Fábio Canazaro Professor Doutor de Direito Tributário da Pucrs, advogado e consultor da Agas
Carlota Pauls/Divulgação
legislação
PIS E COFINS – Segue a inútil discussão administrativa sobre creditamento
O
“Na lógica da Receita, parece que algumas atividades não necessitam de nada para seu desenvolvimento – uma máquina de padaria é relevante; a que corta e envasa carnes ou frios no açougue, não.” 36
REVISTA AGAS
tema do desconto de créditos, no regime de apuração não cumulativa das contribuições para o PIS e da Cofins, é inesgotável. Muitos imaginavam que com a decisão do STJ no REsp.1.221.170, tudo se resolveria; eu sempre disse que não – cada vez mais, me parece que um estado de total segurança, em relação às contribuições, só teremos no dia em que tais forem extintas, o que arrisco a dizer está longe. A questão, agora, diz respeito ao creditamento vinculado às atividades de produção no supermercado. Em março de 2021, a Receita Federal emitiu a solução de consulta nº 37, que ao segregar as atividades do supermercado, conferiu o direito de crédito em relação a insumos aplicados nas atividades de produção (padaria), bem como sobre a aquisição de peças e serviços de manutenção, além de bens incorporados ao imobilizado, desde que utilizados naquela atividade. Por outro lado, negou o mesmo direito, em relação a açougue e rotisseria. Até aí nenhuma novidade – o que chamou atenção foi a forma como a Administração construiu seu argumento: no sentido de que inexistem insumos na atividade comercial. Pois este é um dos maiores absurdos que ouvi nos últimos tempos, tanto sobre o ponto de vista sistemático, quanto sob o ponto de
vista da interpretação dos Tribunais, que mesmo não uniforme, merece respeito. Sistemática e economicamente, temos a construção de um regime de tributação que, com alíquotas elevadas, garante a não cumulatividade (o que se esperava, todos compreendessem); e isso, friso, pouco deve importar em relação à atividade: se é supermercado, padaria, oficina mecânica, não interessa, até porque a lei não distinguiu as atividades ao estabelecer os critérios de tributação – e o que não existe para o bem, não pode, via de regra, aplicar-se para o mal. Insumo, de acordo com as decisões judiciais, não é diferente: é algo imprescindível, importante para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada, essencial ou relevante àquela atividade que é a tributada. Mas na lógica da Receita é diferente: parece que algumas atividades não necessitam de nada para seu desenvolvimento – uma máquina de padaria é relevante; a que corta e envasa carnes no açougue, ou frios, inclusive por questões sanitárias, não. A conclusão que se chega é a de que esta solução de consulta revela uma aberração opinativa – perigosa, é verdade –, que em muito diverge da correta interpretação, a qual vem sendo construída, caso a caso, pelo Judiciário.