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Tratores
Não é só lastrar
Na hora de lastrar o trator, é necessário tomar alguns cuidados com a simplificação da operação, a fim de evitar erros que além de desequilibrar a distribuição de peso, pode comprometer a tração e aumentar a compactação do solo
No Brasil, o avanço da mecanização é uma realidade constante. Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) foram comercializados 35.369 tratores de roda no período 2019/2020. Analisando o anuário de tratores 2021/2022 da revista Cultivar Máquinas, em que foram levantados 281 modelos de tratores agrícolas de 17 marcas que atuam no mercado brasileiro, vemos que os modelos 4x2 Tração Dianteira Auxiliar (4x2 TDA) são os mais comercializados.
O desempenho de um trator agrícola é diretamente proporcional à sua eficiência de tração, que acontece com a interação entre o pneu e o solo onde ele opera. Uma maior eficiência de tração significa melhor transmissão da potência fornecida pelo motor para a potência requerida pelo implemento.
Uma das principais formas para aumentar a eficiência de tração dos tratores agrícolas é a lastragem, isto é, pesos que são adicionados no trator para aumentar a aderência entre os rodados e o solo. O equilíbrio de peso deve estar próximo de uma distribuição de 40% do peso total nas rodas dianteiras e 60% nas traseiras, essa recomendação se aplica aos tratores 4x2 TDA, tendo em vista a geometria de projeto do trator, com as rodas traseiras de maior diâmetro e que são mais requisitadas na tração.
A lastragem deve ser feita de modo correto para aumentar a eficiência de tração do trator. A aplicação incorreta da técnica leva a consequências negativas. Uma lastragem insuficiente acarreta em aumento no consumo de combustível, maior desgaste dos pneus e aumento da patinagem; já uma lastragem excessiva faz com que se aumente o peso sobre a transmissão do trator e nos pneus, logo, há um aumento no consumo de combustível, além do desgaste mais rápido da transmissão e também maior compactação do solo devido ao peso.
Os lastros em tratores agrícolas são geralmente de duas formas: lastro sólido, que são pesos aplicados diretamente na roda ou no eixo do trator e também em suportes que possibilitam a adição de componentes de pesos, e lastro líquido, que é o enchimento do pneu por um líquido, geralmente água, até uma certa capacidade.
Para se realizar o equilíbrio correto do trator através da lastragem, devemos imaginar o trator como uma gangorra, em que cada peso colocado gera uma força vertical onde está sendo aplicado, e um momento, quando não aplicado diretamente sobre os eixos do trator, a aplicação correta do lastro leva ao equilíbrio de pesos nas rodas de tração. Para um peso adicionado fora dos pontos de apoio do trator, que seriam os pontos de contato do pneu com o solo, tem que se levar em con-
ta o aparecimento de um momento, que nada mais é do que um torque, força multiplicada pela distância ao ponto de aplicação. Avaliando-se o esquema do trator com o peso dianteiro aplicado fora do ponto de apoio, este momento faz com que apareça uma força de reação retirando peso da roda traseira, esse é o sistema de gangorra que precisa ser avaliado, ou seja, quando se adiciona peso no suporte dianteiro, com pesos fora do ponto de apoio, é gerada uma força que diminui o peso na roda traseira.
Em um workshop sobre equilíbrio operacional de trator e adequação ao implemento agrícola com a equipe de preparo de solo, realizado na usina CerradinhoBio, localizada no município de Chapadão do Céu (GO), juntamente com o especialista em mecanização Douglas Rocha (coordenador KAM-AGCO do Brasil), onde foi abordado o tema “Lastragem e equilíbrio operacional de tratores”, utilizou-se um equipamento da marca Valtra, modelo T230 CVT com pneus traseiros 710/70 R38 e pneus dianteiros 600/65 R28 para exemplificar. Alguns dados foram medidos com a balança de sapatas e outros estimados através de cálculos.
O trator, calculado sem nenhum peso, chegou aos valores de 2.320kg para o eixo dianteiro e 4.650kg para o eixo traseiro, o que dá um peso total de 6.970kg. Nessas condições, o trator está com 33% do peso total nas rodas dianteiras e 67% nas traseiras. (Figura 1)
A necessidade de se aumentar o peso de um trator está ligada ao tipo de es-
Fotos Charles Echer
Os lastros nos rodados podem ser com acréscimo de água no interior dos pneus ou pesos metálicos nos rodados
forço que ele realizará no trabalho, no caso, o trator seria utilizado para tracionar um implemento que faz a sulcação do terreno e uma aplicação de matéria orgânica dentro desses sulcos. Essa operação é conhecida nas usinas como “plantar torta de filtro”, pois a matéria orgânica utilizada é o resíduo do filtro por onde passa a garapa, que é colocada dentro de um sulco aberto na terra, para melhorar a condição do solo na camada subsuperficial.
Sabendo o implemento e a atividade a ser executada, a lastragem é baseada em cima da força de tração necessária para arrastar o implemento, sendo essa calculada através de normas como a Asae D497 ou medida experimentalmente com uma célula de carga aplicada na barra de tração.
A partir dessa necessidade de esforço para tracionar esse implemento, notou-se a necessidade de adicionar pesos e assim foi feito, colocando-se pesos como os lastros líquidos. Nos pneus foi adicionada água até 75% de seu volume, e o valor dos pesos adicionais que isso acarreta foi levantado do catálogo do fabricante, que aponta para um peso de 810kg nos pneus traseiros e 420kg nos pneus dianteiros.
Com a necessidade de mais pesos, lastros sólidos foram adicionados no eixo traseiro, que são as “anilhas de metal” que o fabricante de tratores fornece. No eixo traseiro foram colocados
Figura 1 - Distribuição de peso e equilíbrio do trator
640kg por roda, dando um peso a mais de 1.280kg no eixo.
Esses pesos adicionais não geram momento, pois são adicionados diretamente nos pontos de apoio do trator, gerando, portanto: no eixo traseiro havia um peso inicial = 4.650kg mais lastro líquido 2 x 810kg (são os dois penus que são adicionados de água) = 1.620kg e mais o peso sólido = 1.280kg => Total eixo traseiro de 7.550kg. No eixo dianteiro havia peso inicial = 2.320kg mais lastro líquido 2 x 420kg = 840kg => Total eixo dianteiro de 3.160kg.
Para essa condição, teríamos peso total do trator de 10.710kg com 29,5% do peso no eixo dianteiro e 70,5% do peso no eixo traseiro. Repare que a distribuição nessa etapa ficou pior do que sem lastro, pois devemos tentar nos aproximar de 60% traseiro e 40% dianteiro para atender ao projeto do trator com relação ao seu poder de tração.
Colocando o lastro sólido de 18 pesos de 55kg no suporte dianteiro, vemos a interação do trator como uma gangorra em funcionamento, pois esses 990kg geram um momento no
Fotos Vinicius S. Ferreira
Exemplos de lastro sólido e lastro líquido
eixo dianteiro do trator, de modo a alterar o peso traseiro e dianteiro do trator. Sabendo que a distância entre o suporte dianteiro e o centro do pneu traseiro é de 1m e a distância entre os eixos traseiro e dianteiro é de 3m, é possível fazer a somatória de momentos no eixo dianteiro, conforme a fórmula na página seguinte.
Logo, para os 990kg de lastro aplicados no suporte dianteiro, 660kg causam uma força no eixo dianteiro e os outros 330kg causam uma força contrária no eixo traseiro, alterando o equilíbrio estático do trator para 7.220kg no eixo traseiro e 3.820kg no eixo dianteiro.
Com essa distribuição de lastro, chegamos ao equilíbrio estático por volta de 35% de peso dianteiro e 65% de peso traseiro para o trator (Situação 1), sendo esse um bom valor para o equilíbrio do trator, considerando que o implemento usado tem o acoplamento na barra de tração e se beneficia de um maior peso
Figura 2 - Distribuição de peso com o lastro aplicado no suporte dianteiro
Situação 1 Situação 2
O trator foi inicialmente pesado sem nenhum peso adicional, para isso foi utilizada uma balança de sapatas para se obter o peso dianteiro e o traseiro
traseiro. Porém, poderíamos obter um equilíbrio próximo de 60% de peso no eixo traseiro e 40% de peso no eixo dianteiro retirando o lastro sólido dos pneus traseiros.
Como o trabalho que foi planejado era com a utilização da carreta sulcadora e distribuidora de torta de filtro, foi realizada uma pesagem com a balança de sapatas com o implemento acoplado. Como esse implemento causa uma força vertical na ponta da barra de tração, foi necessário fazer uma nova pesagem com o implemento desacoplado, dando uma diferença de peso vertical de 2.240kg, que no caso correspondia ao peso aplicado pelo implemento no eixo da roda traseira.
Fazendo as contas novamente do equilíbrio estático, concluímos que o peso traseiro ficou com 7.220kg, mais 2.240kg, num total pesado de 9.460kg, e no dianteiro calculamos 3.600kg. Note que é menor devido ao efeito da gangorra: acrescendo um peso na ponta da barra devido ao acoplamento do implemento, a frente vai diminuir seu peso. Temos um total de 13.060kg e chega-
Obs. Aceleração da gravidade de 9,81 m/s termos Força multiplicado por Distância que seria o momento gerado. mos ao resultado de que o trator ficará com 27,5% do peso total na dianteira e 72,5% na traseira (situação 2), isso demonstra que o equilíbrio estático piorou com o acoplamento do implemento. Essas forças e momentos causados pelo implemento na barra de tração também alteram a configuração do equilíbrio estático de pesos do trator de modo que é necessário um novo cálculo para readequar a lastragem.
Portanto, vemos que a lastragem correta deve ser feita utilizando-se dados sobre o equilíbrio estático de pesos do trator, mas, levando em conta informações do implemento a ser utilizado, onde cada implemento apresenta uma força na barra de tração requerida diferente, isso vai alterar o equilíbrio operacional. Ou seja, quando o trator estiver trabalhando e gerando uma força T, força essa necessária para arrastar o implemento, devemos levar em conta os momentos gerados por ela e refazer os cálculos para a aplicação do lastro, assim, é necessário balancear esses momentos para obtermos o equilíbrio de pesos desejado no momento em que o trator está operando para atingir maior eficiência de tração no trator.
Esse tipo de checagem e regulagem precisa ser estendido para outras atividades do setor canavieiro, como a operação com transbordo de cana, plantadoras de cana, tanques de aplicação localizada de vinhaça, pois são atividades que requerem grandes esforços e alto consumo de combustível. Se os tratores que trabalham nessas operações não estiverem devidamente equilibrados, os prejuízos se multiplicam. .M
Vinicius S. Ferreira Cezario B. Galvão Angel P. Garcia Daniel Albiero e Gabriel A. C. de Moraes, Feagri – Unicamp - AgrPerforma
Figura 3 - Equilíbrio estático do trator