na cultura da soja, formados por fungos e bactérias. Os fungos são divididos em nematófagos, que usam os nematoides como fonte de nutriente, e os fungos que causam efeitos adversos, sem utilizar os nematoides como fontes nutricionais. Os fungos nematófagos ainda podem ser subdivididos em dois grupos: os parasitas de ovos e os de hábito endofítico. Já as bactérias podem agir de diferentes formas no controle de nematoides, parasitando diretamente esses patógenos, produzindo metabólitos tóxicos que afetam a sua movimentação, inibindo a eclosão de juvenis e o processo pelo qual penetram as raízes. Essas bactérias podem ser divididas em parasitas obrigatórias e rizobactérias. Para a cultura da soja, atualmente estão registrados os fungos Purpureocillum lillacinus e Pochonia clamidosporia, ambos parasitas de ovos. No entanto, já existem produtos

Reboleira característica da presença de nematoides

registrados à base de Trichoderma harzianum para outras culturas, sendo testado para soja e utilizado em pesquisas envolvendo fungos do gênero Arthrobotrys e mesmo outras espécies do gênero Trichoderma. Cabe ressaltar que várias misturas de fungos vêm sendo avaliadas com o objetivo de aumentar o espectro de ação e a eficiência no manejo. Com relação às bactérias, para a soja encontram-se disponíveis vários produtos à base de Bacillus sp. (B. subtilis, B. firmus, B. methilotrophicus e B. amyloliquefaciens) e um produto à base de Pasteuria nishizawae, específico para o manejo do nematoide Heterodera glycines. Os Bacillus sp. são rizobactérias que podem sintetizar metabólitos secundários que interferem no ciclo reprodutivo do nematoide e/ou transformam exudados radiculares em subprodutos, interferindo no processo de reconhecimento nematoide-planta. Já as Pasteuria sp. são parasitas obrigatórias, gram positivas, formadoras de endósporos, que parasitam as formas ativas do nematoide, reduzindo a penetração

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e/ou a reprodução. É possível encontrar no mercado misturas de diferentes espécies de Bacillus sp. e mais estudos estão sendo conduzidos testando novas misturas. Da mesma forma, outras espécies de Pasteuria sp. (P. thornei e P. penetrans) para o controle do nematoide das galhas (M. javanica e M. incognita) e do nematoide das lesões radiculares (Pratylenchus brachyurus) estão em fase de avaliação. A associação de agentes de controle biológico (fungos e bactérias), bem como de moléculas (químico + biológico), tem sido testada pela pesquisa para maximizar a ação desses produtos. No entanto, é de fundamental importância avaliar previamente a compatibilidade, principalmente quando se trata da junção entre químicos e biológicos. No caso de haver compatibilidade, se tornam ferramentas bastante interessantes por favorecer o estabelecimento inicial das plântulas de soja, além de promover aumento do efeito residual que consequentemente proporciona maior redução C populacional do patógeno.

Fernando Godinho de Araújo, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano



Evento

Aliança para o futuro

Global Agribusiness 2018 reúne especialistas para debater pesquisa e tecnologia na agricultura como soluções para o futuro da segurança alimentar mundial e a erradicação da fome

C

omo reflexo de uma tendência cada vez mais forte na agricultura: a cooperação, o Global Agribusiness Forum reuniu especialistas das mais diversas áreas ligadas ao agronegócio mundial para debates e painéis, no final de julho, em São Paulo. O evento contou com a participação de autoridades

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e embaixadores de diversos países, como China, Austrália, Índia, Arábia Saudita, entre outras nações do Oriente Médio, da Ásia, da África e da Oceania. O presidente do Conselho do Global Agribusiness Forum (GAF), Cesario Ramalho da Silva, ressaltou a importância de



Pam Johnson falou da necessidade da ciência e do embasamento técnico para a revolução sustentável da agricultura

uma sociedade que lute pela segurança alimentar das gerações futuras, e para que todos os agentes do agronegócio estejam cientes da primordialidade do seu papel nessa luta diária. A head speaker do evento e presidente da Maizall (aliança internacional de produtores de milho formada por Argentina, Brasil e Estados Unidos), Pam Johnson, fortaleceu a visão da revolução sustentável da agricultura e enfatizou a necessidade da ciência e do embase técnico para alcançar esse objetivo. “Precisamos trazer a ciência do laboratório para o campo”, opinou. Também segundo Johnson, a inovação, além de uma ferramenta para o aumento da produtividade, é o grande trunfo para o processo de sucessão familiar nas propriedades rurais, já que a tecnologia vem transformando a agricultura em um ofício cada vez mais jovem e em necessidade de tecnificação. Essa também foi a opinião do ministro da agricultura australiano, David Littleproud, que apontou a ciência como o fator que tem tornado o trabalho do campo cada vez mais atrativo para as novas gerações.

SELO

Com foco voltado para a produção brasileira, o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Blairo Maggi, aproveitou o palco do fórum

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para lançar o selo “Brazil Agro: Good For Nature”, que tem como objetivo funcionar como uma certificação sustentável para os produtos agrícolas brasileiros nos mercados internacionais. Segundo Maggi, os primeiros produtos com o selo deverão começar a chegar aos mercados em outubro. “É uma iniciativa do governo federal, com apoio de diversas entidades, de vários segmentos”, explicou. Com o selo, o consumidor poderá, por meio do código de barras, saber mais sobre a origem e a rastreabilidade do produto. “Queremos apresentar confiança para o consumidor doméstico e internacional”, ressaltou. Durante o evento, o ministro frisou o aumento de produtividade da agricultura brasileira como essencial para a segurança alimentar mundial nas próximas décadas. Maggi projetou que a produção de grãos do país aumentará 30% até a safra 2027/28, para 302 milhões de toneladas. Os entraves que dificultam a segurança alimentar foram discutidos centralmente no GAF, assim como o aumento do percentual de pessoas com fome, que voltou a subir no último ano, tanto mundialmente quanto no Brasil, com relação aos dados de 2015. Para Alan Jorge Bojanic, representante da FAO no Brasil, o acesso aos alimentos foi citado como o maior entrave para solucionar o problema da

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fome no mundo, já que atualmente a produção de alimentos é suficiente para alimentar toda população. A pobreza, a falta de investimento em agricultura, a instabilidade nos preços e o desperdício também foram citados como fatores impeditivos para solucionar o problema. Além da erradicação da fome, o fórum colocou em pauta o futuro do agronegócio, levantando a utilização de água e solo no cultivo, o consumo de proteína direcionando a expansão agrícola e a bioeconomia. Entre as novidades do mercado agrícola foram discutidos casos mundiais de fazendeiros de sucesso, a conexão, colaboração e globalização da agricultura, políticas públicas, negociação multilateral e bilateral, a revolução das máquinas, a resolução de conflitos pelas organizações internacionais, o uso de big data, a 4ª revolução industrial, o sensoriamento remoto, o acordo do clima, as perspectivas de longo prazo e o papel da mídia para o agronegócio. Todos os painéis e debates do fórum geraram um relatório, a ser assinado como um compromisso com o futuro da produção agrícola, e enviado aos “influenciadores” do agronegócio mundial: políticos, representantes da iniciativa privada, pesquisadores, e produtores rurais. O evento foi uma realização conjunta da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ), da Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas) e da Datagro.

CONFIANÇA DO CONSUMIDOR E O PAPEL SOCIAL DA AGRICULTURA

Um dos palestrantes do evento, o vice-presidente global da Plataforma de Proteção de Cultivos da Corteva Agriscience, divisão agrícola da DowDupont, Rajan Gajaria, ressaltou a necessidade de investimento em comunicação de qualidade como medida para criar confiança no consumidor aos produtos vindos de tecnologias desenvolvidas para proteção de cultivos e biotecnologias. “Informar,


comunicar, educar é a maneira para se quebrar o medo do novo no consumidor final”, disse. Além disso, Gajaria ressaltou o papel social da agricultura na formação de comunidades desde o primórdio dos tempos, e como isso ainda molda as perspectivas globais. “Nós somos quem somos porque começamos a cultivar o solo”, lembrou. Para o futuro, o vice-presidente enumerou três condições que auxiliarão na superação de desafios e na geração de oportunidades no desenvolvimento agrícola: avanços tecnológicos, diálogo entre os diversos agentes do setor e globalização. Segundo Gajaria, a tecnologia avança de maneira significativa no agro, sendo as soluções digitais a nova fronteira. “São as novidades em máquinas, big data, nanotecnologia, defensivos, drones, robôs etc.” De acordo com o executivo, o desafio é ampliar o acesso dos pequenos produtores às tecnologias. No segundo tópico, o executivo afirmou que o diálogo entre governos, setor privado, produtores e ONGs é imprescindível para o esclarecimento dos benefícios dos avanços tecnológicos, bem como para a integração e a inclusão tecnológica em nível mundial. Além disso, enfatizou a importância desse diálogo para o aumento da confiança da cadeia geral nas novas tecnologias aplicadas à produção alimentícia. Ao final de seu painel, Gajaria citou a globalização como o terceiro fator de impacto para o desenvolvimento agrícola

Nononononononononononon Fretes e guerra comercial

E

m entrevista coletiva paralela ao GAF, o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, apontou aspectos negativos da guerra comercial entre China e Estados Unidos para o agronegócio brasileiro. Entre os pontos elencados pelo ministro estão a alteração de maneira significativa dos fluxos comerciais e o impacto nos preços das commodities agrícolas, gerando volatilidade nas cotações. “Além, claro, de que qualquer medida protecionista é ruim para o livre mercado”, opinou. Sobre o tabelamento do frete, o ministro afirmou que há risco para a próxima

nos próximos anos. Na avaliação do executivo, consolida-se um cenário mundial, onde de um lado a demanda cresce em um determinado grupo de países, e do outro a produção avança em outro grupo distinto de nações. “É necessário pensar na integração dessas duas vertentes.” Em coletiva de imprensa da marca Corteva, o executivo ainda falou em específico do papel dessa nova marca no avanço da produtividade mundial de grãos através da ciência. “Temos a chance de pegar a experiência de três das maiores empresas de proteção de cultivos e começar do zero, somente com tudo que há de melhor em cada uma delas”, opinou. Durante a coletiva, o líder global em comunicação da marca Corteva, Dana

Gajaria e Hun, da Corteva Agriscience, participaram do evento

safra de grãos, devido a possíveis problemas de entrega de fertilizantes, bem como de aumento de preços do transporte. “Há um impasse nisso. Eu, como produtor, não aceito essa tabela nem os valores que foram colocados nela”, afirmou. O ministro pontuou, ainda, a importância da modernização da legislação que rege defensivos agrícolas, e disse que o Projeto de Lei (PL) 6.299/02 é imperativo para que o agronegócio brasileiro tenha acesso a produtos mais modernos do ponto de vista agronômico e de segurança para pessoas, animais e ambiente.

Bolden, ressaltou a responsabilidade da marca em ser uma voz para os agricultores. “Temos uma oportunidade única de melhorar a vida dos agricultores. Vamos combinar nossas décadas de experiência com inventividade constante, para que possamos ajudar indivíduos, a sociedade e economias a prosperarem”, afirmou Bolden. O presidente da marca para Brasil e Paraguai, Roberto Hun, ressaltou que o Brasil é o segundo maior mercado da empresa, ficando somente atrás dos Estados Unidos. “No mercado brasileiro, nosso principal objetivo é crescer ano a ano acima do valor de crescimento do mercado.” No ano passado, a América Latina respondeu por aproximadamente 20% das vendas globais da Divisão Agrícola. A empresa nascerá como independente no dia 3 de junho de 2019. C

Maggi lançou o selo Brazil Agro: Good for Nature

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Capa

Avanço detectado Presente no Brasil há mais tempo do que se supunha, a mosca-da-haste da soja Melanagromyza sojae acaba de ser identificada também no Cerrado brasileiro, mais precisamente em Goiás, Bahia e Minas Gerais. Táticas de manejo integrado, aliadas ao monitoramento criterioso do inseto nas próximas safras, podem auxiliar a reduzir as populações e a desvendar melhor o comportamento desta praga

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E

spécies exóticas invasoras são aquelas pelas quais a introdução e/ou dispersão ameaçam a diversidade biológica dos ecossistemas, pois passam a ocasionar impactos econômicos e ecológicos de difícil detecção e quantificação. Os deslocamentos destes organismos, de uma região à outra, independentemente da forma como ocorrem, intencional ou acidental, acarretam perdas ambientais, econômicas, sociais e culturais muitas vezes irreversíveis, e podem incidir diretamente ou não na alimentação, na nutrição e na saúde humana. Além disso, há um aumento das barreiras fitossanitárias para comercialização dos produtos agrícolas da região afetada. Com certeza, é a atividade humana dos tempos atuais que tem eliminado as barreiras geográficas do mundo, e isso tem proporcionado a chamada “bioglobalização das pragas”. Desta forma, a cada ano que passa, um novo problema surge em relação a pragas invasoras, uma vez que ambientes modificados, como


Fotos Cecília Czepak

Plantas espontâneas de soja em Silvânia, Goiás, sem dano aparente, porém quando se fez o corte longitudinal da haste verificou-se a presença de larvas e/ou pupas da mosca-da-haste

os agroecossistemas, são seriamente sujeitos a estas invasões biológicas. Dentro deste contexto e levando em consideração os agroecossistemas brasileiros, onde áreas cultivadas com soja apresentaram, nessas últimas décadas, aumento de mais de 200%, proporcionando crescimento em torno 370% na produção, há de se considerar também que os problemas relacionados a fitossanidade possam surgir, principalmente no que diz respeito a pragas invasoras. A exemplo disso, há a entrada da ferrugem-asiática (Phakospora pahyrizi) ou de artrópodes-pragas, como a mosca branca (Bemisia tabaci MEAM1 (Middle East-Asia Minor 1)) e a lagarta Helicoverpa (Helicoverpa armigera). Todas com grande impacto na agricultura brasileira e ainda consideradas um grande problema para a produção de soja no país. Além destas pragas já citadas, existe uma lista com aproximadamente 70 espécies de insetos e ácaros exóticos incidentes em cultivos de soja e que, de acordo com a literatura, se introduzidas no Brasil podem acarretar danos significativos à cultura. Além disso, em uma classificação de insetos exóticos com potencial de adaptação à soja no Brasil, publicada em 2012, apenas duas espécies apresentavam grau de importância “alta”, sendo as duas pertencentes à Família Agromyzidae e uma delas “era” a mosca-da-haste da soja Melanagromyza sojae (Diptera: Agromyzidae), isso porque atualmente é possível afirmar que esta praga já se encontra no Brasil e provavelmente há mais tempo do que se supunha. A mosca-da-haste da soja M. sojae já é praga conhecida em diferentes continentes, pois possui vasta distribuição nos países asiáticos, está em partes da Rússia, Austrália e Espanha causando danos expressivos e com grandes prejuízos aos cultivos de soja. Em 2017, foi identificada atacando alfafa na África, mais especificamente no Sudão, ocasionando significativas perdas à cultura. E sua presença foi confirmada recentemente no Paraguai e na Bolívia. No Brasil, a ocorrência de minadoras danificando hastes de soja foi relatada em 1983, mais precisamente nos estados do Sul, porém como não houve referência à espécie e os dados ainda eram vagos quanto à sua identificação e as ocorrências consideradas esporádicas, a espécie M. sojae foi mantida na lista de pragas ainda não presentes no território nacional. Entretanto, em 2015 na segunda safra de soja, a ocorrência de M. sojae foi confirmada pela equipe do Laboratório de Manejo

Integrado de Pragas (Lab-MIP) da Universidade de Santa Maria/ Rio Grande do Sul em cultivos de soja de diversas localidades do Sul, e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) foi oficialmente notificado da sua presença. Quanto ao Cerrado brasileiro, M. sojae ainda não tinha sido relatada, sendo considerada por algumas instituições até há pouco tempo, como uma praga não disseminada no País. Mas infelizmente esta afirmação não procedia e, para surpresa de muitos, foi encontrada neste ano em diversas áreas do Cerrado goiano. A primeira constatação de M. sojae no Cerrado brasileiro foi verificada pela equipe do Laboratório de Manejo Integrado de Pragas (Lab-MIP) da Escola de Agronomia da Universidade Federal de Goiás (UFG), no final de abril de 2018, no município de Silvania, Goiás (Latitude:-16o 26’ 6.33’’, Longitude:-48o 50’4.22’’), em uma área de 223 hectares com soja voluntária (tiguera) em fase reprodutiva com uma infestação de aproximadamente 100% de plantas com danos e presença de larvas e pupas da mosca-da-haste. Cortes longitudinais das plantas atacadas ajudaram a verificar a presença de larvas e pupas, misturadas a tecidos apodrecidos do caule de consistência mole e coloração marrom-avermelhado. As amostras coletadas durante as inspeções foram encaminhadas para o Laboratório de Manejo Integrado de Pragas da UFG, campus Goiânia, onde foi realizada a triagem do maCiclo biológico - Mosca-da-haste da soja Melanagromyza sojae

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Figura 1 - Infestação da mosca-da-haste Melanagromyza sojae em área de soja voluntária (abril de 2018) em diferentes localidades de Goiás

nia e Vianópolis, a porcentagem de plantas com dano da mosca-da-haste foi superior a 80%. Em Silvânia e Vianópolis também foi observado o maior número de plantas com a presença de larvas vivas de M. sojae, cerca de 60% e 40%, respectivamente.

BIOLOGIA E COMPORTAMENTO

A mosca-da-haste (M. sojae) ataca preferencialmente plantas da família Fabaceae, como a soja. Os adultos são pequenas moscas de coloração preta (2mm a 3mm), que pelo tamanho e a semelhança com outros dípteros não são fáceis de serem detectados no campo, porém, em grandes infestações podem ser vistos nas inflorescências e folhagens. A oviposição ocorre nos folíolos, hastes ou nos ramos tenros e uma fêmea é capaz de ovipositar cerca de 170 ovos. Após dois a três dias ocorre a eclosão das larvas, que começam o ataque broqueando a nervura mais próxima e em seguida avançam por meio do pecíolo até a haste, formando galerias em partes ou em toda sua extensão. O período larval é de sete dias a 11 dias. Após este período, as pupas são formadas dentro das galerias nas hastes da planta, com duração de aproximadamente dez dias. O ciclo de vida completo varia de 16 dias a 26 dias.

terial e as larvas de M. sojae transferidas para eppendorfs contendo álcool (99%). Este material foi enviado para identificação no Laboratório Nacional Agropecuário de Goiás (Lanagro-Mapa, Goiânia, Goiás), onde a caracterização molecular das amostras de M. sojae foi realizada no Laboratório de Diagnóstico e Biologia Molecular, atestando a identificação da espécie e o primeiro relato da sua ocorrência no Cerrado brasileiro. Após a confirmação da identificação de M. sojae, novas buscas foram feitas pela equipe do Laboratório de MIP da UFG em diversas localidades do estado de Goiás. Além disso, foram obtidas amostras de Luís Eduardo Magalhães, na Bahia, e em Minas Gerais em algumas localidades dos municípios de Piumhi, Iguatama, Bambuí e Medeiros no Centro-Oeste do estado, e surpreendentemente a

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mosca-da-haste também foi constatada comprovando que a praga não está presente somente em Goiás, mas difundida para outros estados vizinhos. Em Goiás, foram avaliadas 18 localidades em dez municípios. Estas localidades eram compostas de áreas com cultivos de milheto, tomate e girassol, todas contendo plantas espontâneas de soja. Também, foram coletadas tigueras de soja em beiras de estradas. E com o intuito de se padronizar as coletas, foram avaliadas 100 plantas em cada localidade e em todas se verificou a ocorrência de danos da praga, além do que foi possível constatar a presença de larvas e/ou pupas de M. sojae (Figura1). E em pelo menos uma em cada área avaliada nos municípios de Anápolis, Cristalina, Silvâ-

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PREJUÍZOS E SUGESTÕES DE CONTROLE

Ataques da mosca-da-haste podem reduzir o diâmetro do caule, a altura da planta e a distância dos entrenós. Observa-se também engrossamento na base do caule, configurando um aspecto de nanismo ou deficiência de nutrientes, e na fase reprodutiva há redução no número de vagens. De acordo com alguns autores, soja semeada mais tarde e atacada por M. sojae pode sofrer redução de até 21% no rendimento de grãos. Na Índia, o ataque de M. sojae em alta intensidade tem causado perdas de mais de 80% na produção de grãos de soja. Portanto, é muito importante que se mantenha o monitoramento não só na entressafra de soja, mas também na safra para verificação nas áreas de Cerrado onde e em que momento a praga intensifica seu ataque,


Danos à soja Cultivar

Wilis

G.G. Kundu e R. B. Mehra Determination of economic injury level Harosoy -63 of stemfly on soybean. India - 1987 N. S. Talekar Characteristics of M. sojae diamage in soybean - Taiwan - 1989 KS9

A. K. Bhattacharya and Srinivas rao Evidence on Non - pest status of M. sojae in soybean - 2006

PS-1042

Dano Perda na produção de 2% (causado pelo ataque no cedo). O autor relata que somente o ataque no cedo da cultura causa prejuízo, enquanto o ataque tardio tem menor influência. Perda menor pode ser devido a população de moscas ter sido média, e a infestação ter ocorrido tardiamente. Quando o ataque ocorreu cedo houve diminuição de sementes por planta, diâmetro de caule e estatura de planta. Infestação não teve efeito no peso de 100 sementes. Comprimento do túnel quando acima de 26% causou redução de produtividade significativa. Reduziu o número de vagens e estatura de planta. Este autor compara a resposta da mosca a diferentes foto períodos e a tratamento com e sem inseticida. A planta teve diminuição do tamanho da folha, de estatura, de massa seca acumulada, do n° de flores, n° de vagens, n° de grãos por vagem, n° de nódulos (Rhizobiun) e n° de ramos em plantas não tratadas. Quanto maior o fotoperíodo, menor foi o dano causado pela mosca, pois a planta tem um período de crescimento mais longo (plantas maturam mais tarde) e consegue compensar a perda causada pelo dano da mosca. O autor realizou um experimento em dois blocos, com testemunha e tratado com insenticida, concluindo que plantas sem tratamento obtiveram uma menor estatura, maior % de tunelamento, mas isso não resultou em uma redução da produtividade.

visto as grandes populações encontradas na entressafra. Além disso, táticas do Manejo Integrado de Pragas (MIP) como o controle químico (exemplo: tratamento de sementes), o comportamental (exemplo: armadilhas adesivas) o cultural (exemplo: rotação de culturas, preparo do solo de forma adequada, destruição de tigueras, evitar semeaduras tardias e escalonamentos de plantios); biológico (exemplo: parasitoides, entomopatógenos); resistência (exemplo: cultivares tolerantes e/ou resistentes); legislativo (exemplo: vazio sanitário, obrigatoriedade na destruição de plantas espontâneas) podem ser efetivas para a redução das populações. A constatação da praga em plantas espontâneas de soja disseminadas em cultivos de milheto, tomate e girassol, como também em áreas de pousio ou remanescentes em beiras de estradas reforça a importância de se manter as áreas livres de culturas hospedeiras (ex. plantas da Família Fabaceae), pois com isso o risco desse inseto vir a causar problemas em cultivos de soja de verão poderia ser minimizado, bem como dificultaria seu estabelecimento em altas populações, como foi verificado nesta entresafra. Enfim, cabe aqui também a recomendação de se manter os monitoramentos nas próximas safras para que seja possivel C devendar essa incógnita chamada mosca-da-haste. Cecilia Czepak, Pablo C. Gontijo, Matheus Le Senechal Nunes, Lucas C. G. Silva, Tiago R. Moraes, Jordana R. S. de Morais, Anna Lydhia S. Santos, Aurelio A. Silva, Bruno de M. Ribeiro e Afonso B. Lima, Escola de Agronomia, Universidade Federal de Goiás, Goiânia/GO Luis Henrique Kasuya, Kasuya Inteligência Agronômica, Luiz Eduardo Magalhães/BA Júlio C. de Souza, Empr. de Pesq. Agrop. de MG, Epamig Sul, Lavras/MG

Fotos Cecília Czepak

Autor/artigo/local/ano H. Vanden Berg B. M. Shepard and Nasikin Response of soyean to attack by stemfly in farmens field Indonésia - 1996

A destruição de plantas tigueras é recomendada para reduzir as populações da praga

Ataques da mosca-da-haste podem reduzir o diâmetro do caule, a altura da planta e a distância dos entrenós

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Soja

Pressão intensiva As características do sistema intensivo de produção agrícola brasileiro, ao mesmo tempo em que proporcionam inúmeras vantagens, resultam em maior desafio no manejo de pragas, devido ao fornecimento quase ininterrupto de plantas hospedeiras que permitem a permanência desses insetos ao longo do ano no campo. Aderir a um bom manejo integrado de pragas é o primeiro passo para prevenir ou reduzir as dificuldades de controle

N

as últimas décadas a produção mundial de alimentos teve um incremento sem precedentes, grande parte graças à viabilização da agricultura tropical via avanços científicos e tecnológicos que permitiram o cultivo de até três safras em apenas um ano. Portanto, contribuindo significativamente para a superação do desafio de suprir a demanda alimentar mundial crescente. A intensificação da agricultura reduziu a necessidade de desmatamento para aumentar a produção alimentar, impactando positivamente, por exemplo, na manutenção da biodiversidade e preservação da água. Entretanto, o cultivo intensivo enfrenta maiores dificuldades fitossanitárias quando comparado com sistemas mais tradicionais. Diversos insetos-praga com características polífagas se beneficiam desse sistema produtivo intensificado devido ao fornecimento quase ininterrupto de plantas hospedeiras dessas pragas, permitindo, então, sua permanência ao longo do ano no campo. Consequentemente, o número de pulverizações com inseticidas, quando utilizados sem critérios técnicos, aumenta significativamente. Tal cenário intensifica o processo de seleção de populações de pragas resistentes aos inseticidas, acarretando reduções de produtividades quando o controle da praga não é satisfatório, além de aumentar o custo produtivo, pois novas pulverizações podem ser realizadas para tentar corrigir a falha de controle. A mes-

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Fotos Rafael Major Pitta

Figura 1 - Concentração letal média (CL50 ± IC95%) de teflubenzuron (µg/cm²) em populações de C. includens coletadas em Mato Grosso na safra 2016/17. Método do bioensaio: aplicação da suspensão do inseticida na superfície da dieta

Mariposa da lagarta falsa-medideira (Chrysodeixis includens)

ma analogia deve ser feita para outras táticas de controle, como o uso de plantas transgênicas com proteínas inseticidas, caso da soja que expressa a proteína Cry1Ac. Atualmente no Cerrado brasileiro, a maior parte do algodão cultivado é semeada após o cultivo da soja e isso tem uma influência relevante quando se fala de manejo da resistência, pois diversas espécies-praga (Quadro 1) atacam as duas culturas. Portanto, receberão ao longo das safras, caso não sejam respeitados os níveis de controle estabelecidos pela pesquisa, uma intensa carga de inseticidas. Considerando que não são mais pragas de uma cultura e sim de um sistema produtivo, é importante ter em mente que os planos de rotação de ingredientes ativos com modos de ação diferentes devem ser realizados ao longo da mesma safra e em safras subsequentes. Além do uso em comum de ingredientes ativos para essas pragas nas culturas de soja e algodão, espécies como C. includens, H. armigera, H. zea e C. virescens estão em contínua exposição a proteínas Bt, pois existem cultivares de soja e algodão que expressam a proteína Cry1Ac (Tabela 1). Lagartas do complexo Spodoptera não são afetadas, pois essa proteína nos níveis expressados pelas plantas não sofre seu efeito tóxico. Entretanto, a nova geração de soja transgênica conterá também as proteínas Cry1A.105 e Cry2Ab2, que são eficientes no controle do complexo Spodoptera, atualmente pragas importantes para as culturas de soja, milho e algodão. Necessário se faz mencionar que tais proteínas já estão presentes em cultivares de milho e no algodoeiro são comercializadas cultivares com a proteína Cry2Ab2. Portanto, essas lagartas poderão estar sob intensiva pressão de seleção, pois assim como o algodoeiro, grande parte do milho produzido no país é semeada após a cultura da soja.

e respeitar os níveis de controle preconizados pela pesquisa, naturalmente o número de pulverizações de inseticidas será menor que o utilizado atualmente. Consequentemente, a intensificação do processo de seleção de indivíduos resistentes será reduzida. Ou seja, antes de pensar em estratégias de manejo da resistência, é fundamental a implementação do MIP. De forma complementar deve-se utilizar inseticidas (biológicos ou químicos) com mecanismo de ação distintos em cada pulverização, para permitir uma eficiente rotação de ingredientes ativos. Além disso, é desejável o uso de inseticidas seletivos aos inimigos naturais pelo menos no início do ciclo agrícola, pois estudos indicam que pode haver contribuição dos inimigos naturais na redução da frequência de indivíduos resistentes em uma população. Em relação ao manejo da resistência de plantas Bt, o uso de refúgio é fundamental para permitir que lagartas suscetíveis às proteínas Bt cheguem à fase adulta (mariposa) e cruzem com possíveis insetos resistentes às proteínas Bt para a manutenção de populações suscetíveis, retardando, então, a seleção de insetos resistentes. Baseada no alcance de voo das mariposas, é importante que a distância máxima da área de refúgio para a área de soja Bt não ultrapasse 800m, pois distâncias superiores podem dificultar o acasalamento aleatório de insetos oriundos das áreas de soja Bt e soja não Bt. Além disso, a área destinada ao refúgio deve conter pelo menos 40 linhas e corresponder a um mínimo de 20% da área total cultivada com soja para permitir a quantidade de cruzamentos necessários entre indivíduos resistentes e suscetíveis. Vale a pena ressaltar que o uso exagerado de pulverizações com inseticidas nas áreas de refúgio inviabiliza essa tática de con-

ESTRATÉGIAS PARA EVITAR/RETARDAR A EVOLUÇÃO DA RESISTÊNCIA

A resistência é um processo de seleção e a velocidade em que é selecionada depende da intensidade da pressão de seleção (método de controle) exercida sobre os indivíduos alvos. Portanto, o uso de boas práticas agrícolas como o Manejo Integrado de Pragas (MIP) é o primeiro passo para um manejo adequado da resistência, pois ao utilizar um correto monitoramento de insetos

Presença de mariposa de Chloridea virescens da subfamília Heliothinae

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trole, pois reduz drasticamente a produção de insetos suscetíveis, consequentemente diminui o número de acasalamentos, favorecendo o processo de seleção de indivíduos resistentes. Isso não significa que o produtor terá prejuízos na área de refúgio, pois a recomendação de 20% de área de refúgio leva em consideração o controle da praga. O simples respeito aos níveis de controle produzirá indivíduos suscetíveis suficientes para tais acasalamentos. O uso da soja Bt tem se mostrado eficiente no controle das espécies-alvo da proteína Cry1Ac. Entretanto, é necessário o monitoramento constante da lavoura para evitar que a proporção de indivíduos resistentes aumente na população ao ponto de se observar falhas de controle da praga. Apenas um caso foi relatado na região de Chapadão do Céu, na safra 2017/18, sobre Helicoverpa spp. atacando soja Bt. Porém, existem controvérsias quanto à espécie

encontrada, se era H. armigera ou H. zea ou seus híbridos. Independentemente disto, a tecnologia tem apenas um efeito supressivo para as duas espécies. Contudo, até então não havia casos de lagartas sobrevivendo em soja Bt. Ou seja, trata-se de um processo natural de seleção de indivíduos com menor suscetibilidade à proteína Bt.

MONITORAMENTO DA RESISTÊNCIA

Um dos objetivos de um programa de manejo da resistência é manter o máximo possível a proporção de indivíduos suscetíveis de uma população a determinada estratégia de controle. Para isto, o monitoramento da suscetibilidade de populações da espécie-alvo deve ser realizado constantemente e de preferência antes do início da implantação de determinada estratégia de controle. Tal monitoramento

Quadro 1 - Pragas beneficiadas pelo sistema produtivo soja verão e algodão segunda safra Percevejo-castanho Lagarta elasmo Lagarta-rosca Lagarta do complexo Spodoptera Lagartas da subfamília Heliothinae Lagarta falsa-medideira Mosca-branca Percevejos pentatomídeos Ácaros

Scaptocoris castanea, Scaptocoris carvalhoi e Scaptocoris buckupi Elasmopalpus lignosellus Agrotis ipsilon Spodoptera frugiperda, Spodoptera eridania, Spodoptera cosmioides e Spodoptera albula Helicoverpa armigera, Helicoverpa zea e Chloridea virescens Chrysodeixis includens Bemisia tabaci Euschistus heros, Edessa meditabunda e Piezodorus guildinii Tetranychus urticae e Polyphagotarsonemus latus

Tabela 1 - Principais eventos transgênicos com proteínas Bt em culturas anuais cultivadas no Brasil Tecnologia TL Yieldgard Herculex PRO/PROII Viptera Power core TL..TG Viptera Viptera 4 Intrasect Leptra PROIII Power Core Ultra Bolgard I Widestrike Twinlink Bolgard II Bolgard III Intacta Enlist Intacta 2 Xtend™

Cry1AB x x

Vip3A Vip3Aa20 Cry1F

Proteína Cry2Ae Cry1A105 Cry 2Ab2 Cry1Ac Cry3Bb1 mCry3A

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Cultura milho milho milho milho milho milho milho milho milho milho milho milho algodão algodão algodão algodão algodão soja soja soja

Fonte: CTNBIO. http://ctnbio.mcti.gov.br/documents/566529/1684467/Tabela+de+Plantas.pdf/18880126-2cf3-47b4-a85b-d9b79edd0792?version=1.0

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deve ter um enfoque regional, pois mesmo em espécies com uma capacidade de dispersão elevada, podem ocorrer variações de suscetibilidade à determinada tática de controle entre populações relativamente próximas. Para exemplificar, serão utilizados os dados do monitoramento de populações de C. includens em Mato Grosso na safra 2016/17 (Figura 1). Foram realizadas curvas de dose-resposta (mortalidade) com o inseticida teflubenzuron para cinco populações provenientes do Mato Grosso e comparadas essas curvas com uma população mantida em laboratório por diversas gerações sem contato com inseticidas. Como parâmetro de comparação entre as populações utilizou-se a quantidade de ingrediente ativo (µg/cm²) dispensada sobre a dieta dos insetos que proporcionasse a mortalidade de 50% dos indivíduos avaliados (CL50). As populações de campo com menores valores de CL50 foram Campo Verde e Alto Garças. As populações de Rondonópolis, Diamantino e Canarana foram as que obtiveram maiores valores de CL50, com destaque para Rondonópolis que necessitou de uma concentração 72 vezes maior quando comparada com a população suscetível de laboratório. Mesmo sendo C. includens uma espécie com elevada capacidade migratória, o manejo da praga em cada local influenciou na resposta (mortalidade), pois entre as populações de Campo Verde e Rondonópolis a distância em linha reta é de 170km. Isso demonstra a necessidade de um monitoramento de resistência em âmbito regional e que inferências para o manejo adequado da resistência não devem ser extrapoladas para diversas regiões.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A seleção de indivíduos resistentes a qualquer tática de controle é um processo evolutivo natural, porém o primeiro passo para reduzir/evitar dificuldades de controle devido à resistência consiste na adesão a um bom manejo integrado de pragas. C Rafael Major Pitta, Sandra Maria Morais Rodrigues e Daniel Ricardo Sosa-Gómez, Embrapa Fátima Teresinha Rampelotti Ferreira, Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT



Plantas daninhas Fotos Pedro Christoffoleti

Dupla hostil Capim-pé-de-galinha e caruru-palmeri são daninhas agressivas, cuja importância tem crescido no Brasil, devido à alta adaptabilidade ao sistema de produção e à seleção de biótipos resistentes a múltiplos mecanismos de ação herbicida. A integração de diversas práticas de manejo ao uso sustentável do controle químico é o caminho mais seguro para enfrentar estas duas vilãs

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esde o início da agricultura e pecuária no mundo, plantas que germinavam e emergiam espontaneamente em áreas utilizadas pelos humanos, e que não tinham um fim, já eram consideradas plantas, pois prejudicavam o cultivo de plantas de interesse. Essas plantas são evolutivamente adaptadas para ocupar áreas onde a vegetação original foi alterada, ou seja,

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segundo a nomenclatura botânica são plantas consideradas pioneiras, com função de criar habitats adequados ao início de um restabelecimento da vegetação original. Entretanto, com o desenvolvimento da sociedade e a expansão das áreas agricultáveis ao longo dos anos, essas plantas foram selecionadas, proporcionando o aparecimento de plantas adaptadas aos mais variados ambientes

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de produção, sendo denominadas de plantas daninhas ou plantas infestantes. Frequentemente, estas espécies são disseminadas pelas áreas agrícolas do mundo pelo próprio ser humano, que as transportam para outros ambientes, por terem características ornamentais, forrageiras, medicinais e até mesmo como culturas e, posteriormente, se adaptam ao novo habitat, tornando-se infestantes


Amaranthus palmeri estrutura espinecente, inflorescência masculina e Amaranthus spinosus

com variável grau de agressividade. Dentre os inúmeros casos, são citadas no Brasil as espécies Urochloa decumbens, U. brizantha e Panicum maximum, que são exemplos de forrageiras introduzidas a partir de meados de 1950, e que atualmente são importantes plantas daninhas de difícil manejo. Atualmente, existem diversas ferramentas para se realizar o manejo correto dessas plantas daninhas. Porém, o uso de forma indiscriminada de alguma delas pode acelerar o processo de seleção de biótipos resistentes dessas plantas, dificultando o seu manejo cada vez mais. Dentre as inúmeras plantas daninhas existentes no território brasileiro, duas delas vêm ganhando importância devido à sua alta adaptabilidade ao sistema de produção e por apresentarem biótipos resistentes a múltiplos mecanismos de ação herbicida. São elas o capim-pé-de-galinha (Eleusine indica) e o caruru-palmeri (Amaranthus palmeri), sendo essa última introduzida recentemente no Brasil.

CAPIM-PÉ-DE-GALINHA

O capim-pé-de-galinha tem como centro de origem a Ásia, especificamente a Malásia, sendo que no Brasil encontra-se disseminado em todo território. É uma gramínea de ciclo anual, de fisiologia do tipo C4, cosmopolita e considerada infestante de diversas culturas, anuais e perenes. É uma espécie autógama, apresentando um elevado número de produção de sementes por planta (cerca de 40 mil sementes), que são facilmente disseminadas pelo vento, e com baixas exigências nutricionais para seu desenvolvimento, estabelecendo-se em solos com diferentes níveis de pH e salinidade, características que explicam a sua alta taxa de distribuição. É uma planta bastante competitiva, que acarreta sérios problemas à produtividade das culturas, principalmente quando sua convivência se dá desde o início do seu ciclo. A germinação é facilitada em casos de flutuação térmica, enquanto a emergência é diretamente afetada pela profundidade em que as sementes se encontram e pela quantidade de material vegetal depositado na superfície do solo, ou seja, quanto mais profundas as sementes se encontram e quanto maior a camada de matéria vegetal na superfície, menor é a emergência do capim-pé-de-galinha. Em contrapartida, sementes depositadas

até cinco centímetros de profundidade são capazes de emergir normalmente. Todavia, a realização do plantio direto e o uso de herbicidas, como o glifosato, para controle químico, não estão sendo eficientes no controle de E. indica, pois há relatos da presença de biótipos resistentes a esse herbicida, principalmente em culturas de soja transgênica (Roundup Ready- RR), onde o uso desse herbicida foi realizado de forma repetitiva por muitos anos. A resistência é a capacidade adquirida de uma planta ou biótipo sobreviver e reproduzir-se após determinados tratamentos herbicidas que, sob condições normais, controlam os demais integrantes da população. Atualmente, existem 372 biótipos de plantas daninhas resistentes a herbicidas, pertencentes a 200 espécies. O primeiro registro da resistência da espécie ao herbicida glifosato ocorreu em 1997, na Malásia, sendo registrados casos posteriores na Colômbia, na Bolívia, na China, na Costa Rica, nos Estados Unidos, na Argentina, na Indonésia, no Japão e, finalmente, em 2016, no Brasil. Com relação aos mecanismos de resistência encontrados até agora para a planta, não foram relatados problemas quanto à

Folhas de Amaranthus palmeri, daninha de crescimento acelerado

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Fotos Pedro Christoffoleti

Plantas daninhas de maneira geral se comportam de forma diferenciada

absorção/translocação/metabolização do herbicida. Em todos os casos, o problema encontrado está relacionado a mecanismos-alvo de resistência, consequência da mutação de bases nitrogenadas na sequência gênica da EPSPs. No Brasil, ainda existem biótipos de capim-pé-de-galinha resistentes a outros mecanismos de ação, como aos Inibidores da ACCase e biótipos com resistência múltipla, ou seja, a mais de um mecanismo de ação herbicida, no caso ACCase/EPSPs, sendo que este último biótipo foi descoberto recentemente (2017). Na Malásia, os casos de biótipos de capim-pé-de-galinha resistentes são ainda mais graves, pois já foram identificados biótipos resistentes à ACCase/EPSPs; inibidores do fotossistema I (FSI)/inibidores da síntese de glutamina (GH) e um biótipo resistente a quatro mecanismos de ação distintos: ACCase/ EPSPs/FSI/GH. Nos Estados Unidos, foram relatados casos de biótipos com resistência a diversos mecanismos de ação herbicida, como aos inibidores da síntese da tubulina (trifluralina e pendimentalina), PSI (paraquat), PSII (metribuzin), EPSPs e inibidores da Protox (pxadiazon). A presença desses biótipos resistentes na Malásia e nos EUA faz um alerta para as medidas de controle empregadas no Brasil, visto que, por enquanto, somente foram identificados biótipos resistentes a dois mecanismos de ação, existindo alternativas de controle viáveis para o capim-pé-de-galinha, como os

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herbicidas sulfentrazone, flumioxazina, tebuthiuron, diuron, atrazina, clomazone, isoxaflutole, mesotrione, amônio glufosinato, entre outros. Entretanto, faz-se necessário o uso consciente desses produtos para que não sejam selecionados biótipos com resistência, seja a um mecanismo apenas ou com resistência múltipla. O mesmo cuidado tem que ser tomado com as novas tecnologias que estão por vir, os traits de culturas resistentes a herbicidas não seletivos (amônio-glufosinato, 2,4-D, dicamba e tembotrione), para que não ocorra o que houve com a tecnologia Roundup Ready, que teve seu uso excessivo e, com isso, a seleção de biótipos de plantas daninhas resistentes ao herbicida glifosato. Vale ressaltar que existem ferramentas de controle que podem ser associadas ao manejo químico, a fim de se obter o melhor controle das plantas daninhas presentes na área, como o uso de adubação verde na entressafra, a rotação de culturas, a rotação de mecanismos de ação, a associação de herbicidas, dentre outros.

CARURU-PALMERI

A espécie caruru-palmeri (Amaranthus palmeri) foi introduzida no Brasil, sendo identificada sua presença em

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A área infestada com caruru-palmeri no Brasil é de aproximadamente 12 mil hectares

2015, em regiões do núcleo de produção de algodoeiro do estado de Mato Grosso, onde normalmente se pratica o sistema de produção de sucessão das culturas de algodão, soja e milho. Especula-se que o caruru-palmeri pode ter sido introduzido no Brasil através da importação de colhedoras usadas de grãos e de algodão, que estariam contaminadas com restos de caruru-palmeri vindos de fora do país, prática comercial cada vez mais comum entre os produtores brasileiros. Após a introdução do caruru-palmeri no Brasil, houve expectativa que o setor de pesquisa do País levantasse informações sobre a sua biologia, formas de disseminação, competitividade e controle, em condições brasileiras, pois estas informações existem para outros países, sendo que as plantas daninhas, de maneira geral, se comportam de forma diferenciada quando submetidas a diferentes regiões geográficas no mundo. Segundo estimativa do Instituto de Defesa Agropecuária do Mato Grosso (Indea/MT), a área infestada com caruru-palmeri no Brasil atualmente é de 11 mil hectares a 12 mil hectares aproximadamente, valor que não sofreu muita alteração desde sua identificação, ou seja, sua infestação é considerada sob controle. A espécie é dioica, ou seja, em uma


população, parte das plantas terá somente flores femininas (plantas “fêmea”) e a outra parte, somente flores masculinas (plantas “macho”). Essa é uma característica que facilita a identificação do caruru-palmeri, uma vez que todas as outras espécies de caruru já identificadas no Brasil têm flores masculinas e femininas separadas, porém na mesma planta, sendo classificadas como monoicas. As sementes são produzidas somente nas plantas com flores femininas, porém as plantas femininas podem produzir sementes mesmo sem a ocorrência de polinização, por partenocarpia. Este fato facilita a invasão desta espécie em novos ambientes. Nos Estados Unidos há relatos de populações de caruru-palmeri que foram selecionados como resistentes a pelo menos um dos herbicidas pertencentes a cinco mecanismos de ação: inibidores da ALS (ALS), inibidores da EPSPs (glifosato), inibidores da HPPD (HPPD), inibidores da síntese da tubulina (Trifluralina) e inibidores do fotossistema II (FSII). O manejo dessas populações se torna ainda mais complexo, sobretudo para as com mecanismos de resistência múltipla, a qual já foi relatada para dois ou três desses mecanismos de ação: ALS/glifosato; ALS/glifosato/ FSII e ALS/FSII/HPPD. Além das fronteiras dos EUA, já foram relatados biótipos de caruru-palmeri com resistência à ALS em Israel e na Argentina. No Brasil, a planta já foi pesquisada com relação à resistência a herbicidas e trabalhos publicados comprovam que as populações estudadas são resistentes ao glifosato e à ALS. Algumas alternativas de controle vêm sendo utilizadas no manejo de A. palmeri resistente ao glifosato com sucesso. Destaca-se a aplicação de herbicidas, pós-emergentes, inibidores da Protox como fomesafen, lactofen, saflufenacil ou flumiclorac. Além disso, os futuros traits de culturas resistentes a herbicidas não seletivos (amônio-glufosinato, 2,4-D, dicamba e tembotrione), que estão sendo desenvolvidos, proporcionarão maior leque de opções para o manejo do caruru-palmeri. Ressalta-se que para o sucesso do manejo químico de caruru-palmeri, através da utilização de herbicidas pós-emergentes, a aplicação deve ocorrer em estádios iniciais de desenvolvimento da planta daninha, na dose apropriada. Em relação a herbicidas pré-emergentes, o manejo pode ser feito com o uso dos herbicidas s-metolachlor, sulfentrazone, flumioxazin, metribuzin. A utilização de herbicidas pré-emergentes tornou-se fundamental para que o manejo químico proporcione boa eficácia de controle de plantas daninhas, além de reduzir as perdas de produção decorrentes da matocompetição no início do ciclo da cultura. Um fator importante a ser observado na aplicação dos herbicidas em condições de pré-emergência são os atributos do solo, como teor de matéria orgânica e argila, bem como a condição hídrica do solo no momento da aplicação, ou seja, se a aplicação está sendo realizada em época úmida, seca ou de transição. Além disso, alternativas não químicas também podem ser usadas. É o caso da utilização da palhada pelo sistema de plantio direto, além do consórcio entre culturas, e a rotação de culturas com adubos verdes, para reduzir a pressão causada pelo banco de sementes existente na área, uma vez que dificultam a emer-

gência de inúmeras espécies, e inviabilizam a germinação ao longo do tempo. A associação de mais de um método de controle do caruru-palmeri aumenta significativamente a eficácia de manejo e traz benefícios a médio e longo prazo. O manejo integrado, em que se faz a associação de diferentes práticas, tem por objetivo alcançar alta eficácia de controle do caruru-palmeri resistente a herbicidas, uma vez que proporciona melhor controle, além de dificultar o estabelecimento e, consequentemente, a reprodução das plantas daninhas na cultura. A médio e longo prazo, oferece maior sustentabilidade à atividade agrícola. O controle de caruru-palmeri é recomendado principalmente em fases iniciais de crescimento da planta daninha, dado seu alto potencial competitivo com as culturas, e maior suscetibilidade aos herbicidas, evitando-se assim as perdas por matocompetição precoce. O controle da espécie também se faz ao longo do ciclo da cultura, a fim de evitar escapes e, consequentemente, a produção de sementes pela planta daninha. O desenvolvimento de práticas de manejo que integram o uso sustentável de herbicidas, além de implementação adequada de métodos não químicos para sistemas de cultivos afetados pelo caruru-palmeri, deve, portanto, ser prioridade, para o sucesso de C manejo tanto na safra atual, como nas subsequentes. Pedro Jacob Christoffoleti, Acácio Gonçalves Netto e Marcelo Malardo, Esalq/USP Marcelo Nicolai, Agrocon Assessoria Agronômica

Christoffoleti alerta para a preocupação com a adaptabilidade de caruru-palmeri e capim-pé-de-galinha ao sistema de produção brasileiro

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Plantas daninhas

Adaptação recíproca Ao mesmo tempo em que a agricultura brasileira mudou para enfrentar os desafios impostos por plantas daninhas, observa-se reação da flora tanto na diversidade como na tolerância a herbicidas. Neste processo dinâmico, ganha força a revitalização de soluções já existentes, como o uso de préemergentes. Contudo, é preciso ter em mente que se trata de apenas uma das respostas e não da única solução para o problema

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os últimos 20 anos, a agricultura brasileira sofreu profundas mudanças no manejo de plantas daninhas. Entre as inúmeras alterações, vale destacar o aparecimento de espécies resistentes aos principais

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herbicidas e a criação e o uso de plantas transgênicas resistentes a glifosato e glufosinato de amônio. Ao mesmo tempo, como resultado de tanta evolução, houve uma reação da flora de plantas daninhas tanto na diver-

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sidade como na tolerância aos herbicidas mais frequentes. Trata-se do dinamismo da natureza claramente demonstrando a sua força de reação às tentativas de imposição do homem. No momento, vive-se uma fase de nova transformação. Como ondas que vão e voltam, as técnicas de controle de plantas daninhas se assemelham a esses movimentos. O uso de herbicidas pré-emergentes teve seu momento de glória no passado em várias culturas como soja, milho, algodão, entre outras. Depois, os herbicidas pós-emergentes seletivos como do grupo dos inibidores de ALS e ACCase tiveram um período de prevalência, posteriormente substituídos pelo glifosato com as plantas transgênicas Roundup Ready e GlyTol (soja, milho e algodão). Como resultado adverso da facilidade de manejo das plantas daninhas proporcionada pela inovação, ocorreu uso intensivo destas tecnologias, muitas vezes sem critério. Isso teve como reflexo a seleção de plantas daninhas tolerantes e resistentes a esses herbicidas, algo perfeitamente normal quando se exerce esta pressão de seleção. Assim, a próxima “onda” exige medidas mais difíceis e


Fotos Ceres Consultoria Agronomica

Alta infestação de capim-amargoso resistente ao glifosato

onerosas para evitar os danos das plantas daninhas. Como as alterações na flora de plantas daninhas ocorrem de forma tão sutil, nem sempre o agricultor percebe estas mudanças em seu dia a dia. E quando sua lavoura é tomada por uma nova espécie, há surpresa, como se houvesse uma explosão destas infestações. Cenário que o torna refém de controles mais drásticos. A solução nem sempre está nas tecnologias que estão por vir como a tolerância ao herbicida Dicamba, herbicidas à base de 2,4D ou do grupo dos herbicidas HPPD, o que parece mais uma vez a forma mais eficiente e fácil de lidar com as plantas daninhas. É preciso distinguir o que são boas práticas agronômicas dos controles “fáceis” que podem disfarçar a repetição dos mesmos erros. Uma das respostas (e não única) pode estar na revitalização de herbicidas pré-emergentes. Dentro do meio científico este assunto é tema de diversos diálogos entre os especialistas em plantas daninhas, como medida de segurança, suporte e sustentabilidade das novas tecnologias. Cabe a todos os profissionais da área agrícola voltarem seus olhares para os herbicidas pré-emergentes agora com uma visão voltada a evitar as falhas do passado e acrescentar os conhecimentos mais recentes. A convivência entre todas as tecnologias de controle de plantas daninhas e as diferentes culturas podem não ser harmônicas, quando não houver o uso adequado de qualquer uma dessas técnicas, sem o devido conhecimento. Como exemplo, é possível elencar os riscos de resíduos ou “carry over” dos herbicidas pré-emergentes para cultura posterior, quando esta for sensível. Esta abordagem está cada vez mais frequente na agricultura desenvolvida em países como os Estados Unidos da América. As pesquisas buscam entender melhor todo o mecanismo de degradação do herbicida, o que é essencial para garantir a segurança necessária para as boas práticas agronômicas. O surgimento de novas tecnologias de informação, com uso de sensores e imagens, pode ajudar a identificar com melhor clareza todos os focos de plantas daninhas e no futuro calibrar melhor as quantidades e doses de herbicidas aplicados. Para a revitalização de herbicidas pré-emergentes antigos ou ainda apenas para fazer uso de herbicidas pré-emergentes novos

Herbicidas pré-emergentes aplicados na cultura do algodoeiro

estão sendo conduzidas pesquisas com compostos capazes de proteger a cultura ou “safeners”. Diante disso, há uma grande ampliação dos modelos de controle de plantas daninhas para orientar o agricultor a respeito das melhores ferramentas nesta área. Isso torna essencial a capacidade dos assistentes técnicos na elaboração dos métodos mais adequados para cada agricultor. O sistema de manejo de plantas daninhas deve ampliar seus paradigmas, e para prover a mais eficiente e eficaz solução para o agricultor tem de buscar a melhor combinação de estratégias de controle de plantas daninhas. Isso inclui, sem dúvida, o uso de todos os recursos, inclusive os herbicidas pré-emergentes na forma tradicional antes da semeadura da cultura de interesse ou depois no controle pós-colheita (a critério da recomendação de C um bom profissional da área agrícola). Evaldo Kazushi Takizawa, Ceres Consultoria Agronômica

Competição de mentrasto resistente a herbicidas (acima) e presença de corda-de-viola (abaixo)

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Empresas

Plataforma digital Evento anual Climate FieldView anuncia aumento de funcionalidades, mapeamento digital para colheita de algodão e novos parceiros

Fotos Monsanto

Rocha e Barros explicaram funcionalidades e novidades incorporadas à plataforma

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Monsanto realizou em julho, em São Paulo, o evento anual Climate FieldView. Mapeamento digital das operações de colheita de algodão, apresentação de novos parceiros e aumento das funcionalidades da plataforma estiveram entre as novidades do encontro que reuniu aproximadamente 600 participantes. Lançada no Brasil em maio de 2017, a Climate FieldView integra informações de solo, plantio, monitoramento, pulverização e colheita em um só lugar, tudo acessível pelo celular, tablet ou computador. O objetivo é permitir que o produtor gerencie suas operações com mais eficiência e maximize sua produtividade. "Climate FieldView interpreta seus dados de campo de forma simples, para o agricultor tomar a decisão certa e que possa tirar mais de cada hectare”, explicou o gerente de Produto para Climate, Pedro Rocha. A partir da próxima safra, as operações de colheita de algodão no Brasil poderão ser mapeadas digitalmente pela plataforma de agricultura digital. Além disso, os agricultores brasileiros passam a ter acesso ao Diagnóstico FieldView, ferramenta que fornece imagens de satélite das áreas cadastradas. "Durante a safra, uma grande quantidade de dados é gerada diariamente em todas as operações agrícolas. A Climate ajuda os agricultores a visualizar seus dados, analisar essas informações e depois a otimizar a tomada de decisão operacional", informou o líder de Negócios da Climate para a América do Sul, Mateus Barros. "Com a disponibilidade de imagens de satélites avançadas para ajudar o produtor a entender melhor o desenvolvimento da sua lavoura, a compatibilidade de equipamentos para monitoramento da colheita de algodão e a inclusão de novos parceiros à plataforma, os agricultores

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brasileiros passam a ter ainda mais ferramentas para gerenciar de forma eficiente suas operações e possivelmente maximizar sua produtividade", completou. Em setembro deste ano, os usuários da plataforma Climate FieldView no Brasil terão acesso a imagens de satélites durante a safra, que ajudarão a identificar possíveis problemas antecipadamente, gerenciar insumos e adaptar suas práticas agronômicas com mais precisão, em busca de melhores resultados. Além disso, também a partir da próxima safra, a Climate vai oferecer aos produtores de algodão o Climate FieldView Drive, dispositivo que transfere os dados de campo diretamente para a plataforma C Climate FieldView.

Novos parceiros Climate FieldView no Brasil Software – Integração de dados via softwares: e-Agro (software de gerenciamento agrícola) Horus (imagens de drone) TOTVS (sistema integrado de gestão agrícola) Parcerias comerciais – Os clientes Climate FieldView terão descontos em produtos e serviços: Alluagro (locação de maquinário) Metos (estações meteorológicas) Skydrones (voos e imagens de drone, que podem ser integrados à conta FieldView) TIM (pacote de dados em regiões onde a operadora tem cobertura)



Tratamento de sementes

Tecnologia vital A importância do tratamento de sementes com inseticidas dentro do manejo integrado de pragas (MIP) nas lavouras de soja, milho e algodão, para quebrar a dinâmica populacional dos insetos, de modo a manter as populações em níveis que não provoquem prejuízos significativos às culturas

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iversas mudanças relacionadas ao setor de sementes vêm ocorrendo nos últimos anos, dentre as quais se destacam custo e tecnologia. É inegável que atualmente a semente deva ser encarada de forma diferente. No passado, semeava-se com uso de maiores taxas, para que fosse atingida uma população de plantas satisfatória. Atualmente, a perfeição na distribuição, o vigor e o desenvolvimento de plantas têm feito a diferença no resultado final das lavouras. A semente é o início de uma nova vida, carrega diversas características genéticas que definem o potencial produtivo, além de outros itens como químicos, inoculantes, estimulantes, entre outros. Para se ter uma boa semente

envolveram-se diversas pessoas, empresas, proporcionando um alto valor agregado para a nova cultura. Um bom desenvolvimento inicial da cultura tende a levar maior acúmulo de massa, fazendo com que consiga suportar um maior número de estruturas reprodutivas, levando a maiores patamares de produtividade. O agroecossistema adotado no Centro-Oeste promove um ambiente favorável à multiplicação de pragas, pois prevalece um sistema de produção em que a soja é a principal cultura a se estabelecer na grande maioria das áreas, sendo rotacionada muitas vezes com a cultura do milho e o algodoeiro, por questões de rentabilidade e mesmo de comercializações específicas de cada microrregião. Desta forma, o cultivo sucessivo de duas Fotos Germison Tomquelski

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ou três culturas faz com que muitas pragas se adaptem ao sistema. Aliado a isto, outros fatores como condições climáticas favoráveis, com altas temperaturas no verão e inverno ameno, tornam-se ideais para a multiplicação dos insetos. O Cerrado brasileiro caracteriza-se pela presença de grandes propriedades, altamente mecanizadas. Por vezes, o processo de colheita e semeadura de uma nova cultura é rápido, sem intervalos para que ocorra quebra nos ciclos das pragas. Neste sistema de produção, em que a maioria das pragas presentes no campo apresenta polifagia, ou seja, atacam várias culturas, há como exemplos lagartas, percevejos, cigarrinhas, corós, tripes e ácaros, dentre outras. O manejo integrado de pragas (MIP) precisa ser tratado de forma mais estratégica neste âmbito multicultural. De certa forma, o conhecimento da praga, assim como da lavoura pelo “produtor-técnico” torna-se a base para a construção das estratégias de manejo (conhecimento da biologia das principais pragas ocorrentes na região e uma boa amostragem a campo). A amostragem deve ser constante em virtude da presença de plantas no campo o ano todo. Uma equipe técnica bem treinada faz parte do processo e possibilita a construção de um histórico das áreas com informações sobre a dinâmica populacional desses insetos. Algumas pragas são observadas visualmente, através de contagem direta nas plantas. No entanto, outras necessitam de uma acurácia maior na amostragem como a utilização de armadilhas, “panos de batida” ou mesmo a abertura de trincheiras nos talhões. As tomadas de decisão podem se basear em histórico das áreas, uma vez que se observe condições para a multiplicação da praga. Uma ferramenta muito utilizada, baseada em histórico das áreas, é o tratamento de sementes. É considerada por muitos produtores como um “seguro” e uma ferramenta que torna-se imprescindível para os maiores rendimentos. Outro fator a se analisar reside no fato de que com os avanços biotecnológicos veio a comodidade para o manejo. No entanto, a não observação de novas

Detalhe da planta de milho com o ataque de Elasmopalpus lignosellus

dinâmicas de pragas pode levar a prejuízos enormes, em função do maior custo principalmente em relação à semente, para ressemeadura. O MIP tem por objetivo impedir aumentos populacionais acima de certos níveis, a fim de manter as populações em níveis adequados para que não ocorram prejuízos significativos à cultura. Um dos pilares do manejo é o entendimento da biologia das pragas para traçar as estratégias. Entre as pragas que atacam na fase inicial, a lagarta-elasmo (Elasmopalpus lignosellus) destaca-se, pois tende a reduzir o estande de plantas e por consequência ocasionar perdas de produtividade. Esta praga apresenta grande polifagia. Além da soja, ataca também o milho, o algodoeiro e outras. Este inseto pode ainda se encontrar em diversas plantas daninhas que servem como hospedeiros alternativos, como capim-braquiária, capim-pé-de-galinha, capim-colchão, milheto e outras. As lagartas apresentam coloração variável de esverdeada a arroxeada, com a cabeça escura. Perfuram as plantas na região do colo, fazendo galerias e consequentemente levam as plântulas à morte. Confeccionam, ainda, como forma de abrigo, um casulo com teias, facilmente encontrado no campo. Em algumas culturas como o milho, por atacar o meristema na fase inicial, provoca a morte da planta, secando as primeiras folhas, o que dá nome ao sintoma de “coração-

-morto”. Os adultos são mariposas de coloração cinza e asa com envergadura de aproximadamente 20mm. Ao completarem seu ciclo larval, as lagartas empupam próximo à planta em sua base ou no solo (Tomquelski e Martins 2017). O tratamento de sementes em regiões arenosas, com estresses hídricos ou presença de plantas hospedeiras, tem sido adotado por mais de 90% dos produtores de soja, e com grande sucesso na maioria dos casos, quando ajustado ao sistema de produção. A biotecnologia utilizada em soja Intacta RR2 apresenta supressão em torno de 50% a 60%, sendo uma tática para diminuir os prejuízos. No entanto, necessita deste tipo de ferramenta para garantir o melhor desenvolvimento das plantas. As vaquinhas, coleópteros popularmente conhecidos, têm apresentado maiores frequências de ocorrência. De modo geral nas culturas de soja, milho, algodoeiro e feijoeiro são importantes desfolhadores. Porém, com ataque inicial, levam à desfolha, impossibilitando que a cultura se desenvolva. A prática dos cultivos sucessivos, com grande quantidade de hospedeiros, favorece o desenvolvimento de fases jovens durante todo o ano, com ataque à cultura logo após a semeadura. Entre as espécies mais importantes se destacam: Diabrotica speciosa, conhecida vulgarmente como patriota ou brasileirinho. Possui coloração verde, manchas amareladas sobre os élitros e mede em torno de

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Fotos Germison Tomquelski

Presença da lagarta Spodoptera em folhas de plantas de soja

4mm. Denominada larva-alfinete em sua fase jovem, ataca as raízes principalmente na cultura do milho e também a soja. Outras espécies presentes em determinadas regiões são Megascelis spp., conhecidas como metaleiro. Apresenta o adulto medindo em torno de 5mm, com coloração verde metálica, abdome afilado e tórax mais estreito. Maecolaspis calcarifera também tem sido encontrada no sistema de produção com soja e milho. Seus adultos medem em média 5mm, com coloração do corpo verde, sulcos e pontuações em toda sua extensão. Suas larvas apresentam coloração branco-acinzentada e medem cerca de 7mm. Id-Amim (Lagria vilosa) são besouros com até 10mm de comprimento, apresentam cabeça de cor preta e élitros verde-amarronzados escuros. As larvas apresentam pelos, distinguindo-se de outras, vindo a cortar as plantas, e consequentemente provocam a morte na fase inicial. Pode ser confundida com a lagarta-rosca. Áreas com a presença de grande quantidade de palha tendem a abrigar maiores populações, em função do melhor ambiente para seu desenvolvimento. A pulverização é o método mais utilizado para o controle destes desfolhadores. Entretanto, a fim de diminuir os danos nos primeiros estádios das culturas, o tratamento de sementes com inseticidas registrados à base de fipronil, thiametoxan, imidacloprid + tiodicarbe, imidacloprido + bifentrina tem proporcionado menores infestações. Outros coleópteros importantes para a cultura da soja, e também para o sistema de produção, são os corós. As espécies Phyllophaga cuybana, P. capilata e Liogenys suturalis têm grande predominância no Brasil. Os adultos medem cerca 10mm a 30mm de comprimento, com colorações variáveis castanho a marrom-escuro. As larvas são brancas, atingindo até 35mm de comprimento, passando por três instares. Os ovos são colocados isoladamente no solo, depositados em camadas de até 15cm de profundidade. O ataque se dá nas raízes, principalmente após a passagem para o segundo estádio da praga. No campo, os sintomas são caracterizados por reboleiras (manchas) de plantas amareladas, murchas e com redução no volume radicular. Quando ocorre sincronia da fase inicial da cultura com larvas maiores de 15mm pode ocorrer a

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morte das plantas. No manejo desta praga recomenda-se levar em conta a integração de vários métodos, a fim de evitar grandes perdas. A utilização da semeadura antecipada (primeiras chuvas) diminuiu os danos, promovendo um escape, já que a soja passa o período inicial sem o ataque da praga, e com o desenvolvimento, a cultura passa a tolerar parte dos danos. A rotação de culturas é prática que diminui a infestação da praga. Se destaca a utilização da crotalária. O uso do tratamento de sementes em áreas infestadas é uma alternativa imprescindível, com bons resultados para fipronil, tiodicarb + imidacloprido, bifentrina + imidacloprido, clorantraniliprole, cyantraliniprole. No entanto, em áreas com histórico de ataques severos, recomenda-se o uso de aplicação de inseticidas no sulco de semeadura, integrando as duas alternativas. As lagartas são pragas que têm levado a grandes prejuízos em determinadas regiões do Brasil. Spodoptera frugiperda (lagarta-do-cartucho-do-milho) se apresenta atualmente como um grande desafio. A massa de ovos possui normalmente a coloração cinzenta. Caracterizada por variar a coloração de cinza-escuro a marrom, apresentar um ”Y” invertido na parte frontal da cabeça e quatro pontos equidistantes no final do seu dorso, é uma praga que permanece de 12 dias a 30 dias no estádio de lagarta, e pode chegar a atingir até 5cm de comprimento. A pupa é frequentemente encontrada no solo. O adulto é uma mariposa com asas anteriores mais escuras e desenhadas que as posteriores, medindo 3,5cm de envergadura. Atualmente, em função de diversos hospedeiros alternativos, tem ocorrido o aumento populacional. O inseto ataca as culturas na fase inicial, com o hábito da lagarta-rosca, cortando as plântulas rentes ao solo ou mesmo perfurando o colmo, o que provoca o sintoma de “coração morto” no caso do milho. A tecnologia Bt auxiliou o manejo de pragas, principalmente em culturas como o algodoeiro e o milho. No entanto, como o Brasil é um país em grande parte de clima tropical, pragas como Spodoptera frugiperda podem apresentar um grande número de gerações, e algumas biotecnologias, por selecionarem indivíduos resistentes, têm registrado escapes de controle desta praga, necessitando de ferramentas para auxiliar no controle.


O Manejo Integrado de Pragas tem por objetivo integrar medidas de controle, e nenhuma estratégia deve ser considerada isoladamente. A estratégia do tratamento de sementes se faz importante, a fim de quebrar a dinâmica populacional, ou seja, manter as populações em níveis adequados para que não levem a prejuízos significativos à cultura. Analisado o aspecto da biotecnologia, pode-se considerar como uma ferramenta para garantir um maior tempo de uso deste método de controle, sendo necessário o emprego desde o início. Em função da quebra de resistência das tecnologias Bts, esta prática atualmente também é uma importante ferramenta no manejo integrado de pragas. Observa-se que tanto em soja, como em milho ou mesmo algodoeiro, com ajuste de estande, apenas uma planta já pode fazer grande diferença no resultado. Quando se observa o aspecto de seletividade a inimigos naturais e mes-

Figura 2 - Fatores relevantes para definição de qual ou quais herbicidas pré-emergentes utilizar, além da dosagem correta

Detalhe de plantas mortas em função do ataque de E. lignosellus

mo a redução do impacto ambiental, esta estratégia pode garantir a maior permanência dos inimigos naturais. Outras pragas, dependendo do tratamento de sementes utilizado, podem também ser controladas, como percevejos (Dichelops spp. e Euschistus heros), mosca-branca (Bemisia tabaci biótipo B) e tripes (Frankliniella spp.). De nada adianta o produtor realizar uma boa escolha de materiais, boas

práticas da semeadura-correção-adubação, bons maquinários, se começar perdendo o jogo. Problemas no início do desenvolvimento das lavouras não são passíveis de reversão ao final, com outras práticas. Uma boa base faz C toda a diferença no resultado final. Germison Tomquelski, João Lucas Oliveira e Alexandra Abreu, Fundação Chapadão


Milho

Safra manchada

Principal doença foliar em milho, a mancha branca tem registrado danos potencializados pelo uso de híbridos com elevada sensibilidade em áreas de monocultura. A integração de várias práticas de manejo é mais segura e sustentável para minimizar os impactos desta enfermidade na cultura

C

om aproximadamente 60% da produção total, Estados Unidos e China são os países com maior produção de milho no mundo. O Brasil aparece na terceira posição, com menos de 10% da produção total. Apesar disso, o milho produzido no País é amplamente utilizado na fabricação de rações que abastecem a cadeia produtora de proteína animal, setor esse de grande importância para a economia do país. Dentre as doenças foliares que acometem a cultura do milho no Brasil, a mancha branca já é considerada a principal, podendo ocasionar reduções no rendimento de até 60%. Ensaios conduzidos no Centro de Pesquisa Agrícola da Copacol demonstram que o aumento de um ponto percentual na severidade da doença avaliada no estádio R4, reduz o rendimentode grãos de milho em 44kg/ha.

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Ainda não existe consenso sobre a etiologia desta doença. Os primeiros trabalhos descrevem como agente causal o fungo Phaeosphaeria maydis. Recentemente foi descrita a bactéria Pantoea ananatis como o patógeno responsável por ocasionar essa doença. As lesões são pequenas, entre 0,3cm e 2cm, circulares, alongadas ou levemente irregulares. Inicialmente apresentam aspecto aquoso (anasarca), que após se tornam necróticas com coloração palha. Em alta severidade as lesões coalescem (se unem), interrompendo o fluxo de água, nutrientes e fotoassimilados, podendo destruir toda a folha. Temperaturas diurnas próximas a 25ºC, seguidas de noites frias (14ºC), dias nublados, longos períodos com molhamento foliar e umidade relativa acima de 70% são as condições ideais para essa doença. Normalmente, o progresso é maior após

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o florescimento da cultura, fornecendo um indicativo de que aplicações de fungicidas mais tardias podem apresentar boas respostas em seu manejo. Como estratégia de sobrevivência, P. ananatis pode permanecer no solo em resíduos da cultura ou infestando outras espécies, como capim-braquiária, capim-colchão e capim-colonião. A rotação de culturas e a eliminação de plantas hospedeiras são estratégias que auxiliam no controle da mancha branca pela redução do inóculo inicial da doença. O sistema de produção de milho no Brasil tem migrado para a monocultura de inverno (segunda safra ou safrinha), onde as condições ambientais são mais favoráveis para surtos epidêmicos de mancha branca. Em função do melhor desenvolvimento em temperaturas amenas, para o Sul do país em milho segunda safra, a semeadura antecipada


Fotos Copacol

pode desfavorecer o patógeno, sendo uma das estratégias de manejo. Apesar disso, nas semeaduras antecipadas o potencial produtivo é maximizado e mesmo com menor severidade de mancha branca os prejuízos aos produtores são consideráveis.

RESISTÊNCIA GENÉTICA COMO MEDIDA DE MANEJO

Existe variabilidade genética que confere resistência/tolerância à mancha branca, sendo essa uma estratégia de manejo altamente eficiente que pode ser adotada. Rotacionar híbridos sensíveis com resistentes/tolerantes dentro de uma mesma área de cultivo em diferentes safras pode auxiliar a diminuir o inóculo inicial e a pressão desta doença no sistema de monocultura. Porém, muitos híbridos que apresentam essa característica não possuem o potencial produtivo e/ou a precocidade desejada pelos produtores. Assim, o manejo químico, quando semeados híbridos sensíveis, torna-se importante estratégia de manejo. A busca por híbridos com alto teto produtivo e com maior precocidade pelos programas de melhoramento genético, inevitavelmente levou à seleção de híbridos com maior sensibilidade a doenças. A Tabela 1 demonstra a variação da sensibilidade à mancha branca de diferentes híbridos de milho. Materiais com notas de sensibilidade superiores a 5 requerem atenção especial no manejo.

tava alto grau de sensibilidade e as condições ambientais foram favoráveis ao estabelecimento e desenvolvimento da doença. Nessas condições haveria resposta a uma terceira aplicação, já que o ensaio recebeu somente duas pulverizações. Mesmo assim, pode-se verificar as diferenças entre os fungicidas avaliados e que alguns desses produtos apresentam baixa performance no controle da mancha branca. Os produtos com a presença do ativo fluxapiroxade, pertencente ao grupo das carboxamidas (SDHI), foram os mais eficientes para o controle desta doença, com consequente maior rendimento de grãos. Ainda é possível verificar a melhoria de controle e incremento no rendimento de grãos com a adição do fungicida multissítio mancozeb e a mistura comercial de ciproconazol + azoxistrobina. Além da contribuição em termos de controle e retorno econômico, o uso de fungicidas multissítio na cultura do milho tem grande importância como estratégia de manejo da resistência, para evitar/retardar o aparecimento de populações de fungos resistentes, como o ocorrido em outros patossistemas, Rendimento de grãos de milho em função da severidade de mancha branca, médias geradas a partir de 256 parcelas experimentais com mesmo híbrido (Formula Vip) e data de semeadura (06/02/17), alterando-se os programas de manejo com fungicidas, número e estádio das aplicações, Cafelândia PR, safra 2017

MANEJO QUÍMICO

O manejo químico é uma das estratégias que devem ser utilizadas para minimizar as perdas de produtividade, qualidade de grãos e problemas com acamamento. A Tabela 2 apresenta os resultados de severidade, controle de mancha branca e o rendimento de grãos de milho em função da utilização de 14 diferentes combinações fungicidas em duas aplicações. Os níveis de controle no ensaio não ultrapassaram os 70%, demonstrando a dificuldade do manejo químico da mancha branca. É importante observar que o híbrido utilizado apresen-

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Tabela 1 - Sensibilidade a mancha branca (SMB) de diferentes híbridos de milho semeados e na segunda safra, Cafelândia PR, safra 2017 Híbrido NS 92 PRO CD 3765 PW LG 3055 PRO 2 NS 90 PRO 2 P 4285 YHR MG 652 PW 2B587 PW P 30F53 VYH RB 9006 PRO 2 CD 3612 PW AS 1633 PRO 3 DOW 2B210 PW DOW 2B512 PW MG 30A37 PW MG 699 PW DKB 330 PRO 3 DOW 2B633 PW DOW 2A401 PW CD 3770 PW MG 580 PW Média CV (%)

SMB (0-9)1 0,0 h 0,7 h 0,7 h 1,5 g 2,5 g 2,7 g 3,0 f 3,3 f 3,3 f 3,5 f 3,7 f 3,7 f 3,7 f 3,7 f 3,7 f 4,0 f 4,0 f 4,3 e 4,7 e 4,7 e

Híbrido P 3340 VYH P 3380 HR DKB 290 PRO 3 LG 6036 PRO 2 Rmax 3700 RR MG 600 PW P 2830 VYH AS 1661 PRO LG 3040 VIP RB 9110 PRO 2 NS 50 PRO 2 Supremo VIP DOW 2B346PW Status VIP 3 AG 9000 PRO 3 Formula VIP 2 AG 8780 PRO 3 Formula VIP AS 1677 PRO 3 AS 1777 PRO 3

SMB (0-9) 1 4,7 e 4,7 e 5,3 d 5,3 d 5,3 d 5,7 d 5,7 d 6,3 c 6,3 c 6,3 c 6,7 c 6,7 c 7,0 c 7,0 c 7,3 b 7,7 b 8,7 a 8,7 a 9,0 a 9,0 a 4,9 16,1

1 Escala de notas variando de 0 a 9 sendo 0 a ausência de sintomas de mancha branca

Tabela 2 - Severidade, controle de mancha branca e rendimento de grãos do hibrido de milho Formula Vip semeado na segunda safra em função da utilização de 14 diferentes combinações fungicidas sob duas aplicações (V12 e R2), Cafelândia PR, safra 2017 Fungicida (g/ha)

Mancha branca Controle (%) Severidade (%) Piraclostrobina (99,9) + Fluxapiroxade (50,1) 55,7 33,8 e Epoxiconazol (40) + Piraclostrobina (64,8) + Fluxapiroxade (40) 67,2 25,0 e Epoxiconazol (64) + Piraclostrobina (104) 42,6 43,8 d Mancozebe (1400) + Azoxistrobina (100) 44,3 42,5 d Epoxiconazol (37,5) + Piraclostrobina (99,7) 36,1 48,8 c Ciproconazol (32) + Picoxistrobina (80) 26,2 56,3 c Ciproconazol (32) + Azoxistrobina (80) + Mancozebe (1125) 45,9 41,3 d Flutriafol (75) + Azoxistrobina (75) 13,1 66,3 b Protioconazol (70) + Trifloxistrobina (60) 34,4 50,0 c Azoxistrobina (60) + Benzovindiflupir (30) 32,8 51,3 c Ciproconazol (32) + Trifloxistrobina (75) 27,9 55,0 c Tebuconazol (150) + Trifloxistrobina (75) 16,4 63,8 b Ciproconazol (32) + Azoxistrobina (80) 29,5 53,8 c Tebuconazol (187,5) + Carbendazim (375) 18,0 62,5 b Check 0,0 76,3 a Média 35,0 51,3 CV (%) 12,8 Médias seguidas da mesma letra não diferem entre si pelo teste de Skott-Knott a 5 % de probabilidade de erro.

a exemplo da ferrugem asiática da soja. Cada fungicida apresenta uma resposta diferente para as diversas doenças. Para cada situação (híbrido x condição climática x doença predominante) existe um fungicida ou combinação de fungicidas que entrega uma melhor resposta. Para isso, é importante conhecer a performance dos fungicidas para o controle das diferentes doenças que atacam a cultura, a sensibilidade e/ ou resistência do híbrido escolhido e as condições ideais para o desenvolvimento de cada patógeno. Assim, respostas diversas podem ser esperadas com o uso de diferentes materiais genéticos.

Híbrido resistente/tolerante (NS 92 PRO) à esquerda e híbrido sensível (Formula Vip) à direita sob condições de manejo idênticas, Cafelândia PR, safra 2017

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Rendimento kg/ha 9331 a 9322 a 9116 a 8787 a 8619 b 8547 b 8490 b 8399 b 8370 b 8362 b 8143 b 8081 b 7760 c 7668 c 7527 c 8435 5,25

ÉPOCA E NÚMERO DE APLICAÇÕES DE FUNGICIDAS

Normalmente, a taxa de progresso da mancha branca é maior após o florescimento da cultura. Nos ensaios, respostas constantes às aplicações no estádio reprodutivo da cultura têm sido observadas. Os dados demonstram que uma aplicação no estádio R2 apresenta maior resposta que uma aplicação no estádio V10. A pulverização no estádio de pré-floração (VT) é a mais importante para o manejo químico da mancha branca. Ainda, fica nítida a resposta ao número de aplicações em uma condição de alta pressão. Quanto ao número de aplicações, a resposta é variável com a sensibilidade do híbrido semeado. Normalmente, híbridos de sensibilidade média a baixa apresentam resposta em rendimento entre uma e duas aplicações, enquanto em híbridos com sensibilidade de média para alta podem ser observados retornos em rendimento de duas a até três aplicações. Além do híbrido, o ambiente interfere nestas respostas, portanto, esses dados se referem ao ambiente em estudo. A Figura 2 demonstra o efeito do número de aplicações de fungicidas no rendimento de grãos de milho em função do controle de mancha branca em um híbrido sensível cultivado em ambiente favorável ao surgimento da doença. Observa-se que o retorno é maior para a primeira aplicação e decresce à medida que o número de aplicações passa de uma para duas e de duas para três. Este fenômeno é conhecido como lei dos incrementos decrescentes. O manejo da mancha branca na cultura do milho é complexo. O uso de fungicidas tem apresentado resultados expressivos e consistentes em termos de incremento no rendimento de grãos.


Fotos Copacol

Efeito do manejo químico de mancha branca: sem aplicação (A), duas aplicações de ciproconazol + azoxistrobina (B), epoxiconazol + piraclostrobina (C) e epoxiconazol + piraclostrobina + fluxapiroxade (D), híbrido Formula Vip, Cafelândia PR, safra 2017

Porém, seu uso como única estratégia de manejo e comaplicação de fungicidas de sítio específico pode levar à evolução da redução da sensibilidade dos patógenos, a exemplo do ocorrido com a ferrugem-asiática da soja. A integração de várias práticas de manejo é mais segura e sustentável. A rotação de cul-

Testemunha sem aplicação (A), uma aplicação em V10 (B), duas aplicações V10+VT (C) e três aplicações V10+VT+R2 (D) dos ativos epoxiconazol + piraclostrobina + fluxapiroxade, híbrido Formula Vip, Cafelândia PR, safra 2017

turas, a utilização de híbridos resistentes, a eliminação de plantas daninhas hospedeiras e o manejo químico com associação de fungicidas de múltiplos sítios de ação aos fungicidas monossítios são estratégias de manejo que devem ser utilizadas integradamente para obtenção de melhores resultados. C

Figura 1 - Severidade de mancha branca e rendimento de grãos de milho em função da aplicação de fungicidas em diferentes estádios de desenvolvimento da cultura, média de dois programas de manejo com fungicidas (epoxiconazol + piraclostrobina + fluxapiroxade e epoxiconazol + piraclostrobina + fluxapiroxade + mancozeb) com quatro repetições cada, híbrido Formula Vip, Cafelândia PR, safra 2017

Tiago Madalosso Fernando Fávero Renan Teston Copacol

Figura 2 - Rendimento de grãos de milho em função do número de aplicação de fungicidas, média de dois programas de manejo com fungicidas (epoxiconazol + piraclostrobina + fluxapiroxade e epoxiconazol + piraclostrobina + fluxapiroxade + mancozeb) com quatro repetições cada, híbrido Formula Vip, Cafelândia PR, safra 2017

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Trigo Dirceu Gassen

Manejar desde o início

Corós, lagartas, afídeos e percevejos estão entre as pragas que atacam as fases iniciais de desenvolvimento da cultura do trigo. Monitorar corretamente estes insetos é fundamental para a adequada tomada de decisão sobre o controle

A

s pragas que atacam a cultura do trigo nas fases iniciais de desenvolvimento, compreendendo as primeiras quatro a seis semanas, aproximadamente no período que vai desde a semeadura até a elongação, podem ser agrupadas em corós, lagartas de superfície do solo, afídeos e percevejos. De hábito mastigador (corós e lagartas) ou sugador (afídeos e percevejos), de modo geral são insetos que preocupam pelo poder de reduzir a população de plantas e pelos danos que possam se manifestar mais tarde, devido à transmissão de doenças, alterações fisiológicas e redução da capacidade produtiva das plantas sobreviventes. Devido ao grande potencial para causar perdas na produção, as chamadas pragas iniciais requerem que cuidados especiais sejam adotados antes ou imediatamente após a implantação da lavoura, com objetivo de eleger e aplicar os meios mais adequados de controle. Os corós são larvas subterrâneas, de hábitos rizófagos, considerados pragas residentes, uma vez que têm pouca mobilidade e já estão presentes na área por ocasião do planejamento da lavoura, antes da semeadura. São polífagos (alimentam-se de várias espécies vegetais, cultivadas ou não), pelo que a importância como praga vai além de uma cultura ou safra, dependendo da sincronia fenológica com os cultivos. As espécies de corós-praga mais comuns em trigo, no Rio Grande do Sul, são coró-das-pastagens – Dilobderus abderus (Sturm) e coró-do-trigo – Phyllophaga triticophaga Morón & Salvadori. Juntamente com estas espécies, ocorre com bastante frequência e alta densidade uma espécie preferentemente saprófaga conhecida pelo nome de coró-pequeno (Cyclocephala favipennis). Este coró, pelo fato de apresentar reduzido potencial de dano, não é considerado praga. O ciclo de vida dos corós é longo, passando pelas fases de ovo, larva (coró), pupa e adulto (besouro). Os danos são causados exclusivamente pelas larvas que passam por três tamanhos (estádios ou instares), principalmente pelas grandes (3º instar). O ciclo de D. abderus é anual, enquanto P. triticophaga apresenta uma geração a cada dois anos. O primeiro faz galerias permanentes no solo e está associado a lavouras sob plantio direto e a pastagens, uma vez que logo que sai do ovo, a larvinha consome restos vegetais para depois, gradativamente, crescer e se tornar rizófaga. O coró-do-trigo não faz galerias no solo. Ocorre tanto em plantio direto como em convencional e vive muito próximo da superfície do solo, junto às raízes. Ambas as espécies de corós

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D.N. Gassen e P.R.V.S. Pereira

consomem sementes, raízes e até partes verdes da planta, que puxam para dentro do solo. As infestações e os danos ocorrem em reboleiras (manchas), o que dificulta o manejo. Podem se dar anualmente (coró-das-pastagens) ou em anos alternados (coró-do-trigo), sendo que o período mais crítico para a cultura vai de maio a setembro/outubro, ou seja, desde a semeadura até próximo à colheita. O monitoramento para constatação e delimitação de infestações deve ser realizado a partir da presença de plantas mortas e da abertura de trincheiras no solo, em vários momentos, em qualquer época do ano. Antes da semeadura do trigo, porém, amostragens de solo mais precisas devem ser efetuadas com o propósito de quantificar a densidade de corós por unidade de área e identificar as espécies presentes. A mortalidade natural de corós, principalmente devido à ação de entomopatógenos (micro-organismos causadores de doenças), é muito expressiva, fazendo com que as infestações variem ao longo do ano.

Figura 2 - Produtividade de grãos e massa de mil grãos de 17 cultivares de trigo, indicadas para o Rio Grande do Sul pelo Zoneamento Agrícola do Mapa, conduzidas na safra 2017. Santa Maria (RS)

LAGARTAS

São insetos que já podem estar presentes na área por ocasião da semeadura ou são provenientes da postura realizada pelas mariposas, logo após a emergência das plantas. É um problema mais comum em situações de inverno ameno, causado principalmente pela lagarta-militar ou lagarta-do-cartucho do milho – Spodoptera frugiperda (J. E. Smith). Durante o dia, abrigam-se no solo (sob palha ou torrões) e à noite entram em atividade, atacando as plantas a partir do solo, destruindo-as completamente. A consequência é a redução na população de plantas, que ocorrem em reboleiras que vão se ampliando gradativamente. As lagartas-do-trigo (Pseudaletia sequax e P. adultera) ocorrem mais no final do ciclo da cultura do trigo. Tratam-se de insetos sugadores que se reproduzem rapidamente, desenvolvendo colônias numerosas sobre as plantas, podendo se instalar, dependendo da espécie, em praticamente todos os órgãos da planta de trigo (raízes, colmo, folhas e espigas), desde a emergência até a fase de grão duro. O trigo, assim como os demais cereais de inverno, é atacado por várias espécies de afídeos que ocorrem ao mesmo tempo ou em diferentes estádios de desenvolvimento da cultura. As espécies mais frequentes são o pulgão-do-colmo – Rhopalosiphum padi (Linnaeus), o pulgão-verde-dos-cereais –Schizaphis graminum (Rondani), o pulgão-da-espiga – Sitobion avenae (Fabricius) e o pulgão-da-folha – Metopolophium dirhodum (Walker). Quando em infestações elevadas (colônias), devido à sucção da seiva, podem provocar perdas diretas no rendimento de grãos e sementes. Indiretamente, mesmo em baixos níveis populacionais, tendem a ocasionar danos expressivos, como vetores de vírus fitopatogênicos, especialmente os causadores da Virose do Nanismo Amarelo da Cevada (VNAC). Pela frequência que ocorre e pela eficiência como vetor, R. padi é considerada atualmente a espécie mais importante na transmissão dos agentes causais da virose. A ocorrência de afídeos nas fases iniciais de desenvolvimento das plantas tende a provocar danos significativos.

B

C

Tamanho e pelos/espinhos do coró-das-pastagens (a), do coró-pequeno (b) e do coró-do-trigo (c) J.R. Salvadori

AFÍDEOS OU PULGÕES

A

Lagarta-militar em trigo

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D.N. Gassen e D. Lau

A

B

C

Critérios para a tomada decisão no controle das pragas inicias do trigo Praga Corós

Amostragem e nível de ação (NA)(média de 10 amostras de 1 m de linha/talhão) Abertura de trincheiras no solo (25 cm x 20 cm de profundidade), antes da semeadura. NA: 5 corós rizófagos/m². Lagarta-militar Contagem no solo. NA: início da infestação. Afídeos Contagem nas plantas. NA: da emergência ao afilhamento: 10% das plantas infestadas; da elongação ao grão em massa:10 afídeos/afilho ou espiga. Percevejos Contagem no solo e nas plantas. NA: 2 percevejos/m².

Geralmente, nessas fases predominam as ocorrências de R. padi e de S. graminum e, em menor nível, também pode ocorrer outras espécies. Nestas situações, o ataque intenso de afídeos pode ocasionar a diminuição da população de plantas, bem como afetar negativamente o seu crescimento. A espécie S. graminum possui saliva tóxica e provoca amarelecimento típico das folhas, o que pode evoluir para necrose dos tecidos e morte das plântulas. As infestações de afídeos se originam de alados migrantes. A aveia-preta, cultivada no outono, antes do trigo, para alimentação animal e produção de palhada para proteção do solo, tem importante significado com relação ao manejo do complexo vetor-virose (afídeo-VNAC), uma vez que serve de fonte de infestação do vetor e de inóculo do patógeno. Os principais mecanismos de controle das populações de afídeos em cereais de inverno são seus inimigos naturais. O conjunto de parasitoides (vespinhas), predadores (joaninhas, crisopídeos etc) e fungos entomopatogênicos constitui importante freio no crescimento populacional dos afídeos. Anualmente, têm se observado nas lavouras de trigo elevados níveis de afídeos mortos (múmias) decorrentes da ação de parasitoides, o que representa um controle natural efetivo da praga.

cipalmente no Rio Grande do Sul. São pentatomídeos bastante semelhantes, ambos com espinhos pronunciados no tórax, duas projeções frontais pontiagudas na cabeça e região ventral do corpo de cor verde. Geralmente, em D. melacanthus os espinhos são maiores e mais escuros. Consideradas secundárias como pragas de grãos em soja, estas espécies adaptaram-se para utilizar como abrigo a cobertura morta (palhada) no sistema de plantio direto e, sem abandonar a área após a colheita, passaram a agir como pragas de início de ciclo nas culturas de milho, especialmente na segunda safra (“safrinha”), e de trigo. Os danos dos percevejos decorrem da sucção propriamente dita e de toxinas salivares que provocam deformações e alterações no crescimento das plantas. Folhas com perfurações transversais, dobradas, enroladas e deformadas são sintomas típicos do ataque destes percevejos, que resultam em elevadas perdas no rendimento de grãos. O manejo das pragas iniciais do trigo baseia-se em uma avaliação prévia

Colônias do pulgão-do-colmo (a), do pulgãoverde (b) e do pulgão-da-espiga (c) e reboleira de nanismo amarelo em trigo

da real necessidade de que medidas de controle, incluindo a aplicação de inseticidas via tratamento de sementes ou em pulverização das plantas, sejam adotadas. Essa avaliação fundamenta-se no monitoramento das pragas, através de amostragens. O acompanhamento das áreas permite identificar as espécies de pragas presentes, quantificar a infestação e usar critérios (níveis populacionais de C ação) para a tomada de decisão. José Roberto Salvadori FAMV-UPF Fotos: P.R.V.S. Pereira, V. R. Chocorosqui e D.N. Gassen

PERCEVEJOS

Entre os percevejos que podem ser encontrados nas lavouras no início do desenvolvimento das plantas de trigo destacam-se os barriga-verde, Dichelops melacanthus (Dallas) e D. furcatus (Fabricius). A primeira espécie é mais comum no Paraná e em latitudes menores, enquanto a segunda é encontrada prin-

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C Percevejos Dichelops furcatus (a) e D. melacanthus (b) e danos em trigo (c)



Coluna Agronegócios

Um olhar diferente sobre os agroquímicos

O

olhar não é meu, mas dos cientistas Jerry Cooper e Hans Dobson (Natural Resources Institute, University of Greenwich, United Kingdom), que efetuaram uma revisão da literatura científica, publicada na revista Crop Protection. As duas primeiras frases do artigo são: “A maioria dos artigos publicados sobre pesticidas foca nos seus atributos e nas suas externalidades negativas. Este fato provavelmente explica a percepção inacurada da sociedade no tocante ao efetivo perigo que eles representam e o baixo nível de reconhecimento dos benefícios que trazem”. Elas traduzem a motivação dos autores, que se autoimpõem o objetivo de “explorar e analisar os muitos benefícios do uso de pesticidas, de maneira a que a sociedade possa fazer uma análise mais equilibrada”. Segundo os autores, no total de artigos por eles revisados, foi constatada uma proporção de 40 com visão negativa para cada artigo com visão positiva sobre o uso de pesticidas. Liminarmente, os autores analisam o risco percebido versus o risco real. Em um arrazoado comparativo, é mostrado que, nos EUA, 40 mil pessoas morrem atropeladas por carros a cada ano, apesar da rígida legislação americana. Contrapõem que a fome mata 15 milhões de crianças por ano, o que poderia ser evitado se pragas agrícolas fossem adequadamente controladas nos países assolados pela fome. Referem um estudo que classificou os 30 perigos que mais conduzem à morte nos EUA. Os pesticidas ficaram em 28º lugar, sendo menos perigosos que conservantes de alimentos (27º), eletrodomésticos (15º), natação (7º), fumo (2º) e bebidas alcoólicas (1º).

mortalidade de rebanhos de animais de criação; 6) redução do sofrimento dos animais por menor incidência de enfermidades; 7) aumento da produtividade e da qualidade dos alimentos e produtos derivados de animais e; 8) contenção geográfica das enfermidades animais. Como terceira categoria, são listados os benefícios pelo controle de pragas que afetam atividades humanas e estruturas físicas. Entre outros, são listados: 1) maior visibilidade nas estradas vicinais por controle de plantas nos acostamentos; 2) controle de pragas em vegetação nativa; 3) controle de pragas em parques e jardins; 4) proteção de estruturas de madeira.

BENEFÍCIOS INDIRETOS

O primeiro grupo é o de benefícios às comunidades, sendo elencados como principais: 1) ingresso de recursos financeiros pela melhoria da atividade agrícola, favorecendo outros segmentos econômicos de uma comunidade; 2) melhoria do acesso à alimentação e maior segurança alimentar, pela maior oferta e menor custo; 3) segurança dos alimentos, pela multiplicidade e severidade das regras e controles legais; 4) maior diversidade de cultivos, viabilizados pela disponibilidade de controle de pragas; 5) liberação de mão de obra

para outras atividades; 6) aumento da expectativa de vida; 7) redução de custos com medicamentos veterinários e humanos. Contrapõem que A segunda categoria trata dos benefícios a fome mata de uma nação, com os autores destacando: 1) maior peso da economia agrícola; 2) aumento 15 milhões de das exportações; 3) aumento da produtividade da BENEFÍCIOS PRIMÁRIOS crianças por ano, mão de obra; 4) redução da erosão e aumento da Os autores listam 26 benefícios primários, capacidade de armazenagem de água no solo; 5) diretos, como controle de pragas; e 31 benefícios o que poderia ser redução da migração das áreas rurais para urbasecundários, que não são tão perceptíveis. Os evitado se pragas nas; 6) áreas de parques e jardins mais agradáveis. benefícios primários são divididos em três categoagrícolas fossem Finalmente, a terceira categoria trata dos rias. A primeira delas trata do controle de pragas benefícios globais, com destaque para: 1) segue vetores de doenças. Os principais benefícios adequadamente rança alimentar; 2) menor pressão de expansão elencados são: 1) aumento da produtividade e controladas nos da fronteira agrícola; 3) menor emissão de gases da qualidade dos produtos agrícolas; 2) redução de efeito estufa; 4) menor pressão de introdução da presença de micotoxinas nos alimentos; 3) países assolados de pragas em novas áreas; 5) maior conservação aumento do “tempo de prateleira” dos alimentos; pela fome da biodiversidade; 6) menor intensidade de 4) redução da penosidade no controle de pragas, epidemias em humanos, quando transmitidas especialmente de plantas invasoras; 5) redução do por vetores. uso de combustíveis fósseis no controle de plantas invasoras; 6) viabilização do plantio direto e menor necessidade de O espaço aqui disponível permite tão somente elencar as causas, movimentação do solo; 7) redução da taxa de dispersão e de estabelesem poder analisá-las, fundamentá-las e discuti-las. Assim, o objetivo cimento de pragas exóticas. deste artigo é informar que existe uma análise aprofundada do tema, A segunda categoria trata do controle de pragas e seus vetores, que incentivando-se os interessados a ler o artigo original de Cooper e afetam animais e a espécie humana. Nesse grupo são listados benefícios Dobson, para entendimento das justificativas de cada benefício em como: 1) redução de mortalidade humana; 2) diminuição do sofrimento particular, disponível em www.sciencedirect.com/science/article/pii/ C de cidadãos por menor incidência de enfermidades; 3) redução dos S026121940700097X. incômodos impostos à sociedade por enfermidades; 4) aumento da produtividade do trabalho, por menor incidência de doenças que Decio Luiz Gazzoni, afastem pessoas do trabalho ou as inabilitem para tanto; 5) redução da O autor é Engenheiro Agrônomo, membro do Conselho Científico Agro Sustentável

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Coluna Mercado Agrícola

Trump continua dando as cartas no jogo do agronegócio mundial O presidente dos EUA, Donald Trump, segue criando conflitos e depois se aproveita disso para amenizar e propor acordos lucrativos aos americanos. Já ocorreu com a China, quando taxou em mais de 200 bilhões de dólares os produtos chineses e recebeu como resposta a taxação de produtos norte-americanos e o corte da compra de soja dos EUA. Diante do resultado negativo, o presidente buscou acordo com a União Europeia, anunciando que iria baixar tarifas de importações de produtos europeus, abrindo espaço para vendas maiores de grãos americanos, beneficiando a soja e o milho. Trump, que não é tolo e não quer assistir a uma quebradeira geral entre os seus eleitores do setor rural, abriu as negociações com o mercado europeu para os grãos americanos. Os chineses, por sua vez, tendem a se apegar aos fornecedores da América do Sul, principalmente o Brasil.

MILHO

Colheita a todo vapor e confirmando perdas

O mercado do milho mostra pouco movimento, com os produtores colhendo em ritmo forte. Os números das lavouras vão confirmando que há perdas em praticamente todas as regiões. Mesmo assim, não dá para apontar que exista uma catástrofe na safra e que o volume final tenda a superar a marca das 50 milhões de toneladas nesta safrinha. Somente o Mato Grosso, com colheita avançada, caminha para safra próxima da casa dos 23,5 milhões de toneladas. Sozinho, o estado representa mais de 40% da produção esperada para este ano. Nos demais estados há perdas também, mas o problema é localizado. As perdas devem ficar na faixa dos 30% para o Mato Grosso do Sul e pouco acima de 20% no Paraná. Há prejuízos ainda em Goiás. Os compradores não estão atuando e os negócios nos portos continuam parados à espera de fretes mais baratos. Não há notícias de grandes transações neste mo-

mento, o que tem mantido em R$ 38,00 a saca nos portos para setembro e outubro.

SOJA

Fretes tabelados ainda segurando negócios futuros

O mercado da soja do Brasil avançou nas negociações da safra velha, que já atinge a faixa de 80%, devendo o restante ter comercialização pontual de agora em diante. Enquanto isso, o mercado da safra nova segue parado, à espera que o Supremo Tribunal Federal (STF) anule o tabelamento de fretes mínimos. Há menos de 15% da safra nova negociada, sendo que o Mato Grosso, maior produtor (que já deveria estar com vendas acima de 35%), registra algo em torno de 20%. Segue tudo atrasado nos movimentos de insumos também. Porém, mesmo com o quadro de fretes ainda enrolado e tudo parado, o Brasil caminha para uma grande safra de soja e novamente haverá crescimento de área plantada para este novo ano agrícola.

ARROZ

Consumo crescente e cotações em alta

O Brasil colheu uma safra bem menor que o consumo, o que refletiu nas cotações do arroz no mês de julho e tende a seguir pressionando-as para cima neste restante de ano. Com colheita na faixa das 11,7 milhões de toneladas e um consumo de mais de 12,2 milhões de toneladas, tudo caminha para um aperto no quadro e estoques baixos. Nos dados divulgados pela própria Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) percebe-se que são os menores estoques em 20 anos. Com este cenário, os produtores apostam em alcançar valores próximos de R$ 50,00 a saca na base do arroz de boa qualidade do Rio Grande do Sul. C

Vlamir Brandalizze Twitter @brandalizzecons www.brandalizzeconsulting.com.br

Curtas e boas TRIGO - O mercado do trigo, que nestes últimos anos registrou prejuízos aos produtores, entra agora em uma fase positiva. Com forte alta no mercado internacional movido por quebra da safra dos EUA e da safra da Europa (pouco produto e demanda crescente). Isso está fazendo com que os indicativos de importação sigam em alta, e como vai ser necessário importar mais de 5,5 milhões de toneladas, o Brasil tem fôlego para níveis aos produtores entre R$ 850,00 e R$ 950,00 a tonelada para o grão e, no começo do novo ano, até superiores a R$ 1.000,00 por tonelada, porque a importação irá liquidar nestes níveis ou acima. EUA - Os produtores americanos estão com a safra mais avançada neste ano e dependem de clima favorável em agosto para fechar as lavouras em boas condições. Em julho houve clima irregular, com perda no potencial produtivo. Desta forma, a safra tende a não ser tão grande como poderia. Com expectativas da soja na faixa de 118 milhões de toneladas e do milho em 364 milhões de toneladas. CHINA - A China deu uma grande notícia ao mercado em julho,

anunciando que não iria ficar batendo de frente com os EUA em relação às tarifas. Para manter o crescimento econômico do país na faixa dos 7% ao ano, ao invés de tentar permanecer com exportações crescentes junto ao mercado americano anunciou que irá estimular a economia interna. Vai investir pesado em infraestrutura para ficar mais forte economicamente e mais competitiva para o futuro. Sinal de que seguirá importando grandes volumes de soja do Brasil. Tudo aponta que irão passar longe dos 70 milhões de toneladas de soja comprados em 2019. ARGENTINA - A safra dos argentinos foi bastante prejudicada pelo clima e os números finais mostram algo entre 30 milhões de toneladas e 31 milhões de toneladas em milho contra 39 milhões de toneladas do ano passado. A soja ao redor de 33 milhões de toneladas e 36 milhões de toneladas frente aos 57,5 milhões de toneladas da safra anterior. O país foi forçado a adquirir grandes volumes de soja nos EUA para atender mercados que lhes compram farelo, óleo e biodiesel.

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Coluna ANPII

Falso dilema Buscar de modo racional diminuir a dependência de produtos químicos, sem demonizá-los, ignorar que são necessários ou cair na falsa dicotomia de orgânicos x convencional é o grande desafio a ser perseguido na busca por uma agricultura cada vez mais sustentável

P

erpassa pelo país uma ampla discussão sobre o As micorrizas, que trazem não a eliminação de fertiuso de defensivos agrícolas nas lavouras do Brasil. lizantes, mas seu melhor aproveitamento pelas plantas, Infelizmente, o debate descambou do segmento já estão sendo comercializadas no Brasil e se apresentam em que deveria ser realizada para “palpites” de pessoas como um grande aliado dos agricultores, pelos aumentos sem nenhum conhecimento agrícola, fazendo declarações de produtividade que apresentam. sobre um tema do qual nada entendem. No caso dos defensivos biológicos, o Brasil está um pouco A discussão, em um âmbito técnico, mais atrasado. O potencial é enorme, científico, é pertinente sem a menor mas falta uma política para o setor, As micorrizas, sombra de dúvida. Os defensivos são, com ações conjuntas, ordenadas, com sim, venenos. Portanto, com um poobjetivos bem definidos para que se que trazem não tencial de maiores ou menores danos possa, em médio prazo, chegar a um a eliminação ao homem e/ou ao ambiente. Assim, aumento no uso de biológicos e rede fertilizantes, todos os interessados no ramo devem dução do emprego dos químicos, mas procurar, ao mesmo tempo, produtos sem perda de produtividade, ponto mas seu melhor cada vez com menor risco, mas com essencial para qualquer política a ser aproveitamento pelas maior potencial no controle de pragas. desenvolvida na agricultura. Este é o grande desafio. Atualmente, há um leque de microplantas, já estão sendo O objeto deste artigo não é entrar -organismos com fortes indicadores de comercializadas no na falsa dicotomia agricultura orgânica que seu uso poderá, em alguns casos, x agricultura convencional, mas sim Brasil e se apresentam combater agentes patogênicos e, em destacar os pontos que poderão vir a outros, aumentar a resistência das como um grande tornar a agricultura menos dependente plantas aos organismos que causam aliado dos agricultores, doenças. Não basta apenas estudar o dos produtos químicos, encarados não como um mal a ser extirpado a qualmicro-organismo em si, mas sim sua pelos aumentos de quer custo, pois isto causaria uma onda estreita inter-relação com as plantas, produtividade que de fome nunca vista no mundo, com como eles atuam em conjunto, o papel a queda brusca da produção agrícola de cada um nesta relação, as sinergias apresentam e os preços dos alimentos ficando ao daí resultantes. O engajamento das alcance de uma pequena parcela da entidades de pesquisa, com mudança população. do atual foco nos micro-organismos em si, mas migrando Mas ações de médio e longo prazos poderão, ao longo para um estudo das inter-relações, é que poderá “virar o do tempo, reduzir de modo significativo o uso dos defenjogo”, trazendo novas luzes, novas formas de uso, novas sivos e fertilizantes químicos. No caso da soja já há esta tecnologias para o emprego massivo de micro-organismos, ferramenta, com o emprego de inoculantes como fonte reduzindo, concomitantemente, o uso de agroquímicos. de nitrogênio para esta cultura. Esta tecnologia vitoriosa As empresas associadas à Associação Nacional dos Profoi fruto de ações concatenadas entre o setor público dutores e Importadores de Inoculantes (ANPII) mantêm e o privado, desenvolvendo ferramentas de excelente em seus departamentos de P&D pesquisas para se chegar qualidade para fixar elevadas quantidades de nitrogênio. a este caminho. Mas isso só será possível com uma política C Atualmente, já se busca o mesmo patamar para as culde maior abrangência. turas de feijão, caupi, amendoim e outras. A fixação de nitrogênio em gramíneas, embora sem o mesmo patamar das leguminosas, já mostra sinais muito claros de que o Solon Araujo, caminho para uso de biológicos está não apenas aberto, Consultor da ANPII mas em franco desenvolvimento.

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Integração de tecnologias S Fotos Germison Tomquelski

A comodidade trazida pela tecnologia Bt fez com que o uso massivo e em desacordo com as recomendações técnicas, aliado às características de um agroecossistema favorável à multiplicação de pragas, resultasse em escapes de controle, dificuldades de manejo e pressão de resistência, principalmentede lagartas. Aliar a biotecnologia ao emprego racional de inseticidas e a outras estratégias integradas é o caminho mais seguro para enfrentar este problema

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egundo dados do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB) na safra 17/18, o Brasil apresentou mais de 65 eventos liberados, tanto para o controle de plantas daninhas como para o combate de insetos, em diferentes culturas. Um dos grandes marcos foi a liberação do algodoeiro resistente a lagartas, em 2005, e posteriormente o milho, em 2007. No ano de 2009 foi lançada a soja Bt (Intacta RR2 Pro), com a expressão da proteína Cry1Ac. A contribuição dos transgênicos em milho e algodoeiro foi de grande valia para o manejo integrado de pragas. Ajudou a diminuir as aplicações de inseticidas nessas culturas em torno de 20%, e particularmente no complexo de lagartas houve redução de 80% nos primeiros anos de adoção. Na cultura da soja, os dados também mostram benefícios, porém em determinadas regiões com menores ganhos em relação às outras culturas. Desde a liberação das plantas geneticamente modificadas com resistência a pragas, grandes mudanças têm ocorrido, seja por alterações de comportamento dos insetos, por adaptação no sistema de produção, pela presença de hospedeiros alternativos ou por modificações quanto às pragas principais de cada cultura. Um dos fatores a se analisar no Cerrado brasileiro é que o agroecossistema utilizado na região Centro-Oeste é um ambiente favorável à multiplicação de pragas, pois prevalece a soja como principal cultura a se estabelecer na grande maioria das áreas, podendo ser rotacionada ou não, sendo após a colheita estabelecida uma cultura de cobertura ou a área permanecendo em “pousio”. Neste sistema de cultivo, as pragas têm se adaptado há vários anos, mesmo antes da entrada dos Bts. Fatores como condições climáticas favoráveis, de al-


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Entre as diversas lagartas que ocorrem no sistema de produção se destacam as do complexo Spodoptera (S. frugiperda e S. eridania)

tas temperaturas e de inverno ameno tornam-se ideais para a multiplicação dos insetos. Tanto a soja, como as demais culturas estão sujeitas ao ataque de vários insetos desde a germinação à colheita. No Manejo Integrado de Pragas (MIP) é fundamental o reconhecimento das pragas e seus inimigos naturais. O monitoramento é a operação que reúne informações para tomada de decisão de controle, entre elas os danos e a intensidade da ocorrência. Entretanto, nos programas de MIP, a tomada de decisão de controle é um fator que se modifica em função de diversos fatores como eficiências estratégias de manejo, pátio de máquinas, custos de controle, entre outras, variáveis ao longo dos anos. O MIP caracteriza-se por alterar o agroecossistema o mínimo possível, e a partir desse pressuposto, o controle de pragas na cultura da soja deixou de ser realizado através da dependência exclusiva de inseticidas químicos, para adotar sistemas que enfatizam o manejo da população de artrópodes no agroecossistema. Entre as pragas, as lagartas podem gerar grandes prejuízos na cultura da soja. Até a safra 2014/2015 eram consideradas por muitos pesquisadores como a praga principal. Uma das lagartas, a Helicoverpa armigera, na região dos Chapadões, teve seu custo de controle estimado na ordem

de 50 dólares por hectare, nas safras de 2013/2014 e 2014/2015. De modo geral, na região Centro-Oeste, a intensidade do ataque das diversas espécies de lagartas tem obrigado os produtores a realizarem de uma a sete pulverizações na cultura para o seu controle, em ambiente Bt e não Bt em soja. Entre as diversas lagartas no sistema de produção, se destacam as do complexo Spodoptera (Spodoptera frugiperda e S. eridania) e a Helicoverpa armigera, que nas condições de Cerrado apresentam alta frequência, destruindo folhas, vagens e grãos,

comprometendo a produção. No Brasil (por apresentar condições de vários ciclos, sobreposição de gerações destas pragas), tem se observado um aumento principalmente no número de indivíduos do complexo Spodoptera. Spodoptera frugiperda apresenta grande polifagia, o que leva a prejuízos em diversas culturas, como a soja, o algodoeiro e o milho, onde é praga principal. Na cultura da soja, é um inseto que nos primeiros instares tende a atacar as folhas, e com o desenvolvimento afeta diversas partes das plantas, incluindo as vagens e

Entre as pragas, as lagartas podem gerar grandes prejuízos na cultura da soja

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os grãos em formação. As lagartas podem vir a cortar as plantas jovens na base do caule e levar a menores estandes. Algumas plantas invasoras, como a corda-de-viola, a trapoeraba, o capim-amargoso, além de culturas de cobertura como milheto, braquiárias e nabo-forrageiro, se comportam como boas hospedeiras, o que proporciona o desenvolvimento e a permanência do complexo de Spodoptera nas áreas de cultivo. Quanto às características de S. frugiperda, destaca-se que a massa de ovos pode ter várias cores, mas na grande maioria, as posturas são acinzentadas a amarronzadas. Após a eclosão, as lagartas se alimentam nas folhas próximas, raspando-as. Em seguida, começa sua dispersão para plantas adjacentes. À medida que crescem, causam danos semelhantes a outras lagartas, provocando orifícios nas folhas e podendo atacar as vagens no seu desenvolvimento. Uma lagarta bem desenvolvida pode medir 5cm de comprimento, sendo que a duração dessa fase pode durar entre 12 dias e 30 dias. A cor da lagarta varia do cinza-escuro ao marrom, apresentando um “Y” invertido na parte frontal da cabeça. Quatro pontos pretos ao final do corpo também são características importantes na identificação. A pupa fica no solo. O adulto é uma mariposa que mede 3,5cm de envergadura, com asas anteriores mais escuras e desenhadas que as posteriores, lembrando

Distribuição de lagartas de Spodoptera eridania em talhão de soja. Fundação Chapadão safra 17/18. (Pontos vermelhos mais de 5 lagartas por metro)

que os adultos de machos e fêmeas são diferentes. A cópula ocorre à noite. É comum, em altas populações, observar adultos escondidos nas plantas mesmo durante o dia (Santos, 1999). S. eridania é uma espécie que tem aumentado sua frequência nas lavouras. Apresenta adultos com coloração parda, manchas prateadas nas asas e uma mancha de forma retangular no primeiro par de asas. A fêmea também põe os ovos em massas, podendo colocar até dois mil ovos no decorrer do ciclo. As lagartas possuem coloração marrom a escura, com uma faixa longitudinal amarela que se liga muitas vezes ao Y invertido na cabeça. Podem atingir 50mm de comprimento. Em soja Bt, esta espécie atualmente tem ocorrido em grande parte das áreas. Vale ressaltar que muitas vezes é percebida no campo em estádios de

Eficiência média de inseticidas no controle de Helicoverpa armigera em soja. Fundação Chapadão. Safra 2016/2017. G.83

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desenvolvimento mais avançado, o que dificulta o seu controle. O complexo de Spodoptera sp. dificulta o manejo em função de se adaptar ao sistema de produção e às condições do Cerrado brasileiro. Tem como hospedeiros alternativos o milheto e outras gramíneas, plantas daninhas e tigueras de milho, todas fornecedoras de populações para o início das infestações nas áreas. Outra espécie importante no sistema de produção é a Helicoverpa armigera. Praga altamente polífaga, pode se alimentar tanto dos órgãos vegetativos como reprodutivos de várias espécies de plantas de importância econômica no país. Seus prejuízos na região dos Chapadões alcançam a ordem de 40% na cultura da soja, e até 75% em algodoeiro. A espécie apresenta metamorfose completa, passando pelas fases de ovo, lagarta, pupa e adulto. O ovo, em sua porção apical, é liso, sendo o restante da superfície esculpido em forma de nervuras longitudinais. Possui coloração branco-amarelada com aspecto brilhante quando depositado, se tornando marrom-escuro próximo ao momento da eclosão. Depois da eclosão, as lagartas se alimentam das partes mais tenras das plantas, onde podem produzir um tipo de teia ou até mesmo formar um pequeno casulo, no caso da soja. O período larval da H. armigera é composto de seis períodos distintos. Nos primeiros instares, as lagartas apresentam colo-

Eficiência média de inseticidas (dose g i.a./ ha) aos 7 dias após a aplicação no controle de Spodoptera eridania em soja. Fundação Chapadão. Safra 2017/2018. G.101


ração que varia do branco-amarelado ao marrom-avermelhado. À medida que vão crescendo, a coloração pode variar do amarelo-palha ao verde, apresentando marrom lateralmente no tórax, no abdômen e na cabeça. A coloração variável é influenciada por sua alimentação e o ambiente. Do quarto instar em diante, as lagartas apresentam tubérculos abdominais escuros, que são bem visíveis na região dorsal, sendo esta a característica determinante para a identificação da espécie, também chamada por alguns especialistas de “sela”. Outra característica que a difere das demais é a textura coriácea do tegumento, que apresenta certa resistência a inseticidas. A pupa apresenta coloração amarronzada e superfície arredondada, desenvolvendo-se no solo. Os adultos machos são cinza-esverdeados, com uma banda ligeiramente mais escura no terço distal e uma pequena mancha escurecida no centro da asa, podendo ser melhor vista ao se verificar o inseto pela face inferior. Já as fêmeas apresentam asas dianteiras amareladas. As posteriores são claras e apresentam uma borda marrom em sua extremidade apical. As fêmeas têm longevidade média de 11,7 dias e os machos de 9,2 dias. Podem colocar de mil a até três mil ovos sobre as plantas hospedeiras. Normalmente, a oviposição é realizada à noite, com os ovos postos de forma isolada ou em pequenos agrupamentos, preferencialmente na face adaxial das folhas ou sobre os talos, flores, frutos e brotações terminais com superfícies pubescentes. Mesmo com todas as mudanças, o alicerce do Manejo Integrado de Pragas (MIP) está na boa amostragem de campo. O monitor deve realizá-lo obedecendo alguns pontos importantes, como a frequência de amostragem, em intervalos de cinco-sete dias, o bom número de pontos, que ofereçam representatividade da lavoura, além de uma boa acurácia com relação às pragas. O número de

Fotos Germison Tomquelski

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O monitoramento é a operação que reúne informações para tomada de decisão de controle, como danos e intensidade de ocorrência

pontos em um talhão é variável em função da operacionalidade, mas não se pode deixar de lado a questão da boa representação destas amostras. Não saber quem é a praga, quantos são e onde estão os insetos pode levar ao fracasso de qualquer estratégia adotada. É importante um cuidado maior na amostragem, principalmente em relação às lagartas do gênero Spodoptera, que apresentam distribuição desuniforme (ou seja, ocorrência em manchas nos talhões). Para H. armigera os maiores cuidados devem ocorrer na fase inicial, devendo o técnico desenrolar as folhas novas que porventura possam abrigar esta praga. É necessário também, no período reprodutivo, observar a sua ocorrência nas vagens, estimando a praga em porcentagem ou mesmo em lagartas por metro. Na utilização de cultivares Bts (com gene de resistência a lagartas), os cristais de B. thuringiensis, ao serem ingeridos pelas larvas sofrem

ação do pH intestinal e de proteases, que solubilizam o cristal e ativam as toxinas. Estas, por sua vez, se ligam a receptores localizados no tecido epitelial do intestino da larva, ocasionando a quebra do equilíbrio osmótico da célula, que se intumesce e rompe, propiciando o extravasamento do conteúdo intestinal para a hemocele do inseto. Em consequência, a larva para de se alimentar, entra em paralisia geral e morre por inanição ou septicemia. A estratégia de uso de plantas resistentes é muito bem vista por preservar grande parte dos inimigos naturais na cultura. No entanto, sua utilização precisa observar cuidados básicos como refúgio, sob pena de favorecer o processo de seleção de indivíduos resistentes. Quando se analisa a biotecnologia x Spodoptera em soja Bt, percebe-se que a batalha vem sendo vencida pela praga, com valores próximos de 20% de supressão da população. Isso porque a biotecnologia utilizada até 05


Soja • Agosto 2018 Eficiência média de inseticidas (dose g mL/ ha)no controle de Helicoverpa armigera em soja. Fundação Chapadão. Safra 2017/2018. G.47

a safra 17/18 expressa somente a proteína Cry1Ac, necessitando ser complementada para evitar prejuízos às lavouras. Sabe-se que o ambiente é fundamental para o desenvolvimento de pragas e devido à oferta de hospedeiros alternativos o ano inteiro no campo, o desenvolvimento inicial das lagartas pode ser garantido e permitir que migrem para plantas Bt, em instares de desenvolvimento mais avançados, causando algum tipo de dano, além de contribuir para o processo de resistência no campo. O manejo cultural é uma das práticas que tendem a suportar outras táticas de controle, e cada vez mais se faz necessário, sendo uma estratégia na diminuição do alimento para a praga. O vazio sanitário utilizado em doenças e em determinadas pragas auxilia por retirar, em certo momento, talvez o melhor hospedeiro. Porém, é necessário entender os outros hospedeiros alternativos para ter uma melhor eficiência deste método. Na safra 2016/2017, o Brasil alcançou mais de 50% da área com adoção da tecnologia Bt em soja. Em outras culturas, como o algodoeiro, chegou a 85% (Abrapa 2018), e o milho próximo a 91% (Alves et al, 2017). Um fato interessante reside no fato de que a quebra da resistência coincide como período em que o uso atingiu 06

mais de 50%, em alguns eventos Bts (Farias 2014). Da mesma forma, na soja Bt ocorreram na safra (2017/2018) os primeiros relatos de escapes no controle de H. armigera, com o desenvolvimento de lagartas na cultura a campo, sem a presença de misturas no talhão cultivado (Fundação Chapadão, 2018). A resistência é um processo de seleção de indivíduos no ambiente, ou seja, selecionar indivíduos capazes de tolerar doses tóxicas que seriam letais para uma população de indivíduos da mesma espécie. A taxa de mutação é muito baixa, e quase rara em alguns casos. Desta forma, toda ferramenta que apresente uma ação por maior tempo tende a selecionar mais os indivíduos resistentes. Assim, as plantas Bts tendem a ser grandes selecionadoras de indivíduos no ambiente, pois estão sempre expressando a proteína com ação aos insetos-alvo, que acabam acasalando e originando descendentes viáveis e tolerantes a esta forma de controle. Este fator-processo leva à hipótese de que aquilo que ocorreu com as culturas de milho e algodoeiro no Brasil poderia ocorrer também com a cultura da soja. Atualmente, tecnologias como Vt Pro (Cry1A.105+Cry2Ab2) e mesmo PowerCore (Cry1F, Cry1A.105

IRAC-BR

e Cry2Ab2) têm necessitado de até quatro aplicações em alguns casos específicos. Este mesmo cenário já foi observado em algodoeiro com tecnologias WS, com necessidade de até oito aplicações para o controle de lagartas que anteriormente eram alvo da tecnologia. Depois do relato de ataque de Helicoverpa armigera na cultura da soja, em ambiente Bt (Intacta RR2 Pro), se deu a divulgação da hibridização de H. armigera e H. zea, relatando populações brasileiras com o problema (Anderson et al 2018). Sabe-se que o feromônio para acasalamento é o mesmo, o que permitiria a estas espécies cruzarem. Para avaliar qual o impacto disto, ainda serão necessários vários estudos. No entanto, é preciso estar atento a possíveis falhas tanto na biotecnologia como em outras ferramentas, uma vez que as duas espécies já apresentam problemas de resistência. No entanto, vale ressaltar que a soja apresenta um fator a favor. A cultura expressa mais a proteína quando comparada às demais. Novos eventos vêm ao encontro dos anseios dos produtores e técnicos. Uma extensa série de genes de B. thuringiensis pode ser utilizada na transgenia, incluindo alguns produtos comercialmente disponíveis e pipelines, principalmente os que expressam as toxinas Cry1Ab, Cry2Ab, Cry2Ae, Cry1F e Vip3a.


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Entre as causas responsáveis pelas falhas da biotecnologia, a ausência do refúgio é apontada por vários pesquisadores. Em função da comodidade da tecnologia Bt, muitas vezes o produtor acaba deixando de lado essa técnica, consequentemente matando a efetividade deste controle. A liberação das cultivares transgênicas foi recomendada associada à área de refúgio. Para a cultura da soja, esta estratégia foi apresentada através de modelos matemáticos com a simulação de resistência, sendo necessários 20% de área de refúgio para durabilidade dessa tecnologia (Comissão Técnica de Biossegurança, 2005). Porém, devem ser obedecidos também diversos fatores como distância, tamanho de área, entre outros, para que os indivíduos suscetíveis e resistentes a esta tecnologia possam cruzar, diminuindo a rapidez da aquisição de resistência, além de servirem como hospedeiro de inimigos naturais. Uma das alternativas que podem ajudar a biotecnologia neste primeiro momento é o controle químico. Estratégia que o produtor mais realizou há alguns anos para uma ampla gama de pragas. No entanto, vale salientar que grande parte das moléculas brasileiras apresentou problemas de resistência. E isto é variável em função das diversas populações, que apresentam suscetibilidades diferentes dentro do Brasil. Algumas importantes ferramentas, como reguladores de crescimento de insetos, têm diminuído sua eficiência em determinadas regiões. Estes problemas de desgastes das ferramentas no primeiro momento são contornados com associações a outros grupos químicos. A pesquisa de novas moléculas diminuiu o ritmo nos últimos anos, após a entrada de Bts. Porém, o alerta de que novas pragas viriam - e mesmo antigas - e poderiam se adaptar no sistema em questão de tempo começou a ser apontado por pesquisadores.

Germison Tomquelski

Mesmo com o menor ritmo de pesquisa de novas moléculas, algumas têm apresentado controle satisfatório. É possível citar clorfenapir, indoxacarb, espinetoram e o obenzoato de emamectina (anteriormente liberado emergencialmente para o controle de Helicoverpa armigera e agora registrado em diversas culturas e estados, para o combate de lagartas de difícil controle). Além do controle químico, a adoção de outras táticas como o controle biológico tem aumentado. Porém, ainda é necessário maior entendimento da sincronia dos diversos agentes com Bts. Por isso, compreender o manejo dentro do sistema de produção acaba sendo muito importante para as tomadas de decisões em âmbito social, ambiental e para a rentabilidade da agricultura. Outra questão importante reside no fato de que o critério operacional deve ser bem entendido, de modo a

não se sobrepor ou subordinar o MIP, sob pena de, mesmo com as melhores alternativas de manejo, comprometer o resultado esperado. A integração de tecnologias é o caminho para o manejo correto. Bom conhecimento da praga e do sistema de produção, aliado a boas amostragens, proporcionará ao produtor o controle e consequentemente o aumento da produtividade-rentabiC lidade nas culturas. Germison Tomquelski e Claudemir Theodoro, Fundação Chapadão Encarte Técnico Circula encartado na revista Cultivar Grandes Culturas nº 231 • Agosto 2017 • Capa - Germison Tomquelski Reimpressões podem ser solicitadas através do telefone: (53) 3028.2075

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