O DEBATE POLÍTICO NAS REDES SOCIAIS: APOGEU DA CIDADANIA OU EXACERBAÇÃO DO ÓDIO IDEOLÓGICO? Tito Ryff* Resumo: À luz do debate político recente, ocorrido nas redes sociais, em razão das eleições presidenciais, o autor sugere uma tipologia do pensamento político e traça um breve roteiro histórico de algumas iniciativas de política pública que moldaram as sociedades mais avançadas dos dias atuais. Procura mostrar que muitas dessas iniciativas tiveram origem em razões de ordem pragmática, muito mais do que em considerações de natureza ideológica. E sugere que o ódio ideológico, que caracterizou o confronto de ideias nas redes sociais brasileiras, nem sempre é o que comanda as decisões de homens de governo que têm a responsabilidade de encontrar soluções para problemas concretos que afligem seus governados e de zelar pela segurança de seus países.
Palavras-chave: redes sociais; ideologias; políticas públicas.
Introdução
Até recentemente, e não só no Brasil, o debate polí�tico e ideológico era exercitado por uma pequena minoria. Suas manifestações ocorriam no Parlamento, na vida partidária, em artigos publicados em jornais e revistas, em entrevistas na televisão e na produção intelectual, predominantemente de origem acadêmica. Havia, portanto, várias “instâncias intermediárias” que serviam de “filtro” ao debate polí�tico-ideológico, estabelecendo limites de comportamento, disciplinando a retórica e, de certa forma, “selecionando” os atores que dele poderiam participar. Temas polí�ticos e ideológicos só suscitavam a participação do grande público em época de eleições, ocasião em que eram, na maioria das vezes, abordados de forma indireta e subjacente, encobertos sob a ótica pragmática das promessas de campanha dos candidatos. A sociedade digital em que vivemos, ao promover o surgimento da internet e a expansão de redes sociais, mudou radicalmente a natureza do debate polí�tico e ideológico. Essa revolução digital trouxe, em seu bojo, novos meios e formas de comunicação que permitem a qualquer cidadão, sem nenhum “filtro” ou 4
“intermediação”, emitir opiniões polí�ticas ou ideológicas que alcançam, por vezes, grande difusão e ressonância. Pode-se ver neste fenômeno aspectos positivos. As redes sociais refletem, em boa medida, uma manifestação genuí�na da cidadania – um simulacro de democracia direta - e representam um poderoso instrumento de supervisão dos governos por parte da sociedade. É� cedo, contudo, para sabermos quais serão as consequências duradouras desse fenômeno no que diz respeito ao conví�vio social e ao exercí�cio da democracia. O fato é que, de imediato, seus resultados mais evidentes são a elevação, em vários decibéis, do tom da discussão polí�tica, a vulgarização dos argumentos e a distorção dos conceitos. No Brasil, a distorção dos conceitos, no debate ideológico registrado nas redes sociais, chegou a seu ápice na última eleição. Um exemplo digno de nota, embora longe de ser o único, é o fato de os contendores mais à direita no espectro polí�tico afirmarem, contra toda evidência histórica, que o nazismo (nacional-socialismo)
* Tito Ryff: economista, professor universitário e conselheiro de administração do IBAM.
Revista de Administração Municipal - RAM 298