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Grupo Cultivar de Publicações Ltda. CGCMF : 02783227/0001-86 Insc. Est. 093/0309480 Rua Sete de Setembro 160 – 12º andar Pelotas – RS 96015 – 300
Maior eficiência Ação ovicida e mistura com atrativo alimentar melhora performance de inseticidas no controle de lagarta-do-cartucho
www.grupocultivar.com Diretor de Redação Schubert K. Peter
“Cultivar” e “Agrotécnica” são marcas registradas do Grupo Cultivar de Publicações
Cultivar Grandes Culturas Ano V - Nº 57 Dezembro 2003 / Janeiro 2004 ISSN - 1518-3157
Cercosporiose no café Uma das mais antigas doenças do cafeeiro pode ser evitada com o correto manejo de mudas no viveiro
www.cultivar.inf.br cultivar@cultivar.inf.br Assinatura anual (11 edições*): R$ 98,00
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(*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan)
Números atrasados: R$ 15,00 Assinatura Internacional: US$ 72,00 68,00 • Editor:
Charles Ricardo Echer
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• Consultor
Newton Peter OAB/RS 14.056
A mancha cresce
• Coordenador de Redação
Janice Ebel
O uso de grãos produzidos sem normas de fiscalização e de baixa qualidade facilita a disseminação da mancha parda nos arrozais
• Revisão
Vandelci Ferreira • Design Gráfico e Diagramação
Cristiano Ceia _____________
• Gerente Comercial
Neri Ferreira
Erro de Estratégia
• Assistentes de Vendas
Pedro Batistin Érico Grequi
Desconhecimento do manejo da lagartada-soja leva ao aumento de pragas secundárias e percevejos
_____________
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• Gerente de Circulação
Cibele Oliveira da Costa • Assinaturas
Jociane Bitencourt Luceni Hellebrandt • Expedição
Edson Krause Dianferson Alves • Impressão:
Kunde Indústrias Gráficas Ltda. NOSSOS TELEFONES: (53) • ATENDIMENTO AO ASSINANTE:
3028.4013/3028.4015 • ASSINATURAS:
índice
Nossa capa Foto Capa / Dirceu Gassen
Diretas
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Controle de ovos de Spodoptera
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Cercóspora no café
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A mancha parda cresce
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Erros na aplicação de inseticidas
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Reguladores de crescimento
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Mapa da ferrugem no Paraná
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Coluna Confaeab
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Bayer lança Sphere
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Coluna Aenda
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Agronegócios
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Mercado agrícola
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3028.4010/3028.4011 • GERAL
3028.4013 • REDAÇÃO:
3028.4002 / 3028.4003 • MARKETING:
3028.4004 / 3028.4005 • FAX:
3028.4001 Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: cultivar@cultivar.inf.br Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.
diretas Transgênico O Pesquisador Dionísio Luiz Pisa Gazziero, da Embrapa Soja, concluiu sua tese de doutorado na Universidade Estadual de Londrina. O tema aborda o manejo de plantas daninhas em áreas cultivadas com soja geneticamente modificada para resistência ao glyphosate. O trabalho estudou a aplicação de glyphosate em sistemas de produção, dando-se ênfase ao controle da trapoeraba, uma espécie considerada tolerante ao produto, bem como a deposição do herbicida em diferentes épocas de aplicação e sua combinação com outros compostos.
Posse No último dia 14 de novembro ocorreu a solenidade de posse do novo chefe-geral da Embrapa Agropecuária Oeste, Dourados-MS , Mário Artemio Urchei., assim como, dos adjuntos Renato Roscoe e Auro Akio Otsubo.“Vamos continuar as atividades de pesquisa para as cadeias produtivas do agronegócio, buscando desenvolver sistemas competitivos que amparem os segmentos exportadores e do Mario Urchei (centro) mercado interno, na perspectiva da agregação de valor aos produtos primários e da geração de emprego, por meio da geração de tecnologias ambientalmente corretas e socialmente justas”, declarou o novo chefe.
Mudanças
Unimilho O Engenheiro Agrônomo Luiz Fernando Gonçalves, assume a presidência da União dos Produtores de Sementes de Milho da Pesquisa Nacional – Unimilho. Formado pela Universidade Federal de Viçosa-MG e proprietário da Geneze Sementes em Paracatu-Mg, o novo presidente assume dando continuidade a gestão anterior, buscando melhorar a atuação das empresas associadas com tecnologia, como a Embrapa. A entidade é parceira importante da Embrapa na transferência e difusão de tecnologia, gerando receita com sementes básicas e royalties.
Progresso A Pioneer, empresa voltada para a tecnologia genética, encontra-se em constante crescimento no mercado tecnificado do campo, especialmente nas culturas do milho e da soja. Em 2003 a empresa obteve o melhor resultado operacional da sua história no Brasil - mais de 1.600.000 sc de sementes de milho e quase 700.000 sc de soja. Para 2004/2005 a Pioneer já prevê a construção de uma nova unidade de beneficiamento de sementes híbridas de milho em Formosa-GO, além de duas estações de pesquisa de milho, uma em Passo Fundo-RS e outra em Sorriso-MT. Os investimentos devem alcançar US$ 60 milhões de dólares.
Personalidade
Luiz Pisa Gazziero
Alternativa A região Celeiro do Rio Grande do Sul (noroeste do estado), grande produtora de soja, busca em parceria com a Embrapa Clima Temperado– Pelotas-RS investir em fruticultura. Até 2013, os 21 municípios envolvidos, pretendem implantar 1900 hectares de fruteiras, mesclando espécies temperadas e tropicais, visando atingir mercados interno e externo, de acordo com as variedades escolhidas.
João Luiz Ribas Pessa vice-presidente da AMPA, recebeu homenagem, concedida pela Associação Mato-grossense dos Produtores de Algodão através do troféu “Personalidade do algodão 2003” no hotel Blue Tree Park, em Brasília. O troféu é destinado às pessoas que mais se empenharam pela divulgação da atividade durante o ano. “Apenas represento uma gama de excelentes companheiros que, por meio das diversas associações de algodão em todo o Brasil, fizeram com que a cotonicultura novamente se tornasse viável”, explica Pessa.
A Agilent Technologies acaba de lançar método rápido para identificação de soja transgênica. O Bionalyzer Agilent 2100 com o kit protein 200 plus LabChip permite identificar a concentração dos dois mais importantes agregados protêicos da soja, a conglicinina-beta e a glicininina. O novo método é um sistema de eletroforese microfluídico automatizado, e analisa a composição genética da soja em menos de 45 minutos.
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Cultivar
João Pessa
Insetos quarentenários Lançado CD-ROM que traz o levantamento de quinhentos e dois insetos de expressão quarentenária para o Brasil. Para cada uma das espécies, são apresentadas família, plantas hospedeiras, via de ingresso e distribuição geográfica de ocorrência. Insetos quarentenários são os que não existem no país ou que existem em áreas conhecidas e estão sob controle oficial e que têm expressão econômica potencialmente prejudicial sobre determinada cultura, área ou região. O CD na versão impressa tem 702 páginas e pode ser adquirido pelo endereço: vendas@cenargen.embrapa.br
Trigo no RS
Teste Rápido Cornélis Souilljee
Produtor de Carazinho-RS recupera produtividade de trigo dos últimos dez anos. Enquanto a média de produção no estado é de 2,9 t/ha, Cornélis Maria Souilljee deverá colher um volume superior a 4 t/ha. O sucesso obtido tem como justificativa a combinação da assistência técnica precisa da Cooplantio – Cooperativa dos Agricultores de Plantio Direto e da boa disposição do agricultor em colocar em prática todas as recomendações quanto à adubação, controle de pragas e plantas daninhas e o perfeito balanceamento nutricional das plantas, declara o gerente da cooplantio Cláudio Kovaski.
Nova Agência A FMC Agricultural Products, uma das maiores fabricantes de defensivos agrícolas do país, está sendo atendida desde o início de novembro pela agência Creattore Comunicação Integrada. A nova agência é de Campinas e vai gerenciar verba de R$ 1 milhão em marketing e propaganda, incluindo ações de lançamento de novos produtos e participação em feiras e eventos para produtores rurais brasileiros. A Creattore apresenta perfil adequado por possuir atributos como criatividade, inovação e experiência no desenvolvimento de trabalhos Business to Business e CRM, garante a Coordenadora de Comunicação da FMC, Fernanda Teixeira.
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Adilson Penariol
Welles Pascoal
Adilson Luis Penariol deixou a Monsanto para trabalhar na Cooperativa dos plantadores de Cana da Zona de Guariba (SP), onde atua como Gerente da Divisão Agrícola”.
Rastreabilidade Está em discussão a adoção de um sistema único de rastreabilidade de fardos de algodão no país. Desde a safra de 2002/2003 a Associação de Mato-Grossense de Produtores de Algodão vem utilizando o sistema de identificação de origem do produto através de etiquetas. Funcionam por meio de código de barras que armazenam informações referentes ao produto. O diretor executivo da AMPA, Décio Tocantins garante que o novo sistema de rastreabilidade pode ser utilizado em qualquer lugar do mundo e poderá dar fim aos roubos de carga, além de facilitar a movimentação de estoques.
Evento Mundial Acontece simultaneamente VII Conferência Mundial de Pesquisa da Soja, IV Conferência Internacional sobre Processamento e Utilização da Soja e o III Congresso Brasileiro de Soja, de 29 de fevereiro a 05 de março de 2004, no Hotel Bourbon, em Foz do Iguaçu-PR,. “É a oportunidade para especialistas brasileiros e de outros países apresentarem os principais avanços tecnológicos da soja”, afirma o Pesquisador da Embrapa Soja e vicepresidente da Conferência, Amélio Dall’ Agnol.
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Milho Arquivo
Maior eficiência Ação ovicida e mistura com atrativo alimentar melhora performance de inseticidas no controle de lagarta-docartucho, principal praga em milho e algodão
A
síntese de novas moléculas quí micas, para uso na agricultura, enfrenta tempos de dificuldades devido ao crescente aumento nas exigências para registro dos produtos junto aos órgãos governamentais, somado ao aumento dos custos do desenvolvimento. Atualmente, em nível mundial, cerca de 50 mil substâncias são sintetizadas a cada ano. Destas, cerca de 500 são selecionadas como possíveis candidatas. No entanto, com o andamento dos estudos, em média, 50 prosseguem para ensaios de campo, mas somente duas são apresentadas para registro e apenas uma vai para o mercado. O total de recursos investidos pelas Empresas, para a síntese e desenvolvimento de uma molécula, varia de 200 a 250 milhões de dólares e o tempo estimado, da síntese
até a entrada no mercado, varia de 10 a 12 anos. Além da carência de novas moléculas, os órgãos governamentais, em nível mundial, estão em plena campanha para a retirada de mercado de produtos com potencial forte de intoxicações humanas ou severas contaminações ambientais. É o caso dos inseticidas organofosforados que tendem a serem, paulatinamente, substituídos por inseticidas de grupos químicos modernos. Com isso, muitas empresas estão buscando formas de revitalização de alguns defensivos, em uso há muito tempo, mas com perfil toxicológico favorável. É o caso do cartap (Classe toxicológica III), que é um inseticida de uso antigo no Brasil, que está sendo pesquisado quanto a sua ação
ovicida e sua atuação no controle de Lepidópteros (mariposas) no estágio adulto, quando misturados a substâncias atrativas às mariposas como açúcar ou melaço. A eficiência dos inseticidas sobre as pragas é, normalmente, bastante estudada. Entretanto, a ação destes inseticidas sobre os ovos dos insetos pragas é, para maioria dos casos, pouco conhecida. A propriedade ovicida de um inseticida pode proporcionar maior período de controle sobre as pragas devido à alta eficiência inicial, pois resulta na eliminação tanto das pragas já presentes como na inviabilização dos ovos colocados, levando a um maior período para o restabelecimento populacional da praga.
Gráfico 01 - Efeito de dosagens de cartap e clothianidin sobre ovos da lagarta-do-cartucho do milho, Spodoptera frugiperda, em laboratório. Porcentagem média de lagartas eclodidas por tratamento até 10 dias após a aplicação
Geraldo Papa, professor da Unesp, avalia a eficiência de ovicida para controle de Spodoptera frugiperda
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Cultivar
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Fotos Geraldo Papa
Gráfico 02 - Efeito de dosagens de cartap sobre ovos de Spodoptera frugiperda (provenientes de algodoeiro) em laboratório. Porcentagem média de lagartas eclodidas por tratamento até 10 dias após a aplicação
Ovo de Lagarta-da-maçã do algodoeiro, Heliothis virescens
A ação ovicida do cartap vem sendo estudada para diversas espécies de Lepidopteros pragas. Na Unesp, Campus de Ilha Solteira/SP, foi verificado a atividade de cartap sobre ovos de spodoptera frugiperda, praga importante do milho (lagarta-do-cartucho) e do algodão no Brasil. O experimento foi instalado no Laboratório de Entomologia da Unesp, em Ilha Solteira/ SP. Os ovos foram obtidos através da criação de S. frugiperda, iniciada a partir de lagartas coletadas em campo na cultura do milho e mantidas em laboratório, alimentando-se de folhas de milho. As pupas ob-
tidas foram separadas em casais e colocadas em gaiolas de vidro forradas com papel de filtro. Após as posturas, ovos com um dia de idade foram separados com auxílio de pincel, em lotes de 110 ovos. Cada lote constituiu uma parcela. A análise dos resultados mostrou que cartap, nas dosagens a partir de 300 g i.a./ha mostraram ação ovicida sobre S. frugiperda, superior a 95% (Gráfico 01). Em experimento semelhante, porém utilizando-se ovos de S. frugiperda, provenientes da cultura do algo-
Mariposa da lagarta-rosada do algodoeiro, Pectinophora gossypiella
Geraldo Papa
Gráfico 03 - Efeito de dosagens de cartap e clothianidin sobre ovos de Heliothis virescens em laboratório. Porcentagem média de lagartas eclodidas por tratamento até 10 dias após a aplicação
Lagarta-da-maçã do algodoeiro, Heliothis virescens. Abaixo já em fase adulta
dão, o cartap mostrou ação ovicida próxima de 100% (Gráfico 02). Para a lagarta-da-maçã do algodoeiro, Heliothis virescens, as pesquisas mostraram inviabilidade de ovos da mariposa com aplicação de cartap, em dosagens a partir de 300 g i.a./ha, superiores a 90% (Gráfico 03). Além da ação ovicida, outra alternativa para melhorar a performance de alguns inseticidas é a mistura com atrativo alimentar para mariposas, como açúcar ou melaço. O princípio baseia-se na necessidade de, após o acasalamento, a fêmea passar o período de pré-oviposição procurando por alimentos a base de proteína e carboidrato, necessários para a produção de ovos férteis. Assim, é possível potencializar a ação de inseticidas no controle de adultos de Lepidópteros, que, conseqüentemente, evitará a oviposição, reduzindo a formação das novas gerações e os danos à cultura. Como o açúcar e o melaço atuam como atrativo às mariposas adultas, não há necessidade da aplicação em área total na lavoura. Os inseticidas poderão ser pulverizados em faixas ou apenas nas bordaduras. As características desejadas nos inseticidas, para o sucesso da mistura com atrativo alimentar são que, os mesmos não possuam odores que possam atuar como repelentes. Vários trabalhos de pesquisa estão sendo conduzidos para verificar a performance de alguns inseticidas, com características favoráveis para atuarem como isca, para o controle de adultos de lagarta rosada, Pectinophora gossypiella, e curuquerê, Alabama argillacea, em algodoeiro (Gráficos 04 e 05). O atual avanço tecnológico na área de Manejo Integrado de Pragas tem proporcionado a introdução de novas tecnologias
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Gráfico 04 - Efeito de cartap e betaciflutrina misturado a melaço no controle de adultos de Lagarta rosada, Pectinophora gossypiella, em algodão. Porcentagem média de mortalidade de adultos por tratamento aos 1, 2 e 3 dias após a aplicação.
Gráfico 05 - Efeito de cartap, cartap + atrativo (melaço) e acetamiprid no controle de adultos de curuquerê, Alabama argillacea, em algodão. Porcentagem média de mortalidade de adultos por tratamento aos 1, 3 e 6 dias após a aplicação.
como formulações especiais, que, em associação com atrativos ou estimulantes alimentares, permitem a utilização mais segura e mais adequada de agroquímicos para uso na agricultura, contribuindo para um
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manejo mais racional no controle de pragas C e maior segurança aos agricultores. Geraldo Papa Unesp - SP
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Café
Charles Echer
tismo das mudas; b) em pós-plantio: desfolhamento e atraso no crescimento das plantas; c) em lavouras novas: queda de folhas, frutos e seca de ramos produtivos, após as primeiras produções; d) em lavouras adultas: queda de folhas, amadurecimento precoce, queda prematura e chochamento dos frutos. As lesões funcionam como uma entrada para outros fungos que depreciam a qualidade do café.
FATORES QUE FAVORECEM A DOENÇA
Café em perigo A baixa qualidade dos frutos, através do amadurecimento precoce e chochamento provocada pela cercosporiose pode ser evitada pelo correto manejo da cultura a partir das mudas ainda no viveiro
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cercosporiose é uma das doenças mais antigas do cafeeiro, tanto na América do Sul, quanto na América Central. Na Colômbia, a cercosporiose é considerada uma das principais enfermidades do cafeeiro por ser amplamente distribuída e por ocasionar grandes perdas na produção. No Brasil, causa também perdas na produtividade, além de afetar o tipo e a qualidade do café produzido. O agente causal dessa doença é o fungo Cercospora coffeicola Berk & Cook, que recebe várias denominações, dependendo da região onde incide, como: cercosporiose, mancha-de-olho-pardo, olho-de-pomba e olho-pardo. Os sintomas característicos nas folhas são manchas circulares de coloração castanho-clara a escura, com o
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Cultivar
centro branco-acinzentado, quase sempre envolvidas por um halo amarelado. Nos frutos, ocorrem lesões deprimidas de coloração escura, as quais se desenvolvem no sentido polar. Podem ocorrer em frutos verdes, causando maturação precoce da casca em tomo da mancha. Nos últimos anos, têm sido observados sintomas diferentes nas folhas, caracterizados por manchas escuras sem halo amarelado que, em algumas regiões, têm sido denominadas cercospora negra. Essa doença está presente em todas as regiões cafeeiras do Brasil, causando prejuízos tanto em mudas no viveiro, como em plantas novas e adultas no campo. Os principais danos provocados são: a) em viveiros: queda de folhas e raqui-
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Em geral, o fungo necessita de umidade relativa alta, temperatura baixa e excesso de insolação, para o seu desenvolvimento. Nos viveiros, além das condições climáticas já citadas, os substratos pobres em matéria orgânica ou sem as devidas correções químicas, com relações desequilibradas dos nutrientes e solos com textura inadequada (muito argilosos ou muito arenosos) são fatores que podem predispor as mudas a uma incidência da cercosporiose. Nos plantios realizados no final do período chuvoso (início da seca), é comum ocorrerem ataques severos do fungo, promovendo um desfolhamento acentuado das plantas. O déficit hídrico, os ventos frios ou quaisquer condições adversas após o plantio predispõem as mudas ao ataque da cercosporiose. A incidência é ainda mais severa se o preparo das covas ou dos sulcos de plantios for inadequado. Em lavouras adultas, além das condições climáticas, a nutrição deficiente e/ou desequilibrada em solos muito argilosos, muito arenosos ou solos compactados, assim como, sistemas radiculares deficientes ou pião torto são fatores que predispõem as plantas à doença. As condições do solo e do sistema radicular influenciam diretamente a nutrição da planta. Inúmeros trabalhos indicam que a nutrição deficiente ou desequilibrada tem efeito direto na intensidade de ataque da Cercospora. Doses maiores de N diminuem a incidência da cercosporiose, enquanto que o K interage negativamente com N, diminuindo o efeito deste. Os desequilíbrios da relação N/K também favorecem o desenvolvimento da doença. Lavouras com deficiência de N ou excesso de K sofrerão maior incidência da doença. Ao contrário do que ocorre com a ferrugem, a incidência da cercosporiose é menor nos plantios adensados (Gráfico 1). Além do auto-sombreamento, a maior disponibilidade de água e de minerais desfavorece à doença.
CONTROLE CULTURAL Sob o ponto de vista do manejo integrado, a cercosporiose ou olho-pardo é uma do-
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Gráfico 1 – Porcentagem de folhas com cercosporiose do cafeeiro nas cultivares Mundo novo e Catuaí, nas densidades de plantio 10000, 5000 e 2857 plantas por hectare. EPAMIG – São Sebastião do Paraíso, MG. 1999, 2000 e 2001.
t) adicionar nutrientes em quantidades adequadas.
Vicente Carvalho
Fases de plantio e pós-plantio a) evitar o plantio em solos arenosos e/ ou pobres; b) fazer um bom preparo do solo, livre de compactações e adensamentos para proporcionar um bom arejamento e desenvolvimento das raízes; c) fazer, com certa antecedência, a análise de solo e as correções necessárias, um bom preparo das covas e dos sulcos de plantio. Seguir um plano de adubação e nutrição adequado, incluindo sempre a utilização de compostos orgânicos;
ença, com maior possibilidade de ser controlada através do manejo e de práticas culturais, podendo até dispensar o uso de agroquímicos. Práticas culturais em viveiros a) instalar os viveiros em lugares secos e arejados; b) controlar o ambiente do viveiro, evi-
tando-se alta umidade, baixas temperaturas, ventos frios ou excesso de insolação; c) encher os saquinhos com solo de boa textura, a fim de proporcionar um substrato com boa porosidade; d) preparar o substrato com esterco puro e bem curtido; e) manter as mudas com umidade adequada, evitando-se o excesso ou a sua falta;
Lesões de Cercospora coffeicola causam desfolhamento precoce prejudicando o desenvolvimento das planta
Fotos Vicente Carvalho
Frutos apresentando amadurecimento precoce devido à incidência da doença
d) estar atento ao controle dirigido, principalmente se o plantio for feito no final do período chuvoso, pois o excesso de insolação, ventos e a deficiência hídrica predispõem as plantas à incidência da cercosporiose. Lavouras adultas a) fazer o planejamento das adubações, principalmente durante as primeiras produções dos cafeeiros, a fim de evitar o desequilíbrio da relação parte aérea/ sistema radicular, condição que não favorece à doença; b) fazer o acompanhamento periódico do estado nutricional das plantas, através de análises foliares e de solo; c) manter o equilíbrio da relação dos teores foliares de N/K em lavouras adultas, principalmente em anos de carga pendente alta, visando diminuir a incidência da cercosporiose; d) manter os cafeeiros sombreados ou
em sistemas de plantio adensado, a fim de reduzir a incidência da doença.
CONTROLE DIRIGIDO Quando o controle cultural não for suficiente para reduzir a doença, tanto nas mudas no viveiro, no campo após o plantio ou cafeeiros já em produção, a doença deve ser controlada com aplicação de fungicidas específicos, logo após o aparecimento dos primeiros sintomas. Dois grupos de produtos podem ser usados: a) Preventivos (contato). Produtos que aplicados na superfície das folhas constituem uma barreira tóxica capaz de evitar a penetração do fungo, mediante a inibição de germinação dos esporos. Nesse grupo de fungicidas estão os cúpricos (produ-
tos a base de cobre), que apresentam algumas vantagens como: atuam bem sobre outros patógenos como a ferrugem, que é considerada a principal doença do cafeeiro; fonte de cobre como nutriente para a planta; efeitos benéficos na qualidade, na retenção de folhas e frutos com reflexos positivos na produção e adaptável a vários programas de controle. b) Curativos e erradicantes (sistêmicos). Produtos que atuam protegendo as folhas, curando ou mesmo erradicando a doença depois de instalada, pois translocam dentro da planta. Nesses grupos os principais fungicidas são os triazóis, estrobirulinas, benzimidazóis, ditiocarbamatos, misturas pré-formuladas desses fungicidas e outros. c) Uma outra alternativa que tem sido utilizada e que pode ser um bom sistema de controle é o uso combinado de cúpricos (preventivo de contato) com sistêmicos, tanto em misturas pré-formuladas como em aplicações separadas em épocas distintas. De um modo geral essas combinações em um programa de controle, alia os benefícios dos cúpricos com os dos sistêmicos dando um eficiente controle tanto da cercosporiose como da ferrugem. As aplicações podem ser feitas de dezembro/janeiro a março/abril e a época de maior Incidência da doença é março/abril (gráfico 2), período que coincide com a fase de maturação dos frutos, podendo causar sérios prejuízos. Deve-se seguir rigorosamente o intervalo de 30 dias entre C as aplicações. Vicente Luiz de Carvalho, Epamig/CTSM Marcelo Muniz Benedetti e João Paulo Feliconi Carvalho UFLA
Gráfico 2 – Curva de progresso da cercosporiose do cafeeiro, EPAMIG – São Sebastião do Paraíso, MG
Segundo Vicente de Carvalho, a nutrição deficiente ou desiquilibrada tem efeito direto na intensidade do ataque da doença
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Cultivar
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Fotos Valácia Lobo
Arroz
A mancha cresce Grãos produzidos sem normas de fiscalização e qualidade são utilizadas como sementes pela maioria dos produtores, o que facilita a disseminação da mancha parda a cada safra
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mancha parda do arroz, tam bém denominada helmintospo riose, tem sido considerada a segunda doença mais importante para a cultura, depois da brusone (Pyricularia grisea). É causada pelo fungo Drechslera oryzae (Breda de haan) Subram & Jain, tendo como estágio perfeito Cochliobolus miyabeanus (Ito & Kuribayashi) Dreschs & Dastur. A mesma ocorre tanto em arroz irrigado quanto em arroz de terras altas e em todas as regiões do Brasil, sendo mais expressiva nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Na região Sul, ocorre mais nas lavouras semeadas continuamente com arroz, sem a prática da rotação, e que apre-
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Cultivar
sentam problemas de fertilidade de solo. A doença pode manifestar-se em qualquer fase de crescimento da planta, causando lesões no coleóptilo, nas folhas, nas panículas e nos grãos. Os sintomas, geralmente, manifestam-se nas folhas logo após a floração e, mais tarde, nas glumelas e grãos. Quando ocorre nos coleóptilos, estes apresentam lesões marrons, circulares ou ovais, durante a emissão das plântulas. Nas folhas, as lesões típicas são circulares ou ovais, em geral de coloração marrom, com centro acinzentado ou esbranquiçado. Os sintomas são variáveis conforme a cultivar e o grau de suscetibilidade da mesma. As lesões nas folhas superiores podem
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fornecer inóculo para a infecção dos grãos, nos quais as manchas têm coloração marrom escura, que muitas vezes coalescem, cobrindo-os por completo. A suscetibilidade à mancha parda aumenta com o aumento da idade da planta, sendo as espiguetas mais suscetíveis à infecção, desde o período de floração até a fase de grão leitoso. Sem dúvida alguma, a incidência mais crítica ocorre nesta fase final de desenvolvimento da cultura. A doença pode afetar a qualidade (grãos manchados, gessados e quebradiços) e/ou a produtividade dos grãos, seja no peso dos grãos ou na porcentagem de grãos cheios, acarretando redução no rendimento de engenho. Existem relatos de reduções de 27 a 82% no número de grãos por panículas e 12 a 30% no peso dos grãos, conforme a cultivar plantada. Em casos severos, todos os grãos da panícula podem apresentar-se manchados. A mancha parda, em geral, está associada a plantas fracas, cultivadas sob condições de estresse, como alta densidade de plantas, estresse hídrico, solos deficientes em nutrientes, especialmente potássio, manganês, magnésio, ferro, cálcio e silício. A falta ou excesso de nitrogênio torna as plantas mais sensíveis à doença, principalmente em solos de cerrado, enquanto o uso de silicato de cálcio aumenta a resistência das plantas. O desenvolvimento da doença é favorecido por alta umidade e temperaturas entre 20 e 30 0C, bem como pelo molhamento contínuo das folhas, causados por chuvas ou por períodos prolongados de orvalho e baixa luminosidade. O fungo pode sobreviver por três anos ou mais nos grãos, sobrevive ainda em restos culturais e em várias outras gramíneas. A transmissão via semente é altamente eficiente, chegando a 100%, mesmo quando a infecção é baixa. A importância de D. oryzae foi demonstrada, internacionalmente, constatando-se sua presença em 76% de 686 amostras de sementes de arroz provenientes de diversos países, com incidência variando de 1 a 90% de sementes infectadas. Na região Centro-Oeste brasileira, segundo levantamento feito em sementes de 42 cultivares, a freqüência média do fungo nas cultivares foi de 94% e a incidência média nas sementes foi 38%. As sementes infectadas têm a qualidade fisiológica comprometida apresentando
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baixo poder de germinação, enfraquecimento, má formação e morte das plântulas. Esses fatores, associados a inúmeros outros, explicam os casos de baixo desempenho das sementes no campo, o qual pode ser melhorado pelo tratamento das sementes com fungicidas, que além de erradicar ou reduzir o inóculo inicial, aumentar a germinação e o vigor das sementes infectadas, esse tratamento pode proteger as sementes contra patógenos do solo, durante a germinação e também de patógenos da parte aérea, na fase inicial de desenvolvimento da planta. O sucesso do manejo da doença depende da disponibilidade de técnica ou técnicas disponíveis para cada sistema de cultivo e para cada situação particular. As sementes de arroz constituem importante fonte de inóculo primário para diversos patógenos, os quais podem introduzir em uma nova região novas raças fisiológicas e/ ou novos isolados com diferente especialização patogênica, sendo consideradas importantes veículos de disseminação e sobrevivência de patógenos na natureza. Portanto, o uso de sementes sadias e de boa procedência evita o acúmulo de inóculo inicial, bem como a disseminação do patógeno. Infelizmente, na cultura do arroz, como acontece com outras culturas, somente uma pequena parcela (aproximadamente 20%) dos produtores usa sementes, produzidas com qualidade e sob as normas de fiscalização de produção de sementes. A maioria usa grãos que são produzidos, colhidos, armazenados e na safra seguinte, usados como sementes. Aliado ao uso de sementes sadias e de
boa qualidade, um dos métodos mais eficientes, econômicos e ambientalmente saudável de controle de doenças é o uso de cultivares resistentes, e há muito tempo essa estratégia tem sido considerada a melhor e a mais acessível para proteger plantas contra doenças, não sendo diferente no caso do arroz. Até pouco tempo, no entanto, a maioria dos programas de melhoramento genético, visando resistência a doenças de arroz, estavam direcionados e com esforços concentrados na busca de resistência à brusone (principal doença da cultura). Atualmente, o Programa de Melhoramento de Arroz da Embrapa Arroz e Feijão tem concentrado esforços no momento da seleção de linhagens dentro do programa, visando resistência também as outras doenças da cultura, como a mancha parda, por exemplo. A maioria das cultivares disponíveis no mercado não apresentam resistência, o que se tem são cultivares com diferentes graus de resistência. A doença está se tornando mais importante a cada ano, principalmente nos cultivos de arroz irrigado e nas regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste, onde as condições climáticas são altamente favoráveis ao desenvolvimento do fungo. No Pará, Rondônia e Tocantins, a incidência da doença tem aumentado nas últimas safras resultando em alta incidência de mancha nos grãos, provocada principalmente por D. oryzae. Estes locais são merecedores de especial atenção na avaliação e seleção de linhagens para o desenvolvimento de novas cultivares, bem como no momento da recomendação das mesmas. O manejo integrado da doença, inclu-
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A B
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Sintomas de mancha parda na folha em três cultivares diferentes
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Cultivar
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Fotos Valácia Lobo
Lesões de Drechslera oryzae surgem geralmente após o florescimento, podendo atingir as panículas, afetando os grãos
indo as medidas preventivas já citadas, como uso de sementes sadias e de boa qualidade; uso de cultivares resistentes; adequada fertilização dos solos, com atenção especial à adubação com potássio; rotação de culturas; eliminação dos restos culturais; controle de plantas daninhas, principalmente gramíneas; manejo adequado da irrigação, associado ao controle químico tanto no tratamento de sementes quanto em pulveriza-
O fungo pode sobreviver por mais de três anos nos grãos, restos culturais e outras gramíneas, explica Valácia Lobo
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ções pode controlar ou reduzir significativamente a incidência da doença. Os fungicidas químicos têm sido utilizados com sucesso no tratamento de sementes de arroz visando o controle de fungos em geral. No Laboratório de fitossanidade da Embrapa Arroz e Feijão, a germinação e o vigor de sementes da cultivar Primavera aumentou de 53% para 97% após o tratamento das mesmas com fungicidas. O tratamento de sementes que tem oferecido melhor resultado é a combinação dos princípios ativos carboxin + thiram. A pulverização com fungicidas sistêmicos difenoconazole, trifloxystrobin + propicanazole, na época da emissão das panículas, tem mostrado resultados satisfatórios no controle ou redução da doença nos grãos. Em lavouras de arroz irrigado e/ou destinadas à produção de sementes, recomenda-se duas aplicações, uma na emissão das panículas e outra sete a dez dias após a primeira. Os resultados de vários trabalhos realizados, permitem considerar o tratamento de sementes como um prática bastante eficaz e recomendável a ser incorporada nas estratégias de controle integrado de doenças, principalmente considerando a alta freqüência e a alta incidência de patógenos presentes nas sementes de arroz. No
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entanto, para o uso de fungicidas, em pulverizações, alguns aspectos devem ser considerados, como a definição dos períodos e fatores que favorecem o desenvolvimento da doença, bem como uma avaliação criteriosa do nível de dano, ficando clara a necessidade da análise da viabilidade econômica(custo x benefício) para definir a conveniência da utilização do controle químico. Os fungicidas foliares com ação protetora não têm fornecido controle da doença. Dos produtos avaliados, até o momento, nenhum deles foi 100% eficiente no controle da enfermidade, porém, quando os mesmos são usados de maneira integrada a outras práticas de manejo e controle, tem se conseguido uma redução significativa da doença e dos danos provocados pela mesma. É evidente a necessidade de pesquisas para obtenção de novos produtos de ação sistêmica, tanto para tratamento de sementes, quanto para aplicações foliares, com efeito residual prolongado, para viabilizar o controle químico da mancha parda, em associação com o manejo adequado da água de irrigação e às outras práC ticas de manejo da doença. Valácia Lemes da Silva Lobo, Embrapa Arroz e Feijão
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Fotos Dirceu Gassen
Nossa capa
Erro de estratégia
Falta de conhecimento do momento certo de controle da lagarta da soja e uso incorreto de inseticidas levam a ressurgência da praga e surtos de outras secundárias
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s repetidas aplicações de inseticidas apenas para controlar a lagarta-da-soja, Anticarsia gemmatalis, vêm ocorrendo quase sistematicamente nas últimas safras de soja. Houve casos de três, quatro ou de até mais pulverizações visando apenas essa praga. Esse excesso de aplicações nas lavouras é decorrente de dois erros fundamentais: a primeira pulverização tem sido feita sem a realização das contagens para verificação do tamanho da população da praga (amostragens pelo método-do-pano-de-batida) e do percentual de desfolhamento das plantas; assim o defensivo é aplicado muito cedo, quando a população da praga ainda está reduzida, baseado apenas na constatação dos primeiros danos nas folhas do topo das plantas; além disso, o inseticida é escolhido apenas porque é mais barato e mata a lagarta. Via de regra não é seletivo, pois não apenas controla as poucas lagartas presentes na soja, mas também elimina as populações iniciais de predadores e parasitóides, além de impedir o estabelecimento e proliferação, no agroecossistema, de agentes de doenças que controlam naturalmente a praga. As primeiras respostas a esses erros normalmente materializam-se na forma de rápidas ressurgências da própria lagartada-soja. Tais ressurgências demandam no-
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vas aplicações, ocasiões em que produtos destituídos de boas características seguem sendo usados. Continua, assim, o processo de desequilíbrio na lavoura. Paralelamente aos fatos descritos (ou logo depois deles) têm ocorrido erupções anormais de outras espécies de lagartas, antes reconhecidas como de importância secundária. São os casos das lagartas da família geometridae (as verdadeiras medidoras de palmos), da falsa-medidora-de-palmos, Pseudoplusia includens, das lagartas-das-vagens, Spodoptera eridania e Spodoptera latifascia e até da lagarta-das-maçãs do algodoeiro, Heliothis virescens, entre outros. Tais lagartas são de difícil controle, exigindo o uso de produtos mais fortes, em doses elevadas e, freqüentemente, demandam a utilização de misturas de principios ativos extremamente letais, inclusive aos inimigos naturais. Assim completa-se o processo de “desertificação biológica” da lavoura, construindo-se um ambiente extremamente receptivo (livre de inimigos naturais) para os piores inimigos da soja, os percevejos fitófagos (Euschistus heros, Nezara viridula, Piezodorus guildinii, Edessa meditabunda, Acrosternum spp., etc.) O que deveria ter sido feito para evitar esses problemas? Todos esses aborrecimentos, salvo situações excepcionais, teriam sido evitados com a adoção das recomen-
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dações preconizadas pelo Manejo Integrado das Pragas (MIP) da Soja, realizandose amostragens semanais, contando-se a quantidade de lagartas e verificando-se o tamanho delas, fazendo-se leituras do percentual de desfolhamento e observandose a ocorrência de predadores, parasitóides e doenças que atuam sobre as pragas. Procedendo-se assim, a primeira aplicação poderia ter sido retardada ao máximo e, quando tivesse sido necessário fazê-la, deveria ter sido aplicado um inseticida eficiente contra a praga, porém seguro para o homem, de baixo impacto ambiental, se-
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letivo aos inimigos naturais e, além disso, não deveria ter sido adotado como meta o controle de 100% das lagartas presentes na lavoura. Assim, teria sido possível a realização da colheita com apenas uma aplicação para lagarta da soja e com outra para percevejos, principalmente em se tratando de cultivares precoces semeadas nas melhores épocas. Isto teria sido possível porque: a) a planta de soja tem grande capacidade de recuperação de área foliar perdida, sem acusar perda de produção, notadamente quando o dano ocorre antes do florescimento; b) poucas lagartas, incluindo as de importância secundária, não têm capacidade, em condições normais, de causar injúrias que possam resultar em perda de produção; de outro lado, podem favorecer a manutenção e multiplicação de várias espécies de predadores (Calosoma sp., Nabis sp., Callida spp. Geocoris sp., Orius sp., Podisus sp., Alcaeorrhynchus grandis, Zellus sp., etc.), parasitóides (Patelloa similis, Microcharops sp., Trichogramma spp., Copidosoma truncatellum) e patógenos (Nomuraea rileyi, Zoophtora radicans, Pandora gammae, Paecilomyces tenuipes, Baculovirus anticarsia, etc.) na lavoura; c) tais inimigos, aliados a outros fatores naturais de mortalidade (bióticos e abióticos), teriam mantido as populações da lagarta-da-soja sob controle na maior parte do tempo de permanência da cultura no campo; d) da mesma forma, os inimigos naturais teriam concorrido para a manutenção daquelas outras espécies de lagartas na condição de secundárias, pois, como é sabido, dentre os fatores que podem contribuir para que determinada espécie tenha pouca expressão econômica é a sua associação com inimigos (ou inimigo) naturais que a impede de aumentar em número; assim também teria sido proporcionado, mais para frente, um ambiente pouco confortável para
os percevejos fitófagos da soja devido à presença de ávidos predadores de seus ovos e de suas formas ninfais menores (Geocoris sp., Nabis sp., Lebia concina, Callida sp., etc.) e de parasitóides de ovos (Telenomus podisi, Trissolcus basalis) e de adultos (Trichopoda nitens). Encerrando, é preciso esclarecer que a idéia que vem sendo disseminada no sentido de que o uso do Baculovirus anticarsia tem diminuído em determinadas regiões em razão da ocorrência, cada vez mais freqüente, de outras espécies de lagartas, não corresponde à verdade porque, aliado à não-observação de outras recomendações básicas do MIP da Soja, as pragas secundárias têm adquirido súbita importância pelo motivo inverso: a ausência de uso, contra a lagarta-da-soja, de inseticidas seletivos aos inimigos naturais,
seguros para humanos e de baixo (ou nenhum) impacto ambiental, como o próprio B. anticarsia. A propósito, este último inseticida, desenvolvido pelo Dr. Flávio Moscardi, da Embrapa-soja, reúne tantas características desejáveis do ponto de vista do MIP que chegou a ser usado, com sucesso, em cerca de 400.000 ha apenas nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (Fig. 1), podendo ser utilizado inclusive em áreas de grandes extensões com o auxílio da aviação agrícola (Tabela 1). Há outros inseticidas também de excelentes características recomendados para a lagarta-da-soja, como o Bacillus thuringiensis e os chamados reC guladores de crescimento. Sérgio Arce Gomez, Embrapa Agropecuária Oeste
Baculovirus anticarsia: opção para o controle da lagarta e preservação de inimigos naturais
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Fotos Mauro da Silva
Soja
O uso de reguladores de crescimento pode ser o melhor método de controle das lagartas desfolhadoras da soja, pelo seu poder ativo prolongado e preservação dos inimigos naturais
Ciclo interrompido N
a fase adulta, a lagarta da soja, Anticarcia gemmatalis é uma mariposa (± 3 cm de comprimento), podendo apresentar cores variadas mas tendo sempre uma linha transversal sobre as asas. Elas põem ovos à noite (21h00 às 23h00), sendo as posturas constituídas de ovos isolados, podendo se encontrar dois ou três ovos na mesma área foliar. Cada mariposa põe mais de 600 ovos. Sete dias depois nascem as lagartinhas. À medida que vão crescendo efetuam trocas de pele, processo essencial para o seu desenvolvimento e sobrevivência. Durante as duas primeiras mudas de pele as lagartas praticamente não se alimentam de tecidos vegetais. Após a segunda muda (± 1,5 cm de comprimento), iniciam uma fase de intensa alimentação; da terceira até a sexta muda de pele ocorrem cerca de 98% do consumo de folhas de soja. Em média, decorrem dois a três dias entre cada muda de pele; assim a fase da lagarta dura entre 12 e 18 dias. Terminada essa fase, as lagartas se dirigem para o solo, onde se transformam em crisálidas. Esse pe-
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ríodo dura aproximadamente sete dias. A partir de então todo o ciclo se repete, podendo alcançar quatro ciclos em cada safra. Na fase de consumo de folhas, as lagartas denunciam a sua presença em lavouras de soja, pelo corte de áreas foliares. Uma evolução não controlada pode resultar num completo desfolhamento da cultura. Plantas de soja toleram um certo grau de desfolhamento, que pode ser um pouco maior antes da floração (até 30%), sem que isso afete o rendimento de grãos. Desfolhamentos acima de um certo limite (+ de 15% na fase reprodutiva), contudo, significam, invariavelmente, prejuízos econômicos. Muitos sojicultores aplicam inseticidas de uma forma indiscriminada tão logo apareçam as primeiras lagartas. Entretanto, aplicações excessivas tendem a desencadear sérios problemas à lavoura, tais como: 1) desequilíbrio biológico, pela destruição de inimigos naturais; 2) infestações de pragas com mais freqüência; 3) desenvolvimento de resistência aos inseticidas pelas pragas; 4) surtos de pragas
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secundárias; 5) riscos toxicológicos e de contaminação ambiental. Por outro lado, é possível controlar a lagarta-da-soja, através da aplicação racional, denominada de manejo integrado, o qual consiste nas seguintes medidas: 1) não aplicar inseticidas no início de um ataque, mas acompanhar a evolução, efetuando tratamento caso a infestação chegue a um limite que possa causar danos econômicos; 2) preservar os inimigos naturais, evitando inseticidas não seletivos; 3) havendo necessidade
Fase de intensa alimentação inicia a partir da segunda muda, extendendo-se até a sexta muda
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Fotos Mauro da Silva
Reguladores de crescimento de insetos (RCI) desencadeiam sua ação no momento da troca de pele
de aplicação, selecionar os inseticidas eficazes, de maior seletividade e de menor risco ao homem e ao ambiente. Uma das melhores opções para o controle da lagarta-da-soja é o uso de um inseticida regulador de crescimento de insetos (RCI). Para se entender o modo de ação desses produtos, é conveniente esclarecer como se processa o mecanismo da ecdise (troca de pele) das lagartas. O crescimento e a mudança no aspecto das lagartas são acompanhados por seis trocas de pele, processo que depende da formação de novas cutículas nos momentos adequados. A eliminação da pele se processa
através de contrações seguidas dos músculos abdominais das lagartas, provocando concentrações de hemolinfa nas regiões da cabeça e tórax. A elevada pressão da hemolinfa solta a pele velha ao longo do dorso. O corpo da lagarta se desvencilha, saindo vagarosamente. Uma vez fora da pele velha, as lagartas expandem uma nova pele, que inicialmente é mole, flexível e incolor. A formação e deposição de quitina é essencial para dar consistência a essa nova pele, que só assim poderá resistir às pressões internas e proteger o corpo. Esse processo é regulado por mecanismos hormonais. Um dos grupos de inseticidas reguladores de crescimento de insetos é chamado de benzoilfeniluréias (ex. diflubenzuron, flufenoxuron, lufenuron, nuvaluron, teflubenzuron e triflumuron), os quais interferem na formação e deposição de quitina, causando a morte das lagartas no momento da troca de pele. Outro grupo é o das diacilhidrazinas (ex. metoxifenozide e tebufenozide) que provocam uma aceleração no processo da troca de pele. Em ambos os grupos, o produto precisa ser ingerido, o que acontece quando as lagartas comem folhas tratadas. Por isso, a eficácia se manifesta contra lagartas que estejam em fase de alimentação. Nenhum efeito é notado nas lagartas até o momento das trocas de pele, quando se desencadeia a ação. Como as trocas ocorrem em intervalos de dois a três dias, fica explicado porque estes inseticidas não têm ação instantânea, embora as diacilhidrazinas atuam mais rapidamente que as benzoilfeniluréias. Os reguladores de crescimento dos insetos se diferenciam dos inseticidas tradicionais (IT) em alguns aspectos relevantes: 1) seletividade – como os inimigos naturais (insetos predadores e parasitóides) não têm
Mauro Tadeu explica as vantagens do uso de reguladores de crescimento no controle da lagarta da soja
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o hábito de comer folhas, não ingerem o produto e, dessa maneira, não são afetados. Isso proporciona uma seletividade significativamente maior, com substancial preservação dos agentes de controle biológico natural; 2) segurança – a quitina é um composto essencial nos insetos, mas ausente em mamíferos. Por isso, esses produtos não afetam as formas de vida superiores quando usado de forma racional. Também não afetam o sistema nervoso (característica da maioria dos inseticidas tradicionais) tanto das pragas quanto dos animais e do homem. Isso confere maior segurança ao aplicador e ao ambiente. 3) efeito residual – esses inseticidas mostraram-se biologicamente ativo sobre as folhas de soja até 15 dias após a aplicação, enquanto que a atividade dos inseticidas tradicionais é de apenas quatro dias. Isso explica porque na maioria das lavouras tratadas com reguladores de crescimento é feita apenas uma aplicação, quando inseticidas tradicionais necessitam normalmente de mais aplicações. A eficiência comprovada, o longo efeito residual e mais a preservação dos inimigos naturais têm evitado novos ataques da lagarta-da-soja, o que resulta em grande economia para os agricultores. Várias pesquisas feitas nas condições brasileiras validam o uso de inseticidas reguladores de insetos dentro de um programa de manejo integrado da lagarta-da-soja em substituir os inseticidas tradicionais, contribuindo para reduzir a contaminação ambiental, preservar os inimigos naturais e diminuir os riscos de intoxicações humanas e de animais. C Mauro Tadeu Braga da Silva, Fundacep
Na parte inferior da foto testemunha com os danos causados pela lagarta. Superior à esq. tratamento com RCI e à dir. IT
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Soja
Dirceu Gassen
Mapa da ferrugem Paraná desenvolve software que fará análise de dados através de rede de estações agroclimatológicas, permitindo estimar as condições de clima e assim as potencialidades para infecção da cultura da soja por ferrugem
A
ferrugem asiática (Phakopsora pachyrhizi), constatada nas duas últimas safras provocou perdas até 70% em lavouras comerciais. Na safra 2002/ 2003 a ferrugem foi observada sempre após o florescimento, no entanto, sabe-se que a planta é suscetível durante todo o seu desenvolvimento, a partir da emergência. Mas o que influenciou a variação na quantidade de doença e nos danos verificados entre as regiões ? Seria apenas a época de aparecimento da doença ou a resistência das cultivares plantadas, ou quem sabe o clima? Todas as variedades existentes hoje no país são suscetíveis. Na última safra a ferrugem foi encontrada em praticamente 90% das regiões produtoras e a presença do inóculo está sendo contínua, principalmente no cerrado, em função das áreas irrigadas de produção de sementes no inverno. Se o inóculo já está presente em uma região, pode-se estimar o potencial de risco de epidemias analisando-se o clima.
REGIÕES FAVORÁVEIS À OCORRÊNCIA Procurando mapear as regiões mais favoráveis à ocorrência da ferrugem no PR, fitopatologistas e agrometeorologistas da Universidade Estadual de Londrina, Embrapa, Iapar, Simepar, Universidade Estadual de Ponta Grossa e Fundação ABC estão trabalhando em conjunto desde a safra 2001/2002, com o apoio do CNPq e da Fundação Araucária. Esse trabalho foi possível em função da existência de uma rede de estações meteorológicas no 24
Cultivar
estado do Paraná. A parceria resultou no desenvolvimento de um software, o “Arc Epidemic”, que analisa os dados dessa rede de estações automatizadas e gera mapas com a favorabilidade climática para ocorrência de infecções pelo patógeno. A rede de estações coleta informações de hora em hora sobre a presença de umidade, temperatura, além de outras variáveis e está presente em todas as regiões do estado. Isto permite interpolar os dados e estimar as condições de clima adjacentes às estações. As condições favoráveis à infecção por Phakopsora pachyrhizi são conhecidas. O fungo necessita de pelo menos 6 horas e molhamento foliar, sendo o ótimo atingido com 10 horas. Vale lembrar que as condições de molhamento são obtidas principalmente com o orvalho e a temperatura mais favorável para o fungo durante este período é de 18 a 26oC. Com estes dados tabulados, no formato de equações de favorabilidade pode-
se analisar para cada região do estado se o fungo terá ou não condições de infectar as plantas, caso o inóculo do mesmo esteja presente na região. Apesar da ferrugem ter sido constatada no estado apenas a partir da safra 2001/2002, a análise dos dados foi feita a partir do ano 2000, como uma forma de realizar um estudo histórico sobre a probabilidade de ocorrência da doença. Antes do ano 2000 ainda não havia uma rede de estações automatizadas no Estado. Os meses de janeiro a março foram escolhidos por constituírem o período em que cultura encontra-se em seu estádio reprodutivo, mais suscetível ao patógeno. Analisando-se a favorabilidade climática para ocorrência de infecção por Phakopsora pachyrhizi verifica-se que há uma tendência da região noroeste do estado, a partir do município de Campo Mourão, ser menos favorável à doença, enquanto que a região centro sul, apresenta condições mais favoráveis. Verifica-se também que há variação de ano para ano, como exemplo o mês de fevereiro de 2001, bem mais favorável que o mesmo mês do ano subseqüente, em 2002. Reunindo-se os gráficos em apenas uma imagem fica ainda mais clara a tendência de menores níveis no noroeste. Também percebe-se uma faixa Norte/sul mais favorável, iniciando na divisa com o Estado de São Paulo (Ourinhos) indo até União da Vitória. A região de Cascavel/Toledo aparece com níveis intermediários de favorabilidade. A análise dos mapas deve ser realizada com critério. Deve-se relembrar que não é apenas o clima que controla a ocorrência da doença, e sim o conjunto: clima, planta em estágio suscetível e presença de inóculo na região. Como exemplo, pode-se citar a região de Ponta Grossa, onde no ano 2002 foi constatada a ferrugem em algumas lavouras da região. Entretanto, no ano seguinte, apesar de ocorrer um clima mais favorável para a infecção, não foram constatados focos significativos da doença. Uma possível explicação para o fato foi
Favorabilidade para ocorrência de infecções por Phakopsora pachyrhizi, agente causal da ferrugem asiática da soja, para os meses de janeiro, fevereiro e março no estado do Paraná.
Fevereiro
Janeiro
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Março
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o baixo potencial de inóculo na região, aliado à baixa capacidade de multiplicação do fungo, em função da proteção com fungicidas em mais de 90% das áreas de plantio da região.
OUTROS FATORES Além do clima, a quantidade de inóculo também influência no progresso da doença. Os mapas não têm a pretensão de prever o que ocorrerá na safra 2003/2004, e sim analisar o potencial de ocorrência de epidemias durante os meses em que a soja está mais suscetível. De acordo com previsões meteorológicas para a próxima safra, espera-se que durante o ciclo de cultivo haja menor disponibilidade de água que em anos anteriores, o que a grosso modo diminui a favorabilidade para infecções pelo fungo causador da ferrugem da soja. Estes mapas são uma ferramenta a mais para avaliação de condições climáticas favoráveis à ocorrência de epidemias. Fornecem subsídios para que os empresários rurais possam tomar decisões mais adequadas no controle da ferrugem. Com os mapas em mãos, em regiões mais favoráveis o agricultor deve intensificar o monitoramento por sintomas da doença, pois nestas regiões uma pequena quantidade de inóculo pode resultar em severas epidemias. Em situações como esta, estações meteorológicas colocadas dentro da propriedade agrícola podem servir como um refinamento dos mapas, permitindo uma tomada de decisão mais eficiente para o controle da doença. A Universidade Estadual de Londrina (UEL) está auxiliando a Fundação ABC, na região dos Campos Gerais, no Paraná, em seu projeto de Agricultura de Precisão para formar uma rede de estações automatizadas, com
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Surto precoce no Brasil Central
O
cerrado brasileiro já constatou os primeiros relatos de ferrugem 25 dias após o cultivo da soja. O fato preocupa pesquisadores da Embrapa porque o aparecimento precoce da doença - na fase vegetativa - pode exigir maior número de aplicações de produtos fitossanitários para o controle. O surgimento, segundo pesquisadores, deve-se ao aumento da produção de sementes de soja no inverno em áreas sob irrigação em Mato Grosso, Bahia, Tocantins e Maranhão. O fungo que provoca a doença usa essas lavouras para sobreviver. Nas safras anteriores, o período de inverno servia para diminuir a presença do fungo no ar, o que não aconteceu agora. “Considerando que o ciclo da cultura da soja é de cerca de 130 dias e que o efeito médio residual dos fungicidas é de 25 dias, podemos afirmar que as lavouras infectadas pela doença, no início do ciclo, precisarão, em média, de três aplicações durante a safra. O controle vai custar, em média, duas sacas por hectare um maior número de estações por unidade de área, para que os mapas possam ser usados com maior precisão pelos agricultores da região. Os resultados da safra 2003/2004 serão utilizados para validar o sistema e num futuro próximo poderá até ser utilizado para emitir alertas de períodos favoráveis para ocorrênC cia de infecção.
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para cada aplicação”, explica a pesquisadora Cláudia Godoy, da Embrapa Soja. Através do monitoramento constante da lavoura é possível a detecção precoce da ferrugem, pois os sintomas aparecem em qualquer fase do desenvolvimento da planta. “Para observar os sintomas da ferrugem, o produtor deve coletar as folhas da parte inferior da planta e colocá-la contra um fundo claro. A folha infectada tem minúsculas lesões em formato de pequenos pontos escuros e salientes”, ensina o pesquisador José Tadashi Yorinori. Na última safra, a ferrugem da soja foi identificada em cerca de 90% da área plantada, o que equivale a mais de 16 milhões de hectares. Segundo Márcia Midori Yuyama e Tiago Vieira de Camargo, da Fundação MT, os cenários da safra passada e desta são bastante distintos, pois produtores e técnicos já estão familiarizados com a ferrugem, o que permite a identificação da doença a partir da formação das primeiras pústulas e o seu controle. Marcelo G. Canteri, Univ. Estadual de Londrina Paulo H. Caramori, Iapar Rodrigo I. Tsukahara e Olavo C. Silva, Fundação ABC Cláudia V. Godoy, Embrapa Soja
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CONF AEAB CONFAEAB CONFEDERAÇÃO DAS FEDERAÇÕES DE ENGENHEIROS AGRÔNOMOS DO BRASIL
Agricultura depois de Cancun A competitividade da agropecuária dos países em desenvolvimento, deverá se alavancar na competência de extensionistas e eficiência dos agricultores
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a reunião da OMC recentemente realizada em Cancun, se repetiu, pela enésima vez, aquilo que todos já sabemos mas fingimos não saber: os países ricos, gostemos ou não gostemos, estejamos ou não estejamos de acordo com as suas políticas, continuarão, até onde lhes seja possível, subsidiando e protegendo os seus agricultores; e os países pobres continuarão sem força política para impedir que os países ricos continuem fazendo-o. Esta realidade já foi demonstrada tantas vezes e com tanta veemência que parece incompreensível que ainda continuemos perdendo tempo, esforços e oportunidades, com o pires na mão, mendigando decisões que dependem da boa ou má vontade dos governos dos países ricos, os quais, em cada reunião similar, inventam um novo motivo, pretexto ou escusa para não extinguir esses artificialismos. Será que a eliminação de tais artificialismos é realmente imprescindível para que os agricultores latino-americanos possam ingressar nos mercados ricos? Será que é necessário que continuemos submetendonos a tanta e tão longa humilhação? Definitivamente, não, pois temos ao alcance das nossas mãos uma solução mais soberana, mais eficaz e definitiva para conquistar, com as armas das nossas vantagens comparativas e da eficiência produtiva, o “passaporte” para aceder aos mercados internacionais e, simultaneamente, para desestimular que produtos agropecuários subsidiados ingressem nos nossos países. Essa asseveração está fundamentada na seguinte premissa: a nossa competitividade depende principalmente da maior ou menor capacidade que tenham os nossos agricultores de oferecer produtos de boa qualidade e com baixos custos de produção e de distribuição. Isto significa que os agricultores mais eficientes são, e continuarão sendo, os menos afetados pelos referidos artificialismos e vice-versa. En-
tão, sejamos objetivos: o tempo e o esforço que durante anos e décadas aplicamos, sem obter nenhum resultado concreto, em protestar e negociar aquilo que os países ricos consideram inegociável, deveríamos aplicá-los em conseguir que as nossas vacas, em vez de produzir 4 litros de leite por dia, produzam 30, tal como o fazem as dos países ricos (e que esse leite tenha mais proteína, menos bactérias e menos resíduos de antibióticos); que os nossos triticultores, ao invés de colher 2090 kg/ ha, obtenham 5000 kg, tal como o fazem os chilenos ou oxalá 8000 kg, como o fazem, em média, os franceses e os alemães; que os nossos bataticultores, em vez de colher 13500 kg, obtenham 49000 kg/ha, tal como o fazem os belgas; que os nossos produtores de milho, em vez de colher 3300 kg, produzam 10000 kg/ha, tal como o fazem os estadunidenses. Se nós alimentássemos as nossas vacas leiteiras, frangos e suínos com o milho rendendo 10 toneladas por hectare e com a soja que já produzimos com bons rendimentos - embora bastante aumentáveis - inundaríamos os países desenvolvidos com carne, leite e seus derivados com custos tão competitivos que compensaríamos os efeitos negativos do protecionismo e dos subsídios que eles concedem aos seus produtores rurais. Se a esses incrementos nos rendimentos agregássemos a diversificação produtiva para evitar riscos e vulnerabilidades climáticas e comerciais, se eliminássemos as ociosidades/superdimensionamentos de fatores de produção existentes nas nossas propriedades, se melhorássemos a qualidade e incorporássemos valor às nossas commodities, se os agricultores formassem grupos para adquirir os insumos e comercializar as colheitas, em conjunto, seríamos altamente competitivos, mesmo que os países ricos mantivessem as suas atitudes de intransigência. Em vez de continuar lamentando as
ameaças dos nossos competidores dos países desenvolvidos, deveríamos adotar uma atitude mais construtiva de tirar proveito das invejáveis oportunidades e fortalezas da nossa agropecuária, entre elas a abundância e baixo preço da terra, idem de mãode-obra, a nossa possibilidade de produzir carne a campo, sem necessidade de entabular os animais nem instalar sistemas de aquecimento nas suas instalações, nossa possibilidade de obter três colheitas de grãos ao ano, contra uma nos países desenvolvidos, a vantagem que nos permite produzir na contra-estação (climática) dos países ricos; nossa auto-suficiência na produção de proteínas para alimentar os animais, sem necessidade de importá-las como precisam fazer os europeus, japoneses e canadenses; nossas tecnologias que já estão disponíveis, porém ociosas/sub-utilizadas devido às inaceitáveis debilidades dos nossos serviços de extensão rural. E tudo isto depende especialmente dos próprios agricultores, com a única condição de que os governos lhes proporcionem nada mais que os conhecimentos necessários para que eles saibam corrigir as ineficiências tecnológicas, gerenciais e organizacionais que ainda caracterizam a maioria dos produtores rurais. Durante anos e décadas, os negociadores e diplomatas tiveram suficientes oportunidades para mostrar resultados em termos de correção das distorções do comércio internacional. Como não tiveram êxito na sua missão, é necessário que os argumentos dos negociadores e as boas maneiras dos diplomatas sejam substituídos pela competência dos extensionistas e, através deles, pela eficiência dos agricultores. Em resumo, em vez de lamentar os problemas insolúveis, deveremos ter o pragmatismo de resolver os problemas solucionáveis. Ampliações sobre este tema poderão ser solicitadas através do E-Mail Polan.Lacki@uol.com.br ou encontradas na Página web http:// C www.polanlacki.com.br
Lançamento
Contra os fungos segunda no início de formação de grãos (R5.1). Para o controle de oídio, a aplicação deve ser feita quando o nível de infecção atingir, no máximo, 20% da área foliar da planta.
MODO DE APLICAÇÃO
A
Bayer Cropscience aproveitou o 29º Congresso Brasileiro de Pesquisas Cafeeiras, em Araxá (MG) para lançar o novo fungicida para as culturas de café e soja. Sphere é o nome do novo fungicida mesostêmico e sistêmico, resultado da mistura de dois ingredientes ativos, o Trifloxystrobin e o Cyproconazole, desenvolvido principalmente para controlar a ferrugem dop café e o crestamento foliar e cercosporiose da soja. Segundo a Bayer, o diferencial do produto está no duplo mecanismo e duplo modo de ação - mesostêmico e sistêmico, que possibilita a adesão do produto na camada cerosa das folhas, fazendo que ocorra uma redução das perdas pela radiação solar e chuvas. O ingrediente ativo se desloca, por meio da ação de vapor, de áreas de maior concentração para áreas de concentração menor, distribuindo-se em todos os pontos do vegetal.
NÚMERO, ÉPOCA DE APLICAÇÃO Em café, para o controle ao mesmo tempo de ferrugem e mancha-de-olho-pardo, são indicadas três aplicações durante o período crítico das doenças. A primeira aplicação deve ser feita preventivamente em dezembro, na fase de “chumbinho” e, a partir daí, em intervalos de 40 - 45 dias deve-se repetir a segunda e a terceira aplicações. A maior dose indicada para café (0,6 L/ha) é para lavouras com média/alta carga pendente, maior 25 sacas/ha ou em lavouras com plantas adultas e com alto grau de enfolhamento. 28
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Em soja, para o controle ao mesmo tempo de ferrugem, crestamento-foliar e septoriose, são indicadas duas aplicações preventivas, ambas na fase reprodutiva da cultura. Deve ser utilizada a maior dose (0,4 L/ha) na ocorrência conjunta de condições muito favoráveis aos fungos dessas doenças (alta umidade, temperatura ideal, alta pressão de infecção e cultivares muito suscetíveis). Em lavouras semeadas até final de outubro, a primeira aplicação deve ser feita no início da formação de grãos (R5.1) e a segunda, na fase de “meia granação” (R5.3). Em lavouras semeadas a partir do início de novembro, deve-se antecipar as duas aplicações, sendo a primeira na fase de “canivetinho” (R3) e a
A dose recomendada (ver quadro) deve ser diluída em água e aplicada na forma de pulverização com qualquer tipo de equipamento terrestre: pulverizadores costais (manual, pressurizado ou motorizado), ou tratorizados com barra, equipados com bicos de jato cônico vazio da série “D” ou similar, com pressão de trabalho suficiente para proporcionar tamanho de gotas de 200 a 250 micra, e densidade acima de 200 gotas/cm2. Em soja recomenda-se o volume de calda de 200 l/ha. Em café, utilizando atomizadores, com volume de calda de 250 - 500 l/ha. Para pulverização com aeronaves agrícolas na cultura da soja, utilizar barras equipadas com bicos de jato cônico vazio da série “D” ou similar, com a combinação adequada de difusor (core), que permita a liberação e deposição de uma densidade mínima de 80 gotas / cm2. Recomenda-se o volume de 30 - 40 l/ ha de calda, altura de vôo de dois ou três metros do alvo e largura de faixa de deposição efetiva de 15 - 18 metros.
EXCEÇÃO No Estado do o produto ainda não está cadastrado na Secretaria da Agricultura. Portanto, o produto não pode temporariamente ser recomendado ou receitado neste Estado. C
Doenças Cultura
Doses
Nome Comum
Nome Científico
Litros p.c./ha
Ferrugem-do-cafeeiro
Hemileia vastatrix
0,4-0,6
Café
Gramas i.a./ha 32 g de Ciproconazol + 75 g de Trifloxistrobina 48 g de Ciproconazol + 112,5 g de Trifloxistrobina 32 g de Ciproconazol + 75 g de Trifloxistrobina
Mancha-de-olho-pardo
Cercospora coffeicola
0,4-0,6 48 g de Ciproconazol + 112,5 g de Trifloxistrobina 24 g de Ciproconazol + 56,25 g de Trifloxistrobina
Ferrugem
Phakopsora packyrhizi
0,3-0,4 32 g de Ciproconazol + 75 g de Trifloxistrobina 24 g de Ciproconazol + 56,25 g de Trifloxistrobina
Soja
Crestamento-foliar
Cercospora kikuchii
0,3-0,4 32 g de Ciproconazol + 75 g de Trifloxistrobina 24 g de Ciproconazol + 56,25 g de Trifloxistrobina
Septoriose
Septoria glycines
0,3-0,4
Oídio
Microsphaera diffusa
0,3
p.c. = produto comercial
32 g de Ciproconazol + 75 g de Trifloxistrobina 24 g de Ciproconazol + 56,25 g de Trifloxistrobina i.a. = ingrediente ativo
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AENDA
Defensivos Genéricos
Medida provisória libera plantio de soja geneticamente modificada, mas a discussão em torno do uso de glifosato ainda gera conflitos
A
soja OGM tolerante ao glifosato já pode ser plantada, sob ordem da Medida Provisória nº 131; ao menos as filhas, netas e bisnetas gaúchas, fogosas nos pampas e rincões sulistas ou um tanto desvanecidas nos cerrados de leste a oeste. Essa descendência bastarda, fruto da impulsiva Argentina que cruzou a fronteira para deitar, florescer e frutificar em solo brasileiro, via MP recebeu a morena cidadania tupiniquim. Os filhos legítimos da pesquisa nacional ainda vão ter que aguardar um pouco para serem agraciados com a identidade legal; por ora, não existem, são fetos desconhecidos. O crime parece compensar quando a autoridade se ausenta. Aqueles agricultores que contrabandearam a soja OGM podem plantar as sementes trinetas (tetra ou mais), e os agricultores cumpridores da lei têm apenas o direito de contabilizar se estão perdendo ou não, lucratividade para os seus vizinhos. Mas ambos usam glifosato, uns só glifosato, outros adicionam herbicidas diferentes na pós-emergência da soja. Esse avanço esquivo, sem sombra, da Soja OGM bastarda arrastou consigo o uso do herbicida glifosato. No ano 2000, ainda com pouca Soja OGM o Brasil consumia perto de 80 milhões de litros deste herbicida, agora, estima-se em 150 milhões de litros. Esse salto espetacular foi obtido com a participação da oferta de diversas
empresas formuladoras a partir de ingrediente ativo da Monsanto, Nortox e fornecedores chineses. Este cenário mudou. O duopólio Monsanto/Nortox pressionou e o governo impôs pesada e injustificada medida anti-dumping contra as importações da China no início de 2003. Na prática, para se importar o glifosato da China, as empresas locais devem pagar 13,5% de Imposto de Importação e mais 35,8% de penalidade anti-dumping. Assim, todas as demais ofertantes sucumbiram ou passaram a adquirir o produto da nova fábrica da Monsanto na Bahia. Agora a oferta é quase unipolar. Se não bastasse, que tal mais um empurrãozinho para a monopolização total e absoluta? Pois saibam que só poderá constar no rótulo e bula do herbicida da Monsanto a recomendação de uso para aplicação pós-emergência da SojaRR. Os herbicidas das demais empresas não poderão informar tal recomendação porquanto não fizeram os testes de campo para resíduos e eficácia. Deixaram de fazer os testes, não por displicência, mas porque não podiam legalmente fazê-lo, visto a semente SojaRR ser de propriedade da Monsanto, e, essas empresas não quiseram arriscar a fazer experimentos contrabandeando soja. Esses empresários são mais uma vez punidos porque não se afastaram do cumprimento da lei. Agora, sabem que o crime teria compensado.
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A MP 131 e o Glifosato Para isso, a Anvisa publicou a monografia do glifosato, anotando: quem plantar Soja não transgênica só pode colher com resíduo até 0,2 ppm (aplicando antes da soja germinar), mas quem plantar Soja Roundup Ready pode apresentar resíduo de até 10 ppm (guardando ao menos 56 dias entre a última aplicação e a colheita). Até o fechamento deste artigo a monografia estava sob consulta pública. Esperamos que seja anotada Soja OGMtolerante, para abranger todas as sojas com essa tecnologia e não só a da Monsanto; e, esclarecida essa aparente confusão em matéria de resíduo. Contrapondo, o Ministério da Agricultura deve ter atitude, dentro de sua competência, e baixar uma medida liberando todos os herbicidas registrados contendo glifosato para apontarem em seus rótulos/ bulas as recomendações atinentes à Soja OGM. Afinal, para que servirão os testes, se o glifosato é o mesmo em todas as formulações? A eficácia do glifosato e o resíduo do glifosato serão absoluta e obrigatoriamente os mesmos que os dos testes da Monsanto. É perda de tempo para Institutos de Pesquisa e Escolas de Agronomia. De quebra, evitaria que os agrônomos se valham de artifícios de ética duvidosa para legalizar a venda dos glifosatos. Em se tratando de produto genérico, como é o glifosato, o sistema de registro não deveria exigir tais testes. C
Agronegócios
Créditos de Carbono As conseqüências com o aumento dos gases de efeito estufa, mobilizam a nação em torno do projeto que prevê a redução da emissão destes gases. O Brasil encontra-se como um dos mais ativos produtores de biomassa, mostrando oportunidade de ganhos líquidos neste mercado
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canismos similares às bolsas de valores conferirão transparência e liquidez ao mercado, inclusive sinalizando quanto à demanda e ao correspondente valor futuro, incentivando investidores a ingressar no mercado.
ABRANGÊNCIA Para que determinada contenção de emissão, ipsis litteris, ou o seqüestro e fixação do carbono por um tempo pré-determinado seja computado como crédito, diversas condições, previstas no PQ, necessitam ser atendidas. Além daquelas de natureza estrutural, como a exigência de os projetos serem baseados em florestamento, reflorestamento ou produção e uso de energias alternativas às fontes de carbono fóssil, existe a necessidade de comprovar os ganhos líquidos do projeto e o atendi-
mento da meta pelo país que se propõe credor dos “créditos de carbono”. A produção de biomassa, através de cultivos permanentes, é o principal foco dos projetos que objetivam o seqüestro de carbono. Não apenas o carbono é fixado nas árvores (podendo permanecer fixado mesmo quando as árvores são transformadas em móveis ou construções), como essa fixação é facilmente mensurável. Nos sistemas florestais, pode-se considerar também o carbono que passa a ser fixado, de forma estável, no solo, através de carbonatos ou de carbono orgânico. Os combustíveis derivados de biomassa constituem projetos independentes do sistema de produção para obtenção da matéria prima. Isto vale tanto para o etanol, com tecnologia dominada e com perspectivas animadoras no mercado interna-
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ara início de conversa, é importante conceituar “créditos de carbono” e contextualizar sua importância em termos de tempo, espaço e atividade agrícola. Os cientistas demonstraram a estreita associação entre as emissões de gases como o gás carbônico, o metano e óxidos de nitrogênio e as mudanças climáticas, em especial no longo prazo. Após soar o alarme referente ao aumento dos gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera, e as conseqüências derivadas desse acréscimo, a ONU desenvolveu uma série de negociações que culminaram na formalização do Protocolo de Quioto (PQ), em dezembro de 1997. Pelo protocolo, os países signatários comprometer-se-iam a reduzir as suas emissões em 5% em relação ao verificado em 1990, durante o período 2008-2012. Uma das estratégias previstas para reverter o despejo de GEE na atmosfera é denominada de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), em cujo contexto são flexibilizadas as exigências para que cada país tenha que atingir a sua meta, de forma que não o seja isolada e estanque. Pelo mecanismo proposto, o conjunto de países signatários deverão atingir a meta global. Entretanto, cada país individualmente, poderá negociar com outros países de forma que o superávit de contenção de emissões de um país possa ser contabilizado a favor de outro que não tenha atingido a sua própria meta. Esse superávit de contenção de emissões passa a ser denominado “créditos de carbono” e, como tal, assume um determinado valor no mercado, flutuando ao sabor da Lei da Oferta e da Procura. Me-
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cional, quanto para os combustíveis derivados de óleos vegetais (como o biodiesel), com um amplo leque de aplicações em serviços pesados (transportes, tratores, máquinas, motores estacionários), e que deverá se constituir em uma das principais fontes de combustível no futuro mediato.
CONTEXTO ATUAL Corações e mentes encontram-se em compasso de espera, pois o Protocolo de Quioto apenas entrará em vigor caso 55 Partes (países ou grupos de países), representando, no mínimo, 55% das emissões de CO2 verificadas no ano de 1990, ratifiquem o PQ. Até o momento, o número de países que ratificaram o PQ ultrapassa a 55, porém atingindo apenas 47% das emissões de 1990. Isso ocorre porque dois grandes poluidores atmosféricos mundiais estão emperrando o prosseguimento da implementação: Os EUA, responsáveis por 36,1% das emissões, já decidiram que não ratificarão o protocolo, devido ao alto custo financeiro da contenção das emissões industriais, o que os tornaria menos competitivos no mercado global, sendo insensíveis ao custo que essa decisão impõe ao planeta; e a Rússia (17,4% das emissões) tem se mostrado reticente quanto à sua adesão, emitindo sinalização ambígua no tocante à sua decisão. Ocorre que as emissões desses dois países ultrapassa a 50% das emissões globais, o que lhes confere poder de veto à implementação do PQ. Como tal, o MDL se encontra no limbo, não estando em vigor os compromissos e metas negociados no PQ. Em decorrência, o mercado de créditos de carbono, que seria criado pelo MDL, também se encontra em regime de stand by. Embora alguns contratos tenham sido firmados e alguns projetos encontrem-se em implementação, esses são devidos à legislação ambiental própria de algum país, ou mesmo de estados dentro de países, como no caso dos EUA, ou então a mecanismos voluntários de mitigação das emissões de GEE. O mercado hoje existente é incipiente e volátil, não se encontra lastreado em fundamentos sólidos, e não cumpre o papel de referencial de valores e indutor de investimentos. Em algumas situações existem investidores que buscam posicionarse no mercado, para o caso de o Protocolo de Quioto ser implementado. Ou seja, estão comprando créditos de carbono baratos para revenda a preços maiores, quando houver exigibilidade de sua entrega física. Ou então, intermediários estão investindo em mecanismos de comercialização (como as bolsas) à guiza de conhecimento do
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mercado e de aprendizagem, uma vantagem comparativa em relação à quem chegar mais tarde no mercado.
PERSPECTIVAS FUTURAS Na eventualidade da entrada em vigor do PQ, o Brasil disporá da prerrogativa de ser um dos players mais ativos do MDL, atuando na ponta da oferta de créditos de carbono. Essa perspectiva decorre tanto das possibilidades oriundas de projetos de florestamento e reflorestamento, contemplados no MDL, quanto de produção e uso de biocombustíveis (derivados do álcool ou do óleo vegetal), assim como de outras fontes energéticas que substituam combustíveis fósseis. Em diversas situações a interface com o agronegócio é evidente e passa a constituir uma oportunidade que não pode ser desperdiçada. Por exemplo, o cultivo da seringueira para a extração de látex passa a ocupar um nicho importante, seja pelas oportunidades tradicionais, pelo incremento na demanda de borracha natural (a borracha sintética é derivada de petróleo) assim como pela oportunidade de ingressar no comércio de créditos de carbono.
OS PROJETOS DE MDL A obtenção de créditos de carbono comercializáveis depende de uma série de etapas burocráticas que necessitam ser cumpridas antes, durante e depois da implementação do projeto propriamente dito. Essas etapas são necessárias para garantir a correção e a fidedignidade das informações e que as metas de redução das emissões sejam atingidas. Face a esses quesitos burocráticos haverá necessidade de constituir organizações dedicadas à elaboração, tramitação e validação dos projetos.
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O PQ prevê a existência de um Comitê Executivo de MDL, que será responsável pelo cumprimento dos dispositivos que embasam o mercado de créditos de carbono. Cada governo deverá constituir um Comitê próprio o qual, em última análise, é o braço do PQ de cada uma das partes ratificantes. Os projetos elegíveis para o MDL devem promover seqüestros de carbono ou reduções de GEE, que não sejam decorrentes de compensações entre áreas, e que sejam mensuráveis e permanentes. A duração de um projeto de MDL pode atingir até 21 anos. Um ponto importante é a adicionalidade das reduções, ou seja, as emissões de GEE devem ser menores na presença que na ausência do projeto, o que exige o estabelecimento de uma linha base, que servirá de referência para os cálculos de emissões. Para que o projeto de MDL seja aceito para transação é necessária a sua validação, com base nos pressupostos anteriores, prevendo ainda o monitoramento das metas estabelecidas, ao longo do tempo de duração do projeto. É importante considerar que, na formulação de um novo projeto, tanto na área de florestamento/reflorestamento, quanto em relação à obtenção e uso de energia limpa, os recursos que podem ser obtidos através da comercialização de créditos de carbono derivados do projeto passam a constituir uma importante vantagem competitiva, podendo alavancar determinados negócios que dependiam de sustentabilidade mercaC dológica e consistência financeira. Décio Luiz Gazzoni Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja www.gazzoni.pop.com.br
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Mercado Agrícola
Brandalizze Consulting
brandalizze@uol.com.br
Safra americana chega ao final e quadro mundial segue apertado Os produtores americanos encerraram a colheita da safra local de milho e soja e constataram números menores que as expectativas na soja e acima no milho. Como o quadro geral da soja ficou mais apertado, beneficiou o Brasil e Argentina nesta safra, que podem colher uma safra maior e assim não correr o risco de grandes baixas para os próximos meses. Enquanto isso o milho americano que veio com uma safra maior que as expectativas está chegando num momento de grandes perdas na safra da China e na Argentina e assim com garantia de boa liqüidez internacional, que mostra forte crescimento no consumo mundial e queda nos estoques. Continuamos vendo o quadro geral mundial com forte queda nos estoques, que passarão das 412,8 milhões de t atuais para as 317 milhões de t na safra total de grãos de 2003/04 e assim dando sinais que manterão as cotações firmes para os principais produtos. O consumo mundial de grãos deverá saltar para a casa das 1,92 bilhões de t contra as 1,82 bilhões que estão sendo projetadas na produção. Sinalizando que bons indicativos teremos pela frente.
MILHO Pouco movimento em dezembro O mercado do milho esteve trabalhando atrelado às exportações, que em novembro mostrou bom desempenho. Com crescimento das cotações em dólar, que passaram aos US$ 120,00 e até US$ 125,00 por t no porto de Paranaguá e avanço da moeda americana, que cresceu cerca de R$ 0,15 período. Assim dando liquidez aos vendedores internos que estavam tentando fechar parte dos estoques de milho e não encontravam interesse das grandes indústrias consumidoras. Assim os indicativos mostraram ligeiro avanço positivo nas cotações praticadas. Mas o ponto importante é que as grandes indústrias do segmento de ração não mostravam interesse em formar grandes estoques para a virada do ano. Desta forma o segmento do milho continuará atrelado às exportações para dar liqüidez. O consumo de milho internamente continuará atrelado aos fechamentos de pequenos volumes de curto prazo. Sem expectativas de grandes movimentos neste mês de dezembro.
SOJA EUA beneficiam o Brasil Os EUA confirmaram em novembro a forte queda na produtividade local, onde a incidência de doenças foi devastadora sobre as lavouras e resultou segundo o USDA em 66,7 milhões de t, contra expectativas que apontavam acima das 80 milhões no começo da safra. Com isso as cotações em Chicago continuaram trabalhando com patamares entre os US$ 7,50 e os US$ 7,80 por “bushel”, que para os produtores brasileiros é uma excelente cotação. Desta forma continuamos apontando para o segmento que a comercialização de parte da safra antecipadamente em dólares é uma excelente opção para não correr o risco de encontrar pressão baixista no momento da colheita. A safra tenderá a crescer cerca de 8 milhões de t em relação ao ano que está
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encerrando e assim mais produto será ofertado na mesma época, que requer habilidade comercial dos produtores para conseguir obter a melhor rentabilidade possível e assim um boa alternativa continuará sendo as vendas parceladas e parte destas se dando antecipadamente.
FEIJÃO Perdas fortalecem cotações O mercado do feijão que andava em ritmo lento nos últimos meses começou a dar sinais de reação em novembro e poderá ter pressão de alta em dezembro, porque teremos poucas ofertas de produto novo neste momento. O Sul do país está com a safra atrasada e só apresentará boas ofertas em janeiro, enquanto isso a safra que estará em colheita nestas próximas semanas deverá vir com grandes perdas na produtividade, porque sofreu com altas temperaturas e com o frio no começo do ciclo e então entrará pouco produto que tende a ser melhor valorizado. Com indi-
cativos devendo girar entre os R$ 60,00 até chances de R$ 80,00 se houver chuvas na colheita.
ARROZ Reação inesperada O mercado do arroz trabalhou firme em boa parte do mês de novembro e surpreendeu até mesmo os produtores mais otimistas, que já não acreditavam em forte avanço nos indicativos como se verificou com o pouco de produto que apareceu para ser negociado, onde se fechou posições dos R$ 38,00 aos R$ 40,00 pelo produto gaúcho. O segmento acabou o mês com indicativos calmos e leve pressão baixista. O atraso da chegada de vários navios com arroz importado foi o fator que desencadeou a alta, porque fez com que alguns empacotadores que estavam com vendas de beneficiado atreladas ao recebimento dos importados, tivessem que ir em busca do produto no RS, e assim criando suporte para o fortalecimento das cotações.
CURTAS E BOAS SOJA - o quadro geral do USDA aponta safra mundial de 201,5 milhões de t com os EUA colhendo 66,7 milhões, o Brasil 60 milhões e a Argentina com 38 milhões de t para 03/04. ARGENTINA - teve grandes perdas na safra de milho, que passou por temperaturas muito altas e falta de chuvas com indicativos atualizados de uma produção de 14 milhões de t contra as 16 previstas. Terá menos produto para exportar. MILHO - a safra americana fechou com 261,1 milhões de t e assim ficando acima das expectativas iniciais que apontavam para pouco mais de 252 milhões de t. Mesmo assim terá um quadro apertado, porque o consumo americano junto com as exportações devera superar a marca das 260 milhões de t. TRIGO - a safra mundial segundo o USDA foi comprometida e apontou a produção de 390,6 milhões de t contra as 380,3 milhões da safra 2002/03 e com isso os estoques mundiais despencarão das 163,7 milhões de t para as 126,3 milhões de t. Isso esta abrindo espaço para o Brasil que fechou contrato de exportação em novembro, fato este que não havia sido registrado até então. É um bom sinal para a safra 2004 do Brasil, que poderá ter nas vendas externas a liquidez do momento da colheita. ALGODÃO - o quadro mundial continuou mostrando aperto, porque a safra da China foi fortemente prejudicada e esta fazendo com que este pais tenha que importar algo ao redor dos 7 milhões de fardos neste novo ano comercial. Abre um bom espaço para o produto brasileiro ter melhor liquidez. CARNES - o Brasil esta batendo recorde de embarques do setor das carnes, principalmente frangos, suínos e bovinos, e assim devera continuar em 2004 e desta forma garantindo crescimento da demanda dos produtos formadores de ração, principalmente milho, sorgo e soja.
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Dezembro de 2003 / Janeiro Maio de 2004 2003