DESMATAMENTO
NA AMAZÔNIA MATO-GROSSENSE
DESMATAMENTO
NA AMAZÔNIA MATO-GROSSENSE (PRODES/2015) ANÁLISE DAS CARACTERÍSTICAS DO DESMATAMENTO E DAS POLÍTICAS PÚBLICAS IMPLEMENTADAS
JANEIRO | 2016
DESMATAMENTO
NA AMAZÔNIA MATO-GROSSENSE
SUMÁRIO EXECUTIVO O estado de Mato Grosso é um estado chave na Amazônia brasileira para conciliar a produção agropecuária e a redução do desmatamento. Essa equação é fundamental para diminuir o papel das emissões da agropecuária e das mudanças no uso da terra nas mudanças climáticas globais. Entre 2005 e 2014, Mato Grosso reduziu o desmatamento na floresta amazônica em 87%, ao mesmo tempo em que mais que duplicou seu produto interno bruto (PIB). Em 2015, no entanto, o Prodes CARACTERÍSTICAS »» Apesar da redução do desmatamento desde 2005, frentes de desmatamento ilegal permanecem ativas em MT; »» 20 municípios de MT concentram mais de 70% do desmatamento; »» A maior parte dos desmatamentos em áreas identificadas ocorre em propriedades privadas, com 60% dos polígonos localizados em grandes propriedades (> 15 MF); »» Polígonos grandes (>100ha) representam 41% da área desmatada; »» Infratores estão apostando no desmate ilegal mesmo se registrando no Cadastro Ambiental Rural.
detectou um desmatamento total de 1.508km², a maior taxa anual desde 2008. Neste documento apresentamos as características do desmatamento detectado pelo Prodes de Agosto de 2014 a Julho de 2015, além das principais medidas implementadas até hoje para reduzi-lo. Também formulamos recomendações para conseguir uma redução significativa e duradoura do desmatamento. A Estratégia “Produzir, Conservar e Incluir” apresentada na COP21 contempla parte dessas recomendações.
POLÍTICAS PÚBLICAS IMPLEMENTADAS »» A fiscalização estadual aumentou e a fiscalização federal se manteve estável; »» O Código Florestal está sendo implementado lentamente; »» Ações inéditas estão sendo implementadas junto aos municípios.
O QUE PRECISA SER FEITO? »» Publicar a Lista de Desmatamentos Ilegais e embargos; »» Implementar o Código Florestal através da validação do CAR, a restauração e compensação dos passivos ambientais; »» Envolver os municípios no combate ao desmatamento; »» Disponibilizar os dados do CAR, de licenciamento, e de fiscalização ambiental ao público; »» Estabelecer novos incentivos privados para uma agricultura sem desmatamento. »» Intensificar as ações de comando e controle
CARACTERÍSTICAS DO DESMATAMENTO NA AMAZÔNIA MATO-GROSSENSE EM 2015 De 2009 a 2014, o desmatamento no bioma amazônico de Mato Grosso oscilou em torno de uma média de 1.000 km² por ano. Em 2013 e em 2015 aumentou (em relação ao ano anterior) 50% e 40%, respectivamente (Figura 1). Embora ainda seja um desmatamento reduzido se comparado com as taxas de 2005 a 2008, a permanência de um desmatamento de 1.000 km² e os aumentos detectados em 2013 e 2015 comprovam que o desmatamento ainda não está sob controle no Estado de Mato Grosso. Ano após ano, a concentração do desmatamento detectado pelo Prodes em 20 dos 141 municípios
de Mato Grosso tem caracterizado claramente fronteiras ativas de desmatamento. Em 2015, 72% dos polígonos de desmatamento foram detectados em 20 municípios do estado, enquanto apenas 10 desses foram responsáveis por 52% de todo o desmatamento em Mato Grosso (Figura 2). Nesse contexto, o caso de Colniza, município do noroeste do estado, é um exemplo emblemático: Em 2015, o seu desmatamento representou mais de 17% do desmatamento no estado, e a maioria dele se concentrou em áreas não identificadas, demonstrando claramente a necessidade do cadastramento ambiental e da regularização fundiária.
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FIGURA 1 | Regiões de concentração do desmatamento em Mato Grosso (Fonte: Prodes/Inpe)
O tamanho dos polígonos de desmatamento no estado de Mato Grosso e na Amazônia tem reduzido nos últimos 5 anos. Em 2015, de 5.107 polígonos de desmatamento identificados em Mato Grosso pelo INPE, 4.593 (89%) foram iguais ou menores a 50 ha. Concomitante a isso, a detecção do Prodes de 2015 aponta um aumento dos polígonos de desmatamentos de mais de 100 ha. O número dos desmatamentos deste tamanho aumentou em 82% entre 2013 e 2015, e apesar deles representarem 25% de toda área desmatada em 2013, em 2015 essa proporção aumentou 64%, totalizando 41% dos polígonos. Propriedades rurais e áreas não identificadas contiveram 95% dos polígonos maiores de 100 ha em 2015.
Em 2015, 47% do desmatamento, 638km², foi detectado em áreas sem categoria fundiária identificada. Outros 35% (536 km²) do desmatamento aconteceu em propriedades privadas, e 17% (245 km²) em assentamentos. Já em terras indígenas e nas unidades de conservação, houve desmatamento respectivo de 6,74 km² (0,5%) e 5,38km2 (0,4%). A análise da área desmatada nas diferentes categorias fundiárias nos últimos anos mostra que o recente aumento do desmatamento de 25% aconteceu em propriedades privadas e em áreas sem categoria fundiária definida (Figura 4). Entre as propriedades privadas, 60% (1.055) dos polígonos foram detectados em propriedades grandes, com mais de 15 módulos fiscais2 (Tabela 1).
DESMATAMENTO
7,000
18,628
6,000
15,967
5,000
13,306
4,000
10,645
3,000
7,983
2,000
5,322
1,000
2,661
0
0 2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
Mato Grosso
2012
2013
2014
2015
Amazônia Legal
FIGURA 2 | Evolução do desmatamento de 2005 a 2015 (Fonte: Prodes/Inpe).
60,000
40,000 30,000
2012/2013
2013/2014 Polígonos de 0 a 50 ha
2014/2015 Polígonos de 50 a 100 ha
Polígonos de 100 a mais que 1000 ha FIGURA 3 | Área desmatada por tamanho de polígonos de 2013 a 2015 (Fonte: Prodes/Inpe).
55666
19498
59552
36550
14620
56330
0
29386,2
10,000
16971,1
20,000 67542,7
Área em hectares
50,000
Amazônia Legal
Mato Grosso
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TABELA 1 | Polígonos de desmatamento por tamanho em propriedades privadas.
Até 10 ha
10 a 30 ha
30 a 50 ha
50 a 100 ha
100 a 300 ha
Maior que 300 ha
Grande (>15MF)
531
293
91
65
57
18
Médio (4 a 15MF)
229
82
1976
1958
20
4
Pequeno (< 4MF)
225
60
1976
1958
10
Total
985
435
1976
1958
87
22
60,000 55,000 50,000
Área desmatada em hectares
45,000 40,000 35,000 30,000 25,000 20,000 15,000
Prodes 2012/2013 Assentamentos
Prodes 2013/2014 Imóveis rurais cadastrados no Simlam Terra Indígena
Unidade de Conservação
FIGURA 4 | Áreas desmatada (hectares) por categorias fundiárias (Fonte: Prodes/Inpe)
Prodes 2014/2015 Área sem categoria fundiária
502
638
63779
47933
21863
215
968
46548
36550
0
55811
26197
0
28475
5,000
23328
3417
10,000
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O aumento do valor da carne bovina de 26,5% em 2014 e 13,8% em 2015, associado a especulação imobiliária sobre a terra são possíveis motivos desse aumento da área produtiva em grandes propriedades. Segundo declarações da Secretaria Estadual de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema-MT) baseadas em dados ainda não disponibilizados ao público, 60% do desmatamento teria acontecido dentro de áreas que possuem Cadastro Ambiental Rural (CAR) no Sicar, nos moldes do Novo Código Florestal. A diferença de percentual entre a base de
outubro de 2014 do Simlam e a base de novembro de 2015 do Sicar indica uma aposta dos infratores em uma hipotética regularização dos crimes ambientais a partir do CAR. A Sema declarou também que 8% dos desmatamentos teriam sido legalmente autorizados. Finalmente, de acordo com o levantamento dos polígonos de desmatamento nas áreas de reservatório das usinas hidrelétricas licenciadas e num raio de 20km² dessas usinas, 7 km² de desmatamento são imputáveis à geração de energia hidrelétrica3, o que representa apenas 0,5% do desmatamento de 2015.
O QUE FOI FEITO EM 2015 PARA CONTROLAR O DESMATAMENTO? Dados levantados na Secretaria Estadual de Meio Ambiente mostram que a atuação da fiscalização aumentou em número de autos de infração e em área. De 2013 a 2015, a área das autuações por infrações florestais passou de 130km² a 658km². O número de embargos também aumentou de 54 para 214 (Figura 5). A fiscalização do Ibama em Mato Grosso continua com índices mais elevados do que a fiscalização estadual. De 2013 a 2015 foi emitida uma média anual de 1074 autos de infração florestais, e embargadas uma média de 480 áreas por ano. A implementação do Código Florestal, responsabilidade compartilhada dos governos estadu-
al e federal, está lenta em Mato Grosso como no resto do Brasil. Até outubro de 2015, 77% da área cadastrável no estado tinha sido cadastrada no CAR4, mas o módulo de validação pilotado em Mato Grosso somente tinha sido testado em um número reduzido de propriedades. Sem a validação, o CAR não consegue atuar como instrumento de regularização ambiental e tem um papel limitado para o controle do desmatamento. Além disso, ainda faltavam a regulamentação do Programa Ambiental Rural estadual e o estabelecimento do sistema de acompanhamento e monitoramento dos compromissos de restauração e compensação ambiental.
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1,400
1,200
1,000
800
600
400
200
0 2013 Desmatamento(km2)
Prodes 2013/2014
Prodes 2014/2015
Número de operações de fiscalização (Ibama)
Número de embargos (Ibama) Área fiscalizada (Sema-km2)
Área fiscalizada (Ibama-km2)
Número de operações de fiscalização (Sema) Número de embargos (Sema)
* dados indisponíveis
FIGURA 5 | Produtividade da fiscalização do Ibama/MT e da Sema/MT de 2013 a 2015 (Fonte: Ibama/MT e dados coletados com a Sema/MT)
Para regulamentar a atividade rural em Mato Grosso, o Estado estabeleceu em Agosto de 2015 a Autorização Provisória de Funcionamento de Atividade Rural (APF) através do decreto estadual 230/2015 e da Instrução Normativa 09/2015. De 2015 a 2017, enquanto o Estado prepara um sistema de licenciamento com critérios claros e integração ao Sicar, a APF deve permitir o estabelecimento de um cadastro declaratório das atividades rurais e possibilitar o desembargo das áreas embargadas por falta de licença ambiental ou por desmatamento em área passível antes de julho de 2008. No sistema online disponibilizado pela Sema/MT, áreas desmatadas sem autorização detectadas pelo Prodes são automaticamente bloqueadas para
efeito de requerimento da APF. Segundo informações da Sema/MT de outubro de 2015, desde sua implementação, em agosto de 2015, foram solicitadas 1.907 APFs e emitidas 1.482. Dessas 1.482 APFs emitidas, somente uma levou ao desembargo de uma propriedade. Em nível municipal, o Programa Municípios Sustentáveis (PMS), criado em 2014, está em fase de implementação. Hoje, os municípios que aderiram ao PMS ainda têm grande participação no desmatamento do estado (58%), mas existe um novo protagonismo desses locais e, através do PMS, planos de ação foram neles estabelecidos para canalizar a atuação dos membros do programa em cada município apoiado.
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QUAIS AS RECOMENDAÇÕES PARA CONTROLAR O DESMATAMENTO? O desmatamento detectado em Mato Grosso demonstra que as ferramentas atuais para o controle e a redução do desmatamento não estão cumprindo plenamente o seu papel. Para corrigir essas falhas, as nossas recomendações trilham dois caminhos interdependentes: 1) melhorar a implementação das políticas de comando e controle e 2) criar uma agenda positiva que envolva políticas públicas e iniciativas privadas. Parte dessas recomendações estão contempladas na estratégia “Produzir , Conservar e Incluir” elaborada pelo governo e várias instituições do setor privado e sociedade civil, como IPAM e ICV, entre outras.
3. Implementar o Código Florestal. Isso significa
ir além de registrar as propriedades no CAR, verificando e validando as informações, publicando as regras do Programa de Regularização Ambiental (PRA), criando incentivos para recuperação e notificando quem desmatou ilegalmente na base do CAR. O Código Florestal implementado é a base para o controle do desmatamento ilegal e para a segurança jurídica das propriedades; 4. Envolver os municípios no combate ao des-
matamento, sobretudo os que mais desmatam, com a instituição de uma força tarefa específica para áreas sensíveis como regularização fundiária e ambiental;
1. Intensificar ações de comando e controle. O
crescimento exponencial do desmatamento, a proporção de áreas desmatadas acima de 100ha e o alto número de desmatamentos em áreas cadastradas no CAR mostra que o governo estadual precisa agir com rapidez e firmeza no sentido de identificar os infratores e puní-los de acordo com a lei.
5. Disponibilizar os dados do CAR, de licen-
ciamento, e de fiscalização ambiental ao público para que toda sociedade, incluindo a sociedade civil e os atores do mercado, possam acompanhar as ações dos infratores, ampliando a capacidade de controle do governo e criando mecanismos de restrição de mercado;
2. Publicar uma Lista de Desmatamentos Ilegais
que expõe publicamente a identificação e localização dos desmatadores ilegais, os autos de infração e os embargos com os nomes dos proprietários envolvidos. O alto número de desmatamentos em áreas cadastradas no CAR mostra que o governo estadual precisa dar sinais claros de que é capaz de identificar os infratores e puní-los de acordo. Essa lista também deve assumir um papel fundamental para excluir essas propriedades das cadeias produtivas sustentáveis;
NOTAS 1
Dados usados neste trabalho: As análises foram feitas usando polígonos de desmatamento do PRODES aplicados aos limites do estado de Mato Grosso, onde ele monitora somente o bioma Amazônico. Considerando os polígonos do PRODES para todo o bioma Amazônico, o desmatamento somou um total de 5,273.46 km². O Estado do Mato Grosso foi responsável por 1,346 km2 (26%), apesar de o PRODES ter reportado uma taxa de 1,508 km2. Esta diferença ocorre porque o INPE soma as áreas desmatadas dos anos anteriores que estavam cobertas por nuvens nos períodos anteriores de relatoria.
6. Estabelecer novos incentivos para uma agri-
cultura sem desmatamento. Isso passa por uma gama de incentivos que envolvem ferramentas creditícias, fiscais, apoio ao setor privado, além de critérios de compra de mercado. Existe um arcabouço legal para esses incentivos no artigo 41 do Código florestal, mas ele tem sido pouco explorado até hoje.
2
O módulo fiscal de Mato Grosso vai de 60 a 100 ha no bioma Amazônia. Com isso as propriedades de mais de 15 MF têm mais de 900 ha.
3
Foram analisados as usinas Teles Pires (Paranaíta e Alta Floresta), São Manoel (Paranaíta), Complexo Apiacás (Alta Floresta e Nova Monte Verde), Colíder (Itaúba, Nova Canaã, Colíder e Cláudia) e Sinop ( Sinop, Itaúba, Claudia, Ipiranga do Norte e Sorriso).
4 http://www.florestal.gov.br/cadastro-ambiental-rural/numeros-do-cadastro-ambiental-rural
Autores: Andrea Azevedo (IPAM), Alice Thuault (ICV), Cecilia Simões (IPAM), Isabel Castro (IPAM), Edilene Fernandes do Amaral (ICV) e Ana Paula Valdiones (ICV) Crédito da foto: Na Lata Crédito dos gráficos: Alice Thuault Janeiro| 2016 Projeto gráfico e diagramação: Gueldon Brito Autorizado o uso não comercial desde que citada a fonte