Cultivar 68

Page 1



Cultivar Grandes Culturas • Ano V • Nº 67 • Novembro 2004 • ISSN - 1518-3157

Nossa capa

Destaques

08

Foto Capa / Montagem Cristiano Ceia

Melhor sem bicudo Após ser bem sucedido nos Estados de Goiás e Bahia, o programa contra ao bicudo toma dimensão nacional

16 Mancha crescente Patologia secundária até a década de 90, a Phaeosphaeria ganha novo agente causal e começa preocupar

Nossos cadernos

27

Fotos de Capa

Sem cafeína

José Francisco Garcia

Com a descoberta de planta silvestre de café com baixo teor de cafeína, a pesquisa busca bebida mais saudável

Clara Beatriz Campo

30 Chegada aos EUA Saiba como aconteceu a chegada da ferrugem asiática aos EUA e quais os reflexos para o Brasil

NOSSOS TELEFONES: (53) Grupo Cultivar AO de ASSINANTE: Publicações Ltda. • ATENDIMENTO CGCMF: 02783227/0001-86 3028.4013/3028.4015 Insc. Est.• ASSINATURAS: 093/0309480 Rua:3028.4010/3028.4011 Nilo Peçanha, 212 Pelotas – RS 96055 – 410 • GERAL

Direção 3028.4013 • REDAÇÃO: Newton Peter Schubert 3028.4002 K. Peter / 3028.4003 • MARKETING:

3028.4004 / 3028.4005

Índice Diretas

06

REDAÇÃO • Editor

Charles Ricardo Echer • Coordenador de Redação

Janice Ebel • Design Gráfico e Diagramação

Cristiano Ceia

• FAX:

www.cultivar.inf.br 3028.4001 cultivar@cultivar.inf.br

Programa nacional contra o bicudo

08

Assinatura anual (11 edições*): R$ 119,00 (*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan)

Expansão do sorgo no Cerrado

12

COMERCIAL

Números atrasados: R$ 15,00

Avanço da mancha Phaeospheria

16

Novo agente causador da Phaeospheria

20

Sedeli Feijó Silvia Primeira

Manejo integrado da broca-da-cana

22

Café naturalmente descefeinado

27

CIRCULAÇÃO

Ferrugem asiática chega aos EUA

30

• Assinaturas: 3028.2070

Cibele Oliveira da Costa

Alerta máximo contra a ferrugem

38

• Redação: 3028.2060

Reforço no programa Fome Zero

40

Definições do Goiás Fibra 2004

41

Controle biológico com bicho lixeiro

42

Assinatura Internacional: US$ 80,00 70,00 Nossos Telefones: (53) • Geral 3028.2000

• Marketing: 3028.2065

Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: cultivar@cultivar.inf.br Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.

Cuidados no armazenamento de sementes 44 Informe jurídico

48

Pedro Batistin

• Gerente

• Assinaturas

Jociane Bitencourt Rosiméri Lisbôa Alves Simone Lopes • Gerente de Assinaturas Externas

Raquel Marcos

Agronegócios

50

• Expedição

Coluna Aenda

52

Mercado agrícola

53

Edson Krause Dianferson Alves

Palavra do produtor

54

• Impressão

Kunde Indústrias Gráficas Ltda.




diretas Prêmio fertilizantes A Bunge Fertilizantes, por meio da marca Manah, recebeu o prêmio ‘Destaque 2004 em Fertilizantes’. Segundo, Michel Santos, gerente de marketing, a correta utilização das ferramentas de marketing e a interação da equipe no campo, que constantemente inova nas relações com os clientes, são fatores que vêm garantindo a posição de marca mais lembrada do país em agronegócio. Michel Santos

Embrapa Trigo comemora 30 anos A Embrapa Trigo, de Passo Fundo (RS), comemorou 30 anos no mês de outubro. O chefe-geral, Erivelton Roman, ressalta a contribuição de pesquisas específicas voltadas ao setor tritícola, gerando crescimento e aumento da produtividade. A proposta de descentralizar as linhas de pesquisa, aproximando a empresa dos pólos produtivos, determinou a fundação do Centro Nacional de Pesquisa do Trigo em Erivelton Roman Passo Fundo.

Nova sede O Grupo Cultivar mudou-se em novembro para sua nova sede, com amplas e modernas instalações, em um prédio de estilo neoclássico, localizado na rua Nilo Peçanha, 212, em Pelotas (RS). O novo telefone é (53) 3028.2000.

Bayer O estande da Bayer mais uma vez foi a atração do evento. No III Goiásfibra, o que não faltaram foram produtores interessados em informações sobre produtos da empresa contra a praga-chave da cultura, o bicudo.

06

Solos Será realizado nos dias 6, 7 e 8 de dezembro o Ciclo de Palestras “Fertilidade do Solo em Sistema de Plantio Direto”. A promoção é do Gape, do Departamento de Solos e Nutrição de Plantas da Esalq/USP, sob orientação do prof. Godofredo C. Vitti. Será no anfiteatro da engenharia – Esalq/USP. Contato: (19) 3417-2104 ou gape@esalq.usp.br

Nova Fase A Agroceres comemora crescimento e quer reconquistar o destaque obtido a partir dos anos 80, inclusive com a volta às sementes (híbridos). Em 2005 é esperado salto de 15%, reúnindo as seis empresas do grupo: Inaceres, Biomatrix, Agroceres PIC, Agroceres Ross, Agroceres Nutrição Animal e Atta-Kill.

Monsanto A Monsanto é vencedora do prêmio Destaque no Marketing 2004, na Categoria Marketing Institucional, da Associação Brasileira de Marketing & Negócios (ABMN). O Prêmio é resultado do case sobre transgênicos, que teve a campanha desenvolvida pela Fischer América.

Luto Registramos com pesar o falecimento de Shichiro Matsuda, fundador do grupo Matsuda. Vítima de uma pancreatite veio a falecer na noite do dia 10, pelo agravamento da doença. O corpo foi transladado para Álvares Machado, pequena cidade do interior paulista. No dia de sua morte, Matsuda completaria 84 anos de Shichiro Matsuda idade.

Coodetec A equipe da Coodetec marcou presença no III GoiásFibra, em Goiânia. A empresa apresentou sua linha de cultivares disponíveis no mercado e orientou sobre a melhor forma de conduzir o plantio.

FMC O III GoiásFibra contou também com a presença da FMC. Luis Eduardo Alves, marketing developer da empresa, apresentou a linha de inseticidas e instrumentos para o monitoramento do bicudo do algodoeiro.

Luis Eduardo Alves

Milho A Embrapa Milho e Sorgo, de Sete Lagoas (MG), lança o livro “Doenças em milho: molicutes, vírus, vetores e mancha por Phaeosphaeria”. A pesquisadora Elizabeth de Oliveira é uma das editoras, juntamente com o pesquisador Charles Martins de Oliveira. A publicação tem 13 capítulos, distribuídos por mais de 250 páginas. O livro pode ser adquirido pelo telefone (31) 3773-3855 ou e-mail: faped@faped.org.br

Parceria entre BASF e Dow AgroSciences

GE premia Milenia

A Basf e Dow AgroSciences firmam parceria para o desenvolvimento do Sistema de Produção Clearfield por meio da produção de novos híbridos tolerantes ao herbicida OnDuty , para a cadeia produtiva do milho. O acordo é fruto da experiência da Basf em culturas com tolerância a herbicidas e da Dow AgroSciences no desenvolvimento de híbridos altamente rentáveis, concordam Airton Leites, gerente de produtos da Basf Agro, e José Arana, diretor da sementes e biotecnologia da Dow AgroScienJosé Arana e Airton Leites ces no Brasil.

A GE Infrastructure Water & Process Technologies, a divisão da General Electric especializada em tratamento de águas e processos industriais, outorgou o prêmio “Proof Not Promises™” e ROE – Return On Environment à Milenia Agro Ciências S/A. O reconhecimento se deve ao trabalho realizado na unidade de Taquari em parceria com a GE na otimização química dos reatores de troca térmica, economizando US$ 85.380,00 nos custos opeBeatriz Pinheiro racionais além de importantes benefícios para o meio ambiente.

Cultivar

www.cultivar.inf.br

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Algodão Fotos Paulo Degrande

Melhor sem bicudo Atingindo os algodoais já há duas décadas, o bicudo preocupa a cadeia produtiva de algodão e o monitoramento e controle começam a tomar dimensão nacional

O

setor têxtil brasileiro vive hoje um bom momento, graças à modernização e qualidade da atividade frente a um mercado competitivo. Um dos exemplos deste sucesso vem do campo, justamente no setor de produção da mais importante fibra natural do mundo: o algodão. Controlar as pragas do algodoeiro em sintonia com valores econômicos, ambientais e sociais compatibiliza a atividade com esta atualidade do mercado. E, dentre as pragas da cultura, o bicudo é capaz de exprimir toda esta demanda por maior integração, visão competitiva e necessidade de adotar corretamente as práticas tecnológicas existentes. O bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis) foi constatado pela primeira vez no Brasil no ano de 1983 em dois focos distintos e separados entre si: um na Região de Campinas/Sorocaba (SP) e outro na Região de Campina Grande/Ingá (PB). Muito já se escreveu e falou sobre as ações que poderiam ter sido tomadas naquele momento. O bicudo deveria ter sido erradicado quando chegou no Brasil, mas não foi. Na época, por falta de decisão política dos governos estadual e federal, omissão do setor pro-

08

Cultivar

dutivo, alegações descabidas de alguns cientistas de renome e de ecologistas aloprados influentes, nenhuma atitude responsável foi tomada. Hoje, praticamente todo o país está infestado pela praga e as lavouras de algodão sofrem prejuízos que variam de 3 a 75% da produtividade esperada. Na média estima-se que estas perdas são da ordem de US$ 140 a 350 por hectare, incluídos os custos de controle, danos e depreciação da infra-estrutura de combate da praga.

Prejuízos pelas infestações provocadas pela praga variam de 3 a 75%

www.cultivar.inf.br

Durante anos restou a alternativa de conviver com a praga, cujo remédio foi um manejo que permitia a ela, danificar até 10% de botões florais. O ponteiro das plantas passou a ser alimento de bicudo de fim de safra agravando as perdas de produtividade, dada a dificuldade de controlá-lo sob condições de alta infestação. Consagrou-se a fama da praga e a ela foi atribuída uma espécie de concordata da cotonicultura nacional a partir da segunda metade da década de 80. Numa análise acurada e histórica, além da elevação do custo de controle e os danos do bicudo, também contribuíram para a derrocada da atividade a falta de crédito para os produtores, os sistemas insustentáveis de arrendamento de terras da época, o impacto da importação desenfreada de fibra, a desestruturação da extensão rural, a desorganização da cadeia produtiva e a falta de uma política agrícola para a atividade. Somente a partir de 1996, quando os algodoais se expandiram para o Cerrado Brasileiro, graças à competência dos atuais produtores, que o quadro começou a mudar. A Figura 1 ilustra a evolução da produção e da área plantada de algodão de 1981 a 2000 no Paraná, indi-

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


cando esta oscilação ao longo dos anos. Em 1990, o bicudo-do-algodoeiro já tinha de alastrado por todo o estado. Com a migração da atividade para áreas novas, de baixa prevalência ou ainda não infestadas pelo bicudo, com clima favorável à cultura e produtores dispostos a trabalhar num novo patamar tecnológico e de investimento, o algodão brasileiro voltou a ter destaque no mercado interno e externo. Para o país, obviamente, num contexto de sustentabilidade, estas oscilações são extremamente indesejáveis, pois levam à exclusão de profissionais, produtores e trabalhadores da atividade. Estas variações bruscas nos sistemas de produção eliminam ou levam a obsolecência os sistemas produtivos regionais. Mas afinal de contas, o que é sustentabilidade? É um conceito que objetiva a conciliação das necessidades econômicas, ambientais e sociais sem comprometer o futuro de quaisquer dessas demandas. Como incitador da inovação, de novas tecnologias e da abertura de novos mercados, o desenvolvimento sustentável tonifica o modelo empresarial atual baseado em ambiente de qualidade e competitividade global.

COMO ENFRENTAR O BICUDO Hoje, numa análise responsável das tecnologias disponíveis, eficientes e exeqüíveis para o controle do bicudo, basicamente temos o uso associado de feromônio grandlure, armadilha de captura, práticas culturais, inseticidas, métodos legislativos, adesão maciça dos produtores e recursos financeiros devidamente organizados e inseridos em bons programas de controle, supressão ou erradicação. Técnicas de controle biológico ou plantas transgênicas que controlem eficientemente a praga ainda precisam de investimentos em pesquisa. Não existe no curto e médio prazo de cinco anos, ao menos, qualquer perspectiva de existir variedades de ponta com genes de resistência ao bicudo (cultivares comerciais ou pipelines), nem laboratórios que consigam atender a demanda por inimigos naturais que combatam o bicudo. Estas duas técnicas são esperanças que estão depositadas em

Figura 1: Evolução da produção e da área plantada de algodão de 1981 a 2000 no estado do Paraná

(Fonte: Claspar, 2001)

cientistas e centros de pesquisa para um futuro melhor e demandam investimentos de ciência e tecnologia. Atualmente, as principais ferramentas de controle que devem ser engajadas em qualquer programa de controle, supressão ou erradicação do bicudo, com base em boa ciência, são: 1) Grandlure - É um feromônio produzido pelos machos de bicudo com duas finalidades básicas: agregar machos e fêmeas da espécie no local, e exercer atração sexual das fêmeas. É liberado em quantidades significativas após os machos se alimentarem de algodoeiro no início da safra. Tem a função de facilitar ao bicudo o encontro da lavoura e favorecer a aproximação dos sexos para o acasalamento. É composto de quatro substâncias químicas ativas, cujo balanço entre elas exerce o poder atrativo. Foi sintetizado industrialmente e é usado comercialmente em armadilhas de atração, captura e monitoramento. 2) Armadilha de captura – o modelo atual é composto de uma base plástica verde de formato cônico com o topo achatado que acopla um funil telado em cuja parte superior recebe um receptáculo plástico. Uma pastilha contendo pelo menos 10 mg de grandlure é colo-

cada no receptáculo com a finalidade de atrair os insetos. Outra pastilha contendo uma substância tóxica deve também colocada no recipiente do topo da armadilha, geralmente à base de diclorvós, para matar os indivíduos capturados evitando sua eventual fuga. O bicudo detecta o feromônio contido na pluma de ar que corre na direção do vento e voa para a armadilha, pousando na base verde (muitas pesquisas indicaram que esta é a cor mais atrativa). O bicudo tem o comportamento natural de caminhar na estrutura que pousou, ir para o cone e posteriormente para o receptáculo onde fica aprisionado e morre, tornando-se possível contar, posteriormente, os indivíduos capturados. Fica viabilizada assim a técnica de amostragem da praga, mesmo em condições de baixíssima infestação. 3) Práticas culturais – 3.1. tratamento de final de safra: é a mais importante técnica para iniciar um programa regional de controle de bicudo (supressão ou erradicação, principalmente), consiste em eliminar os insetos antes ou quando eles ganham gorduras no outono, e antes deles deixarem as lavouras para se alojar nos refúgios. Esta prática tem por objetivo reduzir as populações de entressafra que ao sobreviverem infestam as lavouras na prima-


Paulo Degrande

cedidos. Entretanto, alguns sinais indicam a necessidade de evoluir nos modelos atuais ou tomar atitudes que minimizem o risco de fracassos no futuro. Em geral, os resultados de sucesso têm sido relacionados à redução do número de aplicações de inseticidas, maiores produtividades, melhoria do nível de conscientização do Manejo Integrado de Pragas, menores riscos de perdas de produção pelo bicudo, e repercussão no melhor controle de outras pragas da cultura. Por exemplo, a Cadeia Produtiva do Algodão de Goiás está certa de que o programa de controle do bicudo é co-responsável pelo aumento das produtividades registrado na maioria das lavouras goianas nesta safra. Este incremento tem variado entre 5% e 25%, com média geral ficando na casa dos 15%, em relação às duas safras anteriores. Outras estimativas indicam que quem não adotou o Plano teve prejuízos superiores a 10% devido ao bicudo. Adesão e cooperação têm sido as palavraschaves para o sucesso dos planos propostos. Quanto maior a porcentagem de produtores de uma região que adotam o modelo e mais rígida é esta obediência, maiores têm sido os sucessos da proposta. Inclusive, uma das metas mais ambiciosas atualmente é a supressão da praga em algumas regiões que têm adotado o plano na sua integralidade. Outros estados da federação têm adotado medidas similares e alcançado sucesso em suas áreas. No estado de São Paulo, o exemplo vem dos produtores da região de Holambra II. Em Mato Grosso, as ações de manutenção de “áreas livres” desenvolvidas nas regiões localizadas ao norte de Cuiabá e as iniciativas em Campo Verde e Primavera do Leste ilustram o valor das mobilizações regionais.

PROGRAMAS ATUAIS

B

vera do ano seguinte. É uma técnica que realmente funciona: com ela as primeiras pulverizações podem começar mais tarde na próxima safra, com isso os inimigos naturais se estabelecem cedo e exercem seu papel de controle biológico de pragas secundárias, diminuindo as aplicações de safra, reduzindo custos. Trata-se do primeiro passo num programa de supressão ou erradicação, é a partir daí que se começa um programa desta magnitude. 3.2. tratamento de primeiro botão floral: aplicação de inseticida feita por ocasião da emissão dos primeiros botões florais na área com vistas a não permitir a oviposição que geraria um grande número de descendentes na primeira geração. 3.3. desfolha, colheita rápida e destruição de soqueira: para reduzir a sobrevivência, a alimentação na entressafra, e os locais de refúgio. 4) Inseticidas – uma extensa lista de produtos tem registro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento para o controle do bicudo, principalmente dos grupos químicos dos organofosforados, ciclodienos ou piretróides, cujas eficácias dependem da particularidade de cada molécula, da formulação (suspensão concentrada, emulsão, concentrada emulsionável, oleosa em ultra-baixo-volume) e das dosagens utilizadas. Lembrar sempre que os inseticidas são substâncias tóxicas que devem ser manipuladas com cautela, responsabilidade e o devido rigor agronômico.

Falta de investimentos limitam a pesquisa na busca de controle biológico ou transgênicos resistentes

No Oeste da Bahia está em aplicação um grande Plano Regional, que está se expandindo para o Sudoeste do estado, no Vale do Rio São Francisco. Da mesma forma que Goiás fez, organizando-se, a cadeia produtiva têxtil da Bahia adotou medidas de controle da praga dentro de uma visão integrada e de âmbito regional e os resultados já começam a aparecer. Como visto, o Brasil hoje tem uma série de ações estadualizadas para a solução do problema do bicudo. O próximo passo é unir todos os estados em torno de um projeto nacional, respeitando as particularidades locais, e quem sabe com o envolvimento dos países vizinhos que estão infestados com a praga. Paulo E. Degrande, UFMS Walter J. dos Santos, Iapar André Felipe C. P. da Silva, Mapa

Janice Ebel

asicamente, os programas atuais estão estruturados em plantios regionalmente concentrados; tratamentos de bordadura, no momento da emissão do primeiro botão floral (B1) e primeiro capulho aberto (C1); adoção de níveis de controle da praga cientificamente definidos para regiões de cerrado; redução de população de final de safra por ocasião da maturação/desfolha; e eficiente destruição de soqueiras.

O PIONEIRISMO DE GOIÁS Nas últimas safras agrícolas, os produtores de diversas regiões produtoras de algodão do Brasil têm adotado iniciativas de modelos regionais de controle do bicudo-do-algodoeiro. Em parceria com agrônomos, consultores, empresas, fundações e poder público estão estabelecidos programas simples, práticos e eficientes para controlar a praga a níveis economicamente satisfatórios, com benefícios econômicos e sociais para a atividade e as regiões. Através da união de esforços e do uso de tecnologias apropriadas estão conseguindo manter os programas bem su-

10

Cultivar

Para os autores o próximo passo é unir todos os estados em torno de um projeto nacional

www.cultivar.inf.br

C

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Sorgo Cultivar

Potencial de expansão O

parado à cultura do milho (Quadro 1), e por ser uma cultura totalmente mecanizável utilizando os mesmos implementos empregados em outras culturas, destacam-se como as principais vantagens que faz com que o sorgo aumentasse a área e a produção de grãos nos últimos anos. A produção de grãos desse cereal saltou de 295 mil toneladas na safra de 1990/01 para 2.009.000 toneladas na safra 2003/04 (Conab, 2004). Acréscimos signifi-

Alessandro Guerra da Silva

sorgo é uma das culturas de grande importância mundial na produção de grãos. No Brasil, a produção deste cereal é basicamente destinada à formulação de rações de aves, bovinos e suínos, além da possível utilização para produção de farinha que constituirá diversos tipos de alimentos para a população. A maior tolerância ao estresse hídrico aliada ao menor custo de produção quando com-

Grãos se destacam pala semelhança nutricional com o milho, que pode ser substituído totalmente em dietas e rações

12

Cultivar

www.cultivar.inf.br

Com menor custo de produção em relação a outras culturas, o sorgo apresenta-se como excelente opção para o cultivo na safrinha brasileira cativos ocorreram também na área de cultivo, que passou de 195 mil hectares para 893 mil hectares no mesmo período de avaliação. Além do aumento na produção e da área de cultivo, houve também acréscimos de produtividade, na ordem de 49,14%, atingindo patamares de 2.251 kg/ha na última safra. O aumento na área de cultivo de sorgo é atribuído à elevação do número de confinamentos de gado e de granjas de aves e suínos na região CentroOeste que fez com que a cultura do sorgo encontrasse nessa região um lugar ideal para se expandir. Dentre as inúmeras vantagens que esta cultura apresenta, destaca-se também a semelhança do valor nutricional de seus grãos com os do milho, podendo substituí-lo complementarmente ou em sua totalidade como ingrediente nas dietas e rações balanceadas de animais. Estes alimentos podem ser elaborados com a complementação determinados aminoácidos essenciais e corantes, que asseguram cor desejada na pele da carne de aves e na pigmentação da gema dos ovos. Na produção de proteína animal, o uso do sorgo pode reduzir as despesas com as rações animais devido ao seu menor custo de produção, diminuindo assim o valor do pro-

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


Quadro 1: Custo médio de produção de milho e sorgo, em um ha, cultivados na safrinha na região Centro-Oeste - Safra 2004 Sorgo Milho

Figura 1 - Comportamento de híbridos de sorgo de ciclo precoce e ciclo médio/tardio, em quatro épocas de semeadura, em nove locais dos estados de Mato Grosso e Goiás (modificado de Peixoto, 2002 citado por Coelho et al., 2002)

Reais (R$)/ha Operações Agrícolas 157,06 191,70 Insumos (sementes, adubos e defensivos) 409,00 1.020,00 Administração Agrícola 59,64 59,64 Pós-colheita 83,16 94,08 708,86 1.365,42 Fonte: FNP - modificado

duto final. No entanto, o valor de comercialização do sorgo é de 70 a 90% do valor do milho, sendo dependente da oferta de milho no mercado, do local de cultivo e da época de comercialização. Desta forma, percebe-se a importância de se utilizar os grãos de sorgo na própria propriedade visando redução nos custos de produção animal. Atualmente, a pesquisa disponibiliza novas cultivares de melhor valor nutricional e com baixo teor de tanino nos grãos. A presença deste componente nos grãos torna-se uma característica indesejável, pois diminui expressivamente a digestibilidade de aminoácidos, influenciando negativamente no aproveitamento de proteínas presentes nas rações dos animais. Este é o motivo pelo qual as indústrias utilizam cada vez mais o sorgo de baixo tanino como fonte de matéria-prima na formulação de rações. Por outro lado, cultivares que apresentam tanino nos grãos são menos atacadas por pássaros e são recomendadas para determinadas regiões. Por não competir em área e mercado com as culturas de soja, milho e arroz cultivados no verão, o sorgo vem ganhando a preferência do produtor no momento de se definir qual cultura a ser cultivada na safrinha, mesmo apresentando uma remuneração mais baixa em relação ao milho. Entre outras vantagens, o cultivo do sorgo no sistema de plantio direto, principalmente em sucessão à soja, pro-

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005

porciona a formação de grande quantidade de palhada, fundamental para a manutenção da produtividade e na conservação das características do solo. Devido às suas características de rusticidade e a excelente performance em semeaduras de fim do verão, o sorgo granífero tem sido cultivado em grandes áreas na região dos cerrados. A ampla variação observada no rendimento das cultivares é atribuída não só ao seu potencial produtivo, mas também às respostas às condições climáticas, principalmente a chuva e temperatura. Neste aspecto estes fatores são dependentes do local de cultivo, ressaltando que no Centro-Oeste, a baixa disponibilidade de água é considerada fator limitante ao desenvolvimento do sorgo e obten-

www.cultivar.inf.br

ção de altas produtividades. Na região dos cerrados, a falta de chuvas no período da entressafra pode gerar grande risco para a produção de grãos, sendo que poucas culturas de valor econômico poderiam ser usadas em condições de safrinha. Pelo fato de utilizar eficientemente a água e tolerando períodos de estresse hídrico, o sorgo vem ganhando espaço cada vez mais no cultivo da safrinha. Porém, a produção de grãos é altamente influenciada pela época de semeadura na safrinha. A limitação de maquinários ou o atraso na colheita da cultura de verão levam os produtores do Centro-Oeste a semear o sorgo em um período que não seja ideal para o desenvolvimento da cultura. Semeaduras efetu-

Cultivar

13


Cultivar

adas muito tardiamente, como no final de março e no início de abril, podem proporcionar reduções expressivas no rendimento de grãos. Nessa região, os produtores, após efetuarem a colheita da soja precoce de verão, cultivam o milho safrinha em fevereiro e princípio de março. Se a colheita da soja atrasar, faz-se a opção pelo sorgo safrinha, podendo atrasar sua semeadura caso haja disponibilidade de chuvas. No entanto esta não é uma prática muito recomendada em virtude de proporcionar riscos de queda na produção de grãos. Importante não só no processo de germinação e emergência das plântulas, a disponibilidade de água no solo é fundamental nas fases de floração e enchimento de grãos, visando assegurar rendimentos satisfatórios de produtividade. Para isto, é necessário que o produtor programe a época da semeadura do sorgo para que essas fases não coincidam com período de maior deficiência hídrica na sua região. Isto pode ser conseguido com a antecipação do plantio da cultura de verão. O sucesso da alta produtividade de sorgo na safrinha inicia com o correto planejamento do plantio da cultura de verão e o produtor deve efetuar a semeadura do sorgo até meados de fevereiro, sendo o mais recomendável, com tolerância até princípio de março. Para o plantio do sorgo safrinha, é interessante que se faça uma dessecação bem feita, escolhendo corretamente os herbicidas e as doses a serem aplicadas. Neste aspecto, é fundamental que os equipamentos estejam bem regulados para evitar falhas na aplicação e o ressurgimento de ervas daninhas durante o desenvolvimento do sorgo. Além dos cuidados na época de plantio, o produtor tem que atentar também para o ciclo das cultivares, pois além de antecipar a época de semeadura, é recomendável que ele

utilize cultivares mais precoces, para garantir que as fases de maior exigência hídrica (floração e maturação) ocorram em períodos em que haja disponibilidade de água no solo, como verificado na Figura 1. Em condições irrigadas, teria-se maior flexibilidade para a época de semeadura do sorgo, ficando limitado somente às condições de temperaturas baixas, que seriam prejudiciais ao desenvolvimento das plantas. Com o lançamento de cultivares de maior potencial produtivo, é necessário que se faça também o manejo correto da adubação do sorgo visando assegurar o melhor aproveita-

MERCADO PARA O PRODUTO

A

cultura do sorgo auxiliaria nas divisas do país. O Brasil pode consolidar sua posição como exportador de milho pela expansão da cultura do sorgo na região dos cerrados. Um dos motivos seria o fato dos Estados Unidos, o maior exportador mundial de milho, estar utilizando este grão para produção de biocombustíves para consumo interno, fazendo com que haja aumento na demanda do cereal. Consequentemente haverá diminuição nas vendas externas de milho americano, favorecendo assim a exportação de milho brasileiro. Isto se consolidará quando houver a produção em maior escala de grãos al-

14

Cultivar

ternativos, como o sorgo, principalmente para atender a crescente demanda das indústrias de rações. O Brasil poderia gastar assim menos divisas com a importação de milho, como ocorreu nos últimos anos, caso houvesse maior oferta de sorgo no mercado. Isto seria benéfico para os produtores, para as indústrias e principalmente para a balança comercial do país. A indústria e o consumidor ganhariam também mais uma opção de grãos para a formulação de rações, a custos mais reduzidos. Por tudo isto, o agronegócio brasileiro pode obter grandes benefícios com o cultivo de sorgo na safrinha.

www.cultivar.inf.br

Não competindo em área e mercado com outras culturas, o sorgo vem ganhando a preferência do produtor

mento dos fertilizantes. Sabe-se que a retirada de nutrientes do solo pelo sorgo é semelhante ao de outras culturas, como o milho, por exemplo. A quantidade removida de nutrientes do solo em uma safra será função do potencial produtivo do sorgo cultivado. Para a realização de uma adubação equilibrada e que garanta maior retorno econômico ao produtor, deve-se levar em consideração a produtividade esperada de grãos, além dos teores de nutrientes presentes no solo. Seria claro, portanto, que a quantidade de nutrientes residuais deixados pela cultura de verão não seria suficiente o bastante para garantir altas produtividades do sorgo safrinha, desmistificando a idéia de que a cultura seria esgotante do solo. Outro fator limitante para a obtenção de altas produções de grãos e que o produtor deve estar atento na escolha da cultivar é o nível de incidência de doenças. Neste contexto destacam-se várias enfermidades, dentre elas a antracnose (Coletotrichum graminicola), que é favorecida pelas condições climáticas de temperatura e umidade elevadas. Outras doenças também podem causar prejuízos no sorgo como a helmintosporiose (Exserohilum turcicum), ferrugem (Puccinia purpurea), míldio (Peronosclerospora sorghi), podridão seca do colmo (Macrophomina phaseolina) e doenças que atacam a panícula, como a doença açucarada do sorgo (Sphacelia sorghi), que tem causado danos expressivos em determinadas épo-

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


Divulgação

cas do ano. Na safrinha, tem sido constatado nos últimos anos vários problemas com a antracnose. No manejo das doenças, o produtor pode fazer uso de fungicidas para evitar danos à produção, no entanto, o aumento dos custos desses insumos nas últimas safras tem inviabilizado a aplicação de fungicida, principalmente no sorgo safrinha. Nestas condições, cultivares de sorgo sensíveis podem apresentar maior incidência de doenças, e conseqüentemente, não permitir a obtenção de uma colheita satisfatória. O produtor pode evitar as doenças em sua lavoura empregando várias táticas de controle. A rotação de culturas e a eliminação das plantas hospedeiras/invasoras que estiverem presentes na área podem ser medidas eficientes de controle. Além disto, a variabilidade genética existente entre as cultivares de sorgo faz com que haja incidência diferenciada de doenças. Assim, o uso de cultivares resistentes é uma das práticas mais eficientes e econômicas para o controle das doenças do sorgo. Aliado a isto, a maior precocidade das cultivares proporciona menor tempo das plantas de sorgo em campo, e conseqüentemente, menor será o risco de infecção. Desta forma, a escolha por cultivares mais precoces é uma atitude sábia do produtor que quer

obter altos rendimentos na safrinha com o cultivo de sorgo. Além de todas as práticas culturais mencionadas para o sorgo, é importante também que o produtor efetue a colheita na época adequada. Isto permite que a cultura não fique no campo devido à falta de armazéns pela ocupação dos produtos da colheita da safra de verão, ou mesmo como uma opção do produtor em tentar minimizar os custos de armazenagem

Alessandro mostra que a maior precocidade das cultivares proporciona menor tempo das plantas no campo

de grãos. A colheita no momento correto evita perdas no campo, como o acamamento das plantas e perdas na colheitadeira, além de evitar o ataque de pragas e a germinação de grãos na panícula quando há umidade na lavoura. C Alessandro Guerra da Silva, Fesurv


Milho Fotos Ricardo Casa

Mancha crescente

Phaeosphaeria, considerada como patologia secundária até o início dos anos 90, toma dimensões de grande importância econômica e preocupa por não haver, ainda, produtos para o controle

16

Cultivar

www.cultivar.inf.br

A

cultura de milho tem grande importância econômica e social em nosso país. Em 2001, o Brasil foi o terceiro produtor mundial, com uma produção média de 41 milhões de toneladas, numa área de 12 milhões de hectares. Seus produtos como grãos, matéria verde fresca, amido, amilose, xaropes de glicose e maltodextrinas são utilizados na alimentação humana, diretamente ou após a industrialização e, principalmente, na alimentação de aves, suínos e bovinos. Entretanto, atualmente um dos principais entraves para o desenvolvimento deste setor é a disseminação de diversos patógenos que infectam a cultura. O fungo Phaeosphaeria maydis, agente etiológico da mancha branca do milho, tam-

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


CARACTERÍSTICAS

O

bém denominada de mancha de Phaeosphaeria ou esferolínea, destaca-se por causar danos expressivos no Brasil, tanto pela sua ampla distribuição como pelos prejuízos causados às cultivares suscetíveis. Existem poucos registros na literatura confirmando o agente causal da mancha de Phaeosphaeria. Recentemente, foi sugerido que picnídios e

Períodos de severidade da doença são encontrados entre os meses de dezembro e maio

pseudotécios presentes nas lesões típicas da doença pertencem a outras espécies de fungos e não a estados anamórfico e teleomórfico de um mesmo agente (Cervelatti et al., 2002). Encontrase também o registro na literatura do envolvimento da bactéria Pantoea ananas na produção de sintomas típicos da

fungo Phaeosphaeria maydis (P. Henn.) Rane, Payak e Renfro [Sinonímia Sphaerulina maydis P. Henn.], cujo estágio anamorfo foi inicialmente identificado como Phyllosticta sp., atualmente é denominado como Phoma maydis (Carson, 1999). No campo, o fungo sobrevive na forma de esporos em partes das plantas doentes que, sob condições favoráveis, germinam e infectam as folhas de milho (Fantin, 1994). Segundo Fernandes & Oliveira (1997), os esporos que permanecem nos restos culturais incrementam o potencial de inóculo para anos posteriores. “Mancha de Phaeosphaeria” (PaccolaMeirelles et al., 2001). Amaral et al. (2002) alertam para a possibilidade de existirem diferentes agentes causais que provocariam sintomas semelhantes aos da Mancha de Phaeosphaeria. Apesar da necessidade de estudos futuros que comprovem o cumprimento dos postulados de Koch, encontram-se disponíveis na literatura diversos trabalhos de-


Fotos Cultivar

senvolvidos no Brasil que indicam a patogenicidade de P. maydis (Fantin & Balmer, 1997; Fantin & Resende, 1999; Fantin et al.; 2001, Fantin et al., 2002). Os sintomas da doença iniciam-se, em geral, por manchas pequenas, levemente cloróticas, tornando-se esbranquiçadas, arredondadas a oblongas com 0,3 até 2 cm, dependendo principalmente da resistência da cultivar. Essas lesões podem evoluir para necróticas, com coloração amarelo-palha e de bordos bem definidos de cor pardo-escura. Geralmente, os sintomas aparecem primeiro nas folhas inferiores, progredindo rapidamente para o ápice da planta. Podem ser encontradas, no centro das lesões, pontuações escuras que são os pseudotécios e picnídios do fungo. A incidência da doença aumenta em condições de alta umidade relativa e temperatura moderada, principalmente quando a temperatura se eleva logo após uma chuva. Estas condições ocorrem com freqüência, durante o período no qual se cultiva o milho, em vários estados do Brasil (Fantin, 1994). De acordo com o

18

Cultivar

Manchas geralmente evoluem da parte inferior da planta para o ápice

estudo realizado por Fernandes et al. (1995), a doença praticamente não ocorre nos meses de julho a outubro, mas alcança níveis altos de severidade em dezembro a maio. Sawazaki et al. (1997) verificaram a partir dos dados de temperatura e precipitação obtidos durante o ciclo da cultura que a uniformidade de precipitação é o fator climático preponderante. O fator climático que esteve mais correlacionado com a severidade da doença foi o número de horas de umidade relativa acima de 90%, embora isoladamente este fator ecológico não tenha sido suficiente para explicar o progresso da doença. Esses dados alertam para o fato de que a estabilidade e a durabilidade da resistência devem ser periodicamente checadas, tendo em vista a influência de fatores ambientais na expressão do caráter. Quando cultivado in vitro, o fungo apresenta crescimento bastante lento, inclusive na faixa mais adequada de temperatura (20 a 22 oC), mostrando-se sen-

www.cultivar.inf.br

sível a temperaturas acima de 30 oC (Fantin et al., 1996). O grande número de lesões provocadas por P. maydis causa requeima das folhas que cessam a fotossíntese na fase de enchimento dos grãos, os quais secam prematuramente antes de atingirem seu tamanho normal. Portanto, a diminuição da produção resulta da redução da fotossíntese decorrente da área foliar lesionada. Todavia, o patógeno também é capaz de inibir a fotossíntese no tecido foliar assintomático remanescente. Foram observadas reduções na taxa fotossintética líquida da folha ao redor de 40% para severidades da doença variando entre 10 e 20%. Isto se deve a uma diminuição da eficiência de uso da radiação interceptada, que pode ser resultante de alterações na difusão de CO2 na folha e alterações na relação de solutos entre as células do hospedeiro, entre outros mecanismos possíveis (Godoy et al., 2001). Apesar de existirem poucas informações no Brasil sobre os prejuízos causados por P. maydis, sabe-se que estes podem ser de grandes proporções. A mancha de Phaeosphaeria tem aumentado em incidência e severidade em praticamente todas as regiões brasileiras (Fernandes & Oliveira, 1997). Os estados mais afetados segundo Santos et al. (2002) são Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, São Paulo, Santa Catarina e Minas Gerais, principalmente na região do Triângulo Mineiro. No estado de São Paulo, tem sido observado que a mancha de Phaeosphaeria apresenta maior severidade principalmente em locais de maiores altitudes (regiões Centro e Sul), porém é de ocorrência generalizada em quase todos os anos agrícolas, tendo sido bastante expressiva nas safras 95/96 e 96/97 nas regiões Centro-Norte e Sul (Fantin et al., 2000). A freqüência de cultivos constitui-se em fator determinante da ocorrência desta moléstia. Como exemplo disto, na região do Sul de Minas onde o plantio ocorre apenas uma vez por ano, o potencial de inóculo de P. maydis é menor em relação à região do Triângulo Mineiro, em função do plantio na época do verão, do uso de irrigação e da safrinha, além de que em muitas propriedades não se faz a rotação de culturas (Miguel-Wruck et al., 2002). Além disso, têm-se verificado que níveis elevados de nitrogênio no solo podem favorecer a ocorrência desta doença (Parentoni et al., 1996; Fantin et al.,1999; Miranda et al., 2002).

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


Dentre as estratégias que auxiliam no controle do patógeno menciona-se o plantio antecipado, a rotação de culturas e o emprego de cultivares resistentes, sendo esta última considerada como a mais eficiente e econômica. De fato, a resistência do milho a P. maydis é dependente do genótipo da planta, das condições ambientais e, provavelmente, do genótipo do patógeno (Cleide et. al., 2002). No entanto, o desenvolvimento de cultivares resistentes requer trabalho intenso, uma vez que os mecanismos envolvidos no controle genético da doença devem estar elucidados, as fontes de resistência devem ser identificadas e devem ser adotadas estratégias eficientes na transferência dos alelos de resistência para as linhagens elites de milho que participam dos híbridos comerciais. Com relação ao controle genético da resistência para esta doença, alguns estudos propõem a ação de pelo menos dois genes independentes que possuam efeitos aditivos, porém com desvios de dominância e epistasia (Parteniani et al., 2000; Pegoraro et al., 2002; Schuelter et al., 2003). Esses resultados são bastante promissores para o melhoramento genético dessa planta, uma vez que apenas os efeitos de aditividade são transmitidos aos descendentes. Além disso, no estudo realizado por Pegoraro et al. (2002), a herdabilidade de média a alta deste caráter indica que genótipos resistentes podem ser eficientemente selecionados em populações segregantes. Diversas fontes de resistência têm sido identificadas nas principais regiões produtoras do país (Fantin et al., 1991; Sawazaki et al., 1997; Brasil & Carvalho, 1998; Paterniani et al., 2000; Pegoraro et al,. 2001; Santos et al., 2002). Todavia, é muito importante que a avaliação do comportamento de materiais genéticos seja feita regionalmente quando se tem a finalidade de recomendar

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005

HISTÓRICO

O

O plantio antecipado é uma das práticas recomendadas para escapar dos fortes ataques do fungo

cultivares para o plantio, uma vez que os materiais selecionados como resistentes em determinadas regiões podem se comportar como moderadamente resistentes ou suscetíveis em outras. Alguns estudos preliminares demonstram a eficiência de alguns fungicidas para controlar a mancha de Phaeosphaeria, como o oxicloreto de cobre e Mancozeb (Borges & Campos,1996; Pinto, 1997). Porém, cabe salientar que ainda não existe recomendação técnica para os mesmos, um fato que sugere a necessidade de estudos mais aprofundados, de modo a viabilizar esta tecnologia. Assim, tendo em vista os aspectos acima discutidos e principalmente devido à crescente importância da doença nos principais centros produtores de milho do país, trabalhos de investigação desta patologia se justificam. Parece ser consenso a necessidade de se estudar a variabilidade genética do pató-

www.cultivar.inf.br

primeiro registro de isolamento e identificação deste patógeno ocorreu na Índia, em 1965 (Rane et al., 1965). Desde então, a doença vem se propagando pelas principais regiões produtoras de milho em todo o mundo. Inicialmente, esta moléstia foi considerada como uma patologia secundária no Brasil, pois não causava maiores danos econômicos, ocorrendo com maior freqüência no final do ciclo da planta. Todavia, a partir do início da década de 90, sua ocorrência generalizou-se, principalmente nos meses de dezembro a março. O agravamento da doença no país se deu em função de modificações no cultivo do milho, como o plantio predominante de cultivares de ciclo precoce a superprecoce adaptadas a uma maior amplitude de ambientes e à ampliação das épocas de plantio (iniciando-se em fevereiro-março - Fantin, 1994). A utilização de irrigação e o emprego de genótipos suscetíveis também contribuíram para o agravamento da doença. geno, na tentativa de identificação das raças, para que futuras quebras de resistência possam ser evitadas. De forma similar, a elucidação dos mecanismos envolvidos no processo de infecção e colonização da planta por parte do patógeno, bem como os mecanismos estruturais e bioquímicos envolvidos na resposta de defesa por parte da planta também são necessários para que se possa adotar medidas efetivas de controle C da doença. Shirley Kuhnen, Juliana Bernardi Ogliari, Antônio Carlos Alves e Marcelo Maraschin, UFSC

Cultivar

19


Milho

Fotos Elizabeth de Oliveira

Novo agente causal Confirmação da descoberta de novo agente causal da mancha por Phaeosphaeria pode auxiliar a pesquisa na determinação de seu controle

A

doença denominada mancha de Phaeosphaeria tem sido relatada por sua ocorrência severa no milho, em várias regiões do território nacional, desde os anos 80. Não há registro certo de quando foi encontrada pela primeira vez no Brasil, porém sua presença tem sido mencionada em trabalhos científicos, em artigos e em livros desde 1979. As plantas com essa doença apresentam nas folhas, e por vezes, nas palhas, lesões em formato arredondado ou elíptico, de coloração palha que, em geral, iniciam-se nas folhas inferiores e progridem rapidamente nas folhas superiores, podendo

20

Cultivar

causar morte precoce da planta, quando predominam condições de alta umidade relativa e temperaturas noturnas inferiores a 200C. Tem sido encontrada apenas em plantas de milho adultas, iniciando-se os primeiros sintomas por ocasião do florescimento; nunca em plantas jovens. A mancha por Phaeosphaeria foi relatada em milho, pela primeira vez, na Índia, em 1965, assumindo-se como seu agente causal o fungo Phaeosphaeria maydis, (forma imperfeita: Phyllosticta sp) (Rane et al., 1965). Ao realizar a identificação taxonômica desse fungo, Rane e seus colaboradores afirmaram que, o fungo de-

www.cultivar.inf.br

nominado Sphaerulina maydis P. Hennigs, assim classificado por Hennigs, em 1902, em amostras de folhas de milho coletadas no Brasil, tratava-se provavelmente, de Phaeosphaeria maydis. É provável que esse fato tenha sido a razão de pesquisadores brasileiros terem assumido que a mesma doença estava ocorrendo no Brasil. Contudo, nos últimos anos, a etiologia dessa doença tem sido muito questionada no Brasil, uma vez que, tanto o fungo Phaeosphaeria maydis, quanto sua forma imperfeita Phyllosticta sp, quando isolados de milho, cultivados em meio de cultura e, novamente inoculados em plantas de milho, não causam os sintomas típicos da doença, como seria esperado. Ademais, o exame direto de lesões dessa doença através da microscopia, tem mostrado ausência desses fungos na grande maioria das amostras examinadas. Esses fatos têm motivado os pesquisadores a levantarem hipóteses, e a buscarem por outro possível agente causal da doença. Existe na literatura, ao menos um relato de sucesso na inoculação de esporos de Phaeosphaeria maydis em plantas de milho e obtenção de sintomas da doença, 26 dias após a inoculação, sob condições de casa de vegetação. Porém, em outros trabalhos de inoculação, esse resultado nunca foi repetido. Como as lesões iniciais dessa doença apresentam aspecto encharcado, e por isso, semelhante às lesões do tipo anasarca, que geralmente são causadas por bactérias, foi levantada a hipótese de ser uma bactéria o seu agente causal. A bactéria Pantoea ananas foi isolada de lesões, da mancha por Phaeosphaeria, foi cultivada em meio de cultura, e novamente inoculada em plantas de milho com idade de 15, 30 e 45 dias. Foram obtidas lesões semelhantes àquelas da doença denominada mancha por Phaeosphaeria. Porém, questiona-se o fato de que, em campo, essa doença nunca é encontrada em plantas dessa idade, para se aceitar, em definitivo, que essa bactéria possa ser o seu agente causal. Recentemente, o exame de lesões da mancha por Phaeosphaeria, sob microscopia eletrônica de varredura, mostrou a presença de um fungo diminuto, com hifas de diâmetro inferior a 2µm, crescendo mais profusamente nas lesões jovens que naquelas totalmente necróticas, e produzindo estruturas que permitiram sua

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


Alta umidade relativa e temperaturas noturnas abaixo dos 20ºC são condições que beneficiam a doença

classificação preliminar como uma nova espécie no gênero Sclerophthora. Nesse estudo, estruturas dos fungos Phaeosphaeria maydis ou de Phyllosticta sp não foram encontradas associadas às lesões, porém,

essa provável nova espécie de Sclerophthora foi sempre detectada em todas as lesões examinadas, evidencia ser esse o agente causal da doença. Como as hifas desse fungo são muito finas, não podem ser distinguidas quando as lesões são diretamente observadas sob microscópio ótico composto, mas somente após clareamento e coloração das lesões com corantes para fungos. Porém, as estruturas interpretadas como os esporângios desse fungo, medem cerca de 24µm de diâmetro, e podem ser facilmente observadas sob microscópio ótico estereoscópico e sob microscópio ótico composto. A identidade desse fungo necessita mais estudos para confirmação, sobre sua

Estruturas do fungo da espécie Sclerophthora vistas sob microscópio ótico

inclusão no gênero Sclerophthora e provável descrição como nova espécie, assim como sua ação como agente causal da doença. Apesar disso, por tantas dúvidas sobre a etiologia dessa doença, e pelas evidências de um novo agente causal, sugere-se que o nome comum: “mancha branca do milho”, já em uso, por alguns fitopatologistas, seja adotado por todos, para substituir a denominação até então usada pela maioria, de “mancha por PhaeosC phaeria”. Elizabeth de Oliveira e Fernando Tavares Fernandes, Embrapa Milho e Sorgo


Cana-de-açúcar

Ampliando campo de ataque A adoção de mais de um método de controle, junto a uma análise de custo/ benefício, visam garantir o controle da broca da cana, que também está causando problemas em lavouras de milho

A

tóide (Macedo & Botelho 1988). Em que pese o sucesso técnico e econômico deste método em praticamente todas as regiões canavieiras do país, há situações, especialmente nos canaviais implantados nas regiões de fronteira agrícola, nas quais o controle biológico não apresenta a rapidez suficiente para evitar expressivos danos econômicos à cultura. Recentemente, esta praga tem se tornado bastante importante também ao milho, aumentando significativamente sua população nesta cultura pela expansão das áreas de plantio e, em especial, pela prática do cultivo do milho “safrinha”, muitas vezes rotacionando milho com milheto em áreas expressivas da região Centro – Oeste brasileira. Em virtude do exíguo tempo disponível para a

implementação de medidas de controle biológico na cultura do milho, geralmente, resta ao produtor, como única opção, o uso do controle químico na tentativa de minimizar os danos causados pela broca. Porém, embora essa prática seja passível de adoção na cultura da cana-de-açúcar no Brasil, ela tem sido pouco empregada devido aos resultados pouco confiáveis de controle (Degaspari et al. 1981). A utilização de produtos químicos nãoseletivos aos inimigos naturais pode ocasionar desequilíbrios no agroecossistema, além de limitar ou impedir o emprego de métodos de controle biológico (Hassan 1997), porém novas moléculas inseticidas disponíveis no mercado têm a qualidade de provocar baixo

Divulgação

cana-de-açúcar está sujeita ao ataque de numerosos insetos, tanto na sua parte aérea como subterrânea. Dentre estes merece destaque, pela freqüência com que ocorre e pelos danos econômicos que causa à produtividade, a broca Diatraea saccharalis. Esta praga é importante em diversas gramíneas, destacando-se a cana-de-açúcar, trigo, arroz, sorgo e milho (Zucchi et al. 1993). Os danos causados por ela à indústria sucroalcooleira no estado de São Paulo são muito grandes (Macedo & Botelho 1988). Em canade-açúcar, o seu controle é tradicionalmente realizado através da liberação de inimigos naturais que agem sobre a sua fase larval, sendo Cotesia flavipes o seu principal parasi-

22

Cultivar

www.cultivar.inf.br

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Fotos José Francisco Garcia

Na fase adulta, predadores e patógenos são os mais atuantes no controle biológico

impacto ambiental, assim, desde que estas reúnam também eficiência técnica e econômica, podem ser uma boa opção de controle para situação críticas de ataques da praga em cana-de-açúcar.

MÉTODOS DE LEVANTAMENTOS O controle a um inseto é uma decisão técnico-econômica que envolve informações quanto aos prejuízos ocasionados pelo mesmo, no momento e/ou no futuro, o método de controle a ser utilizado e os respectivos custos. Com essas informações é possível estimar-se há relação custo/benefício, a qual define a viabilidade de controle e identifica o momento de agir. Embora os sintomas de ataque da broca sejam facilmente visíveis em um canavial e as perdas que acarretam, sobejamente conhecidas, é conveniente que o produtor que pretenda implantar um programa de controle dessa praga proceda inicialmente a uma estimativa das possíveis perdas que estão ocorrendo na lavoura, pois o dano pode diferir com a variedade da cana, a época do ano, o ciclo da cultura, entre outros fatores e, por ser a cana-de-açúcar uma cultura de renda líquida baixa, todo investimento deve ser muito bem analisado sob o ponto de vista econômico. Os levantamentos de Intensidade de Infestação (I.I.%) são realizados nas frentes de corte ou quando a cana chega ao pátio da indústria, durante o período de safra. Nos levantamentos no pátio, deve ser retirado o equivalente a cinco canas por carga, tomadas casualmente nos veículos de transporte que chegam ao pátio da indústria. Quando feitos nas frentes de corte (área de colheita mecanizada), amostram-se cinco pontos casualizados de 25 canas (em pé ou cortadas

24

Cultivar

na leira), tomadas: [5 cana (5 passos) + 5 canas (5 passos) + 5 canas (5 passos) + 5 canas (5 passos) + 5 canas], totalizando 125 canas, representando até 50 ha.(Macedo & Lavorente, 2003). Em ambos os métodos as canas são abertas longitudinalmente, contando-se os entrenós com ataque do complexo broca/podridão-vermelha e o total de entrenós, anotando-se os dados em fichas apropriadas. De posse dos dados de campo, calcula-se a I.I.% pela fórmula: I.I.% = [(número de entrenós brocados / número total de entrenós) x 100] para cada zona, setor, fazenda ou talhão, tomando-se o cuidado de ponderar esses resultados individualmente, em função da área plantada ou produção em t/ha, para cada variedade de mesma idade e local. Para tanto, utiliza-se a área ou a produção correspondente ao local de origem das diferentes amostras, multiplicando-se este dado pelo valor médio de suas respectivas % I.I. e dividindo-se pelo somatório de todas as áreas ou produções. No final da safra, de posse dessas informações, pode-se decidir pelo controle no próximo ciclo da cultura. Consideram-se 3% de I.I. como o nível ao de dano econômico. Como a cana-de-açúcar é uma planta semiperene consideram-se a composição da lavoura em termos de variedades mais susceptíveis, as áreas em diferentes cortes e as que recebem sistematicamente fertirrigação,

a idade do canavial e as áreas que se destinam à produção de mudas, a partir daí se estabelece uma estratégia de ação no programa de controle, em que, prioritariamente, as áreas de cana-planta e as que recebem algum tipo de irrigação devem ter atenção especial por serem mais sujeitas ao ataque da broca.

MÉTODOS DE CONTROLE Biológico Os artrópodos exercem um importante papel no controle natural da broca, agindo sobre todas as fases de desenvolvimento; no entanto, a participação mais significativa ocorre na fase de ovo. Nesse caso, os predadores (coleopteros, dermapteros, neuropteros), parasitóides (Trichogramma galloi) e patógenos (fungos, bactérias e vírus), efetuam um eficiente controle, muitas vezes superior a 80%. Além da ação dos inimigos naturais, certas condições de clima podem também contribuir para reduzir o número de ovos viáveis. Logo após a eclosão, a lagarta também está sujeita à ação desses controladores que agem principalmente até a penetração desta no entrenó (uma a duas semanas). Uma vez a lagarta dentro do entrenó, estará mais protegida, sendo, no entanto, atacada por parasitóides (principalmente C. flavipes, Paratheresia claripalpis e Lydella minense), predado-

3% de índice de infestação é considerado nível de dano econômico levando à decisão pelo controle

www.cultivar.inf.br

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


ESTIMATIVA

A

res e patógenos. O controle natural nessa fase gira em torno de 20%. Finalmente, sobre as fases de pupa e adulto atuam, pricipalmente, os predadores e patógenos que auxiliam no controle, embora de forma muito mais modesta, se comparada à ação destes nas outras fases do ciclo. Em todo o processo que envolve o ciclo da praga e seu controle, dois outros pontos são de grande importância. O primeiro é que as variedades de cana-de-açúcar apresentam diferentes graus de resistência à Diatraea, existindo certa tendência daquelas mais precoces, produtivas e ricas em açúcar sofrerem ataques mais severos. O segundo ponto se refere à ação das práticas que envolvem a colheita da cana-de-açúcar e ao cultivo da lavoura logo após o corte tendo em vista a próxima safra e o controle biológico. A princípio, julga-se que essa sucessão de eventos (queima, corte e requeima dos restos culturais) prejudica a ação dos controladores naturais de D. saccharalis, mas na realidade todas essas práticas, ao contrário, auxiliam no controle da praga, reduzindo em mais de 95% a sua população, enquanto que uma parcela significativa de parasitóides e, principalmente, predadores sobrevivem durante esses eventos (Degaspari et al., 1983). Atualmente uma significativa área com cana-de-açúcar, especialmente no estado de São Paulo, vem sendo cortada mecanicamente e sem a queima, aumentando a matéria orgânica, devido a uma espessa camada de palha remanescente sobre o solo ao final de cada colheita. Como conseqüência, há propensão, no primeiro ano, de haver aumento da população da broca nessas áreas. Nos anos subseqüentes, porém, em função do restabelecimento do equilíbrio populacional, a praga volta a ser controlada naturalmente em novo patamar de eficiência (Araújo, 1995).

Parasitóides como Trichogramma galloi atuam com eficiência superior a 80% sobre os ovos

leta de formas biológicas, para definir os locais e momento das liberações, cujo procedimento é o seguinte: a partir de novembro fazer, quinzenalmente, vistoria geral na lavoura, conforme a composição: variedades mais susceptíveis; primeiros cortes; áreas fertirrigadas e, onde aparecer sintomas de ataques da praga. Fazer a coleta de lagartas entrando na lavoura, aleatoriamente, buscando os colmos atacados (“coração morto” e canas brocadas). O momento ideal de liberação é quando as lagartas estão fazendo galerias no colmo, com presença de dejetos externos e apresentam tamanho de 1,5 a 2,0 cm. Quando não há muitas áreas infestadas e há disponibilidade de C. flavipes as liberações devem ser feitas nas áreas que apresentarem os maiores índices de coleta. Quando

dmitindo haver uma linearidade entre a Intensidade de Infestação da broca (I.I.%), determinada pelo método de Gallo et al. (1988), e as perdas, na quantidade e qualidade da matéria-prima, resultando em uma menor extração de açúcar e/ou álcool pela indústria, procede-se à estimativa de perdas devido ao ataque da broca. Para cada 1% de I.I. considera-se uma perda de 0,77% em peso de cana no campo e 0,25% de perda no açúcar recuperável na indústria (Copersucar). há muitas áreas infestadas e há limitação de quantidade de C. flavipes as liberações devem ser feitas em áreas cujas coletas médias são superiores a dez lagartas/hora/homem, cobrindo-se todas as áreas problema. A quantidade de parasitóide liberada por hectare deve ser de 6 mil em cada liberação, e o número pode variar de uma a três liberações por ciclo da cultura.

CONTROLE QUÍMICO Levantamento para controle químico O monitoramento da população da praga com vistas à aplicação de inseticida leva em conta, dentre outros parâmetros, a idade

Levantamento para controle biológico O controle biológico baseado na liberação massal de Cotesia flavipes para ser bem sucedido passa inicialmente por levantamentos de lagartas infestantes que consiste no método de amostragem hora/homem de co-

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005

www.cultivar.inf.br

Cultivar

25


Janice Ebel

Tabela 1 Tratamentos T1 – GALLAXY 100 CE T2 – GALLAXY 100 CE T3 – NOMOLT 150 CE T4 – NOMOLT 150 CE T5 –CERTERO 480 SC T6 –Testemunha

Ingrediente ativo Nuvaluron Nuvaluron Teflubenzuron Teflubenzuron Triflumuron

g.i.a./ha 10 15 12 15 24

l ou kg/ha 100 150 80 100 50

ml ou g/trat. 500 ml 750 ml 400 ml 500 ml

Ingrediente ativo Nuvaluron Nuvaluron Teflubenzuron Teflubenzuron Hexaflumuron

Pré-avaliação % 25,80 20,60 20,50 19,66 21,70 10,80

Pós-aplicação % 14,56 a 9,60 a 10,40 a 8,64 a 14,40 a 25,28 b

Eficiencia de controle 75,9% 80,1% 78,3% 81,2% 71,6%

Tabela 2 Tratamentos T1 – GALLAXY 100 CE T2 – GALLAXY 100 CE T3 – NOMOLT 150 CE T4 – NOMOLT 150 CE T5 –CERTERO 480 SC T6 –Testemunha

do canavial (canas com entrenós formados e com cerca de 1,5 m de altura). Nesses locais examinam-se, em áreas homogêneas de até 50 ha, cinco pontos amostrais, constituídos de cinco lotes de cinco canas cada, tomadas de forma espaçada, cerca de cinco metros entre si numa mesma linha de cana (25 canas examinadas). Neste trabalho são observadas as primeiras bainhas das folhas na região do palmito que já se apresentem ligeiramente afastada do entrenó (geralmente a terceira ou quarta bainha do palmito, contando-se de cima para baixo). A aplicação do inseticida é decidida quando são encontradas 3% de canas com presença de lagartas vivas da praga, independente da quantidade de lagartas/colmo (lagartas pequenas de 2o e/ou 3o ínstares, até 1 cm, que ainda não tenham penetrado na cana). Atingido o índice acima, fazer a pulverização dentro de uma semana a dez dias. O número de aplicações varia de um a três por ciclo da cultura, distribuídas nos meses de janeiro a abril. Produtos químicos testados Visando dispor de produtos químicos para controle da broca, que sejam compatíveis com o controle biológico convencional, foram testados inseticidas e doses (Tabela 1), através de aplicações aéreas visando ao controle da broca, D. saccharalis, em cana-deaçúcar, na fase inicial de infestação. Os produtos e doses foram as que seguem: Os referidos produtos foram aplicados em faixas, em áreas de: 7,0 e 6,7 ha para Gallaxy, 7,0 e 12,5 ha para Nomolt e 6,0 ha para Cer-

tero, respectivo a cada dose, totalizando seis tratamentos. Após três semanas das aplicações foi feita avaliação de brocas pequenas nas áreas, seguidas da contagem de furos de broca, repetindo cinco vezes nas faixas nos seis tratamentos. A avaliação de presença de lagartas da broca na fase inicial de infestação (1o. ao 3o. instar) realizado um dia antes da pulverização dos produtos (pré-aplicação) indicaram infestações bastante elevadas (10,8% a 25,8%) (Tabela 2), considerando que índices acima de 3%, na fase em que se encontrava a lavoura, já justificam o emprego do controle químico. Após três semanas da aplicação foi feita nova avaliação de brocas pequenas nas áreas, repetindo cinco vezes nas faixas dentro de cada um dos seis tratamentos (pós-aplicação). Os resultados médios estão na Tabela 2. Os resultados da avaliação pós-aplicação indicaram uma redução na quantidade de lagartas para os três produtos e doses, de forma que, todos diferiram significativamente da testemunha. Sobre os dados da Tabela 2 foi aplicada a fórmula de Henderson & Tilton {%E = [1(Id x Ta / Ia x Td)] x 100} para cálculo de eficiências dos produtos. Pelos resultados, atingiram índices de controle superiores da 80% os ingredientes ativos Nuvaluron na dose 150ml/ha, e Teflubenzuron na dose 80ml/ha. A dose 100g/ha, embora tenha se mostrado ligeiramente inferior à dose me-

26

Cultivar

Recomendações resumidas do controle integrado As recomendações de controle integrado são resumidas no Quadro 1. Sendo os produtos testados perfeitamente compatíveis com o controle biológico, tanto natural como induzido por liberações massivas de parasitóides, os produtores podem desenvolver programas de controle biológico abrangentes, durante a maior parte do ciclo da cultura e, em situações específicas de focos da praga e estágio de desenvolvimento da lavoura e do inseto, fazer pulverizações com os citados produtos, reduzindo rapidamente a pressão de ataque do inseto. C Newton Macedo e Maria Bernadete S. Campos, Ufscar

Objetivo Controle

CUSTOS

O

nor, a rigor não há diferença estatística entre as duas. Assim, este produto pode ser considerado eficiente no controle de lagartas de primeiros instares em doses superiores a 80ml/ha. Os produtos Nuvaluron, na dose de 150 ml/ha, e Teflubenzuron, dose de 80 ml/ha, controlam larvas de 1o. ao 3o. instar de broca Diatraea saccharalis, em cana-de-açúcar, por meio de aplicações aéreas. Os resultados, com as devidas ressalvas, podem auxiliar no controle desta praga também na cultura do milho.

Quadro 1 Amostragem/Níveis

s custos do controle biológico convencional estão atualmente estimados em R$ 20,00 por liberação e R$ 30,00 por aplicação aérea de inseticidas fisiológicos.

Macedo aponta a problemática do controle da broca-da-cana

Pontos/até 50 ha Canas/ponto ND NC

Químico (pulverização) 5 25 canas1 5% ? 3 % de canas com lagartas2

Biológico (liberação de parasitóides) Variável (hora homem) Variable 5% ? 10 lagartas2/hora homem

Avaliação dano (I.I.%) Cana Pátio Em pé Cortada 5 5 5/carga 25 25 5% 5% 5% -

(1) Tomadas de 5 em 5 distanciadas de 5 metros. (2) Controle químico (lagartas ? 1 cm); Controle biológico (lagartas ? 1,5 cm). I.I.% = Intensidade de infestação (complexo broca/podridão).

www.cultivar.inf.br

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


Naturalmente descafeinado

Através de um amplo mapeamento das formas silvestres de cafeeiro, a descoberta de três plantas com teor reduzido de cafeína prometem ampliar os estudos para a obtenção de uma bebida mais saudável

C

onsiderando o intenso desmatamento das florestas da Etiópia, centro de origem e diversidade da espécie Coffea arabica (café arábica) e temendo pela extinção de grande parte da diversidade genética dos cafeeiros silvestres, a FAO, Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura propôs e financiou, na década de 60, uma missão internacional àquele país visando a coleta de material para ampla documentação botânica das formas silvestres do cafeeiro; de sementes para prosseguir os estudos de melhoramento e seleção; de insetos causadores de dano ao cafeeiro; de sementes para screening contra o agente causador da ferrugem (Hemileia vastatrix) e de

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005

esporos da ferrugem do cafeeiro para identificação das raças prevalecentes. Desta forma, os objetivos desta missão da FAO estavam de acordo com o conceito relativo à posse da biodiversidade vigente naquela época, ou seja, os recursos biológicos, de modo geral, incluindo-se entre eles o germoplasma vegetal, eram considerados patrimônio da humanidade estimulando-se, portanto, seu livre intercâmbio entre os países, diferentemente das regras atualmente vigentes. Nessa missão foram coletadas cerca de 600 amostras de sementes - também chamadas introduções - que foram divididas entre seguintes países: Etiópia, Índia, Tanzânia, Portugal, Peru e Costa Rica, para

www.cultivar.inf.br

instalação de réplicas desta coleção nos respectivos Bancos de Germoplasma. O Brasil recebeu em 1973, a pedido de Alcides Carvalho, uma coleção de sementes oriundas das plantas introduzidas na Costa Rica. No Brasil, após um período de quarentena, as plantas obtidas vieram a constituir dois ensaios de campo no Centro Experimental de Campinas, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), onde permanecem até hoje. Como se sabe, a variabilidade genética presente em coleções de germoplasma é a base de um programa de melhoramento genético de qualquer cultura. A erosão dos recursos genéticos de várias espécies, incluindo-se o cafeeiro, certamente caminha a passos mais largos do que aqueles responsáveis por sua geração na natureza. Ações capazes de prevenir prejuízos irreversíveis para a humanidade são imperativas e, em linhas gerais, levando-se em conta o sistema reprodutivo de cada espécie, seriam: • resgate da variabilidade genética presente nos diversos tipos de germoplasma de espécies cultivadas ou não, antes de sua total eliminação da natureza; • instalação no campo de coleções representativas ou manutenção de materiais propagativos por métodos diversos; • caracterização ampla destas coleções de modo a identificar os genes nelas representados, que em última análise definiriam seu valor para utilização no melhoramento genético vegetal. Deve ser ressaltado ainda que o valor dos recursos genéticos não se restringe apenas a sua utilização direta em trabalhos de melhoramento convencional, tendo especial significado também para o conhecimento do genoma e para o melhoramento apoiado por ferramentas moleculares. Como a maior fonte de variabilidade em uma espécie é encontrada em seu centro de origem e diversidade, uma das estratégias adotadas para que o programa de melhoramento do cafeeiro visando baixos conteúdos de cafeína nas sementes, desenvolvido pelo IAC, alcançasse seus objetivos foi a detalhada avaliação das introduAntoninho Perri

Cultivar

Café

Pesquisa seguirá dois caminhos distintos, avaliando produtividade e trabalhando com cruzamentos e autofecundação

Cultivar

27


Antoninho Perri

ções da Etiópia quanto a esta característica. Este projeto que conta com o apoio financeiro do Conselho Deliberativo da Política do Café (CDPC) através do Consórcio Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento do Café (CBP&D-Café), é liderado pelo IAC e executado desde 1999 em parceria com a Unicamp. Foram fundamentais também para a realização desta pesquisa os investimentos proporcionados pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento, Unicamp e o apoio financeiro da Fapesp. O resultado mais significativo deste trabalho foi a identificação de três plantas, denominadas AC1, AC2 e AC3, com reduzido teor de cafeína no endosperma entre as cerca de três mil plantas que compõem o germoplasma oriundo da Etiópia. Esta informação, assinada pelos pesquisadores científicos Maria Bernadete Silvarolla (IAC), Paulo Mazzafera (Unicamp) e Luiz Carlos Fazuoli (IAC), foi publicada na revista Nature, volume 429, página 826, 2004. A denominação AC foi uma homenagem dos autores ao emérito pesquisador científico Alcides Carvalho, pai da cafeicultura nacional. Como os cafeeiros AC passaram apenas por etapas iniciais de um programa de seleção massal é de se esperar que a produtividade deste germoplasma seja inferior à de variedades comerciais de café arábica disponíveis no mercado. Desta forma, os trabalhos para a obtenção de cultivares naturalmente descafeinadas deverão prosseguir por dois caminhos distintos, que serão conduzidos paralelamente. O primeiro, através da avaliação da produtividade e

28

Cultivar

O controle genético da característica “ausência de cafeína” e transferência para outras variedades também estão em estudo

demais características agronômicas, das plantas AC em ensaios clonais (reprodução por estaquia). Como são necessárias pelo menos quatro colheitas para se ter uma boa idéia da produtividade potencial de um cafeeiro, estes dados estarão disponíveis em cinco a seis anos. Entretanto, considerando-se que estes materiais não possam ser recomendados para exploração comercial em função da baixa produtividade, já está em andamento o segundo caminho, mais longo, que envolve a realização de autofecundações e cruzamentos controlados entre as plantas AC e variedades elite, de modo que a análise das descendências permita não somente determinar o controle genético da característica “ausência de cafeína”, como também transferi-la para variedades elite de arábica. Acredita-se que a transferência desta característica para cultivares comerciais de C. arabica deverá ser bastante facilitada uma vez que estará restrita a hibridações entre plantas de uma mesma espécie. É difícil estimar com precisão o tempo neste segundo caso mas, com uma expectativa boa, estima-se que de dez a 15 anos será possível ter uma cultivar produtiva e descafeinada. A proposta de aproveitamento deste germoplasma cuja característica diferencial é o reduzido teor de cafeína nas sementes, representa uma inovação tecnológica para a cultura do café uma vez que o café, naturalmente descafeinado atende a uma demanda presente no mercado consumidor global, resultando na agregação de valor ao

www.cultivar.inf.br

produto diretamente para o produtor brasileiro. O agronegócio mundial do café envolve, anualmente, recursos da ordem de US$ 91 bilhões e tem a participação de cerca de 8% da população mundial, para movimentar as 115 milhões de sacas que, em média, são produzidas. Neste gigantesco mercado se insere a cadeia produtiva do café brasileiro, que é responsável por 30% da produção mundial, empregando sete milhões de pessoas. Fica bastante evidente a relevância de trabalhos de melhoramento genético envolvendo esta cultura, especialmente no aspecto social, uma vez que a liberação de novas e superiores cultivares permite tanto a melhoria nos rendimentos dos produtores como a ampliação na geração de emprego. Segundo a Associação Brasileira da Indústria do Café (ABIC), o consumo de café industrialmente descafeinado no Brasil não chega a 1% do café consumido, contudo, existe uma estimativa de que 10% do café mundialmente comercializado destina-se à descafeinação. Este fato tem especial significado considerando-se que o Brasil é o maior produtor mundial de café. Acredita-se ainda que uma nova cultivar naturalmente descafeinada conduziria a um sensível aumento no consumo de café, uma vez que consumidores tradicionais e mesmo novos consumidores poderiam se beneficiar dos diversos efeitos positivos do café para a saúde, sem os eventuais efeitos colaterais produzidos pela caC feína em algumas pessoas. Maria Bernadete Silvarolla e Luiz Carlos Fazuoli, IAC – APTA Paulo Mazzafera, Univ. Estadual de Campinas

Autores acreditam que com o lançamento da cultivar descafeinada o consumo de café tende ser ainda maior

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Leila Costamilan

Nossa capa

A chegada aos EUA Depois de danos causados no Brasil, Argentina e Colômbia, os Estados Unidos finalmente entraram na sequência de campos infectados pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, causador da ferrugem asiática na soja

A

ferrugem asiática da soja causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi Sydow finalmente chegou na área continental dos Estados Unidos. A confirmação foi feita pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) no dia 10 de novembro de 2004. Na semana anterior, amostras suspeitas apresentando os sintomas típicos da doença haviam sido observadas na estação experimental da Universidade do Estado de Louisiana, no sul dos Estados Unidos. O responsável pela identificação foi o professor Raymond W. Schneider, fitopatologista, que terá seu nome registrado na história da fitopatologia americana como o primeiro a identificar a doença em área continental daquele país. O país estava em estado de alerta máximo e os monitoramentos se intensificaram, des-

30

Cultivar

de que a doença foi confirmada na Colômbia em agosto deste ano, fato que aumentou o risco de que esporos do fungo pudessem chegar mais rapidamente ao território americano, após cruzar a linha do Equador. Com a confirmação, uma equipe de mais de 30 profissionais e especialistas coordenada pelo USDA foi enviada ao local no dia seguinte para conduzir levantamentos coordenados em lavouras próximas da região. Quatro equipes com quatro especialistas percorreram lavouras de soja e áras com kudzu (Pueraria lobata), potencial hospedeiro alternativo, em um raio de 160km, compreendendo três regiões de Louisiana e uma região do estado do Mississipi. No total, 65 amostras suspeitas foram coletadas, sendo nove de plantas de kudzu e 56 de soja. Apenas três amostras de Louisiana e a amostra de Mississipi foram positivas

www.cultivar.inf.br

para P. Pachyrhizi, todas em soja. Com a intensificação do monitoramento nos estados do Sul do país, novas ocorrências foram confirmadas em amostras oriundas de campo experimental da Universidade da Flórida, em Quincy, no dia 17 de novembro. No dia 19, houve nova confirmação para amostras dos estados do Alabama e Georgia, e em uma amostra de kudzu, na Flórida. No dia 22, foi confirmada uma amostra do estado de Arkansas, totalizando 11 casos confirmados até o momento. Como a doença foi detectada tardiamente, não houve impacto na produção.

HIPÓTESES SOBRE A CHEGADA DA DOENÇA Uma das hipóteses mais aceitas é que esporos do fungo possam ter sido trazidos por furacões desde campos infectados com P. pa-

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Emerson Dal Ponte

chyrhizi em uma região próxima de Cali, Colômbia, localizada a cinco graus acima da linha equador. O grande número de furacões e eventos de precipitação durante a estação aumentaram as chances de dispersão de esporos a longa distância. Segundo climatologistas, a atividade de furacões na estação foi um evento único em 40 anos. O furacão Ivan e diversos outros atingiram os estados do Sul no terço final de setembro, provavelmente na época em que podem ter ocorrido as primeiras infecções que foram detectadas em início de novembro.

ANÁLISES EPIDEMIOLÓGICAS DE RISCO Devido à importância da doença, análises científicas do risco da ferrugem asiática vêm sendo conduzidas nos Estados Unidos há dezenas de anos. Estudos tem demonstrado que a doença encontra condições climáticas favoráveis para ocorrer naquele país. Um trabalho recente, utilizando um modelo matemático com normais climatológicas mensais, determinou as áreas onde o patógeno poderia sobreviver o ano inteiro sem estresses de calor, frio e umidade, na forma de um índice de sobrevivência. A probabilidade da doença sobreviver o inverno na costa do Golfo do México é uma em cinco anos, exceto para algumas áreas no Sul da Flórida e do Texas que seriam favoráveis à sobreviência o ano inteiro (Pivonia & Yang, 2004). Ainda no início da década de 90, estudos conduzidos pelo USDA em campos experimentais da China permitiram o desenvolvimento de modelos para a simulação da doença e dos danos da ferrugem na produtividade da soja nos Estados Unidos. Os resultados do estudo mostraram que no Sul, onde as condições são mais favoráveis do que no Norte, o risco da doença variou de um ano

32

Cultivar

Kudzu: planta bastante disseminada nos EUA, é hospedeira alternativa do fungo da ferrugem

pra outro, sendo que em um período de 11 anos na Flórida, somente em dois anos a doença poderia teoricamente reduzir a produtividade acima de 40%, sem aplicação de medidas de controle (Yang et al., 1991). Enquanto não se tem dados sobre se e quando a ferrugem pode se tornar endêmica no sul dos Estados Unidos, tem se considerado que epidemias periódicas podem ser originadas de hospedeiros alternativos infectados nos estados do sul, como a planta kudzu e outras, ou mesmo de regiões ao redor do Golfo do México. O kudzu é uma planta daninha agressiva e altamente disseminada nos Estados do sul e sudeste dos estados Unidos. Observações no Paraguai verificaram que a planta é altamente suscetível à ferrugem asiática naquele país. O kudzu pode servir para manter e multiplicar o inóculo nas regiões onde ele permanece com folhas verdes. Nas regiões onde a planta não permanece com folhas verdes no inverno, folhas que crescem antes da emergência da soja pode servir como “ponteverde” na primavera para aumentar o inóculo e contribuir na sua dispersão em direção ao norte. A Figura 4 apresenta o mapa de distribuição da soja e de kudzu no país. A situação da ferrugem asiática no Brasil poderia fornecer um indicativo das expectativas de impacto da ferrugem nos Estados Unidos, porém existem diferenças particulares. No Brasil, a soja é produzida em zonas sem estresse de frio onde a vegetação sobrevive o ano inteiro, servindo para manter e multiplicar o inóculo ao longo do ano. Prova disso são as plantas voluntárias de soja e cultivos de safrinha, que têm se apresentado infectadas na pri-

www.cultivar.inf.br

mavera, confirmando a presença do inóculo no local. Já nos Estados Unidos, o inóculo teria que ser levado por correntes aéreas de campos infectados no Sul, já que não teria condições de se manter durante o inverno rigoroso no meio-oeste. A ocorrência de ventos de alta velocidade do Sul para o Norte do país, os chamados “low-level jets” noturnos, podem facilitar e promover a rápida dispersão dos esporos na direção Norte. A região do Cerrado brasileiro apresenta condições extremamente favoráveis ao desenvolvimento da epidemia da ferrugem, como alta umidade relativa do ar, temperaturas noturnas favoráveis à infecção e alto regime de chuvas. Nos meses de janeiro e fevereiro, o número de dias de chuva no Mato Grosso pode chegar ou ultrapassar a 20. Esse fato pode estar associado às frequentes epidemias nos últimos anos na região, enquanto que veranicos na região sul do país, principalmente no RS, podem frear o desenvolvimento da doença, como foi o caso da safra passada. Nos Estados Unidos o regime de chuvas parece ser similar às condições o Sul do Brasil. Alguns estudos comparativos foram feitos com a situação na China. Naquele país, a doença é endêmica e pode sobreviver o inverno. De acordo com dados de 12 anos de registros de epidemias, o nível da ferrugem foi severo (40-50% de redução na produção) em três anos e moderado (20-30% de redução) em cinco anos. Nos anos de epidemia severa, a quantidade de chuva, em dois meses, variou de 220 a 270 mm com 27 a 33 dias de chuva. Em anos de moderada epidemia, a quantidade de chuva variou de 140 a 200mm com 20 a 30 dias de chuva, para dois meses. Os dados indicam que as condições de chuva no meio-oeste dos Estados Unidos parece ser similar às condições na China, porém com menor número de dias de chuva, mas em maior quantidade. A situação nos três países parece ser distinta, mas até o momento se sabe que tanto na China como no Brasil a doença é um grande problema e os Estados Unidos deverão também ter que batalhar contra o fungo. É provável que a situação americana seja similar à situação da Argentina, porém ainda não se sabe como a doença aparecerá e evoluirá naquele país no próximo ano, visto que as condições de clima seco retardaram a chegada e o estabelecimento da doença na última safra argentina, sendo identificada tardiamente sem danos à produção, porém disseminada em um grande número de regiões ao norte do país (Sinavimo, 2004). Ainda é cedo para se ter modelos de previsão que possam corretamente estimar o risco do movimento sul-norte e a severidade da doença na próxima safra nas principais regiões produtoras. No entanto, pesquisas já estão em andamento no grupo de Iowa, com objetivo de analisar características climáticas

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Mapa de identificação de regiões produtoras de soja e casos de ferrugem confirmados

que possam influenciar no transporte a longa distância de esporos da ferrugem e estabelecimento da doença, baseado em métodos quantitativos que consideram princípios biológicos como a sobrevivência e viabilidade de esporos e disponibilidade do hospedeiro (Kwang-Soo Kim- comunicação). Com isso poder-se-á ter uma forma de prever antecipadamente, usando-se de previsões climáticas, a provável rota e estabelecimento da ferrugem dos Sul para o Norte dos Estados Unidos.

PREPARAÇÃO E TREINAMENTO Tudo o que se sabe de manejo prático da ferrugem asiática nos Estados Unidos tem sido baseado na experiência recente adquirida em outros países onde se batalha contra a doença, no caso o Brasil e a África do Sul. Diversos estados americanos começaram a preparar planos de ação para detecção, confirmação e manejo da ferrugem asiática desde a safra passada, principalmente para divulgação de informações sobre a doença e treinamentos para identificação. Todo o treinamento vem sendo realizado com texto instrutivo e ilustrado com fotografias, portanto é possível ainda que se leve algumas safras, se a doença se disseminar no país, para que os produtores e mesmo técnicos tenham segurança para identificar focos da doença no campo antecipadamente para realizar um controle eficiente. A doença é de difícil identificação quando o sintoma está na fase inicial e mesmo no Brasil, produtores e técnicos que já conheceram a doença de perto, correm o risco de perceber a doença quando esta já estiver em fase avançada. Ainda, a maioria dos produtores americanos não estão acostumados com pulverizações de fungicidas, nem mesmo a ficar monitorando os campos na busca de doenças. Com a plantação de transgênicos, muitos realizam a aplicação de herbicidas e saem para as férias. Com a ferrugem, a situação vai exigir uma adaptação a uma nova sistemática de intenso monitoramento.

34

Cultivar

Concentração da principal planta hospedeira (Kudzu) do fungo da ferrugem nos EUA

Uma alternativa será utilizar as parcelas sentinelas implementadas no Brasil, com o objetivo de monitorar no tempo e no espaço a disseminação da ferrugem. É uma forma de saber que o inóculo está presente na região e que houve condições para a infecção, fazendo com que o produtor fique em alerta e baseie a sua tomada de decisão. O consórcio anti-ferrugem, liderado pelo Ministério da Agricultura do Brasil é uma iniciativa exemplar e que movimenta uma grande rede de colaboradores. Não será difícil adotar sistema similar nos Estados Unidos, que já possui uma rede bem organizada de extensionistas e de laboratórios.

ESTUDOS DE IMPACTO ECONÔMICO

Ainda antes da chegada da doença, estudos econômicos pelo USDA haviam indicado que as perdas poderiam variar de US$ 640 milhões a 1,341 bilhões, em um primeiro ano. Nos três a cinco anos posteriores, as perdas poderiam variar de US$ 240 milhões a 2,4 bilhões por ano. Tais números representariam menos de 1% dos benefícios econômicos derivados das atividades agrícolas, demonstrando a flexibilidade da agricultura americana como um todo. Segundo o Chris Hurt, eco-

www.cultivar.inf.br

nomista agrícola da Universidade de Purdue, a necessidade de pulverização para controlar a ferrugem aumentaria dramaticamente os custos de produção, o que poderia levar os agricultores a saírem do negócio da soja. O impacto mais importante seria no controle da doença com fungicidas, cujo custo poderia variar de US$ 50 a 80 por hectare. Segundo Hurt, somente este fato geraria um aumento substancial no custo de produção, o que, no tempo, poderia levar os agricultores a trocar o plantio da soja pelo do milho, cultura que tem maior custo, mas alta produtividade. No entanto, preocupações existem em relação à quebra do sistema de rotação da culturas milhosoja no estado de Indiana, conforme cita o economista, devido à possibilidade de aumento de infestação de doenças, insetos e plantas daninhas na cultura do milho.

MANEJO DA DOENÇA PARA PRÓXIMA SAFRA Tanto na China como no Brasil a estação é mais longa, enquanto que no meio-oeste americano a soja tem um período mais curto. Com isso, talvez uma segunda pulverização não seja necessária, dependendo do momento em que a doença aparecer no campo. Algu-

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



CONSEQÜÊNCIAS DA FERRUGEM NOS EUA

A

chegada de ferrugem asiática aos EUA deverá aumentar os custos de produção em, pelo menos, US$ 50 por hectare. Os valores deste ano vão além: indicam que esse valor pode alcançar os US$ 60 por hectare. Isso faz com que a soja se torne menos competitiva frente ao milho, cuja produtividade média ultrapassa os nove mil/kg por hectare. Considerando os valores atuais, a soja nos EUA permite faturamento de pouco mais de US$ 500 por ha. Com o milho, consegue-se US$ 750. As margens da soja já estavam apertadas antes da ferrugem. Onde se gasta acima dos US$ 400 para produzir, um acréscimo de US$ 60 com insumos, estrangula os produtores - que passam a operar sem lucros. Enquanto isso, o milho tem custos de produção acima dos US$ 500/ha e margens superiores a US$ 200/ha. Os primeiros indicativos apontam possibilidade de queda de 10% na área plantada da soja. São três milhões de hectares que tenderão ir para o milho, porque o consumo americano do cereal continuará em crescimento – e os estoques estão baixos. Se houver a queda de três milhões de ha no plantio, teremos a safra caindo entre sete e oito milhões de toneladas, o que novamente equilibraria o quadro mundial e

36

Cultivar

dutos comerciais encontram-se registrados para a doença, azoxystrobim e chlorotalonil. De acordo com os resultados de pesquisa divulgados no Brasil, o azoxystrobim não é um dos mais eficientes no controle da doença e o chlorotalonil não tem registro no

Emerson M. Del Ponte e XB Yang, Universidade do Estado de Iowa Cláudia V. Godoy, Embrapa Soja

Charles Echer e Divulgação

mas informações de risco estão sendo passadas para os produtores do estado de Iowa. Em março, deve ser observado o que acontece nas regiões do Sul. Se ocorrerem epidemias naquela região o sinal é de alerta. Em abril e maio deve ser observada situação em Louisiana, Mississipi e Alabama. Se ocorrem epidemias nesses locais, esporos podem alcançar o Norte antes do fim de julho. Deve-se observar a previsão climática para os meses de julho e agosto, dois meses críticos para epidemias da ferrugem asiática na região Norte-central. Se a ferrugem for detectada em lavouras da região ao redor do florescimento, o risco é muito alto, e considerando-se que a previsão climática é favorável à doença, a pulverização deve ser imediata. Se a ferrugem for detectada em julho no estado de Iowa, também se deve pulverizar. Se a ferrugem for encontrada no final de agosto ou em estágio R5, em nivel baixo, menor o risco de perdas, sem necessidade de controle. De acordo com uma lista de fungicidas divulgada na página da internet do Programa de Pesquisa de Soja da região NorteCentral, até o momento, apenas três pro-

daria um suporte para as cotações internacionais ultrapassarem novamente os US$ 6 por bushel. Outra possibilidade é a redução da produtividade provocada pela ferrugem nãotratada; o resultado equivale ao da redução do plantio. Essa hipótese deve ser considerada porque dificilmente veremos todos os produtores realizando os tratamentos dentro das recomendações técnicas de combate à doença. Os custos adicionais para tratar todas as lavouras americanas devem girar entre US$ 1,5 e US$ 2,0 bilhões, que certamente não terão cobertura dos subsídios ora existente para os produtores americanos. O ponto certo é que agora estamos igualados em tecnologia e problemas, mas levamos a vantagem de nunca termos trabalhado com subsídios e já termos um bom domínio sobre esta doença. Isso tende a resultar em um mercado melhor do que o pintado nos últimos meses, afugentando os pessimistas de plantão, que apontavam que a fase da soja do Brasil estava encerrando. Caminhamos para uma boa safra para os produtores brasileiros, que têm que acompanhar o mercado e não tomar decisões precipitadas. Vlamir Brandalizze

Brasil. Seis outros produtos tiveram aprovação emergencial. Dentre esses, três são propiconazole, o qual um produto testado no Brasil, cujo produto comercial difere daqueles da lista americana, também não foi um dos mais eficientes. Um bom nome na lista é o tebuconazole, o qual no Brasil apresentou mais de 90% de controle. Finalmente, mais dois produtos à base de myclobutanil estão na lista, sendo que este princípio ativo apresentou controle acima de 80%, segundo dados dos ensaios em rede realizados no Brasil. Outros quatro produtos ainda esperam por aprovação, os quais, também segundo resultados dos ensaios em rede realizados no Brasil, ou apresentam a menor eficiência de controle ou não se encontram registrados no Brasil. Se a lista de fungicidas não for melhorada é possível que os americanos tenham problemas para controlar a doença, pois apenas dois produtos da lista encontram-se registrado no Brasil e com boa eficiência de controle, embora não se saiba da eficiência dos outros produtos que não foram testados no Brasil. Além disso, a capacidade de pulverização para fazer o trabalho rápido pode ser problema para a maioria dos produtores de soja, que não possuem estrutura para tal. Já está sendo prevista a necessidade de aquisição de equipamentos maiores para realizar o trabalho de forma rápida, cujo investimento pode variar de US$ 30 a 50 mil, por equipamento. Embora toda a preparação, muitas incertezas e desafios ficam no ar para a próxima safra americana, mas um fato é certo: a ferC rugem asiática da soja veio para ficar.

Claudia Godoy e Emerson Del Ponte acompanham a problemática da chegada da ferrugem aos Estados Unidos

www.cultivar.inf.br

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Claudia Godoy

Soja

Alerta máximo

Fungo da ferrugem asiática sobrevivente da safra anterior já começa a aparecer em diferentes regiões do país, colocando produtores em alerta para a safra 2004/05

A

presença do fungo Phakopsora pachyrhizi, causador da ferrugem asiática da soja, já foi confirmada em áreas comerciais de soja, da safra 2004/2005, nos municípios de Três Barras do Paraná, sudoeste do Paraná, pela Coodetec (18/11/04) e em Sapezal, no Mato Grosso, pela Fesurv (22/11/04). No Paraná, a ferrugem apareceu no final da floração (R3), em lavoura semeada em setembro, com cultivar precoce, e no Mato Grosso, no início da floração (R1). Os focos iniciais de ferrugem nessa safra foram identificados em plantas de soja voluntárias (“guaxas” ou “tigueras”) no Paraná (Nova Cantu) e no Rio Grande do Sul (Nonoai, Sananduva, Cruz Alta, Espumoso, Itaara, Jóia, Santa Rosa, Sarandi e Santiago), unidades de alerta no Mato Grosso (Primavera do Leste e Ipiranga do Norte) e em Goiás (Jandaia e Montevidiu) e em cultivos de soja irrigada com pivô central, semeadas na entressafra, no Maranhão (Balsas). No Rio Grande do Sul, nos focos identificados pela Universidade de Passo Fundo e Universidade Federal de Santa Maria, a ferrugem foi constatada em plantas de soja voluntárias, que germinam a partir de grãos perdidos na colheita, em diferentes fases de desenvolvimento, com predomínio da fase reprodutiva (R3 e R4). As geadas não conseguiram eliminar as plantas de soja voluntárias, que sobreviveram ao inverno, servindo como hospedeiras para ferrugem durante a entressafra. As unidades de alerta, que se constituem de pequenas áreas de soja, semeadas até um mês antes da semeadura normal e sem aplica-

38

Cultivar

ção de fungicida na parte aérea, são utilizadas para facilitar o monitoramento e alertar o agricultor para a presença da doença na região. A maior parte das unidades de alerta que fazem parte do Consórcio Antiferrugem foram instaladas pela iniciativa privada (Syntinelas) e têm auxiliado a atualização dos mapas de focos de ferrugem no Brasil. Até o momento, somente em uma unidade de alerta, instalada sob pivô central, em Primavera do Leste, os sintomas da ferrugem foram observados no estádio vegetativo (V5), indicando que, em condição climática altamente favorável e na presença de inóculo do fungo, a ferrugem pode aparecer no estádio vegetativo. No entanto, existe uma tendência dos sintomas serem observados principalmente a partir da floração, como observados em todos outros focos, onde a ferrugem foi constatada sempre a partir do início da floração (R1). Cultivos de soja, irrigados ou não, na entressafra, têm funcionado como “ponte verde” para o fungo, promovendo uma continuidade de inóculo durante todo o ano, como já observado nas safras anteriores. Em Balsas (MA), o foco de ferrugem foi identificado nesses cultivos, em estádio de formação de grãos (R5). Os focos identificados em plantas de soja voluntárias, unidades de alerta e cultivos de entressafra indicam a presença de esporos do fungo no ar nessas regiões, devendo o produtor ficar alerta para sua lavoura, intensificando o monitoramento. Quando as lavouras comerciais chegarem na fase de florescimento, há maior probabilidade do surgimento de ferrugem, se as condições climáticas continuarem favoráveis à doença, conforme observa-

www.cultivar.inf.br

do em Três Barras do Paraná (PR) e Sapezal (MT). O monitoramento da doença e sua identificação nos estádios iniciais são essenciais para o controle eficiente. Os primeiros sintomas da ferrugem se iniciam pelos terços inferior e médio da planta e aparecem como minúsculas pontuações mais escuras que o tecido sadio da folha. A confirmação da ferrugem é feita pela constatação no verso da folha (face abaxial), de saliências semelhantes a pequenas feridas (bolhas), que correspondem à estrutura de reprodução do fungo (urédias). Essa observação é facilitada com uma lupa de dez a 20 aumentos. Em caso de dúvida, o produtor pode procurar um laboratório do Consórcio Antiferrugem na região para auxiliar no diagnóstico da doença. A relação dos municípios e o mapa com os locais onde há ocorrência da ferrugem têm sido atualizados diariamente no Sistema de Alerta disponível no site da Embrapa Soja (www.cnpso.embrapa.br/alerta). As informações para atualização do mapa são fornecidas por especialistas e laboratórios credenciados pelo Consórcio Antiferrugem, espalhados nas principais regiões produtoras. Endereços de laboratórios, especialistas, informações sobre identificação, controle e produtos registrados para ferrugem também estão disponíveis no site. O Sistema de Alerta é uma das ferramentas do Consórcio Antiferrugem para disseminar as informações sobre a situação da doença no país. O Consórcio é coordenado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e conta com a participação de vários segmentos da cadeia produtiva da soja. Entre eles: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), fundações de apoio à pesquisa, empresas estaduais de pesquisa, de transferência de tecnologias, cooperativas, universidades, Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef) e Associação Brasileira dos C Defensivos Genéricos (Aenda). Cláudia V. Godoy, Embrapa Soja

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Empresas

Fotos Bayer

Reforço no Fome Zero Participação da Bayer em projeto inédito de agricultura familiar autosustentável gera melhora na cesta alimentar e renda das comunidades do sertão da Paraíba

A

Bayer entra em nova fase na participação do Programa Fome Zero, do Governo Federal, parceria iniciada em 2002. Desde 2003, a empresa apóia o projeto inovador e simples, que está levando, a comunidades carentes da região nordeste, técnicas sustentáveis de geração de renda pela agricultura familiar auto-sustentável. O papel da empresa visa a prestação de apoio técnico e financeiro aos assentamentos Acauã e Santa Helena, localizados respectivamente nos municípios de Aparecida e Cruz do Espírito Santo, na Paraíba. Nestas localidades está sendo implantado um programa de suporte às famílias ali estabelecidas, em parceria com a Agência Mandalla D.H.S.A, uma organização nãogovernamental, com sede em João Pessoa(PB). Envolvendo uso de tecnologia, o trabalho consiste na construção de canteiros ao redor de tanques circulares chamados mandala, providos com um sistema de irrigação eficiente. A irrigação ocorre através de vários círculos de tubos de plástico em torno dos canteiros. A mandala é abastecida por qualquer fonte de água, que é também utilizada para a criação de

40

Cultivar

peixes e aves. Nestes canteiros são cultivadas hortaliças, legumes e frutas. “Esse sistema para produção, de baixo custo, foi muito bem aceito pelos pequenos produtores” afirmou Marcelo Vasconcelos, coordenador do projeto Fome Zero. A produção excedente já está sendo comercializada nas feiras dos municípios próximos aos assentamentos. Cerca de 200 famílias estão sendo beneficiadas pelo projeto, recebendo da Bayer uma bolsa mensal de um salário mínimo durante um semestre, período esse necessário para que se capacitem e produzam alimentos nas mandalas. Além de gerar uma melhora substancial na cesta alimentar daquelas comunidades, a produção

Investimentos da Bayer no projeto em 2004 devem ficar em torno dos R$ 300 mil

www.cultivar.inf.br

agrícola excedente neste sistema permite que as famílas tenham um incremento em sua renda. A venda destes produtos deverá ser feita por uma cooperativa que será criada pelos trabalhadores. Sessenta mandalas pequenas já estão em funcionamento no assentamento Acauã, garantindo o sustento dos usuários da comunidade. O primeiro passo do projeto no local iniciou-se em abril deste ano com a implantação de uma mandala coletiva de 2.500 metros quadrados e outras deste porte estão previstas até dezembro deste ano. Além da contribuição técnico-financeira, foi realizada também a doação de alguns computadores para que os jovens de Acauã possam aprender noções básicas de informática. Os investimentos da Bayer no projeto em 2004 devem ficar em torno dos R$ 300 mil. “Esperamos poder contribuir com o desenvolvimento destes assentamentos e que as famílias que neles residem possam produzir alimentos suficientes, dentro do conceito de agricultura auto-sustentável”, afirmou, o presidente da Bayer CropScience Brasil - Cone Sul, C Marc Reichardt.

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


Evento Janice Ebel

A

cadeia produtiva do algodão esteve reunida no III Goiásfibra, realizado em Goiânia em outubro. Dentre os assuntos em pauta estiveram monitoramento e controle do bicudo (principal praga que ameaça a cultura atualmente), apresentação de resultados de pesquisas e abordagem de qualidade, custos e mercado para o produto brasileiro. Preocupado com a situação do Brasil que passou de grande exportador a um importante importador de algodão, o pesquisador José Edmilson Miranda avaliou os danos da praga nas lavouras, seus impactos e conseqüências na cadeia produtiva, dando ênfase à elevação dos custos de produção devido ao grande número de aplicações que são necessárias para conter o inseto. Já o pesquisador Paulo Degrande abriu as discussões sobre a aplicação do programa de controle do bicudo no estado de Goiás, apresentando todas as suas etapas e objetivos. Segundo Degrande, o programa prevê a eliminação de insetos de primeira geração, com ações diferenciadas em função do nível de infestação da lavouras. Na ocasião, outros estados produtores de algodão também abordaram medidas que estão sendo tomadas em relação à praga. Controle de qualidade e mercado para a

Contra o Bicudo pluma também tiveram seu espaço. Rubens G. da Fonseca, da Embrapa Algodão, mostrou as novas exigências para quem pretende exportar o produto, em termos de pureza de fibra, cuidados que devem ser levados em conta desde o plantio até o processamento, além da logística pós-colheita. Já Miguel Biegai, da Safras e Mercados, garantiu que o mercado para o algodão seguirá preessionado até abril de 2005, com isso, alertou para os custos de produção para a próxima safra. “É necessário cautela”, afirma.

“O III Goiásfibra foi um seminário acima de tudo oportuno, realizado no momento em que os produtores tinham que tomar suas decisões para a próxima safra”, afirma o presidente do evento, Washington Senhorello. “A programação foi extremamente adequada para o momento. Além das informações técnicas básicas, dos avanços da pesquisa, trouxemos profissionais altamente capacitados na área da comercialização, do mercado em si, das exportações, da logística, exatamente o que a CaC deia do Algodão necessitava”, conclui.

Cada vez maior

D

e 24 a 27 de fevereiro acontece a VI edição do Show Agrícola de Palma Sola (SC), organizado pela empresa Sementes Crestani. O evento se consolidou como a maior feira de negócios voltados ao setor agrícola de

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005

Santa Catarina, e acontece numa área de aproximadamente 40 ha. O Show Agrícola de Palma Sola já faz parte do circuito das grandes feiras voltadas ao setor realizadas em todo o Brasil e está na agenda das principais empresas da área agrícola.

www.cultivar.inf.br

Durante os quatro dias de evento, o público poderá conferir exposição de máquinas e implementos, lavouras demonstrativas, dinâmica de máquinas a campo e pecuária, onde são apresentados ao agricultor as inovações e tecnologias existentes para facilitar a vida no campo. O Show Agrícola é organizado exclusivamente pela Sementes Crestani, que tem em sua principal atividade a agricultura. “O evento conta com parcerias de sucesso compostas basicamente por seus expositores, que são os grandes responsáveis pela grandeza da feira”, destaca Claudiomar Crestani, diretor-presidente da empresa. Em 2004, 170 empresas estiveram presentes e o público passou a marca dos 60 mil visitantes. Informações adicionais sobre o evento podem ser obtidas pelo telefone (49) 652-0452 ou no site www.sementes crestani.com.br. C

Cultivar

49


Insetos Fotos Sergio Freitas

Alternativa barata Pela facilidade de multiplicação e por ser economicamente satisfatório, o bicho lixeiro vem sendo utilizado no controle biológico como uma alternativa ou até simultaneamente ao controle químico de pragas em diversas culturas

O

bicho lixeiro está presente em quase todos os ambientes naturais bem como na maioria das lavouras. Ele é um inseto pertencente à família dos Chrysopidae. Existem cerca de 82 espécies destes insetos associadas às principais pragas dos cultivos brasileiros. Somente as larvas são predadoras. As espécies estão distribuídas pelos gêneros Chrysoperla, Ceraeochrysa, Chrysopodes, Plesiochrysa, Nacarina, Leucopchrysa e Leucochrysa (Nodita). Até recentemente pensava-se que o gênero Chrysopa estava presente no Brasil, entretanto já se sabe que nenhuma das espécies brasileiras tem as características necessárias para serem enquadradas em tal táxon. Os bichos lixeiros também podem ser chamados de crisopas, mas é interessante ressaltar que esta terminologia nada tem a ver com o gênero Chrysopa. A identificação correta da espécie é de fundamental importância para seu uso em programas de controle biológico de pragas. Existe o costume de nomear de Chrysoperla externa as crisopas brasileiras. Em-

42

Cultivar

bora esta espécie seja de larga distribuição geográfica, deve-se atentar para o fato de haverem muitas outras espécies e algumas delas serem muito parecidas. A estas espécies muito parecidas dá-se o nome de “espécies crípticas”. Pode-se citar como crípticas as espécies Chrysoper-

BIOLOGIA

O

ciclo biológico das crisopas é do tipo completo, isto é, passa pelas fases de ovo. larva, pupa e adulto. As fases de ovo, larva, pupa e adulto tem duração média de 4, 12, 10 e 90 dias respectivamente. O ovo é colocado na extremidade de um pedicelo. A postura pode ser isolada ou em grupos. Cada fêmea pode colocar até 1300 ovos. As larvas são extremamente vorazes, chegando a se alimentarem de milhares de indivíduos. Ao encontrar uma colônia, a larva inicia a alimentação e somente volta à caçar ao findar o alimento.

www.cultivar.inf.br

la externa, Chrysoperla defreitasi, Chrysoperla raimundoi e Chrysoperla genanigra. As crisopas são utilizadas como agentes de controle biológico de pragas em vários países, sendo importante instrumento alternativo para o uso de inseticidas. As vantagens do uso das crisopas em programas de controle biológico são: • as larvas alimentam-se da praga cessando imediatamente o prejuízo; • para completarem o ciclo, necessitam de vários exemplares da praga; • possuem a fase larval curta possibilitando várias gerações no ciclo da cultura; • ocorrem em vários agroecossistemas; • alimentam-se de ácaros e de insetos de vários grupos; • possuem grande capacidade de caça; • são de fácil criação em laboratório. A alta plasticidade ecológica permite eleger as crisopas como o predador capaz de atuar em cultivos perenes e anuais, bem como serem eficientes nas diferentes regiões do Brasil. Elas são fartamente encontradas em plantios de citros, algodão, cereais, acácia, crucíferas, fei-

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


jão, soja, café, berinjela, morango, batata, legumes, uva, azeitona, cana-de-açúcar, pêssego e várias outras culturas. O potencial de uso das crisopas com agentes de controle biológico aumentou à medida que os estudos da biologia aumentaram. Várias formas de uso são propostas. A criação em laboratório e liberação no campo é uma delas. A multiplicação das crisopas em laboratório é simples e barata. A manipulação ambiental é uma tática utilizada para criar condições favoráveis para o estabelecimento de populações de crisopas. A suplementação alimentar, isto é, a aplicação de substâncias que podem aumentar a longevidade, a capacidade de oviposição e a atratividade das crisopas. A ação destas substâncias varia de espécie para espécie. Alimentos sintéticos contendo várias proteínas aumentam significativamente a fecundidade. O uso de melaço de cana-deaçúcar promoveu a agregação de Chrysoperla externa em plantios de milho. Este tratamento reduziu a população de lagartas da espiga. A possibilidade de formação ou manutenção de locais onde eles possam encontrar refúgio e alimento. O manejo da cobertura vegetal do solo pode promover o aumento da população das crisopas. Plantas invasoras podem ter outra conotação no contexto do cultivo se forem olhadas como refúgio para as

Janice Ebel

CAPTURA

O

A fase larval curta permite várias gerações do predador no mesmo ciclo da cultura, salienta Freitas

crisopas na época em que as pragas não estão presentes nos cultivos perenes. Plantios de gergelim, crotalária e outras leguminosas poderão promover a estruturação do solo, bem como servir para a manutenção das crisopas. No Manejo Integrado de Pragas (MIP) está previsto a integração de vários métodos e técnicas para o controle populacional da praga. Cada técnica ou método isoladamente perde seu valor. É necessário compatibilizar. A soma dos resultados trará a redução das pragas. O uso das crisopas em MIP como

Melaço de cana: alimento barato para a manutenção de crisopas na lavoura

s adultos geralmente são alimentados com substâncias açucaradas das plantas, pólem, e as larvas alimentam-se de diversas pragas como cochonilhas, pulgões, ovos e larvas de borboletas e mariposas, mosca branca, psilídeos, tripés, cigarrinhas. Também os ácaros servem de alimento. A partir do momento em que a presa é encontrada, a larva introduz as peças bucais e ingere todo o conteúdo líquido do corpo. A sobra, pele e as outras estruturas, são jogadas para cima do próprio corpo, este comportamento conferiu a ela o nome de “bicho lixeiro”. agente de controle biológico é extremamente aplicável porque existe a possibilidade de compatibilização com os vários métodos. As crisopas são compatíveis com o uso de outros inimigos naturais, como as vespas tricogramas. O uso do controle químico, nem sempre dispensável, pode ser praticado simultaneamente com as crisopas, ressalvando-se as esC pecificidades. Sergio Freitas, Unesp

Detalhe de crisopa predando pulgão


Armazenagem

Reflexo na qualidade Charles Echer

A deficiência do sistema de armazenamento, seja por insetos ou controle das condições ambientais, interfere na qualidade de grãos e sementes, refletindo problemas, principalmente no plantio

A

rede armazenadora brasileira de grãos é deficitária, na distribuição espacial, em tecnologia ou na modalidade de manuseio da produção agrícola. Grandes perdas de grãos ocorrem na póscolheita, devido a condições inadequadas de armazenamento e transporte. O país precisa se conscientizar que o sistema armazenador é um dos elos da política agrícola cuja finalidade é garantir um fluxo de abastecimento constante, proporcionando maior estabilidade aos preços dos produtos agrícolas e aos mercados. Muitos armazéns não estão de acordo com as normas técnicas recomendadas para garantir a qualidade do produto devido a serem antigos e obsoletos, implicando em uma defasagem na recepção de grãos nas unidades em relação à rapidez da colheita. Nas décadas de 50/60 foram construídos armazéns convencionais para a estocagem de trigo. Já no final da década de 60 e início de

44

Cultivar

70, foram construídos os silos elevados de concreto. Depois, com o crescimento das áreas cultivadas com soja foram construídos armazéns graneleiros, seguidos com os silos metálicos, mais direcionados para o arroz. Com a globalização, a tendência mundial é a busca pela qualidade total. Assim, diversos parâmetros de qualidade dos produtos agrícolas estão sendo objetos de pesquisas. A falta de dados na literatura sobre as principais causas de perdas quantitativas e qualitativas de

grãos na pós-colheita e armazenamento fez com que o Departamento de Engenharia Agrícola da Universidade Federal de Viçosa/MG (UFV) desenvolvessem alguns trabalhos de pesquisas, citados a seguir: 1) Avaliação da qualidade dos grãos colhidos com diferentes teores de umidade, logo após a recepção do produto pela unidade armazenadora; os parâmetros de qualidade são definidos pelas análises de teor de impurezas e matéria estranha, teor de umidade, massa específica aparente, índice de danos, percentual de grãos infestados, índice de trincas e susceptibilidade à quebra. 2) Avaliação do efeito imediato e latente de diferentes temperaturas do ar de secagem associados aos níveis de umidade de colheita sobre a qualidade dos grãos. 3) Avaliação das condições de armazenamento na qualidade dos grãos. 4) Avaliação da perda de peso dos grãos, devido ao processo respiratório, medida pela concentração de CO2, em função das condições de armazenamento. 5) Avaliação da perda de peso dos grãos devido ao ataque de insetos. No armazenamento a massa de grãos é constantemente submetida a fatores externos que compõem o ambiente de armazenamento. Em condições tropicais, os insetos são considerados pragas dos grãos armazenados, devido à massa de grãos constituir um ambiente favorável ao seu desenvolvimento. Os insetos causam perda de peso, desvalorização e poluição das massas de grãos, proporcionando, assim, um maior consumo de matéria seca e, conseqüentemente, uma rápida deterioração do produto. A qualidade de armazenagem de sementes e grãos está diretamente relacionada com os eventos deteriorativos. Os eventos deterio-

Tabela 1 - Valores médios da acidez graxa (ml de KOH/100g MS) segundo tratamentos e “momentos de avaliação” em dias de armazenamento

Para cada momento, médias de tratamentos seguidas de pelo menos uma letra igual, não diferem significativamente (P>0,05)

www.cultivar.inf.br

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Tabela 2 - Resultados obtidos nas análises de qualidade, no início e final do período de armazenamento, para os tratamentos testemunha e dano térmico Parâmetro

Cultivar IAC19 Testemunha Dano térmico 0 dias 240 dias 0 dias 240 dias Viabilidade 85 67 11 1 Vigor1 58 49 3 0 Danos Mecânicos2 3 1 4 0 Deterioração por Umidade3 2 8 69 96 Teor de umidade (%) 14,2 9,7 9,7 9,4 Teste de uniformidade (%) 4,61 5,73 Acidez Graxa (ml de KOH/ 5,94 6,91 5,14 12,18 100gMS) Nível de vigor: muito alto: = 85%; alto: 75% a 84%; médio: 60% a 74%; baixo: 50% a 59%; muito baixo: = 49%. 2 Sem restrição: inferior a 6%; Problema sério: entre 7% a 10%; Problema muito sério: superior a 10% 3 Porcentagem de grãos quebrados obtidos na peneira Nº 0. 1

Tabela 3 - Resultados obtidos nas análises de qualidade, no início e final do período de armazenamento, para os tratamentos testemunha e dano mecânico Parâmetro

Cultivar IAC19 Testemunha Dano Mecânico 0 dias 240 dias 0 dias 240 dias Viabilidade 85 67 67 56 Vigor1 58 49 42 38 Danos Mecânicos2 3 1 15 13 Deterioração por Umidade3 2 8 0 12 Teor de umidade (%) 14,2 9,7 14,2 9,8 Teste de uniformidade (%) 4,61 11,9 Acidez Graxa (ml de KOH/ 5,94 6,91 5,1 9,86 100gMS) Nível de vigor: muito alto: = 85%; alto: 75% a 84%; médio: 60% a 74%; baixo: 50% a 59%; muito baixo: = 49%. 2 Sem restrição: inferior a 6%; Problema sério: entre 7% a 10%; Problema muito sério: superior a 10% 3 Porcentagem de grãos quebrados obtidos na peneira Nº 0. 1

Tabela 4 - Resultados obtidos nas análises de qualidade, no início e final do período de armazenamento, para os tratamentos testemunha e dano por microorganismos Parâmetro

Teste de sanidade (Aspergillus favus) (%) Teor de umidade (%) Teste de uniformidade (%) Acidez Graxa (ml de KOH/ 100gMS) 3

Cultivar IAC19 Testemunha Dano Mecânico 0 dias 240 dias 0 dias 240 dias 2,5 1,5 1 1 14,2 5,94

9,7 4,61 6,91

17,9 5,83

10,7 4,02 8,06

Porcentagem de grãos quebrados obtidos na peneira Nº 0.

rativos não podem ser evitados, mas o armazenamento adequado controla a velocidade do processo. Os mecanismos de deterioração podem manifestar-se basicamente por modificações bioquímicas e/ou fisiológicas. Como exemplos de modificações bioquímicas, podemos citar a peroxidação dos lipídios, os danos genéticos, as mudanças na respiração de sementes, as modificações na atividade enzimática, dentre outros. Já as modificações fisiológicas podem ser visualizadas na coloração das sementes, menor tolerância às condições ambientais adversas, redução na germinação e no cres-

46

Cultivar

cimento das plântulas e influência dos microorganismos. Os eventos deteriorativos não ocorrem isoladamente e a sensibilidade das sementes e grãos ao processo de deterioração, em determinado ambiente, tem sido atribuída à constituição genética. Estudos recentes mostram que existem diferenças entre as espécies, entre as cultivares dentro de uma mesma espécie e entre sementes de um mesmo lote, sendo que as condições de temperatura e umidade relativa do ar durante o armazenamento são importantes para explicar a evolução da deterioração. A peroxidação dos lipídios é de extrema importância para a soja e o algodão, já nas sementes amiláceas, como milho, trigo e arroz, também podem apresentar estes mecanismos, mas não é o principal. Nestas últimas, considera-se o acúmulo de substâncias tóxicas, principalmente os açúcares redutores, pelo fato de serem os carboidratos as principais substâncias de reserva. Tendo em vista que o retardamento da colheita tem sido considerado como a principal causa da queda da qualidade de lotes de sementes e grãos, adiantando o início da deterioração, as quais têm implicado na redução do crescimento ou vigor das plântulas, maior incidência a ataques de microorganismos patogênicos, emergência desuniforme e redução na produtividade, foi que passei a estudar as modificações bioquímicas que ocorrem na composição de lipídios das sementes e grãos. Durante o desenvolvimento de um estudo na Faculdade de Ciências Agronômicas – Unesp, campus de Botucatu (SP) e no Centro Nacional de Pesquisa de Soja o em Londrina (PR), foi observado que a deterioração dos danos às membranas causam modificações na composição de lipídios em sementes e grãos aumentando a proporção de ácidos graxos livres e que, durante o armazenamento, a severidade destes danos aumenta quando em condições desfavoráveis de temperatura e umidade do produto como do ambiente. A soja [Glycine max. (L.) Merrill], devido a suas características morfológicas e fisiológicas, é muito propensa à deterioração e sensível a práticas inadequadas de manejo durante a colheita e armazenamento, denotando um baixo poder de armazenamento. Isto é explicado pelo grande acúmulo de lipídios de reserva nestas sementes, tornando-se mais sensíveis a oxidações do que as sementes amiláceas. Assim, visando avaliar a possibilidade de adoção de um índice de qualidade sensível à deterioração, com metodologia rápida e de boa aplicabilidade para sementes e grãos, o presente trabalho teve como objetivo testar a sensibilidade do índice de acidez graxa segundo diferentes fontes de deterioração de grãos de

www.cultivar.inf.br

soja (danificação mecânica, danificação térmica e microorganismos) avaliando seus efeitos imediato e latente, tendo como referência testes de qualidade já padronizados. O teste de acidez graxa, como método para avaliar a deterioração em grãos armazenados, tem na sua sensibilidade a principal vantagem. Como a formação de ácidos graxos livres nas sementes e grãos é resultante da hidrólise das gorduras – uma das primeiras reações desencadeadas sob condições adversas de manejo pós-colheita – esta análise permite, além da quantificação (método volumétrico) do processo deteriorativo, acusá-lo ainda nos estágios iniciais. O bom poder de resposta deste método, associado à sua rapidez e baixo custo na execução, suscita no mínimo, investigações de caráter mais aplicado, visando um melhor aproveitamento do teste na área de colheita e processamento de sementes e grãos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Analisando-se a Tabela 1, verifica-se que o teste de médias mostrou que a secagem rápida e excessiva (dano térmico) reduziu drasticamente o vigor e a viabilidade dos grãos que seriam armazenados, e, com o decorrer do período de armazenamento, foi constatado a perda total do vigor e da viabilidade destes grãos. Analisando-se a Tabela 3, verifica-se que o alto percentual de danos mecânicos, aproximadamente 14%, detectados pelo teste de tetrazólio (níveis 6-8), desde a colheita e durante o período de armazenamento (240 dias), foram os responsáveis pela redução da qualidade dos grãos, uma vez que, aproximadamente 14% dos grãos perderam sua capacidade

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


Charles Echer

Tabela 5 - Valores médios dos teores de óleos (%) segundo tratamentos e “momentos de avaliação” em dias de armazenamento

Para cada momento, médias de tratamentos seguidas de pelo menos uma letra igual, não diferem significativamente (P>0,05)

Condições de temperatura e umidade relativa do ar durante o armazenamento são parte no processo de deteriorização

germinativa. Após o período de armazenamento (efeito latente), verificou-se a maior sen-

sibilidade do teste de acidez graxa na avaliação da deterioração sofrida pelos grãos de soja quando comparado a análise do teste de tetrazólio. Os resultados obtidos através da deterioração por umidade (teste de tetrazólio) revelaram-se, num excelente indicador, também para dano térmico, pois não são apenas as condições adversas no campo que ocasionaram a deterioração por umidade (efeito imediato), mas também, a secagem em alta temperatura (efeito latente). Os resultados obtidos nas análises de acidez graxa para a danificação por microorganismo (Tabela 4) não diferiram estatisticamente aos da testemunha, durante o armazenamento. A equiparação entre estes dados pode ser atribuída a problemas que surgiram durante o desenvolvimento

destes dois testes. A análise estatística utilizando a técnica de análise de variância frente a diferentes fontes de deterioração mostrou que o teor de óleo utilizado como um teste de referência, não apresentou significância ao longo do período de armazenamento (Tabela 5), confirmando a acidez graxa (Tabela 1). Tal conclusão foi obtida devido ao teste de acidez graxa ter se mostrado mais sensível em relação aos testes de qualidade industriais aplicados à soja, confirmando a significativa deterioração ocorrida durante o armazenamento, não detectada, porém, pelas análises de teor de óleo e rancidez. Tatiane Aparecida Soares, Unesp

C


Informe jurídico • Newton Peter • OAB/RS 14.056 • consultas@newtonpeter.com.br

Problemas no arrendamento rural

U

m produtor do interior de São Paulo arrendou propriedade rural e se comprometeu a pagar, anualmente, uma quantidade pré-determinada de suas colheitas. Quando o proprietário morreu, seus herdeiros, percebendo o não-pagamento do combinado, ajuizaram ação de cobrança. Perderam em todas as instâncias, pois a lei expressamente proíbe a determinação do aluguel rural em quantidade fixa de produto. Inconformado, um dos herdeiros contou-me os detalhes dessa história há algumas semanas e perguntou o que poderia fazer. Nada. Legislação especial rege o arrendamento rural e, em alguns pontos, impõe condições injustas aos olhos do cidadão não acostumado ao convívio diário com as leis. A irrenunciabilidade de alguns direitos, por exemplo. A lei impede o arrendamento com preço combinado em produtos e sem equivalência monetária. Em tese, o arrendatário, ao assinar contrato comprometendo-se a entregar uma quantidade fixa de sacos de soja, por exemplo, renunciaria ao seu direito. Todavia, por constituir direito irrenunciável, mesmo com a existência de contrato, não pode o arrendador sustentar a exigência. Embora essa situação possa ser ou parecer injusta, fato é que ela ocorre com freqüência e iniciar aqui uma discussão filosófica sobre a justiça contida ou não na norma pouco ajudaria o leitor.

CONTRATOS AGRÁRIOS Seja através de parceria ou de arrendamento, as duas formais mais utilizadas de contratos agrários, a utilidade, juridicamente falando, é a mesma: viabilizar a função social da propriedade, conforme determina a Constituição. Não podendo ou não desejando cultivar suas terras, o proprietário confere a alguém essa tare-

48

Cultivar

fa mediante recebimento de um valor fixo. Esses contratos são regulados por legislação especial por causa das particularidades envolvidas. Por exemplo, há previsão de contrato agrário realizado verbalmente devido ao elevado índice de analfabetismo existente no campo, principalmente no momento de promulgação da lei – anos 60. Um ponto interessante é que a ruralidade do imóvel advém do seu uso, não de sua localização. Mesmo um imóvel inserido no perímetro urbano pode ser considerado rural se for usado para agricultura ou pecuária. A moradia dos proprietários ou arrendatários no local não descaracteriza essa condição.

Outras particularidades desses tipos de contrato são a proteção social e econômica dos contratantes, a conservação dos recursos naturais da Terra, a proibição de usos e costumes lesivos à economia agropecuária e a já mencionada irrenunciabilidade de vantagens legalmente conferidas ao arrendatário. Importante também é mencionar a possibilidade de provar esses contratos, independente do seu valor e forma, através de testemunhas. Por outro lado, para fazerem valer seus direitos perante terceiros, devem as partes registrar o contrato em cartório.

www.cultivar.inf.br

ARRENDAMENTO RURAL Nessa modalidade de contrato, há pagamento de aluguel, fixo e expresso monetariamente, pelo uso da terra. O arrendatário se compromete a usar o imóvel exclusivamente para o declarado, plantio de soja, por exemplo, não podendo modificar unilateralmente o combinado, sob pena de rescisão contratual e de arcar com perdas e danos. O preço do arrendamento sujeitase a um máximo de 15% do valor cadastral do imóvel declarado pelo proprietário do Incra. Reajustes são permitidos conforme o aumento de preços dos produtos agrícolas, variação dos índices oficiais vigentes, índices de valorização da terra ou de acordo com o aumento do ITR. Note-se, contudo, que o limite prático de reajuste é o de preço do produto cultivado. O período mínimo de duração do contrato no caso de exploração agrícola de lavoura temporária (soja, algodão) ou de pecuária de pequeno e médio porte (ovinos e caprinos) consiste em três anos; para lavoura permanente (café, citros) ou de pecuária de grande porte (bovinos, eqüinos), cinco anos; para exploração florestal, sete anos. Prazos superiores podem ser contratados livremente; inferiores costumam ser aumentados pela Justiça. Resta ainda comentar a questão da preferência do arrendatário no caso de novo arrendamento ou venda da propriedade. O arrendador, caso deseje retomar o imóvel, deve comunicar ao arrendatário seis meses antes do término do contrato. Caso contrário, há renovação automática. No caso de venda, o proprietário deve comunicar ao arrendatário das propostas e lhe conceder prazo de trinta dias para exercer seu direito de preferência à compra. Em caso de dúvida, consulte seu C advogado.

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005



Agronegócios

A soja RR e as medidas

N

os EUA, mais de dois terços da área de soja é semeada com soja resistente ao glifosato RR) e, na Argentina, ela é utilizada em, praticamente, toda a área. Para o mercado internacional, enquanto commoditye, o novo padrão estabelecido é a soja RR, sendo as cotações a ela referenciadas. O Brasil era o único grande produtor de soja do mundo que, oficialmente, não cultivava soja RR, até o surgimento da série de Medidas Provisórias. A MP 223 libera, para plantio na safra 2004/2005, a “semente” em poder dos agricultores, para seu próprio uso.

INDECISÃO O remendo das MPs não soluciona o “imbróglio” da biotecnologia agrícola. Enquanto os medicamentos biotecnológicos encontram livre trânsito, os produtos agrícolas são questionados. Cabe refletir sobre o ensinamento do padre Ricci, superior geral dos jesuítas, quando pressionado a alterar profundamente a constituição da Companhia de Jesus. “Sint ut sunt, aut non sint!”, decretou o jesuíta (“Que as coisas sejam como são ou então não sejam”). Insisto – em coerência com o que sempre defendi – que o Brasil não pode ficar, eternamente, no acostamento das tendências mundiais. Ou bem nos engajamos na corrente dominante da biotecnologia (“sint ut sunt”), sem qualquer concessão em relação à biossegurança, ou investimos, fortemente, nos nossos institutos de pesquisa, para pavimentarmos um caminho alternativo (“aut non sint”). O

50

Cultivar

que não podemos é ignorar que a competitividade no comércio internacional repousa em tecnologia competitiva. Postergarmos a decisão significa adiarmos a realização ou declinarmos do nosso potencial agrícola, matriz de emprego, renda e desenvolvimento.

ÁGIO E DESÁGIO Caso houvesse alguma perspectiva de prejuízo com a soja RR, a pressão dos agricultores não seria tão avassaladora. E o Governo Federal, fortemente dependente das divisas da exportação de soja, não a liberaria. Após debruçar-se sobre as cotações dos últimos cinco anos, o analista Flávio França Jr., da Agência Safras e Mercados, demonstrou que o mercado não trabalha com ágio para soja convencional ou com deságio para a transgênica. Observe que a Argentina mais que duplicou a venda de soja à Europa, coincidindo com o plantio de soja RR, que representa 99% da sua produção. Tanto a Europa quanto a China, maiores compradores mundiais, exigem que o país exportador certifique que a partida de soja seja transgênica ou convencional, para efeito de rotulagem, sem que isto altere a decisão de compra ou a cotação da partida de soja. Logo, não existe constrição econômica ou negocial que impeça a regulamentação definitiva do uso de OGMs na agricultura brasileira.

SAÚDE Os opositores da soja RR denunciam não existirem evidências científicas,

www.cultivar.inf.br

definitivas, de que a soja RR não causa problemas à saúde humana. Em contraposição, seus defensores alegam que não existe qualquer evidência de que algum problema de saúde possa decorrer do consumo de soja transgênica. Enveredando por outra trilha de raciocínio, é incontestável que o tamanho do mercado, os prêmios e os descontos são determinados pelo consumidor, por avaliações objetivas ou por percepções subjetivas. O avanço extremamente rápido da soja RR, (mais de 50% da soja mundial), deixa transparecer que a quase totalidade da opinião pública não vislumbra riscos à saúde, decorrentes de seu consumo. Em tempos de culto à saúde, se dúvidas persistissem, a opinião pública mundial enxotaria do mercado os alimentos derivados de OGMs, incluindo a soja RR. O consumidor foi tranqüilizado pelo “efeito de massa”, representado por mais de 300 milhões de toneladas de soja transgênica, consumidas nos últimos anos, sem que aflorasse qualquer suspeita de efeito alergênico ou outro distúrbio de saúde. Lembrando que a soja transgênica, produzida nos EUA, na Argentina ou no Brasil, é consumida, primordialmente, nos países do Primeiro Mundo. Seus cidadãos foram as cobaias, sujeitos a eventuais riscos à saúde. Não apenas os órgãos sanitários dos países ricos permitiram que o “teste” ocorresse com sua população, como não houve uma reação civil cuja magnitude impedisse esse “teste”.

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005


provisórias permanentes

AMBIENTE O principal problema ambiental aventado é o fluxo gênico. No Brasil, o risco prático de que esse fenômeno venha a ocorrer é nulo. A soja é uma planta autógama e a polinização ocorre com a flor ainda fechada. O pólen, após a abertura da flor, possui uma viabilidade muito baixa. E a polinização entre flores necessita do auxílio de polinizadores, escassos na cultura. Ou seja, mesmo entre cultivares de soja, a polinização cruzada seria muito difícil. A probabilidade de o pólen da soja (Glycine max) fecundar outras espécies vegetais é ainda menor. Não existem parentes botânicos da soja no Brasil, com compatibilidade cromossômica, que torne a hibridação viável. Este poderia ser, eventualmente, um problema no Nordeste da China, onde existem espécies de soja selvagem. Similarmente ao exposto para o tópico saúde, em uma quadra da civilização em que a proteção ambiental é um “cult”, a percepção da maior parcela da opinião pública é de que não existem perigos palpáveis pelo cultivo da soja RR, paradoxalmente, podendo até ser favorecida pela menor descarga de herbicidas no ambiente – o que levou ao fim da moratória dos OGMs na Europa. Portanto, a restrição à regulamentação definitiva não se prende às questões ambientais ou de saúde pública.

VANTAGENS Propalam-se, de uma parte, ganhos financeiros com o cultivo de soja RR (por menor uso de herbicidas) e, de outra, que a mesma apresenta menor produtividade.

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005

Os institutos de pesquisa brasileiros nunca puderam comprovar qualquer das afirmativas. Com a legalização, essa dúvida poderia ser elucidada, comparando-se produção, receitas e despesas, em similaridade de condições. Pessoalmente, entendo que a vantagem da soja RR é a simplificação do controle de plantas daninhas, menos dependente de tecnicalidades e de condicionamentos de solo, clima e dimensionamento de parque de máquinas. Em relação à produtividade da lavoura não é lícito supor qualquer vantagem da soja RR, porque a tecnologia resume-se à resistência ao herbicida glifosato, não interferindo com outras características agronômicas.

PRIMEIRO DILEMA Removidas as constrições legais e reduzidas as angústias pertinentes à saúde e ao ambiente, entendo que o primeiro dilema da soja RR legalizada será o pagamento da taxa tecnológica ao detentor da patente. O Brasil será a arena para o primeiro teste real, em escala mundial. Na Argentina não há cobrança da taxa tecnológica e, nos EUA, qualquer valor cobrado é fictício, pois o subsídio encarrega-se de anular o impacto sobre o custo de produção. Comenta-se no mercado que o valor seria próximo de US$17,00/ha. Entendo ser o valor elevado, significando uma apropriação quase integral do eventual ganho financeiro com o menor uso de herbicidas. Em decorrência, antevejo uma ameaça ao sistema de sementes brasileiro, fortemente dependente da soja.

www.cultivar.inf.br

Para evitar o pagamento da taxa tecnológica, incidente sobre a semente, o produtor utilizar-se-á da permissão legal de produzi-la para seu uso. Por esse raciocínio pode-se especular, também, que fica entreaberta a brecha para comercializar, ilegalmente, a semente assim produzida, sonegando impostos, royalties e a própria taxa tecnológica.

SEGUNDO DILEMA Desde o surgimento da soja RR, manifesto minha preocupação quanto ao desenvolvimento de plantas invasoras resistentes ao glifosato. A pressão de seleção exercida sobre as invasoras será de tal ordem que, em pouco tempo, seria possível surgir ervas daninhas resistentes ao glifosato, em grande escala. Esse fenômeno indesejável não é novidade nem é inevitável. Plantas daninhas resistentes ao glifosato foram identificadas nos EUA e na Argentina. Os agricultores deverão atentar para o manejo de plantas daninhas, executando rotação de culturas, diversificando formas de controle, alternando cultivares convencionais e transgênicas e, inclusive – se for o caso – variando a cultivar de soja transgênica, quando outras opções estiverem disponíveis. O agricultor relapso corre o risco de enormes prejuízos financeiros e muitas dificuldades para conduzir sua lavoura. Mais do que nunca, vale a velha máxima: consulte o C seu agrônomo! Décio Luiz Gazzoni Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja www.gazzoni.pop.com.br

Cultivar

51


AENDA

Defensivos Genéricos

Brometo sem poluição Câmara de fumigação a vácuo permite o tratamento fitossanitário com brometo de metila sem afetar a camada de ozônio

O

Brasil, como signatário do Protocolo de Montreal, deveria tomar atitudes para diminuir os gases artificiais que promovem parte da redução da camada de ozônio e sua relação com câncer de pele, redução do fitoplâncton e outras conseqüências à saúde dos seres vivos. Recentemente, o IBGE concluiu um levantamento sobre o consumo desses gases no país (clorofluocarbonos, tetracloretro de carbono, metil-clorofórmio e halônios): Em toneladas de PDO (Potencial de Destruição do Ozônio) / 1 PDO = 1 t de CFC Consumo por setor Refrigeração Fabricação de espuma Agente em processos químicos Aerossóis Solventes Extintores de incêndio Brometo de metila

1997 5.816 4.137 958 234 22 107 757

1999 2001 8.264 3.729 3.655 3.154 662 163 130 92 33 12 107 5 420 258

2003 3.595 353 68 74 12 5 249

Portanto, com uma redução de 12 t para 4,3 t (menos 64%), fica evidente que o Brasil realizou grandes e efetivos esforços para cumprimento das metas estabelecidas. Em relação ao brometo de metila, um gás biocida usado na agricultura e, em verdade, com pouquíssima influência na celeuma do ozônio, o governo cortou na car-

ne em 2002 o uso do produto. De imediato foi cancelado o uso para grãos armazenados, exceto em casos especiais com anuência do Ministério da Agricultura. Para fumo, até fins de 2004. Para sementeiras e como formicida, até final de 2006. Até esse momento a redução foi de 67%. Só será permitido para usos de absoluta necessidade em exportação e importação, até 2015. Saliente-se que nos Estados Unidos o produto continua sendo usado em canteiros de diversas culturas e em silos graneleiros, visto o EPA não ter conseguido substituto adequado do ponto de vista de eficácia e economia. Lá, o consumo está por volta de nove mil toneladas/ano. O monobromometano é tão eficaz como praguicida que em alguns casos só ele é aceito. Por exemplo, a Colômbia só importa algodão em pluma do Brasil se os fardos da arbustiva malvaceae passarem por uma severa varredura com esse gás. Em razão das restrições legais brasileiras, a engenhosidade teve de entrar em cena. E surgiu o Multivácuo, um dispositivo para fazer o trabalho fitossanitário e depois recuperar o CH3Br. Passe de mágica? Não, apenas emprego da química e da física. Trata-se de uma câmara de fumigação

a vácuo, construída por sólida e bem vedada estrutura de aço carbono com 81 m3 e suportando pressão de até 2 atm. Uma bomba promove a retirada do ar e um sistema injeta o agente fumigante, usando aparelhos calibradores e válvulas dosadoras. Por fim, um sistema recupera o gás biocida que não foi absorvido por bio-materiais na operação.

Para realizar seu serviço em 80 m3 o brometo de metila precisa apenas de 6,5 gramas, que se volatilizam rapidamente na câmara e correspondem a uma concentração de 20 ppm do gás. Com essas pequenas quantidades, o sistema desenvolvido não consegue informar exatamente quanto foi recuperado, estima-se em 70%. Por outro lado, como nada escapa da câmara, é possível afirmar que todo o gás não consumido na operação foi retido na forma líquida em baixas temperaturas. Nossos agradecimentos à Multivácuo – Tecnologia em Sistemas de Vácuo (19) 3278-4100 e à Esqua – Estação Quarentenária de Tratamento e Pesquisa (13) 3296C 3378


Mercado Agrícola

Brandalizze Consulting

brandalizze@uol.com.br

Chegamos ao fundo do poço, agora somente para cima O mercado agrícola pregou aos produtores um dos piores quadros da historia brasileira, com cotações boas na safra e queda constante na seqüência. Atingiu o fundo do poço nos meses de outubro e novembro, quando começou a dar sinais de recuperação e já mostrava alguns produtos em crescimento. O feijão teve cotações crescentes e mostra os melhores indicativos do ano neste momento. A soja, que foi ao fundo do poço, teve o apoio da ferrugem encontrada em vários pontos dos EUA, e como o quadro geral, agora, está igual para todos os produtores, como temos melhores produtividades, certamente levaremos vantagem. Enquanto isso, nos EUA, o quadro em 2005 tende a empurrar uma fatia das áreas de soja para o milho, que segue com crescimento da demanda local e mundial. Os estoques, por sua vez, baixos e com isso mais rentáveis aos produtores e, desta forma, menor pressão de oferta da safra futura da soja, que nos aliviará a comercialização em 2005. Até agora pouco foi negociado antecipado. O arroz também foi um dos produtos que veio caindo durante o ano todo e segue fraco. Enquanto isso, noticias boas para o setor do algodão, que está sinalizando para crescimento na demanda mundial, apoiado pelo crescimento dos preços dos derivados do petróleo. Assim, os tecidos sintéticos, que tinham preços menores, agora estão perdendo competitividade e, assim, beneficiarão a pluma nos próximos anos. Outra boa noticia vista nas últimas semanas veio do setor das carnes, que segue batendo recorde de embarque. Com isso, o segmento das rações tende a bater novo recorde histórico de produção, enxugando os excedentes de milho e soja. A soja, neste mês de novembro, chegou ao fundo do poço, mostrando crescimento em Chicago, sinalizando que não tem espaço no lado de baixo para navegar. Ou seja, já estamos vendo uma luz no final do túnel que pode servir de estímulo para que os produtores mantenham uma boa tecnologia nas lavouras que estão nos campos em busca de produtividades maiores, de onde sairão os lucros. MILHO Exportação supera expectativa O mercado do milho está chegando ao final do ano e começa a reavaliar o quadro geral, buscando explicações para as baixas cotações aos produtores neste ano. Os indicativos mostram que as exportações, previstas em 4,5 milhões de t, foram superadas no final de agosto e devem chegar à marca das cinco milhões de t até o final deste mês, encurtando parte dos excedentes que vinham sendo pintados pelos operadores. Outra notícia que deverá chegar no começo do ano será do aumento do consumo pelo setor de ração, que continua batendo recorde de produção e consumo para atender a forte demanda existente na exportação das carnes. Os indicativos do milho, especialmente aos produtores, não reagiram em novembro. Isto porque os produtores continuaram dando preferência à venda do cereal e segurando a soja, assim abastecendo as necessidades das indústrias e deixando as cotações nos piores momentos do ano. De agora em diante veremos o quadro mudar de sentido, com menor pressão de venda e a volta dos compradores, recuperando parte dos indicativos. SOJA Área cresce e cai o consumo de adubo Os produtores de soja, vendo os custos dos principais insumos em elevação, sentido contrário que navegou o grão desta oleaginosa, tiveram como opção a redução da adubação, que segundo os dados vistos até o final de outubro apontavam chegar à marca de um milhão de t a menos do que no ano passado, quando se chegou à casa das 6,2 milhões de t, somente no segmento da soja. Estamos aumentando o plantio para a casa dos 22,6 milhões de hectares contra os 21,2 milhões plantados na safra passada. Ficamos bem abaixo das primeiras expectativas, que indicavam números entre os 23 e até os 24 milhões de hectares, isso se as cotações continuassem entre os US$ 15,00 e US$ 18,00 por saca, que estavam sendo praticados na colheita. O quadro atual se mostrou com indicativos praticamente estabilizados, mostrando pouco fôlego para grandes mudanças neste mês de dezembro. Isto porque a maior parte das indústrias estarão paradas, em manutenção, devendo voltar a movimentar produto com maior pressão de compra a partir da segunda quinzena de janeiro.

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005

FEIJÃO Consolida alta e trabalha no pico do ano O feijão, depois de vários meses em marcha lenta e indicativos baixos, mostrou forte alta em novembro, quando os produtores estavam formando as cotações e negociando dentro dos níveis que mais lhes interessavam. Os indicativos variavam dos R$ 75,00 aos R$ 90,00 para o feijão novo, que estava aparecendo nos poucos pontos onde estava sendo colhido. Deve continuar firme em dezembro, porque poucas regiões têm o produto para colher e, assim, os produtores devem continuar tendo boa margem de lucratividade com a cultura. Será um estímulo para que se busque investimentos na safra que entra em janeiro, já que o país está passando por uma fase sem estoques e a primeira safra mostrou

forte queda na área, além da tendência de queda também na produtividade, devido ao clima irregular. ARROZ Final de ano em marcha lenta O mercado do arroz está chegando ao final do ano em marcha lenta, com grandes volumes de arroz em casca ainda nas mãos de produtores, comerciantes e cooperativas. Estes seguraram e apostaram em alta, mas agora estão tendo que liquidar o produto e, assim, os indicativos seguem fracos e mostram poucas chances de alterações, já que a safra brasileira segue com clima favorável e o plantio está sendo superior às expectativas. Ainda existem bons volumes de arroz do Mercosul chegando ao mercado brasileiro e deixando o setor em ritmo lento.

CURTAS E BOAS SOJA - as exportações brasileiras de soja vêm acumulando recorde de embarque, com 33 milhões de t acumuladas até outubro, com 18,3 milhões de t de grão, 12,6 milhões de t de farelo e 2,2 milhões de t de óleo. No ano passado, neste mesmo período, o acumulado era de 32 milhões de t. ARGENTINA - está chegando ao final do plantio da safra de verão, com estabilidade na área da soja, de 14,2 milhões de hectares, crescendo no milho para 3,2 milhões, frente aos 2,8 plantados no ano passado e leve crescimento na área de arroz, que passa para os 179 mil ha, com crescimento de 4% em relação à safra passada. A ferrugem já está nas áreas de soja do país. EUA - as boas notícias que chegaram vieram da confirmação da ferrugem em vários pontos produtores de soja, que segundo os pesquisadores foram causadas pelo furacão Ivan, que levou os fungos. As expectativas são de que se espalhe rapidamente em 2005. A safra fechou com 85,7 milhões de t de soja, 298,2 milhões de t de milho e 10,3 milhões de t de arroz, todos com recorde histórico de produção. TRIGO - os produtores estão amargando cotações abaixo do mínimo de garantia neste final de ano, com indicativos de R$ 370/390 por t, quando deveria estar acima dos R$ 400. O câmbio nos piores momentos do ano favorece o produto importado. O governo acenou com a retirada do Pis e da Cofins dos derivados para melhorar o desempenho das indústrias, mas até agora pouco ajudou os produtores. ALGODÃO - o novo indicativo de oferta e demanda mundial da pluma mostrou novo crescimento dos estoques mundiais devido ao aumento na produção, apontada em 111,7 milhões de fardos, contra os 94,7 da safra passada. Mas uma luz aparece no fim do túnel para o produto, apontando para a volta do consumo das fibras naturais em detrimento das sintéticas de origem do petróleo, caminhando para se manter em alta em 2005, estimulando o consumo do algodão. A exportação segue como a melhor alternativa para os produtores brasileiros, buscando contratos em dólar, porque a moeda americana não pode recuar mais do que ocorreu neste ano. Estamos num momento de recuperação.

www.cultivar.inf.br

Cultivar

53


Negócios

stamos vivendo um momento ímpar na história, o Brasil está tendo a oportunidade de se consolidar como um grande produtor agropecuário mundial. São grandes superávits na balança comercial, altas produtividades no campo, grande geração de empregos e divisas ao país. Entretanto, os produtores brasileiros estão passando por um momento de muita agonia e apreensão com a grande alta dos insumos e o baixo preço internacional das commodities agrícolas, influenciados pela supersafra no hemisfério norte com os maiores estoques mundiais dos últimos anos. O Brasil pode sim ser o celeiro do mundo, mas é preciso que providências urgentes sejam tomadas, ou corre-se o risco de matar a galinha dos ovos de ouro. Não podemos continuar achando que o empreendedor do campo não tem limites, estamos à beira de um colapso logístico; há muitos anos o governo não faz grandes investimentos neste setor, e hoje são estradas ruins, com excesso de tráfego, portos necessitando de grandes obras, ferrovias que não saem do papel e hidrovias impedidas por ambientalistas. É necessário ter pulso neste momento e rever o porquê do produtor rural continuar pagando o Funrural, que só onera o custo de produção e nenhum benefício traz ao setor. Precisamos regulamentar urgentemente a lei dos transgênicos para todas as culturas, sob o risco de ficarmos tecnologicamente inviabilizados. Em relação aos insumos, faz-se necessário facilitar as importações de máquinas, adubos, defensivos e também a legalização dos genéricos na agricultura e ainda a consolidação do Mercosul com a quebra da barreira alfandegária e o uso de insumos registrados no Mercosul. É extremamente difícil registrar um defensivo no Brasil, mesmo que já exista o princípio ativo registrado com outra marca e isto gera um grande custo, ocasionando, segundo os fabricantes, o alto custo dos agroquímicos no Brasil em relação a países vizinhos como o Uruguai e a Argentina, por exemplo. Nem vamos falar nos preços na China, que aí sim a disparidade seria ainda maior. Para permitir ao nosso gerador de divisas uma competição menos desleal com os produtores altamente subsidiados mundo afora é primordial que tenhamos uma política agrí-

44

Cultivar

cola forte, com preços mínimos garantidos e adequados, com seguro de produção e com recursos a taxas internacionais à disposição do produtor. Dá agonia ver os funcionários do Banco do Brasil buscando justificativas para explicar a falta de recursos, a pouca disponibilidade de recursos a taxa de 8,75% (muito alta se vermos os 3% nos EUA) e ainda a tal da mixagem com recursos disponíveis para CPR a taxas de 18% à 24% e ainda escassos. Portanto, é preciso conscientizar a sociedade da importância do Agronegócio e somarmos forças junto ao ministro da agricultura, à bancada ruralista na câmara federal e demais deputados, governadores, senadores e governo federal para uma mobilização em defesa da produção de alimentos, e consolidarmos o Brasil como o maior exportador agropecuário do mundo. O projeto Fome Zero é muito bonito, mas só terá sucesso se antes dele estruturassem o projeto de produção deste país, pois para matar a fome é preciso antes de tudo produzir alimentos e produzir a custos acessíveis para que possamos colocar alimento a todos os brasileiros a custos plausíveis. Não é possível um pai de família comprar 5kg de arroz à R$ 7, R$ 8 ou R$ 10, mas é importante saber que destes 5 kg praticamente 2 kg são de impostos. Portanto, torna-se incoerente, com uma mão gasta-se um rio de dinheiro com o Fome Zero, principalmente muito recurso no marketing e com a outra mão cobra-se uma das maiores taxas

Janice Ebel

E

O agronegócio do Brasil

O Brasil pode sim ser o celeiro do mundo, mas é preciso que providências urgentes sejam tomadas, afirma Matos

www.cultivar.inf.br

de impostos do mundo sobre o alimento e impostos em cascata, que são pagos nas agroindústrias e novamente pagos pelos consumidores (muitos fazendo parte do Fome Zero) ou, ainda mais claro, se o governo dá dez ao beneficiário do Fome Zero, ele tira aproximadamente quatro de volta em impostos. Parece incoerente, mas é a realidade do nosso país. Precisamos de políticas estruturais que permitam aos programas de governo gerar divisas, riquezas, empregos, oportunidades e qualidade de vida ao nosso povo. O programa de assentamento dos semterra; como pode pessoas do governo acharem que um assentado vai conseguir ter qualidade de vida plantando 15 a 20 hectares de milho e/ou soja e/ou arroz e/ou outra cultura, se ele compra seus insumos em pequena escala obviamente com preços maiores, se ele vende em pequenas quantidades, obviamente com preços menores, com uma altíssima carga tributária, com baixas produtividades na maioria, com falta de assistência técnica e sem uma política agrícola neste país. Se o grande não consegue ter lucro com os preços atuais, imagine o pequeno. Imagine a logística do pequeno e sua estrutura de produção, seu maquinário, seu local de armazenamento. Não somos contra a reforma agrária, apenas achamos que antes de assentar uma família no campo tem que primeiro não deixar que outra família saia do campo e isto só vai ser conseguido se tivermos um agronegócio tão forte que permita ao homem do campo ter segurança para viver na fazenda, ter certeza de uma política agrícola que realmente priorize a produção, com diminuição de impostos, com adequação das lei trabalhistas ao trabalhador rural, que tem uma jornada de trabalho diferenciada, que depende do tempo e que é sazonal, com preços mínimos a níveis internacionais e garantia de compra pelo governo, com política de crédito com recursos facilitados e abundantes, com garantia de renda ao produtor rural (seguro agrícola) e uma participação maior das entidades dos produtores nas discussões e decisões do setor agropecuário do C nosso Brasil. João Pereira Matos, Tweed Agrícola

Dezembro de 2004 / Janeiro de 2005




Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.