Cultivar 74

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Cultivar Grandes Culturas • Ano VI • Nº 74 • Junho 2005 • ISSN - 1518-3157

Nossa capa

Destaques

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Foto Capa / Charles Echer

Influência negativa Quais práticas influenciam negativamente e criam condições para o desenvolvimento de pragas no algodão

17 Mais resistentes Saiba porque a resistência das plantas daninhas aos herbicidas pode ser diferente para cada composto químico

Nossos cadernos

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Fotos de Capa

Somando resultados

Newton Peter

Como a mistura de fungicidas pode aumentar o espectro de ação e prevenir o risco de resistência dos fungos Marco A. Lucini

30 Sempre sadio Como trabalha a pesquisa para desenvolver cultivares resistentes às principais doenças do trigo

NOSSOS TELEFONES: (53) Grupo Cultivar AO de ASSINANTE: Publicações Ltda. • ATENDIMENTO CGCMF: 02783227/0001-86 3028.4013/3028.4015 Insc. Est.• ASSINATURAS: 093/0309480 Rua:3028.4010/3028.4011 Nilo Peçanha, 212 Pelotas – RS 96055 – 410 • GERAL

Direção 3028.4013 • REDAÇÃO: Newton Peter Schubert 3028.4002 K. Peter / 3028.4003 • MARKETING:

3028.4004 / 3028.4005 • FAX:

www.cultivar.inf.br 3028.4001 cultivar@cultivar.inf.br Assinatura anual (11 edições*): R$ 119,00 (*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan) Números atrasados: R$ 15,00

Índice Diretas Mancha de phaeosphaeria na safrinha

04 06

Influência negativa do manejo no algodão 10

REDAÇÃO • Editor

Charles Ricardo Echer • Coordenador de Redação

Janice Ebel • Design Gráfico e Diagramação

Cristiano Ceia • Revisão

Silvia Pinto

COMERCIAL Pedro Batistin

Lixiviação de herbicidas em irrigação

14

Nossos Telefones: (53)

Resistência aos herbicidas

17

• Geral 3028.2000

Aplicações seqüenciais de herbicidas

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CIRCULAÇÃO

• Assinaturas: 3028.2070

Ferrugem da soja nos EUA

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Cibele Oliveira da Costa

• Redação: 3028.2060

Mistura de fungicidas para doenças de soja 27

• Marketing: 3028.2065

Resistência do trigo às doenças

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Predisposição do trigo às doenças

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Lançamento Nativo Bayer

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Coluna Aenda

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Agronegócios

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Mercado Agrícola

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Assinatura Internacional: US$ 80,00 70,00

Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: cultivar@cultivar.inf.br Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.

Sedeli Feijó Silvia Primeira

• Gerente

• Assinaturas

Jociane Bitencourt Rosiméri Lisbôa Alves Simone Lopes • Gerente de Assinaturas Externas

Raquel Marcos • Expedição

Edson Krause Dianferson Alves • Impressão

Kunde Indústrias Gráficas Ltda.


Diretas

Sucesso

Syngenta está animada com o crescimento das vendas. Só no primeiro trimestre deste ano o incremento foi de 24%. O crescimento foi particularmente forte em fungicidas. Os Produtos Profissionais por sua vez são liderados pelos produtos para Tratamento de Sementes. A venda de Sementes, principalmente de grandes culturas, cresceram 70%.

Priori Xtra

Escola no Campo

O Priori Xtra foi o carro chefe da Syngenta durante o Showtec em Maracaju (MS). No estande da empresa os produtores puderam confirir parcelas com demonstrativos do desempenho do produto na controle da ferrugem da soja.

Livro (foto) A Embrapa Arroz e Feijão de Santo Antônio de Goiás (GO), lançou o livro “Desenvolvimento tecnológico e dinâmica da produção do arroz de terras altas no Brasil”. Sob a edição de Carlos Magri Ferreira, Ivan Sergio Freire de Sousa e Patricio Méndez del Villar, a obra discorre sobre sistemas produtivos de arroz no Mato Grosso, avaliação de impactos ocasionados por inovações tecnológicas, estudo de preços e margens de comercialização e diagnóstico das características do arroz no mercado internacional. Informações (62) 533-2123.

Clima temperado Mostra fotográfica abre as comemorações do 30º aniversário da Embrapa Clima Temperado, Pelotas (RS). Os 30 anos também foram lembrados com a criação de um selo comemorativo à história da Unidade e da pesquisa agropecuária no Sul do Brasil.

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Resultados

Para Luiz Bottino, gerente de marketing da Quimifol, a participação da empresa nos principais eventos do setor foi muito positiva. “A Quimifol é pioneira em fertilizantes e nutrição foliar, oferecendo produtos desenvolvidos para atender todas necessidades da agricultura moderna”, garante.

A Syngenta Seeds lança o Projeto Escola no Campo em Uberlândia (MG). O objetivo é levar conhecimento sobre temas atuais relacionados ao campo para crianças e ensinar que a manipulação de defensivos agrícolas não deve ser realizada por menores de 18 anos. O projeto remodelado no ano passado, inclui novos temas, como água, solo, energia e lixo e os antigos foram revistos para reforçar a mensagem. Mais de 300 mil crianças já participaram do programa que começou em1991 em parcerias regionais da Syngenta com governos estaduais e municipais, cooperativas e universidades.

Ampliação A Milenia Agro Ciências inaugura em junho as ampliações de sua planta em Taquari (RS). No total, foram investidos R$ 17 milhões na nova unidade, que voltará suas atividades para exportação. O grupo planeja desembolsar mais US$ 25 milhões nos próximos cinco anos na ampliação de suas unidades. Com a esticada de suas linhas de produção, a meta é chegar a faturamento de US$ 500 milhões até 2010. O principal motor do crescimento da Milenia tem sido o fungicida Orius, destinado à ferrugem da soja.

Cerrado Jasp Pedroso Júnior, gerente de marketing operacional da Basf para o Cerrado, considerou muito produtivo o Agrishow Cerrado 2005 para a empresa. Para a safra 2005/06, a Basf colocará de plantão todas as forças para o combate da ferrugem asiática no Cerrado.

Jasp Pedroso Jr.

Nativo Presentes no lançamento do Nativo, novo fungicida da Bayer para as principais doenças do trigo, Rodolpho Leal, gerente regional de marketing; Jorge Barrionuevo, gerente da linha de produtos fungicidas, e Fernando Rupulo, gerente de marketing para a região de Passo Fundo (RS), mostraram entusiasmo com o desempenho do novo produto, que promete ser uma excelente opção já a partir da safra Leal, Barrionuevo e Rupulo que se aproxima.

Gente nova Cláudia David assumiu recentemente a coordenação de comunicação da Bayer CropsCience, onde desenvolverá seu trabalho ao lado da gerente de marketing, Adriana Porto. Antes de assumir na Bayer, Cláudia era coordenadora de comunicaAdriana Porto e Claudia David ção corporativa da Basf.

Aniversário A Embrapa soja também completou seus 30 anos de trabalho com pesquisas na área da agricultura. Além das homenagens à figuras representativas da história da empresa, feitas pela chefe geral da Embrapa Soja, Vania Castiglioni, foram lançadas 22 tecnologias: 13 cultivares de soja transgênica, 7 cultiVania Castiglioni vares convencionais e 2 de trigo.

Algodão Salvador (Ba) sediará o V Congresso Brasileiro de Algodão. O evento ocorre de 29 de agosto a 01 de setembro de 2005. Inscrições e informações no site www.cbalgodao.com.br

Prêmio Andef

Aquisição

A Syngenta pelo oitavo ano consecutivo foi ganhadora do Prêmio da Andef (Associação Nacional de Defesa Vegetal). A empresa, levou o primeiro prêmio na categoria destaque em Inovação e o segundo lugar na categoria Profissional. O projeto premiado, Água Viva, desenvolvido na região de Cascavel (PR), que consiste em recuperar áreas de nascentes em propriedades agrícolas através de pequenas construMaurício Marques ções de baixo custo.

A Becker Underwood adquiriu as ações remanescentes do seu sócio da Nitral Urbana, a maior fornecedora e produtora de inoculantes de rhizobium do Brasil. “A transação é muito positiva para a Becker Underwood e avança os nossos objetivos de crescimento através do investimento estratégico, pesquisa de ponta e expansão do mercado global” comentou Roger C. Underwood, Presidente Executivo (CEO) empresa. O presidente da Nitral será José Alberto Nunes da Silva, que tem vasta experiência de liderança em companhias agrícolas brasileiras. “Aguardo ansiosamente para assumir minha nova função e trabalhar com uma equipe excelente e clientes maravilhosos”, disse José.

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Milho

Mancha na safrinha O uso de cultivares suscetíveis e modificações tecnológicas no cultivo do milho, como uso da irrigação e do cultivo do safrinha, têm agravado o desenvolvimento da mancha de Phaeosphaeria, resultando em redução de produtividade das lavouras

O

milho tem uma grande participação no mercado econômico brasileiro. Há duas décadas, nosso país vem mantendo a posição de terceiro produtor mundial, após os Estados Unidos e a China, com uma produção atual ao redor de 42,5 milhões de toneladas, numa área de 12,5 milhões de hectares (Agrianual, 2004). A mancha de Phaeosphaeria do milho agravou-se muito a partir da década de 90. Sua importância pode ser ressaltada pela redução da produtividade da cultura, que vem sendo observada nas lavouras e também através de experimentos de pesquisa. Para a definição das estratégias adequadas de manejo desta importante doença, são necessários a identificação do agente causal e também o conhecimento de suas características e das condições que favorecem o desenvolvimento da doença. Vários estudos foram realizados fornecendo informações básicas sobre o patógeno e o patossistema milho-Phaeosphaeria maydis, permitindo-se estabelecer as principais medidas para o controle da doença.

CARACTERÍSTICAS E CONSEQÜÊNCIAS A identificação do fungo Phaeosphaeria maydis como o agente causal da doença foi feita na Índia por Rane et al. (Indian Phytop. Soc. Bull., 3:6, 1965). No Brasil, esta identificação foi confirmada através de vários trabalhos. Em ensaios conduzidos em casa de vegetação, Fantin & Balmer (Sum. Phytop., 23:64, 1997) observaram o surgimento das primeiras lesões causadas por P. maydis no milho, aos 26 dias após a inoculação, as quais ocorreram com severidade muito elevada; Fantin (Sum. Phytop., 25:38, 1999) observou o início dos sintomas aos 27 dias, e Fantin et al. (Fit. Bras., 24:282, 1999), em outro genótipo, observaram os primeiros sintomas em menor período de tempo, aos 21 dias após a inoculação, os quais também se desenvolveram com severidade elevada. Esta variação de 3 a 4 semanas quanto ao período para o surgimento das primeiras lesões, encontrada nestes estudos, provavelmente ocorreu por influência de diferenças na resistência dos genótipos e nas condições ambientais. Nestes trabalhos também foi possível evidenciar que o período para o surgimento das lesões desta doença, após a deposição dos propágulos do patógeno na superfície das plantas, é longo, maior que para a maioria dos fitopatógenos. Godoy et al. (Fit. Bras., 26:209, 2001) observaram reduções ao redor de 40% na taxa fotossintética líquida da folha, para severidades da doença que variavam de 10 a 20%, e concluíram que o patógeno também é capaz de inibir a fotossíntese no tecido foliar assintomático remanescente. Este resultado, encontrado por esses autores, pode ser devido ao tecido foliar ainda sem sinto-

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EVOLUÇÃO DA LESÃO tência, em condições de casa-de-vegetação, observaram severidade muito mais elevada dos sintomas nas plantas sabidamente suscetíveis do que nas mais resistentes. Observaram também menor tempo para o surgimento e evolução das lesões em uma das cultivares mais suscetíveis, evidenciando a existência de diversas formas de manifestação da resistência. Fantin et al. (1999) observaram o favorecimento do progresso da doença por doses elevadas de nitrogênio, em plantas inoculadas em condições de casa-de-vegetação, confirmando resultados obtidos por vários autores em condições de campo, como Parentoni et al. (Congr. Nac. Milho Sorgo, 21:164, 1996), Miranda et al. (Congr. Nac. Milho Sorgo, 24:154, 2002) e Costa et al. (Sum. Phytop., 30:116, 2004). Quando cultivado in vitro, o fungo apresentou crescimento bastante lento, inclusive na faixa mais adequada de temperatura, que foi de 20 a 22 oC, mostrando-se extremamente sensível a temperaturas acima de 30 oC, quando teve seu crescimento quase que completamente inibido (Fantin et al., Sum. Phytop., 22:61, 1996). Essa característica de desenvolvimento lento do fungo em meio de cultura e também o longo período para o surgimento das lesões no milho, após as inoculações, indicam que é possível que o desenvolvimento do patógeno no tecido foliar também seja lento, o que facilitaria o crescimento de invasores secundários nas lesões. Existem, na literatura, vários outros organismos citados como agentes causais da doença, os quais provavelmente são encontrados com freqüência nas lesões devido ao crescimento lento de P. maydis. Com relação à temperatura e umidade favoráveis ao patógeno, Godoy et al. (Sum. Phytop., 25:24, 1999), testando diferentes

Fotos Gisèle Maria Fantin

mas já estar infectado pelo fungo, em vista do longo período de tempo para o surgimento das lesões visíveis após as inoculações. Além disso, esse longo período para o aparecimento das lesões, com a presença ainda assintomática do fungo na planta, pode ser o responsável pelo fato de o tratamento químico desta doença com fungicidas apresentar eficiência muito maior se iniciado preventivamente, aos primeiros sintomas visíveis da doença, que ocorrem em geral no pré-florescimento. Também Fantin (1999), ao inocular plantas de diferentes idades em casa de vegetação com P. maydis, concluiu não ser possível observar o surgimento das lesões, em plantas inoculadas em estádio muito jovem, provavelmente porque as primeiras folhas do milho senescem rapidamente, antes do longo período necessário para as lesões se tornarem visíveis após a inoculação. Esses resultados estão de acordo com a manifestação da mancha de Phaeosphaeria no campo, pois esta doença não é observada em plantas muito jovens. Vários outros estudos sobre a patogenicidade de P. maydis ao milho, utilizando diferentes métodos de inoculação, também foram realizados. Fantin & Resende (Fit. Bras. 24:282, 1999) inocularam com sucesso plantas em condições de campo, através de pulverização de esporos. Fantin et al. (Fit. Bras., 26:371, 2001), em estudos conduzidos em condições controladas, concluíram que a inoculação através da deposição de grãos de trigo e de sorgo, colonizados pelo fungo, no cartucho das plantas, é um método prático para ser utilizado em condições de campo, em estudos de seleção de plantas resistentes à doença. Com relação ao desenvolvimento dos sintomas da mancha de Phaeosphaeria, Fantin et al. (Sum. Phytop., 28:75, 2002), estudando a reação de plantas com diversos níveis de resis-

Freqüência de chuvas é fator preponderante para maior severidade da doença

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O

s sintomas desta doença iniciam-se por manchas levemente opacas, arredondadas a oblongas, com 0,3 a 2 cm, de bordos irregulares, mas bem definidos. Estas podem passar despercebidas, até que se tornem de cor verde-pardo escura, com aspecto encharcado. As manchas evoluem gradativamente para tons mais claros e, em 1 a 2 dias, atingem uma cor próxima à esbranquiçada, com bordos escuros, típica da doença. À medida que estas lesões amadurecem, vão-se tornando cada vez mais claras. Após cerca de duas semanas do surgimento de cada uma das lesões, sob condições climáticas favoráveis, tem sido observado, no centro destas, o aparecimento de pontos escuros, que são as estruturas reprodutivas (pseudotécios e picnídios) do patógeno. O longo período de tempo para a formação das estruturas reprodutivas, associado à dependência de ambiente favorável para indução da formação destas estruturas, além da diferença de idade das lesões, provavelmente são a causa de se observar com freqüência no campo apenas parte das lesões apresentando frutificações do patógeno. combinações de temperaturas e períodos de umidade para a germinação deste fungo in vitro, observaram, entre as temperaturas testadas, melhor porcentagem de germinação a 23 oC e com o máximo período de umidade testado, que foi de 24 horas. Estudos feitos por Sawazaki et al. (Pesq. Agrop. Bras., 32:585, 1997) sobre a ocorrência da doença em condições de campo estão de acordo com estes resultados, pois concluíram que, provavelmente, o fator preponderante para a maior severidade da doença seja a umidade relativa do ar, causada por uma maior freqüência de chuvas durante o ciclo da cultura. Ainda Godoy et al. (Fit. Bras., 24:288, 1999), estudando a influência de variáveis climáticas sobre a doença no campo, observaram melhor correlação da severidade com o número de horas de umidade relativa superior a 90%, embora a temperatura e a chuva também tenham sido necessárias, para explicar o progresso da doença nos diferentes locais. Com efeito, tem sido observado, em lavouras conduzidas em áreas de risco, que mesmo cultivares resistentes, sob longos períodos chuvosos, podem apresentar severidade alta da doença e que esta praticamente paralisa seu desenvolvimento após advir clima seco.

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CAUSAS DO AGRAVAMENTO DA DOENÇA

O

agravamento da mancha de Phaeosphaeria se deu, principalmente, em função do emprego de cultivares suscetíveis, associado a modificações tecnológicas no cultivo do milho. As principais modificações ocorridas foram a adoção em larga escala do sistema de plantio direto, ou semeadura na palha, e a maior flexibilidade das épocas de semeadura, com o advento e expansão do safrinha (milho extemporâneo semeado de janeiro a abril), e a ampliação de áreas com milho irrigado (em regiões onde não há limitação térmica para a cultura durante todo o ano). Essas novas tecnologias, entre outras, permitiram o cultivo do milho em áreas e épocas antes marginais e possibilitaram

REDUÇÃO DA PRODUTIVIDADE EM SP Danos à produtividade da cultura, devidos à mancha de Phaeosphaeria, têm sido observados em muitas regiões do país, embora na maioria das vezes não sejam quantificados. Os Institutos Agronômico, Biológico e Pólos Regionais da Apta e a CATI, da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, desenvolvem o “Programa Milho IAC”, sob a coordenação do Dr. Aildson Pereira Duarte (Apta Regional Médio Paranapanema – Assis (SP) ) e têm conduzido anualmente, nas safras de verão e de inverno (safrinha), ensaios regionais com cultivares de milho por todo o estado de São Paulo. Nestes ensaios, além de estudos sobre as características agronômicas e de produtividade, são realizadas avaliações da intensidade de doenças nas diferentes cultivares. Na safrinha 2002, Fantin et al. (Rev. Agric., 79:135, 2004) observaram elevada re-

maior produção de grãos. Por outro lado, essas práticas favorecem maior sobrevivência, multiplicação e disseminação do patógeno, tanto pela presença das plantas vivas durante o ano todo no campo, onde o fungo se desenvolve nas partes doentes delas, como pela permanência da palhada do milho sobre o solo, onde o fungo sobrevive nos restos culturais que não foram incorporados para decomposição. Sob condições ambientais favoráveis, o patógeno dissemina esporos, infectando novas folhas de milho. Dessa forma, a atual realidade da cultura exige maior atenção à doença e leva à necessidade de se realizar o manejo integrado, utilizando-se um conjunto de medidas adequadas para o seu controle. dução na produtividade, devido a manchas foliares, principalmente à mancha de Phaeosphaeria, em ensaio realizado na região Sul do estado, onde as condições climáticas foram favoráveis à ocorrência de doenças. Na safra de verão 2002-03, a doença foi severa, novamente, em ensaios no Sul e, também, ao centro do estado, e, na safra 2003-04, a severidade desta doença foi mais elevada nos experimentos instalados na região Norte do estado. Na safrinha 2004, as condições ambientais do estado de São Paulo foram muito favoráveis à ocorrência de doenças, e a mancha de Phaeosphaeria apresentou distribuição generalizada e elevada severidade, principalmente no sul do estado. Nesta safrinha, em ensaios com 48 a 52 híbridos simples e triplos, conduzidos nos municípios de Itaberá, Capão Bonito, Manduri e Mococa, onde a mancha de Phaeosphaeria foi mais intensa, estimaramse também os danos à produtividade das cul-

Cultivares suscetíveis apresentaram quebra de 900 a 1600 kg/ha em São Paulo, devido à doença

tivares em função da intensidade de doenças. A mancha de Phaeosphaeria foi a principal causa de redução da produtividade, entre as demais doenças de ocorrência natural. Esta doença acarretou diminuição da produtividade ao redor de 900 a 1,6 mil kg/ha para o grupo das cultivares mais suscetíveis em relação ao das mais resistentes, em ensaios com produtividade média variando de 2,6 mil a 6 mil kg/ha, ou seja, uma quebra de produção por volta de 20 a 35%. Estes resultados enfatizam a importância de se realizar o controle desta doença, para evitar prejuízos ao agricultor.

CONTROLE DA MANCHA DE PHAEOSPHAERIA Para se obter um controle mais eficiente da mancha de Phaeosphaeria, assegurando a estabilidade da produção das lavouras de milho, tornou-se necessário adotar várias medidas dentro do manejo integrado. A primeira medida a ser utilizada é o uso

Principais fungicidas registrados para controle da mancha de Phaeosphaeria do milho através de pulverização foliar1

SE

Classe toxicológica3 II

Dose (p.c.) 0,75 l/ha

CE

II

0,8 l/ha

Produto comercial (p.c.) Opera

Ingrediente ativo (i.a.) Epoxiconazol + Piraclostrobin

Grupo químico Triazol + Estrobilurina

Concentração (g/l ou kg) 50 + 133

Formulação2

Stratego 250 EC

Propiconazol + Trifloxystrobin

Triazol + Estrobilurina

125 + 125

Recomendação de aplicação Fungicida sistêmico + protetor com ação protetiva, curativa e erradicante para aplicações terrestres e aéreas. Iniciar as pulverizações preventivamente aos primeiros sintomas. Fungicida sistêmico + mesostêmico para aplicações terrestres e aéreas. Iniciar as pulverizações próximas ao pendoamento ou aos primeiros sintomas.

Empresa registrante Basf S.A.

Bayer CropScience Ltda.

Fonte: Compêndio de Defensivos Agrícolas - Andrei, 6a edição, 1999 e atualização 2003, Relação de produtos por cultura, SAA/CDA (dezembro/2004), SIA - ANVISA (on line) e SINDAG (on line). Formulação: CE = concentrado emulsionável, SE = suspo-emulsão. 3 Classe toxicológica: I = extremamente tóxico, II = altamente tóxico, III = medianamente tóxico, IV = pouco tóxico. 1 2

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Fotos Gisèle Maria Fantin

de cultivares mais resistentes, com ênfase às regiões e épocas com histórico de ocorrência da doença com maior severidade. A semeadura de diferentes cultivares resistentes, de forma a ter maior variabilidade de genes de resistência à doença, ajuda a retardar o progresso da doença. Informações sobre resistência de cultivares às doenças podem ser obtidas através das empresas de sementes e também junto a órgãos de pesquisa estaduais e federais. Resultados obtidos pelo “Programa Milho IAC”, conduzido em trabalho cooperativo entre órgãos de pesquisa da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, podem ser encontrados na homepage: http://www.zeamays.com.br. Uma segunda medida importante é a realização da rotação de culturas, a qual deve sempre estar associada ao uso de cultivares mais resistentes. A rotação de culturas consiste em só voltar a semear a mesma espécie vegetal, na mesma área, após dois ou mais anos, ou até a completa decomposição da palhada daquela cultura, na qual o patógeno pode sobreviver. Nos casos em que for realizada a monocultura, deve-se dar preferência ao sistema convencional de manejo do solo, realizando bom preparo, com incorporação, para destruição mais rápida dos restos culturais.

Outra medida bastante importante é evitar plantios escalonados, procurando sincronizar as épocas de semeadura do milho em uma região. Esse cuidado visa prevenir altas taxas de disseminação de propágulos do patógeno das culturas instaladas mais cedo para as mais tardias e, desta forma, restringir o rápido aumento da intensidade da doença nos campos mais novos. Além dessas medidas, várias outras colaboram para o manejo da doença, como o uso de sementes de boa qualidade, e demais práticas culturais que favoreçam o adequado desenvolvimento das plantas, como um bom manejo de solo, uso de densidade de semeadura recomendada para a cultivar e adubação adequada, evitando-se elevados teores de nitrogênio. Atualmente existem também alguns fungicidas (triazóis e estrobilurinas) registrados para o controle químico da mancha de Phaeosphaeria, mas, para um controle economicamente viável, estes apenas devem ser utilizados em lavouras bem conduzidas e com bom potencial produtivo, que estejam instaladas em áreas de risco, e quando os demais métodos de controle não estiverem sendo suficientes. Para observar o surgimento e monitorar o avanço da doença nas lavouras, estas devem ser vistoriadas periodicamente, com maior

Gisèle Fantin, Eduardo Sawazaki e Aildson Duarte, pesquisadores da cultura do milho

atenção no pré-pendoamento das plantas, quando geralmente ocorrem os primeiros sintomas. Os principais fungicidas já registrados para o controle da mancha de Phaeosphaeria são o Opera (epoxiconazol + piraclostrobin) e o Stratego 250 EC (propiconazol + trifloxystrobin), e há ainda produtos em fase de registro para esta doença. Cumpre lembrar que, se os fungicidas forem utilizados indiscriminadamente, há a possibilidade de os patógenos desenvolverem resistência a estes produtos, o que reforça a importância da prática do manejo integrado de doenças, para minimizar a necessidade do C controle químico. Gisèle Maria Fantin, Instituto Biológico


Algodão

Embrapa Algodão

Influência negativa Muitas das pragas que interferem na produtividade das lavouras estão ligadas às práticas de cultivo empregadas pelos produtores, que criam microambientes favoráveis, dificultando o controle, quando estas espécies passam a causar danos econômicos

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A prática de cultivo com espécies exploradas pelo homem normalmente ocorre através da substituição de espécies nativas por espécies que produzam alimentos ou fibras. O ambiente criado por esta substituição é ecologicamente simples, fornecendo um habitat favorável à sobrevivência de insetos e outros organismos, tais como plantas indesejáveis e microorganismos. Essas espécies indesejáveis podem estar presentes na área antes da implantação dos cultivos de interesse, ou podem ter sido atraídas de outras áreas. A partir do suprimento de novos requisitos ou de quanti-

dades adicionais de um requisito pré-existente, as taxas reprodutivas e de sobrevivência de populações indesejáveis aumentam, resultando em perdas à cultura. Considerando-se que informações a respeito de como os sistemas de cultivo do algodoeiro modificam a dinâmica populacional de insetos-praga que infestam a cultura são restritas, este artigo visa discutir como a adoção de sistemas de cultivos específicos pode interferir na densidade populacional de artrópodes no algodoeiro.

Fotos Charles Echer

O

algodoeiro herbáceo ou anual (Gossypium hirsutum L. r. latifolium Hutch) é uma cultura de alto potencial produtivo, sendo este potencial limitado por perdas impostas por fatores abióticos (clima e solo) e bióticos (pragas e fatores introduzidos pela ação do homem). Anteriormente à entrada do bicudo do algodoeiro (Anthonomus grandis Coleoptera: Curculionidae) no Brasil, em 1983, o sistema de cultivo do algodoeiro constituía-se em um sistema de maior heterogeneidade, com a produção brasileira sendo oriunda do cultivo com variedades herbáceas e arbóreas, estas últimas estando restritas à região Nordeste. A partir da ampla disseminação do bicudo, em 1985, houve um decréscimo na área colhida de algodão arbóreo, caindo 48% em relação à mesma área colhida no período compreendido entre 1976-77. O declínio na colheita de um tipo de algodão, anteriormente cultivado com sucesso, serve para exemplificar como, muitas vezes, é necessário que profundos ajustes sejam realizados no sistema produtivo de uma dada cultura, em decorrência do aparecimento de problemas anteriormente não constatados. Grande parte desses problemas são decorrentes do ataque de pragas, com a adaptação/introdução de novos organismos, interferindo em determinados sistemas de cultivo.

Microclima favorável + fibras alimentares = elevação dos níveis populacionais de insetos

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CONTROLE CULTURAL A filosofia preconizada pelo MIP prevê a utilização de táticas compatíveis de controle, de maneira integrada, de forma a permitir a sustentabilidade ou durabilidade do agroecossistema. Dentre as táticas passíveis de serem utilizadas em um programa de manejo de pragas, inclui-se o controle cultural, que pode ser definido como a manipulação das práticas de cultivo, com o objetivo de reduzir as taxas de crescimento populacional dos insetos e ácaros e os danos por eles causados. Sendo assim, o controle cultural envolve a manipulação de fatores ambientais já existentes, visando diminuir a densidade da praga, através da redução da disponibilidade de alimento e abrigo. Essa tática de controle foi implementada no sistema de cultivo do algodoeiro, principalmente após o surgimento do bicudo, permitindo, entre outras coisas, o convívio com a praga em uma época em que métodos de controle químico ainda não estavam disponíveis. Sob esta ótica, não se pode desconsiderar a importante influência dos sistemas de cultivos sobre a redução da severidade dos danos impostos pelo ataque de pragas.

PLANTIOS SUBSEQÜENTES A crescente demanda por altas produções vem contribuindo para alteração nos sistemas de cultivo praticados. No caso específico do algodoeiro, a incorporação de novas áreas, anteriormente sem tradição de cultivo, que não possuíam limitações quanto à adoção de um sistema totalmente mecanizado favoreceu ainda mais a disseminação de cultivos múltiplos e sucessivos em larga escala, não recomendados do ponto de vista do manejo de pragas. O algodoeiro constitui-se em uma planta que possui uma enorme diversidade de insetos fitófagos associados ao seu cultivo, sendo

este número crescente devido à adaptação ou à estratégia de sobrevivência adotada por insetos provenientes de outros cultivos, em função do estreito convívio que vem sendo estabelecido entre culturas distintas. Junte-se a isso o fato de a planta de algodoeiro possuir hábito de crescimento indeterminado, o que favorece a presença, em um mesmo campo de cultivo, de “hospedeiros potenciais” em diferentes fases de crescimento do seu ciclo vegetativo. Adicionalmente, a facilidade de cultivo, o clima favorável ao cultivo ininterrupto, as limitações hídricas sendo suplantadas por sistemas de irrigação intensamente disseminados, associados às áreas recentemente incorporadas à produção do algodoeiro, têm contribuído para uma situação de aumento do potencial das pragas em causar dano, resultando em altos prejuízos econômicos, devido à disponibilidade irrestrita de alimento aos insetos. Isso tem contribuído para elevação do risco de contaminação ambiental, visto que medidas imediatas de controle, como o uso de produtos químicos, são sempre preferidas nestas situações, sendo responsáveis pela elevação do custo de produção. Além disso, o MIP do algodoeiro tem sido dificultado, já que pragas anteriormente de baixa ocorrência passaram a ocorrer de maneira sistemática e em níveis populacionais que justificam a adoção de medidas de controle. Como exemplo, podem-se citar os casos do complexo Spodoptera e do complexo de percevejos, que se tornaram capazes de atacar o algodoeiro, além da capacidade do ataque das pragas-chaves da cultura, a exemplo do bicudo, ter aumentado. Os órgãos de fiscalização federal e estadual tentam limitar esse cultivo generalizado através da implantação de medidas legislativas, com adoção de calendários para plantio. A portaria no. 29, de 25 de março de 2002, do Indea, por exemplo, sugere que o plantio de

Crescimento indeterminado do algodoeiro permite plantas em diferentes estádios de desenvolvimento e facilita migração das pragas

algodão seja feito entre 20 de novembro e 20 de janeiro, em áreas produtoras de algodão que se localizem na zona infestada pelo bicudo do algodoeiro. A legislação federal prevê ainda que a destruição de soqueiras seja feita até no máximo 31 de agosto de cada ano agrícola, tanto em áreas infestadas quanto em áreas indenes. Todavia, a aplicabilidade dessas medidas é restrita, fato inevitável de ser contestado, caso se observe a utilização de cultivos sucessivos adotados em algumas regiões, onde os benefícios do ponto de vista econômico têm maior peso. Essa oposição à legislação vigente coloca a classe produtiva em situação contrária a tais medidas. Há ainda parcela significativa do sistema produtivo que desconhece a existência dessas recomendações. O maior problema é que os constituintes desse mesmo sistema produtivo ainda não atentaram para o fato de que,


Fotos Embrapa Algodão

milheto e que não apresentem as mesmas restrições, a fim de justificar a característica de sistema conservacionista aliada a estes cultivos.

CONCLUSÕES

Plantios subseqüentes poderão comprometer a sustentabilidade do cultivo do algodão

caso insistam na adoção irrestrita de cultivos subseqüentes, poderão comprometer a sustentabilidade dos agroecossistemas algodoeiros. Se recorrermos à história da agricultura, verificaremos que muitas regiões foram inviabilizadas para o cultivo de determinadas espécies devido às mesmas razões aqui citadas. No caso do bicudo do algodoeiro, para as condições dos Estados Unidos, os problemas só foram minimizados a partir da implantação de medidas legislativas, que regulamentavam o calendário adotado para o plantio e a destruição de soqueiras. Tanto no caso do algodoeiro, quanto no de qualquer outra cultura, é reconhecida a ação de “escape” ao ataque de pragas, quando da implantação antecipada dos cultivos, da colheita antecipada ou do uso de variedades de ciclo curto. Todas estas medidas, adotadas isoladamente ou em conjunto, contribuem para minimizar o dano imposto pelas pragas através da redução da suscetibilidade do hospedeiro, em função do menor tempo de exposição da cultura ao seu ataque. Alguns estudos constataram que a manipulação da data de plantio de cultivares transgênicas reduzia a taxa de aplicação de inseticidas e atrasava a evolução de resistência da lagarta-rosada ao algodão Bt. Em outros trabalhos, tem-se verificado que o plantio antecipado de lavouras tem possibilitado uma menor infestação de adultos de mosca-branca em relação a lavouras implantadas mais tardiamente, resultando em menores danos às plantas. Nesse peculiar, cabe ressaltar a preferência de artrópodes sugadores/raspadores (pulgões, moscas-brancas, tripes, ácaros) em atacar os cultivos estabelecidos fora de época (ou safrinha), quando a precipitação pluvial e a disponibilidade hídrica são pequenas. Muitos destes organismos constituem-se em transmissores de virose, podendo levar à perda total da produção.

SISTEMAS DE CULTIVO Muitas das premissas adotadas por sistemas como o plantio direto e suas variantes

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são consideradas conservacionistas do ponto de vista do solo, todavia, têm contribuído para aumentar a infestação de alguns insetos, dificultando o manejo de pragas. Insetos de solo (como corós, larva-arame, percevejos-castanho, gorgulhos), que normalmente são de difícil controle, têm sua incidência favorecida nestes sistemas. Como normalmente estes insetos são altamente generalistas, mesmo a rotação de culturas exerce pouco efeito em relação à quebra do ciclo das pragas. Em alguns casos, dependendo da intensidade da infestação e da praga em questão, recomendase até o pousio da área de cultivo. Um sistema que tem sido largamente empregado é o plantio do milheto, seguido da dessecação e incorporação da palhada, anteriormente à implantação dos cultivos. Isto tem favorecido a disseminação do complexo de Spodoptera, levando o agricultor a pulverizar a cultura de cobertura (milheto) contra esta praga, visando evitar os danos futuros da praga no algodoeiro. Nesse caso, deve-se tentar implementar coberturas vegetais alternativas ao

A adoção de várias safras por ano, para o cultivo do algodoeiro, em importantes regiões produtoras, tem contribuído para dificultar a situação do manejo integrado de pragas. A cultura do algodoeiro, por si só, já é atacada por um grande número de artrópodes, que podem atingir o status de praga, além de possuir uma fisiologia característica (crescimento indeterminado) que pode favorecer o ataque. A adoção de cultivos múltiplos e subseqüentes contribui para manutenção das populações de pragas nos cultivos e, como conseqüência, para aumento do potencial causador de dano destes organismos. O cultivo contínuo dessas áreas agrícolas tem possibilitado o aumento do número de gerações dos insetos e, conseqüentemente, da densidade populacional de importantes pragas (como o bicudo do algodoeiro), dificultando a eficiência de controle a cada cultivo subseqüente e favorecendo a adaptação e/ ou migração de pragas provenientes de outros cultivos (como o complexo de Spodoptera e de percevejos que atacam a soja). Alguns tipos específicos de cultivo (como o plantio direto e o semi-direto com uso de milheto) também têm favorecido a ocorrência de algumas pragas. Faz-se necessário repensar a adoção destes sistemas sob a ótica da sustentabilidade, a fim de que a agricultura praticada nestas regiões não C seja inviabilizada. Cristina Schetino Bastos e Raul Porfírio de Almeida, Embrapa Algodão

Cristina e Raul alertam os produtores para os cuidados dos plantios escalonados e sucessivos

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Herbicidas

Fockink

Diante do diferente comportamento que apresentam os defensivos agrícolas no solo após a aplicação, um estudo mostra a avaliação de herbicidas quanto à lixiviação e à percolação e o perigo da contaminação do lençol freático

A

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gue atingir a água subterrânea, podendo provocar a sua contaminação. Como essa reserva é a responsável pela reposição de águas de rios e lagos para diversos fins, inclusive para o consumo humano, a percolação deve ser evitada. A situação ideal é aquela na qual o produto

aplicado tem movimentação limitada, permanecendo localizado na camada de solo mais superficial, onde se concentra grande parte das sementes de plantas daninhas que efetivamente germinam, aspecto de particular importância para os herbicidas de ação em pré-emer-

José Roberto Antoniol Fontes

necessidade do estudo do comportamento de herbicidas e de outros agrotóxicos no ambiente orienta a elaboração de projetos de pesquisa para a compreensão da dinâmica dos eventos a que estão sujeitos esses produtos. Às vezes, afirmações são feitas sem o respaldo de estudos e avaliações sistemáticas, o que pode levar a equívocos, tomando por danosas certas situações, quando na realidade não o são, e vice-versa. Os herbicidas estão sujeitos à ação de inúmeros fatores que alteram seu destino no ambiente agrícola. Uma preocupação importante é a movimentação no solo e o perigo de contaminação de águas subterrâneas e de corpos d’água. A movimentação de um herbicida no solo pode ser dividida em dois processos com conseqüências distintas. A lixiviação é o carreamento do herbicida em solução para baixo, no solo, por meio da força gravitacional, influenciado por características físico-químicas dos herbicidas (constante de dissociação, solubilidade em água, coeficiente de adsorção, volatilidade, fotossensibilidade e meiavida), do solo (pH e conteúdo de argilas e de matéria orgânica) e das condições climáticas (chuvas ou irrigação e temperatura). A percolação é a situação em que o herbicida conse-

A contaminação das águas é dada, geralmente, pela mobilidade e persistência do herbicida no solo

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Quadro 1- Valores de coeficiente de adsorção (K oc), meia-vida (t1/2) e classificação do potencial de lixiviação de alguns herbicidas de acordo com os índices GUS, CDFA e Cohen1 gência. A mobilidade e a persistência de herbicidas no solo são os principais indicadores de seu potencial para contaminação de corpos de água e do lençol freático, ou seja, quanto maiores a mobilidade e a persistência, maior é o potencial. Alguns índices utilizam valores dos coeficientes de adsorção (Koc) e de meiavida (t1/2) para o estabelecimento do potencial de contaminação. O mais conhecido é o Groundwater Ubiquity Score (GUS), calculado pela fórmula: GUS = log t1/2 (4 – log Koc),

Herbicidas Alachlor Atrazine Clomazone Chlorimuron-ethyl Diquat Fenoxaprop-p-ethyl Fomesafen Glyphosate Lactofen Metolachlor Nicosulfuron Sethoxydim 1

onde GUS < 1,8 indica herbicidas nãolixiviadores, e GUS > 2,8, herbicidas lixiviadores. Aqueles com valores entre esses dois extremos são considerados de lixiviação intermediária. Outros dois são o CDFA (California Department of Food and Agriculture), que considera herbicidas lixiviadores aqueles que apresentam Koc menor que 512 ml/g e meia-vida superior a 11 dias, e o índice de Cohen, que estabelece valores de Koc menores que 300 ml/ g e meia-vida superior a 21 dias para os herbicidas lixiviadores, e valores de Koc maior que 500 ml/g e de meia-vida inferior a 14 dias para os não-lixiviadores. No Quadro 1, são apresentados exemplos de herbicidas utilizados no Brasil e seus respectivos potenciais de lixiviação de acordo com esses índices. Os herbicidas são aplicados nas lavouras por pulverização, com emprego de volumes de água relativamente pequenos (até 400 l/ ha); o líquido, ao passar pelas pontas, é fracionado em gotas de diâmetro pequeno e, então, depositado no alvo (solo ou folhas das plantas daninhas). Outra possibilidade de aplicação dos herbicidas é através da água de irrigação, ou herbigação. Apesar de não haver produtos registrados para esta modalidade de aplicação, há relatos de produtores que têm realizado a herbigação, para reduzir gastos no controle de plantas daninhas. A aspersão tem sido o sistema de irrigação mais empregado, para realizar a aplicação de herbicidas, principalmente o

Coeficiente de adsorção (ml/g) 103 165 300 110 1.000.000 9.490 60 24.000 10.000 200 20 100

Meia-vida (dias) 80 60 24 40 1.000 180 100 47 3 195 21 5

GUS sim sim intermediário sim não não sim não não sim sim intermediário

Potencial de lixiviação CDFA sim sim sim sim sim sim sim sim

Cohen sim sim sim sim sim não sim sim -

Modificado de Inoue et al., 2003.

pivô-central. Quadro 2 – Massa seca de plantas de sorgo, cultivadas em amostras de Trabalhos já foram de- solo coletadas em diferentes profundidades, 15 dias após a herbigação e a senvolvidos com o objetivo pulverização do metolachlor de avaliar a eficácia de herbiPorcentagem da Massa Seca de Plantas de Sorgo1/ cidas aplicados com água de Tratamentos Plantio Direto Convencional irrigação no controle de plan0-5 cm 5-10 cm 10-15 cm 0-5 cm 5-10 cm 10-15 cm tas daninhas, porém os estu5 mm 99 99 98 65 100 94 do da movimentação no solo 97 97 98 70 96 96 Herbigação 10 mm são poucos. 15 mm 97 96 99 69 98 98 Além disso, com a expan98 94 100 97 99 97 são da área cultivada no sis- Pulverização 100 100 100 100 100 100 Testemunha capinada tema de plantio direto, deve Em relação à testemunha capinada. ser considerada a influência de sistemas de plantio sobre a movimentação de herbici- Quadro 3 – Massa seca de plantas de sorgo, cultivadas em amostras de das. Trabalhos realizados solo coletadas em diferentes profundidades, 60 dias após a herbigação e a para avaliar os efeitos de sis- pulverização do fomesafen tema de plantio sobre a lixi- Tratamentos Porcentagem da Massa Seca de Plantas de Sorgo1/ viação de herbicidas produPlantio Direto Convencional ziram resultados que não fo0-5 cm 5-10 cm 10-15 cm 0-5 cm 5-10 cm 10-15 cm ram consistentes. Ora os re3 mm 35 64 96 28 52 93 sultados indicaram índices Herbigação 6 mm 33 61 94 31 58 92 maiores de lixiviação em solo 9 mm 32 58 95 24 57 93 sob plantio direto em relação Pulverização 35 58 95 34 63 95 ao plantio convencional, ora Testemunha capinada 100 100 100 100 100 100 o contrário. Em certas situaEm relação à testemunha capinada. ções, foi verificado que a movimentação dos herbicidas no solo não dife- tação e adsorção nesses resíduos. Mais moviriu entre os sistemas de plantio. mentação de atrazine em áreas de plantio conTodavia, o aumento da biomassa de resí- vencional em relação às de plantio direto já foi duos vegetais sobre o solo pode inibir a lixivi- constatada. Os resíduos vegetais podem ter ação de herbicidas em razão de sua intercep- maior capacidade de sorção do que o solo. Por 1/

1/


Fotos José Roberto Antoniol Fontes

A biomassa de resíduos vegetais pode inibir a lixiviação, devido à interceptação e à adsorção

outro lado, em alguns casos, índices maiores de lixiviação de herbicidas foram verificados nos solos em área de plantio direto. Esse fato pode ser atribuído ao menor escoamento superficial e à maior infiltração de água nesse sistema de plantio. Além disso, no plantio direto, é maior o conteúdo de matéria orgânica na superfície do solo, o que aumenta a estabilidade de agregados, a quantidade de macroporos e o volume de canais, formados por atividade de macrofauna e por raízes decompostas. Um estudo recente avaliou a movimentação no solo dos herbicidas metolachlor e fomesafen, aplicados com água de irrigação e por pulverização, em plantio direto e convencional. A profundidade de lixiviação do metolachlor depende da ocorrência e intensidade de chuvas ou irrigação e dos teores de argila e de matéria orgânica do solo. A sua adsorção ao solo correlaciona-se positivamente com o conteúdo de matéria orgânica e argilas. Em relação ao fomesafen, tem sido constatada pouca mobilidade, que pode ser atribuída à sua adsorção aos colóides orgânicos e minerais e também aos óxidos de ferro e alumínio. O metolachlor foi aplicado em pré-emergência com lâminas de água de 5, 10, e 15 mm, e o fomesafen, em pós-emergência, com 3, 6 e 9 mm. Para a aplicação, foi empregado um pivô-central. Os herbicidas também foram aplicados por pulverização, com volume equivalente a 200 l/ ha. Para a avaliação da movimentação dos herbicidas, foi conduzido

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bioensaio em casa de vegetação com amostras de solo coletadas em diferentes profundidades. Como planta-teste foi escolhido o Sorghum bicolor, sensível aos herbicidas. Vê-se, no Quadro 2, que, 15 dias após a aplicação, o metolachlor só foi detectado na camada de 0-5 cm de solo na área do plantio convencional, quando se utilizou a herbigação. Na pulverização, a não-detecção do herbicida na camada de 0-5 cm foi devida, provavelmente, às maiores perdas do produto por fotodecomposição e/ou volatilização, em relação à herbigação. Aplicado via água de irrigação, mesmo com lâminas de água de 5 mm, o herbicida parece ter sido suficientemente incorporado ao solo, para reduzir tais perdas. A lixiviação do metolachlor geralmente é insignificante, quando o conteúdo de matéria orgânica do solo é maior que 2 dag/kg. O solo empregado neste estudo continha, na camada de solo de 0-15 cm, mais de 2 dag/kg de matéria orgânica, além de 49 e 43 dag/kg de argila no plantio direto e no convencional, respectivamente. Isso explica a presença do herbicida apenas na camada de solo de 0-5 cm, no plantio convencional, além da ausência de resíduos vegetais nesse sistema de plantio. No plantio direto, diferentemente do plantio convencional, o herbicida geralmente não foi detectado 15 dias após a sua aplicação em nenhuma das camadas de solo. Uma das ex-

plicações para esse fato foi a provável retenção de parte do metolachlor na palhada que havia sobre o solo. O herbicida, nesta situação, ficou mais sujeito a perdas por fotodecomposição e/ou volatilização. Além disso, é possível que o metolachlor que atingiu o solo em plantio direto tenha sido mais rapidamente degradado do o que atingiu o solo em plantio convencional. A razão disso é o maior conteúdo relativo de matéria orgânica na superfície do solo em plantio direto, o que favorece a atividade microbiana, fator de grande importância na persistência do metolachlor no solo. O método de aplicação e o sistema de plantio não influenciaram a lixiviação do fomesafen no solo, que se concentrou na camada de 0-10 cm de profundidade. Esperava-se que o fomesafen se movimentasse a maiores profundidades, em razão dos menores conteúdos de argila e de matéria orgânica nas áreas de plantio direto (49 e 2,83 dag/kg de argila e matéria orgânica, respectivamente) e de convencional (43 e 2,57 dag/kg de argila e matéria orgânica, respectivamente). Uma explicação possível pode ser o pequeno volume (264 mm) de água de chuva e irrigação na área. Outro fator que pode ter influenciado no menor deslocamento do fomesafen foi o tempo de condução do experimento (60 dias após a aplicação do herbicida). Os resultados obtidos também mostraram que a persistência no solo do fomesafen foi, provavelmente, além de 60 dias. Segundo Rodrigues & Almeida (1998), a sua persistênC cia no solo varia de 60 a 180 dias. José Roberto Antoniol Fontes, Embrapa Cerrados Rogério Faria Vieira, Embrapa/Epamig Antônio Alberto da Silva e Márcio Mota Ramos, Universidade Federal de Viçosa

José Roberto Fontes mostra estudo comparativo de herbicidas e sua ação no solo

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Herbicidas

Resistência aos herbicidas O grau de resistência de plantas daninhas, como o capim-marmelada, pode sofrer contrastes para diferentes compostos químicos de defensivos agrícolas inibidores da enzima ACCase

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esde a introdução da soja no Brasil, o capim-marmelada (Brachiaria plantaginea) tem sido considerado uma das principais espécies infestantes dessa cultura. A necessidade de controle das plantas daninhas faz do método químico o mais utilizado pelos agricultores, para solucionar problemas de soja, milho e trigo, entre outras culturas. Com o lançamento dos graminicidas de aplicação em pós-emergência das plantas daninhas, os sojicultores passaram a utilizá-los intensivamente. O primeiro herbi-

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cida lançado foi o diclofop, seguido por sethoxydim, que, dados suas características e seu grau de eficiência, foi aplicado ano após ano nas mesmas áreas. Com o decorrer do tempo, outros produtos foram lançados no mercado. Os graminicidas utilizados em soja pertencem basicamente a dois grupos químicos: as ciclohexanodionas (CHD ou DIMS) e os ariloxifenoxiproprionatos (AFP ou FOP). Esses compostos atuam na síntese de lipídios, sendo o mecanismo de ação definido como inibidores da acetil coenzima A carboxilase (ACCase). O uso continuado de herbicidas pertencentes a um único mecanismo de ação resulta em pressão de seleção para biótipos resistentes. O fenômeno da resistência é conhecido desde os anos 60. Ganhou importância nos anos 70, com as triazinas, e nos anos 80, com os inibidores da enzima acetolactatosintase (ALS) e da acetil coenzima A carboxilase (ACCase). Em revisão bibliográfica, Cortez (2000) relata os trabalhos sobre as primeiras referências de plantas resistentes aos CHD e AFP, cuja manifestação ocorreu após sete a 10 anos da introdução desses herbicidas no mercado. Entretanto, a autora afirma que quatro anos são suficientes, para originar casos de populações resistentes.

No Brasil, as primeiras manifestações de resistência foram citadas por Ponchio et al (1996) e Christoffoleti et al (1996), para biótipos de picão-preto, e por Gazziero et al (1998), para biótipos de amendoim-bravo. Para capim-marmelada, os casos foram relatados por Gazziero et al (1997) e Vidal e Fleck (1997), nos estados do Paraná e do Rio Grande do Sul, respectivamente. Tem sido comum verificar-se que, quando da ocorrência da manifestação da resistência de uma planta daninha a um determinado produto, o problema se estende aos demais produtos que possuem o mesmo mecanismo de ação. Observações de campo em áreas comerciais de produção mostram que o nível da resistência poderá variar com o produto, ou, para certos produtos, a resistência de alguns biótipos pode não se manifestar. Um estudo foi conduzido com o objetivo de analisar a variabilidade na resistência de biótipos de capim-marmelada a três herbicidas inibidores da ACCase. Foram instalados dois experimentos em casa-de-vegetação, utilizando vasos com plantas de biótipos suscetíveis e resistentes, provenientes de Ponta Grossa, região Sul do estado do Paraná. A semente do biótipo considerado resistente foi colhida em campo de produção, no qual durante muitos anos foram utilizados produtos inibidores da ACCase, cuja eficiência nas últimas safras deixava a desejar. A semente

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Charles Echer

Problemas de resistência, apresentados pelas plantas, devido ao uso intensivo de herbidas, é o tema abordado por Gazziero

dos tratamentos, respectivamente no primeiro e no segundo experimento. Após a última avaliação, foi medida a biomassa seca de cada vaso e estabelecida a média por tratamento. Os dados foram submetidos à análise estatística.

Flavio D. Haas

do biótipo considerado como suscetível foi colhida em um local não agriculturável próximo ao campo de produção. Os tratamentos são apresentados na Tabela 1 e foram compostos pelos herbicidas clethodim, tepraloxydim e sethoxydim, em diferentes doses, tendo como referência a dose recomendada (Embrapa Soja, 2004). No primeiro experimento, os vasos foram mantidos em casa-de-vegetação durante todo o tempo. No segundo, após a emergência das plantas, foram colocados em ambiente externo, com irrigação diária por gotejamento. O controle foi avaliado visualmente aos 7 e 18 e aos 8 e 15 dias após a aplicação

Uso continuado de um mesmo princípio ativo exerce pressão de seleção sobre as plantas, desenvolvendo biótipos resistentes

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Os efeitos da ação dos herbicidas sobre as plantas de capim-marmelada, no primeiro experimento, foram observados aos sete dias após a aplicação. Nas plantas suscetíveis, o nível de controle variou de 88% a 95%, nas doses recomendadas. Mesmo com a metade dessa dose, houve elevado nível de controle com os produtos clethodim e tepraloxydim. Para as plantas consideradas resistentes a esses herbicidas, o controle foi apenas mediano na dose recomendada (120 g i.a./ha de clethodim e 160 g i.a./ha de tepraloxydim), enquanto que, para sethoxydim, o controle foi considerado insatisfatório, mesmo com quatro vezes a dose recomendada de 230 g i.a./ha. Aos 18 dias da aplicação, as plantas suscetíveis foram consideradas totalmente controladas com os três produtos, não tendo sido encontradas diferenças significativas entre eles. Nas plantas tidas como resistentes, verificou-se controle das plantas tratadas com clethodim e tepraloxydim e recuperação das que foram submetidas ao sethoxydim. A biomassa seca confirmou a avaliação visual, indicando não haver diferenças significativas entre os produtos clethodim e tepraloxydim. Entretanto, para o sethoxydim, na dose normal, o peso da biomassa seca das plantas foi semelhante

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Dirceu Gassen

Tabela 1 - Produtos e doses utilizados nos experimentos sobre variabilidade no grau de resistência de capim-marmelada aos herbicidas inibidores da enzima ACCase. Embrapa Soja. Londrina (PR), 2002

ao encontrado na testemunha não aplicada. Gazziero et al (2000) conduziram experimentos em Londrina (PR) e Piracicaba (SP) com um biótipo de capim-marmelada, registrado como B-1.96, com suspeita de resistência. O material proveniente de Mangueirinha, Sudoeste do Paraná, foi avaliado, utilizando-se herbicidas dos grupos químicos CHD e AFP, em doses que variaram de metade até oito vezes a dose recomendada para cada produto. Nos dois locais, os resultados com o clethodim mostraram-se semelhantes aos encontrados no trabalho descrito anteriormente, enquanto para os demais produtos foi confirmada a resistência. As principais diferenças, do primeiro para o segundo experimento, foram a dose de sethoxydim, que passou de 2 para 4 l/ ha, a manutenção dos vasos fora da casade-vegetação e o estádio de desenvolvimento no momento da aplicação. Apesar disso, os resultados seguiram o mesmo padrão do primeiro experimento. Os níveis de controle das plantas foram elevados para todos os produtos, no biótipo suscetível, e, no resistente, apenas para clethodim e tepraloxydim. Para esses dois produtos, a diferença de controle não ultrapassou 3%.

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A biomassa seca das plantas obtida confirmou as avaliações visuais. Dose/ha Tratamentos Proporção Cortez (2000) encontrou dife- Nº Prod. Comercial Nome comum g i.a. l p.c. renças de controle, ao estudar a re1. Select + Lanzar clethodim + Lanzar 60+1,0 0,25+1,0 n sistência de capim-marmelada aos 2. Select + Lanzar clethodim + Lanzar 120+1,0 0,50+1,0 n inibidores da ACCase. Na revisão 3. Select + Lanzar clethodim + Lanzar 180+1,0 0,75+1,0 1n bibliográfica que realizou, cita os tra4. Select + Lanzar clethodim + Lanzar 240+1,0 1,0+1,0 2n balhos de Devine & Shimabukuro, 5. Aramo + Dash tepraloxydim +Dash 80+1,0 0,4+1,0 n que afirmam que as variações na sen6. Aramo + Dash tepraloxydim +Dash 160+1,0 0,8+1,0 n sibilidade são atribuídas a mais de 7. Aramo + Dash tepraloxydim +Dash 240+1,0 1,2+1,0 1n uma alteração no mecanismo de re8. Aramo + Dash tepraloxydim +Dash 320+1,0 1,6+1,0 2n sistência prevalecente nas espécies. 9. Poast + Assist sethoxydim + Assist 230+1,0 1,25+1,0 n Ainda segundo Cortez (2000), a re- 10.Poast² + Assist sethoxydim + Assist 460+1,0 2,5+1,0 2n sistência aos inibidores da ACCase 10.Poast³ + Assist sethoxydim + Assist 920+1,0 5,0+1,0 4n ocorre devido à mutação, que torna 11.Testemunha o biótipo insensível a herbicidas. A n¹= Dose recomendada no controle de capim-marmelada para aplicação em condições de área comercial. variabilidade na resistência pode ser ²Tratamento com sethoxydim utilizado no experimento 1. explicada pela possibilidade de ocor- ³Tratamento com sethoxydim utilizado no experimento 2. rer mutação em diferentes locais do como essas podem ser interpretadas gene codificador da ACCase. Embora se saiba ser possível existi- como uma oportunidade adicional ao rem variações no grau de resistência das agricultor, pois, apesar de a resistência plantas daninhas, observa-se no dia-a- ter se manifestado para os produtos inidia a campo que essas variações não são bidores da enzima ACCase, alguns herexpressivas e que, normalmente, são mais bicidas desse grupo podem continuar a evidentes quando se trata de espécies de ser utilizados sem que ocorra perda de folha larga. Nesse caso, a pesquisa per- eficácia. Convém alertar que outros biómite inferir que o biótipo estudado, mes- tipos podem não mostrar o mesmo commo tendo manifestado resistência ao her- portamento, razão pela qual deve haver bicida sethoxydim, foi controlado pelos acompanhamento agronômico, quando C produtos clethodim e tepraloxydim. Po- situações como essa acontecerem. rém, os resultados obtidos nesse experimento mostraram que os contrastes en- Dionisio Luiz Pisa Gazziero, contrados foram marcantes. Situações Embrapa Soja

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Soja

Aplicações seqüenciais Estudos com aplicações seqüenciais de herbicidas em pós-emergência, visando um melhor controle do banco de sementes no solo, são uma alternativa, para fugir da resistência aos produtos utilizados no controle

Charles Echer

O

número de áreas com problemas de resistência de plantas daninhas a herbicidas tem aumentado consideravelmente. Num levantamento realizado pela universidade estadual de Maringá, na região de abrangência da Coamo, durante a safra 2003-04, constatou-se que 80% das propriedades amostradas apresentavam algum nível de incidência de leiteiro (Euphorbia heterophylla) resistente e que 10% das propriedades apresentavam problemas de picãopreto (Bidens pilosa) com resistência. Por outro lado, no Paraná, a consagração dos plantios de “safrinha”, principalmente o milho, leva à colheita destes cultivos entre julho e agosto, o que ocasiona a reinfestação das áreas mesmo antes do plantio. Ambos os fatos têm determinado o aumen-

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to da densidade de infestação de plantas daninhas em muitas áreas de plantio. Tal fato tem demandado pesquisas que apontem opções para o manejo destas elevadas infestações de plantas daninhas, especialmente no mercado de soja. A disseminação dos casos de resistência de plantas daninhas aos herbicidas inibidores da ALS tem intensificado a utilização de herbicidas com outros mecanismos de ação, tais como os inibidores da Protox e os inibidores da síntese de carotenóides. No entanto, uma vez que a maioria deles são tipicamente herbicidas de ação de contato, em áreas de infestação elevada, nem sempre o controle pontual exercido por estes produtos gera um controle satisfatório da flora infestante. Dessa forma, em áreas de elevada infestação de plantas daninhas,

como o leiteiro, a utilização de doses “cheias” de herbicidas inibidores da Protox, em aplicação única, não se tem mostrado eficaz, uma vez que podem ocorrer rebrotes e novos fluxos de emergência após a data de aplicação. Os rebrotes normalmente ocorrem principalmente em plantas cujo estádio é igual ou superior a três folhas definitivas no momento da aplicação. Nas duas últimas safras, tem-se intensificado o estudo do efeito de aplicações seqüenciais de herbicidas pós-emergentes na cultura da soja, envolvendo principalmente os herbicidas fomesafen, lactofen e flumiclorac-pentil. A aplicação seqüencial consiste basicamente na utilização do herbicida pós-emergente em duas etapas com doses reduzidas. Embora apresente como desvantagem a necessidade de entrar-se

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HORA DA APLICAÇÃO

A

determinação do momento de aplicação dos herbicidas deve ser feita com bastante rigor, uma vez que as doses utilizadas são mais baixas do que as normalmente recomendadas. No caso das aplicações de doses “cheias”, normalmente a recomendação que os fabricantes utilizam como critério é a de que os herbicidas sejam aplicados no estádio de quatro folhas definitivas das folhas largas. No caso da aplicação de forma seqüencial, a recomendação para o estádio de aplicação é o de duas folhas definitivas, desprezando-se as folhas cotiledonares (estádio de “estrelinha”), quer seja do novo fluxo de emergência ou dos eventuais rebrotes de plantas daninhas não totalmente controladas pela primeira aplicação (Figura 1). A escolha do momento adequado para aplicação das duas etapas dos tratamentos seqüenciais é de fundamental importância para o êxito dos tratamen-

te em eventuais falhas de controle ou em rebrotes. A médio prazo, uma vantagem adicional das aplicações seqüenciais pode ser a redução do banco de sementes do solo, uma vez que diversos fluxos de plantas daninhas podem ser controlados numa mesma safra. Obviamente, tal fato depende da utilização de outros métodos culturais associados, como a não proliferação de novas sementes na área. A eficácia de controle dos tratamentos seqüenciais é comparável ou superior àquela obtida por tratamentos com doses “cheias”. Em experimentos conduzidos na re-

gião de Maringá, durante as safras 200304 e 2004-05, todas as combinações de doses de Radiant e Lanzar proporcionaram controle aceitável no mínimo até 24 DAA (dias após a aplicação) da segunda etapa das seqüenciais. Nesta avaliação, os tratamentos seqüenciais passaram a ser superiores aos de aplicação de doses “cheias” de Radiant, Flex ou de Cobra. Para os tratamentos 0,30/0,30 e 0,36/0,36, houve pouca ou nenhuma diferença entre a adição de Lanzar a 0,4 ou a 0,8 l/ha, o que indica que a menor dose é suficiente, para maximizar a ação do Radiant sobre o leiteiro, sem prejuízo na eficácia de controle. Isto está possivelmente associado à pequena área foliar do leiteiro, por ocasião da realização das aplicações, o que faz com que a necessidade de cobertura foliar seja reduzida, e à maior sensibilidade do leiteiro no estádio de duas folhas. Esta é mais uma razão para enfatizar a necessidade de aplicações bastante precoces, já que, com o aumento do desenvolvimento do leiteiro, maior área foliar necessita ser coberta, e a sensibilidade da infestante também diminui. A Tabela 1 apresenta dados de controle também de picão-preto e de guanxuma (Sida rhombifolia). A importância da segunda aplicação dos tratamentos seqüenciais do Radiant pode ser verificada, comparando-se a aplicação apenas da primeira meia-dose (0,30 + Lanzar 0,8 l/ha) (tratamento 2 – Tabela 1) com a mesma dose, mas com a reaplicação de mais (0,30 + Lanzar 0,8 l/ha) (tratamento 5 – Tabela 1). Aplicações de 50% da dose recomendada proporcionaram controle aceitável (>80%) apenas até cerca de 12 DAA da primeira etapa dos seqüenciais, sendo que, a partir de então, o controle passa a ser insatisfatório, em função dos

Fotos Rubem Silvério de Oliveira Jr.

duas vezes na lavoura, normalmente tal fato não implica no aumento do amassamento das plantas, em virtude de ocorrer no início do ciclo, quando estas ainda possuem pequeno porte. O grande aspecto positivo dessa modalidade de controle consiste no fato de que as aplicações são separadas por um período de tempo, que possibilita a emergência e o controle de novos fluxos de plantas daninhas. Isso é bastante desejável principalmente em áreas com elevada quantidade de sementes no banco de sementes do solo. Além disso, uma segunda aplicação tem um efeito importan-

tos. Deve-se optar pela aplicação mais tardia possível (uma vez que possibilita a emergência de novos fluxos) sem, no entanto, deixar que a infestação ultrapasse o estádio predominante de duas folhas verdadeiras. Em áreas com bancos de sementes mais significativos, onde ocorre a emergência de vários fluxos e/ou onde o “fechamento” da cultura é retardado, em função de algum fator limitante do meio (fertilidade, déficit hídrico, ataque de pragas) ou de características próprias da cultivar, é possível até que uma terceira aplicação destes herbicidas possa ser necessária. Nesses casos, deve ser avaliada a seletividade desses possíveis tratamentos para a cultura, assim como a compatibilidade da mistura em tanque com graminicidas aplicados em pós-emergência, uma vez que tais herbicidas são freqüentemente aplicados mais próximos ao fechamento da cultura.

À esquerda: plantas de leiteiro com quatro folhas verdadeiras; à direita: leiteiro com duas folhas verdadeiras – “estrelinha”

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rebrotes e dos novos fluxos de emergência. A única possibilidade de uso de uma aplicação única de 0,30 l/ha de Radiant (50% da dose recomendada) seria para o caso de necessidade de controle de um fluxo tardio do leiteiro que emergisse próximo ao fechamento da cultura, em áreas de baixa infestação. Mesmo assim, é possível que em função do rebrote das plantas haja uma infestação tardia, que possa ter repercussão negativa na colheita, tanto pelo aumento de umidade e impurezas quanto pela maior dificuldade de colheita mecânica. Um aspecto que deve ser levado em conta é o grau de injúria dos tratamentos seqüenciais para a soja. Da mesma forma que a eficácia sobre plantas daninhas pode aumentar, também existe a possibilidade de aparecimento de efeitos mais drásticos sobre a cultura. Os dados da Tabela 2 evidenciam uma tendência geral de maiores injúrias sobre a cultura em aplicações seqüenciais. Isso se deve ao fato de a soja estar mais nova no momento da primeira aplicação e, conseqüentemente, mais sensível. Dessa forma, por uma questão de segurança, recomenda-se, na primeira aplicação, utilizar-se no máximo 40 a 50% da dose “cheia” dos herbicidas, com a segunda aplicação complementando a dose. Quanto mais precoce o estádio da soja no momento da aplicação, menores as doses que deverão ser usadas. A modalidade de aplicação seqüencial de pós-emergentes constitui-se, portanto, numa alternativa importante e eficaz para o manejo de plantas daninhas em áreas de alta infestação e/ou com problemas de resistência de plantas daninhas a herbicidas C inibidores da ALS. Rubem Silvério de Oliveira Jr, Jamil Constantin, João Guilherme Z. Arantes, Sidnei D. Cavalieri e Diego G. Alonso, Universidade Estadual de Maringá

Tabela 1 - Porcentagens de controle de picão-preto, leiteiro e guanxuma após a aplicação de pós-emergentes, em aplicação única ou seqüencial, em experimentos realizados na cultura da soja nas safras 2003-04 e 2004-05 Tratamento e dose (l p.c./ha)

Modalidade

1. Radiant (0,60) + Lanzar (0,8)1/ 2. Radiant (0,30) + Lanzar (0,8) 3. Radiant (0,24/0,24) + Lanzar (0,8) 4. Radiant (0,30/0,30) +Lanzar (0,4) 5. Radiant (0,30/0,30) + Lanzar (0,8) 6. Radiant (0,36/0,36) + Lanzar (0,4) 7. Radiant (0,36/0,36) + Lanzar (0,8) 8. Radiant (0,36/0,24) + Lanzar (0,8) 9. Flex (1,0) + Energic (0,2%)1/ 10. Flex (0,50/0,50) + Energic (0,2%) 11. Cobra (0,60) 1/ 12. Cobra (0,30/0,30) + Hoefix (0,4) 13. Testemunha sem capina 14. Testemunha capinada

única única seqüencial seqüencial seqüencial seqüencial seqüencial seqüencial única seqüencial única seqüencial -

Picão-preto (2003-04) 16 DAA 2a seq 22 DAA doses cheias 28 DAA da 1a seq 85,25 b 51,25 d 92,00 a 97,25 a 96,00 a 96,00 a 97,25 a 96,25 a 71,50 c 97,75 a 81,50 b 93,75 a 0,00 e 100,00 a

Leiteiro (2003-04) 16 DAA 2a seq 22 DAA doses cheias 28 DAA da 1a seq 85,25 b 51,25 d 92,00 a 97,25 a 96,00 a 96,00 a 97,25 a 96,25 a 71,50 c 97,75 a 81,50 b 93,75 a 0,00 e 100,00 a

Guanxuma(2004-05) 16 DAA da 2a seq 21 DAA doses cheias 28 DAA da 1a seq. 96,50 a 96,25 a 93,75 a 98,00 a 75,00 b 33,75 c 81,75 b 79,25 b 0,00 d 100,00 a

Médias na mesma coluna seguidas da mesma letra não diferem entre si, ao nível de 5% de probabilidade pelo teste de agrupamento de Scott-Knott

Tabela 2 - Efeito dos tratamentos sobre a altura da soja na pré-colheita e sobre a fitotoxicação da soja (escala EWRC) em quatro avaliações após a aplicação dos tratamentos Tratamento e dose (l p.c./ha) 1. Radiant (0,60) + Lanzar (0,8) 2. Radiant (0,30) + Lanzar (0,8) 3. Radiant (0,24/0,24 ) + Lanzar (0,8) 4. Radiant (0,30/0,30) +Lanzar (0,4) 5. Radiant (0,30/0,30) + Lanzar (0,8) 6. Radiant (0,36/0,36) + Lanzar (0,4) 7. Radiant (0,36/0,36) + Lanzar (0,8) 8. Radiant (0,36/0,24) + Lanzar (0,8) 9. Flex (1,0) + Energic (0,2%) 10. Flex (0,50/0,50) + Energic (0,2%) 11. Cobra (0,60) 12. Cobra (0,30/0,30) + Hoefix (0,4) 13. Testemunha sem capina 14. Testemunha capinada

Altura (cm) (pré-colheita) 63,10 a 61,40 a 63,95 a 63,35 a 61,48 a 66,35 a 62,88 a 62,55 a 69,75 a 63,70 a 64,93 a 58,38 a 69,50 a 62,83 a

4 DAA 1a seq 1,0 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0 3,0 1,0 2,0 1,0 5,0 1,0 1,0

Fitoxocidade (escala EWRC)* 9 DAA 2a seq 12 DAA 1a seq 4 DAA 2a seq 6 DAA doses cheias 10 DAA doses cheias 15 DAA doses cheias 1,0 5,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0 5,0 1,0 1,0 5,0 1,0 1,0 5,0 1,0 1,0 5,0 1,0 1,0 5,0 1,0 1,0 5,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0 3,0 1,0 5,0 1,0 3,0 3,0 6,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0 1,0

Médias na mesma coluna seguidas da mesma letra não diferem entre si, ao nível de 5% de probabilidade pelo Teste de agrupamento de Scott-Knott ns Não significativo (P < 0,05). *Escala E.W.R.C., onde 1,0 = ausência de sintomas e 9,0 = morte de 100% das plantas.


Soja

EUA sob monitora Com o término do plantio da safra e um avanço mais lento do que o esperado, a ferrugem asiática nos EUA está sob monitoramento, visto que a doença ainda não invadiu as lavouras comerciais nas regiões onde foi detectada

N

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SITUAÇÃO DA FERRUGEM A ferrugem está-se movendo a um passo muito mais lento do que muitos previam ou antecipavam, devido à presença do kudzu, planta daninha largamente distribuída do Sudeste até algumas regiões do Norte. Apesar de a primeira detecção ter ocorrido no dia 25 de fevereiro de 2005, até o dia 26 de maio, apenas quatro outras detecções foram confirmadas, todas em kudzu, exceto uma única detecção em soja Charles Echer

unca uma doença de planta provocou tamanha expectativa, especulações, investimento e mobilização em massa em torno de sua ocorrência, em um país, no primeiro ano após sua detecção na safra anterior. Desde que a ferrugem asiática da soja chegou à última grande região produtora de soja ainda não afetada pela doença, há apenas seis meses, um grande volume de informações tem sido reunido e disponibilizado, concomitante ao investimento ainda mais pesado no desenvolvimento de estratégias para combater uma doença considerada ameaça à produção americana de soja, devido ao seu potencial destrutivo, verificado em alguns locais no Brasil e na África. Na última safra brasileira, é incontável o número de pesquisadores, extensionistas, produtores e mesmo jornalistas americanos que se incursionaram nas áreas produtoras de soja e institutos de pesquisa no Brasil, para conhecer o “inimigo” de perto e coletar o maior número possível de informações sobre a doença. Fazendose uma busca na Internet, com o termo “soybean rust”, é de impressionar o número de websites que surgiram nos últimos meses com informações sobre a doença. Porém, quantidade nem sempre está associada à qualidade, e muitas informações na rede são fruto de interpretações equivocadas. Dados preliminares, ainda não devidamente comprovados, acabam sendo oportunisticamente divulgados, aproveitando-se da sede que uma grande cadeia produtiva tem por informações. A seguir, apresentam-se a situação e as armas americanas, para monitorar e prever riscos da ferrugem na safra 2005.

Pouco inóculo e baixa dispersão deste são atribuídos ao fato da doença ainda não estar disseminada

voluntária - ver cronologia das detecções no mapa. Não se tem encontrado a doença mesmo nos locais onde alguns modelos de simulação já prevêem o seu desenvolvimento. A maioria das detecções em kudzu se deu nos mesmos locais onde a ferrugem tinha sido detectada em novembro do ano passado. No caso das plantas de soja no Sul da Geórgia, níveis baixíssimos da doença (pequenas pústulas isoladas) foram encontrados em poucas plantas, localizadas próximo ao kudzu detectado com ferrugem em novembro passado. Apesar das suspeitas, nenhuma confirmação de ferrugem foi feita nesse kudzu até o momento. Tendo a maioria das detecções ocorrido em locais nos quais a doença já tinha sido detectada, é provável que o fungo tenha sobrevivido ao inverno nesses locais no extremo Sul do país, onde as temperaturas não são tão baixas quanto nas regiões mais ao Norte, o que permite ao fungo encontrar hospedeiro vivo e condições para sobreviver. As fontes limitadas de inóculo e sua provável dispersão em baixíssima concentração talvez sejam responsáveis pela taxa ainda lenta com que a doença tem-se disseminado, apesar de as condições climáticas terem sido favoráveis à doença, como na Geórgia e no Norte da Flórida, com grande quantidade de chuvas em março e abril e presença de kudzu em crescimento vigoroso.

SENTINELAS A POSTOS Dois projetos foram idealizados de for-

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mento ma independente, mas conduzidos de forma coordenada. A Universidade de Iowa, em conjunto com pesquisadores de outros 20 estados, lidera um projeto para o estabelecimento de um número mínimo de 20 parcelas sentinelas em 20 estados americanos, com financiamento de 300 mil dólares do programa de pesquisa de soja da região Centro-Norte. A Secretaria de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) investiu 800 mil dólares para a instalação de um mínimo de 10 parcelas sentinelas em 31 estados, incluindo outros não participantes da rede do projeto liderado pela Universidade de Iowa. Totalizando um número ao redor de mil unidades com os dois projetos, as parcelas sentinelas seguem os mesmos princípios das sentinelas adotadas no Brasil, que é o de monitorar a dispersão da doença e alertar quanto ao risco. Todas as parcelas sentinelas já foram plantadas no período de 15 a 20 dias anteriores ao plantio normal. Em algumas áreas nos estados do Norte, algumas parcelas que não receberam cobertura a tempo tiveram que ser replantadas, após a geada que ocorreu na primeira semana de maio. As visitas às parcelas já se iniciaram nos estados do Sul, onde o plantio é antecipado. Diferente do Brasil, mas

seguindo uma decisão que deverá ser tomada por cada estado, muitas parcelas sentinelas não serão destruídas após a detecção e terão o objetivo de obtenção de dados de monitoramento do progresso da doença, para se poderem validar modelos de previsão de ferrugem. Essas são chamadas “parcelas epidemiológicas”. Além das sentinelas, o projeto da USDA propõe a coleta de amostras semanais de chuva em uma rede de 124 pontos de coleta, espalhados em todos os estados do Centro e Leste dos Estados Unidos, para se detectarem os esporos do fungo, antes ainda que a doença apareça nas sentinelas. Um protocolo de análise molecular por PCR está sendo ajustado, para detectar esporos de Phakopsora pachyrhizi, baseado no modelo existente para coleta de esporos da ferrugem do colmo do trigo, que tem provado ser eficiente, para alertar a presença de esporos desta outra ferrugem nas regiões do Norte. Até o momento, não foram divulgados resultados desse projeto. Existem iniciativas da indústria de também fazer coletas de esporos em unidades móveis que se deslocarão do Sul para o Norte no decorrer da safra.

MODELOS DE PREVISÃO No dia 2 de março de 2005, o centro de previsão de doenças de plantas da Universidade da Carolina do Norte lançou suas previsões, baseadas em simulação de movimento de esporos, a partir da primeira fonte detectada em kudzu no condado de Pasco, no Centro da Flórida. O sistema é baseado no modelo já estabelecido para mofo-azul-dofumo e apresenta a provável trajetória de movimentação de parcelas de ar que contêm esporos do fungo, a partir do ponto de origem. Os riscos são determinados através da análise e interpretação qualitativa das condições meteorológicas na fonte e na trajetória dos esporos, como ocorrência de chuvas que potencialmente promovem a deposição dos esporos. As simulações são feitas três vezes por semana, e, atualmente, três mapas são produzidos, considerando-se três locais distintos como fonte de inóculo do fungo. Não se sabe ainda como o sistema será adaptado futuramente, quando ocorrer grande número de detecções em locais diferentes. Em uma iniciativa ambiciosa e inédita, modelos complexos de simulação estão sendo desenvolvidos por pesquisadores ligados ao


MONITORAMENTO visão climática de até 30 dias, rodados por colaboradores na Universidade de St. Louis. São utilizados modelos que simulam as futuras dispersão e concentração de esporos a partir de fontes conhecidas, bem como mapeiam regiões de risco de maior favorabilidade a epidemias, com base em variáveis climáticas. Previsões e análises interpretativas são feitas semanalmente e distribuídas a um pequeno grupo de pesquisadores, para que a informação possa ser avaliada. A iniciativa será de grande valia, para se testar o potencial de uso de previsões climáticas de até 30 dias para a previsão de doenças de plantas. Se, com sorte, tanto os modelos de previsões climáticas como os de previsão da epidemia da ferrugem estiverem aproximadamente certos, será possível se conhecerem com até um mês de antecedência, em nível regional, os locais de maior risco de ocorrência de uma epidemia moderada ou severa, ou, ao contrário, locais onde epidemias não são esperadas.

ANÁLISE DO CENÁRIO ATUAL É possível que se tenha passado de uma situação extrema para epidemias nas regiões produtoras do Meio-Oeste devido ao lento movimento da doença no Sul do país. Neste cenário extremo, epidemias teriam que ocorrer em kudzu e soja voluntária nos estados do Sul, antes do final de maio, para que uma grande quantidade de esporos pudesse ser produzida com potencial de atingir os campos do Norte em junho, o que poderia provocar um desenvolvimento acelerado da epidemia nesta região. Considerando as limitadas fontes atuais de inóculo, se novas detecções não forem feitas nas próximas semanas, é provável que o risco de epidemias no Nor-

Dirceu Gassen

USDA e universidades. Tais modelos são baseados em sistemas de informações geográficas e conectados com bases climáticas de dados, observados e simulados em tempo real, em um gride de 10 km2. Os resultados desses modelos não estão sendo divulgados ao público, mas apenas a um grupo restrito de pesquisadores, para avaliação do sistema e interpretação dos resultados. Resumidamente, são feitas simulações do movimento e da concentração de esporos depositados na superfície, originados a partir das fontes de inóculo conhecidas. Uma vez que o modelo simula a deposição de determinada concentração de esporos do fungo sobre uma área onde outro modelo simula a presença e crescimento de um hospedeiro do fungo, seja kudzu ou soja, inicia-se a simulação da epidemia com dados meteorológicos em tempo real, que calcula diariamente o progresso da severidade da doença. Os resultados desse modelo complexo, uma vez validados, nesse primeiro ano, pelas observações nas parcelas sentinelas, e devidamente ajustados, têm potencial para, no futuro, orientar a tomada de decisão do momento de aplicação de fungicida. É possível que, ao invés de se adotar o modelo preventivo de duas aplicações, possa-se atrasar a primeira aplicação, ou então, ainda, eliminar-se uma segunda aplicação desnecessária, conforme a simulação, que pode, ao contrário, indicar a necessidade de aplicação anterior à prevista em calendário fixo. Aqui, na Universidade de Iowa, o nosso grupo de pesquisa, liderado pelo prof. X.B. Yang, que trabalha com modelagem do risco da ferrugem asiática há mais de 15 anos, está trabalhando em outra estratégia, também inédita, que consiste em previsões regionais de médio prazo, baseadas em dados de pre-

Além do monitoramento, as previsões climáticas para os três próximos meses definirão o cenário da safra

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P

ara poder manejar e divulgar o grande volume esperado de informações sobre detecções em parcelas sentinelas e em hospedeiros alternativos, o USDA investiu pesado na construção de um sistema informatizado de grande porte, disponibilizado na Internet, sendo manejado de forma descentralizada. O sistema possui uma interface de livre acesso, onde se podem visualizar, em uma mapa interativo, os locais e o histórico das detecções. Essas informações são enviadas diretamente ao banco de dados, pelos responsáveis de laboratório de uma extensa rede, após o laudo ser confirmado oficialmente como positivo pelo laboratório de Beltsville, Maryland. Informações das parcelas podem ser atualizadas pela Internet ou por equipamentos portáteis, como palmtops. Em outros dois mapas, são indicados os locais onde se deve intensificar o monitoramento, bem como as ações de manejo que devem ser tomadas, como a decisão de pulverizar ou não, ou de pulverizar de forma preventiva ou curativa. Importante salientar que as recomendações são de responsabilidade de um pequeno grupo de especialistas que avaliam o cenário local e incluem, no sistema, as medidas de ação específicas para o seu respectivo estado. A tomada de decisão será baseada em diversos fatores criteriosamente avaliados pelos especialistas regionais, com base na situação local e em modelos de risco. te diminua cada vez mais. Se a doença aparecer no Norte, é mais provável ser detectada em estágios mais tardios. No entanto, não se descarta a possibilidade, ainda que remota, de que, com o avanço dos cultivos e a maior disponibilidae de hospedeiros, a doença possa se estabelecer de forma rápida em algumas regiões, uma vez que o ambiente está sendo bastante favorável e grande quantidade de inóculo, produzida. Os ventos rápidos poderão ser eficientes em levar o inóculo para a região Norte. No entanto, ainda é muito cedo para se antecipar o cenário final da safra atual, devido a algumas incertezas, como as das previsões climáticas para os meses de junho, julho e agosto, meses mais críticos que C definirão o cenário da safra. Emerson Del Ponte, Universidade do Estado de Iowa

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Soja

Somando resultados As doenças na cultura da soja, principalmente as de final de ciclo, podem resultar em perdas superiores a 80%. Neste sentido, a mistura de fungicidas tende a aumentar o espectro de ação e a prevenir o risco de resistência dos fungos ao controle

O

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de resistência do fungo ao fungicida. * Como aplicar? Essa decisão é altamente dependente da tecnologia de aplicação. Relaciona-se ao tipo de bico recomendado para cada situação, ao volume de calda, à qualidade da água etc. Tem sido recomendado para doenças de soja que a calda fungicida atinja os três terços da planta com o mínimo de 60 gotas/cm2. Embora seja difícil, em caráter prático, devem-se evitar as pulverizações sob condições desfavoráveis, ou seja, sob umidade relativa inferior a 55%, temperaturas acima de 30ºC e ventos superiores a 10 km/h. * Quando aplicar? Talvez seja esse o gargalo do controle químico de doenças de soja. Para algumas doenças, torna-se necessário realizar a aplicação após a constatação de determinada porcentagem de severidade da doença (ex: oídio), enquanto que, para outras, a aplicação deverá ser preventiva ou, no máximo, ser realizada ao aparecimento dos primeiros sintomas (ex: ferrugem asiática, antracno-

se e doenças de final de ciclo). Para tanto, o monitoramento de doenças a campo é fundamental para a tomada de decisão do agricultor. Uma vez respondidas essas questões, o agricultor obterá êxito no controle químico. Vale salientar que, em relação ao fungicida a ser aplicado, torna-se imprescindível conhecer o modo de ação de cada produto (evitar resistência) e a possibilidade de utilizá-los em misturas. O grande objetivo da mistura de fungicidas com grupos químicos diferentes é aumentar seu espectro de ação e prevenir o risco de resistência dos fungos aos produtos aplicados. As primeiras misturas de fungicidas, contendo dois grupos químicos diferentes, foram disponibilizadas para o agricultor na safra 2002-03, como, por exemplo, o pyraclostrobin + epoxiconazole, ou Opera®. Posteriormente, novos produtos chegaram ao mercado, a saber: trifloxystrobin + propiconazole (Stratego®); azoxystrobin + ciproconazole (Priori Xtra®) e trifloxystrobin + ciproconazole (Sphere®). Esses fungicidas são compos-

Fotos Fesurv

complexo de doenças na cultura da soja é responsável por perdas significativas, principalmente em função da ocorrência das doenças de final de ciclo (DFCs), antracnose e ferrugem asiática. Geralmente, essas perdas variam de 30 a 50%, embora sejam relatados casos com perdas superiores a 80%, como no da ferrugem asiática. Para se minimizarem os danos causados pelas doenças da soja, várias medidas de controle devem ser adotadas de maneira conjunta, preconizando-se o correto manejo de fertilidade, a rotação de culturas, a escolha da variedade conforme a época de plantio, a utilização de sementes com boa sanidade e o uso de fungicidas. Na maioria dos casos, o agricultor utiliza-se apenas do controle químico, não obtendo algumas vezes o resultado esperado, o que normalmente está relacionado ao uso incorreto desses defensivos. Portanto, antes mesmo da escolha do fungicida a ser utilizado, o agricultor precisa responder às seguintes questões: * O que aplicar? Essa escolha sempre será em função do histórico da área, através da identificação dos seus principais problemas ao longo dos anos. Outro ponto a ser observado diz respeito à eficácia de cada produto para as principais doenças. * Quanto aplicar? Nesse caso, o agricultor deve utilizar sempre a dose recomendada pelo fabricante, a qual está registrada junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Evite subdosagem (fato de ocorrência generalizada no país)! A dose recomendada é a garantia da eficiência do produto no que diz respeito à porcentagem de controle, ao período residual e à minimização do risco

Terço inferior de plantas de soja com alta severidade da ferrugem (esq.) e pústula, vista na face inferior da folha, com esporulação abundante do patógeno (dir.)

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Fotos Fesurv

Sintomas da antracnose em vagens

Close do sintoma, semelhante a um alvo

tos pelos grupos químicos das estrobilurinas e triazóis. As estrobilurinas, de maneira geral, são fungicidas que possuem ação preventiva contra doenças da soja, proporcionam um período residual mais prolongado, em comparação aos triazóis e aos benzimidazóis, e apresentam amplo espectro de ação contra manchas foliares. Quanto ao grupo químico dos triazóis, existem diferenças entre os produtos. Conforme relatado por Godoy e Canteri (2004), a sistemicidade é diferente para cada ingrediente ativo, e, conseqüentemente, a eficácia de cada um deles varia em função da doença em questão. Segundo a classificação proposta pela Embrapa (2004), os produtos foram classificados em uma, duas ou três estrelas, de acordo com a sua eficácia contra a ferrugem asiática. Em relação às porcentagens de controle dos produtos de três, duas ou uma estrela, muito cuidado deve ser tomado pelo agricultor, lembrandose que cada produto terá sua eficácia diferenciada em função da condição de aplicação. Se a aplicação for preventiva, com ausência de sintomas, a porcentagem de controle poderá ser superior a 90%, mesmo para produtos de duas ou uma estrela. Ao se considerar uma aplicação curativa, com alta severidade da doença

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(porcentagem de área foliar lesionada e/ou desfolha), mesmo para um produto classificado como três estrelas, a porcentagem de controle pode ser inferior a 70%. Tudo depende do momento de aplicação! Novos fungicidas, como Celeiro® (tiofanato metílico + flutriafol), estão sendo disponibilizados ao mercado, representando as misturas de benzimidazóis e triazóis. Estas se apresentam como mais uma opção para a rotação de produtos com modos de ação diferentes, garantindo assim amplo espectro de ação contra outras doenças, como a manchaalvo e antracnose. A antracnose tem-se mostrado uma doença muito importante em algumas microregiões dos estados de Goiás e Mato Grosso. Entretanto, poucos trabalhos têm sido realizados acerca do controle químico dessa doença. Observações a campo e resultados experimentais preliminares têm sugerido maior eficácia de controle com os benzimidazóis, quando aplicados entre o início da fase reprodutiva (R1/R2) e a fase que vai do canivetinho até o final de alongamento de vagens (R3/R4), embora ainda haja necessidade de realização de maior número de trabalhos em relação à eficácia dos fungicidas, suas respectivas doses e época de aplicação. Outro fator importante

Carregal e Campos apontam as vantagens do uso de misturas no controle do complexo das doenças na soja

é analisar-se o comportamento de cada variedade a essa doença. Várias são as pesquisas que vêm sendo desenvolvidas na Universidade de Rio Verde (Fesurv), para se avaliar a eficácia das misturas, formuladas ou não, no controle do complexo de doenças na cultura da soja. Em muitos experimentos, observou-se maior eficácia dos fungicidas no controle do complexo de doenças, quando os mesmos foram utilizados em misturas (triazóis + estrobilurinas). Para esses casos, foram diagnosticadas as seguintes doenças: mancha parda, crestamento de cercospora e ferrugem asiática. Outro fator a ser considerado é que existem triazóis que, na mesma dose em que são recomendados para o controle da ferrugem asiática, também se mostram efetivos contra DFCs. Em outros experimentos, onde se constatou também a incidência de antracnose e/ou mancha-alvo, melhores resultados foram obtidos quando da utilização de misturas de triazóis com benzimidazóis. Vale salientar que foram utilizadas doses completas de cada fungicida, uma vez que o triazol tinha como alvo a ferrugem asiática, e o benzimidazol visava o controle de DFCs, antracnose e mancha-alvo. Dessa forma, o emprego de misturas mostra-se como uma ferramenta importante para o agricultor no controle do complexo de doenças da soja, minimizando os riscos de resistência do fungo a determinado princípio ativo e prolongando a vida útil dos produtos, desde que bem utilizados. Para isso, é fundamental a assistência de um engenheiro agrôC nomo. Luís Henrique Carregal e Hercules Diniz Campos, Fesurv Quadro 1 – Classificação de fungicidas quanto à eficácia para o controle da ferrugem asiática. Embrapa Soja, 2004 Nome técnico azoxystrobin + ciproconazole trifloxystrobin + ciproconazole pyraclostrobin + epoxiconazole tebuconazole tebuconazole flutriafol tetraconazole myclobutanil trifloxystrobin + propiconazole fluquinconazole difenoconazole azoxystrobin epoxiconazole tetraconazole ciproconazole + propiconazole

Nome comercial Agrupamento Priori Xtra 3001 *** Sphere 300 *** Opera 500 *** Folicur 200 CE 500 *** Orius 250 CE 400 *** Impact 125 SC 500 *** Domark 100 CE 500 ** Systhane 250 400-500 ** 400 Stratego * Palisade 250 * Score 250 CE 200 * 200 Priori * Opus 50 400 Eminent 125 EW 400 Artea 300 -

1 – dose do produto comercial em ml/ha *** + de 90% de controle/ ** de 80 a 86% de controle/ * de 59 a 74% de controle

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Trigo

Marco A. Lucini

Para tentar minimizar as perdas com doenças, que muitas vezes ultrapassam os 40% da lavoura, pesquisas de avaliação do grau de resistência das cultivares são cada vez mais intensas, para tornar as plantas tolerantes aos patógenos

E

A doença é transmitida pela semente, e o patógeno sobrevive nos restos culturais e no solo por dois a três anos. A maioria das cultivares possui alto potencial de produção, porém, é suscetível ou moderadamente suscetível a esta doença. Com base em ensaios de campo, realizados durante oito anos em diversas localidades do Paraná, identificaram-se as melhores fon-

Fotos Y. R. Mehta

ntre as diversas doenças fúngicas, bacterianas e viróticas que atacam o trigo, poucas são economicamente importantes para a cultura. As doenças viróticas não são importantes para a região Centro-Sul do Brasil, salvo casos esporádicos e isolados. Devido às épocas de plantio, a ferrugem do colmo se manifesta tardiamente e, portanto, não chega a causar danos econômicos para a cultura. As cultivares do trigo atualmente em cultivo são suscetíveis a uma raça ou à outra da ferrugem da folha e do oídio. Essas doenças podem ser economicamente controladas por uma ou duas aplicações de fungicida apropriado e/ou tratamento de semente, especialmente para o oídio. Algumas doenças de difícil controle serão tratadas aqui doravante.

HELMINTOSPORIOSE A helmintosporiose de trigo, causada por Bipolaris sorokiniana, provoca perdas apreciáveis do rendimento, chegando em determinados casos, a valores superiores a 40% (Fig.1).

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Fungo da mancha amarela é capaz de sobreviver em restos de cultura de uma safra à outra

tes de resistência a B. sorokiniana (Tabela 1,2). Resistência completa não foi encontrada em cultivares comerciais de trigo, sendo que todas as cultivares de trigo são suscetíveis ou moderadamente suscetíveis. Maiores esforços devem ser dirigidos à busca de melhores fontes de resistência em diferentes espécies afins ao trigo. A avaliação da variabilidade genética dentro da população do patógeno, baseada na análise de DNA, auxilia nos testes de germoplasma de ampla adaptabilidade para resistência a todos os patótipos que ocorrem ao longo das regiões produtoras de trigo. Considerando-se esse aspecto, estudou-se a variabilidade genética entre isolados de B. sorokiniana. Os resultados demonstram que a variabilidade genética entre os isolados é pequena, e tampouco há evidências de mudança genética na população do patógeno durante os últimos 15 anos. Os resultados sugerem que apenas alguns isolados mais agressivos possam ser utilizados, para testar o grau de resistência em espécies afins ao trigo.

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Tabela 1 - Genótipo de trigo com resistência à helmintosporiose, medida através de área abaixo da curva de epidemia da doença (AUDPC)

Tabela 2 - Porcentagem da área foliar infectada de algumas cultivares de trigo, onze dias após a inoculação com Bipolaris sorokiniana

Genótipo de trigo 1. CEP 14 (PEL 72380/ATR) 2. YM#6 3. IA 814 (T.AEST/4/TP//CNO/NO/3/CNO/7C/5/JUP) 4. CNT 8 5. 8230-54/32*FR/KAD//CB/4PAT(B)/5/CKA “S” 6. CNT 1 (PF11.100-62/BH 1146) 7. MON “S”MN 72131-CM52721-4Y-2Y-5M-1Y-1M-1Y-0M 8. SUZHOE F3#8-18B-0Y 9. BR 8 (IAS/TP//PF 70100) 10. (NADXTMP-C112406/BJY “S”) TIP 11. CEP 76146 12. LD 8254 13. MON «S»MN 72131-CM52721-4Y-2Y-6M-1Y-1M-1Y-0M 14. VEE «S» 15. BOM/YR/3/F3570//KAL/BB 16. SUZHOE F3#8-28B-0Y 17. PAT 7219 (S12/J 9280.67/NB/TP) 18. IAS 20 (COLONIAS/FRONTEIRA/KENIA 58) 19. BH 1146 (FRONTEIRA/MENTANA/PG1) 20. MITACORE (SUSCEPTIBLE WHEAT CHECK) 21. IT 8037(SUSCEPTIBLE TRITICALE CHECK)

Cultivar

Média AUDPC 1989 - 1994 278 421 465 473 485 515 529 542 587 588 595 596 596 607 608 610 617 628 642 1471 2013

* - Calculado através do programa de computador AUDPC programa desenvolvido por CIMMYT, México

MANCHA AMARELA De uma maneira geral, no Paraná, o trigo é cultivado sob sistema de plantio direto. A maioria dos agricultores não pratica rotação de culturas, e, conseqüentemente a mancha amarela, causada por Pyrenophora tritici-repentis (Ptr), manifesta-se com maior intensidade em todas as áreas onde o trigo é cultivado. O patógeno sobrevive no solo em restos culturais de um ano para outro e continua liberando os ascosporos durante quase todo o ano (Tabela 3,4; Fig. 2,3). O grau de resistência das 38 cultivares comerciais de trigo, recomendadas para a região Centro-Sul do Brasil, foi estudado. Para esse fim, primeiramente estudou-se a diversidade genética de 40 isolados de Ptr, coletados de várias cultivares/linhagens de trigo, cultivadas em 12 regiões diferentes do Paraná, durante 1996-2000, através de análise patogênica e molecular, inclusive com testes de sensibilidade à fitotoxina produzida pelos isolados de Ptr. Todas as 38 cultivares demonstraram reação compatível (suscetibilidade) com os isolados de Ptr. Não obstante, algumas cultivares diferiram em seu grau de resistência, sendo que as cultivares CEP 17, BRS 177 e BR23 demonstraram ser menos suscetíveis a essa doença (Tabela 3). Resultados de análise molecular foram compatíveis com os de teste de virulência e demonstram que o Ptr do trigo, pelo menos no estado do Paraná, é geneticamente uniforme, sendo que a utilização de diversos isolados do patógeno na avaliação do germoplasma para resistência não será neces-

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1. LD 7831 2.SNT 1 3. BOM/YR/3/F3 570/KAL/BB 4. CEP 76146 5. PAT 7219 6. TRIGO BR 8 7. ANAHUAC 8. KUZ/HD 2009 9. BH 1146 10. PF 7339 11. PF 79557 12. IAS 20 13. P 214 14. BATUIRA 15. IA 807 16. INIA 17. ANB’S’/YACO’S’ 17. IA 815 18. IA 7968 19. IT 8037 20. MITACORE 21. IA 7956

Folhas inoculadas (N°) 15 10 16 11 13 18 8 13 12 12 7 11 5 10 15 11 16 15 11 11 17 16

Área média da folha Bandeira (cm2) 14.4 14.2 14.7 14.6 17.5 19.6 13.5 17.6 13.5 15.1 14.7 22.4 21.3 11.1 17.4 5.6 12.1 9.5 11.5 10.4 16.6 11.5

Área média coberta por lesões (cm2) 0.5 0.8 0.9 1.0 1.4 2.2 1.7 6.1 2.6 2.4 3.4 3.7 5.1 3.2 5.6 2.0 5.7 4.8 6.5 5.6 8.6 6.5

Área foliar infectada (%) 3.4a 6.1ab 6.1abc 7.5abcd 8.0abcd 11.5abcd 12.5abcd 12.7abcd 16.3abcd 16.7abcd 17.8abcde 18.2abcdef 20.0abcdefg 28.7abcdefgh 31.0 bcdefgh 35.1 bcdefghi 44.4 efghi 47.3 efghi 53.5 ghi 53.9 ghi 54.5 ghi 59.5 ghi

1 = Área das folhas e das lesões foram medidas utilizando “Portable Area Meter LI - COR. Modelo LI 3000, USA”. Teste Tuckey 5%. Médias seguidas pela mesma letra não diferem entre si

sária.

BACTERIOSE A bacteriose (estria bacteriana), causada por Xanthomonas campestris pv. undulosa (Xcu), pode causar perdas superiores a 40% em rendimento (Fig. 4). A resistência das cultivares de trigo a Xcu foi amplamente estudada. Como em outros casos, foi necessário primeiramente estudar a variabilidade patogênica dentro da população de Xcu. A variabilidade patogênica de 75 isolados de Xcu, provenientes de 12 municípios do Paraná, foi estudada em 37 cultivares do trigo, 2 de triticale, 1 de cevada, e 1 de centeio, em casa de vegetação. Dos 75 isolados, coletados durante 1987-94, abrangendo dez isolados com variabilidade patogênica, caracterizou-se a reação ao bacteriófago em estudos culturais, morfológicos e patológicos, através de microscopia de imunofluorescência, com uso de anticorpos monoclonais. Utilizando-se estes isolados, todas as cultivares então recomendadas para cultivo comercial, juntamente com linhagens mais avançadas, foram avaliadas em casa de vegetação. Identificaram-se cinco cultivares de trigo (Batuira, Cacatu, Ibiará, Piratá e Juriti) como moderamente resistentes, sendo que as demais cultivares mostraram-se suscetíveis (Tabela 5). O grau de resistência das cinco melhores cultivares foi estudado através da taxa de extensão da lesão em condições ambientais controladas. Quanto menor for a taxa

de extensão de lesão, maior será o grau de resistência da cultivar. Neste trabalho, o grau de resistência mais alto foi demonstrado pelas cultivares Batuira, Ibiará e Cacatu. A resistência completa a Xcu em trigo e triticale não foi encontrada. A bactéria não sobrevive nos restos culturais por mais de cinco meses. Os resultados indicam que a doença não é controlada através de resistência varietal ou através de rotação de culturas, sendo que seu controle depende basicamente do uso de semente sadia. Não se têm produtos químicos eficientes, para erradicar a bactéria de grandes quantidades de sementes. Tabela 4 - Restos culturais de trigo como fonte de inóculo de Pyrenophora tritici-repentis no Brasil Data de amostra de restos culturais de trigo Outubro Dezembro Janeiro Março Junho Setembro Outubro Janeiro

Quantidade de pseudotécia presente nos restos culturais de trigo* Passo Fundo Passo Fundo Cultivo Plantio Plantio convencional direto direto + +++ +++ + +++ +++ + ++ +++ 0 + ++ 0 + ++ 0 + ++ + ++ ++ 0 +++ -

* 0 = Pseudothecia ausente, + = muito pouco pseudothecia, ++ = muitos pseudotécia, +++ = pseudotécia abundante. Fonte: Mehta and Gaudencio (1991); Reis (1990).

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Tabela 5 - Reação de cultivares de trigo a 10 isolados de Xanthomonas campestris pv. undulosa, na fase de plântulas, em condições ambientais controladas Cultivar 1. Juriti 2. Sulino 3. Guarapuava 4. Morumbil 5. Panda 6. Igapó 7. CEP 11 8. Caeté 9. BR 14 10. Batuíra 11. Tapejara 12. OCEPAR 18 13. Mirim 14. BR 14 15. OCEPAR 19 16. BR 34 17. Anauhac 18. Cacatú 19. BR 35 20. Pirata 21. Guarata 22. BH 1146 23. BR 22 24. BR 23 25. BR 28 26. BR 37 27. Cocoraq 28. Garça 29. Ibiara 30. Macuco 31. Maringá 32. Minuano 33. OCEPAR 14 34. OCEPAR 15 35. OCEPAR 16 36. OCEPAR 17 37. OCEPAR 20 38. Serrano 39. Tamacore 40. Taquari 41. IAPAR 46 42. CEP 14

Reação** MR S S S S S S S S MR S S S S S S S MR S MR S S S S S S S S MR S S S S S S S S S S S S S

suscetível aos outros isolados anteriores. O processo de melhoramento genético é interrompido devido ao surgimento de diversos patótipos deste patógeno.

MANEJO DE DOENÇAS Normalmente, as doenças são manejadas através de integração de diversos métodos, tais como resistência varietal, práticas culturais e produtos químicos. Os métodos químicos incluem aplicação de fungicidas na parte aérea e tratamento de semente. A escolha e o uso de um fungicida dependerão de registro no Ministério da Agricultura do Brasil. De maneira geral, os fungicidas sistêmicos eficientes contra uma doença foliar também são eficientes contra as demais doenças foliares. Conforme dito anteriormente, não há fontes de resistência adequada em trigo para a helmintosporiose, mancha amarela, bacteriose e brusone. Tentativas devem ser feitas, para buscar fontes de resistência em espécies afins ao trigo, como por exemplo, Hordeum chilense. Após a identificação de fontes de resistência, elas podem ser incorporadas em cultivares agronomicamente desejáveis. Uma das técnicas para a fixação de resistência é a produção de duplos haplóides de trigo através de hibridação entre trigo e milho. Resistência às doenças também pode ser adquirida através de novos métodos biotecnológicos, como, por exemplo, a identificação e a incorporação de genes de resistência de espécies de planta nãohospedeiras ao patógeno. Quanto aos métodos culturais, a época de semeadura pode ser muito importante. A tendência recente em sistema conservacionista (plantio direto) de manejo de solo e água é a de utilizar leguminosas tanto para cobertura

verde como para produção de grãos, com a finalidade de fornecer uma parte de nitrogênio para a cultura subseqüente. Várias opções de culturas para cobertura verde estão disponíveis, e sua praticabilidade vem sendo investigada e comprovada por produtores rurais. As culturas de aveia preta, aveia branca, milho, milheto, sorgo, moha, nabo forrageiro e leguminosas são utilizadas na rotação de culturas, tanto para cobertura verde como também para produção de grãos. Culturas como ervilha, guandu e grão de bico podem ser cultivadas com sucesso em pequenas áreas. O cultivo de aveia preta, usada para a adubação verde, teve um incremento substancial nos últimos dez anos. Dentro do novo enfoque da agricultura conservacionista, a utilização da aveia preta ocupa um papel fundamental na agricultura paranaense. Da mesma forma, devido à expansão rápida da cultura da aveia branca, a helmintosporiose (Drechslera avenae) se tornou uma doença de alto impacto. Em anos recentes, devido a mudanças no sistema de cultivo, ao interesse crescente do setor industrial na utilização da aveia branca para a alimentação humana e também às poucas opções para o período de inverno, o cultivo deste cereal na região Norte e Oeste do Paraná expandiu-se rapidamente. As culturas de triticale e centeio não são ideais para a rotação, pois são suscetíveis à mancha amarela, à helmintosporiose (Fig. 1,2), à giberela e à brusone, as quais também atacam a cultura de trigo. Além disso, estas duas culturas não formam cobertura de palha superior a do trigo. Patógenos fúngicos, transmitidos pelo solo, são considerados potenciais. Eles podem ocasionar prejuízos econômicos e incluem espé-

S = Suscetível; MR = Moderadamente Resistente; R = Resistente.

BRUSONE A brusone do trigo e de triticale é causada por Magnaporthe grisea, proporcionando perdas apreciáveis no rendimento, dependendo do ano (Fig. 5). Avaliou-se o grau de resistência das cultivares de trigo e triticale a 11 isolados de M. Grisea, provenientes de trigo, triticale e arroz. Estudos posteriores, realizados em 2002, utilizando-se 72 isolados coletados nos estados do Paraná e Mato Grosso, demonstraram que todas as cultivares de trigo são suscetíveis a alguns isolados, sendo que a cv. Br 18 mostrou um índice de doença menor do que as demais cultivares, no entanto, foi

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Fotos Y. R. Mehta

cies de Sclerotina, Sclerotium, Rhizoctonia, Phytophthora, Fusarium, Macrophomina, Ophiobolus, Diaporthe e alguns patógenos foliares. As culturas de milheto e sorgo, atacadas pelo esporão, causado por Claviceps purpurea (comumente chamada “doença açucarada do sorgo”), por exemplo, enfrentam um novo desafio. Estas espécies são componentes do sistema de rotação de culturas e são muito utilizadas na produção de ração animal (frangos, porcos e bovinos) e cobertura do solo na agricultura familiar (Cultivar, 1999). Ração contaminada pelo esporão traz sérios riscos de intoxicação para os animais. A sanidade de semente exerce um papel importante no manejo de doenças. Com exceção das ferrugens e do oídio, as doenças da parte aérea do trigo são transmitidas pelas sementes infectadas e/ou contaminadas. A má sanidade da semente poderá afetar sua germinação e vigor, provocando perdas apreciáveis no rendimento da cultura. Os principais patógenos transmitidos pelas sementes de trigo incluem B. sorokiniana, Ptr, Fusarium graminiarum, F. nivale, M. grisea, Stagnospora nodorum, Ustilago tritici e Xcu. No caso da estria bacteriana, para os campos destinados à produção de semente,

Detalhes da estrutura do fungo Pyrenophora triticirepentis nos restos culturais

Brusone: estudos geralmente são interrompidos devido ao surgimento de diversos patótipos do fungo

sugeriu-se o limite de tolerância de 10% de área foliar infectada no estágio decimal 83. Com base nesses resultados, os campos de produção de sementes onde forem constatados índices de infecção de área foliar inferiores a 10%, por ocasião da floração até o estágio de cera mole, podem ser aprovados.

A doença pode ser controlada através de produção de sementes em áreas isentas de patógeno, aliada à aplicação de teste de sanidade de semente, utilizando-se a técnica de SIT, para que apenas as sementes sadias sejam comercializadas para o plantio. Da mesma forma, a utilização de sementes com infecção de B. sorokiniana inferior a 10%, inclusive sem tratamento das mesmas com fungicida, é recomendada. A integração de diversos métodos, inclusive a coleta de campos sadios e, depois, de infestados e a secagem das sementes devem ser praticadas, C para manejar a doença. Y. R. Mehta, Iapar


Trigo

Dirceu Gassen

Predisposição a doenças Presença e indução dos mecanismos estruturais e bioquímicos definem a resistência ou a suscetibilidade a doenças

A

resposta da planta ao patógeno é um fenômeno complexo, dinâmico e coordenado, envolvendo um grande número de genes e muitas rotas de sinalização interconectadas. A presença e indução dos mecanismos estruturais (barreiras) e bioquímicos (compostos tóxicos) que definem resistência ou suscetibilidade a doenças dependem da constituição genética da planta hospedeira e são afetadas pelo ambiente. A condição de suscetibilidade da planta, independente de fatores genéticos, é comumente chamada de predisposição. A predisposição das plantas ao ataque de patógenos é dependente de fatores ambientais e da condi-

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ção fisiológica da planta. Entre as características da planta, a idade (fenologia) é considerada a mais importante. Plantas na fase vegetativa se mostram mais suscetíveis a doenças do que plantas que já alcançaram a fase reprodutiva. Essas diferenças se devem a alterações no conteúdo de nutrientes orgânicos e compostos tóxicos, além de diferenças na estruturação da parede celular. Na literatura, vários fatores ambientais são citados como variáveis causais da predisposição, entre eles, umidade, temperatura, fertilidade e pH do solo, teor de oxigênio na raiz e qualidade de luz. O efeito do ambiente é indireto, causando alterações na fisiologia da plan-

ta. Essas alterações no metabolismo facilitam ou dificultam a entrada e a colonização de patógenos no hospedeiro. Temperaturas diferentes da temperatura ótima ao desenvolvimento da planta geram estresses, afetam a sinalização entre a parede e a membrana celulares, alterando a capacidade de resposta da planta à infecção. Altas densidades de semeadura reduzem a quantidade e alteram a qualidade de luz, podendo causar redução da espessura da parede celular e da cutícula, ambas barreiras estruturais. A nutrição mineral pode causar variações nos mecanismos bioquímicos de defesa do hospedeiro ou mesmo na composição dos elementos estruturais, como a parede celular. Cálcio, por exemplo, devido à sua ação na estruturação das pectinas, é essencial para a manutenção da resistência à penetração. Avaliando-se os nutrientes individualmente, generalizações são arriscadas. É de conhecimento comum que alto teor de nitrogênio tende a aumentar a suscetibilidade a doenças, enquanto o potássio tende a diminui-la. O nitrogênio reduz a relação carbono/nitrogênio no tecido e prolonga a fase vegetativa, aumentando a predisposição. Outros nutrientes têm efeito variável, dependendo do patógeno e da planta em estudo. De forma geral, pode-se afirmar que plantas nutricionalmente equilibradas têm uma maior capacidade de superação dos estresses, sejam estes bióticos ou abióticos. A aplicação de herbicidas também pode alterar a predisposição a doenças. Alguns herbicidas, como os difeniléteres, geram radicais livres. Os radicais livres fazem parte da sinalização de ataque de patógenos e podem, portanto, ativar mecanismos de proteção sistêmicos e/ou locais. Por outro lado, subdoses de glyphosate inibem a rota de síntese de fitoalexinas (substância de defesa induzida), aumentando a suscetibilidade a doenças. Outros estresses abióticos (seca, encharcamento, estresse térmico, deficiência nutricional) geram desequilíbrio no gerenciamento de radicais livres pela planta e na síntese de metabólitos secundários. Vários metabólitos secundários, fenóis, alcalóides, glicosídeos fenólicos e cianogênicos fazem parte do sistema de proteção bioquímico a doenças. Dessa forma, estes estresses afetam a predisposição das plantas a doenças. A resistência das plantas a doenças é resultado do somatório das contribuições individuais de diferentes mecanismos de defesa. O funcionamento adequado destes sistemas está subordinado à condição fisiológica da planta e, por conseqüência, C ao ambiente. Carla A. Delatorre, UFRGS

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Lançamento

Marco A. Lucini

Solução completa Com Com uma uma fórmula fórmula mais mais completa, completa, oo Nativo, Nativo, novo novo fungicida da Bayer, mostra mostra desempenho desempenho superior superior no no controle controle das das principais principais doenças doenças do do trigo trigo

resiste à lavagem pela chuva, garantindo um período maior de proteção. Testado em importantes regiões brasileiras, o Nativo mostrou que a combinação dos dois ingredientes ativos se complementam,

ampliando a proteção de toda a planta. “A alta performance do Nativo o posicionará em pouco tempo como líder de mercado, pois apresenta níveis de eficiência acima de 80% para o controle das

Gerhard Bohne, diretor de marketing, pesquisa e desenvolvimento da Bayer CropScience: “Solução completa contra as doenças do trigo”

O Nativo é uma ferramenta para ajudar a vencer os principais desafios do trigo no Brasil, destaca Paulo Queiroz, gerente de produto

Fotos Bayer

A

Bayer CropScience lançou uma nova solução para as principais doenças que atacam o trigo no Brasil, que são a ferrugem-da-folha, manchas foliares, oídio e giberela. A novidade é o fungicida Nativo, uma fórmula composta por Trifloxystrobin (grupo estrobilurinas) e Tebuconazole (grupo triazol), os quais apresentam modos de ação distintos na planta graças ao efeito mesostêmico de um e a atividade sistêmica do outro princípio ativo. O Tebuconazole proporciona ação sistêmica, e o Trifloxystrobin forma uma camada protetora que Modo de ação do Nativo

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Rendimento de grãos com aplicação de Nativo no controle das principais doenças do trigo (kg/ha) doenças fúngicas do trigo, quando aplicado na época recomendada”, ressalta Gerhard Bohne, diretor de marketing, pesquisa e desenvolvimento da Bayer CropScience. Segundo dados da (Conab) Companhia Nacional de Abastecimento e da Embrapa, o Brasil tem um consumo da ordem de 11 milhões de toneladas e produz apenas 5 milhões de toneladas. Os estados do Sul respondem por cerca de 90% desta produção, sendo que o Paraná e o Rio Grande do Sul são os maiores produtores. “O plantio do trigo no Brasil ainda precisa vencer os desafios da perda devido às doenças, pragas e plantas daninhas. Além disso, como cultura de inverno, enfrenta mais riscos, como geadas e outras intempéries. Isso reflete também na área total plantada no País”, analisa Paulo Queiroz, gerente de produto da Bayer CropScience. A Bayer CropScience tem buscado soluções inovadoras em fungicidas para esta cultura, porque esta é uma prática com resultados. A aplicação no início das infecções apresenta eficácia superior às aplicações curativas, uma vez que o comprometimento da produtividade ocorre desde cedo. “Hoje o agricultor pode perder até 80% de sua produção se não seguir um tratamento adequado e utilizar o produto correto”, enfatiza Queiroz.

Ferrugem da Folha

Manchas foliares

Oídio

COMBINAÇÃO CERTA A Estrobilurina - Trifloxystrobin possui propriedades mesostêmicas, ou seja, sua alta afinidade com a camada de cera da planta faz com que se armazene por mais tempo na superfície vegetal, formando um depósito de ingrediente ativo resistente à lavagem pela chuva. Uma vez protegido da influência dos fatores climáticos, o produto pode prolongar sua proteção. O ingrediente ativo também penetra no tecido foliar e exerce sua atividade translaminar. As doenças do trigo são muito bem controladas pelos triazóis. A adição do Trifloxystrobin ao Tebuconazole incrementa o controle das doenças fúngicas, inclusive das manchas foliares. Devido aos diferentes modos de ação, o produto apresenta uma completa proteção que se inicia nas camadas externas e se propaga por toda a folha. Desenvolvido sob as condições brasileiras, Nativo apresenta a relação adequada e ideal de cada um de seus ingredientes ativos. Esta relação proporciona um ótimo controle do complexo de doenças e segue as premissas básicas para o eficaz manejo de resistência aos fungos C na cultura do trigo.

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Giberela

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Coluna Aenda

Defensivos Agrícolas

Suspensibilidade A suspensibilidade de uma formulação, quando diluída na água de pulverização, é um atributo com tantas variáveis que fica difícil impor limites de garantia

A

evolução das formulações de pesticidas tem um capítulo um tanto curioso. Espero saber contá-lo direito. Cresci no meio de algodoais e de muita poeira de polvilhadeiras, que sufocava as lagartas, as brocas, os pulgões e os ácaros. Depois, vieram os pós molháveis e os pós solúveis. Grande economia em custos, concentrando mais os ingredientes ativos e diminuindo o peso das argilas-condutoras... Naquela época não se falava muito dos custos ambientais ou de saúde. As pragas eram terríveis, e o defensivo agrícola, o salvador. Chegaram os concentrados emulsionáveis, as emulsões, os concentrados solúveis, as suspensões e as soluções concentradas... Até os grânulos dispersíveis, os géis e os encapsulados. Quando as suspensões apareceram, eram conhecidas por flowable. Mas, no início, esse “apto para fluir” tinha lá suas imperfeições: você precisava chacoalhar o vasilhame antes de jogar o produto na água. Muitos produtos traziam no rótulo: agitar antes de usar. Alguns, mesmo com esse esforço, perdiam partes precipitadas no fundo da embalagem, as quais se negavam a se reintegrar ao produto; é claro que, nesses casos, o produto era apontado como impróprio para uso. Também, ao mergulharem na água de pulverização, precipitavam com rapidez, formando uma calda não homogênea, fenômeno minimizado com as pás rotativas introduzidas no equipamento. Este último fato já ocorria com pós molháveis, mas, nas suspensões, a subliminar mensagem advinda do “agite antes de usar” satanizou o problema. Os químicos correram a

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descobrir melhores suspensores, e a preocupação com a qualidade dos produtos se alastrou no setor. Foi um período muito rico para a química de formulação. Em 1976, o Ministério da Agricultura, através da Portaria nº 12, determinou que a garantia de suspensibilidade em água seria de 60% ,no mínimo, para fungicidas, e de 50%, no mínimo, para outros defensivos, tanto no caso de pós molháveis quanto no de suspensões concentradas. Só não foi explicado o porquê do atributo suspensibilidade ser diferenciado entre classes distintas de pesticidas. De fato, não está registrado nos diários de pesticidas, mas posso relatar, com toda a transparência, que os poucos produtos em uso na época conduziram a essa distinção sem base química. Em 1982, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) lança sua primeira norma sobre a metodologia para mensurar a suspensibilidade, a MB 1166. Em 1984, a ABNT revoluciona o assunto, publicando duas normas: • A NBR 8510, que estabeleceu limites de garantia diferentes, segundo a classe de pesticidas: mínimo de 60% m/m, para fungicidas, e > 50% m/m, para outras classes, no caso de pós molháveis; para as suspensões concentradas, apertou os limites de garantia: > 80%, para fungicidas, e > 70%, para outras classes. • A ABNT apertou ainda mais as suspensões na NBR 8511 (substituta da MB 1166), ao estabelecer apenas 30 minutos em água para pó molhável, antes de calcular a diferença entre a massa inicial e a massa decantada, enquanto, para as suspensões, a

alíquota deveria permanecer duas horas em água antes da mensuração. A metodologia sofreu alteração em 1995, quando a ABNT substituiu a NBR 8511 pela NBR 13313 e determinou que o método voltasse a exigir apenas 30 minutos em água para as suspensões, porém o cálculo da diferença entre quantidade inicial e decantada não seria mais em massa e, sim, em ingrediente ativo. Uma trabalheira que muitos laboratórios, para uso prático, não adotaram. Em 2000, a ABNT deu uma mãozinha aos laboratórios e definiu que o cálculo seria em massa, descontando-se os resíduos não voláteis presentes. Por sua vez, os limites de garantia foram modificados em 1990, com a NBR 8510, estabelecendo o limite mínimo de 80% para suspensões em todas as classes de defensivos agrícolas. Apesar de revisada em 1995 e 1997, a NBR 8510 não alterou as garantias nesse item suspensibilidade. Em 2005, entretanto, após longo estudo do Comitê Brasileiro de Química, ficou definido que o limite mínimo de garantia é de 60% nas suspensões concentradas que contêm um mínimo de 800 g/kg de enxofre. Essa alteração era absolutamente necessária, em razão do alto peso específico do enxofre, quando comparado à maioria dos defensivos agrícolas existentes. Isso significa que é muito mais difícil manter em suspensão produtos contendo esse ingrediente ativo, pois a formulação precisa incorporar boa quantidade de componentes suspensores. O singular é que a satanização da suspensibilidade começa a ser desmistificada justamente com o elemento químico preferido do demo. Por mim, que acompanho despretensiosamente a evolução dos produtos no setor, ainda vou torcer para que, na próxima revisão, caia por terra a diferenciação de característica físico-química vinculada às funções pesticidas dos produtos, ou, melhor ainda, para que eliminem a suspensibilidade como caracterísC tica a ser limitada por garantia.

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Agronegócios

Agronegócio e qu q T

enho dito que o fim da era do petróleo não significará apenas o desaparecimento da gasolina e do petrodiesel. Na minha visão de futuro, sai o petróleo, e entra a biomassa como matériaprima para a indústria química. A associação entre biotecnologia e biomassa está-se mostrando um caminho natural para inovações na área industrial, pela melhoria dos processos fermentativos, ou pela criação de OGMs com propriedades industriais desejáveis. Um exemplo é a celulose produzida pela Acetobacter xylinum, uma bactéria encontrada em frutas em decomposição.

CELULOSE Além das plantas, também algas, bactérias e invertebrados marinhos produzem celulose, que, após o processamento, adquire grande resistência mecânica, impermeabilidade aos líquidos e permeabilidade aos gases. A bactéria A. xylinum produz longas microfibras de celulose, criando uma substância gelatinosa chamada de zoogléia, entremeando fibras e bactérias, na superfície de líquidos. Esse arranjo serve para melhorar a captação de oxigênio pelas bactérias. As microfibras de celulose são extraídas, purificadas, secas e compactadas, obtendo-se celulose pura. Cientistas brasileiros estão investigando as aplicações industriais da celulose de A. xylinum, entre elas, o uso da película de celulose como biocurativo cutâneo. Em perdas de pele por trauma mecânico ou úlceras crônicas, a película substitui a pele, temporariamente. O curativo é colocado sobre a lesão após a assepsia, não provocando rejeição ou efeito colateral. O biocurativo adere à lesão, protegendo o local e permitindo a regeneração da epiderme, após o que ele é destacado e pode ser removido com facilidade. O curativo é permeável a gases e impermeável a líquidos, formando uma barreira sép-

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tica, porém, permitindo que a área lesionada “respire”. Verificaram-se a atenuação ou a eliminação da dor nos pacientes que receberam o curativo e uma redução do tempo de tratamento e do custo das internações de doentes com queimaduras e com feridas crônicas.

DURA-MÁTER Estudos apontam que a celulose bacteriana tem potencial para substituir, em casos de traumas ou tumores, a dura-máter - a membrana externa, espessa e fibrosa que envolve o cérebro e a medula espinhal. A pesquisa envolveu a substituição da dura-máter de 21 cães por películas de celulose, comparando as reações ao uso da celulose ao da fáscia muscular (membrana fibrosa que recobre os músculos do crânio), outro substituto de membrana empregado em neurocirurgia, com resultados encorajadores. A película está sendo testada, para revestir o stent, pequena malha metálica usada como sustentação mecânica, para impedir que a artéria volte a se fechar durante a angioplastia, procedimento utilizado para desobstruir as artérias coronárias em processo de aterosclerose. O stent é introduzido fechado na artéria coronária e, só quando atinge o ponto exato do local do estreitamento da artéria, o balão em seu interior é inflado. Assim, o stent envolvido com celulose é liberado contra a parede da artéria. Dessa forma, ele atua contra um dos processos que causam a reestenose (uma complicação tardia do procedimento), que é a migração de células musculares lisas da parede do vaso para dentro da artéria. Os testes in vitro e também com coelhos e porcos foram feitos durante três meses nos Estados Unidos e Canadá. Foram avaliadas a reação inflamatória e a hemocompatibilidade, demonstrando seu potencial para uso seguro em veias e artérias e no sistema tubular (tubo digestivo, estruturas tubulares do pul-

mão, brônquios, traquéia e uretra). Esse é um exemplo instigante das inovações que a associação entre biotecnologia, biomassa e biodiversidade nos reserva para o futuro.

OUTROS USOS A aplicação da celulose especial não se restringe à área médica, podendo ser usada em membranas para telas flexíveis luminescentes. Essas telas, com a espessura de uma folha de papel, revestem monitores de computador, cinescópios de televisores, DVDs e games portáteis, entre outros. A versatilidade da celulose bacteriana, em comparação com a vegetal, deve-se ao fato de que ela é quimicamente pura, isenta de contaminantes. Isso significa que a celulose não vem acompanhada de nenhum outro composto orgânico, como ocorre com a vegetal, dispensando o processo caro e complexo de separar a celulose da lignina e da hemicelulose. A celulose bacteriana constitui-se em um polímero cristalino, o que a distingue de outras formas de celulose.

JACAS E QUEIMADURAS Aos poucos a ciência resgata e comprova conhecimentos centenários, que compõem a cultura popular e a farmacopéia dos pajés. Recentemente, um cientista brasileiro isolou uma substância com propriedades antiofídicas, centenas de vezes mais potente que os soros convencionais. A substância foi extraída de uma das conhecidas “garrafadas”, vendidas em feiras populares, indicada como antídoto antiofídico. Uma equipe de pesquisadores da USP estuda um grupo de proteínas, as lectinas, e seu efeito sobre os mamíferos, há mais de uma década. Uma dessas pesquisas concluiu que uma proteína presente na semente da jaca, a lectina KM+, diminui o tempo de recuperação e evita a necrose de tecido em queimadu-

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uímica fina ras de pele. A lectina KM+ provoca a concentração de células de defesa, quando em contato com algum ponto lesado do organismo. Um dos pesquisadores envolvidos no estudo entendeu que deveria ser dado um sentido prático às descobertas científicas. Com esse foco, os pesquisadores passaram a estudar a hipótese de que a concentração de células de defesa em uma lesão, quando em contato com a lectina KM+, poderia evitar as infecções oportunistas, decorrentes de queimaduras.

COBAIAS Estabelecida a hipótese, a mesma foi testada em ratos de laboratório. Os animais foram lesados com queimaduras e, sobre o local da ferida, foi aplicada uma pomada, preparada com as sementes de jaca, contendo a lectina KM+. Para gáudio dos cientistas, o tratamento foi tão eficiente que ocasionava uma recuperação antes que houvesse uma infecção do tecido. Verificou-se que a pomada acelerava a regeneração do tecido queimado, evitando a necrose. Aprofundando as pesquisas, os cientistas descobriram que a lectina KM+ induz maior multiplicação celular, assim como aumenta

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a produção de colágeno e estimula a formação de novos vasos sangüíneos, permitindo a irrigação do local afetado pela lesão.

BÔNUS A natureza mostrou ser, mais uma vez, a grande fonte de inspiração da Ciência. Os testes foram repetidos inúmeras vezes, variando a intensidade das queimaduras provocadas nos ratos, com lesões de diferentes extensões e profundidades. Ao final, a pomada de jaca, contendo a lectina KM+, apresentou resultados 80% superiores aos obtidos na sua ausência. Os cientistas também foram agraciados com outra descoberta importante: ao contrário do processo natural de cicatrização, que recompõe a parte lesionada com células de tecido conjuntivo, a regeneração ocorre por multiplicação das células sadias do tecido remanescente no entorno das lesões, evitando o risco de surgimento de quelóides.

LARGA ESCALA A primeira etapa da pesquisa está concluída, tendo sido comprovada a utilidade terapêutica de uma substância presente na semente da jaca. O próximo desafio é obter o produto em lar-

ga escala. A jaca não é uma fruta com cadeia produtiva organizada, que permita a garantia de oferta do produto ao longo do tempo. Para resolver o problema, os cientistas do laboratório de Biologia Molecular de Plantas da USP identificaram o gene da jaca responsável pela lectina. Essa etapa já foi superada, e o gene foi introduzido em uma bactéria, inócua aos seres vivos, e de reprodução fácil e barata em laboratório. Assim, a bactéria passa a ser uma usina viva para produção do medicamento. Os estudos com a bactéria transgênica, que virou uma biofábrica de remédio, já iniciaram. Os testes prosseguem, usando a substância, agora obtida da bactéria, inicialmente em ratos. Posteriormente, serão utilizados voluntários humanos, para comprovar o efeito medicamentoso observado nos ratos. Finalmente, se todas as pesquisas, inclusive de biossegurança, forem bem sucedidas, a tecnologia poderá ser adotada em larga escala, permitindo à sociedade auferir os benefícios de mais uma C descoberta derivada da biotecnologia. Décio Luiz Gazzoni Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja www.gazzoni.pop.com.br

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Mercado Agrícola

Brandalizze Consulting

brandalizze@uol.com.br

Safra fechando com perdas de 20 milhões de t A safra de verão, que concentra a maior parte da produção brasileira, está fechando a colheita, com todas as lavouras da soja, do algodão, do arroz, cerca de 80% da safra do milho e cerca de 70% da safra do feijão. Ficam somente as lavouras de inverno e safrinha para os próximos meses. Neste ano, chegou-se a indicar que a colheita totalizaria 132 milhões de t, mas, agora, os números, segundo a Conab, estão ao redor das 113,7 milhões de t, e ainda há parte da produção que não se definiu. Desta forma, os números poderão ainda ser menores, com perdas de cerca de 20 milhões de t, que certamente farão falta para os produtores. Eles terão como obrigação, neste ano, comercializar bem, para aproveitar os mínimos detalhes e amenizar as perdas causadas pelo clima e, agora, principalmente, pelo mercado, onde se mostra fraqueza no lado do arroz. Também, há pouco espaço de crescimento nos produtos de exportação, porque o governo não está fazendo esforço, para que o câmbio melhore. Desta forma, o ritmo dos embarques está caindo, e os produtores seguram o máximo que podem, para tentar números mais atraentes no segundo semestre. Temos visto alguns comentários de analistas, pregando um quadro caótico para o setor agrícola, os quais denominamos de mensageiros do caos. Os produtores não merecem ouvir estas preces que projetam catástrofes. Não concordamos com os mensageiros do caos, porque acreditamos que o fundo do poço passou em maio, e o quadro geral tende a dar sinais positivos nos próximos meses. MILHO Safrinha chegando O mercado do milho passou por um período de estabilidade em maio, e, agora, em junho, veremos as primeiras lavouras da safrinha entrando em colheita. Junto a isso, não podemos nos assustar, se ocorrer alguma pequena queda nos indicativos no período de colheita. O que interessa aos produtores, neste momento, é a cotação que o cereal terá nos próximos meses, e o que temos que apontar é que certamente haverá grande pressão dos compradores. Veremos um ágio pago acima do valor da liquidação do milho argentino, porque o milho nacional terá melhor aceitação. Assim, comenta-se que poderemos ver os indicativos do produto brasileiro chegando às indústrias até 10% acima do valor do importado, que, neste momento, está liquidando ao redor dos US$ 8,50 por saca CIF na base dos portos brasileiros. Conseqüentemente, os valores, no interior, para a safrinha e para o que resta da safra de verão, fecharão em cima deste valor, somados o ágio, e descontados custos comerciais e logística, projetando boas expectativas para o cereal nos próximos meses. SOJA Dólar limita vendas dos produtores O mercado da soja esteve pressionado pelo câmbio, que foi ao fundo do poço no mês passado, circulando ao redor dos R$ 2,40 e, assim, limitando o volume de negócios com a soja dos produtores que não apareciam para fixar balcão. As indústrias continuam apontando que há muita soja ainda para ser recebida até junho e, assim, não estão forçando compras de soja livre dos produtores, para não pressionar as cotações para cima. Desta forma, os indicativos praticados no balcão estiveram baixos, e poucos negócios foram realizados. A expectativa é de que em junho tenhamos algumas alterações positivas, mas com altos e baixos no período, que será capitaneado pelo clima nas lavouras americanas que já estão plantadas e, agora, dependem de boas condições climáticas. Lembrando que poderemos ter uma boa notícia, se a ferrugem se espalhar pelo cinturão da soja nos EUA no período vegetativo das lavouras.

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FEIJÃO Segue firme e com poucos vendedores Os negócios com o feijão ficaram restritos a poucos volumes. Os produtores estão recebendo cotações entre R$ 85,00 e R$ 105,00 por saca, sendo que o produto de ponta esteve acima dos R$ 90,00. Os indicativos de preços deverão continuar firmes nos próximos meses, porque há pouco feijão nos campos, e a demanda seguirá favorável aos produtores. O feijão segue como destaque do setor agrícola, com a melhor rentabilidade neste ano, chegando a mostrar uma relação de troca com a soja de quatro para um, quando normalmente essa relação gira entre duas a três sacas de soja para uma de feijão. O feijão segue firme, e os produtores formando as cotações. ARROZ Dependendo do governo O mercado do arroz teve uma boa safra do ce-

real neste ano, com os números finais da Conab indicando 13,2 milhões de t contra o consumo de 12,8 milhões, e ainda temos grandes importações do Mercosul. Desta forma, com estoques entre 2 e 3 milhões de t, o arroz segue como o patinho feio do setor agrícola neste ano, porque apresentou as maiores baixas. Outro problema enfrentado pelo setor do sequeiro vem da reclassificação da variedade Cirad, que derrubou as cotações deste para a casa dos R$ 10,00 por saca e até dos R$ 9,00, nas regiões distantes do MT. Assim, o que seria uma boa notícia para o irrigado transformou-se em mais um problema, porque os preços muito baixos deste serviram de apoio, para derrubar ainda mais as cotações de todo o setor. A boa noticia do mês é que a demanda de varejo cresceu 20% entre abril e maio. Os leilões de Opções das indústrias não conseguiram segurar as cotações e frustraram os produtores. No momento, a melhor saída será o governo garantir o Preço Mínimo.

CURTAS E BOAS SOJA - O USDA baixou a estimativa de safra do Brasil para 52 milhões de t e também derrubou os estoques mundiais para 51,1 milhões de t. Assim, nos próximos meses, poderemos ver os estoques finais ficarem abaixo das 48 milhões de t, mesmo assim grandes, sinalizando para um ano calmo e dependente de quebra nos EUA. ALGODÃO I - O câmbio continua sendo o pior problema para os produtores neste ano. Enquanto isso, a Conab divulgou seu novo relatório da safra e aponta a produção total deste ano em 1,38 milhões t, sendo a maior colhida nos últimos oito anos, segundo dados divulgados pelo Governo. Mesmo com uma supersafra, segue a estimativa de que teremos 60 mil t importadas, e, junto com os estoques de entrada próximos a 240 mil t, ficaremos com mais ou menos 1,68 milhões de t ofertadas, com consumo de 920 mil t. ALGODÃO II - Assim, dependentes da exportação, seguimos com o gargalo no câmbio baixo, onde se projetam exportar 370 mil t, valor que poderia ser o dobro, se tivéssemos o dólar mais atrativo, resolvendo todos os problemas que o setor enfrenta no momento. TRIGO I - As indústrias compraram forte na Argentina entre abril e maio, formando estoque com câmbio baixo, para compensar as altas cotações do dólar e a baixa disponibilidade de trigo. A Argentina deverá exportar 10,5 milhões de t neste ano, das quais 8,7 milhões de t já estavam vendidas no começo de maio, com o Brasil sendo o maior comprador, já foram fechadas 2,7 milhões de t, contra as 2,6 milhões do mesmo período de 2004. TRIGO II - Os produtores estão realizando plantio e apostando em ganhos, porque o mercado internacional está com poucas ofertas. A China segue como destaque internacional do trigo, porque antes não comprava nada. Os chineses levaram 7 milhões de t em 2004, com indicações de que já tenham comprado 4 milhões de t em 2005, deixando o mercado mundial firme.

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