Cultivar 90

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Cultivar Grandes Culturas • Ano VIII • Nº 90 • Outubro 2006 • ISSN - 1518-3157

Nossa capa

Destaques

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Capa / Servspray

Praga nefasta O monitoramento antes do plantio é tarefa importante contra o ataque do bicudo em lavouras de algodão

11 Cortadeira de lucros Os desafios para barrar os prejuízos causados por formigas em cana-de-açúcar em São Paulo

Nossos cadernos

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Fotos de Capa

Residual relativo

Flávio Martins G. Blanco

Os fatores que interferem no desempenho residual dos fungicidas em campo

Charles Echer

26 Daninhas barradas Operações de manejo de solo no combate às invasoras na cultura do arroz

NOSSOS TELEFONES: (53) Grupo Cultivar AO de ASSINANTE: Publicações Ltda. • ATENDIMENTO Rua:3028.4013/3028.4015 Nilo Peçanha, 212 Pelotas –• RS 96055 – 410 ASSINATURAS: 3028.4010/3028.4011 • GERAL www.cultivar.inf.br 3028.4013 cultivar@cultivar.inf.br • REDAÇÃO:

3028.4002 / 3028.4003 • MARKETING:

3028.4004 / 3028.4005 • FAX:

3028.4001 Assinatura anual (11 edições*): R$ 119,00 (*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan)

Índice Diretas

REDAÇÃO • Editor

Gilvan Dutra Quevedo • Coordenador de Redação

Janice Ebel • Design Gráfico e Diagramação

Cristiano Ceia

06 • Revisão

Silvia Pinto

Controle do bicudo em algodão

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Assinatura Internacional: US$ 80,00 70,00

Controle de formigas em cana

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Nossos Telefones: (53)

Nematicida em cana soca

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Sedeli Feijó Silvia Primeira

Importância do efeito residual de fungicidas 18

CIRCULAÇÃO

Números atrasados: R$ 15,00

Pedro Batistin

• Geral 3028.2000 • Assinaturas: 3028.2070 • Redação: 3028.2060 • Comercial: 3028.2065 / 3028.2066 / 3028.2067

COMERCIAL

Micronutrientes no metabolismo da soja

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Produquímica - fixadores de nitrogênio

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• Gerente

Cibele Oliveira da Costa • Assinaturas

Simone Lopes Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: cultivar@cultivar.inf.br Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.

Plantas daninhas em arroz

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• Gerente de Assinaturas Externas

Raquel Marcos

Café orgânico

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• Expedição

Dianferson Alves

Coluna Agronegócios

33 • Impressão

Mercado Agrícola

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Kunde Indústrias Gráficas Ltda.




Diretas

Destaque

Cursos

Laborsan

A Agroconsult, empresa especializada em análise dos mercados agropecuários, é a responsável pela realização do “Rally da Safra - Uma viagem ao Brasil que Produz”, expedição que analisa as condições da safra brasileira de grãos em 14 estados. Como coordenador da equipe está o sócio-diretor, André Pessoa, engenheiro agrônomo e economista escolhido no ano passado como “Profissional do Ano do AgroneAndré Pessoa gócio”, pela ABM&R.

De 6 a 10 de novembro ocorre a 5ª Semana de Ciências Agrárias e Veterinárias (SECAV), do Centro Universitário Moura Lacerda, em Ribeirão Preto (SP). O evento tem o objetivo de oferecer cursos de alto nível voltados para a agronomia, zootecnia e medicina veterinária, destinados a estudantes, técnicos agrícolas, engenheiros agrônomos, médicos veterinários, agricultores e demais interessados. Inscrições e informações pelo email: posgraduacao@mouralacerda. com.br ou aspinn@uol.com.br

A Laborsan marcou presença no XXVI Congresso Nacional de Milho e Sorgo em Belo Horizonte (MG). A empresa apresentou resultados de pesquisa na utilização de concentrados à base de polímeros.No estande da Laborsan, o s congressistas foram recepcionados pela equipe técnico-comecial, com informações de todo o portifólio, além de acompanhar o lançamento de maNo nononono teriais.

ProjetoTalstar A FMC percorre mais de 12 mil quilômetros no Cerrado e no Sul do país, para divulgar e levar informações sobre pragas da cultura da soja e também sobre o inseticida Talstar 100 EC. Para isso são usadas três caminhonetes totalmente equipadas para os treinamentos técnicos, nas mais de 40 cidades visitadas no período de quarenta dias. A programação contempla informações sobre nível de controle, amostragem, momento de aplicação, morfologia e identificação das pragas e principais danos na lavoura.

Gente nova Paulo Queiroz é o mais novo integrante da equipe de trabalho da FMC. Queiroz assumiu a gerência de marketing herbicidas e fungicidas da empresa em lugar de Luiz Carlos Micelli, que atua como gerente comercial regiPaulo Queiroz onal Nordeste.

Resultados de pesquisa Mauro Alberton, gerente de tratamento de sementes da Bayer CropScience, apresentou, na XXVIII Reunião de Pesquisa de Soja da Região Central, os resultados de pesquisas realizadas com novas opções de produtos fungicidas da empresa para o manejo da ferrugem asiática no Brasil.

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Mauro Alberton

Lançamento A Embrapa Arroz e Feijão apresenta aos produtores de feijão de grão preto nos estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Tocantins e Goiás, além do Distrito Federal, a nova cultivar BRS Supremo. A variedade tem como características comerciais o potencial produtivo, o porte ereto de planta e a resistência às principais doenças e ao acamamento.

Sementes A Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Passo Fundo (RS), juntamente com a Embrapa Trigo, a Fundação Pró-sementes e a Apassul, promovem o 9° Simpósio Brasileiro de Patologia de Sementes (9º SBPS). O simpósio ocorre de 23 a 27 de outubro de 2006. Inscrições na página: www.upf.br.

Calçado biconfortável A Bracol traz para sua linha de produtos o primeiro calçado biconfortável para trabalhadores da indústria sucroalcooleira. A nova Linha Bracol Flex, produzida em couro, oferece ao cortador de cana maior conforto e proteção para os pés, garantindo resistência ao impacto, à flexão contínua e a materiais perfurocortantes, maior cobertura da região metatarsiana e também resistência à hidrólise. Informações: www.bracolonline.com.br

Controle de pragas Alexandre de Sene Pinto lança o livro “Controle de Pragas da Cana-de-Açúcar”, que aborda assuntos relacionados ao controle biológico de pragas de ocorrência nacional e da América Latina. O conteúdo da obra conta com a larga experiência e conhecimento de renomados pesquisadores e técnicos de reconhecidas instituições e universidades brasileiras. Para adquirir: www.livroceres.com.br.

Certificação do Algodão A Bayer CropScience traz aos produtores brasileiros uma ferramenta que proporcionará vantagens competitivas e mais rentabilidade com a produção das plumas de algodão. A empresa acaba de lançar a Certificação FiberMax, sistema diferenciado que identificará a fibra proveniente da semente original FiberMax. O objetivo é aumentar a entrada no mercado, da fibra produzida no país, Premium internacional (algodão de alta qualidade), possibilitando melhor oferta pelo produto brasileiro.

Produção de baculovírus

Nova chefia

Projeto do pesquisador Fernando Hercos Valicente, da Embrapa Milho e Sorgo Sete Lagoas (MG), busca a produção comercial do baculovírus, inseticida biológico altamente eficiente contra a lagarta-do-cartucho, a Spodoptera frugiperda, praga em lavouras. A Embrapa deve gerar o inseticida em pó, em escala comercial, possível de ser usado por qualquer agricultor. “Nosso objetivo é oferecer um produto final eficiente e acessível aos produtores”, explica Valicente. As próximas etapas são o desenvolvimento de formulações para o baculovírus, a definição da estabilidade genética do material e o estudo de formulações mais proFernando Valicente missoras.

A Embrapa Milho e Sorgo Sete Lagoas(MG) tem nova direção. Em agosto, assumiu a chefia-geral da unidade a pesquisadora Vera Alves, que desde a década de 80 se dedica principalmente à pesquisas sobre adaptação de plantas a solos ácidos, tolerância ao alumínio, eficiência nutricional e mecanismos de adaptação. Junto com ela, assumiram como chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento, Antônio Álvaro Corsetti Purcino, chefe-adjunto de Comunicação e Negócios, Derli Prudente Santana e chefe-adjunta de Administração, Isabel Regina PraVera Alves zeres de Souza.

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Fotos Paulina de Araújo Ribeiro

Algodão

Sobrevivência nefasta Além Além da da grande grande capacidade capacidade de de dispersão, dispersão, oo bicudo bicudo desenvolve desenvolve estratégias estratégias para para permanecer nas lavouras de algodão durante a entressafra, à espera de de novo novo cultivo. cultivo. Por Por isso, isso, oo monitoramento monitoramento antes antes do do plantio plantio éé tarefa indispensável indispensável para para minimizar minimizar os os prejuízos prejuízos causados causados pela pela praga praga

O

bicudo-do-algodoeiro, Anthonomus grandis Boheman (Coleoptera.: Curculionidae), é considerado a praga que causa anualmente os mais sérios danos a essa lavoura, em virtude da sua alta capacidade reprodutiva, do elevado poder destrutivo das estruturas reprodutivas, além dos danos causados ao produto final destinado à comercialização, reduzindo diretamente a produção de algodão. Desde a introdução do bicudo no Brasil, em 1983, várias práticas culturais e de manejo da praga têm sido efetuadas e aperfeiçoadas, visando o controle eficiente do inseto, para minimizar os prejuízos causados à cultura do algodoeiro. No entanto, produzir algodão sem resíduos tóxicos e de baixo custo é o grande desafio de toda a cadeia produtiva. A atual situação exige que os cotonicultores tenham um alto nível de conhecimento, pois grande parte do sucesso da lavoura de algodão depende do grau de eficiência no controle das pragas, aliado à preservação do

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meio ambiente.

SOBREVIVÊNCIA DO BICUDO Com as crescentes aplicações de inse-

ticidas no combate ao bicudo, no período da safra do algodão, e possivelmente devido à adaptação do inseto às condições brasileiras, desde a sua introdução, essa praga

Rebrota de algodão com soqueira não destruída após a colheita, tornando-se local excelente para a sobrevivência do bicudo

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HÁBITOS DO INSETO

O

s adultos do bicudo que entram na lavoura de algodão atacam inicialmente os botões florais, que passam a apresentar perfurações externas, brácteas abertas e um excremento de cor amarela. As maçãs, assim como os botões florais, também apresentam perfurações externas, decorrentes da alimentação e da oviposição do inseto. Após o período de incubação dos ovos, as larvas passam a se alimentar no interior dos botões florais e maçãs, destruindo as fibras e as sementes. Durante esse período as larvas ficam protegidas da ação de inseticidas, o que dificulta ainda mais o controle da praga. Depois do ataque larapresenta algumas estratégias de sobrevivência que lhe permitem atravessar a entressafra da cultura, aguardando um novo plantio. Foi realizado um estudo, no campo experimental do Centro Nacional de Pesquisa de Hortaliças, localizado a 50 km de Brasília (DF), no período da safra do algodão em 2005, para a determinação da preferência de ataque do bicudo às estruturas reprodutivas do algodoeiro (botões florais e maçãs) durante o ciclo da cultura. Essa área se encontra a distâncias superiores a 70 km das áreas de plantio de algodão na região, mas foi colonizada pelo bicudo desde o primeiro ano de plantio, na safra de 2005, demonstrando a grande capacidade de dispersão e colonização de novas áreas, antes isoladas do inseto. Foram amostrados um total de 843 botões e 96 maçãs em abril, 951 botões e 167 maçãs em maio e 143 botões e 91 maçãs em junho. O bicudo atacou preferencialmente botões florais em abril (38,9%) e maio (43,2%). No entanto, esse padrão de ataque mudou em junho, quando somente 4,9% dos botões florais foram atacados, mesmo em maior número do que as maçãs nas amostras. De forma inversa, o ataque nas maçãs cresceu de 1,0% em abril para 19,2% e 45,1% em maio e junho, respectivamente. Essa troca no padrão de preferência do bicudo pelas estruturas atacadas pode refletir uma estratégia de distribuição de risco em relação à sobrevivência durante a entressafra. Constatou-se que os insetos que se desenvolvem nos botões florais obrigatoriamente deixam a estrutura quando atingem a fase adulta, enquanto que aqueles que se desenvolvem nas maçãs podem atravessar ali o período de entressafra da cultura do algodão - fato verificado pela

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val o botão floral cai ao solo, e a larva continua seu desenvolvimento por cerca de 10-11 dias até a emergência do adulto, que tem seu tamanho influenciado pela quantidade e/ou qualidade de alimento ingerido no estágio larval. Quando há o ataque de botões florais e frutos (maçãs) pelo adulto do bicudo e/ ou pelas suas larvas, as estruturas atacadas não produzem flores, e os frutos não se abrem normalmente, comprometendo toda a produção. Freqüentemente, quando as lavouras são severamente atacadas pelo inseto, não há qualquer capulho aproveitável na metade ou no terço superior da planta. coleta de maçãs (carimãs) das plantas de algodão em fase de colheita, com a constatação de que 90% das estruturas apresentavam, em seu interior, adultos de bicudo vivos. Esses resultados demonstram a importância da destruição dos restos culturais na redução das populações de bicudo ao final da safra de algodão. Estudos anteriores demonstraram que adultos do bicudo não sobrevivem quando maçãs são incorporadas ao solo entre cinco e 15 cm de profundidade, mostrando que, mesmo quando os restos não são queimados e sim incorporados, podem causar elevada mortalidade. Adultos que emergem de botões florais tendem a deixar a área do algodoeiro

quando esse é perturbado com as práticas relacionadas à colheita. A compreensão dos processos de dispersão e escolha de local para refúgio do inseto está sendo o foco da pesquisa, para que uma estratégia mais ampla de controle das populações na entressafra possa ser proposta. O bicudo apresentou uma mudança no padrão de preferência, passando dos botões florais para as maçãs no final do ciclo da cultura de algodão, possivelmente, como uma estratégia de sobrevivência na entressafra. Assim, o conhecimento dessa estratégia é fundamental para a tomada de decisão para o manejo integrado dessa praga no Cerrado do Brasil Central.

MONITORAMENTO E CONTROLE Os programas de controle dessa praga, na região Centro-Oeste, vêm utilizando em larga escala armadilhas com feromônio para captura do adulto do bicudo para monitoramento de suas populações. Esse monitoramento é feito 60 dias antes do período que antecede a semeadura do algodão, nas margens da nova cultura. Estudos demonstram que as armadilhas com feromônio apresentam alta sensibilidade na detecção do inseto e possibilitam que populações muito baixas sejam detectadas e suprimidas, tanto na safra como nos períodos de pós-colheita. Esse método permite ainda determinar a entrada da praga nas lavouras e monitorar o seu nível populacional, subsidiando a decisão de aplicação de métodos de controle e evitando o aumento e a dispersão das populações locais

Detalhe da presença do inseto adulto de bicudo Anthonomus grandis dentro da maçã de algodão seca

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O

agronegócio da cultura do algodão no Brasil cresce anualmente em busca de produtividade e qualidade, alcançando cifras que variaram nos últimos cinco anos de aproximadamente US$ 154 milhões a US$ 449 milhões em exportações, segundo dados do Departamento de Operações de Comércio Exterior - Decex, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Na região Centro-Oeste, a cultura do algodoeiro teve uma expressiva expansão após a década de 90. Atualmente essa região responde por mais de 80% da produção nacional, devido, principaldo inseto. Além do uso de armadilhas, outros métodos são adotados, para minimizar o ataque do bicudo, como: destruição de soqueira do algodão no final da safra; destruição de rebrotas e tigüeras; aplicações de inseticidas nas bordaduras após a chegada do bicudo à lavoura; monitoramento do número de bicudos dentro da área de algodão; culturas de ciclos curtos e realização do plantio no período compreendido entre 20 de novembro e 20 de janeiro. No entanto, nem todos os cotonicultores têm seguido essas recomendações logo após a colheita, principalmente em relação à destruição de soqueira, que, conseqüentemente, permite a rebrota das plantas e a permanência do bicudo no campo, multiplicando-se nas novas estruturas reprodutivas. Essa atitude tem elevado consideravelmente o ataque do bicudo a cada ano. Com isso, aumenta a necessidade de aplicação de inseticidas a partir de meados de fevereiro até o final do ciclo da cultura de algodão. Mesmo produtores que usam alta tecnologia em seus plantios, como aqueles nos cerrados da região Centro-Oeste, algumas

mente, às condições favoráveis de clima e de terras planas, que permitem a mecanização da lavoura, aos programas de incentivo à cultura e também ao uso de um sistema de cultivo altamente tecnificado, com utilização intensiva de insumos agrícolas. Entretanto, o custo médio de produção ainda é relativamente alto, decorrente dos altos custos dos defensivos agrícolas no combate de insetos-praga, particularmente do bicudo. Os custos para o manejo de pragas podem chegar a R$ 1,5 mil por hectare, sendo que apenas o monitoramento e o controle do bicudo ficam em torno de R$ 500 por hectare. vezes, deixam de realizar práticas culturais importantes, possivelmente, devido ao quadro econômico adverso que o agronegócio atravessa. No entanto, a falta desses cuidados somente leva a um aumento do problema, não apenas em sua propriedade como nas vizinhas, agravando os custos de controle da praga no próximo ano e aumentando a contaminação ambiental por agrotóxicos na região. Em estudos realizados nos Estados Unidos, com a finalidade de erradicação do bicudo, foi constatado que o manejo total da população em uma ampla região geográfica pode ser uma excelente alternativa de estratégia de manejo da praga. No Brasil, o manejo total em todas as áreas produtoras de algodão poderia também ser sugerido, uma vez que o inseto apresenta um alto poder de dispersão, podendo colonizar outras áreas, até mesmo distante das áreas de algodão, se não houver um manejo adequado. Assim, há necessidade de se trabalhar para reduzir os níveis de infestação iniciais da praga, o tempo de sua permanência nas lavouras de algodão e, conseqüentemente,

Fotos Paulina de Araújo Ribeiro

NÚMEROS DO ALGODÃO

Com a manutenção das soqueiras na lavoura, as aplicações de inseticidas tornam-se cada vez mais intensas de fevereiro até o final do ciclo da cultura

a quantidade de inseticidas químicos utilizados. Devem-se adotar as práticas de manejo integrado de pragas, permitindo a continuação e a viabilidade da cultura e a redução do uso de inseticidas químicos de largo espectro, resultando na diminuição dos custos de produção, na conservação mais efetiva de inimigos naturais das pragas da cultura do algodoeiro, na diminuição do potencial de contaminação do solo, da água e das pessoas que têm contato direto ou indiC reto com os defensivos agrícolas. Paulina de Araújo Ribeiro e Ivone Rezende Diniz, UNB Edison Ryoiti Sujii e Eliana Maria Gouveia Fontes, Cenargem

Figura 4 - Total de estruturas reprodutivas analisadas na cultura do algodão no Figura 5 - Porcentagem de ataque do bicudo às estruturas reprodutivas do algodão Distrito Federal, safra de 2005. Bt = botões florais e Mc = maçãs na safra de 2005, no Distrito Federal. Bt = botões florais e Mc = maçãs

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Cana-de-açúcar

Cortadeira de lucros Prejuízo anual causado por formigas em lavouras canavieiras de São Paulo chega a cinco toneladas por sauveiro. Pesquisadores apontam estratégias para enfrentar o ataque da praga

N

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mica, pois causam danos de maior vulto. O corte contínuo de folhas interfere no desenvolvimento da planta, provocando perdas agrícolas consideráveis em suas áreas de forrageamento. Nesse contexto, as formigas cortadeiras assumem grande importância econômica em virtude das grandes extensões ocupadas pelas lavouras canavieiras e da

utilização de áreas onde não se adotam métodos eficientes de controle, especialmente nas proximidades de pastagens e de áreas de reservas onde elas não são sistematicamente combatidas, encontrando aí locais seguros para se multiplicarem e migrarem para as lavouras comerciais de cana. Em São Paulo, as formigas cortadeiras de maior importância pertencem ao gêne-

Fotos Divulgação

as últimas décadas houve grande incentivo à cultura da cana-de-açúcar, que rapidamente se expandiu, mantendo o Brasil como líder mundial na produção dessa cultura e de seus derivados. Em 2005, a cana-de-açúcar ocupava uma área superior a 5,7 milhões de hectares, dos quais 2,9 milhões (52%) só no estado de São Paulo. Nos próximos anos, os mercados do açúcar e do álcool serão norteados pela crescente demanda, especialmente de álcool combustível. O álcool refletirá o provável aumento dos preços do petróleo, que determinará a oferta e, conseqüentemente, os preços do açúcar. No entanto, apesar de todos os prognósticos, e como ocorre com as culturas de importância econômica, a cana-de-açúcar é atacada por inúmeras pragas, destacando-se, dentre estas, as formigas. Sob a denominação de formigas cortadeiras, classificam-se diversas espécies pertencentes aos gêneros Atta e Acromyrmex, conhecidas como saúvas e quenquéns, respectivamente. As primeiras, no geral, são consideradas de maior importância econô-

Detalhe: Içá - fêmea sexuada responsável pela multiplicação e povoamento do sauveiro

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DIFERENCIANDO AS ESPÉCIES

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s saúvas e quenquéns podem ser diferenciadas por várias características, dentre elas: estrutura externa dos ninhos, que nos de saúvas, quando adultos, são grandes e com monte de terra solta aparente e, nos de quenquéns, geralmente, pequenos e na maioria das espécies sem terra solta aparente. As formigas do gênero Atta se caracterizam por possuírem três pares de espinhos no dorso do tórax, superfície dorsal do gáster lisa, sem tubérculos, e carenas frontais separadas e soldados maiores (12 a 15 mm); as formigas do gênero Acromyrmex possuem operárias com quatro ou cinco pares de espinhos no dorso do tórax e soldados menores (8 a 10 mm). As saúvas estão presentes em todo o território americano, desde o Sul dos Estados Unidos até o centro da Argentina, não ocorrendo no Chile, no Canadá e nas Antilhas. Sua distribuição está relacionada às condições climáticas e es-

agrícola, que variam de três a cinco toneladas de cana por sauveiro ao ano, e na redução de até 30% no teor de sacarose da cana colhida na área de forrageamento. Outro importante fator a ser considerado é o aumento de áreas de cana-de-açú-

Fotos Divulgação

ro Atta, sendo as espécies A. bisphaerica, saúva mata-pasto, e A. capiguara, saúva parda, as mais freqüentes e que causam danos mais expressivos. A presença dessa praga no agroecossistema da cana-de-açúcar resulta em perdas na produtividade

pécies de plantas. Seu ataque ocorre ao longo do ano, e, ao contrário do que muitos pensam, sua principal fonte de alimento não são as folhas que cortam, mas sim um fungo que cultivam dentro de seus ninhos, vivendo em simbiose com o mesmo. Esse fungo é alimentado pelos pedaços do material vegetal que são levados até o formigueiro. Os danos e prejuízos causados, principalmente em plantas novas, são imensos, pois um sauveiro pode consumir algumas toneladas de folhas/ano. A saúva mata-pasto, A. bisphaerica, juntamente com a saúva parda, A. capiguara, são pragas exclusivas do Brasil e destacam-se das demais por estarem presentes na maioria dos canaviais. A saúva cabeça-de-vidro, A. laevigata, e a saúva limão, A. sexdens, são de ocorrência mais esporádica em cana-de-açúcar, pois só se alimentam nessa cultura na ausência de plantas de folhas largas, dicotiledôneas.

Após a revoada as fêmeas fecundadas iniciam um novo formigueiro, cavando uma panela e regurgitando o fungo que trouxe da colônia original

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car colhidas mecanicamente e da crescente proibição da queima para o corte, com mudanças no manejo da cultura. Como conseqüência, em muitas regiões, observase o aumento na população dessas formigas, pelo aumento na dificuldade para controlá-las. De modo geral, as formigas são menos afetadas devido à sua capacidade de construir ninhos protegidos do intenso calor e à sua organização social que as adaptam ao rápido restabelecimento da atividade forrageadora. A busca por alimento pelas formigas é rítmica, na maioria das vezes noturna, modificando-se em razão de mudanças ambientais e da demanda da colônia. Assim, o aumento da atividade forrageadora poderá incrementar o dano causado pela praga.

CONTROLE E MANEJO Por causarem perdas expressivas, extensos programas de controle têm sido desenvolvidos pelos produtores de cana-de-açúcar, para evitar que os prejuízos se acumulem ao longo do ciclo da cultura. Apesar da necessidade de se desenvolverem métodos alternativos para uso em lavouras orgânicas e dos esforços da pesquisa nesse sentido, o controle de formigas cortadeiras em cana-de-açúcar tem sido realizado, predominantemente, por meio de métodos químicos, destacando-se o emprego de iscas granuladas, termonebulização e inseticida líquido. Diversos fatores devem ser ponderados no processo de seleção do método de controle, especialmente a eficiência que ele proporciona, já que as despesas com mão-de-obra correspondem a, aproximadamente, 60% do custo total dessa operação. Antigamente, o controle de formigas cortadeiras na cultura da cana-de-açúcar baseava-se na aplicação de inseticidas em pó, que eram insuflados no interior dos ninhos através de aplicadores manuais, oferecendo riscos à saúde do aplicador e ao meio ambiente, além de baixa eficiência de controle. Esse método foi utilizado até 1985, quando o Ministério da Agricultura, através da portaria 329, proibiu o uso agrícola de inseticidas clorados. As iscas granuladas surgiram em 1960, sendo que as formuladas à base de dodecacloro, óleo de soja e polpa cítrica como atraentes surgiram em 1967. Essas iscas foram muito utilizadas sob inúmeras denominações comerciais até 1993, quando o uso desse produto foi proibido no Brasil em razão da alta solubilidade em lipídios, da alta persistência no meio ambiente e de efeitos mutagênicos, teratogênicos e carcinogênicos a longo prazo. Durante esse período, foram avaliados inúmeros princípios ati-

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O corte contínuo das folhas interfere no desenvolvimento da planta e principalmente no teor de sacarose produzido

As formigas do gênero Atta se caracterizam por possuírem três pares de espinhos no dorso do tórax e também por apresentarem soldados maiores

vos em substituição ao dodecacloro na formulação das iscas, sendo os mais utilizados sulfluramida, clorpirifós e, mais recentemente, fipronil. Esse método proporciona elevado rendimento operacional e segurança ao aplicador e não requer equipamentos para a sua aplicação. Porém, em termos de eficiência, não tem apresentado resultados satisfatórios na cultura da canade-açúcar, provavelmente porque as espécies de saúvas que ocorrem com maior freqüência nos canaviais têm preferência por forragear gramíneas, não sendo muito atraídas pelas substâncias que compõem as iscas. Além disso, estas sofrem limitações quanto à sua utilização em épocas úmidas. Embora seja uma técnica antiga, a termonebulização na lavoura canavieira teve início em 1986. Trata-se de um método eficiente de controle em razão da rápida interrupção dos danos ocasionados pela praga. Encontra limitações em função do custo do equipamento, da necessidade de inseticidas formulados para esse uso, dos riscos com incêndios e de intoxicação dos operadores do equipamento, além de o uso do equipamento ser recomendado com melhores resultados após o corte do canavial, quando o sauveiro e seus olheiros são mais facilmente localizados. A colheita da cana sem queima constitui um fator que dificulta ainda mais esse método de controle, por tornar mais difícil a localização dos olheiros e serem maiores os riscos de incêndios. Requer a utilização de equipamentos especiais e mão-de-obra qualificada para aplicação e manutenção dos mesmos. Em contrapartida, proporciona elevado rendimento operacional e excelentes resultados no controle de formigas cortadeiras de qualquer gênero ou espécie. No método de controle de formigas cortadeiras através da termonebulização, o inseticida diluído em um veículo de aplicação é nebulizado, formando gotículas de dez a 30 micras, originando uma espessa névoa que, além de ficar em suspensão no

ambiente tratado por um longo período, possui excelente poder de penetração em canais e câmaras. A nebulização da mistura no estado líquido ocorre através da transferência de energia cinética e térmica dos gases de escape, gerados na combustão da gasolina em um motor de combustão interna ou em sistema pulso-jato. Não há riscos de degradação do inseticida, pois este não chega a ser queimado, devido à velocidade de expansão da mistura. O produto mais indicado no controle de formigas cortadeiras, independente do

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veículo de aplicação, é clorpirifós etil fogging. Além deste, que é o mais eficiente, são registrados para esse uso os inseticidas permetrina, deltametrina e fenitrotion. Esse controle é realizado sistematicamente após cada corte, preferencialmente antes da reforma, conseqüentemente, antes do plantio, ou do cultivo da área. No método com uso de inseticida líquido, o ingrediente ativo com maior eficiência é o fipronil, aplicado diluído, especialmente nos olheiros de alimentação do sauveiro. Tem alta eficiência de controle, mas só deve ser usado em sauveiros com atividade, pois sua ação explora o hábito de trofolaxia (um indivíduo alimentar o outro) entre as formigas cortadeiras. Sua principal limitação reside na dificuldade para aquisição do inseticida no mercado, uma vez que há restrição de uso pelo fato de o produto não estar registrado especifiC camente para esse tipo de uso. Eliane Grisoto, José Francisco Garcia e Luciano Pacelli M. Macedo, Esalq/USP Paulo S. M. Botelho, UFSCar

REPRODUÇÃO DAS FORMIGAS

Q

uando o formigueiro se torna adulto, mais ou menos com 38 meses de idade, ocorre o aparecimento de indivíduos alados, comumente denominados bitus (machos) e içãs (fêmeas). Esses indivíduos serão os responsáveis pela multiplicação e propagação de novos formigueiros, que realizarão a cópula durante um evento chamado revoada, que ocorre uma vez por ano, na região Sudeste, logo após as primeiras chuvas (setembro/outubro). Antes de ocorrer a revoada, as operárias alargam os olheiros, que serão os locais por onde os indivíduos alados irão sair para o acasalamento. As fêmeas, durante o vôo nupcial, podem acasalar com até oito machos, os quais morrem logo após o acasalamento. Depois de fecundadas, as fêmeas (rainhas) perdem as asas e começam a iniciar um novo formigueiro, cavando uma panela. Após a escavação, a fêmea regurgita o fungo que trouxe da colônia original e que servirá de substrato para o novo sauveiro. A sua alimentação ini-

cial e a de sua prole será baseada em ovos de alimentação depositados pela rainha nesse início de formação do sauveiro. Simultaneamente, a rainha deposita ovos normais que darão origem às jardineiras, a primeira das castas a surgir no novo sauveiro. Os primeiros ovos são colocados cerca de cinco dias após a revoada, e as primeiras operárias (jardineiras) surgirão, mais ou menos, dois meses após o início de fundação do sauveiro. Com vinte meses o formigueiro já terá duas ou mais panelas, e haverá presença de dez ou mais olheiros, ocorrendo a emergência do primeiro soldado cerca de vinte e dois meses após o início de formação do sauveiro. O aparecimento do soldado é retardado por este exercer uma função menos nobre na colônia (defesa), consumir muito alimento e necessitar ser alimentado pelas jardineiras, já que, por possuir mandíbulas desenvolvidas, estas dificultam sua alimentação. A rainha acasala uma única vez e oviposita até o último dia de sua vida, podendo viver por mais de vinte anos.

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Cana-de-açúcar

Soqueira limpa Experimentos avaliam o desempenho de defensivos no controle de nematóides em cana soca e determinam o melhor momento para a aplicação dos nematicidas

M

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parte aérea e do sistema radicular das plantas, e o canavial, como um todo, tende a apresentar menor número de falhas. Em conseqüência, a soqueira resultante de uma cana planta tratada também se apresenta mais bem desenvolvida e com falhas mais reduzidas. Assim, muitas vezes, devido ao tratamento feito no plantio, observa-se incremento de produtividade também na segunda colheita, variando de 5 a 12 t/ha, em função da variedade e dos níveis populacionais de nematóides (Figura 3). Em decorrência dos significativos incrementos de produtividade, o uso de nematicidas químicos no plantio de cana-deaçúcar, em áreas infestadas por nematóides, tem sido comum nos últimos anos e é uma ferramenta importante na redução

dos danos causados por esses parasitos. Estimulados pelos bons resultados em cana planta, muitos produtores utilizam também nematicidas em soqueiras, onde os incrementos de produtividade decorrentes do controle químico de nematóides são geralmente mais modestos do que os observados em cana planta, porém, economicamente viáveis em muitas situações. Um dos fatores que merece destaque pela influência que exerce sobre o controle de nematóides e, conseqüentemente, sobre os incrementos de produtividade, devido ao uso de nematicidas em soqueiras, é, sem dúvida, o período decorrente entre a colheita do canavial e a aplicação do nematicida. A falta de resposta ao tratamento químico em soqueiras, em muitos ca-

Fotos Leila Dinardo

uitas espécies de nematóides são encontradas em associação com a cana-de-açúcar, mas, nas condições brasileiras, três são economicamente importantes, em função dos danos que causam à cultura: Meloidogyne javanica, M. incognita e Pratylenchus zeae. Em muitos canaviais pouco desenvolvidos e com baixa produção, são encontradas altas populações de pelo menos uma delas. Outra espécie, P. brachyurus, é também muito comum em canaviais brasileiros, mas sua patogenicidade para a cultura ainda não está estabelecida, razão pela qual vários estudos estão sendo conduzidos no IAC, envolvendo essa espécie. A grandeza dos danos causados por nematóides varia em função da presença de uma ou mais espécies na área, dos seus níveis populacionais e da variedade cultivada. Em média, M. javanica e P. zeae causam cerca de 20 a 30% de redução de produtividade, em variedades suscetíveis, como ilustrado na Figura 2. M. incognita pode ocasionar perdas maiores, ao redor de 40%. Em casos de variedades muito suscetíveis e de níveis populacionais muito altos, as perdas provocadas por nematóides podem chegar a até 50% da produtividade. O controle de nematóides no plantio contribui para melhor desenvolvimento da

Detalhe de sistema radicular com presença de galhas provocadas pela injeção de toxinas por nematóides (esq.); danos característicos de Pratylenchus (dir.)

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Fotos José Francisco Garcia

DANOS ÀS PLANTAS

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sos, deve ser atribuída à aplicação de nematicidas em época inadequada. Para determinar a melhor época de aplicação de nematicidas em soqueiras, foram conduzidos experimentos em áreas infestadas por nematóides, cujas colheitas haviam sido efetuadas em diferentes ocasiões ao longo da safra. Um desses ensaios foi conduzido em área com população alta de M. javanica e P. zeae, onde foi cultivada a variedade RB835113, cujo primeiro corte havia sido efetuado em 5 de agosto, em pleno período seco do ano. Os nematicidas Furadan 100G e Temik 150G foram aplicados nas doses de 22,7 kg/ha e 10 kg/ha, respectivamente, aos 20, 40 e 60 dias depois do corte (20ddc, 40ddc, 60ddc). O desempenho dos nematicidas foi bastante semelhante, e, independentemente do produto utilizado, os maiores incrementos de produtivi-

Plantas menores e cloróticas encontradas em forma de reboleiras na lavoura podem ser sinais de nematóides na área

ataque dos nematóides à cana-de-açúcar restringe-se às raízes, de onde extraem nutrientes para o crescimento e desenvolvimento e, para isso, injetam toxinas no sistema radicular, resultando em deformações, como as galhas provocadas por Meloidogyne e extensas áreas necrosadas, quando os nematóides presentes são Pratylenchus. Em decorrência do ataque de nematóides, as raízes tornam-se pobres em radicelas e incapazes de absorver água e nutrientes necessários para o bom desenvolvimento das plantas que, conseqüentemente, ficam menores, raquíticas, cloróticas, murchas nas horas mais quentes do dia e menos produtivas. Em condições de campo, são verificadas reboleiras de plantas menores e cloróticas entre outras de porte e coloração aparentemente normais.

dade foram observados quando o tratamento foi feito aos 60 dias depois do corte, ou seja, em outubro, no início do período chuvoso (Figura 4). Por outro lado, em ensaio conduzido em área cultivada com a variedade IAC915155, colhida em 20 de outubro, período de chuvas já estabelecidas, os maiores incrementos de produtividade foram observados ao se aplicar nematicidas cerca de dez dias depois do corte (Figura 5). Para entender a razão da variação no tempo ideal de espera após o corte para aplicar nematicida em soqueira, é necessário considerar a dinâmica de crescimento das raízes em cana-de-açúcar. Segundo Vasconcelos (2002), em sua tese de doutoramento, o sistema radicular da cana-de-açúcar cresce paulatinamente

de um ciclo para o outro (cana planta, primeira soca, segunda soca etc), ocorrendo morte parcial de raízes em função da disponibilidade de água no solo. Sob condições de déficit hídrico, grande quantidade das raízes morre, com renovação sob condições de acúmulo de água. Pode-se afirmar, portanto, que nos meses de seca a cana-de-açúcar perde parte de seu sistema radicular, que volta a se desenvolver nos períodos chuvosos do ano. O autor salientou que a morte, ou a renovação do sistema radicular da cana-de-açúcar, não está relacionada ao corte da parte aérea, mas à condição hídrica a que a cultura está submetida em determinado período de desenvolvimento. As raízes superficiais são as primeiras a morrer durante o período de estiagem e

Figura 2 – Produtividade agrícola (t/ha) de variedades cultivadas em área infestada por P. zeae, tratadas ou não com nematicida no plantio

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Figura 3 - Produtividade agrícola (t/ha) da variedade RB867515, cultivada em área infestada por M. javanica e P. zeae, tratada ou não com nematicida no plantio e incremento de produtividade em função do tratamento nematicida (t/ha)

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José Francisco Garcia

A aplicação de nematicidas em período de seca pode acarretar a decomposição do produto e insucesso no controle

também são as primeiras a se renovar durante o período das chuvas. Esse fato é bastante relevante, já que nutrientes e nematicidas, especialmente nas soqueiras, são aplicados nas camadas superficiais do solo (cinco a dez cm de profundidade). Como ocorre morte de raízes na época seca do ano, que no Centro-Sul do Brasil coincide com os meses de junho a setembro, a aplicação de nematicidas em soqueiras, logo após o corte efetuado nesse intervalo, é inadequada devido à falta de raízes para absorver os produtos. Sem raízes para absorvê-los, os nematicidas permanecem no solo, sujeitos à decomposição biótica e abiótica. Assim, na época chuvosa, quando ocorrem emissão de novas raízes e crescimento das populações de nematóides, a quantidade de nematicida disponível é menor do que a aplicada, já que parte do produto

se decompôs. Por outro lado, ao fazer as aplicações de nematicidas mais tardiamente, aos 90 ou 60 dias depois do corte, elas estão mais próximas ou até mesmo coincidem com o período chuvoso, quando ocorre emissão de novas raízes, principalmente as superficiais, responsáveis pela absorção. Dessa forma, o produto, seja ele qual for, fica um tempo menor sujeito à decomposição no solo, sendo aproveitado pela planta em sua quase totalidade. Isso explica porque nos ensaios conduzidos, em áreas colhidas entre a segunda quinzena de junho e a primeira quinzena de setembro, os maiores incrementos de produtividade foram obtidos quando os nematicidas foram aplicados aos 90 ou aos 60 dias depois do corte.

Figura 4 - Produtividade (t/ha) da variedade RB835113, em função dos tratamentos nematicidas e incremento de produtividade dos tratamentos em relação à testemunha (t/ha)

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Por outro lado, em canaviais colhidos na época úmida, as raízes estariam, por ocasião da colheita, em pleno desenvolvimento, e, em conseqüência, as populações de nematóides estariam se elevando, justificando a aplicação de nematicidas logo após o corte. Quando as aplicações são feitas tardiamente, aos 40 ou 60 dias depois do corte, os nematóides causam danos às plantas, pois suas populações sobem rapidamente, favorecidas por condições edafoclimáticas adequadas e raízes abundantes. Em canaviais colhidos em época chuvosa, portanto, aplicações efetuadas logo após a colheita são mais efetivas. Os dados desses trabalhos mostram que o tempo ideal de espera, definido como o período que se deve aguardar após a colheita para fazer aplicações de nematicidas, de maneira a obter os melhores incrementos de produtividade, não é o mesmo para todas as áreas de cultivo de cana, variando de 60 a 90 dias, para canaviais colhidos em junho/julho, até cinco a dez dias para canaviais colhidos em novembro. Portanto, o período ideal de espera para aplicação de nematicidas em soqueiras reduz-se gradativamente na medida em que a colheita do canavial se aproxima do período chuvoso, como ilustrado na Figura 7. Obviamente, podem ocorrer alterações no período ideal de espera após o corte para aplicação de nematicidas em soqueira, em função do regime de chuvas de determinada região ou ano. Em anos ou regiões nos quais as chuvas são abundantes em setembro, por exemplo, é provável que a cana-de-açúcar comece a emitir novas raízes nessa época, e, em conseqüência, o período ideal de espera para aplicação de nematicida em soqueira deve ser proporcionalmente encurta-

Figura 5 - Produtividade (t/ha) da variedade IAC91-5155, em função dos tratamentos nematicidas e incremento de produtividade dos tratamentos em relação à testemunha (t/ha)

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Leila Dinardo

Cultivar

Figura 7 - Período ideal de espera para aplicação de nematicidas em soqueiras (em azul), em função da época de colheita do canavial Aplicação do Mês - quinzena nematicida 06 07 08 09 10 11 12 (dias depois do corte) 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 2 1 5 20 40 60 90

Leila explica qual a melhor hora de controlar nematóides em soqueiras Raízes atacadas por nematóides se tornam frágeis e comprometem a absorção de água e nutrientes da planta

do. Da mesma forma, nas áreas freqüentemente irrigadas, onde a dinâmica do desenvolvimento do sistema radicular é diferente, também é diferente o período após o corte que se deve aguardar para aplicar nematicida em soqueira. Outro fator a ser considerado diz respeito ao porte das plantas por ocasião da

aplicação do nematicida. Variedades colhidas em começo e meio de safra, na época seca do ano, apresentam desenvolvimento inicial da parte aérea bastante lento, devido às limitações impostas pelas baixas temperaturas e à escassez de água. Entretanto, aos 60 ou 90 dias depois do corte, plantas de algumas variedades podem atingir um porte alto o suficiente para dificultar a entrada de equipamentos para aplicação do nematicida. Nesse caso, as aplicações devem ser fei-

tas um pouco antes da época considerada ideal, ou seja, as aplicações devem ser feitas o mais tardiamente possível, desde que não ocorram limitações devido ao desenvolvimento da parte aérea. Finalmente, para aplicação de nematicidas em soqueiras infestadas por nematóides devem ser consideradas as condições gerais da área a ser tratada. Áreas com muitas falhas e previsão de baixa produtividade na colheita seguinte não devem receber nematicidas, pois o incremento de produtividade a ser obtido pode não justificar economicamente o C investimento realizado. Leila Luci Dinardo-Miranda, Instituto Agronômico


Capa

Dirceu Gassen

R

Residual relativo

esidual de um fungicida, característica peculiar aos diversos grupos químicos, consiste na manutenção de um ingrediente ativo no interior dos tecidos da planta em concentração suficiente para inibir ou retardar a infecção causada por um patógeno. Neste caso, considera-se como residual absoluto o período de tempo em que os fungicidas podem conferir proteção à planta, ou seja, os benzimidazóis apresentam um residual absoluto ao redor de 15 dias, os triazóis, entre 22 e 25 dias, e as estrobirulinas, entre 27 e 30 dias. No caso de misturas de fungicidas de grupos diferentes, o efeito sinérgico poderá acarretar um período residual absoluto maior do que o observado considerando-se os produtos isolados. Na ausência de sinergismo entre os componentes da mistura, pode ser observada uma relação entre o residual da mistura e o do componente cujo residual for o de maior duração. Por outro lado, considerando-se os diferentes estádios da patogênese como referencial para o momento da aplicação de um ingrediente ativo, o residual efetivo é conceituado como o período de tempo compreendido entre a deposição do fungicida sobre a superfície da planta e o surgimento de sintomas em magnitude superior à verificada no momento da aplicação. Dois cenários são possíveis, o fungicida é aplicado antes do estabelecimento da infecção ou já em presença de infecção estabelecida (Figura 1). Como um longo período de tempo pode decorrer entre a infecção inicial e a formação de sintomas detectáveis, o residual efetivo se manifesta de forma diferente caso a aplicação do fungicida seja realizada de forma curativa ou erradicante. Aplicações curativas promovem uma alteração na ação do fungicida, devido ao estádio de progresso em que a doença se encontra; enquanto que nas aplicações preventivas o fungicida permanecerá um determinado período de tempo nos tecidos da planta sem que o patógeno tenha iniciado o processo de Ricardo Balardin

A busca dos produtores por fungicidas que apresentem efeito residual mais prolongado deve levar em conta o quanto a relação entre a patogênese e as condições fisiológicas das plantas interfere na a ação destes produtos na lavoura

O estado nutricional da planta tem efeito direto sobre o residual, já que, bem nutrida, ela tem capacidade de manter tecidos fisiologicamente ativos por mais tempo

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Figura 1 - Relação do início da patogênese com o número de aplicações e período residual de fungicidas Ricardo Balardin

As aplicações preventivas possibilitam um residual mais longo em relação às aplicações curativas, devido às condições fisiológicas da planta

infecção. Assim posto, o residual efetivo em aplicações preventivas é mais prolongado, já que a totalidade do tecido vegetal encontra-se metabolicamente favorável à ação do fungicida, aliado à ausência de inóculo sobrevivente após a aplicação. As aplicações preventivas possibilitam um residual mais longo em relação às aplicações curativas, devido ao somatório de condições fisiológicas da planta, ao nível de inóculo disponível para infecção, combinado a uma maior probabilidade de o produto ser depositado em uma maior percentagem de área foliar sadia da planta. Por que o residual efetivo varia tanto em condições de campo, podendo divergir tão significativamente do residual absoluto? O período residual absoluto de um determinado ingrediente ativo é apenas uma referência, já que, por tudo o que é feito do ponto de vista de manejo de uma cultura e da dinâmica populacional do patógeno, o residual efetivo converte-se no residual realmente alcançável sob condições de campo. Além disso, a maior compreensão do pró-

prio conceito de doença permite entender, de forma inequívoca, a dinâmica fisio-populacional de plantas e patógenos, possibilitando extrair maior benefício do controle químico, entendido neste ponto como maior período residual efetivo. O período residual efetivo de um fungicida perpassa as características intrínsecas que o ingrediente ativo apresenta sob condições experimentais, podendo variar em função da relação entre curso da patogênese e condições fisiológicas gerais da planta. De maneira mais explícita, entende-se que o período residual será resultado da estratégia de controle estabelecida na forma de um plano de manejo integrado e que pode ser impactado por fatores tão diversos quanto o próprio momento de aplicação do fungicida em relação ao desenvolvimento da planta ou da patogênese, a densidade populacional do patógeno, a idade, a nutrição e diversos componentes de manejo fitotécnico da planta, ou mesmo a expressão de genes menores associados à resistência parcial.

Figura 2 - Programas de controle preventivo e curativo com base na evolução populacional do patógeno causador da ferrugem asiática da soja

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O cenário observado em doenças como requeima da batata, brusone do arroz, ferrugem do trigo, ou ferrugem asiática da soja, em contraste à pinta preta do tomateiro, cercosporiose da soja ou septoriose do trigo, indica a necessidade de uma leitura cuidadosa de doenças cuja taxa de progresso pode acarretar uma explosão populacional do patógeno ou daquelas cuja progressão é mais lenta. Mesmo que o controle preventivo, por conceito, considere a deposição de um ingrediente ativo previamente ao início da patogênese, o resultado final será diferente entre as doenças do grupo cuja taxa de progresso é mais elevada. O que esperar, então, de uma aplicação realizada após o estabelecimento de uma doença, mesmo que sua progressão seja mais lenta? A aplicação de um fungicida, após o início da infecção, sofre reduções tão mais drásticas no residual quanto maior for a densidade populacional do patógeno no momento da aplicação. É provável que alguns componentes da patogênese, tais como número e distribuição dos locais de infecção, aliados à taxa de progresso do fungo, possam obrigar o produ-

Figura 3 - Variação no balanço energético durante o desenvolvimento da cultura da soja, gerando aumento de sensibilidade na planta e diminuindo sua atividade metabólica associada ao fluxo de compostos induzidos de defesa e sítios livres para metabolismo do fungicida

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Figura 4 - Efeito da nutrição e do espaçamento entre linhas sobre o rendimento de grãos de soja, Santa Maria (RS)

Figura 5 - Efeito do espaçamento entre linhas sobre o período residual de fungicidas na cultura da soja, Santa Maria (RS)

leno, que acelera a degradação de tecidos ao mesmo tempo em que favorece o estabelecimento da doença. Nessas condições, naturalmente o residual do fungicida vai decrescer. Na transição entre o período vegetativo e o reprodutivo, ocorre aumento no dreno de energia para os órgãos de reserva, aumentando a ineficiência dos processos de defesa, que se tornam mais onerosos do que benéficos do ponto de vista de equilíbrio energético. Essa dinâmica favorece o desenvolvimento da doença e reduz a atividade do fungicida nos tecidos da planta. O estado nutricional da planta tem efeito direto nessa dinâmica, pois uma planta bem nutrida tem maior capacidade de reduzir o impacto desse desequilíbrio energético pela manutenção dos tecidos fisiologicamente ativos por um período mais prolongado. Outro fator de relevância prende-se à associação entre a nutrição da planta e seu manejo cultural (Figura 4). André Shimohiro

Figura 6 - Evolução dos valores de área abaixo da curva de progresso de ferrugem (AACPF) em diferentes cultivares de soja nos estádios de V1, V3/V5 e R1

tor a aumentar o número de aplicações (Figura 2). Nessas condições, o resultado final é um número excessivo de aplicações, associado a um retorno financeiro incoerente ao investimento realizado e que potencialmente poderia ser mais satisfatório, se respeitadas as condições da planta, do patógeno e de sua interação. Na interação fungicida – patógeno, as aplicações curativas resultam em dificuldade crescente do fungicida em eliminar ou reduzir a evolução da doença. Nessas condições, o aumento na intensidade de atividade metabólica de defesa da planta reduz a disponibilidade de elementos constitutivos que possam estar envolvidos na atividade do fungicida, acelerando a degradação deste e reduzindo o

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período cuja concentração do ativo na planta mantém-se em patamar de letalidade eficiente. Em contrapartida, nas aplicações preventivas, o efeito residual do fungicida é favorecido pela ausência da interação entre o inóculo do patógeno e a planta hospedeira, pela maior concentração de compostos constitutivos, devido à reduzida produção de compostos induzidos – fatores que acabam, em conjunto, permitindo uma lenta extinção do ativo nos tecidos da planta. Em adição, o momento adequado de proteger uma planta também tem relação à associação entre os estádios fenológicos e os momentos fisiologicamente críticos na planta (Figura 2). Um exemplo é a produção de eti-

Na relação fungicida-patógeno, aplicações curativas resultam em dificuldade crescente do fungicida em eliminar ou reduzir a evolução de uma doença

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Ricardo Balardin

Divulgação

Balardin e seu grupo de pesquisa abordam a interferência de diversos fatores no efeito residual de um produto fungicida A aplicação de um fungicida, após o início da infecção, sofre reduções drásticas no residual quanto maior for a densidade populacional do patógeno

Alterações no arranjo de plantas, devido ao aumento no espaçamento entre linhas, ou à variação na densidade de plantas, podem propiciar maior incidência de radiação solar em toda a planta, mantendo as folhas mesmo no dossel inferior com uma maior atividade fotossintética. Além disso, fatores microclimáticos como redução no período de molhamento foliar, aumento de aeração e redução na concentração precoce de etileno retardam ou inibem a infecção pelo patógeno. Conseqüentemente, além de uma deposição mais facilitada do fungicida, a redução de atividade patogênica irá resultar em um aumento no residual do fungicida. Por outro lado, o adensamento de plantas, juntamente com um elevado índice de área foliar, favorece a atividade patogênica, prejudicando a penetração e a deposição de fungicida sobre o alvo, refletindo no seu residual (Figura 5). O residual do fungicida será reduzido, obrigando o produtor a um maior número de aplicações, mas cada vez menos eficazes, devido à associação dos fatores de má penetração, lenta atividade metabólica da planta e proporcionalmente maior densidade populacional remanescente a cada aplicação. Além dos fatores nutricionais e do mane-

Figura 7

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jo cultural, é importante destacar que a manifestação da resistência parcial, através de um maior período de latência e uma menor taxa de progressão da doença, acarreta menor densidade populacional do patógeno. Na medida em que a pressão de inóculo diminuir sobre os tecidos do hospedeiro, será observado um aumento no residual do fungicida à semelhança do observado do ponto de vista fisiológico. (Figura 6). Se uma correta tecnologia de aplicação for associada a uma adequação no arranjo espacial e populacional das plantas, favorecendo maior deposição e cobertura das folhas de todo o dossel pelo fungicida aplicado, o residual dos produtos será aumentado. A adequação da tecnologia de aplicação compreende um ajuste de variáveis como volume de calda e pontas de barra que produzam DMV e DMN compatíveis com o dossel que se busca cobrir (Figura 7). Outros fatores, como arquitetura da planta, estádio fenológico em que o fungicida é aplicado e local mais provável de infecção, são aspectos que afetarão o resultado final de uma aplicação, ou, mais especificamente, o residual do fungicida. Adicionalmente, o horário e as condições climáticas no momento da aplicação comprometem o residual de um fungicida. É importante enfatizar que toda vez que a deposição de um fungicida for afetada por quaisquer fatores e que uma quantidade inferior de ingrediente ativo for aplicada so-

bre a planta, todos os componentes populacionais do patógeno, aliados às variáveis fisiológicas da planta, produzirão um efeito sobre o residual do fungicida ainda mais relevante (Figura 8). Obter a máxima expressão do residual efetivo de um fungicida dependerá da compreensão do próprio conceito de doença. No clássico triângulo fitopatológico, é importante que entendamos de forma inequívoca que planta e patógeno são dinâmicos, tanto do ponto de vista genético e fisiológico como do populacional. Por outro lado, o ambiente poderá impor variações positivas ou negativas sobre aqueles componentes, acarretando variações no benefício do controle químico. Nesse sentido, pode haver uma freqüência variada de aplicações, menor dano devido às doenças e maior economia do controle químico. Em ultima análise, espera-se que, pela maior compreensão da dinâmica do processo doença, seja alcançado um maior período residual efetivo C da aplicação de um fungicida. Ricardo Balardin, Rosana Meneghetti, Lucas Navarini, Mônica Paula Debortoli e Marcelo Gripa Madalosso, UFSM

Figura 8 – Incremento no residual de fungicidas pelo aumento no volume de calda

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Soja

Dirceu Gassen

O bom desenvolvimento da cultura da soja passa pelo fornecimento adequado de micronutrientes à planta, uma vez que a deficiência desses elementos diminui sensivelmente a produtividade da cultura

A

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fornecer esses nutrientes via semente ou via aplicações foliares.

MICRONUTRIENTES A soja exige pequenas quantidades de micronutrientes para completar seu ciclo, especialmente o Mo, e a concentração dos mesmos nos tecidos das plantas é muito pequena, bem como a exportação, se comparada aos macronutrintes. Por exemplo, para a produção de uma tonelada de grãos de soja, segundo a Embrapa (1993), as ne-

cessidades são de 5 g de Mo, 2 g de B, 30 g de Mn, 10 g de Cu, 40 g de Zn; enquanto a faixa de suficiência no tecido foliar de soja seria de 1 a 5 mg/kg para Mo, de 21 a 55 mg/kg para B, 20 a 100 mg/kg para Mn, 10 a 30 mg/kg para Cu, 20 a 50 mg/kg para Zn (Comissão, 2004). Embora os micronutrientes sejam absorvidos em pequenas quantidades pela soja, possuem funções muito importantes, especialmente aqueles envolvidos no metabolismo em geral e na fixação biológica

Dirceu Gassen

s plantas em geral necessitam de 16 elementos químicos para o seu desenvolvimento. Destes, destacam-se o carbono (C), o hidrogênio (H) e o oxigênio (O), fornecidos naturalmente pela água e pelo ar que perfazem mais de 90% da matéria seca das plantas; os elementos nitrogênio (N), fósforo (P) e potássio (K), também chamados de macronutrientes, são utilizados em grandes quantidades pelas plantas. Cálcio (Ca), magnésio (Mg) e enxofre (S), chamados de macronutrientes secundários, são constituintes do calcário e de alguns fertilizantes. Já cobre (Cu), zinco (Zn), manganês (Mn), ferro (Fe), molibdênio (Mo), boro (B) e cloro (Cl) são chamados de micronutrientes, devido à pequena quantidade em que são absorvidos pelas plantas, sendo constituintes de fertilizantes e calcário. De forma natural, as plantas extraem do solo os micronutrientes de que necessitam para a sobrevivência e altas produções, porém, alguns solos não possuem todos os elementos nas quantidades que as plantas necessitam, seja pela origem do solo, pobre em nutrientes, pelas reações químicas e biológicas, ou pela contínua remoção destes, devido aos sucessivos cultivos, devendo-se nesses casos complementar, ou

Embora a soja necessite de pequenas quantidades de micronutrientes, estas são fundamentais para que a planta expresse seu máximo poder produtivo

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Fotos Divulgação

Sintoma de deficiência de zinco (Zn) – geralmente manifestado em solos com pH alto, arenosos e derivados de material de origem com baixos teores

Sintoma de deficiência de Cobre (Cu) em solos com teores muito altos de matéria orgânica, em solos arenosos

Sintoma de deficiência de Manganês (Mn) – este elemento participa diretamente na fotossíntese ajudando na síntese de clorofila

do nitrogênio. As bactérias do gênero Bradyrhizobium, que vivem em simbiose com a soja, fixam o N do ar e, nesse processo, alguns micronutrientes são muito importantes. Na fixação biológica do N, a enzima nitrogenase utiliza o Mo, o Fe e o Mn. O Mo exerce importante papel nas reações de transferência de elétrons. Ainda participa como cofator das enzimas nitrogenase, redutase do nitrato e oxidase do sulfato e na formação da proteína Mo-Fe-S. O cobalto (Co) é outro micronutriente essencial na fixação biológica do N. O N é o macronutriente mais utilizado pela soja (em torno de 110 kg/ton de grãos) e é fornecido em sua maior parte pela fixação biológica (o restante pela mineralização da materia orgânica do solo). A deficiência de N na soja pode ser devida às deficiências de micronutrientes, e como conseqüência pode ocorrer diminuição do potencial de rendimento. O Mn atua no sistema enzimático de várias reações metabólicas importantes, como a conversão de N-nitrato para aminoácidos e proteínas. Participa diretamente na fotossíntese, ajudando na síntese de clorofila, acelera a germinação e a maturidade e aumenta a disponibilidade de P e Ca. O B é essencial na divisão e desenvolvimento das células, sendo mais importante a ação sobre as gemas e pontas das raízes. Sob condições de deficiência desse nutriente, verificam-se prejuízos à formação das sementes. O B atua também na formação da parede celular, no processo da síntese de proteínas, no aumento do teor de clorofila, na integridade da membrana plasmática, no metabolismo fenólico, na lignificação, na formação dos nódulos das leguminosas, no crescimento dos ramos e frutos e é ativador da fosforilase do amido. O Cu compõe enzimas que participam da fotossíntese, importantes na formação da clorofila e, assim, na transformação de água + gás carbônico + luz em açúcares. O Cu também participa na respiração, dis-

tribuição de carboidratos, redução e fixação de nitrogênio, metabolismo de proteínas e da parede celular. O Zn atua em muitos sistemas enzimáticos das plantas, na multiplicação e crescimento das células, na absorção de nutrientes, no processo de fotossíntese e ainda aumenta o teor de proteína nos grãos. A resposta a este micronutriente irá depender das características genéticas das culturas. O milho responde muito bem ao Zn; a cevada, a soja e o trigo, moderadamente.

ou aplicados via adubação, depende das suas propriedades químicas, físicas e biológicas. Dentre os atributos de solo que mais influenciam a disponibilidade de micronutrientes destacam-se: a textura, o pH, a umidade, o teor de matéria orgânica e de óxidos de ferro e alumínio (Al). O pH do solo é um dos fatores de maior influência na disponibilidade de micronutrientes e é fator de fácil controle através do manejo da calagem. A calagem tem se mostrado eficiente em aumentar a disponibilidade de Mo à soja. Por outro lado, a diminuição da disponibilidade de Fe, Cu, Mn, Zn e B pela calagem ocorre, mas só é crítica em pH acima de 6,5, ou em solos mais arenosos. Em geral, as condições que favorecem a manifestação das deficiências dos micronutrientes nos solos são: B em cultivo de

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NO SOLO O conhecimento dos fatores que afetam a ocorrência, a reação e o movimento no solo são relevantes para analisar o comportamento dos micronutrientes no sistema solo-planta e, conseqüentemente, a sua disponibilidade às plantas. Solos derivados de basalto, que normalmente são mais argilosos, em geral, têm maior disponibilidade de micronutrientes do que solos arenosos. Os micronutrientes são de natureza essencialmente inorgânica, e sua disponibilidade pode variar muito, em função das reações que ocorrem com os componentes orgânicos e inorgânicos do solo, as quais controlam a disponibilidade destes. Dessa maneira, a capacidade do solo em reter e/ ou disponibilizar micronutrientes para as plantas, quer seja da sua reserva natural

Efeito do B, Cu, Mn, Zn e tratamento completo na produtividade da soja Tratamentos “Completo” Menos B Menos Cu Menos Mn Menos Zn Completo menos micros

Produtividade Kg/ha % 3.492 100 3.336 95 3.242 93 3.072 88 2.910 83 2.310 66

Fonte: Fundação MT/PMA (1999)

Rendimento da soja submetida a diferentes programas e nutrição foliar em complementação à adubação via solo Tratamento/Produto 1 – testemunha 2 – Broadacre Zn/Cu Broadacre Mn High cooper Supa Bor 3 – Broadacre Mn High cooper Broadacre Mn High cooper 4 – High cooper High cooper

Época Semeadura Semeadura R1 R1 Semeadura Semeadura R1 R1 Semeadura R1

Forma Tratamento sementes Tratamento sementes Foliar Foliar Tratamento sementes Tratamento sementes Foliar Foliar Tratamento sementes Foliar

Quantidade (kg ou ml/ha) 250 200 100 400 100 100 200 100 100 100

Rendimento (Sc/há)1 63,0 a 66,0 a

68,0 a

67,3 a

Fonte: Fundação Rio Verde (2005); 1Médias seguidas por letras distintas diferem entre si ao nível de 5% de probabilidade pelo teste de Duncan

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Dirceu Gassen

espécies exigentes (alfafa, algodão, girassol etc.), solos arenosos, períodos de seca e alto pH do solo; Cu em solos com teores muito altos de matéria orgânica, em solos arenosos; Zn em solos com pH alto, solos arenosos e solos derivados de material de origem com baixos teores de Zn; Mo em solos com baixo pH, solos com material de origem com baixos teores de Mo e solos com altos teores de Fe e Al; Mn em solos com pH alto e em solos arenosos; Fe em solos com pH alto. A análise de solo é a principal ferramenta para avaliar a fertilidade do solo. Entretanto, devido aos poucos trabalhos de pesquisa de longa duração visando à calibração de teores de micronutrientes no solo e à resposta das culturas, não é conveniente manejar a adubação somente com base na análise do solo. Deve-se considerar também a análise foliar e a visualização de sintomas de deficiências ou toxidez. A forma de aplicação de micronutrientes irá depender de vários fatores, como a quantidade do elemento no solo, a expectativa de rendimento da cultura, o manejo do solo e da cultura utilizada e a disponibilidade financeira do produtor.

RESPOSTAS À ADUBAÇÃO As respostas a micronutrientes têm sido mais freqüentes nas condições da região dos Cerrados, devido aos processos de formação dos solos dessa região favorecer a deficiência dos elementos. Diversos trabalhos na região do Cerrado demonstram respostas positivas à adubação com micronutrientes, via solo, principalmente quando as quantidades desses nutrientes são classificadas como muito baixas. Outros demonstram que a suplementação via semente ou via folha

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A disponibilidade de micronutrientes para as plantas varia em função das reações que ocorrem com os componentes orgânicos e inorgânicos do solo

pode ser uma alternativa economicamente viável. Em solo de Cerrado, Galrão (1984) mostra que o micronutriente que mais limitou o rendimento da soja foi o zinco, com redução de quatro sc/ha na ausência desse elemento. Resultado diretamente relacionado com a venda de grandes quantidades de formulações contendo zinco para a região do Cerrado, já que os teores de zinco no solo são baixos, e a soja responde em produtividade à aplicação desse nutriente. Trabalhos feitos pela Fundação MT (1999) com a cultura da soja provam a importância da adubação ser de forma balanceada, pois embora a deficiência de zinco provoque a maior redução da produção (-17%), a redução é ainda maior com a omissão de todos os micronutrientes (-34%), demonstrando que a interelação solo-planta é muito complexa (Tabela 2). Em um estudo feito pela Fundação Rio Verde (2005), não foram obtidas diferenças estatísticas à apli-

cação de produtos contendo micronutrientes em aplicações suplementares via semente e via folha. Porém, cabe ressaltar que houve uma tendência de resposta ao cobre em suplementação, já que a quantidade no solo estava abaixo do teor crítico - 0,3 mg/dm3, sendo que para solos do MT o teor adequado é de 0,8 mg/dm3. A resposta em produtividade à aplicação de micronutrientes é afetada diretamente pelos fatores de produção, como a disponibilidade hídrica, radiação solar, disponibilidade do nutriente no solo, potencial de rendimento da cultura, dentre outros que afetam diretamente a eficiência da adubação. Além disso, o sistema de manejo de solo adotado tem grande influência sobre a dinâmica e a disponibilidade dos micronutrientes, devido à maior produção e concentração de material orgânico na superfície do solo, o que favorece a complexão desses elementos, resultando num acúmulo nas camadas mais superficiais e em redução das quantidades em profundidade, ocasionada, também, pela extração das culturas e a baixa mobilidade desses elementos, especialmente do Cu e C Zn, no perfil do solo. Leandro Bortolon e Jairo André Schlindwein, UFGRS Efeito da aplicação de Co e inoculação da soja, cv.BR 37 no rendimento de grãos Tratamentos

Produtividade Kg/ha % 2.636 100 3.085 117 3.630 138 3.617 137 3.726 141 3.659 139

Sem Inoculação IP1 IP + 200 kg N IP + Mo IP + Mo + 2,59 g Co IP + Mo + 5,0 g Co

Fonte: Campo & Hungria (2002); 1 300 ml de água açucarada mais 500 g/50 kg sementes de inoculante turfoso, contendo as estirpes SEMIA 587 + SEMIA 5019, com população de células de 3x109/g inoculante

Produtividade da soja e viabilidade econômica, em US$, da aplicação de micronutrientes e outros produtos comerciais na produtividade de grãos de soja, quando comparadas com a testemunha, no ano agrícola de 2002/03 Tratamento

Produtividade Kg/ha

CoMo+2x Mo CoMo+2x Mo+B CoMo+2x Mo+ Phit. PK CoMo+2x Mo+ Fortifol CaB CoMo+2x Mo+LBE-PT1 CoMo+2x Mo+P30 CoMo+2x Mo+Stimulate Testemunha Média CV (%)

3.510 3.433 3.696 3.344 3.473 3.470 3.340 3.184 3.431 3,97

Custo Aplicação Micronutrientes Ano agrícola 2002/03 3,80 5,20 11,34 3,30 7,99 4,81 10,31

Acréscimo no RE1 U$/ha 62,76 48,13 98,56 30,99 55,83 55,25 30,22

Retorno líquido

58,96 42,93 87,22 27,69 47,84 50,44 19,91

Fonte: Ceretta el al. (2005); 1 Retorno econômico

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Empresas

Produquímica

Fixadores de nitrogênio Trabalho de pesquisa mostra os efeitos da aplicação de molibdênio e cobalto na cultura da soja

A

soja utiliza diretamente o nitrogênio atmosférico para suprir suas necessidades nutricionais, a partir da associação simbiótica entre suas raízes e as bactérias do gênero Bradyrhizobium. A fixação biológica do nitrogênio representa a maior parte do fornecimento de nitrogênio necessário para a planta de soja. Para a produção de mil quilogramas de grão, é necessário o fornecimento de 83 kg de N. Em função da simbiose raiz/bactéria, não há necessidade de fornecer adubo mineral, o que promove economia considerável em comparação a outras culturas. Entretanto, o Bradyrhizobium terá seu funcionamento adequado com a presença de alguns micronutrientes, sendo os mais importantes o molibdênio e o cobalto. As recomendações técnicas (Emprapa Soja) são de 12 a 30 g/ha de Mo e de 2 a 3 g/ha de Co para a aplicação via semente, ou em pulverização foliar, nos estádios de desenvolvimento V3-V5. A aplicação via semente ou via foliar tem mostrado resultados similares quanto aos acréscimos de rendimento da cultura. Trabalho realizado pela Fundação MS e a Produquímica, no ano agrícola 2005/ 06, mostrou que o uso de Mo e Co aumentou o rendimento da soja, tanto no fornecimento via semente quanto via

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foliar, sendo que a forma de aplicação não diferiu entre si. O molibdênio tem importante atuação na fixação do N na cultura da soja, pois participa da estrutura e da ativação da enzima nitrogenase. Essa enzima é a responsável pela redução do nitrato a nitrito, processo pelo qual são rompidas as três ligações existentes entre os átomos de nitrogênio que formam a molécula de N2, produzindo, posteriormente, duas moléculas de amônia (NH3), que irão formar os compostos nitrogenados. Os solos brasileiros possuem naturalmente baixa concentração de Mo, principalmente os de Cerrado, o que provoca maior dependência da soja pela aplicação de molibdênio. O cobalto faz parte da molécula da co-

enzima cobamida, a qual participa das reações das etapas iniciais da síntese de leghemoglobina, substância existente nos nódulos, que lhes confere a cor avermelhada, essencial para a fixação do N2. Apesar de ser pequena a necessidade de Co para a soja – perto de 300 vezes menos do que a necessidade de Mo –, trabalhos de pesquisa têm mostrado que a aplicação do Co juntamente com o Mo, via semente ou foliar, promove aumento da fixação biológica do nitrogênio e da produC tividade da soja. Valter Casarin, Vanice Birck e Fernanda Forli, Grupo Produquímica

Produtividade da soja (sc/ha) cv. Embrapa 48, em resposta ao fornecimento de Mo e Co via sementes e via foliar no estádio V4. Maracaju (MS). Fundação MS/Produquímica, 2006 Produto Profol CoMol 225 Profol CoMol 225 Controle

Dose1 22,5 g/ha Mo 1,5 g/ha Co 22,5 g/ha Mo 1,5 g/ha Co ——

Modo Via Foliar (V4)

Produtividade2 sc/ha 56,7

sc/ha 7,0

Variação3 % 14,1

Via sementes

56,4

6,7

13,5

——

49,7

——

——

Considerar dose em 50 kg de sementes de soja quando se realizou a aplicação via sementes e dose em ha quando se realizou a aplicação via foliar. 2 Dados de produtividade correspondem à média de 4 repetições de campo. 3 Variação na produtividade da soja, em saca ha -1 e em % em relação ao tratamento-testemunha. 1

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Arroz

Invasoras contidas A coincidência do período de preparo do solo e da época de emergência de daninhas na cultura do arroz permite ao produtor o uso de operações de manejo do solo que eliminem as invasoras, com redução dos custos de produção e garantia de bom desenvolvimento inicial das plantas

A

semeadura deve ser planejada de forma que os tratos culturais referentes ao manejo de plantas daninhas coincidam com a época de maior ocorrência destas, contribuindo com a redução dos custos de controle, o aumento da eficiência dos métodos empregados, e a facilidade na aplicação dos demais tratos culturais. Não só no arroz irrigado, mas em qualquer outra cultura, o manejo de plantas daninhas deve ser realizado pela integração dos métodos viáveis na propriedade, associados à prevenção. A prevenção começa com uma limpeza cuidadosa do maquinário usado no ano anterior. Tratores com lama podem carregar sementes de espécies daninhas de difícil controle e contaminar outras áreas durante as operações de preparo do solo; semeadoras não devem

conter restos de sementes de anos anteriores, e implementos como arados, grades, enxadas rotativas ou plainas devem estar isentas de propágulos de tais espécies. O preparo das áreas limpas ou destinadas à produção de sementes deve ser realizado antes das demais. Alguns trabalhos sobre monitoramento de emergência de plantas daninhas em áreas de arroz, conduzidos na Embrapa, indicam que o maior fluxo inicial de emergência está normalmente associado, além de à temperatura e umidade, também ao revolvimento do solo no preparo inicial. Conseqüentemente, a época de maior emergência de plantas daninhas coincide com as operações de preparo, semeadura e desenvolvimento inicial da cultura. Na cultura do arroz irrigado no Sul do Brasil, Charles Echer

cultura do arroz, especialmente do irrigado, exerce grande expressão econômica nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, sendo os patamares de produtividade em torno de 5,6 e 7,5 t/ha, respectivamente. As plantas daninhas são responsáveis por perdas substanciais de produtividade das culturas, quando não corretamente manejadas. A diversidade de espécies, aliada à alta infestação, dificulta o controle, ocasiona problemas durante o cultivo, facilita o acamamento da cultura e dificulta outros tratos culturais, além de causar maiores perdas na colheita. O sistema convencional de semeadura tende a favorecer a ocorrência de espécies daninhas anuais. Sendo assim, a época de

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Flávio R. Gassen

por exemplo, em solos preparados no início de novembro, ocorrerão sucessivos fluxos de emergência de plantas daninhas, cada vez menos intensos, até meados de janeiro, quando então a emergência se torna praticamente nula (Figura 1). Embora a prática comum recomendada para evitar a disseminação seja a de que as plantas daninhas devam ser controladas antes do florescimento, o maior dano é provocado muito antes desse período, devido à competição inicial com as plantas da cultura. A cultura e as plantas daninhas se desenvolvem juntas inicialmente, praticamente sem interferência mútua, até que ocorra a ocupação do espaço disponível, quando então se estabelecem dois tipos de competição: a intraespecífica, entre as plantas de arroz, e a interespecífica, que é a competição das plantas de arroz com as plantas daninhas. Normalmente elas estão relacionadas, ou seja, a menor ocorrência de plantas daninhas implicará em menor competição interespecífica, que conseqüentemente deixará mais espaço disponível para o desenvolvimento das plantas da cultura, reduzindo também a competição intraespecífica. Dupla vantagem.

MANEJO PRÉ-PLANTIO O preparo do solo representa grande parte dos custos de manejo de uma lavoura de arroz irrigado e influencia o ambiente para o desenvolvimento radicular das plantas. A associação do preparo inicial do solo com o controle de plantas daninhas deve visar a eliminação dos primeiros flu-

A aração e a gradagem estimulam a germinação e o primeiro fluxo de emergência de plantas daninhas, mais vigoroso e com maior número de indivíduos

xos de emergência das plantas daninhas, que normalmente surgem logo após o revolvimento inicial do solo. Com o baixo valor da saca de arroz, a maximização da eficiência operacional deve implicar em redução nos custos de manejo, por menor


Figuras 1 a, b e c

que seja. No sistema convencional, o preparo é dividido em primário e secundário. O primário consiste em operações mais profundas, normalmente realizadas com arado ou grade pesada, que visam principalmente o rompimento de camadas compactadas e a

eliminação e/ou enterrio da cobertura vegetal. No preparo secundário, as operações são mais superficiais, utilizando-se grades ou plainas para nivelar, destorroar, destruir crostas superficiais, incorporar agroquímicos e eliminar plantas daninhas no início do seu desenvolvimento, criando assim um ambiente favorável à germinação, emergência e desenvolvimento da cultura implantada. O preparo inicial do solo, visando adequação à semeadura, pode também ser usado como ferramenta no manejo de plantas daninhas de difícil controle, como capim-arroz e arroz vermelho. Enquanto a primeira é problema principalmente devido à alta infestação das áreas e vasta distribuição geográfica, a segunda normalmente ocorre em menor densidade, mas a dificuldade de controle e a depreciação do valor da produção devido à sua presença a

CADA CASO É ÚNICO m ponto-chave é conhecer o inimigo: a biologia e fisiologia da planta daninha a ser controlada pode nos fornecer boas dicas de sua competitividade e fragilidades. Um acompanhamento das plantas da cultura e das plantas daninhas, e das interações entre comunidades, é essencial para determinarmos quando uma planta deixa de ser “indesejada” (como sinônimo de indiferente) e passa a ser literalmente “daninha” (como sinônimo de problemática). O capim-arroz, por exemplo, normalmente leva vantagem no crescimento inicial por estar presente em maior número, distribuído no perfil do solo, apresentar o fenômeno de dormência e possuir metabolismo C4, acarretando em crescimento rápido, emergência escalonada e maior sobrevivência aos métodos de controle. Neste aspecto, a eliminação das primeiras camadas de emergência, através da associação das operações de preparo inicial do solo com o controle de plantas daninhas, resultará em redução substancial da infestação e da capacidade competitiva da comunidade da espécie daninha em questão, com as plantas da cultura.

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Charles Echer

U

tornam muito importante. No caso de mais de uma operação de preparo, um espaço de uma semana ou pouco mais entre elas pode associar o preparo com o controle de plantas daninhas, praticamente sem incremento nos custos. No caso de aração e gradagem, é possível estimular a germinação com a primeira operação e, dez a 15 dias após, realizar a gradagem e eliminar o primeiro fluxo de emergência de plantas daninhas, normalmente vigoroso e com maior número de indivíduos. Esse controle inicial durante o ciclo da cultura, principalmente no período mais sensível à competição, pode reduzir ou até mesmo eliminar algumas das práticas posteriores adicionais de controle. A Figura 2 mostra área de arroz preparada no início de novembro e não semeada, com alto índice de infestação, evidenciando o primeiro fluxo de emergência de capim-arroz na ausência de controle, 20 dias após preparo.

CONTROLE QUÍMICO

No controle de invasoras em pós-emergência, devese atentar para o controle logo após a emergência, com plantas com no máximo quatro folhas

O planejamento das práticas culturais no período de maior emergência de plantas daninhas, para a eliminação do primeiro fluxo, pode tornar possível reduzir a dose do herbicida aplicado na fase inicial de desenvolvimento, ou viabilizar a retirada ou redução de dose de um dos herbicidas, no caso do uso de misturas. O próximo passo é a escolha do herbicida ideal e do momento de aplicação. Vários produtos são atualmente recomendados para aplicação em pré ou pósemergência na cultura do arroz irrigado, destacando-se os inbidores da enzima acetil coenzima A carboxilase (ACCase) e acetolactato sintase (ALS), principalmente devido à alta eficiência e flexibilidade de aplicação. O momento de aplicação, pré ou pós-emergência, normalmente fica a cargo do técnico responsável, levando em con-

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Dirceu Gassen

sideração principalmente as exigências de cada produto e as condições de infestação e umidade da lavoura, além da disponibilidade de água para iniciar a inundação permanente. Embora seja possível uma flexibilidade quanto ao momento de aplicação, o ideal é realizá-la o mais rápido possível após a semeadura. Mesmo não sendo preferência da maioria, algo em torno de 10% do mer-

cado de herbicidas em arroz irrigado, os produtos pré-emergentes desempenham papel importante, mantendo a cultura no limpo desde os primeiros dias após a emergência. Se o técnico responsável optar por aplicação em pós-emergência, deve realizá-la o mais cedo possível, no máximo no estádio de três a quatro folhas das plantas de capim-arroz. Outra questão importante é a necessidade de rotação de herbicidas com diferentes mecanismos de ação, associada ou não à rotação de culturas. Essa alternância de princípios ativos é particularmente importante para retardar o aparecimento de plantas daninhas resistentes aos herbicidas. Inibidores da ALS e ACCase, por exemplo, são muito específicos quanto ao local de atuação dentro da planta, o que resulta em aumento na intensidade de seleção e risco do surgimento de um biótipo resistente. É importante ter sempre em mente ainda a maximização da eficiência, através da associação de finalidades em uma mesma operação. Monitoramentos constantes na lavoura e a determinação do momento ideal de controle podem contribuir para evitar

Práticas culturais planejadas para eliminação de plantas daninhas permitem reduzir doses de herbicidas aplicados na fase inicial da cultura

entradas desnecessárias na lavoura de arroz. Aplicações bem realizadas e a escolha do herbicida adequado para cada caso evitam a necessidade de um segundo controle químico, C reduzindo o custo da lavoura. Germani Concenço e Francisco Affonso Ferreira, UFV Paulo T. B. S. Melo, PMP


Café

Orgânico viável Mesmo com algumas limitações, como custos com certificação e carência de técnicos e pesquisas na área, produtores já conhecem as alternativas de manejo e adubação do cultivo orgânico de café e incentivam o desenvolvimento do sistema

O

ADUBAÇÃO DO SOLO O manejo do solo em sistemas orgânicos de produção dever ser considerado não apenas pelo aspecto de fornecimento de nutrientes para as plantas, mas pela manutenção de um sistema complexo, que abriga organismos responsáveis pelo processo de ciclagem de nutrientes. A adubação é feita principalmente através da aplicação de resíduos vegetais e animais, originados na própria unidade de produção, no solo, podendo ser complementada pelo uso de determinadas substâncias minerais de origem não industrial. Podem-se usar estercos de animais, esterco líquido, cama de curral, adubos verdes, tortas, vinhaça e demais fontes de matéria orgânica disponíveis. No entanto, deve-se ficar atento com a procedência desses materiais, e em muitos casos é interessante fazer a compostagem antes de utilizá-los na lavoura. As principais fontes de fósforo permitidas são os fosfatos naturais, escórias de Thomas, farinha de ossos e termofosfatos. Entre as fontes de potássio aceitas estão a palha de café, cinzas vegetais, aveia preta, sulfato de potássio, sulfato duplo de magnésio e potássio, granito basalto e outros. Os micronutrientes podem ser fornecidos através de basalto (liberação mais lenta), algas, sais (sulfato de zinco e cobre, ácido bórico etc.), biofertilizantes e fontes de materiais orgânicos. A matéria orgânica do solo representa um sistema complexo de substâncias, cuja dinâmica é governada pela natureza e forma dos

compostos orgânicos, assim como pela sua transformação contínua sob ação de fatores biológicos, químicos e físicos. A matéria orgânica contém, em média, de 2 a 5 % do carbono orgânico, de 1 a 5 % do nitrogênio e de 2 a 20% do fósforo orgânico nos solos tropicais (Smith e Paul, 1990), sendo rica em bactérias, fungos e demais microrganismos do solo. Segundo Conte et al. (2002), a matéria orgânica também pode proteger as enzimas da decomposição. Na superfície do solo, a matéria orgânica também fornece nutrientes para as espécies vegetais, tendo influência na retenção de cátions, na estabilidade da estrutura do solo, na infiltração e retenção de água, na aeração do solo e na atividade da biomassa microbiana, constituindo-se, dessa forma, em um componente essencial da capacidade produtiva do solo e, conseqüentemente, das culturas (Santos e Camargo, 1999). Os microrganismos são fundamentais para o equilíbrio e sustentação dos ecossistemas terrestres e aquáticos, pois desempenham funções importantes, como ciclagem de nutrientes, decomposição de resíduos orgânicos, fertilização de solos, controle biológico e fixação biológica de nitrogênio, dentre outras. Por outro lado, podem acarretar problemas, como doenças às plantas, e produzir hormônios, mas longe de se comparar com os benefícios advindos pelos mesmos (Moreira e Siqueira, 2002). Ricci et al. (1999), estudando a influência do cultivo do café arábica, nos sistemas orgâVilso Júnior Santi

cultivo de café orgânico apresenta algumas vantagens, com destaques para o enquadramento no mercado solidário, proveniente da agricultura familiar e que preserva os recursos naturais; a ausência de barreiras ambientais; a existência de um mercado disposto a pagar de 30 a 50% a mais pelo produto, além da melhor saúde e satisfação dos agricultores envolvidos (Penteado, 2000). Contudo, existem limitações, como custo com a certificação; carência de técnicos e pesquisas na área; maior custo com mão-de-obra para a aplicação de fertilizantes orgânicos; dificuldade em conseguir preço diferenciado para o café Conilon; e a queda inicial da produtividade das lavouras, quando são convertidas para o orgânico (Partelli et al., 2006). Os mesmos autores verificaram, no Norte do Espírito Santo, que a expectativa de preços diferenciados, associada à preocupação com a saúde humana e ambiental, foi o fator que mais motivou a opção pela produção orgânica. Nesse estudo, a escolaridade dos casais de agricultores envolvidos na produção de café orgânico foi de oito anos, não existindo analfabetos entre eles, sendo o café, em média, responsável por 68% da renda agrícola e 51,1% da renda total dos agricultores.

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NÚMEROS DO CAFÉ Tabela 1 - Composição química média de algumas fontes de matéria orgânica (4a Aproximação do Espírito Santo, 2001) Fonte Esterco bovino Esterco de galinha Palha de café Palha de milho Lodo de esgoto

MO (%) 58 77 79 98 -

C/N 32/1 19/1 29/1 56/1 11/1

N 1,1 2,3 1,6 1,0 1,6

P 0,4 1,3 0,1 0,02 0,8

Macronutrientes (%) K Ca 0,9 0,7 1,71 2,12 2,15 0,39 0,05 0,06 0,2 1,6

Mg 0,3 0,47 0,12 0,11 0,6

S 0,2 0,2 0,2 0,2

Micronutrientes (mg/kg) Cu Zn Mn B 25 70 620 36 199 255 21 10 15 126 19 1 13 30 9 435 900 -

As concentrações são apresentadas com base na matéria seca. Este aspecto deve ser observado, pois na maioria das vezes o agricultor utiliza estes produtos com certa umidade. Esses valores podem variar em função de fatores como a qualidade da alimentação dos animais que fornecerão o esterco.

nico e convencional, sobre a população e a atividade de organismos do solo, observaram que a atividade microbiana foi superior no sistema orgânico, bem como o número de espécies de minhoca. Pesquisadores indianos (Akhtar e Malik, 2000) e espanhóis (Nico et al., 2004) relataram que a utilização de restos industriais não tóxicos e de produtos agríco-

las exerceram influência indireta sobre o controle de nematóides, por favorecer o desenvolvimento de microrganismos antagônicos a determinados nematóides. A utilização de matéria orgânica é uma realidade entre os agricultores orgânicos (Fotos 3 e 4) e, de acordo com Fernandes et al. (2000), pode substituir a adubação convencional (adubos altamente solúveis), desde que seja utilizada de forma equilibrada e balanceada. É sabido que a necessidade de adubação varia de acordo com a cultura, produtividade esperada e condições químicas e físicas do solo. Dessa forma, para a recomendação de adubação orgânica, Theodoro et al. (1999) sugerem os seguintes cálculos: X = A/{(B/100) x (C/100) x (D/100)} X = Quantidade de adubo orgânico a aplicar A = Necessidade do nutriente para a cultura B = Porcentagem de matéria seca do fertilizante C = Concentração do nutriente na matéria seca em porcentagem D = Índice de conversão em porcentagem (pode variar de 80 a 100%)

O SISTEMA

O

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Vejamos um exemplo: Quando se deseja aplicar 200 kg/ha de N na cultura, qual será a quantidade de esterco de galinha “curtido” necessário?

m todo o mundo, existem cerca de 23 milhões de hectares manejados organicamente, distribuídos em aproximadamente 400 mil propriedades e que movimentam, atualmente, cerca de US$ 30 bilhões. No Brasil, foram cultivados em 2001, 275,5 mil hectares, totalizando 14,8 mil produtores, isto sem considerar o recente acréscimo de cerca de 500 mil hectares de pastagens orgânicas (Darolt, 2003). A cafeicultura orgânica ocupa uma área de 13 mil hectares, envolvendo mais de 419 produtores (Ormond et al., 2002). (Fotos 1 e 2), sendo o México o maior produtor mundial de café orgânico. X = 200 /{(80/100) x (2,3/100) x (90/ 100)} X = 12 toneladas de esterco de galinha “curtido”. Vale lembrar que, além do N, os adubos orgânicos também apresentam outros nutrientes em quantidades expressivas (Tabela 1). Dessa forma, ao considerar o exemplo anterior, também se estará adicionando, aproximadamente, 100 kg/ha de K2O, além de outros macro e micronutrientes.

ADUBAÇÃO VERDE Apesar de as plantas espontâneas ocasionarem diversos efeitos prejudiciais sobre as lavouras, é possível que, quando bem manejadas, possam promover benefícios para os agroecossistemas. Geralmente, no início do crescimento das espécies espontâneas, elas podem proteger o solo, evitando a erosão e promovendo a ciclagem de nutrientes, devendo ser controladas com cultivos em faixa, roçadas e cultivo de leguminosas. A utilização de leguminosas (Fotos 5 e 6)

Charles Echer

s sistemas orgânicos de produção agropecuária adotam práticas, processos e tecnologias que otimizam o uso de recursos naturais e socioeconômicos, respeitando a integridade cultural e tendo por objetivo a auto-sustentação, a maximização dos benefícios sociais e a minimização da dependência de energias não renováveis. Neles, não é permitido utilizar insumos artificiais tóxicos, organismos geneticamente modificados, radiações ionizantes em qualquer fase do processo de produção, de armazenamento e de consumo, privilegiando a preservação da saúde ambiental e humana (Brasil, 1999). O manejo adotado nesses sistemas de produção deve ser economicamente viável, ecologicamente sustentável, socialmente justo e culturalmente aceitável. A agricultura convencional trouxe muito progresso para a ciência agronômica em termos da geração de conhecimentos e do aumento de produtividade a curto prazo. Entretanto, quando as culturas são exploradas de forma inadequada, isso pode levar a uma degradação do solo (Balota et al., 1998; Oliveira et al., 2003; Carneiro et al., 2004), trazendo problemas como perda de fertilidade, aumento do ataque de pragas e doenças nas plantas, decréscimos da qualidade ambiental pela contaminação de alimentos e degradação do ambiente (Paschoal, 1995). Nesse contexto, a agricultura orgânica desponta no início do século 21 como uma solução para reduzir parte desses problemas, podendo promover um desenvolvimento rural mais sustentável. (Penteado, 2000; Theodoro et al., 2003).

E

O cultivo orgânico utiliza resíduos vegetais e animais oriundos da própria unidade produtora depois de preparados para aplicação

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A

certificação é uma confirmação de que o produto foi produzido de forma orgânica, conferindo ao consumidor, a certeza do que está adquirindo, e ao produtor, um diferencial do seu produto. O primeiro passo para a certificação é o produtor ter interesse de produzir de forma orgânica. Em seguida, ele deve procurar informações sobre os procedimentos a adotar na propriedade e verificar quais as certificadoras existentes, suas normas, procedimentos de atuação e custos, a fim de selecionar a mais adequada. Escolhida a certificadora, é aconselhável fazer a filiação, e solicitar a visita de um técnico da mesma para fazer a inspeção da propriedade. Há muitas regras a serem seguidas (referentes ao processo de produção, assim como questões ambientais e sócio-econômicas), que são baseadas na legislação vigente e nas normas de cada certificadora. A

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No caso do cafeeiro, a utilização de culturas intercalares é mais indicada, pois possibilita a disponibilidade de nutrientes, principalmente de nitrogênio, durante grande parte do ciclo da cultura. Dessa forma, com o corte da leguminosa, o cafeeiro se beneficia da fixação desse nutriente pela leguminosa através da decomposição dos seus resíduos, que irão se decompor e liberar nutrientes durante o seu desenvolvimento (Castro et al., 2004). Prova disso é o trabalho de Ricci et al. (2005), que mostra que a Crotalaria juncea reciclou 444, 21, 241, 191 e 44 kg/ha de N, P, K, Ca e Mg respectivamente, e que a fixação biológica foi res-

Partelli apresenta os ganhos com a produção de café orgânico e as dificuldades ainda encontradas no sistema

ponsável por um aporte de N superior a 200 kg/ha, o que proporcionou maiores teores foliares do nutriente no tecido foliar do cafeeiro. Diante do exposto, nota-se que a agricultura orgânica é um segmento importante, crescente, rentável e de boa aceitação, o que a torna uma excelente alternativa para muitos agricultores e outros segmentos (indústria e comércio). Assim, a profissionalização na atividade, associada ao uso adequado de tecnologias, é fundamental para a sustentabilidade da atividade e, conseqüentemente, do agricultor. C Fábio Luiz Partelli e Henrique Duarte Vieira, UENF José Antônio Azevedo Espíndola e Marta dos Santos Freire Ricci, Embrapa Agrobiologia

Vilso Júnior Santi

aumenta o processo de ciclagem de nutrientes, promove a fixação biológica de nitrogênio atmosférico (Castro et al., 2004; Perin et al., 2004; Ricci et al., 2005), aumenta a densidade e a diversidade da biota do solo (Carneiro et al., 2004; Jordan et al., 2004) e diminui a densidade deste (Carvalho et al., 2004), além de reduzir a necessidade da aplicação de estercos e de compostos como fonte de nitrogênio. Assim, as leguminosas contribuem com a nutrição das culturas (Andreola et al., 2000; Heinrichs et al., 2002), proporcionando, conseqüentemente, a obtenção de maiores produtividades (Heinrichs et al., 2002; Spagnollo et al., 2002). Além disso, plantas de cobertura protegem o solo do impacto das gotas de água proveniente das chuvas e/ou irrigação, melhoram a infiltração e manutenção da água no solo, diminuem a infestação de plantas espontâneas, atenuam as oscilações térmicas, favorecem a solubilização de fósforo, diminuem a lixiviação de nutrientes, em especial o nitrogênio, aumentam a capacidade de retenção de nutrientes e, indiretamente, a estabilidade de agregados (Calegari et al., 1993; Espíndola et al., 2000; Souza e Pires, 2002). Entretanto, se mal manejadas, podem competir com as plantas de interesse econômico e hospedar pragas e/ou doenças (Souza e Pires, 2002), ocasionando queda da produção (Paulo et al., 2001; Heinrichs et al., 2002). Os efeitos da adubação verde variam de acordo com o clima, a espécie utilizada como adubação verde, a cultura de interesse econômico, as características do solo e o manejo adotado (Souza e Pires, 2002), daí a necessidade de se fazer um manejo adequado dessas plantas.

propriedade irá receber uma ou mais inspeções por ano, para atestar o cumprimento das normas e obter o selo que garante a qualidade do produto orgânico. A certificadora cobra uma taxa com custo variável, e mantêm um controle da sua emissão, para garantir o emprego correto do mesmo. As despesas da visita e/ou inspeção geralmente são definidas pela certificadora. Com a aprovação do relatório de inspeção, é feito um contrato de certificação entre o interessado e a certificadora, em que o primeiro se compromete em obedecer as normas de produção, e a segunda, a inspecionar a propriedade. Caso a propriedade não seja aprovada imediatamente, geralmente são apresentadas sugestões. Neste caso pode-se firmar um contrato de transição, ou seja, um período de conversão para a agricultura orgânica, com o compromisso de cumprir as etapas sugeridas.

Divulgação

CERTIFICAÇÃO

Utilização de leguminosas como cultura intercalar é excelente devido à liberação de nutrientes para o cafeeiro e auxílio para fixação biológica do N

Cultivar • www.cultivar.inf.br • Outubro de 2006


Agronegócios

Qualidade dos alimentos

N

o limiar do novo século, a sociedade exige padrões cada vez mais rígidos de qualidade de alimentos. Embutida na qualidade, a inocuidade constitui um de seus principais atributos. Cada vez menos a sociedade tolera contaminantes químicos, físicos ou biológicos. Atropelada pela globalização que eliminou espaços geográficos e comprimiu o tempo, a ciência opera em duas grandes vertentes, para garantir alimentos de qualidade superior. De uma parte, os cientistas desenvolvem métodos e processos para garantir a pureza e a identidade dos alimentos, emoldurados pelos sistemas de certificação e rastreabilidade. De outra parte, os métodos e equipamentos analíticos tornam-se cada vez mais sofisticados e precisos, para garantir a credibilidade e assegurar a confiança do consumidor.

ATUALIDADE Destarte o avanço logarítmico da ciência, nos últimos anos, podemos nos considerar na pré-história dos sistemas de sanidade e segurança de alimentos, face ao que a mesma ciência promete para um futuro próximo. Atualmente, se uma planta ou um animal é infectado por uma praga, podem demorar dias, meses ou mesmo anos (como é o caso da BSE) até que os sintomas se tornem evidentes. Por vezes, não há como evitar epidemias altamente destrutivas (como a gripe do frango), devido à alta patogenicidade dos agentes e à demora para o surgimento dos primeiros sintomas. Em outros casos, pragas que poderiam ser controladas com custos marginais oneram em demasia o sistema de produção, pois, quando são detectadas, já estão amplamente distribuídas. Atualmente, o controle exige aplicações generalizadas de agrotóxicos, pois não é factível delimitar com precisão as plantas afetadas.

NOVA ERA Um conjunto de novos materiais e processos está sendo desenvolvido para atender à demanda social de maior qualidade. Podem-se identificar três grandes linhas de pesquisa na área de segurança de alimentos: a) Desenvolvimento de nanossensores para identificar contaminantes, sejam eles patógenos, resíduos químicos ou traços de radioatividade;

Cultivar • www.cultivar.inf.br • Outubro de 2006

b) Nanorregistradores, que permitirão efetuar todo o registro de produção, processamento, embalagem, transporte e armazenamento dos alimentos, incluindo as condições do ambiente de produção ou trânsito. c) Sistemas inteligentes, que transmitem informações e tomam decisões, atuando como controle remoto para interferências destinadas a garantir a segurança dos alimentos. Como sinais deste futuro, podem-se imaginar microssensores que monitoram, a cada minuto, a febre de um animal, remetendo as informações para sistemas de alerta, identificando com segurança os animais com distúrbios. Ou, então, nanoequipamen-

“Será possível detectar, pela leitura genômica de cada indivíduo, sua predisposição a determinadas moléstias, em especial àquelas diretamente derivadas de sua carga genética”

tos que monitorarão fluídos orgânicos, como sangue ou saliva, analisando componentes críticos, que denunciam distúrbios orgânicos ou a infecção por patógenos. Assim, as medidas de controle sanitário ou a prevenção do efeito de estresses abióticos (seca, deficiências minerais) poderiam ser adotadas antes do surgimento dos sintomas em macro-escala, quando parte dos danos já seria irreversível, e o custo, mais oneroso.

AVANÇOS Será possível detectar, pela leitura genômica de cada indivíduo, sua predispo-

sição a determinadas moléstias, em especial àquelas diretamente derivadas de sua carga genética. A reprodução animal, garantindo a perpetuação de características desejáveis e bloqueando a herança de características desfavoráveis, experimentará um salto ponderável. A aplicação de agrotóxicos se tornará mais precisa, pela identificação de traços de substâncias voláteis liberadas por insetos, cuja concentração no ar seja proporcional à população do inseto. Os nanobioprocessadores permitirão o aproveitamento do que hoje é considerado lixo ou entulho ambiental (esterco, cascas, restos de processamento ou colheita), tornando mais efetivos e baratos os processos de conversão para obtenção de energia ou fertilizantes. Estudos estão sendo realizados com nanocatalisadores para a obtenção de biocombustíveis e biossolventes, a partir de óleos vegetais, de forma mais rápida, econômica e segura.

ESTRUTURAS Grupos de cientistas estão se dedicando ao desenvolvimento de embalagens e envoltórios específicos para alimentos. Os envoltórios deverão conter microssensores que acusam condições inadequadas de manuseio, transporte ou armazenagem, em especial temperaturas fora das especificações. Também conterão detectores dos principais patógenos contaminantes de alimentos, que possam causar problemas à saúde dos consumidores. Existem pesquisas em andamento para embalagens que se “auto-constituirão”, a partir de determinadas estruturas moleculares, embalando os alimentos sem contato com fontes de contaminação. As embalagens também conteriam estruturas que impediriam a contaminação dos alimentos por patógenos, até o momento do consumo. Parece cada vez mais crível o conceito de Big Brother, visão futurística de George Orwell, em seu livro “1984”. O que o autor não antecipou foi o fato de que o Big Brother primeiro se manifestará na escala molecular, para depois surgir na macro-escala. C Décio Luiz Gazzoni Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja www.gazzoni.pop.com.br

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Mercado Agrícola

Brandalizze Consulting

brandalizze@uol.com.br

Quadro mundial favorável em 2007 O ano está passando, e agora estamos na reta final de 2006; para muitos produtores pode ter sido o pior de todos, porque tivemos forte queda no câmbio e cotações baixas em quase todos os produtos agrícolas colhidos. Até mesmo o setor da cana-de-açúcar reclama de caixa baixo, mas todos os produtos estão atrelados ao câmbio, que favorece as importações em detrimento da produção interna. Mas pelo que se observa no quadro para a safra nova, estamos na fase de mudanças, porque, mesmo que o governo continue represando a moeda no fundo do poço, os indicativos internacionais estão sinalizando alta: estudos que aparecem todas as semanas mostram que o milho estará em alta, porque tem grande demanda mundial, e a produção não consegue acompanhar. Dessa forma, poderá não haver todo o cereal necessário para produção de álcool e ração. O arroz também sinaliza grande queda dos estoques mundiais, porque não consegue produzir para suprir o consumo, e agora também o trigo mostra a maior queda de estoques vista até hoje, que passa das 146 para as 126 milhões de t e assim também mostra cotações em alta. O clima tem sido irregular pelos quatro cantos do mundo, e, dessa forma, os produtos agrícolas estão mostrando uma retomada no crescimento das cotações. Muitos olham somente para a soja como fator de preços agrícolas, mas esta representa apenas 10% da produção e consumo global dos grãos, e sempre que há já escassez nos demais, também a cultura da soja será beneficiada. O quadro mundial de oferta e demanda de grãos mostra uma produção de 1,98 milhões de t para esta safra 06/07, contra um consumo superior a 2,04 milhões de t, ou seja, há forte queda nos estoques mundiais, e já se aponta que em 2008 o mundo estará em mais de 2,1 milhões de t. Assim o buraco tende para a casa das cem milhões de t, favorecendo as cotações internacionais. Como a economia mundial cresce na ordem de 5% ao ano, essas correções nos preços dos alimentos serão facilmente absorvidas, favorecendo os produtores. MILHO Alta chegando com a entressafra O mercado, que vinha em ritmo lento até agosto, agora mostra as primeiras alterações no lado positivo das cotações, com pressão que chega de todas as regiões produtoras e espaços para novos ajustes nos próximos meses. Com o governo sinalizando que irá começar a vender seus estoques para não deixar as cotações dispararem, tudo caminha para termos ganhos de R$ 2 ou R$ 3 por saca antes de dezembro. SOJA Divórcio dos mercados favorece produtor Os produtores que seguram a soja para negociar neste final de ano podem ter alguns ganhos nas cotações, porque estamos vendo as ofertas se escassearem, e, dessa forma, os compradores terão que pagar níveis maiores do que liquida a exportação. Isso já estava ocorrendo em setembro, com níveis de 5% acima, e poderemos ver os patamares esticarem um pouco mais e chegarem à marca dos 15%, fato esse que em anos anteriores era comum ocorrer, mas que há dois anos não tem se verificado, porque a safra do Brasil cresceu e muita soja vinha sendo retida para ser negociada no segundo semestre. Agora com os pregões de Pesoja e de Pepro, grande parte do grão foi negociada com prêmios, e resta pouco para ser negociado até a nova safra, com indicativos de que tenhamos menos de 15% da safra para ser comercializada até o início da nova colheita. As negociações com a safra nova continuaram abaixo das expectativas do mercado, e os produtores, realizando alguns fechamentos via adiantamento de recursos atrelados a insumos com a fixação do grão livre para os próximos meses. FEIJÃO Novamente um bom negócio Os produtores que plantaram as lavouras da safra de verão no Sul e Sudeste não esperavam que teriam boa remuneração pelo feijão, porque o mercado em julho e agosto esteve em marcha lenta e com cotações fracas, chegando a negociar nos R$ 40, ou seja, abaixo do preço mínimo. Agora foram surpreendidos por forte alta nas cotações e já negociam entre os R$ 75 e R$ 85, podendo ir acima, porque tem pouco produto sendo ofertado, como

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já vínhamos indicando que em outubro haveria um buraco no abastecimento e assim dando suporte para a safra de verão. A quebra de safra do Nordeste, que vinha em boas condições, mas teve excesso de chuvas no final do ciclo, teve baixa qualidade e baixa produtividade, sinalizando boas condições para o setor nos próximos meses. Outro fator de alta veio dos produtores do feijão irrigado, que plantaram poucas áreas, deixando parados os pivôs movidos a diesel. Os mais otimistas já estão vendo o feijão de melhor qualidade batendo a marca dos R$ 100 nas próximas semanas. ARROZ Governo vendendo estoques no MT O mercado do arroz se manteve com pou-

cas alterações nas últimas semanas, com o produto no Sul rondando os R$ 20/22 e um pouco acima disto para o nobre do Litoral Norte, mantendo-se firme nos estados centrais, onde o sequeiro está escasso. Dessa forma, do dia 21 de setembro em diante, o Governo começou a vender os estoques que tem no MT, para atender às necessidades das indústrias locais, mesmo assim as cotações do arroz de agora em diante devem começar a dar sinais de reação, porque as ofertas tendem a escassear, e após o plantio certamente a pressão será maior, porque os produtores irão segurar o pouco que lhes restar à espera de números mais rentáveis. Estamos entrando no período de alta.

CURTAS E BOAS ARROZ - a FAO, órgão das Nações Unidas, informou que o consumo mundial do arroz crescerá das 618 milhões de t em 2005 para as 771 milhões de t na base do casca em 2030, isso basicamente atrelado ao crescimento da população mundial, que sinaliza uma tendência média de avançar 70 milhões de pessoas por ano. Sinal de que temos grande espaço nos próximos anos, e para isso temos que desenrolar o Brasil, que vive uma fase de escândalos semanais. TRIGO - o USDA divulgou o seu novo relatório de oferta e demanda mundial, com 596 milhões de t contra o consumo superando a marca das 616 milhões de t, ou seja 20 milhões de t acima, sinalizando que segue em crescimento. Dessa forma, cotações em alta no mercado internacional, que indicam liquidação no Brasil acima dos US$ 220 por t e níveis acima dos US$ 250 nos próximos meses. A safra brasileira foi fortemente afetada pelo clima, que mostrou geadas fortes em todas as regiões produtoras, e dessa forma já se comenta colher duas milhões de t, contra mais de quatro milhões das primeiras estimativas. O Brasil caminha para ser o maior importador mundial, superando as oito milhões de t no próximo ano. ALGODÃO - a colheita da safra brasileira encerrou neste mês de setembro. O quadro futuro mostra condições melhores do que o que passamos nestes últimos dois anos, porque agora o consumo caminha para números bem acima da produção, que está indicada em 25 milhões de t em 06/07, frente ao consumo de 26,2 milhões de t, e assim queda nos estoques e apoio nas cotações futuras. O algodão vem mostrando uma nova fase de crescimento no consumo. Com isso poderá ter crescimento do plantio no Brasil nesta nova safra, que caminha para ser uma boa alternativa para os produtores. EUA - a colheita está a todo vapor, com os produtores indicando que a soja pode fechar acima das 84,1 milhões de t apontadas pelo USDA em setembro. Agora os comentários são de níveis de 86 e até 87 milhões de t, dos mais otimistas. Em contrapartida o milho poderá recuar, porque tem indicativos de produtividade abaixo das expectativas e pode ter reduzida a produção e assim criar apoio contra queda nas cotações da soja. CHINA - voltou às compras mais cedo do que estava previsto, com mais de dez navios negociados, contrariando comentários anteriores de que só voltaria na segunda quinzena de outubro. O aumento das compras vem em decorrência da queda da safra local, que agora mostra 16,2 milhões de t contra 16,7 apontados no final de agosto.

Cultivar Cultivar •• www.cultivar.inf.br www.cultivar.inf.br •• Fevereiro Outubro de 2005 2006




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