O DIAGNÓSTICO DO SERVIÇO SOCIAL NA DETERMINAÇÃO DO GRADIENTE DA VULNERABILIDADE DOS DOENTES NA TRANSIÇÃO DOS CUIDADOS HOSPITALARES PARA OS CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO
Estudo desenvolvido com base na experiência do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental - quadriénio 2009-2012.
JORGE DOS SANTOS LOPES DA COSTA
ORIENTADOR PROFESSORA DOUTORA MARIA VITÓRIA MOURÃO
TESE PARA A OBTENÇÃO DE GRAU DE DOUTOR EM CIÊNCIAS SOCIAIS
ESPECIALIDADE DE SERVIÇO SOCIAL
DOCUMENTO PROVISÓRIO
LISBOA 2015 i
AGRADECIMENTOS
Aproveito para expressar o meu apreço por todas/os aqueles que deram o seu contributo para tornar possível esta investigação.
Começo por agradecer à minha orientadora, à Professora Doutora Vitória Mourão, pela responsabilidade assumida na orientação deste trabalho, pela partilha do seu conhecimento e pelas imprescindíveis contribuições durante todo o processo de construção do saber. Devo ainda um agradecimento aos Professores Fernando Serra, Coordenador da Unidade de Serviço Social e Política Social e à Professora Doutora Carla Pinto, pelo incentivo e disponibilidade.
Gostaria ainda de distinguir o Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade de Lisboa (UL) pela abertura ao enquadramento da realização deste trabalho de investigação em Ciências Sociais, na especialidade de Serviço Social.
Deixo ainda um agradecimento à Dra. Maria Dulce Gonçalves, coordenadora do Departamento de Serviço Social do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental (CHLO) e a todas as assistentes sociais em exercício de funções.
A todos os doentes e familiares, pela simpatia, pelo tempo despendido e pela partilha das suas vulnerabilidades.
A Deus e à minha mãe, que do Alto continuam a dar-me forças para tentar fazer melhor.
À minha mulher pelo seu amor, dedicação e paciência, ao meu irmão por me acompanhar sempre (e pelos meus sobrinhos), e ao meu pai pelos conselhos da experiência.
ii
RESUMO
Os assistentes sociais hospitalares norteiam a sua praxis a partir de um modelo sistémico e ecológico e planeiam a alta com base num diagnóstico que tem lugar entre o acolhimento do doente e a transição do nível de cuidados. No entanto, não existem diagnósticos que captem a amplitude da vulnerabilidade dos doentes, principalmente dos que exigem prioridade de assistência por serviços e equipamentos da comunidade.
Esta investigação tem o objectivo de desocultar o gradiente de vulnerabilidade dos doentes na alta hospitalar, de identificar os que se encontram numa situação crítica, de aferir o seu impacto nos cuidadores informais e de reconhecer potencialidades/fragilidades na política vigente de cuidados continuados integrados.
A metodologia cruza uma abordagem quantitativa expressa através da análise de resultados de doentes complexos (N=4965), com duas abordagens qualitativas. Nestas últimas recorre-se à entrevista aprofundada para chegar a representações dos cuidadores informais, bem como de peritos e decisores em saúde.
Os resultados mostram que as 1509 pessoas (32,8%) em extrema vulnerabilidade são idosas, apresentam uma situação económica precária e carecem do apoio adequado pela sua rede formal/informal.
Conclui-se que este diagnóstico social identifica os doentes de alto risco, condição de difícil reversão, que devem ser sinalizados e acompanhados pelos serviços de proximidade.
Palavras-chave: Serviço Social, modelo ecológico, práticas de intervenção social, diagnóstico social, extrema vulnerabilidade, risco, planeamento de altas, cuidadores informais, cuidados continuados de proximidade, institucionalismo de redes
iii
ABSTRACT
Hospital social workers guide their praxis from a systemic and ecological model and plan patient discharge based on a diagnosis which takes place between admission and the transition from the level of care. Nevertheless there are no diagnosis that assess the range of patients´ vulnerability, mainly from those who need priority assistance by community and local services.
This investigation aims: to unveil patients´ vulnerability gradient at hospital discharge; to identify those who are in a critical situation; to determine its impact on informal caregivers and to recognize strengths/weaknesses in current policy of integrated continuous care.
Methodology uses a quantitative approach expressed through the analysis of results of complex patients (N= 4965), and two qualitative approaches. In these last we used in-depth interviews to reach the representations of informal caregivers as well as health experts and decision makers.
Results show that there are 1509 people (32, 8%) in extreme vulnerability. They are simultaneously old, poor and lack appropriate support from their formal/informal network.
We conclude that this diagnosis identifies high-risk patients that should be signaled and monitored by proximity social services.
Keywords: Social work, ecologcal model, social work practice, social diagnosis, extreme vulnerability, risk, hospital discharge, informal caregivers, long term care, network institutionalism.
iv
INDICE GERAL
AGRADECIMENTOS
ii
RESUMO
iii
ABSTRACT
iv
ÍNDICE GERAL
v
ÍNDICE DE FIGURAS
x
ÍNDICE DE GRÁFICOS
x
ÍNDICE DE TABELAS
xi
INTRODUÇÃO
1
PARTE I - A PROBLEMÁTICA
CAPÍTULO ÚNICO - A DEFINIÇÃO DA PROBLEMÁTICA
10
Resumo de capítulo
10
1. DA PRAXIS À PROBLEMATIZAÇÃO DE PARTIDA
10
2. O CONTEXTO DA INVESTIGAÇÃO: O SERVIÇO SOCIAL NO CENTRO HOSPITALAR LISBOA OCIDENTAL (CHLO)
11
2.1. O SERVIÇO SOCIAL NO CHLO: DA DISPERSÃO À UNIFORMIZAÇÃO DE PRÁTICAS
12
2.2. UMA CARACTERIZAÇÃO GLOBAL DA ACTIVIDADE NO QUADRIÉNIO 2009-2012
15
2.3. A ANÁLISE E O APROFUNDAMENTO DA INTERVENÇÃO SOCIAL COMO PRERROGATIVA DA INVESTIGAÇÃO: O ESTUDO DOS EPISÓDIOS SOCIAIS
17
3. A LEGITIMIDADE DA INVESTIGAÇÃO E A EXPLANAÇÃO DO MODELO DE ANÁLISE
19
3.1. SOBRE A LEGITIMIDADE
19
3.2. O MODELO DE ANÁLISE
21
3.2.1. DO INSTITUCIONALISMO HISTÓRICO À GOVERNAÇÃO EM SAÚDE
22
3.2.2. ENTRE A PROMOÇÃO DA SAÚDE E A VULNERABILIDADE SOCIAL
28
3.2.3. A POLÍTICA DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS E OS DESAFIOS DA INTERVENÇÃO SOCIAL
4. OS OBJECTIVOS DA INVESTIGAÇÃO
31 35
v
PARTE II - OS PRINCIPAIS EIXOS TEÓRICOS
CAPÍTULO 1 - O SERVIÇO SOCIAL NO PLANEAMENTO DA ALTA HOSPITALAR: DO DIAGNÓSTICO À GESTÃO DA VULNERABILIDADE DO DOENTE E DA FAMÍLIA
39
Resumo de capítulo
39
5. ENTRE A PROMOÇÃO DA SAÚDE E A EVIDÊNCIA DO RISCO: PERSPECTIVAS TEÓRICAS
40
5.1. A SALUTOGÉNESE, A RESILIÊNCIA E O MODELO HUMANISTA ECOLÓGICO
41
5.2. O RISCO E A VULNERABILIDADE EM CONTEXTO HOSPITALAR: O DIAGNÓSTICO SOCIAL AFERIDO DAS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE
56
5.3. DEPENDÊNCIA, DOENÇA CRÓNICA, COMORBILIDADE E INEXISTÊNCIA DE REDE DE SUPORTE FORMAL: FACTORES DE AGRAVAMENTO DA VULNERABILIDADE NA ALTA HOSPITALAR
69
5.4. SERVIÇO SOCIAL HOSPITALAR: DO DIAGNÓSTICO À AVALIAÇÃO DE SITUAÇÕES DE VULNERABILIDADE
5.4.1. A PRAXIS NO RISCO, NA INCERTEZA E NA VULNERABILIDADE
76 82
5.4.2. O MODELO DE INTERVENÇÃO SOCIAL HOSPITALAR NA AFERIÇÃO DA VULNERABILIDADE: QUE EVOLUÇÃO
87
5.4.3. A ABORDAGEM POLISSÉMICA NO DIAGNÓSTICO DA VULNERABILIDADE EM CONTEXTO HOSPITALAR
95
CAPÍTULO 2 - DO HOSPITAL AOS CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO (CLD): UM RUMO PARA O ENVOLVIMENTO DA REDE SOCIAL E INSTITUCIONAL
98
Resumo de capítulo
98
6. OS REFLEXOS DE UMA NOVA GOVERNAÇÃO EM SAÚDE
98
6.1. A CONTINUIDADE DE CUIDADOS E A COOPERAÇÃO ENTRE O TERCEIRO SECTOR E O SECTOR PRIVADO
104
6.2. O PAPEL DO ESTADO NOS CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO
112
6.2.1. AS RESPOSTAS SOCIAIS EM PORTUGAL
113
6.2.2. AS RESPOSTAS SOCIAIS INTEGRADAS
119
6.3. O CONTRIBUTO DA REDE INFORMAL NA TRANSIÇÃO DOS NÍVEIS DE CUIDADOS
123
6.3.1. A FAMÍLIA COMO GARANTE DOS CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO
125
vi
CAPITULO 3 – O TRAJECTO DA POLÍTICA DE SAÚDE NA ÁREA HOSPITALAR E NOS CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
130
Resumo de capítulo
130
7. O TRAJECTO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE: DA CRIAÇÃO DO SNS À ACTUALIDADE
130
7.1. OS EFEITOS DA EVOLUÇÃO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE NOS CUIDADOS HOSPITALARES
139
7.2. A REDE DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS: A RESPOSTA NECESSÁRIA
143
PARTE III - DESENHO DA INVESTIGAÇÃO EMPÍRICA CAPÍTULO ÚNICO – O PERCURSO DA INVESTIGAÇÃO E A DEFINIÇÃO DA ESTRATÉGIA METODOLÓGICA
152
Resumo de capítulo
152
8. A INVESTIGAÇÃO E A QUESTÃO DE PARTIDA
152
8.1. PERTINÊNCIA E APLICABILIDADE DO ESTUDO
159
8.1.1. TÉCNICAS E PROTOCOLO DE RECOLHA DE INFORMAÇÃO
164
8.1.2. A ANÁLISE E O TRATAMENTO DE INFORMAÇÃO
168
PARTE IV – APRESENTAÇÃO E DESCRIÇÃO DOS DADOS EMPÍRICOS QUALITATIVOS E QUANTITATIVOS CAPITULO 1 – PERSPECTIVAS DE DECISORES E DE PERITOS EM SAÚDE: FORÇAS E VULNERABILIDADES DA POLÍTICA DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
173
Resumo de capítulo
173
9. UMA APRECIAÇÃO PRELIMINAR DA REDE NACIONAL DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
173
9.1. O RISCO E A INCERTEZA EM CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
176
9.2. EXPANSÃO E MODERNIZAÇÃO: QUE PROPOSTAS
181
9.3. CUIDADOS CONTINUADOS EM PORTUGAL E NA EUROPA
186
CAPITULO 2 – O SERVIÇO SOCIAL NA DETERMINAÇÃO DOS FACTORES DE RISCO: UM ESTUDO SOBRE A VULNERABILIDADE DOS DOENTES EM CONTEXTO HOSPITALAR
189
Resumo de capítulo
189
10. O PERFIL DOS EPISÓDIOS SOCIAIS: UMA VISÃO SOCIODEMOGRÁFICA
189
10.1. AS DETERMINANTES SOCIAIS E DE CONTEXTO: UMA ANÁLISE DE FACTORES DO RISCO
193 vii
CAPITULO 3 – CUIDADORES DE DOENTES EM EXTREMA VULNERABILIDADE: DO PLANEAMENTO DA ALTA HOSPITALAR AO DOMICÍLIO
201
Resumo de capítulo
201
11. REPRESENTAÇÕES NO PROCESSO DE “CUIDAR”: DA EXPERIÊNCIA DO CUIDADOR ÀS ESTRATÉGIAS DE ESTABILIZAÇÃO DOS CUIDADOS
201
11.1. O APOIO FORMAL E INFORMAL NO DOMICÍLIO: MITOS E REALIDADES
207
11.2. O IMPACTO DA VULNERABILIDADE DO DOENTE NO CUIDADOR
210
PARTE V – INTERPRETAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS EMPÍRICOS: QUE RESULTADOS CAPITULO 1 – A POLÍTICA DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS EM PORTUGAL: REPRESENTAÇÕES DE DECISORES E DE PERITOS EM SAÚDE
215
Resumo de capítulo
215
12. A EMERGÊNCIA DA ARTICULAÇÃO SECTORIAL NA SAÚDE E A SUSTENTABILIDADE DOS CUIDADOS CONTINUADOS NOS CUIDADORES INFORMAIS
12.1. UMA APRECIAÇÃO “ON-GOING”: POTENCIALIDADES E CONSTRANGIMENTOS
215 219
12.2. A VULNERABILIDADE DA REDE NACIONAL DE CUIDADOS INTEGRADOS (RNCCI): A VISÃO DOS PERITOS
225
12.3. A EXPANSÃO E MODERNIZAÇÃO DOS CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS: DA ESTRATÉGIA GLOBAL AOS CUIDADORES
12.4. CUIDADOS CONTINUADOS EM PORTUGAL E NO CONTEXTO EUROPEU
229 234
CAPITULO 2 – O GRAU DE VULNERABILIDADE DOS DOENTES DO CHLO: UMA ANÁLISE QUE CONJUGA DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE
237
Resumo de capítulo
237
13. O CAMINHO DA VULNERABILIDADE: DAS DIMENSÕES CRÍTICAS DE ANÁLISE À CONSTITUIÇÃO DE CLUSTERS
238
13.1. UMA ANÁLISE SOCIODEMOGRÁFICA
249
13.2. UMA ANÁLISE MULTIDIMENSIONAL
253
14 A EXTREMA VULNERABILIDADE NO QUADRO DAS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE
263
14.1. DAS CONDIÇÕES ESTRUTURAIS ÀS INDIVIDUAIS
264
viii
CAPITULO 3 – A EXTREMA VULNERABILIDADE NA PERSPECTIVA DOS CUIDADORES INFORMAIS
275
Resumo de capítulo
275
15. A AFEIÇÃO E A RESPONSABILIDADE DE “CUIDAR”: A FAMÍLIA NO CENTRO DA EXTREMA VULNERABILIDADE
275
15.1. ENTRE O APOIO FORMAL E INFORMAL: UMA REALIDADE FAMILIAR QUE NÃO EXCLUI A REDE DE EQUIPAMENTOS DE PROXIMIDADE
279
15.2.O IMPACTO DA EXTREMA VULNERABILIDADE NO CUIDADOR: UMA PERSPECTIVA MULTIDIMENSIONAL
284
PARTE VI – CONCLUSÕES E CONTRIBUTOS
CAPITULO ÚNICO - CONCLUSÕES, CONTRIBUTOS E LIÇÕES APRENDIDAS
290
Resumo de capítulo
290
16. AS CONCLUSÕES
290
16.1.O CONTRIBUTO TEÓRICO – PRÁTICO: DIAGNÓSTICOS DE EXTREMA VULNERABILIDADE
303
16.2.. LIMITAÇÕES, LICÕES APRENDIDAS E RECOMENDAÇÕES
307
BIBLIOGRAFIA
310
BIBLIOGRAFIA TEMÁTICA
310
BIBLIOGRAFIA METODOLÓGICA
335
LEGISLAÇÃO
336
ANEXOS
339
ANEXO 1- Justificação da colaboração dos interlocutores privilegiados
339
ANEXO 2 - Identificação dos cuidadores informais
341
ANEXO 3 - Identificação dos cuidadores informais contactados
342
ANEXO 4 - Grelha de construção de entrevista a peritos em saúde
346
ANEXO 5 – Grelha de construção de entrevista a decisores políticos
346
ANEXO 6 - Grelha de construção
347
de entrevista a cuidadores informais
ix
INDICE DE FIGURAS Figura 1 – Mapa conceptual (V Gowin) Figura 2 – Área de influência do CHLO
12
Figura 3 - Modelo de análise
23
Figura 4 - Determinantes sociais da saúde
68
Figura 5 - Etapas do Modelo psicossocial (risco)
89
Figura 6 - Etapas do Modelo sistémico-ecológico (vulnerabilidade)
90
Figura 7 - Modelo de análise metodológico
156
Figura 8 – Representações dos interlocutores sobre CCI em Portugal
219
Figura 9 – Representações da análise aos CCI em Portugal
224
Figura 10 – Representações da vulnerabilidade nos CCI em Portugal
228
Figura 11 – Expansão e modernização nos CCI em Portugal
233
Figura 12 – CCI em Portugal e na Europa
236
Figura 13 - Análise resíduos ajustados: proveniência de recursos / clusters
255
Figura 14 - Diagrama axial I: representações sobre o “processo de cuidar”
279
Figura 15 - Diagrama axial II: representações sobre apoio formal e informal
283
Figura 16 - Diagrama axial III: representações impacto da vulnerabilidade no cuidador
289
ÍNDICE DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Intervenção social por actos sociais 2009-2012
16
Gráfico 2 - N de utentes atendidos por Nº episódio social – 2009-2012
17
Gráfico 3 - Episódios sociais /diagnóstico social – 2009-12
19
Gráfico 4 - Distribuição de episódios sociais por sexo - 2009-12
189
Gráfico 5 - Distribuição de episódios sociais por idade -2009-12
189
Gráfico 6 - Distribuição de idade: Teste Detrendend Normal Q-Q Plot SPSS- 2009-12
190
Gráfico 7 - Distribuição de episódios sociais por estado civil - 2009-12
191
Gráfico 8 - Distribuição de episódios sociais por habilitações literárias - 2009-12
192
Gráfico 9 - Distribuição de episódios sociais por situação perante o trabalho - 2009-12
192
Gráfico 10 - Distribuição de episódios sociais por fontes de rendimento-2009-12
193
Gráfico 11 - Distribuição de episódios sociais /estado doença - 2009-12
193
Gráfico 12 - Distribuição episódios sociais/ comorbilidade - 2009-12
193 x
Gráfico 13 - Distribuição episódios sociais /grau de dependência - 2009-12
193
Gráfico 14 - Distribuição dos episódios sociais /destino após alta hospitalar - 2009-12
194
Gráfico 15 – Episódios sociais /factores de risco isolados - 2009-12
195
Gráfico 16- Episódios sociais /factores de risco na família - 2009-12
196
Gráfico 17 – Episódios sociais /factores de risco económicos – 2009-12
197
Gráfico 18 - Episódios sociais /factores de risco associados ao trabalho - 2009-12
197
Gráfico 19 – Episódios sociais /factores de risco na educação -2009-12
198
Gráfico 20 – Episódios sociais/ factores de risco na protecção social-2009-12
198
Gráfico 21 – Episódios sociais/ factores de risco habitacional - 2009-12
199
Gráfico 22 – Episódios sociais /factores de risco por áreas clínicas - 2009-12
200
Gráfico 23 – Análise de componentes principais – 2009/12
239
Gráfico 24 - Método Variable Principal - 2009/12
242
Gráfico 25 – Método de comparação cluster Centroide
243
Gráfico 26 – Método de comparação cluster Vizinho mais afastado – 2009/12
243
Gráfico 27 – Método de comparação cluster Ward - 2009/12
244
Gráfico 28 – Distribuição de clusters – episódios sociais 2009/12
244
Gráfico 29 – Método de Variable Principal com clusters - 2009/12
245
Gráfico 30 – Idade por composição de clusters - 2009/12
250
ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 – Actividade Assistencial CHLO - 2009-12
13
Tabela 2 – Tipologia de intervenção social por grau de complexidade
15
Tabela 3 – Respostas sociais para pessoas idosas
114
Tabela 4 – Respostas sociais para pessoas adultas com deficiência
115
Tabela 5 – Respostas sociais para pessoas em situação de dependência
115
Tabela 6 – Respostas sociais para pessoas com doença mental ou psiquiátrica
115
Tabela 7 – Respostas sociais para pessoas sem-abrigo
115
Tabela 8 – Programas e investimento público no apoio à RSES
119
Tabela 9 – Respostas inovadoras
120
Tabela 10 – Unidades da primeira lei de cuidados continuados integrados
122
Tabela 11 – Técnicas de recolha de informação
166
Tabela 12 – Técnicas de tratamento de informação
172 xi
Tabela 13 – Análise de componentes principais (distribuição de frequências e dimensões) 239 Tabela 14- Distribuição das variáveis por principais dimensões 2009/12
240
Tabela 15 - Quantificação de categorias - 2009/12
241
Tabela 16 – Distribuição de variáveis por proximidade/afastamento - 2009/12
241
Tabela 17- Situação de dependência /composição de clusters – 2009/12
246
Tabela 18- Doença crónica /composição de clusters – 2009/2012
246
Tabela 19- Comorbilidade /composição de clusters – 2009/12
247
Tabela 20- Destino após alta hospitalar /composição de clusters – 2009/12
248
Tabela 21- Análise resíduos ajustados positivos da comp. clusters – 2009/12
249
Tabela 22 – Relação entre sexo masculino e feminino e clusters -2009/12
249
Tabela 23 – Relação entre estado civil e clusters- 2009/12
251
Tabela 24 – Relação entre ocupação profissional e clusters -2009/12
252
Tabela 25 – Relação entre estado ocupacional e clusters -2009/12
253
Tabela 26 – Relação entre diagnóstico e clusters -2009/12
254
Tabela 27 – Relação entre a variável rendimento e clusters - 2009/12
256
Tabela 28 – Relação entre dimensão pessoal e clusters – 2009/12
257
Tabela 29 – Relação entre dimensão familiar e clusters -2009/12
259
Tabela 30 – Relação entre dimensão económica e clusters – 2009/12
260
Tabela 31 – Relação entre dimensão profissional e clusters – 2009/12
261
Tabela 32 – Relação entre dimensão educação e clusters
261
Tabela 33 – Relação entre dimensão protecção social e clusters – 2009/12
262
Tabela 34 – Relação entre dimensão habitação e clusters – 2009/12
262
Tabela 35 – Determinantes ambientais: enquadramento geográfico
265
xii
INTRODUÇÃO
Distinguir a intervenção do Serviço Social nos doentes mais complexos, é tentar compreender o gradiente da vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração. No entanto, os modelos de referência que norteiam a praxis ainda não estão apetrechados de técnicas que avaliem a sua amplitude, estando vocacionados para identificar factores de risco e para interferir sobre eles, quando a promoção da saúde fica ou parece estar comprometida. Assim, ao considerarmos a falibilidade dos modelos de intervenção social, ainda que apoiados no método científico, o que questionamos é que possam existir variáveis latentes, à margem dos diagnósticos sociais aferidos através das narrativas dos doentes, das famílias e de representações de contexto.
As técnicas de intervenção que coadjuvam a preparação das altas hospitalares e que fundamentam a ponderação dos assistentes sociais revelam ser ambíguas a concluir sobre níveis de vulnerabilidade e a diferenciar as situações sociais mais intrincadas. Deste modo, apenas a inovação na elaboração da técnica de diagnóstico social pode fazer emergir novos critérios que a qualifiquem, de acordo com a sua amplitude.
O dilema do Serviço Social em fazer coincidir, simultaneamente, a alta clínica e a alta social (eficácia) e a assegurar a continuidade de cuidados dos doentes (defesa dos direitos) levou ao desenvolvimento desta investigação, que se centra na identificação da vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração. O tema acabou por fundamentar esta tese de doutoramento em Ciências Sociais, na especialidade de Serviço Social. Já a inspiração que a motivou está relacionada com a actividade que desempenho há mais de dez anos, enquanto assistente social na área da saúde, e que tem na sua base o desdobramento e a utilização de um modelo de intervenção sistémico-ecológico.
Desde o início do meu percurso profissional cedo compreendi que a manutenção de cuidados de saúde fora das unidades hospitalares, teria de mostrar indicadores claros de coesão social entre o doente, a família e a rede formal e informal de suporte. Já a evidência de sinais de ruptura nessa cadeia de sistemas poderia comprometer ou inviabilizar a continuidade de cuidados. Assim, o estudo que levo a cabo admite a inquietação dos assistentes sociais e a sua
1
dificuldade em planear altas quando existem múltiplos factores de risco que se colocam no regresso dos doentes ao seu meio envolvente/domicilio.
A investigação, além de assinalar riscos e determinantes sociais da saúde na transição entre níveis de cuidados, opta por compreender a vulnerabilidade dos doentes. Nesta medida, a técnica de diagnóstico social não elenca apenas os indicadores de risco, mas conjuga-os até identificar variáveis que demonstrem que um doente regressa ao domicílio, numa situação de maior ou de menor vulnerabilidade. Este critério no desenvolvimento da praxis desoculta situações críticas e reconduz o foco da intervenção social, bem como estimula a coesão social e a articulação entre o doente, a família e rede social. Os resultados são visíveis no estabelecimento de medidas preventivas de acompanhamento, e em termos de prioridade no acesso a serviços e a equipamentos da comunidade, acabando por fomentar novos ganhos em saúde.
A vulnerabilidade na transição dos cuidados assumiu teoricamente a dimensão individual, social e programática (Ayres et al., 2003). Já a investigação empírica tentou harmonizar-se com esta tripla perspectiva, optando pela diversificação dos métodos e do campo de análise.
Considerando o argumento supramencionado, identificámos como objectivo principal o gradiente da vulnerabilidade nos doentes mais complexos que são avaliados pelos assistentes sociais, e de seguida aqueles que se encontravam numa situação de extrema vulnerabilidade. Complementarmente, indagámos sobre a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) enquanto medida política, assim como planeámos perceber o impacto da sobrecarga dos doentes nos seus cuidadores informais. Para atingir os objectivos foi elaborada uma questão de partida que pudesse conduzir toda a investigação: “Qual a vulnerabilidade do doente que regressou ao domicílio, a cargo de cuidadores informais depois de um internamento hospitalar, com elevado grau de dependência, doença crónica e comorbilidades? Com o intuito de lhe dar resposta, procurou aferir-se o gradiente da vulnerabilidade em 4965 doentes, que correspondem ao número de processos sociais mais complexos, avaliados pelo Serviço Social do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, no quadriénio 2009-2012. Depois, colocou-se a hipótese de existirem nestes doentes, situações de extrema vulnerabilidade encapotadas, fruto de uma conjugação de dimensões críticas. O apuramento dos resultados implicou cumulativamente a admissão das variáveis subentendidas 2
na questão de partida, designadamente: a condição de dependência, de doença crónica, de comorbilidade e a ausência de apoio formal no domicílio. Na verdade, pretendemos retirar ilações para o desenvolvimento de técnicas de diagnóstico e de avaliação social, e nessa sequência, delinear medidas de intervenção social ajustadas e tendentes a minimizar a vulnerabilidade dos doentes e das famílias na transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração.
Na lógica da transição de cuidados identificámos uma afinidade entre o capital social (Putnam, 2002) e as redes que promovem as relações entre instituições e que legitimam a eficácia da acção entre indivíduos, grupos ou organizações. As redes foram simultaneamente instituições e recursos da intervenção social (Ansell, 2006), o que significa que quanto mais firme for a dinâmica interinstitucional menos vulnerável e mais eficaz se torna o projecto de intervenção. Percebemos que não seria possível identificar o gradiente da vulnerabilidade dos doentes na transição dos cuidados, apenas através da avaliação de indicadores individuais ou de uma contagem de factores de risco que podem evidenciar uma situação mais ou menos aguda. Importou também indagar sobre as causas que originaram tal condição, designadamente, as que estão relacionadas com o estilo e com as condições de vida dos doentes, com o seu meio envolvente, com a sua situação socioeconómica, com a rede de suporte disponível e com a flexibilidade da política de cuidados continuados integrados.
O método que nos permitiu qualificar a vulnerabilidade implicou uma investigação que foi para além do cruzamento de variáveis de diagnóstico dos doentes e da utilização de técnicas directas e indirectas de um determinado modelo de intervenção social. Ou seja, incorporou para além da visão de resultados da intervenção social, uma visão de contexto, sobretudo, sobre o contributo de interlocutores privilegiados, acerca da política de cuidados continuados e sobre o papel dos cuidadores informais na transição de cuidados.
Em suma, partimos para a identificação da vulnerabilidade, fazendo uso da plataforma informática de registo da intervenção social dos doentes com maior complexidade, cedida pelo Centro Hospitalar Lisboa Ocidental. Depois, complementámos essa análise de resultados recolhendo declarações de peritos e de decisores em saúde, destacando potencialidades e vulnerabilidades da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, enquanto medida política. Finalmente, após definirmos o gradiente de vulnerabilidade, observámos a dinâmica 3
do processo de cuidar no domicílio dos doentes mais frágeis e auscultámos os seus cuidadores informais. O que pretendemos compreender foi como conseguiram conjugar a rede de suporte formal e a informal e que impactos tiveram para as suas vidas por terem de lidar com doentes numa situação tão frágil.
As instituições hospitalares prestam cuidados de saúde à população durante um período limitado no tempo. Privilegiar a elaboração do diagnóstico e o plano de intervenção, no trajecto que vai do acolhimento à alta para o domicílio, e analisar variáveis latentes que possam estar ocultas recorrendo a técnicas avançadas, pareceu-nos uma metodologia de intervenção a ser replicada no futuro.
Os resultados estatísticos evidenciam que o modelo de intervenção social ecológico (Viscarret, 2007; Duque, 2013) esteve na base da aferição do gradiente de vulnerabilidade, bem como na definição de diagnósticos de extrema vulnerabilidade. Tornou-se clara a harmonização conceptual entre os riscos avaliados pelo Serviço Social (modelo ecológico) e as determinantes sociais da saúde que os enquadram. Foi também possível identificar a amplitude da vulnerabilidade dos doentes pela sua exposição a características individuais, associadas ao estilo de vida, à rede de suporte e aos contextos de vida, de trabalho e ambientais. Da percepção dos doentes, admitiram-se situações de extrema vulnerabilidade que se estenderam, a todas as “camadas”/níveis do modelo teórico (Dalhgren & Whitehead, 2006). Nestas evidenciaram-se cumulativamente (por estudo de hipóteses), os factores: de dependência, de doença crónica, de comorbilidades e dos doentes que regressaram ao domicílio, apenas com uma ligação a Cuidados de Longa Duração, pela via informal.
Os diálogos com os cuidadores informais sobre cuidar na extrema vulnerabilidade dizem-nos que o seu papel de responsabilidade foi estabelecido pela relação de afinidade filial e por outras ligações de afecto (Kellerhals, 1995), deixando muitas vezes para segundo plano, os aspectos que se referem à habilidade e à competência demonstrada para a execução dos cuidados. Os mesmos cuidadores admitiram fragilidades na rede de apoio do doente e no seu sistema de protecção de saúde e apoio social. O registo das experiências demonstrou que o apoio de proximidade foi quase sempre providenciado por elementos da rede familiar, e que a 4
condição dos doentes marcou a vida dos que tiveram essa incumbência, a um nível físico, psicológico, e nalguns casos até patológico.
As inferências dos peritos em saúde e dos decisores políticos em saúde consideraram que o hospitalocentrismo enquanto visão estratégica, afecta a orientação para a continuidade dos cuidados, provocando ineficiências na sua gestão. Globalmente, as declarações foram sensíveis à evidência de uma assimetria territorial do crescimento da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e à ausência de equipamentos e de recursos humanos. As apreciações dos interlocutores confirmaram a rigidez e a dificuldade de acesso, bem como a escassez de unidades e de equipas de Cuidados Continuados Integrados nas áreas metropolitanas com maior densidade populacional.
Sintetizando, referir que uma das contribuições aguardadas nesta investigação é de tentar estabelecer um gradiente de vulnerabilidade na transição dos cuidados que permita a monitorização e o acompanhamento de situações de extrema vulnerabilidade. A questão que se coloca é saber se a avaliação dos assistentes sociais hospitalares pode ser veiculada junto dos serviços de proximidade, já que a vulnerabilidade, não está ainda devidamente legitimada por grau, frequência ou outra ordem de medida, o que pode desvirtuar a protecção de doentes e de cuidadores. A questão que deixo em suspenso é se podemos validar diagnósticos sociais de extrema vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para o domicílio, a partir de um modelo de intervenção ecológico e da sistematização/polissemização da prática (Santos, 2010, 2012).
De forma a promover o entendimento e a estrutura da investigação, apresenta-se um diagrama em V de Gowin (Novak, 2000). Esta ferramenta permite facilitar a leitura do mapa conceptual (Figura 1) e observar que a questão primordial do estudo reside no conhecimento do gradiente da vulnerabilidade dos doentes, quando estes regressam ao domicílio com apoio informal. Ou seja, possibilita a promoção de estratégias de intervenção que tenham em vista a continuidade dos cuidados dos doentes que mais carecem de apoio.
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Mapa Conceptual Descida Conceptual
Subida Metodológica
Questão de partida Concepções do Mundo e da Vida: Convicção de uma vulnerabilidade oculta na transição dos cuidados hospitalares para os cuidados de longa duração Contexto socioprofissional e organizacional sistémico onde emerge o problema: Praxis do Serviço Social hospitalar no planeamento e na gestão de altas Dificuldade em promover, simultaneamente, a alta clínica (visão biomédica) e a alta social (visão biopsicossocial/ecológica)
Qual a vulnerabilidade do doente que regressou ao domicílio, a cargo de cuidadores informais depois de um internamento hospitalar, com elevado grau de dependência, doença crónica e comorbilidades?
Conclusões Definição de extrema vulnerabilidade (legitimada pelo modelo ecológico Serviço Social) associada à pobreza, à insuficiente rede social de suporte e ao envelhecimento Limitações da rede formal/informal na prestação de cuidados de proximidade não excluem responsabilidade individual e da rede familiar de suporte Cultura “hospitalocentrica” e não investimento, na base da descontinuidade de cuidados (acesso, adequação, escassez de recursos) Resultados Extrema vulnerabilidade como a conjugação de múltiplas determinantes sociais de saúde (individuais, sociais, rede social e comunitária, ambientais) - doentes Distinção de vulnerabilidade e extrema vulnerabilidade doentes Ambivalência, Isolamento social, sobrecarga física e psicológica (vulnerabilidade no cuidador) Emergência articulação sectorial e Racionalização do financiamento (vulnerabilidade programática) Prevalência dos CLD nos cuidadores informais e aposta na qualidade: acesso, adequação as necessidades e à procura (vulnerabilidade programática)
Conceitos Conceito de dependência de trajecto das instituições (hospital/família) Nova gestão pública (Hood, 1991; Araújo, 2002) e governação em saúde (Sakellarides, 2010; Bovaird & Loeffler, 2011) Capital social como factor de ligação entre indivíduos, grupos e organizações (Putnam, 2002) Cuidados de longa duração, Cuidados Continuados integrados Promoção da saúde numa perspectiva salutógénica (Antonovsky, 1996) Intervenção social polissémica como resposta (Santos, 2010) Dependência, doença crónica, comorbilidades Teorias e modelos Vulnerabilidade enquanto dimensão individual, social e programática (Ayres, 2003) Modelo humanista ecológico em Serviço Social (Viscarret, 2007) Teoria do risco (Renn, 1992; Dean, 1999;Beck, 2000) enquadrada no Modelo das determinantes sociais da saúde (Dalhgren & Whitehead, 2006) Novo institucionalismo histórico (Hall & Taylor, 2003; Pierson & Skocpol, 2004) e de redes (Ansell, 2006) como padrão de estabilidade das redes formais e informais (hospital, Serviço Social, família, organizações comunitárias)
Objectivo Definir a “extrema vulnerabilidade” na transição dos cuidados hospitalares para os CLD através do modelo de intervenção do Serviço Social
Figura 1 – V de Gowin
Dados e análise Triangulação sequencial de métodos: 1.Qualitativo – 2.Quantitativo – 3. Qualitativo 1.Categorização de conteúdo: dimensões definidas por análise SWOT (peritos e decisores em saúde); 2.Análise quantitativa com ACP e definição de clusters para definir o gradiente da vulnerabilidade e a extrema vulnerabilidade – Base de dados do SS do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental (2009-2012) 3.Categorização de conteúdo: dimensões definidas por diagramas axiais (extrema vulnerabilidade: impacto nos cuidadores)
O contexto no domínio conceptual parte da convicção de que há vulnerabilidades ocultas na transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração que não são devidamente valorizadas pelos assistentes sociais no planeamento das altas. O problema emerge da dificuldade destes profissionais conseguirem estabelecer um gradiente de vulnerabilidade nos doentes mais complexos, e de intervirem mais de acordo com as suas necessidades. É através destas concepções da praxis que se augura poder construir conhecimento sobre diagnósticos de extrema vulnerabilidade na transição entre níveis de cuidados. Esta lógica levou-nos a enquadrar como quadro de referência, o conceito tridimensional da vulnerabilidade (Ayres, 2003) e o modelo de intervenção ecológico em Serviço Social (Viscarret, 2007). Foi também necessário esclarecer-se na teoria, a abordagem polissémica (Santos, 2012) como estratégia norteadora da acção, não deixando de analisar o trajecto do Serviço Social, desde a sua institucionalização até aos dias de hoje.
Também salientámos os conceitos de promoção da saúde numa perspectiva salutogénica (Antonovsy, 1996), a teoria do risco (Renn, 1992, Dean, 1999; Beck, 2000), e o modelo das determinantes sociais da saúde (Dahlgren & Whitehead, 2006; Marmot et al., 2008). Explorámos os conceitos de dependência, de doença crónica e de comorbilidade e a perspectiva familiarista da Europa do Sul na transição dos cuidados (Romão et al, 2008), que assenta num modelo welfare mix. Realçámos o papel das instituições formais (hospitais, organizações lucrativas, não lucrativas e Terceiro sector) e informais (familia e rede de amigos e vizinhança), na promoção e na manutenção da qualidade de vida dos cidadãos. Distinguimos depois, o conceito e a política da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e abordámos os conceitos e medidas de Cuidados de Longa Duração.
Numa teoria de maior alcance, reconhecemos a interpretação do institucionalismo histórico (Immergut, 1998; Hall & Taylor, 2003; Pierson & Skocpol, 2004) e do conceito da dependência do trajecto das instituições, como paradigma que guia as acções individuais (dos doentes) e as colectivas (das organizações). Neste âmbito, reconhecemos as redes formais e informais como instituições (Ansell, 2006), implicando-as simultaneamente na causa e na solução dos problemas suscitados pela investigação. Nesta sequência, introduzimos o conceito de “capital social” (Putnam, 2002; Silva et al., 2012), como factor de ligação entre os indivíduos, as redes e as instituições. Destacámos ainda os conceitos de “Nova Gestão Pública” (Hood, 1991; Araujo, 2002) e de governação em saúde (Sakellarides, 2010; Bovaird 6
& Loeffler, 2011), tendo sido neste contexto que se colocou a possibilidade de inovar técnicas de Serviço Social, no modelo da praxis em meio hospitalar.
Esta tese de doutoramento em Serviço Social inspirou-se no aperfeiçoamento do diagnóstico e no contributo que a técnica pode oferecer aos assistentes sociais durante o planeamento das altas.
A metodologia de estudo implicou uma abordagem mista que triangulou, numa ordem sequencial, os resultados da praxis do Serviço Social e as representações de contexto, obtidas por cuidadores informais e interlocutores privilegiados.
A metodologia de recolha de dados consistiu no estudo dos 4965 doentes complexos acompanhados pelo Departamento de Serviço Social do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, entre 2009 e 2012 e elucida a forma como o Serviço Social, a partir da avaliação de factores de risco, chega ao gradiente de vulnerabilidade dos doentes. A recolha de dados contou ainda com a execução de onze entrevistas aprofundadas a peritos em saúde e a decisores políticos onde se discute, a tendência expansionista e de modernização da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e a questão do risco e da incerteza da sua implementação (vulnerabilidade programática). A acrescentar, foram realizadas dez entrevistas aprofundadas a cuidadores de doentes em extrema vulnerabilidade, com a pretensão de se aferirem depoimentos sobre as suas experiências, sobre as ligações existentes ou inexistentes entre a rede formal e a informal, e por fim, do impacto da condição de vulnerabilidade do doente na vida do cuidador.
A análise dos dados implicou o tratamento qualitativo e quantitativo de três estudos que reflectem a vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração.
De forma sequencial, o primeiro estudo qualitativo elencou, através da análise SWOT, as vulnerabilidades, as forças, os constrangimentos e as potencialidades da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, enquanto medida política vocacionada para a transição dos cuidados. As respostas e/ou proposições consensuais foram transformadas em categorias de leitura da realidade. O segundo estudo tem uma correspondência com a análise quantitativa 7
dos casos mais complexos acompanhados pelos assistentes sociais em contexto hospitalar. Este implicou a análise transversal (em espiral) de componentes principais, que nos permitiram relacionar variáveis e agrupá-las em novas variáveis independentes. De seguida, foram quantificadas e discriminadas, e sujeitas a uma análise de clusters, por diferentes métodos de comparação. Por fim, estabelecemos uma tipologia classificatória do gradiente da vulnerabilidade em quatro clusters. Um dos clusters desocultou os doentes mais vulneráveis expondo as suas características sociodemográficas e as suas determinantes sociais em saúde, tendo estas sido sujeitas a uma análise de resíduos ajustados. Finalmente, o terceiro estudo ajudou a interpretar a realidade dos cuidadores dos doentes, numa situação de extrema vulnerabilidade, através de diagramas axiais que categorizam as declarações mais evidentes das narrativas dos entrevistados.
A triangulação de dados obtida com as entrevistas a interlocutores privilegiados, mostra-nos que é necessário potenciar a articulação entre a saúde e a comunidade, bem como é indispensável racionalizar o financiamento dos Cuidados Continuados Integrados, adequá-los à procura e às necessidades dos doentes e facilitar o seu acesso. Assim, podemos inferir que as evidências referidas por peritos e decisores políticos, estão reflectidas nos doentes estudados, principalmente nos que foram considerados como extremamente vulneráveis, pois regressaram ao domicílio, desenquadrados de respostas sociais e expostos a um conjunto de determinantes sociais que os colocam num risco contínuo.
A triangulação de dados obtida com as entrevistas a cuidadores informais chama-nos a atenção para a prestação de cuidados aos doentes, que mercê da indisponibilidade de recursos de proximidade e por exclusão de medidas programáticas ficam à sua responsabilidade. Esta sobrecarga tem um impacto físico e psicológico e pode levar à exaustão.
A análise dos dados dos doentes (episódios sociais) assistidos pelo Serviço Social hospitalar, evidencia um gradiente de vulnerabilidade que distingue uma população jovem, em situação de desemprego ou inactiva, e uma população envelhecida, acima dos setenta anos, que vive da pensão de velhice. Os resultados demonstram que a precariedade económica e as baixas habilitações literárias são determinantes sociais da saúde comuns à maioria dos doentes. A extrema vulnerabilidade recai sobre os mais idosos, com baixos rendimentos e/ou com dificuldades em suprir as suas necessidades básicas e instrumentais decorrentes da situação de 8
doença/dependência. Uma parte significativa destes doentes desconhece os seus direitos e carece da disponibilidade familiar, de amigos ou de instituições de proximidade.
A teoria que emerge dos resultados demonstra-nos que os assistentes sociais vivem dilemas no planeamento das altas hospitalares por nem sempre conseguirem distinguir o gradiente da vulnerabilidade dos doentes que acompanham. Este paradigma pode ser mitigado se forem feitas as adaptações necessárias ao modelo da praxis (Viscarret, 2007). A conservação do hospitalocentrismo, as limitações da rede social na continuidade de prestação de cuidados de saúde e de apoio social, as fragilidades da política de Cuidados Continuados Integrados, a dependência e a prevalência das doenças crónicas são aspectos que levam à necessidade de adequar o modelo da praxis à transição do nível de cuidados para o domicílio. Neste sentido, o plano da alta que se norteia por uma intervenção que passa pela ponderação dos sistemas de acção dos indivíduos, ganha em definir o gradiente da vulnerabilidade dos doentes, e em descriminar as situações de extrema vulnerabilidade.
Desenvolver técnicas de diagnóstico social que possibilitem esclarecer parâmetros que desocultem a incerteza de existirem ou não riscos latentes, permite validar os planos de intervenção social, de acordo com a vulnerabilidade de cada doente. Não são os factores individuais dos doentes que influenciam a transição entre níveis de cuidados, mas a forma como estes se conjugam com as determinantes sociais da saúde (Dalhgren & Whitehead, 2006), especialmente, nas vertentes associadas à condição socioeconómica e às circunstâncias que os aproximam ou afastam da rede de suporte informal e formal.
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PARTE I
A PROBLEMATICA
CAPÍTULO ÚNICO
A DEFINIÇÃO DA PROBLEMÁTICA
Resumo de capítulo
Este capítulo descreve a evolução do tema de investigação até se definir enquanto problemática. Num primeiro momento, identifica-se o local e o contexto institucional onde decorreu a experiência empírica: O Serviço Social do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental (CHLO). Depois, faz-se referência às práticas profissionais, em termos de organização de processos e de tipologia de intervenção social. Num segundo momento caracteriza-se a actividade assistencial do serviço no quadriénio 2009-2012, e especificamente por Episódios sociais, reconhecendo nestes, a base da investigação subordinada à vulnerabilidade dos doentes na transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Num terceiro momento, explana-se o modelo de análise que legitima o estudo, assim como se identificam os objectivos gerais e os objectivos específicos da investigação.
1. DA PRAXIS À PROBLEMATIZAÇÃO DE PARTIDA
A motivação que instiga um investigador a reflectir sobre determinada questão ou a problematiza-la, é de tal forma complexa, que descrever as causas desse processo individual seria uma tentativa de descrever um fenómeno, num campo de análise fértil cujo quadro de referência é condicionado pela subjectividade do sujeito que se propõe a tal exercício, bem como pelas suas experiências práticas e profissionais. Todavia, todos os factores que estão na origem dessa escolha, tal como o nascimento das várias ciências, são fruto de “procuras” sociais, resultantes da necessidade de apropriação cognitiva e prática do real” (Almeida & Pinto, 1990, p. 9). Na realidade, a construção do objecto de investigação está directamente ancorada à actividade profissional do investigador e à possibilidade de aprofundar o conhecimento sobre a teoria da prática do Serviço Social, consolidando o modelo de intervenção social na saúde, num determinado contexto. 10
Assim, o propósito da investigação favorecerá simultaneamente a sua aspiração, quer como investigador que se norteia pela pergunta de partida, quer como profissional, por participar activamente para o enriquecimento teórico-prático da sua actividade profissional enquanto assistente social. Porém, outras partes interessadas beneficiarão dos efeitos da investigação, designadamente, a instituição hospitalar e o Departamento de Serviço Social que abraçaram esta iniciativa. Assim, foi a partir do aprofundamento da questão da vulnerabilidade no contexto da transição dos cuidados hospitalares para os CLD, que se foram modelando os objectivos da investigação.
2. O CONTEXTO DA INVESTIGAÇÃO: O SERVIÇO SOCIAL NO CHLO
Este estudo teve lugar no Centro Hospitalar Lisboa Ocidental (CHLO), e assumiu como referência a actividade assistencial do Serviço Social. A investigação envolveu o aprofundamento dos doentes de maior complexidade (episódios sociais), no quadriénio 20092012, nas três Unidades que o compõem: Hospital São Francisco Xavier, Hospital de Egas Moniz (HSFX) e Hospital de Santa Cruz (HSC).
BREVE ENQUADRAMENTO INSTITUCIONAL
O CHLO foi criado pelo Decreto Lei nº 233/2005, de 29 de Dezembro, integrando os Hospitais de Egas Moniz, de Santa Cruz e de S. Francisco Xavier. A sua missão principal consubstancia-se em prestar cuidados de saúde a todos os cidadãos no âmbito da sua área geográfica, de acordo com as suas atribuições, e com a capacidade instalada das unidades hospitalares que o integram. No plano operativo está estabelecido o compromisso de executar as directivas políticas de saúde vigentes para os cuidados diferenciados, aos níveis regional e nacional, no quadro do plano estratégico definido pela tutela, e em consonância, com as decisões superiormente veiculadas pelas instâncias supranacionais e internacionais de referência. A prestação de cuidados de saúde rege-se de acordo com as áreas geográfica de influência que se observam na figura 2, e com as redes de referenciação de doentes por áreas de especialidade médica tendo como fio condutor o cumprimento dos contratos - programa celebrados, em articulação com as instituições que integram a rede de cuidados do Serviço Nacional de Saúde (SNS). O 11
CHLO, desenvolve ainda actividade complementar de grande relevo, nas áreas do ensino pré e pós-graduado e ao nível da investigação e da formação profissional dos seus colaboradores.
Área de Influência CHLO
Área
Habitantes
Concelho de Oeiras
4600
172 120
Concelho de Cascais
9710
206 429
Concelho de Lisboa
1404
61 331
Total Linha directa
15 714
439 880
Concelho da Amadora
2300
175 135
Concelho de Sintra
31 650
377 837
Total Cuidados Diferenciados
49 664
992 852
Figura 2 – Área de influência do CHLO (Relatório de gestão e contas, 2011)
Especificamente, as áreas de influência do CHLO identificam-se nas freguesias de São Francisco Xavier, Belém, Ajuda, Alcântara e Campo de Ourique, no concelho de Lisboa, e nos concelhos de Oeiras, abrangendo também os cuidados mais diferenciados aos habitantes dos concelhos da Amadora, Sintra e Cascais prestando cuidados de saúde, segundo os últimos censos, a uma população aproximada de 993 000 habitantes (INE, 2011).
2.1 O SERVIÇO SOCIAL NO CHLO: DA DISPERSÃO À UNIFORMIZAÇÃO DE PRÁTICAS
O Serviço Social do CHLO, aquando a promulgação do Decreto lei 233/05, de 29 Dezembro, passa a materializar-se organicamente no quadro da assunção jurídica de Entidade Pública Empresarial (EPE) e a integrar o universo dos Serviços de Apoio à Acção Médica. Ainda que se tivessem mantido algumas características específicas relacionadas com a cultura de cada unidade hospitalar, antes do processo de fusão, o Serviço Social já agregava consensos na sua 12
prática, relativamente aos eixos fundamentais da sua actividade. Contudo, em determinados contextos da praxis profissional, eram admitidas diferenças, nomeadamente: em áreas de intervenção complementar como o Gabinete do Cidadão e o Voluntariado, ou em áreas processuais, relacionadas com o padrão de registo e com a gestão/monitorização da produção de actividade. Todavia, a partir de 2005, houve necessidade de recalibrar práticas profissionais e o “modus operandi” para um padrão de prestação de serviços sociais compatível com as necessidades de harmonização processual e procedimental, com o intuito de servir com mais qualidade os doentes que acorrem a esta intervenção especializada.
A actividade do Serviço Social caracteriza-se por dar resposta a todos os Serviços de Acção Médica e divide-se pelas seguintes áreas funcionais: Ambulatório (Consultas, Hospitais de Dia e Urgência), Internamento e área de Comissões Técnicas (Equipa de Gestão de Altas da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados – EGA, Núcleo Hospitalar de Apoio à Criança e ao Jovem - NHSJ e Unidade Coordenadora Funcional – UCF). A tabela 1, demonstra a expressão do apoio do Serviço Social por áreas de actuação, cunhando a sua importância no panorama da actividade hospitalar, em especial nos serviços de internamento e na urgência, quando conferidos os rácios da intervenção social. Serviço Social CHLO (2009-2012) % N Doentes Saídos Internamento N Urgências Admitidas N
Doentes Doentes Doentes internamento Urgências Internamento + Urgências 25,2% 0,6% 4,9% Total Consulta Ambul. Urgência Internam +Urgência Internam. 46 906 3650 820 4620 42 436 37 816 Internamento e Urgências CHLO (2009-2012) 2009 2010 2011 2012 Total TOTAL 37 818 37 587 37 780 36 894 150 079 862 920 2009 2010 2011 2012 Total 183 266 184 922 182 354 162 299 712 841
Tabela 1 – Actividade assistencial CHLO - 2009-12 (Fonte: SPACG, 2013)
Relativamente ao referencial teórico da intervenção social este parece enquadrado nos preceitos do modelo psicossocial, no que concerne ao atendimento individual e familiar, que implica estudo de caso e investigação da problemática de base e; por um modelo de intervenção social ecológica, de base sistémica, no que caracteriza a actividade desenvolvida multidisciplinarmente com a rede formal e informal. O método de intervenção social está ancorado a quatro tipos de operacionalização que se conjugam, de acordo com a complexidade de cada situação ou situação-problema: (i) avaliação diagnóstica (diagnóstico 13
social), (ii) programação da intervenção, (iii) execução do projecto e (iv) avaliação dos resultados.
A ORGANIZAÇÃO DOS PROCESSOS E DOS PROCEDIMENTOS
A actividade do Serviço Social no CHLO tem vindo a uniformizar-se sucessivamente e a alcançar novos padrões de qualidade e de harmonização de práticas, facilitando o registo, a recolha, o tratamento e a demonstração de resultados da intervenção social. O Serviço Social do CHLO, utiliza um programa de software informático inovador que se apelida de Sistema de Apoio ao Assistente Social R (SAAS), e que tem sido alvo de correcções e de ajustamentos para melhorar a sua capacidade funcional. As alterações têm sido propostas pela coordenação do serviço à medida das necessidades e dos contornos da intervenção social, transformando o SAAS num verdadeiro instrumento de administração, na prestação de serviços à população utente.
A TIPOLOGIA DE INTERVENÇÃO SOCIAL: DOS ACTOS AOS EPISÓDIOS SOCIAIS
O tipo de intervenção social está associado à complexidade de cada situação /problema sendo fundamental para a compreensão dos fenómenos, distinguir a abordagem aos conceitos.
Assim, como actos sociais entenda-se o universo de diligências registadas por assistentes sociais em contexto hospitalar. Por seu turno, o conjunto de actos sociais enquadra-se em patamares de complexidade funcional, como se observa na tabela 2: GRAU DE COMPLEXIDADE TIPOLOGIA DE INTERVENÇÃO SOCIAL
Acto de Triagem Social (inicia intervenção/pressupõe análise/percepção problema social/detecção de factores de risco
Nível I Baixa Complexidade
do
Acto de Atendimento Social Isolado (ASI) Diagnóstico evidente/resposta a pedido, risco estabilizado, intervenção localizada e solução imediata, baixa complexidade. Muitas vezes evolui para intervenção de nível II/III, à medida que se complexifica o desenho do diagnóstico social. Episódio Social (até cinco APS* associados) Grau de complexidade compatível com o conhecimento aprofundado da situação individual, familiar, comunitária:
Nível II Média Complexidade
Nível III Elevada Complexidade
•
•
•
•
14
Diagnósticos sociais definidos, informação/preparação/articulação da rede formal e informal, intervenção social com execução de propostas de aderência consentidas, constituídos como projectos de apoio pós alta. Episódio Social (mais de cinco APS* associados) Grau de complexidade compatível com o conhecimento aprofundado das dinâmicas individuais, familiares, comunitárias e das redes formais e informais, cujos • • • projectos de intervenção social assumem contornos de difícil resolução por determinantes essências no cumprimento de projecto de vida de um doente, principalmente a nível familiar e institucional. Decisão sobre a definição do plano de intervenção prioritário a seguir, articulando-o com os recursos e apoios disponíveis. Maior exigência de reflexão para estudos alternativos, capacitação de interlocutores, mediação institucional e coresponsabilização institucional *Actos de Acompanhamento Psicossocial (APS) Pressupõe diagnóstico aprofundado evidente/condição psicossocial esperada, intervenção na gestão/compreensão/negociação da doença/informação param a saúde. Exige a construção de Episódio Social em SAAS
Tabela 2 – Tipologia de intervenção social por grau de complexidade (Manual de qualidade SSCHLO, 2013)
2.2 UMA CARACTERIZAÇÃO GLOBAL DA ACTIVIDADE NO QUADRIÉNIO 2009-2012
A PERSPECTIVA GENÉRICA DA ACTIVIDADE ASSISTENCIAL POR ACTOS SOCIAIS
Entre o dia 1 de Janeiro de 2009 e o dia 31 de Dezembro de 2012 a intervenção do Serviço Social do CHLO contou 106 065 actos sociais. Estes correspondiam a uma intervenção a 46 869 utentes, de acordo com o Sistema de Apoio ao Assistente Social ® (SAAS). O gráfico 1, abaixo representado, reflecte a distribuição dos actos sociais por tipo de intervenção. Os actos de triagem social (44,2%) dizem respeito ao número de utentes atendidos sendo, por esse motivo, os mais representativos. Sobressaem depois os actos de atendimento social isolado (28,9%) e os de acompanhamento psicossocial (22,4%) pois representam, em conjunto, mais de metade da actividade do Serviço Social.
Mesmo que os actos de acompanhamento psicossocial (APS) tenham sido transversais aos dois níveis de complexidade da intervenção (Nível II/III) a sua importância foi registada, no panorama geral da actividade do serviço, assim como os actos sociais isolados (ASI), que apesar de traduzirem uma menor complexidade na intervenção social, corresponderam a quase dois terços das situações acompanhadas no período em estudo. 15
Intervenção Social por Actos Sociais 50,0%
44,2%
40,0% 28,9%
30,0%
22,4%
20,0% 10,0% 0,0%
4,6% Triagem social Atendimento Social Isolado
Acompanhamento Psicossocial
Outras actividades
Gráfico 1 - Intervenção social por actos sociais 2009-2012 (Fonte: SAAS, 2013)
De forma a caracterizar todos os doentes assistidos pelo Serviço Social apresentam-se, genericamente, os resultados provenientes
da conjugação possível das variáveis
sociodemográficas, definidas por actos sociais. Estes permitiram uma identificação clara do perfil da população utente assistida durante o período em estudo (2009-2012).
Assim, os dados estatísticos revelaram uma população predominantemente feminina (56,6%) na qual, a condição civil preponderante foi, por ordem de ponderação: a condição de casado/a (42,3%), de solteiro/a (25,2%) e de viúvo/a (17,8%). De acordo com o grau de educação, sobressaiu uma população com a escolaridade obrigatória: 1ª Ciclo (19,9%), o 2º Ciclo (10,6%) e com o 3º Ciclo (9,9%).
Geograficamente, os doentes estavam distribuídos pelos distritos de Lisboa (76,7%), existindo alguma representação dos distritos de Setúbal (4,1%) e de Santarém (2%). Quanto às áreas concelhias mais evidentes, pelo número de actos, distinguiram-se os concelhos de Oeiras (37,2%), de Lisboa (23,4%), de Cascais (9,2%), Sintra (6,7%) e Amadora (3,9%). Quanto aos principais problemas e necessidades destacaram-se com maior expressividade, aqueles que estão relacionados com a doença crónica (24,1%) e com a situação de dependência (23,5%) para as actividades básicas/instrumentais da vida diária, bem como os problemas relacionados com a rede de suporte familiar (11,8%) e com a precariedade económica (8,8%), embora com menor expressão. 16
2.3 A ANÁLISE E O APROFUNDAMENTO DA INTERVENÇÃO SOCIAL COMO PRERROGATIVA DA INVESTIGAÇÃO: O ESTUDO DOS EPISÓDIOS SOCIAIS
A análise estatística descritiva do instrumento de gestão de registo do Serviço Social - SAAS permitiu compilar informação referente à actividade do CHLO, por actos sociais, como foi possível aferir no sub-capítulo anterior. No entanto, de forma a perscrutar a vulnerabilidade dos doentes, foi necessário recorrer a um sub-universo de 4965 doentes, assistidos no quadriénio 2009-2012, no quadro da população assistida pelo Serviço Social que se designam por episódios sociais. Estes processos são fruto de uma intervenção social pormenorizada. Os episódios sociais são constituídos após uma triagem social que vai evoluindo naturalmente para um grau de maior complexidade, e por tal, extrapola a resposta pontual ou esperada de um desfecho interventivo, para um tipo de intervenção mais sensível e detalhada e que, não raras vezes, envolve diversos actores e diferentes instituições sociais, exigindo um estudo rigoroso do problema e das hipóteses envolvidas para a sua resolução.
Apesar de representarem cerca de 11,2 % da totalidade dos utentes que foram avaliados pelo Serviço Social, no último quadriénio (gráfico 2, p. 28), os episódios sociais encerram em si, pelas suas características, o binómio complexidade/vulnerabilidade. Daí o interesse da investigação empírica quantitativa, ao tentar deduzir sobre conjugações de variáveis e responder à pergunta de partida que está relacionada com a extrema vulnerabilidade. 10,10%
1,10%
Nº de Utentes atendidos por NºEpisódio Social
Triagens Sociais/ ASI Episódios Sociais 88,70% Episódios Sociais +
Gráfico 2 – Nº de utentes atendidos por Nº episódio social – 2009-2012 (Fonte: SAAS 2013)
Depois de se considerarem os episódios sociais como o foco da investigação empírica, interessou que a interrogação de partida da investigação, se focasse na avaliação dos doentes mais vulneráveis em contexto hospitalar, através do circuito de recolha, arquivo e de tratamento de processos sociais disponibilizado pelo SAAS. 17
Este instrumento de trabalho, tal como a sua designação sugere, é uma ferramenta de suporte informático exclusiva para assistentes sociais que recolhe e arquiva a informação pertinente do exercício profissional em domínios como: a percepção do risco, a pluralidade e o tipo de intervenções, o potencial de reabilitação e a reinserção social. Também tem como função monitorizar a actividade e os resultados da prestação de serviço, sendo possível estabelecer nexos de causalidade entre os problemas apresentados pelos doentes e famílias e o grau de vulnerabilidade em que se encontram. Neste sentido, como exemplo desta capacidade de “analisar” vulnerabilidades apresenta-se no gráfico 3, o detalhe dos 10 577 diagnósticos no contexto dos episódios sociais, entre 20092012, que fundamentaram a intervenção social desenvolvida no decorrer do quadriénio em estudo. De seguida, enumeram-se os que obtiveram maior expressão no conjunto dos diagnósticos sociais: I - problemas associados à doença crónica (N = 2556); II- situação de dependência (N =2493); III- problemas relacionados com o grupo de suporte primário – (N =1251) IV- precariedade económica (N =939).
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25,0%
24,1% 23,5%
Diagnósticos Sociais -2009/12
20,0% 15,0% 11,8%
10,0%
8,8% 6,4%
5,0%
5,4% 5,3% 4,1% 2,6%
0,0%
2,0%
1,7%
1,2% 1,2%
0,6% 0,5%
0,2%
Gráfico 3 – Episódios sociais /diagnóstico social – 2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
3. A LEGITIMIDADE DA INVESTIGAÇÃO E A EXPLANAÇÃO DO MODELO DE ANÁLISE
3.1 SOBRE A LEGITIMIDADE
A legitimidade desta investigação centra-se na vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os cuidados de longa duração (CLD). Este fenómeno que merece a atenção da comunidade científica, visa aprofundar o processo de transferência de cuidados, dos hospitais (instituições seguras, com recursos especializados e tecnologia de ponta), para um outro tipo de meio envolvente, que se caracteriza por oferecer maior apoio informal e menor diferenciação de cuidados, no que se refere à capacidade de resposta de recursos técnicos ou humanos, capazes de assegurar os ganhos em saúde no superior interesse dos doentes e das suas famílias.
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Quando uma alta hospitalar é planeada, dando-se a conhecer as limitações e as necessidades do doente e do que significará a continuidade de cuidados no domicílio, o problema que se coloca não é, grande parte das vezes, o cumprimento do plano terapêutico, mas o condicionalismo imposto pelas Determinantes sociais na viabilidade desse mesmo plano que envolve uma alta em segurança, livre de riscos e de perigo. Essas determinantes podem ser de tipo individual, e estão relacionadas com o doente per si, tais como: o tipo de patologia, a comorbilidade e o grau de dependência. Podem estar relacionadas com a rede social e comunitária, designadamente: com o apoio familiar, informal e formal de pessoas e instituições de suporte, e ainda com outros factores ambientais ou de contexto, quer relacionados com as condições de vida e situação socioeconómica, quer relativas a aspectos relacionados com o trabalho, a habitação ou a educação.
Porém, mais do que a complexidade do estado de saúde, importou analisar os riscos e, nesse enquadramento, a vulnerabilidade dos doentes, quando regressam ao seu meio envolvente. Ainda que a gravidade de uma doença, o grau de dependência e a incapacidade física ou cognitiva possam influenciar o planeamento da alta hospitalar, também é verdade que podem não ser decisivos para a continuidade dos cuidados, por não suscitarem riscos acrescidos, ou até mesmo, por estar assegurada a segurança do doente e a manutenção dos cuidados de saúde. De facto, é da conjugação dos factores de risco e da percepção da vulnerabilidade social que se definem necessidades de intervenção social específicas. Estas assentam numa política de articulação efectiva e de cariz preventivo ou reparador, com a rede informal e formal, para que possam ser garantidos os cuidados adequados de saúde e de apoio social, com as instruções necessárias referentes a direitos e benefícios sociais e a (in) formação/ encaminhamento adequados.
Em todo o caso, apesar de ter sido inevitável redefinir o contexto empírico da investigação, sempre se quis abordar a questão da transição dos cuidados hospitalares para os CLD, assim como compreender a integração da política de saúde e de apoio social. O desenho da investigação final viria a ser acolhido pela coordenação do Departamento de Serviço Social do CHLO (a quem o desafio foi colocado e que beneficiará directamente da investigação), tendo sido obtida a anuência do Conselho de Administração, da Comissão de Ética e do Departamento de Investigação Clínica desse centro hospitalar.
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3.2 MODELO DE ANÁLISE
O tema da investigação tema está associado à teoria do Novo Institucionalismo e à sua relação com o aparelho do Estado e com as instituições que asseguram cuidados de saúde e de apoio social. Na verdade, a vulnerabilidade que se evidencia entre níveis de cuidados envolve, fundamentalmente, instituições e redes formais e informais, alargando a visão exclusiva dos efeitos da política de saúde vigente ou do impacto desta junto dos cidadãos que se encontram numa situação de maior fragilidade. O Novo Institucionalismo como corrente teórica é crucial no contexto da economia política, pelas questões que colocou ao dinamismo do mercado nos últimos vinte anos, e porque introduziu inovações relevantes para a credibilidade da intervenção do Estado (Harriss et al., 1995). Esta salienta a diversificação das instituições no mercado, para garantir, de forma equilibrada, níveis colectivos de bem-estar, que de outra forma não seriam possíveis de alcançar. (Bates, 1995, p.27). Dessas instituições, o autor mencionado, destacou as unidades familiares como as mais relevantes, já que nessas é possível exigir, e os recursos estão disponíveis quando a necessidade assim o impõe. Todavia, a par das instituições familiares estão outras instituições não comerciais como: as Associações religiosas, Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) e Organizações Não-governamentais (ONG), que são muitas vezes responsáveis por organizarem esforços para garantir e mobilizar o apoio necessário ao cidadão na transição dos cuidados hospitalares para o domicílio, por vezes, na ausência, insuficiência ou ineficiência de respostas estatais, ao nível da saúde e de apoio social.
Considerando a abordagem supramencionada, pode referir-se como relevante a perspectiva que relaciona o conceito de instituições e de organizações. North distingue as instituições, compostas por regras formais (leis e regulamentos) e informais (códigos de conduta e de comportamento). Também define as organizações como um conjunto de “actores, grupos de indivíduos determinados por uma proposta comum para atingir objectivos” (North, 1995,p. 23). Nas organizações podem estar incluídas corporações políticas, (empresas e sindicatos), corporações sociais, (igrejas e associações) e corporações educacionais (escolas e universidades). Assim, espera-se que do encontro e do entrosamento entre estruturas institucionais e organizacionais, de origem estatal, da sociedade civil, do Terceiro sector ou 21
até por instituições familiares, se fomente o comportamento organizacional e novas formas de criar impactos nas instituições formais.
Atendendo à natureza do processo político, talvez seja possível dar um contributo para a plasticidade de certas políticas públicas quando estas, ideologicamente, são confrontadas com limitações endógenas, como o financiamento, e exógenas, como as dificuldades de implementação junto de instituições e organizações ou junto da própria população a que se destinam. É do desfasamento entre o que foi planeado e a implementação no terreno de políticas, que a corrente Neoinstitucionalista actua favorecendo a compreensão de como o poder político e as instituições conseguem modelar as políticas na saúde, aceitando a perspectiva plural do Estado, na qual se defende o debate entre grupos de interesse organizados que visam influenciar o processo de tomada de decisões. Nesta linha de raciocínio, eleva-se o contexto institucional como o pilar que define “as regras do jogo” (North, 1995) e que na realidade determina a forma como as preferências individuais se agregam em resultados sociais. Por outro lado, faz sobressair o contexto, neste caso o institucional, onde são determinadas e levadas a cabo as preferências individuais.
3.2.1 DO INSTITUCIONALISMO HISTÓRICO À GOVERNAÇÃO EM SAÚDE
O sentido desta tese legitima a necessidade de demonstrar uma proposta que conjugue a participação institucional da Administração do Estado, com as organizações de proximidade de saúde e de apoio social, criando sinergias e tentando, simultaneamente, aperfeiçoar a oportunidade de alcançar melhores níveis de eficiência na intervenção social (cf. figura 3). Para tal, é importante compreender a forma como as instituições, organizações e agentes se articulam em rede e como essa cultura tem impacto na política de CLD. Um dos motivos da escolha do Novo Institucionalismo, advém do facto desta corrente teórica assentar numa concepção do desenvolvimento das instituições que privilegia o trajecto, as situações críticas e as consequências imprevistas (Ikenberry, 1994). No fundo, defende-se uma causalidade social, que depende de um trajecto (path dependent) e cujo resultado é fruto das propriedades de cada contexto local, que se traduzem pelo legado do passado, e cuja natureza é institucional. O que também é indispensável, como se defende na corrente elegida, são as consequências imprevistas das instituições existentes, neste caso dos hospitais, e das insuficiências que produzem, em situações críticas e que conduzem a novos desenvolvimentos 22
através de outros trajectos alternativos, num tempo também marcado pela crise económicofinanceira.
• Do institucionalismo histórico à governação em saúde
-Institucionalismo histórico -Institucionalismo redes -Capital Social -Nova Gestão pública -Governação em saúde
- Salutogénese -Determinantes Sociais da Saúde -Risco -Vulnerabilidade Social Envelhecimento, dependência, doença crónica, comorbilidades
• Da promoção da saúde à vulnerabilidade Social: A referência das determinantes sociais da saúde
- Serviço social hospitalar
• Os desafios do Serviço Social na extrema vulnerabilidade • - Comorbilidades • -Dependência • -Doença Crónica • - inexistência suporte formal
- Método de aferição do risco e vulnerabilidade ( - Modelos de intervenção -Técnicas – Diagnóstico, Plano alta e acompanhamento
-Redes e cuidados formais e informais -Instituições e respostas sociais e em saúde - A politica de cuidados continuados integrados (RNCCI)
• Os Cuidados de Longa Duração • Welfare Mix (Estado, família e Terceiro sector)
Figura 3- Modelo de análise
Dos contributos teóricos, o Novo Institucionalismo histórico reuniu maior consenso porque consegue ser integrador, tanto dos argumentos da teoria racional, como do Institucionalismo sociológico (Powell & Di Maggio, 1991). Assim, esta tese explorou o trajecto das políticas de saúde na transição dos cuidados hospitalares para os CLD, tendo como pano de fundo o desenvolvimento da praxis do Serviço Social. Esta abordagem incorporou premissas do Novo Institucionalismo histórico (Hall & Taylor, 2003; Immergut, 1998; Thelen, 1999; Pierson & Skocpol, 2004) e do Institucionalismo de redes (Ansell, 2006), à luz de uma perspectiva cronológica da política de saúde em Portugal.
Deste modo, as novas correntes do Institucionalismo (histórico e de redes) acabam por contribuir também, para a análise da evolução dos contributos do Serviço Social na transição dos cuidados hospitalares para os CLD ou de proximidade. Quando há esta referência ao Serviço Social, destaca-se sobretudo, o papel-chave dos assistentes sociais, sendo que seria inusitado analisar a transição de cuidados entre instituições ou organizações, sem mencionar 23
alguns dos seus principais interlocutores. Ou seja, é tão ineficiente uma análise da estrutura sem referência a actores, como uma análise sobre actores sem menção às suas estruturas (Mayntz & Scharpf, 2001).
Assim, e para reforçar, há um reconhecimento de que a transição dos níveis de cuidados pode ser explanada, não apenas no contributo do Institucionalismo histórico, mas com o entendimento de um Institucionalismo de redes. Nesta última corrente neo-institucionalista mais recente, as redes são compreendidas como instituições, pois representam padrões de estabilidade ou padrões recorrentes de interacções e trocas entre indivíduos, grupos e organizações. Os defensores desta linha de pensamento, para além da expressão e da dinâmica que essas interacções podem provocar, vêem as redes como variáveis que têm impacto na distribuição do poder e na construção de interesses e de identidades.
A abordagem ao Institucionalismo histórico implica a referência ao conceito de poder e da sua concentração nas instituições, bem como considera o meio social e político, o comportamento dos múltiplos actores e a sua relação com o Estado (Hall & Taylor, 2003). Deste modo, privilegia-se uma investigação que ajusta a pertinência do trajecto das unidades hospitalares, num quadro político-social e histórico em que os assistentes sociais se constituíram, como agentes de mudança, integrando e desenvolvendo o seu próprio processo de evolução institucional.
A finalidade de desvendar a problemática em estudo não se esgota na acção das instituições formais e das redes organizacionais, constituídas também como instituições, mas salienta a plasticidade na acção, dos assistentes sociais. Estes têm sido determinantes para a compreensão do fenómeno da evolução das instituições de saúde. Procura-se assim, abordar o processo de institucionalização do Serviço Social nos serviços de saúde hospitalares, desde a abordagem precursora de uma concepção reformadora e higienista da medicina social (Matias, 1999), até ao entendimento das determinantes sociais que influenciam o estado de saúde dos indivíduos e que coloca o Serviço Social “na avaliação dos factores psicossociais que interferem na saúde de pessoas, grupos e comunidades com especial atenção para situações identificadas como de risco e de vulnerabilidade” (DGS, 2007, p.5).
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Identificam-se também, alguns dos conceitos relacionados com as correntes do Novo Institucionalismo já indicadas, e que assumem particular relevância. Da escola histórica sobressai o conceito de “path dependence”, e do Novo Institucionalismo de redes introduz-se o conceito de “capital social”, colocando a tónica na complexidade das relações que ligam indivíduos, grupos e organizações. Aqui, as redes são compreendidas como recursos ou como limitações ao comportamento (Ansell, 2006). Relativamente ao primeiro conceito (path dependence) admite-se que é útil para apreender a institucionalização de processos de decisão sobre a evolução das unidades hospitalares e de outras unidades de análise, envolvidas na transição de níveis de cuidados de saúde. A dependência de um caminho que tem sido percorrido, envolve naturalmente as questões do passado e pode ocasionar uma cadeia de constrangimentos que influenciam as decisões políticas da actualidade (Steinmo et al., 1992; Pierson & Skocpol, 2004), o que significa que as decisões presentes estão sobrecarregadas pelas decisões do passado, e não tão só pelas condições socioeconómicas da actualidade. Nesse sentido, relembre-se que no contexto das políticas públicas, e na saúde em particular, quando há opções prévias, os custos em alterá-las ou de as transformar, são geralmente elevados. Utiliza-se este conceito para identificar, por exemplo, a fraca adesão à reforma dos cuidados de saúde primários, e o impacto desse investimento na RNCCI, que deveria assegurar, de forma mais eficaz a transição de níveis de cuidados, designadamente para cuidados pós hospitalares, tanto na área da saúde, como no apoio social. Identificar constrangimentos de funcionamento nos modelos da administração pública não faria sentido sem alguns contributos que estiveram na origem da construção moderna do significado de “capital social” (Bourdieu, 1986; Coleman, 1990). Estes abriram caminho ao que se classificou como “elementos de organização social, como redes, normas e confiança social que facilitam a coordenação e a cooperação em benefício recíproco” (Putnam, 2002, citado por Silva et al., 2002, p. 21). Estas características organizacionais, no caso das unidades hospitalares que são tuteladas e reguladas pelo Estado, têm tendência para melhorar as relações de reciprocidade com a sociedade civil e facilitar o funcionamento das instituições no contexto da vida social. Tal, faz-se principalmente através de categorias do “capital social” em proveito desse equilíbrio, seja numa instituição, num grupo ou comunidade, designadamente: o desempenho institucional, a confiança, a participação, a cidadania e a descentralização das decisões governamentais. Da mesma forma, os assistentes sociais por partilharem dos mesmos interesses, por estarem incumbidos de uma missão, associada à sua
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existência enquanto serviço facilitador de recursos e por se reverem neste espaço de intervenção com autonomia, também procuram calibrar muitos conflitos da acção colectiva.
Ainda no quadro do Novo Institucionalismo, enquanto corrente teórica, destacam-se os conceitos de “Nova Gestão Pública” (NGP) e de “Governação em Saúde”, no trajecto das instituições hospitalares e do seu impacto para a transição dos cuidados. O termo NGP nasce com a referência de uma utilização de ferramentas de gestão privada na administração pública (Hood, 1990), e da necessidade de novas formas de governar assentes em modelos mais liberais. Estas pressupunham a redução das fronteiras do Estado através de políticas de contenção de despesa e do fomento à privatização. Assim, pode até dizer-se que a reforma da gestão pública foi fruto de uma crise instalada sobre o estado de bem-estar em que “ (…) os constrangimentos económicos impuseram ajustamentos nas políticas (…) e métodos alternativos de fornecer serviços públicos (Araújo, 2002, p. 60). O modelo da NGP parte do princípio que admite que o modelo de gestão privada é mais eficiente que o da gestão do sector público, por conseguir optimizar resultados. Este modelo, de base anglo-saxónica assistiu vários países da OCDE tendo um impacto importante, principalmente, a partir da década de 70, com a profissionalização da gestão. Em geral, definiram-se medidas de desempenho com objectivos mensuráveis, e reforçou-se a preocupação com o controlo dos resultados, através de modelos de flexibilização e de disciplina, na gestão dos recursos. No sentido prático, as duas últimas décadas da modernização do Estado, colocaram a tónica na eficiência e nos resultados, sem ponderar os efeitos sistémicos da reforma. A preocupação centrava-se essencialmente, nos estímulos do mercado e na redução de postos de trabalho na administração pública, o que fez emergir um modelo novo, mais alargado nos seus objectivos e que respondia à insatisfação de algumas medidas da NGP.
Assim, um novo conceito emerge, alterando a forma como o Estado desempenha o seu papel, tornando-o mais entrosado com outros agentes da sociedade civil. À tradicional administração burocrática, sucede um Estado policêntrico que promove a articulação com outros actores de forma a conseguir os resultados esperados e definidos pela política pública. A governação pública diz respeito a: “(…) set of rules, structures and procedures which give stakeholders some power to influence the decisions which affect their welfare” (Bovaird & Loeffler, 2001, citado por Vigoda, 2002, p.347). A uma definição mais generalizada de governação, acrescentam-se outros contributos do conceito, essenciais para a necessidade de fundamentar 26
o fenómeno em estudo, sobre a transição de cuidados de saúde hospitalares para os CLD, designadamente o conceito de governação local (local governance) “ the set of rules, structures, and procedures that give stakeholders in a local area some power to influence the decisions made in that área or for that área that affect their welfare” (Bovaird & Loeffler, 2001, citado por Vigoda, 2002, p.347). Esta nova cooperação entre actores reconhece as capacidades de negociação e de comunicação e ainda de confiança, como uma alternativa à gestão estabelecida pela hierarquia do poder, que envolve cidadãos, o tecido empresarial e o terceiro sector, num trabalho articulado. A governação local, pode constituir-se normativamente como: “uma acção conjunta, via todos os stakeholders (cidadãos, administração, associações tradicionais, clubes e empresas) em prol do bem da colectividade (Damkowski & Rosener, 2003, citado por Kissler & Heidemann, 2006, p 483-483). O Estado deixa de ser uma instituição que se diferencia de forma clara e distinta do mercado e da sociedade, passando de um estado de hierarquia para um estado corporativo, que actua em rede e em conjunto com as organizações empresariais e através de parcerias estratégicas. Neste sentido, a transição da rede hospitalar para a rede de CLD passou de uma “velha governação”, na qual predominou a hierarquia e as relações verticais, para um novo tipo de governação, mais fluída e norteada que se estrutura também pela estrutura do mercado e pelas redes (Skelcher & Mathur, 2004, citados por Firmino, 2011). O poder concentra-se nas instituições sustentando-se em regras e normas, cabendo ao mercado o dinamismo da competição, e às redes a reciprocidade e a confiança entre os vários actores (Kjaer, 2004, citados por Firmino, 2011). As circunstâncias históricas transformaram o sistema de saúde num aglomerado de sectores e de organizações geridas “verticalmente”. Tal aconteceu com diversas estruturas, em particular com os hospitais, que no passado não souberam “horizontalizar” a articulação com as organizações de saúde e entre si, quando as doenças de evolução prolongada, um dos principais objectos dos cuidados de saúde, o exigiam.
A discussão da transição dos cuidados de saúde implica uma visão que esteja centrada, não nas organizações de saúde, mas na gestão de processos de cuidados e no interesse dos doentes. Não é a circunstância de um internamento ou de uma consulta que melhorará a saúde dos doentes episodicamente, mas a capacidade de acompanhamento dos mesmos, numa rede constituída por várias organizações que asseguram em continuidade, os cuidados, ampliando de forma significativa os resultados em relação à saúde das pessoas (Sakellarides, 2010, 27
p.112). Neste modelo de governação local, as estratégias destacam-se no apoio ao cumprimento dos objectivos do Plano Nacional de Saúde (PNS), estabelecendo-se a partir da compreensão do contexto socioeconómico e cultural, utilizando recursos locais com o apoio de parcerias sustentáveis.
Não podendo discutir as questões da governação em saúde sem uma referência ao conceito de poder, muito comum nas análises dos institucionalistas históricos (Pierson & Skocpol, 2004), expressa-se o contributo teórico de Foucault que identifica o conceito de “biopoder”. Este envolve, a responsabilidade de gerir uma sociedade em pleno desenvolvimento e propaga a ideia de um Estado cuidador “do corpo e da vida”, através de técnicas de controlo populacional, de cálculos de risco, de políticas públicas e de normas disciplinares e reguladoras da população (Foucault, 2006, citado por Trubiliano & Dutra, 2011, p. 23). O “biopoder”, conjuga a regulação com a normalização dos comportamentos individuais e colectivos, servindo-se das instituições estatais e de mecanismos próprios. Para o autor, nesses mecanismos estão os cuidados de saúde, as instituições de saúde, os esquemas de protecção social na doença e a organização do apoio familiar. 3.2.2 ENTRE A PROMOÇÃO DA SAÚDE E A VULNERABILIDADE SOCIAL: UMA REFERÊNCIA ÀS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE
Na saúde, área basilar desta investigação, interessou aprofundar conceitos que fossem disciplinando as linhas teóricas explicativas do fenómeno em estudo. Nesse sentido, defendeu-se a ideia da Promoção de Saúde como um processo de desenvolvimento económico e social. Como orientações gerais adoptaram-se os preceitos postulados na Carta de Banguecoque (OMS, 2005), que são o resultado do reconhecimento das transformações e das prioridades estratégicas da promoção da saúde definidas desde a Carta de Ottawa (OMS, 1986). Também se estabeleceu, como desígnio, o trajecto de continuidade que apela à participação de indivíduos e da comunidade. Quanto ao conceito de promoção da saúde propriamente dito, recorre-se à perspectiva salutogénica, no quadro do modelo teórico das Determinantes sociais da saúde e ao conceito de vulnerabilidade social, associado à teoria do risco.
O paradigma salutogénico, por oposição ao patogénico (Antonovsy, 1996) salienta a existência de factores individuais e colectivos que favorecem a saúde e o bem-estar. Neste 28
entendimento, o conceito de “sentido de coerência” (Nunes, 2001) assume um papel crucial, assim como o conceito de “recursos gerais de resistência”. Na salutogénese, o sentido de coerência traduz uma atitude individual de como cada indivíduo interpreta a sua vida e de como utiliza recursos para manter a sua saúde e o seu bem-estar. Já os recursos gerais de resistência apresentam-se como as estratégias utilizadas para a defesa e preservação da saúde podendo destacar-se, teoricamente, alguns grupos de análise (Long, 2001; Lindstrom & Eriksson, 2005). O primeiro autor estabeleceu categorias distinguindo os recursos gerais de resistência em: recursos ambientais e materiais (de contexto), físicos e bioquímicos (factores genéticos e do sistema imunitário); emocionais (de identidade e da estabilidade da personalidade); interpessoais ou relacionais (da rede de suporte social) e socioculturais, relativos ao ambiente social: cultura, crenças, normas (Long, 2001). No sentido dos recursos gerais de resistência distingue-se o foco que analisa a saúde da população, relacionando, no lugar dos factores que podem condicionar a saúde, aqueles que a podem promover e que geram o equilíbrio.
Por oposição, o conceito de Determinantes sociais de saúde (Dahlgren & Whitehead, 1991, 2006; Marmot et al., 2008) revelou grande importância para a investigação porque consegue identificar os múltiplos factores de risco na transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Já a vulnerabilidade individual, social e programática/política, encontrou espaço de discussão na ligação existente entre os níveis de cuidados de saúde, especialmente quando esta é estabelecida a partir do contexto hospitalar. Considerou-se para a discussão do conceito do risco, a distinção entre a possibilidade e a realidade (Renn, 1992) que remete para uma eventualidade que pode ou não acontecer. Sobressai também a perspectiva que defende o risco como um “continuum” (Dean, 1999, p.146) que nunca deixa de existir totalmente. Pode de facto, ser minimizado, localizado e evitado, mas está sempre presente porque advém da natureza ou da acção humana. Esta assunção altera o conceito tradicional de integração social em geral, e em especial na saúde, tendo sido utilizado para manter a estabilidade e fomentar a coesão social. Tal “modus operandi”, fruto do compromisso com as políticas sociais reguladoras e exclusiva dos serviços públicos, determinou a passagem de uma sociedade moderna, cujas políticas incidiram nos perigos calculados subjacentes à herança do industrialismo, para uma sociedade de “risco exterior”, isto é, “do que chega de fora, das imposições da tradição ou da natureza” (Giddens, 2000, p.35).
29
O que de facto se discute no panorama da saúde, é a forma de canalizar a acção governamental na promoção de políticas, com a finalidade de estabelecer um perímetro à volta dos riscos para a saúde. Esta actuação preventiva sobre os “focos de risco” tem apresentado medidas, tácticas e métodos definidos pela natureza e expressão desses mesmos focos. Porém, a questão que hoje se coloca, deve considerar o risco como um processo dinâmico que interfere na ordem dos problemas sociais. Assim sendo, as políticas devem também perspectivar a sua actuação sobre as situações-problema que decorrem do processo de transformação social e que se podem criar, gerar ou alterar, se não forem tomadas medidas que permitam retomar o equilíbrio.
Finalmente, depois de um enquadramento do risco na saúde e do dimensionamento dos seus limites através do recurso ao modelo sistémico das Determinantes sociais da saúde, coube verificar a vulnerabilidade social dos doentes e das famílias, distinguindo a sua amplitude e salientando a intervenção prioritária na extrema vulnerabilidade. A aproximação ao conceito de vulnerabilidade na saúde considera uma definição tridimensional, a saber: individual, social, programática e de serviços (Ayres et al., 2003; Muñoz Sánchez & Bertolozzi, 2007). O plano individual tem como referência as etapas e os comportamentos que cada pessoa escolheu durante a sua vida. A vulnerabilidade social relaciona-se com estigmas e com condições sociais (factores económicos, políticos e culturais), bem como, o acesso a meios de comunicação e à disponibilidade de usufruto de recursos cognitivos e materiais. Finalmente, uma vulnerabilidade programática (RNCCI) e de serviços (hospitais) que sugerem a acessibilidade, a qualidade dos programas e o compromisso da rede de instituições indispensáveis, para a distribuição das condições de saúde e de bem-estar, incluindo as que asseguram a transição dos cuidados. O que se verificou do binómio “risco versus vulnerabilidade”, e daí a distinção, foi que o segundo conceito, apesar de estar assumido no primeiro, acaba por ter maior extensão do que o valor probabilístico da análise do risco. Nesse sentido, sobre ele impendem áreas prioritárias de intervenção em saúde, como a viabilidade da continuidade de cuidados fora do contexto hospitalar. O conceito de “risco”, apesar de imprescindível na aproximação à problemática em estudo, está associado a uma ideia objectiva, em função de uma determinada exposição a um 30
fenómeno identificável, ao contrário da vulnerabilidade, que reúne um conjunto de determinantes que extrapolam os fenómenos circunstanciais ou individuais. Na matriz de análise na saúde consideraram-se aspectos sociais e contextuais que podem contribuir para uma (re) instalação da doença, para o seu agravamento ou para outros perigos aquando a alta hospitalar. Estes incluem a disponibilidade e/ ou a escassez de recursos vocacionados para a protecção social na área da saúde e também remetem para a intervenção sistémica e integrada que coloca o doente no centro dos cuidados.
3.2.3 A POLÍTICA
DE CUIDADOS
CONTINUADOS INTEGRADOS E OS DESAFIOS DA
INTERVENÇÃO SOCIAL
A vulnerabilidade social na transição dos cuidados hospitalares para os CLD é influenciada pela dependência e pelo envelhecimento da população, o que destina o foco da investigação também para a Rede de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), que em missão promove respostas de continuidade pós-hospitalares propondo-se, a contrariar os efeitos dos fenómenos demográficos mencionados. Neste domínio importou, em primeiro lugar, aferir o significado de dois conceitos: o de cuidados de longa duração (CLD) e de cuidados continuados integrados (CCI). Distinguir estes conceitos foi útil porque na maioria dos países europeus, há uma separação acentuada entre cuidados de saúde e de apoio social, o que leva a dificuldades de coordenação na agilização de respostas para quem tem necessidades específicas e de apoio integrado. A abordagem aos CLD, no plano europeu carece de uma definição exclusiva, o que coloca dificuldades de enquadramento, por não existir consenso conceptual, mesmo entre organizações internacionais. Este tipo de respostas dos sistemas de protecção social e de protecção na saúde dos países da União Europeia, apelidadas de CLD, ou de “Long Term Care”, assumem divisões de responsabilidades dissonantes, e organizações de cuidados de saúde e sociais distintas, que provocam variações de serviços. Neste domínio, enveredou-se então, por uma definição de conceitos mais consentânea com a realidade portuguesa, distinguindo-se duas concepções, uma que se designa por CLD ou “Long Term Care” e outra por Cuidados Continuados Integrados (CCI) ou “Continuing Care”. Assim, definiu-se CLD como: “uma gama de serviços para pessoas que estão dependentes de ajuda de actividades da vida diária (AVD), devido a incapacidade física ou mental, estando associada à prestação de serviços básicos na 31
área da saúde (tratamento de feridas, gestão da dor, medicação, monitorização da saúde, prevenção, reabilitação, cuidados paliativos.” (OCDE, 2008, citado por Abreu-Nogueira, 2009, p.4)
e CCI como: “uma perspectiva global, relativamente a serviços de saúde e sociais que incluem cuidados institucionais, serviços na comunidade e apoio domiciliário. Varia o tipo de serviços em cada um dos componentes e o mix entre eles (…) Assenta em respostas mais adequadas às necessidades, mas também em melhores serviços para apoio continuado às pessoas em situação de fragilidade ou com doença crónica e de apoio à recuperação da funcionalidade e continuidade de cuidados pósinternamento hospitalar. Tem por objectivos o aumento da capacidade de intervenção dos serviços de saúde e de apoio social ao nível da reabilitação integral e da protecção da autonomia.” (AbreuNogueira, 2009, p.5).
As instituições, serviços e equipamentos sociais que fornecem a gama de cuidados acima referida são distintas entre si, variam consoante a sua localização e apresentam soluções diversas nos vários países europeus. Em Portugal, a necessidade de coordenação surgiu da interface entre CLD, na área dos cuidados de saúde (primários e secundários) e na dos serviços de apoio social (centros de dia, casas de repouso, lares, associações, organizações não governamentais). As duas últimas décadas, aliadas ao aumento exponencial do envelhecimento, da dependência e da doença crónica, fizeram proliferar os cuidados pessoais, sociais e de saúde, a nível formal e informal (Campos, 2008, p.107). Esta tendência exigiu a participação de vários interlocutores, numa perspectiva de “welfare mix” que surge num contexto de transição demográfica, a par com outros países da Europa Ocidental, especialmente aqueles que assumem as características do modelo da Europa do Sul.
Quanto ao papel do Estado, como foi referido, a ideia fundamental foi a de regular e promover respostas sociais, responsabilizando os interlocutores envolvidos através de políticas activas, de forma a capacitar indivíduos e instituições (Capucha et al., 2005) para uma nova cidadania participativa e socialmente responsável, que tem como objectivo promover a coesão social. O esforço de todos os interlocutores e a imposição em se avaliar o tipo de cuidados a prestar numa determinada situação de dependência/necessidade após um internamento hospitalar, é fundamental, tendo-se exigido uma política que reunisse também uma melhor integração entre saúde e o apoio social e que salvaguardasse a diferenciação positiva na promoção da igualdade de oportunidades e a territorialidade, salvaguardando o equilíbrio e a justiça social entre meios envolventes distintos (AA.VV, 2002). As primeiras medidas para a criação de respostas integradas surgiram assim com o Plano de Apoio Integrado para Idosos -PAII (Despachos Conjuntos nº 166/94 de 20 Julho; 259/97 de 32
21 de Agosto; 407/98, de 18 de Junho; 726/98 de 16 de Outubro) estando vocacionadas para a população desta faixa etária. Nesse mesmo tempo, foi cogitada uma Rede de Cuidados Continuados de saúde da responsabilidade conjunta do Ministério da Solidariedade Social e do Trabalho e do Ministério da Saúde, tendo sido já tardiamente regulamentada através do Despacho Conjunto nº 407/98 de 18 de Junho. Estas respostas serviram as situações de dependência na área dos CLD, abrangendo inicialmente, duas medidas inovadoras, o Apoio Domiciliário Integrado (ADI) e a Unidade de Apoio Integrado (UAI). Apesar de dirigidas, fundamentalmente, à área da saúde mental, também proporcionavam cuidados continuados de reabilitação e tratamento a pessoas dependentes com alta hospitalar, tendo sido alargadas em 2001, a pessoas carecidas de cuidados especiais, a toxicodependentes e a idosos, tendo sido consolidadas pela primeira lei da Rede de Cuidados Continuados Integrados (Decreto Lei nº 281/2003, de 8 Novembro). A rede deveria constituir-se por todas as entidades públicas, sociais e privadas que estivessem em condições de prestar cuidados de saúde e tivessem como objectivo a promoção e a manutenção da qualidade de vida, assim como o bem-estar e o conforto daqueles que dela necessitassem.
Finalmente num trajecto de consolidação, surgem as respostas integradas no Serviço Nacional de Saúde (SNS) fomentadas pelas orientações europeias, no sentido da prestação dos cuidados de saúde a pessoas dependentes e idosas (Resolução do Conselho de Ministros nº 84/2005, de 27 Abril). A resolução sustenta a estreita articulação entre Saúde e Segurança Social através de uma política de cuidados continuados integrados, que formalmente se manifestou por intermédio do Decreto-lei nº 101, de 6 de Junho de 2006.
Esta política de saúde também fez parte de um dos eixos da investigação, na medida em que a Rede de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) tem por missão facilitar cuidados de saúde e de apoio social aos cidadãos, desde que estes reúnam os critérios de elegibilidade para acederem a uma das tipologias de cuidados existente. A RNCCI é uma resposta formal e institucional levada a cabo por profissionais, unidades, equipas de saúde (Hospitais e Cuidados de Saúde Primários,) e instituições de apoio social de suporte (Misericórdias, Associações, Instituições Particulares de Solidariedade Social e Instituições Privadas lucrativas) que garantem uma via de continuidade na transição dos níveis de cuidados aos doentes.
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Porém, o aumento da esperança média de vida vai despoletando uma recrudescente procura de cuidados de saúde, e em particular, nos CLD. A quebra de financiamento no sector da saúde e o acesso a este tipo de cuidados torna-se uma questão crítica, já que a tónica da governação é colocada simultaneamente na redução de custos e na manutenção da qualidade dos serviços prestados. Perante um cenário de crise económica e financeira, a RNCCI atravessa um momento de incerteza, onde as opções da oferta tidas em matéria de financiamento público, privado com fins lucrativos ou sem fins lucrativos, determinam o grau de cobertura da rede. No contexto da incerteza de recursos, aparecem como noções centrais para a compreensão do fenómeno, os conceitos de cuidador informal, de família, de Serviço Social na saúde e de modelos de intervenção social na saúde, sendo do conhecimento geral que o envelhecimento da população portuguesa tem provocado um aumento do grau de dependência e da sobrecarga sobre as famílias, pese embora a RNCCI se apresentar como uma medida recente de resposta a esta tendência. Face à natureza destes fenómenos prevê-se uma maior procura de cuidados continuados, principalmente, pela parte da população mais idosa, confirmando-se a indispensabilidade de investimento na diferenciação dos cuidados e na gestão da doença crónica. Em Portugal, por exemplo, as preocupações com a natureza da RNCCI na agenda política têm sido, sobretudo, sobre a sua sustentabilidade, quer pela questão da diversidade de financiamento, quer pela conjugação adequada da prestação de serviços por cuidadores formais e informais. Contudo, há ainda um reconhecimento generalizado, de que os CLD recaiem maioritariamente sobre o domínio privado, das famílias e de outros cuidadores informais, (física e financeiramente) quando as situações de dependência exigem cuidados formais. A este nível, o perfil do cuidador informal é variável, no entanto são as mulheres que assumem na larga maioria, esta responsabilidade (OCDE, 2005). Ainda assim, é importante salientar que os homens têm vindo a ocupar o papel de cuidador das suas esposas, melhorando a participação masculina nos cuidadores informais, contrariando a tendência do passado, em não assumirem as competências de gestão do lar ou da educação dos filhos. Contudo, subsistem ainda diferenças de género nos vários níveis de cuidados, sendo que as mulheres continuam a destacar-se no quadro dos cuidadores informais, assumindo os compromissos de maior responsabilidade (Pego, 2013, p.60-64). Relativamente ao apoio familiar como fonte de cuidados informais, não restam dúvidas que se devem considerar os argumentos que reconhecem o carácter binário das responsabilidades na dependência (Lavoie, 2000), combinando critérios normativos e critérios afectivos por parte 34
dos membros da família. Deve também salientar-se, o que se apelida de sentimento de obrigação familiar (familismo), onde claramente existe uma hierarquia de principais cuidadores, uma divisão sexual dos cuidados e na ordem de escolha destes (Walker, 1991). Ou pelo contrário, no reconhecimento da desfamiliarização que expõe o desaparecimento de certas práticas socais tradicionalmente enraizadas na família e que podem provocar rupturas das solidariedades intergeracionais (Bengston, 2001).
Finalmente, cabe demonstrar em que medida o Serviço Social e os assistentes sociais promovem a saúde dos doentes na transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Neste sentido, importou compreender a prática profissional hospitalar, relativamente ao modelo teórico, ao método e aos modelos de intervenção social que fundamentam o planeamento da continuidade de cuidados. Ainda que não seja uma ciência exacta, tenta comprovar-se que a base e a sustentabilidade da intervenção social no contexto de transição dos cuidados, são determinadas por critérios de risco social a partir do método científico (Barker, 2003), pressupondo as etapas de observação, hipótese, estudo, pré-diagnóstico e tratamento. Neste sentido, e pela via hospitalar, o Serviço Social assume o preconizado pela OMS quando se refere à seguinte premissa: “para proteger a população os governos precisam de poder avaliar os riscos e de escolher as intervenções mais eficazes e acessíveis, de forma a evitar que ocorram esses riscos” (OMS, 2002, citado por Carvalho, 2012, p.66-67).
4. OS OBJECTIVOS DA INVESTIGAÇÃO
O encontro entre os objectivos da investigação e o referencial teórico assumido no modelo de análise, permitiu consolidar trilhos previamente delineados garantindo o rigor na condução da investigação.
A apresentação do trajecto conceptual nasce então da ideia de que as instituições (Immergut, 1998; Thelen, 1999, Hall & Taylor, 2003; Pierson & Skocpol, 2004;Ansell, 2006) contribuem de forma relevante para o desenho de políticas, como entidades formais, designadamente as que integram o aparelho estatal, o sector privado e o terceiro sector e as outras instituições de interacção informal, como a Família, por exemplo (Rosamond, 2000). Neste prisma, e tendo como enquadramento o futuro das políticas sociais integradas, tenta demonstrar-se como o Novo Institucionalismo aceita a visão plural e enfatiza a relevância do contexto institucional. 35
Tal abordagem, para além de levar a uma apreciação mais ampla das instituições, considera a hipótese de contribuir para o redesenho de novas práticas de intervenção social. Esta mudança justifica-se pela expressão e pela complexidade da epidemiologia clínica e social actual, que têm conduzido, ao diagnóstico de situações de extrema vulnerabilidade às quais é imperativo dar resposta prevenindo o perigo e a exclusão social na continuidade dos cuidados de saúde e de apoio social após a alta hospitalar. Para tal importa reconhecer o valor dos estudos de caso, como se propõe neste caso particular.
Como consequência do enquadramento teórico exposto no modelo de análise, também é formulada uma questão de partida que acaba por delimitar os objectivos da investigação.
OBJECTIVO GERAL DA INVESTIGAÇÃO 1. Definir “extrema vulnerabilidade” na transição dos cuidados hospitalares para os CLD através do modelo de intervenção do Serviço Social hospitalar;
A investigação procura determinar a vulnerabilidade dos doentes na transição dos cuidados hospitalares para os CLD, a partir do modelo de intervenção do Serviço Social hospitalar, em três instituições hospitalares que compõem o Centro Hospitalar Lisboa Ocidental. A partir deste ponto de partida quis aprofundar-se a relação entre os factores de risco social identificados pelo diagnóstico dos assistentes sociais, através do quadro teórico das Determinantes sociais da saúde. Essa conjugação de variáveis pretende identificar perfis de vulnerabilidade e de extrema vulnerabilidade, em contexto hospitalar para doentes que regressam à comunidade para beneficiarem de apoio familiar, formal ou informal. No seguimento deste objectivo, questiona-se o grau da vulnerabilidade dos doentes aquando o regresso ao meio envolvente e incluem-se critérios como: condição de dependência, doença crónica, comorbilidade e destino após alta sem apoio formal. Essa conjugação de variáveis procura definir melhor o perfil da “extrema vulnerabilidade”, avaliada em contexto hospitalar, e a necessidade de atenção redobrada dos assistentes sociais no planeamento de altas, para a articulação com os serviços de proximidade, tanto ao nível dos cuidados de saúde como de apoio social.
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OBJECTIVOS ESPECÍFICOS
1. Identificar os principais Determinantes sociais da saúde na transição dos cuidados hospitalares para os CLD, através da sistematização dos Diagnósticos registados pelos assistentes sociais, no quadro do modelo de intervenção sistémico/ecológico, por comparação ao modelo que teoriza os constrangimentos sociais na saúde por camadas (Dalhgren & Whitehead, 2006);
2. Aferir o impacto da extrema vulnerabilidade nos cuidadores informais, através da análise do processo de cuidar, da conjugação da rede formal e informal e do impacto da extrema vulnerabilidade no cuidador;
Quis percepcionar-se a importância dos cuidadores informais, em especial da família, na compreensão dos CLD, salientando o impacto da extrema vulnerabilidade na vida do cuidador, colocando em evidência questões de género e a forma como se articulam cuidados formais e informais, em contexto domiciliário. As orientações teóricas sublinham por um lado, a tradição do “familismo” (Walker, 1991) e a responsabilidade familiar (Lavoie, 2000), e por outro, a ruptura com laços familiares - “desfamilização” (Lenoir, 1979, citado por Gil, 2010, p. 68) e a dificuldade em constituir “redes de apoio” (Albuquerque & Pimentel, 2010) em situações críticas, como as de extrema vulnerabilidade.
3. Auscultar, no quadro da vulnerabilidade programática, informadores privilegiados sobre a política de Cuidados Continuados Integrados em Portugal: em áreas sensíveis como o financiamento, a procura e a oferta de cuidados, o acesso, a sustentabilidade, a adequação às necessidades e a expansão geográfica.
A exploração desta política de saúde circunscreve a acção do Estado e incorpora na sua definição, opções de gestão inovadoras por um novo modelo de governação na saúde. Todavia, o financiamento, a diversificação de parceiros privados e do terceiro sector e a sustentabilidade económica, condicionam a oferta e a procura deste nível de cuidados tornando-a incerta e sensível ao risco. Ainda numa fase de consolidação da RNCCI, questionam-se questões como o acesso, a assimetria entre procura e a oferta de cuidados e a garantia da sustentabilidade das unidades constituídas pela política de concessão/regulação 37
dos parceiros e do financiamento variável, consoante as verbas oriundas dos Jogos Sociais da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML). Na linha da teoria do risco, acrescem as dúvidas de uma ágil articulação entre ministérios da Solidariedade e da Segurança Social e do Ministério da Saúde, para o bom desempenho da política integrada, já que, o plano de “combate” ao hospitalocentrismo e a tentativa da colocação do doente no centro do sistema de saúde, não surtiu os efeitos desejados.
SÍNTESE DE CAPÍTULO
Esta investigação surge da necessidade de aferir a vulnerabilidade dos doentes em contexto hospitalar. O tema tem manifestado interesse porque substitui a análise linear de verificação de factores de risco pela compreensão de situações de vulnerabilidade. A mudança de estratégia fomenta a coesão social na transição do nível de cuidados de saúde, não só através do aumento da eficiência no planeamento de altas e na articulação com os cuidados de continuidade, mas porque contribui para a eficácia da prestação de serviços de saúde, apurando situações de extrema vulnerabilidade nos doentes e cuidadores. Deste modo podem reorganizar-se pessoas e meios, minimizando a procura de cuidados hospitalares e adequando os níveis de cuidados disponíveis às necessidades dos doentes.
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PARTE II
OS PRINCIPAIS EIXOS TEÓRICOS
A tese que se apresenta enquadra teoricamente o contributo das práticas e do método do Serviço Social hospitalar na determinação do risco social, o que lhe permite distinguir o grau e a amplitude de vulnerabilidade dos doentes, após a alta hospitalar.
O estudo está circunscrito à área da saúde, e em especial, ao processo de transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Neste domínio, salienta-se o papel das instituições formais (Hospitais, RNCCI, Organizações lucrativas, não lucrativas e do Terceiro sector) e informais (Rede familiar e de vizinhança) na promoção e na manutenção da qualidade de vida dos cidadãos.
Finalmente, numa perspectiva mais abrangente, são dadas a conhecer as reflexões teóricas que passam pelo Novo institucionalismo e pela Governação em Saúde.
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CAPITULO 1 - O
SERVIÇO SOCIAL NO PLANEAMENTO DA ALTA HOSPITALAR: DO
DIAGNÓSTICO À GESTÃO DA VULNERABILIDADE DO DOENTE E DOS CUIDADORES INFORMAIS
RESUMO DE CAPÍTULO
Este capítulo coloca em evidência as linhas teóricas centrais à investigação. Inicialmente, define-se uma concepção de promoção da saúde numa perspectiva salutogénica, demonstrando a importância dos conceitos-chave que norteiam a salutogénese (“sentido de coerência” e “recursos gerais de resistência”).
Em seguida, por oposição, apresenta-se a teoria do risco, como um processo dinâmico, que interfere na ordem dos problemas sociais e que se expressa globalmente na área da saúde. Para tal, estabelece-se um perímetro em torno das dimensões do risco, enquadrando-as em Determinantes sociais da saúde (Dalhgren & Whitehead, 2006; Marmot et al., 2008). Esta abordagem demonstra, ao mesmo tempo, a existência de uma compatibilidade com o modelo teórico do Serviço Social hospitalar, que se norteia por uma matriz, também multidimensional na aferição do diagnóstico social, no plano de intervenção para a minimização de riscos sociais, bem como ao nível da prevenção de situações de vulnerabilidade no período após a alta hospitalar.
Finalmente pretende aprofundar-se o conceito de vulnerabilidade e as causas que levam doentes e famílias a esta condição, que resulta de uma conjugação de dimensões de risco/ Determinantes sociais da saúde. Cabe referir que este conceito, no Serviço Social hospitalar, é fruto da complexidade do diagnóstico aferido pelos assistentes sociais hospitalares, e esclarece áreas prioritárias de intervenção focadas no doente, nos cuidadores informais e nos cuidadores formais.
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5. ENTRE A PROMOÇÃO DA SAÚDE E A EVIDÊNCIA DO RISCO: PERSPECTIVAS TEÓRICAS
O sistema de saúde português, acompanhou a evolução do conceito da saúde para uma definição que se foi tornando mais abrangente e integradora, como defendem hoje em dia, as organizações nacionais e supranacionais. Neste sentido, pode afirmar-se que inicialmente, a governação hospitalar esteve associada a uma cultura de “reparação” da doença e não de promoção da saúde, o que colocava o seu modelo de organização e funcionamento conciliável com certos paradigmas teóricos, como o alopático (Kuteev- Moreira, 2007) e o patogénico (Antonovsky, 1991). Na verdade, ambos os contributos limitavam a abrangência conceptual da saúde a uma tripla função que compreendia: a prevenção, o tratamento e a reabilitação da doença. Tais limitações, também ao que ao Serviço Social na saúde diz respeito, fizeram emergir um novo paradigma assente na promoção da saúde e no bem-estar dos cidadãos, mais humanista e centrado no indivíduo e não na patologia. Este teria como propósito equilibrar as funções de tratamento e cura dos hospitais, desde o acolhimento até ao momento da alta, considerando a realidade e o meio onde cada doente se encontra inserido (Kuteev-Moreira, 2007).
A PREVENÇÃO DA DOENÇA E A PROMOÇÃO DA SAÚDE
A abordagem ao conceito de saúde somou reformulações sucessivas até à sua definição actual, designadamente, pela inclusão de factores de ordem, psicológica, social e ambiental. Do conceito de saúde como: “estado de completo bem-estar físico, mental e que não consiste somente numa ausência de doença ou de enfermidade” (Preâmbulo da Constituição da OMS) até à visão multidimensional que se conhece nos dias de hoje, foram reconhecidas dimensões como a felicidade, a satisfação com a vida, a auto-realização e a capacidade de empreender na vida (Bengel et al., 1999).
A prevenção da doença enquanto modelo, ganhou espaço na década de 50, estando subordinada à corrente higienista e imunizadora que relacionava a doença com determinados factores de risco a que a população estava exposta (Leavell & Clark, 1977). Actuava-se nas causas da doença, permitindo-se através da mudança comportamental, a minimização de riscos importantes, sendo possível obter ganhos significativos em saúde. Mais tarde, o reconhecimento internacional e o compromisso da universalidade do direito à saúde e da 40
adequação às necessidades da população, primeiro por intermédio da Declaração de AlmaAta (1978) e depois pela Carta de Ottawa (1986), revelaram-se marcos importantes de transição, rompendo com o modelo biomédico e voltando-se para os preceitos da saúde comunitária, a qual se identificava com uma ideia mais ampla de justiça social, de solidariedade, de co-responsabilidade e de mobilização dos vários sectores da sociedade.
A prevenção da doença, entendida como um conjunto de medidas específicas, era agora substituída por um processo de inspiração salutogénica, que preconiza a existência de factores individuais e colectivos, que favorecem a saúde e o bem-estar (Antonovsky, 1996). Esta perspectiva, reconhece as transformações do mundo e destaca o papel da participação do indivíduo e das estruturas da comunidade, no seu próprio projecto de vida. Também encontra homogeneidade no conceito de “empowerment”, quando se refere à capacidade individual ou colectiva para a mobilização de recursos ou para a assunção de intenções de mudança (Bengel et al., 1999) estando por isso, fortemente enraizada na prática dos assistentes sociais da saúde.
5.1 A SALUTOGÉNESE, A RESILIÊNCIA E O MODELO HUMANISTA ECOLÓGICO A SALUTOGÉNESE E A PROMOÇÃO DA SAÚDE A “patogénese” e a “salutogénese” são dois conceitos que não se opõem, mas que sustentam significados diferentes. A patogénese sugere uma valorização da causa específica da doença, na qual os sintomas ou sinais que indicam a disfuncionalidade têm uma importância preponderante. Esta visão focaliza-se na doença e na sua prevenção, por uma contraposição à adaptação activa do organismo ao meio envolvente (Long, 2001). Todavia, a salutogénese não exclui nem se substitui à orientação patogénica, porque esta permite desvendar a origem e o tratamento da doença e essa dimensão é crucial (Antonovsky, 1990). O que propõe, porém, relaciona-se com a importância de valorizar a rede de determinantes que têm influência para a saúde e para a cultura do desenvolvimento individual e organizacional/colectivo num sentido positivo e, por tal (Graça, 2000), numa perspectiva que não é meramente de prevenção da doença, mas de promoção da saúde. O objectivo passa por desenvolver mecanismos, comportamentos e práticas saudáveis que possam potenciar factores de protecção nas pessoas e apetrechar os seus “recursos gerais de resistência”, através de um “sentido de coerência” (Antonovsky, 1996) que permita a cada indivíduo/família responsabilizar-se pela sua saúde e pela saúde da comunidade. 41
A EXPLICITAÇÃO DO “SENTIDO DE COERÊNCIA” E DE “RECURSOS GERAIS DE RESISTÊNCIA”
O paradigma salutogénico, que tem por base a promoção da saúde (OMS, 1997), identifica uma condição prévia de cada indivíduo na relação com o seu meio envolvente, que é variável de pessoa para pessoa. A percepção do que se designa por “sentido de coerência” (Antonovsky, 1987), distingue os efeitos a uma determinada exposição, a factores exógenos e endógenos, ou seja, depende de como cada indivíduo actua perante situações que penalizam ou podem ser prejudiciais para a sua saúde. Por outro lado, reflecte-se na forma como cada pessoa cognitivamente, emocionalmente ou afectivamente percepciona as experiências de vida e as interioriza, assim como na sua capacidade de levar a cabo acções, atitudes ou recursos disponíveis para assegurar a sua saúde e bem-estar. Para o autor, a expressão desta ideia constitui a base do paradigma salutogénico: “A global orientation that expresses the extend to which on has a pervasive, enduring though dynamic feeling of confidence that (1) the stimuli deriving one`s internal and external environments in the course of living are structured, predictable and explicable; (2) the resources are available to meet the demands posed by these stimuli, and (3) the demands are challenges worthy of investment and engagement” (Antonovsky, 1987, p.19)
De facto, o “sentido de coerência” é, para cada indivíduo, o instrumento que catalisa a acção depois de digerir os inputs externos ou internos que cada experiência de vida proporciona. A forma como age é determinada pelo modo como calibra o impacto das experiências e faz uso dos recursos que tem à sua disposição, tendo capacidade para os alterar ou modificar, de acordo com as exigências que se vão colocando. Finalmente, a abordagem ao conceito, revela que um “sentido de coerência” equilibrado, num determinado indivíduo influencia positivamente as acções que podem favorecer a sua saúde quando estiver perante uma situação de risco (Bengel et al., 1999).
O autor que desenvolveu o conceito, introduziu uma outra noção complementar que classificou como “recursos gerais de resistência”. Esta asserção terá surgido de estudos epidemiológicos que levou a cabo, com grupos sociais marginalizados e excluídos socialmente, designadamente, com mulheres sobreviventes de campos de concentração nazi e de judeus que experimentaram a miséria extrema, antes do estabelecimento do Estado de Israel (Antonovsy et al., 1971; Datan et al., 1981). A partir do conhecimento empírico deste conjunto de pessoas expostas a agentes de stress, foi possível determinar características que 42
quando categorizadas, identificavam estratégias de protecção para fazer face às condições de adversidade exógena ou endógena a que foram submetidos, permitindo de certa forma, sublimar os efeitos que podem penalizar ou afectar a saúde de cada indivíduo, como melhor exprime a seguinte declaração: “stressors are omnipresent in human existence (…) given the ubiquity of pathogens – microbiological, chemical, physical, psycchological, social and cultural” (Antonovsky, 1979, p. 9-13).
Mais tarde, estudos percursores identificavam estratégias de coping, importantes nos “recursos gerais de resistência” ao nível das competências pessoais, sociais, culturais, estendendo-se ao suporte social e aos recursos materiais (Lazarus & Folkman, 1984). Estes foram também relacionados com as características que determinado indivíduo, grupo, sociedade ou subsistema detém e que lhes permite lidar com acontecimentos adversos, especialmente no que toca à defesa e à promoção da saúde (Antonovsky, 1979, 1987). Com base nos preceitos de Antonovsky, mas aludindo à descrição dos “recursos gerais de resistência” (Long, 2001, citado por Carrondo, 2006), elencam-se as seguintes categorias: I “Ambientais e materiais – Descreve o contexto em que o indivíduo nasce e se desenvolve (…). Pode estar associado ao acesso a “recursos materiais, ao grau educacional, à saúde, ocupação profissional, localização geográfica, características ambientais e níveis de poluição” (Carrondo, 2006, p.42); II. “Físicas e bioquímicas – Refere-se a factores genéticos individuais e inclui características como o (…) capacidade do sistema imunitário resistir à doença e se adaptar a um ambiente em mudança” (Carrondo, 2006, p.42); III. “Emocional – Refere-se à identidade do eu, à identificação do papel e à estabilidade da personalidade” (Carrondo, 2006, p.42); IV. “Interpessoais/Relacionais – Inclui a rede de suporte social do indivíduo (...) apoio do cônjuge, de um amigo, colega ou religioso”; (Carrondo, 2006, p.42); VI – “Socioculturais – refere-se á forma como cada indivíduo se adapta ao seu ambiente social. Inclui a cultura, sistema de crenças, a língua, as normas” (Carrondo, 2006, p.42);
O PARADIGMA SALUTOGÉNICO E O SERVIÇO SOCIAL NA SAÚDE
O paradigma salutogénico complementa o modelo patogénico e visa a promoção da saúde, (Nunes, 1999) permitindo ganhos através da adaptação de práticas e de comportamentos saudáveis. O desenvolvimento destas práticas tem influência directa no “sentido de coerência” dos indivíduos, tanto na recuperação de estados de tensão desencadeados por acontecimentos adversos, como no apoio à participação nos processos de decisão (Bengel et al., 1999). A 43
salutogénese porém, não se limita exclusivamente ao domínio de uma profissão ou área disciplinar já que envolve uma cultura interdisciplinar. Não sendo restritiva, pode ser fomentada individualmente, por interacção pessoal, em grupo, ou na comunidade. Nesta lógica o “sentido de coerência” serve de guia de orientação da prática profissional, tendo impacto no desenvolvimento do processo de decisão dos indivíduos, através do estabelecimento da relação e do diálogo (Lindstrom & Eriksson, 2005).
No caso concreto, os assistentes sociais na saúde, e em contexto hospitalar, fazem-no pela via da entrevista de ajuda e do estabelecimento da relação empática que são, etapas essenciais para aferir e consolidar o “sentido de coerência” do doente, para que este possa decidir de forma participada na estratégia mais adequada à promoção da sua própria saúde. É então, com alguma naturalidade, que modelo salutogénico encontra homogeneidades com a intervenção do Serviço Social na saúde. A sua adequação foi estudada e considerada útil em determinados contextos, que também servem a investigação, designadamente na perspectiva de potenciar o “sentido da coerência” dos doentes no momento em que há lugar a uma decisão de transferência de responsabilidade de cuidados de saúde e de apoio social. Este conceito serve de instrumento ao Serviço Social, porque providencia um conjunto de informações relevantes sobre a capacidade de um doente ou até mesmo de um cuidador familiar, lidar com os agentes de stress ou com as adversidades, que lhes são colocadas no planeamento da alta hospitalar, ligando três aspectos fundamentais: a prevenção (na transição dos cuidados), a saúde (na perspectiva da sua promoção) e o Serviço Social (Frankenhoff, 1998, p.512). O Serviço Social tem um papel no reforço do “sentido de coerência”, mas também determina as suas competências e funções na saúde, nas denominadas “clinical practice activities”, também conhecidas como “direct practice”, ou por outras palavras, numa intervenção directa, face-a-face. Nesta área específica que será desenvolvida oportunamente, incluem-se as seguintes responsabilidades para o assistente social: “a) Psychosocial evaluation and assessement; b)Help with pschosocial functioning; c)Help with adaptation to illness; d)Help with posthospital planning; e) facilitating services, e finalmente, f)protective services” (Jonhson et al., 1995, p.133-134). Tais aptidões demonstram que a intervenção dos assistentes sociais tem subjacentemente, a capacidade de integrar positivamente a mudança, que pode fazer a diferença, reconhecida no modelo salutogénico, como o “sentido de coerência”. Pode fazê-lo, efectivamente, nas três dimensões que o constituem e que foram já mencionadas: na 44
capacidade de compreensão (percepção do meio e da realidade em que está inserido), na gestão (possibilidade de alocar recursos disponíveis para responder aos problemas que se evidenciam) e através do investimento (depois de compreender o fenómeno investe-se proactivamente numa abordagem promotora de mudança).
RESILIÊNCIA: UM CONCEITO-CHAVE
No trilho da promoção da saúde, a salutogénese está alinhada a outro conceito, o de “resiliência”, aliás, certos autores referenciam-na mesmo como um modelo ou tipo de resiliência, resultado da interacção interdisciplinar entre a Sociologia e Psicologia (Soria et al., 2007, p.4). A “resiliência” como objecto de estudo esteve, desde cedo, ancorada epistemologicamente às ciências exactas (Young, 1807, citado por Soria et al., 2007) e a áreas disciplinares como a Engenharia, a Física e a Matemática. O seu focus divergiu mais tarde, interdisciplinarmente, conjugando ciências como a Física e a Química, a Sociologia e a Biologia e a Sociologia (Bengt, 2004) e a Psicologia (Rutter, 1985). No entanto, o significado delimitador do conceito que aqui se demonstra, concerne às ciências sociais e humanas e deve ser definida como um processo que se instala quando se evidencia um risco ou uma ameaça ao desenvolvimento de uma pessoa, sendo a resiliência o resultado da adaptação a essa possibilidade de risco (Cowan et al., 1996; Masten, 2001). Como uma construção de estatuto inferencial e proveniente de determinado contexto, a resiliência envolve duas dimensões distintas: os processos de adaptação e os factores de risco (Masten, 2001). No primeiro caso, a adaptação assenta na diversidade de tarefas, que se esperam que um indivíduo alcance durante o seu desenvolvimento, tendo em consideração as expectativas culturais, o contexto histórico, político, social e económico em que se encontra inserido. A adaptação pode até ser mensurável, por exemplo através de variáveis como a competência social e académica (Elder, 1998; Masten & Cosworth, 1995), mas estão também relacionadas, com maior pertinência para esta investigação, com características individuais (auto-estima e auto-eficácia) e sociais (rede de apoio social e coesão familiar) na resposta aos factores de risco, já que dependem, tanto da intensidade do risco como da conjugação com outros factores (Hardy et al., 2004).
A segunda dimensão da resiliência versa sobre a presença de factores de risco (Masten, 2001). Para os teóricos, a resiliência e a vulnerabilidade estão associadas ao risco e à probabilidade de este se poder manifestar na saúde das pessoas. O estudo dos factores de risco tem origem 45
na epidemiologia e na padronização das doenças, e dos factores que podem influenciar os níveis de segurança da população. O seu aprofundamento vai ao encontro da precisão do diagnóstico, cujo propósito passa por desvendar as afinidades com o desenvolvimento da doença, instigando intervenções que reduzam ou eliminem a sua incidência. No âmbito dos factores de risco valorizaram-se as adversidades crónicas em detrimento das agudas, pois as primeiras são tendencialmente duradouras e variam de intensidade, em particular, as que estão relacionadas com a natureza biológica e física (dependência), com as características individuais (doença crónica, comorbilidades) e com graves problemas familiares: indisponibilidade, incapacidade ou ausência de apoio, conflito, violência (Garmezy & Masten, 1994).
Sintetizando, pode afirmar-se que no âmbito da salutogénese os assistentes sociais actuam sobre os recursos disponíveis de cada doente, tentando potenciar ou manter o “sentido de coerência” através da sua acção capacitadora. Esta, como também se interpreta, pode brotar de uma estratégia de “empowerment”, que é acção, é praxis, tanto dos sistemas-cliente da intervenção social, como dos sistemas de intervenção, nomeadamente dos profissionais (…) que o procuram alcançar” (Pinto, 2011, p.477) junto dos doentes, no que resulta de uma abordagem terapêutica em contexto hospitalar (Payne, 2002; Dominelli, 2009). A apreensão dos “recursos gerais de resistência” externos ou internos que se distinguem na categorização de Long (2001), conjugada com a habilidade na técnica de “empowerment” podem ter efeitos positivos no desenvolvimento do “sentido de coerência” de um indivíduo. O objectivo é fortalecê-lo ou ampliá-lo para melhorar o potencial da saúde, sabendo que, mesmo assim, existem factores durante o percurso da vida que podem ter uma influência positiva ou negativa, catapultadas quer por experiências pessoais ou quer por experiências institucionais. Por outras palavras, “The sense of coherence concept permits the social worker to measure the adaptative capacity of a target population or of an individual in terms of both personal resources and perceived social resources (…) relates to a number of psychosocial health concepts (eg: life satisfaction, morale, hardiness, resilience) (…) its constructive potencial for social work prevention seems clear (Frankenhoff, 1998, p.520)
Em jeito conclusivo, recorre-se a uma metáfora que pode elucidar alguns dos conceitos já apresentados e outros que seguidamente serão aprofundados. Pode então comparar-se os 46
“recursos gerais de resistência” e a “resiliência” a um guarda-chuva reservado para um dia de Inverno. A chuva (tida pelos factores de risco e pelas adversidades que se podem colocar na saúde) terá mais dificuldades em conseguir chegar ao indivíduo se este, no momento em que se confrontou com essa possibilidade (risco) foi alertado ou convidado a trazê-lo consigo (empowerment) antes de sair de casa (transição de níveis de cuidados e planeamento de alta hospitalar). No fundo, transportar o chapéu-de-chuva por si não é suficiente, importa também ter a capacidade de o abrir (sentido de coerência) antes de se ficar encharcado e vulnerável à exposição da doença.
O HUMANISMO E A ECOLOGIA DOS SISTEMAS: AS ÂNCORAS DO SERVIÇO SOCIAL NA SAÚDE
A promoção da saúde pela via do Serviço Social, à semelhança dos conceitos teóricos já visitados no âmbito da gestão da alta hospitalar e da transição dos cuidados, reivindica uma abordagem humanista e multidimensional. Os assistentes sociais, já no início do século XX, veiculavam a sua prática através da prestação directa de serviços, assentando a perspectiva da profissão em teorias centradas na tarefa ou em intervenções na crise (Reid & Epstein, 1992; Doel & Marsh, 1992; Golan, 1978; Roberts, 1991, citados por Payne, 2002,p.139-162). O objectivo centrava-se na solução para os problemas apresentados pelos doentes. Paulatinamente, e mantendo essa perspectiva fizeram uso do legado da teoria cognitivacomportamental (Hudson & Mcdonald, 1986; Sheldon, 1995, Fischer & Gochros, 1975; Gambrill, 1977, citados por Payne, 2002,p.165-186), que tem como pressuposto base potenciar comportamentos desejados e reduzir comportamentos indesejados, para que as pessoas pudessem responder positivamente a situações ou acontecimentos da forma mais adequada. Na realidade este tipo de Serviço Social traduz-se, como melhor justificam os autores, “pela utilização informada, por trabalhadores sociais profissionais, de técnicas de intervenção baseadas em teorias de aprendizagem empiricamente derivadas que incluem mas não são limitadas a condicionamento operante, a condicionamento respondente e a uma aprendizagem por observação” (Thyer & Hudson, 1987, citados por Payne, 2002, p.173).
As teorias de índole cognitiva-comportamental, assentes num modelo biomédico de prevenção da doença iniciaram-se em meados dos anos 50 e 60 no Serviço Social, conduzindo os assistentes sociais a abordagens terapêuticas fundadas na teoria psicológica, e mais tarde,
47
incorporando ideias humanistas que conjugam para além das ideias cognitivas, a aceitação do entendimento e da forma como cada indivíduo interpreta e concebe o mundo em que vive.
À medida que a visão da saúde se foi alterando e prosperou para um modelo mais amplo e focado na promoção da saúde, também o Serviço Social criou capilaridades que foram e têm vindo a inovar a sua prática, adequando-se aos padrões internacionais e às sucessivas conquistas do direito fundamental à saúde, à sua protecção e reabilitação, numa perspectiva sustentável e participativa.
A FILOSOFIA HUMANISTA
O Serviço Social hospitalar concebe a gestão da continuidade dos cuidados de saúde numa abordagem teórica humanista que defende valores e direitos como: o livre arbítrio, a dignidade humana, o cuidado com o próximo, a participação activa e a auto-realização (Rogers, 1951,1961; Laing, 1971;Carkhuff & Berenson, 1977; Keefe, 1986; Ramon, 1990; citados por Payne, 2002, p.247-252). Talvez uma posição mais filosófica do que teórica, os modelos humanistas na saúde, como podem ser designados, rompem com a lógica hipotéticodedutiva do funcionalismo e com o determinismo filosófico de Marx, para abraçarem uma perspectiva que advém da racionalização da compreensão da pessoa na sua dimensão subjectiva, tendo por base a sua experiência e enquadramento do meio envolvente, onde cada pessoa está inserida. Ou como Núncio melhor explicita, quando se refere a uma “orientação compreensiva que caracteriza (…) pela procura das razões subjectivas que se ocultam por trás da realidade objectivável e aparente dos factos sociais, ou seja, pela busca dos significados mais profundos que os homens atribuem às suas condutas” (2010, p. 99).
Em suma, o humanismo representa uma forte influência para o Serviço Social hospitalar pois a sua abordagem permite apoiar a construção de projectos de vida que vão ao encontro da expectativa e do sentido da auto-realização dos doentes. Para tal, tem como ponto de partida a pessoa e o seu meio envolvente permitindo uma ampla compreensão de significados, tanto das fragilidades, como das oportunidades e da motivação para superar obstáculos. Cientificamente “o Serviço Social humanista está associado à fenomenologia psicológica, à fenomenologia sociológica, ao construtivismo da escola de Chicago, (…) e à interacção tendo em conta a ordem social” (Payne, 2011, citado por Carvalho, 2012, p. 97), mas o sentido prático da 48
intervenção social vai para além desta visão periférica e afirma que o humanismo é tomado por garantido na atitude dos assistentes sociais e, “nem sequer é tratado como uma perspectiva, uma vez que é visto como uma posição geral que informa a prática, do que como uma forma de definir uma abordagem específica à prática” (Payne, 2002, p. 246). A abordagem do Serviço Social é transmitida através dos sujeitos, tendo em consideração a compreensão das suas representações e significados (a experiência, o contexto, os meios disponíveis, os princípios e valores pelos quais se rege e a cultura onde está inserido). Em síntese, a praxis traz a si, um conjunto de várias influências, quer sejam oriundas da terapia de aconselhamento e das ideias centradas na pessoa, quer provenientes do interaccionismo simbólico e fenomenológico do trabalho social, ou até da análise transacional (Payne, 2002).
Nos dias de hoje parece evidente que a intervenção do Serviço Social hospitalar, pelo menos no sentido lato das suas atribuições-chave foi evidenciando um papel conciliador herdado pelo modelo biomédico. Dotado da capacidade para compreender o indivíduo como um todo, soube reconhecer os ganhos em saúde e a eficácia da intervenção, em privilegiar a reciprocidade e o compromisso numa relação de ajuda. Do diálogo, da interacção e da compreensão abriu espaço para a construção de soluções concertadas na relação entre o indivíduo e as múltiplas dimensões que o enformam. Como esclarece Lopes da Costa “a prática do assistente social direcciona-se para a permanente construção de vínculos de reciprocidade, imprimindo ao hospital o sentido de comunidade, personalizando as relações entre a instituição e o cidadão” (2009, p.29).
Em Portugal, o papel do assistente social como humanizador de serviços de saúde em ambiente hospitalar, tem sido um dos sustentáculos da prática profissional desde a sua institucionalização. Essa repercussão e o reconhecimento da sua especificidade, enquanto disciplina científica que coadjuva a Medicina e as Ciências Médicas fizeram com que se expressasse ao nível da qualidade dos serviços prestados no sistema de saúde português. Em síntese, a abordagem humanista na saúde apesar de se inspirar em importantes contributos, “fundamenta a perspectiva teórica do Serviço Social na promoção da saúde e na intervenção em cuidados continuados sendo orientada para o desenvolvimento de uma relação de ajuda que tem como ponto de partida a interacção da pessoa com o ambiente (modelo ecológico) ” (Carvalho, 2012, p. 98).
49
DO
HUMANISMO AO MODELO ECOLÓGICO: UMA PERSPECTIVA COMPREENSIVO-SISTÉMICA
DO SERVIÇO SOCIAL NA ÁREA DA SAÚDE
As teorias de sistemas aplicadas ao Serviço Social, incluindo a corrente ecológica, inspiramse na teoria geral (Von Bertalanffy, 1971). Esta tem por base a proposta da biologia, de que todos os organismos são sistemas e que estes são formados por subsistemas que, por sua vez estão integrados em super sistemas. Poucos anos mais tarde a teoria sistémica-ecológica (Bronfenbrenner, 1979), traria novos contributos que centravam o indivíduo no seu meio envolvente.
A conjugação deste legado acabou por despoletar um conjunto de contributos de relevo com aplicação ao Serviço Social, tanto ao nível da teoria geral dos sistemas como da teoria ecológica (Hearn, 1958, 1969; Goldstein, 1973; Pincus & Minahan, 1973; Siporin, 1975, citados por Payne, 2002, p.195-218). Também considerada como uma resposta à insatisfação “sentida”, relativamente às teorias psicodinâmicas, o investimento na Sociologia parecia agora mais consentâneo e frutífero para lidar com o espaço do “social” do Serviço Social. Assim, o primeiro impacto relevante surgiu da aplicação das ideias dos sistemas gerais por Pincus & Minahan, quando se estabeleceram três tipos de sistemas sobre os quais as pessoas dependem, para conseguirem assegurar uma vida plena e satisfatória. São eles: “1) sistemas informais ou naturais, como a família e a rede de amizades; 2) sistemas formais, como por são exemplo as associações; e 3) sistemas societais, no caso dos hospitais e das universidades” (Pincus & Minahan, 1973, citados por Payne, 2002, p.200). Nestes domínios, ao Serviço Social coube verificar a proveniência dos problemas, que surgem das interações entre o indivíduo e o seu meio envolvente, já que é seu objectivo“ajudar as pessoas a desempenharem tarefas de vida, aliviar a angústia e a atingir objectivos ou posições de valor importantes para os clientes” (Payne, 2002, p.201).
Mais tarde, e numa formulação ecológica aplicada ao Serviço Social, os americanos (Germain & Gitterman, 1980) dão a conhecer o seu modelo de intervenção que apelidam de “modelo da vida”. Este considera as pessoas num processo contínuo de adaptação, que decorre entre os diferentes aspectos do ambiente em que se encontram inseridos. Tanto o ambiente como as pessoas sofrem alterações e estão em constante mudança mas, vão conseguindo modelar-se adquirindo uma condição que segue um percurso natural e que se designa por “adequação 50
recíproca”. Quando há falhas nesta reciprocidade, ou seja, quando os problemas sociais dificultam as condições do ambiente (ex: pobreza, isolamento social, exclusão) estão também reduzidas as possibilidades de adaptação recíproca provocando roturas no tecido social. Por este motivo é que se salienta a importância do trabalho cognitivo e a capacidade de controlar o meio envolvente, cabendo ao Serviço Social o cuidado de “fortalecer as capacidades adaptativas das pessoas e influenciar os seus ambientes para que as transacções sejam mais adaptativas” (Germain & Gitterman, 1980, p.10).
A tónica no processo de adaptabilidade demonstra como a teoria ecológica assumiu uma ordem social fundamental para com o Serviço Social na saúde, pois os problemas que se têm colocado, como o caso da doença crónica, do isolamento social e da dependência, entre outros, emergiram da desadaptação dos indivíduos às alterações sucessivas no ciclo das suas vidas. Vinte anos depois de reflexão sobre o modelo ecológico original (Bronfenbrenner, 1979), passou a não se atribuir uma importância tão significativa ao papel do ambiente, conferindo-se maior atenção ao tratamento da relação entre o ambiente e as características de cada pessoa (Bronfenbrenner, 1999; Bronfenbrenner & Evans, 2000, citados por Ceconelllo, 2003, p.11). Este refrescado modelo, reformado nas suas componentes principais, passou a designar-se também de “modelo bioecológico” (Bronfenbrenner & Morris, 1998). Podem então demonstrar-se os eixos de referência para compreender as relações recíprocas existentes entre os organismos e o ambiente, quando sujeitos a factores de stress. O desafio parte da seguinte premissa: o desenvolvimento humano deve ser estudado a partir da interacção de quatro elementos: processo, pessoa, contexto e tempo (Bronfenbrenner & Morris, 1998) procurando compreender as relações recíprocas de forma adaptativa, evolutiva e capacitadora (Viscarret, 2007). O processo, como primeiro elemento, constitui-se como o motor do desenvolvimento, sendo este adquirido através de interacções recíprocas (ou processos proximais) com as pessoas, objectos e símbolos, na esfera de cada indivíduo activo. O segundo elemento, diz respeito à pessoa e às características biopsicológicas produzidas pelo ambiente (Viscarret, 2007). O terceiro elemento está relacionado com o contexto, sendo este analisado à luz de quatro níveis: microssistema, mesosistema, exosistema e macrosistema, à semelhança de outros modelos de promoção do desenvolvimento humano (Gitterman, 1996; Payne, 2002; Baldwin & Walker, 2005; Viscarret, 2007, citados por Carvalho, 2012). Finalmente, o quarto componente representa o tempo, que permite depreender a influência das mudanças ou das estabilidades que se vão verificando ao longo da vida. 51
Da mesma medida que a teoria sistémica enfatiza os fenómenos de transição que ocorrem dentro do espaço ecológico (Bronfenbrenner & Morris, 1998; Viscarret, 2007), também o “modelo da vida” contribui para a melhoria das relações entre indivíduos, famílias, grupos e comunidades, para a compreensão das suas necessidades, capacidades e aspirações relativamente ao ambiente, aos suportes disponíveis e aos recursos existentes (Gitterman, 1995, citado por Carvalho, 2012, p.99). Podem ser defendidas duas formas de transição no curso do desenvolvimento no ciclo da vida: A normativa, que é expectável pela maioria das pessoas (ex. adolescência, casamento e paternidade) e a não-normativa que não é expectável, como ocorre, no caso de morte, de doença crónica ou de divórcio (Cowan, 1991). Ambas têm impacto e provocam mudanças no self, na visão sobre o outro e nas representações do ambiente, pelo que devem ser tidas em apreciação no processo de intervenção social. O Serviço Social que se centra na perspectiva do “modelo da vida”, pode interferir directamente determinando a prática a aplicar ou indirectamente acautelando os interesses dos indivíduos na comunidade através de estratégias que possam influenciar ou mobilizar organizações, recursos ou políticas. Desta forma assegura-se um equilíbrio na adaptação recíproca entre os processos de mudança que ocorrem dentro dos vários sistemas/rede dos indivíduos numa ampla estrutura social (Baldwin & Walker, 2005; Greene, 2008). Por outras palavras, há um reconhecimento de que a abordagem ecológica tem a capacidade para influenciar a rede de sistemas ou como os autores definem para: “capture and address the complexity of individuals life and allow those involved in the assessment to address issues from a wide range of perspectives” (Baldwin & Walker, 2005, p.41)
A abordagem ecológica tem como sustentáculo a interacção entre as pessoas e os sistemas que as envolvem, e dota o Serviço Social da capacidade de gerir os problemas e as necessidades que se colocam, tanto no quadro das relações interpessoais (ex. rede familiar, vizinhança) como nas transições do ciclo vital (ex. envelhecimento, dependência) ou como explicita o autor: “o Serviço Social ocupa-se da interacção entre as pessoas e o seu contexto social envolvente, que exerce influência sobre a capacidade das pessoas realizarem as suas tarefas vitais, de modo a diminuir o seu sofrimento e mal-estar, e realizar os seus projectos de vida” (Viscarret, 2007, p.275).
Em conclusão poderá afirmar-se que o modelo de Serviço Social na saúde resulta de um cruzamento entre a filosofia humanista e o paradigma sistémico de segunda geração ou 52
ecológico (Duque, 2013). Viscarret também esclarece a abrangência deste modelo quando se refere ao “conceito de interacção entre indivíduo e o meio físico e social, ou entre indivíduos, grupos e instituições” (2007, p. 261). Este modelo permite o desenvolvimento da adaptação recíproca entre o indivíduo e o seu ambiente e vê na degradação do meio e nos problemas sociais que daí emergem o desequilíbrio dessa relação e o aparecimento de factores de stress. Estes factores podem ser determinados por:“a) transições vitais (mudanças de status, de papeis); b) pressões do meio envolvente (desigualdade de oportunidades, organizações rígidas e insensíveis); c) processos interpessoais (exploração, expectativas incoerentes) ” (Payne, 1995, citado por Duque, 2013, p.222). Importa também referir que a adaptação ao meio, para além do impacto ambiental assume a sua capilaridade através de uma estratégia em rede, de âmbito pessoal, social ou institucional, como se identifica, no modelo de redes e de sistemas de apoio (Garbarino, 1983; Walton, 1986, citados por Duque, 2013 p. 233-234).
Hoje, a filosofia humanista-compreensiva, mantém-se no quadro da estrutura de sistemas (micro, meso, exo, macro), sendo predominante no desenvolvimento da teoria do Serviço Social de aplicação à área hospitalar. Por outro lado, faz uso do princípio heurístico (do estabelecimento da relação) e do princípio pedagógico (da mediação), para potenciar a capacidade adaptativa de cada indivíduo para a solução de problemas, ou para a activação de recursos disponíveis (Viscarret, 2007). Apesar das críticas que se lhe podem ser dirigidas, o Serviço Social na saúde privilegia o método de apoio afectivo, como pode também ser designado (Duque, 2013, p.232). Este tem como alicerces o “modelo de vida” (Germain & Gitterman, 1980) e a confluência de elementos cognitivo-afectivos na sua base metodológica (desde a intervenção na dimensão pessoal e interpessoal, ao nível dos ciclos vitais causadores de stress e do ambiente que será alvo de intervenção). Poderá até catalogar-se como uma integração-dialógica, pois serve-se da interacção que decorre entre o conhecimento e a acção (Dal Pra, 1998) para oferecer inputs numa base pedagógica (ex. desenvolvimento da autoestima, de incentivos) fazendo uso de técnicas que capacitam os indivíduos aos níveis: cognitivo, perceptivo e emocional acabando por activar competências pessoais que podem solucionar problemas.
Se esta lógica assume um enfoque humanista, estabelecido pela compreensão do indivíduoambiente, o “modelo da vida” é também extensível a um nível de intervenção colectivo, através das redes sociais. Esta última dimensão, tem o propósito de fortalecer e constituir 53
sistemas de apoio que funcionem em rede, seja através de grupos naturais e informais ou de natureza formal. Neste domínio, o assistente social assume um papel mediador, que tem como missão conduzir as pessoas à mobilização e à participação e que, consequentemente, tem como objectivo a integração social e a readaptação ao sistema ambiente. Na saúde, uma rede informal ou formal não se constitui apenas como a fonte de recursos que“protege a pessoa da doença, acelera processos de cura e aumenta a sobrevida (Sluzki, 1999, citada por Duque, 2013, p. 234), como também lhe cabe “estimular, reflectir e centrar o seu potencial para uma solução recíproca dos problemas” (Ranquet, 1996, citada por Duque, p. 235). Por outras palavras, o seu princípio metodológico assenta na relação de reciprocidade e no princípio pedagógico, que é consentido a partir da narrativa e do diálogo reflexivo, e possibilita “considerar e ter um conhecimento da realidade ou da totalidade do contexto de um indivíduo quando se trabalha com ele” (Klefbeck, 1999, citado por Duque, 2013, p.236). O assistente social pode recorrer à rede social como estratégia metodológica, para promover a readaptação ao meio envolvente e/ou para mobilizar recursos. Em qualquer destes domínios, a prioridade reside no estabelecimento de relações interpessoais, sociais, centradas em objectivos e na participação dos indivíduos, tal como propõem os precursores dos métodos de intervenção na rede, Walton (1986) e Garbarino (1983). Estes autores propõem dois métodos de rede: um focado nas crises do ciclo vital que se norteia pela teoria de Bronfenbrenner (1979, 1998) e distingue quatro fases: “Uma fase de mobilização da rede (identificação da pessoa em situação de crise, mapeamento da rede para definição de limites e responsabilidades); uma segunda fase, de redesenho do mapa da rede com a identificação da rede primária (família, trabalho, amigos) e das suas relações positivas e negativas; uma terceira fase, que marca a tomada de consciência da rede social para se poder ter acesso ou mobilizar recursos de forma participativa e construtiva através de ferramentas como: mapas pessoais, ecológicos, genogramas familiares e, finalmente, uma quarta fase, na qual a rede é activada através de reuniões entre os elementos que a constituem”
(Duque, 2013, p.236);
E outro método mais uniformizado com a realidade do Serviço Social na área da saúde, aqui reflectido por Escobar & Elizalde (1999) que se apelida por método de rede para a integração social, e que se desenvolve em três fases distintas:“A “fase I concerne ao trabalho levado a cabo com o sistema em análise (família, grupo, comunidade) ” (1999, citado por Duque, p. 236). Nesta é estabelecido o contacto e a relação viabilizando tempo para reflectir, avaliar e planear, o que sucede em dois momentos distintos: o da entrevista (revelador de informações sobre expectativas de vida, do sistema e ciclo vital, necessidades futuras, recursos materiais) e 54
o momento da co-participação no qual se diagnosticam/examinam dando início ao processo de
integração
(definem-se
objectivos,
a
estratégia,
calibram-se
expectativas
e
responsabilidades). “A fase II que tem uma relação com o trabalho de equipa (interdisciplinar) no qual se definem as estratégias de intervenção social. Finalmente, uma “fase III que está directamente associada ao trabalho extra-institucional ou entre as redes institucionais com quais se legitima um projecto comum em benefício daqueles que necessitam, seja através da cedência de informações, do acompanhamento ou da comprovação que o projecto delineado terá sido eficaz” (1999, citado por Duque, p. 237).
Indirectamente poder-se-iam considerar os contributos de Chadi (1997) para o modelo sistémico e das redes sociais no Serviço Social. A autora propõe um modelo de mudança (que não altera o sistema mas que o reorganiza e desenvolve) e fixa o objectivo da intervenção numa perspectiva educativa e não terapêutica, sustentando-se nas redes primárias e comunitárias (relação indivíduo-contexto) para conseguir desenhar propostas de mudança de um nível micro (intrapsíquico), para o nível macro (rede social) e do sistema para o contexto onde decorre a acção, saindo teoricamente do marco deixado pela psicologia clínica para as teorias sistémicas e ecológicas nas quais se incorporam as explicações biológicas, emocionais e sociais que assumem o indivíduo como um ser biopsicossocial.
Sintetizando, este subcapítulo acabou por demonstrar como o modelo sistémico e o paradigma humanista estão entrosados, e colocam a tónica na relação entre os sistemas, o ambiente e o indivíduo numa perspectiva de diálogo e adaptação recíproca. Neste domínio o Serviço Social na saúde tem como alicerce o “modelo de vida” (Germain & Gitterman, 1980), desenvolvendo as fraquezas provocadas pelos ciclos vitais, e que por vezes, acarretam situações não esperadas ou problemáticas que carecem de intervenção especializada. O foco da acção do Serviço Social está no desenvolvimento de competências, no estímulo da actividade relacional e na capacidade de influenciar o meio onde ocorrem os processos de transição, de forma a interferir, reparar e a reequilibrar o sistema (homeostase) que envolve determinado individuo-ambiente.
São ainda recordados alguns dos contributos ao nível dos modelos de intervenção na rede, destacando o método para a crise do ciclo vital e para a integração social (Walton, 1986; Garbarino, 1983) evoluindo de uma orientação funcionalista para um posicionamento 55
ecológico-compreensivo, sem descaracterizar a praxis orientada para o indivíduo e incluindo na intervenção o trabalho com a rede social de apoio (informal e formal). Destacam-se dos modelos sistémicos, o ecológico, pois evidencia a base cognitiva (nas representações ou na construção subjectiva da mente) dos modelos humanistas e psicodinâmicos, e reconhece na tradição metodológica do Serviço Social, a importância do assistente social enquanto facilitador
(principio
da
relação
e
da
reciprocidade
mútua)
de
processos
de
mudança/modelação/adaptação.
5.2 O
RISCO E A VULNERABILIDADE EM CONTEXTO HOSPITALAR: O DIAGNÓSTICO SOCIAL
AFERIDO DAS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE
DA TEORIA DO RISCO À VULNERABILIDADE SOCIAL Os problemas sociais resultam da exposição a factores de risco individuais, sociais ou ambientais e não são fáceis de precisar. Pelo menos no que se refere às estratégias de intervenção social. Na era que apelidamos de sociedade de risco (Beck et al., 2000), as políticas de saúde tentam integrar os fenómenos que surgem por via da hegemonização socioeconómica. No entanto, surgem riscos associados à reconfiguração de certas patologias, como a pandemia da Gripe A ou o surto de Ébola, e são reconhecidas novas patologias relacionadas com variáveis que influenciam os estilos de vida (grupais e individuais). Em todo o caso, co-existiram sempre dimensões sociais que poderiam constituir riscos para os subsistemas de interacção entre indivíduos e ambiente, comprometendo os ciclos vitais e o bem-estar físico e social de indivíduos, grupos ou comunidades. Muitas dessas implicações são aferidas em contexto hospitalar, na fase de diagnóstico social, ou melhor ainda, durante o processo que consiste em planear a alta hospitalar (meso-sistema) para o domicílio (microsistema). Para entender o conceito do “risco”, nada melhor do que tentar defini-lo, já que a sua discussão é imperativa pelo facto de ocupar um lugar privilegiado no plano teórico desta investigação. Porém, antes de abordar o risco no contexto da teoria social e a sua interpenetração na transição de cuidados hospitalares para os CLD, importa salientar um elemento comum na discussão do conceito: a distinção entre a possibilidade e a realidade (Renn, 1992). Esta pretende explicitar que algo que é possível acontecer, pode vir a
56
concretizar-se efectivamente, ou o seu contrário, integrando desde logo a problemática da incerteza como uma das dimensões do risco.
Como introdução ao conceito poderá incorporar-se a perspectiva de Dean (1999, p.146) que defende o risco como um continuum, que nunca deixa de existir totalmente. Pode ser minimizado, localizado ou evitado, mas está sempre presente porque advém ou da natureza ou da acção humana. Esta assunção provoca alterações no conceito tradicional de integração social utilizada para manter a estabilidade e fomentar a coesão social. Hoje, o “modus operandi” na área da saúde e o compromisso através de serviços e organizações e políticas públicas, determina-se pela passagem de uma sociedade moderna cujas políticas incidiram nos perigos calculados, trazidas pela herança do industrialismo, para uma sociedade de “risco exterior”, isto é, “do que chega de fora, das imposições da tradição ou da natureza” (Giddens, 2000, p. 35).
O entrosamento entre a promoção da saúde e a teoria do risco é vital e considera relevantes aproximações teóricas. Porém, a abordagem de Douglas & Wildavsky (1982) é insuficiente para abranger o significado do conceito, reduzindo-o a aspectos de natureza cultural, pesem embora os valiosos contributos sobre a evidência dos riscos voluntários (os que estamos dispostos a “correr”) e involuntários (ambientais e/ou laborais) que também se aplicam à área da saúde.
Por outro lado, o conceito de sociedade de risco (Beck, 1992), que identifica os efeitos colaterais das sociedades actuais, primordialmente, no que se refere aos riscos dos avanços tecnológicos e ao impacto ambiental, oferece uma compreensão para o entendimento do risco enquanto fenómeno global e não local, sugerindo a sua extensão a um maior número de pessoas, independentemente da sua classe ou estatuto social. A caracterização do risco como um tema político, consequência da incapacidade de previsão, de controlo e de organização é uma das faces que se coloca na saúde actualmente, que Beck (1992) analisa e Giddens (2000) corrobora, incorporando as noções de risco e de perigo em sociedades tradicionais e modernas. Ainda referindo a dualidade de conceitos entre perigo e risco, Luhmann (1993) reforça e enquadra o âmbito da teoria dos sistemas, trazendo o argumento Durkeimiano que estabelece o risco como um desvio à norma, e nesse caso como uma disfunção do sistema.
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A intenção de promover a saúde na transição de cuidados carece de investimento no plano organizacional/institucional para se agir perante as situações de risco e da incerteza. Contudo, a partir de um processo que advém do conhecimento das instituições, agentes e grupos, sobre potenciais riscos, permite-se projectar ou prever possibilidades futuras, ainda que num domínio probabilístico e não da eliminação dos mesmos (Luhmann, 1993). Também sobre a perspectiva teórica, merece destaque, a relação entre a governamentalização e o risco, que no domínio da política de saúde parece ser uma das mais importantes a considerar. Esta tenta analisar o risco no contexto da vigilância, da disciplina e da regulação das populações tendo por referência a questão do controlo social. Aliada às políticas de saúde reconhece-se a forma como os estados superintendem/governam as sociedades e o risco. Originalmente pressupunham uma governação assente em políticas de prevenção, o que potenciava o aumento da despesa pública e a disponibilidade de recursos financeiros para fazer face à estratégia mais adequada para as populações. Actualmente, no quadro das democracias avançadas emergem uma parafernália de estratégias administrativas e preventivas que gerem os factores do risco de forma a visarem a população, agora entendida como dimensão a necessitar de ser ordenada (Foucault, 2007, p.105).
No campo da saúde, e referindo o conceito actual de risco como um instrumento de controlo social e de vigilância sobre o território e sobre as populações, aferindo os seus hábitos e eventuais comportamentos desviantes, sobressai a evidência de que a arte de governar compreende fundamentalmente pessoas e “coisas” e não, exclusivamente, o território (Moraes & Nascimento, 2002). Esta perspectiva Foucaultiana pretende explicitar a conexão dos homens com o termo que determina por “coisas”. Nesta elencam-se a riqueza, os recursos, a cultura, e para o caso vertente da saúde, os hábitos, as acções, os acidentes e as epidemias tendo como propósito alcançar melhorias significativas nos seus principais indicadores.
No sistema de governação moderno de governação liberal, considerando os fundamentos de Lupton (1999), a intervenção no risco é reconhecida pela estratégia. Atenda-se, a título de exemplo, aos programas do Plano Nacional de Saúde (PNS). Pode dizer-se que são geridos e monitorizados, tendo como pressuposto o bem comum e que reúnem uma estratégia que delimita as questões da saúde mais evidentes, relacionadas com o perigo ou com o risco para as populações. Esta estratégia contempla a definição de grupos populacionais, determinados pelo critério da alocação de factores de risco, definidas “à distância” pela governação (Rose, 58
1996a) em certos grupos que apresentam ameaças potenciais, atente-se o exemplo de alguns dos eixos prioritários para a saúde: “Prevenção e Controlo das Doenças Oncológicas; Programa Nacional de Prevenção da Infecção VIH/SIDA; Programa Nacional para a Saúde das Pessoas Idosas; Programa Nacional de Prevenção e Controlo das Doenças Cardiovasculares (PNS, 2004, p. 60-92). Assim, é na dedução de factores de risco, num vasto campo de probabilidades, que se implementam mecanismos de prevenção sistémicos, ainda que socorridos de tecnologias de observação. Estas tecnologias têm por base uma visão generalista que conjuga factores de risco, distinguindo-se da visão individualista que pressupõe a abordagem caso a caso para determinar a evidência de risco.
O legado de Foucault, mediante o seu duplo sentido de governação que argumenta sobre a experiência do “eu” (passagem da perigosidade ao risco) e do governo como problemática da norma, está patente nas recentes configurações da gestão do risco. A passagem da perigosidade ao risco implica a redefinição das distinções entre os incluídos e os marginalizados (Rose, 1996b, p.340) através de políticas vocacionadas para alteração de comportamentos desviantes, bem como a responsabilidade individual perante os estilos de vida. A confirmação da segunda premissa do autor supramencionado passa por aquilo que Castel defende como “sonho da realidade tecnocrática do controlo do acidental” (1991, p. 289) levada a cabo por uma autoridade que é exercida sobre as pessoas, relativamente às suas práticas e crenças (Rose, 1996a, p.43). Esta tendência rompe com a cultura de responsabilidade governamental baseada no “contrato social” para se focalizar numa outra, de racionalidade colectiva através da focalização em riscos de grupos específicos. Nesta recorrese cada vez mais a um novo conceito de solidariedade que é corroborada pela introdução de tecnologias e diagnosticada por factos empíricos. É possível então, adicionar um conjunto de técnicas específicas de parametrização do risco. Deste modo, há lugar para racionalizar o risco tornando-o, de certa maneira mais calculável (Dean, 1999).
No domínio da saúde, sobretudo em Portugal, o panorama segue as mesmas directrizes. A título de exemplo, as doenças infecciosas, a doença mental, as doenças cancerígenas são variáveis calculáveis que concernem à política de saúde, cabendo-lhes medidas de prevenção e de tratamento específicas. Porém, são situações de risco tradicionais que podem ocasionar o perigo, quando há interferências de comportamento individuais ou grupais que o potenciem, ou seja, quando os contornos existentes para um risco calculado são maiores e podem criar 59
perigo. Estas começam cada vez mais, a ser alvo da preocupação e da intervenção governamental através de uma acção espartilhada e selectiva sobre determinadas conjecturas, sobre as quais, é necessário agir.
A questão fundamental está na forma como se definem os riscos, pois estes são cada vez mais submetidos a apreciações que confirmam ou não, o grau de perigosidade e/ou o enquadramento num “perfil” de risco com o intuito de se poder actuar sobre ele, seja ao nível da remoção do perigo ou da minimização do risco. Esta estratégia que esteve no passado, no quadro da sociedade industrial, integrada num contexto dominado pelo Estado em que o risco era combatido por uma política de adequação dirigida por regras próprias já não faz sentido. A gestão do risco desvincula-se da discussão partidária, para ser partilhada pelos movimentos sociais, organizações e agentes governamentais que, em conjunto, evitam a ambivalência entre o princípio da sobrevivência e o princípio da responsabilidade em matéria de bem-estar social, especialmente na saúde.
Nos dias de hoje, há cada vez mais estudos que analisam a acção governamental recorrendo ao discurso do risco (probabilidade de perigo efectivo). Muitos demonstram que existe mais do que uma forma de actuar sobre o risco. Veja-se o exemplo português, supramencionado, que estabelece as prioridades dos programas nacionais de saúde. O que de facto se discute, no panorama da saúde, é a forma de canalizar a acção governamental na promoção de políticas com a finalidade de estabelecer um perímetro à volta dos riscos para a saúde. Esta actuação sobre “focos de risco” tem apresentado medidas, tácticas e métodos definidos pela natureza e expressão desses. Porém, a questão que hoje se coloca está em considerar o risco como um processo dinâmico que interfere na ordem dos problemas sociais. Assim, as políticas devem perspectivar a sua actuação sobre as situações-problema que decorrem do processo de transformação social e que se podem criar, gerar ou alterar se não forem tomadas medidas que permitam retomar o equilíbrio.
Com origens na epidemiologia e no estudo dos padrões de doenças nas populações (Masten & Garmezy, 1985) também o Serviço Social na saúde foi aprimorando, desde a década de 40 e 50, a sua capacidade para estabelecer diagnósticos sociais e evitar situações que colocassem doentes em situações de risco ou sujeitos a quaisquer outros resultados negativos (Cowan et al., 1996). Estes factores de risco tanto concernem a características individuais (sexo, factores 60
genéticos, cognitivos) como ambientais, como socioeconómicas, da rede de suporte familiar e da rede formal e informal (Masten & Garmezy, 1985). Em termos de impacto dos riscos existem diferentes manifestações de intensidade: os factores de risco agudos (ex. morte familiar) são rápidos, curtos e austeros nos efeitos, já os crónicos (ex. pobreza, desemprego) trazem efeitos cumulativos para o desenvolvimento dos indivíduos (Garmezy & Masten, 1994).
Em síntese, importa sublinhar que desde a década de 50 e 60, o Serviço Social na saúde actuou pragmaticamente sobre os processos de exclusão e desfiliação dos indivíduos (Castel, 2003, citado por Mouro, 2006, p. 386), ou especificando, sobre os estados de privação e nos fenómenos que os levavam à desqualificação social, focando-se também nas situações de vulnerabilidade associadas à ausência ou à insuficiência de redes de suporte (familiar, formal e informal). Aqui a resposta ao risco apresentava-se num eixo predominantemente regulador (Mouro, 2006) no qual o Serviço Social focava o resultado da acção na integração social e/ou na regulação de bem-estar através da mediação, não produzindo necessariamente, uma mudança social, mas adequando os problemas ao sistema de organização da sociedade. Mais tarde, a afinidade ao risco globalizado num contexto de “sociedade de risco”, despoletou uma cultura emancipadora na relação entre assistentes sociais e utilizadores de serviços de saúde conferindo aos segundos, através do desenvolvimento de competências individuais e da sua própria capacitação, a responsabilidade de desenvolverem estratégias para solucionar problemas endógenos que anulam atitudes estáticas e conformistas relativamente aos riscos que se lhes colocam.
A VULNERABILIDADE COMO DIMENSÃO NEGATIVA DO RISCO
A vulnerabilidade emerge da análise do risco, por contraposição a dois conceitos já referidos, o de “resiliência” e o de “recursos gerais de resistência”. A sua discussão teórica encontrou espaço na ligação entre os níveis de cuidados de saúde, especialmente quando esta se estabelece, a partir do contexto hospitalar. A vulnerabilidade social, apesar de se assumir uma componente do risco tem maior impacto, maior dimensão probabilística e sobre a sua essência impendem áreas prioritárias para o Serviço Social na saúde, como a viabilidade dos CLD. Por outro lado, enquanto o “risco” se escuda numa ideia objectiva em função de um determinado
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factor ou exposição a um fenómeno, a vulnerabilidade reúne uma constelação de determinantes que vão para além de fenómenos circunstanciais ou individuais.
Tendo em consideração algumas definições alusivas ao conceito de vulnerabilidade pode avançar-se, de imediato, com uma ideia de predisposição para resultados negativos no desenvolvimento ou na presença de factores de risco, seja por uma falha ou por susceptibilidade ao stress. Na mesma medida a vulnerabilidade, só se identifica na presença de um factor de risco estando intrinsecamente ligada a este. Ambos os conceitos estão, como se reforça, acoplados a maus resultados podendo o risco ser identificado a título individual e ambiental enquanto a vulnerabilidade surge de características enraizadas ou adquiridas individualmente. Ainda assim, ambos (risco e vulnerabilidade) apenas se expressam mediante a interacção com o “ciclo de vida”, possibilitando por um lado; a observação das interferências do risco e por outro, as revelações da vulnerabilidade (Cowan, 1996).
Muitas são as disciplinas científicas que incluem a vulnerabilidade no seu corpo de conhecimentos e que fazem uso do termo. Contudo, é ao nível das relações entre indivíduos e ambiente que se opta por teoriza-la. A investigação na vulnerabilidade tem sido útil como ferramenta para descrever estados susceptíveis de perda, de impotência, tanto em contextos de ambiente físico (catástrofes) como social (doença, pobreza, exclusão) como forma de nortear acções futuras que promovam o bem-estar através da redução do risco (Adger, 2006).
Uma das lições aprendidas do entendimento dos sistemas sociais numa perspectiva ecológica, no estudo da vulnerabilidade, defende a acção humana e as estruturas sociais como parte integrante da natureza não distinguindo sistemas naturais (processos biológicos/ biofísicos) ou sociais (normas, ética e regras institucionais) (Berkes & Folke, 1998). No plano teórico e do estudo da vulnerabilidade também se chegaram a diferentes perspectivas de investigação. Uns defendem-na como uma qualquer “exposição” a condições que caracterizam pessoas e ambientes frágeis ou como uma condição social que pode ser mensurável a partir da medição de factores de resiliência (Cutter et al., 2003). Outros defendem a vulnerabilidade como um resultado “vulnerability as outcome” ou como um processo “contextual vulnerability” (O`Brien et al., 2005, citado por Adger, 2006, p. 274). No quadro das direcções possíveis que envolvem a investigação vários estudiosos tentaram a sua quantificação através de medidas comparativas. Porém, as suas características dinâmicas que pressupõem processos biofísicos e 62
sociais num determinado contexto podem não permitir chegar a conclusões quantitativas fidedignas por não expressarem simultaneamente o impacto e a sua complexidade (Alwang et al., 2001). Contudo, os desafios que envolvem métodos qualitativos e quantitativos têm sido particularmente procurados para comparar a vulnerabilidade em determinados ambientes (ex. vulnerabilidade à pobreza através da análise do consumo) comparando características ao longo do tempo e em localizações distintas (Kamanou & Morduch, 2004; Alwang et al, 2001,)
O que se toma por certo, no paradigma sistémico-ecológico, consiste no facto dos sistemas que dele fazem parte serem susceptíveis a vários factores de stress, e nestes, os efeitos da vulnerabilidade extrapolarem os resultados materiais e imateriais. Com efeito, providenciar um enquadramento para tornar a vulnerabilidade mensurável pode ser possível se forem conjugadas abordagens quantitativas e qualitativas providenciando, por um lado, avaliações de resultados e por outro, percepções locais e de contexto (Lutrell, 2001;Winkels, 2004, citados por Adger, 2006, p. 274), tal como se propõe nesta investigação empírica.
No contexto da investigação o mapeamento da vulnerabilidade é crucial para a avaliação e para o desenho da intervenção social pois oferece oportunidades para se desenvolverem e readaptarem medidas através da triangulação e da validação de indicadores (Downing et al., 2001; Yohe & Tol, 2002; Brooks et al., 2005, citados por Adger, 2006). Reconhece-se também a utilidade de compreender como estão distribuídas as variáveis que geram vulnerabilidades e que possibilidades combinatórias são previsíveis (Luers, 2005). Estes avanços podem levar a um terceiro desafio colocado pelo estudo da vulnerabilidade num contexto de transição de sistemas (entre hospital e domicilio) que permite avaliar o modus faciendi e reavaliar aspectos da governação implementando medidas tendentes a acompanharem as mudanças efectivas e diagnosticadas do meio envolvente, já que por vezes, tanto as pessoas como os locais com maior incidência de vulnerabilidade, são excluídos dos processos de decisão, do poder e dos recursos disponíveis (Adger, 2003).
A VULNERABILIDADE ENQUANTO CONCEITO INTEGRADOR O conceito de “vulnerabilidade” não é muito consensual quanto ao seu significado estando associado a diferentes linhas de investigação. Nesta em particular, adopta-se uma abordagem 63
que agrega as ciências sociais e as ciências naturais num sistema socio-ecológico. Neste contexto, defende-se a noção de vulnerabilidade constituída por um conjunto de dimensões (Adger,
2006).
Em
primeiro
lugar,
faz-se
a
associação
do
conceito
a
uma
“perturbação/distúrbio”, na qual se personalizam os fenómenos stressantes, os perigos e os “picos de pressão” provocados pelo choque. Uma segunda dimensão da vulnerabilidade está relacionada com a perspectiva de mudança ou de transformação, e do que poderá significar (profundidade da alteração) na dinâmica do sistema de um indivíduo, grupo ou comunidade. A vulnerabilidade está também associada ao conceito de sensibilidade que demonstra o grau de transformação do sistema provocado pelas perturbações/distúrbios (Gallopin, 2003). O conceito de sensibilidade, como componente da vulnerabilidade é defendido por quem não o dissocia do binómio sensibilidade-exposição (Luers, 2005), e por outros, como Adger que o definem autonomamente como: “ the extent to which a human or natural system can absorb impacts without suffering long-term harm or other significant state change” (2006, p. 295). Saliente-se a importância de outro componente relacionado com a capacidade de resposta do sistema à perturbação/distúrbio (evitando prejuízos potenciais, aproveitando oportunidades e gerindo as consequências das transformações). Finalmente, e uma das mais importantes, aqui tratada isoladamente, está a exposição à vulnerabilidade (por graus de contacto, duração, extensão) a que o sistema está sujeito ou em contacto (Kasperson et al., 2005, citado por Adger, 2006).
A VULNERABILIDADE EM SAÚDE: DAS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE AO DIAGNÓSTICO SOCIAL
Depois de demonstrar as características endógenas da vulnerabilidade enquanto conceito, importou centrar as atenções na área a que se propõe esta investigação, que tem por âmbito, o diagnóstico social da vulnerabilidade em meio hospitalar, no contexto de transição entre níveis de cuidados. O estudo científico da vulnerabilidade em saúde, disponível na literatura, estabelece-se a partir da década de 80, no seguimento das muitas incursões realizadas na perspectiva do risco, a partir de estudos epidemiológicos. Todavia, das definições que gravitam à volta do conceito, a mais enquadradora reflecte a matriz heurística que nasceu, da pesquisa sobre o Vírus da Imunodeficiência Adquirida (VIH), no final da década de 90. A particularidade desta investigação esteve na análise multidimensional agregadora de três ordens de medida: a trajectória social, a interacção e o contexto (Delors & Hubert, 2000, 64
citados por Sanchez & Bertolozzi, 2007, p.320). Se a trajectória pessoal avaliava as etapas e as condutas dos indivíduos no ciclo da vida, a interacção reflectia a forma como cada pessoa se relacionava com os outros, e com o contexto onde convivia e admitia os factores económicos, políticos e culturais em determinada sociedade. Na mesma linha de entendimento, outros autores (Mann et al., 1993) sugeriram estruturas de análise assentes no comportamento individual e nos domínios colectivo-social, defendendo um sistema de medição da intensidade da vulnerabilidade (baixa, média e alta). Mais tarde, foi apresentada uma linha psicossocial que chamou a atenção para a investigação da vulnerabilidade como resultado dos factores estruturais da sociedade (da desigualdade de rendimentos, de níveis educacionais, do acesso a bens e serviços), por oposição à vulnerabilidade centrada nos aspectos fisiológicos e decorrentes das relações de género (Paris, 1999, citado por Sanchez & Bertolozzi, 2007, p.320).
Finalmente, entendeu-se para o estudo subordinado à vulnerabilidade dos doentes que transitam dos cuidados hospitalares para os CLD, a opção que alarga a proposta de Mann (1993) e que se define através de três planos de avaliação: A aferição da vulnerabilidade individual (análise compreensiva dos indivíduos), da vulnerabilidade colectiva (relativa ao contexto social) e a vulnerabilidade programática (relacionada com o programa/estratégia de resposta social para os CLD (Ayres et al., 1999).
Para o autor que sugere a classificação, o significado de vulnerabilidade reflecte o locus onde esta tem lugar, ou seja, em sede hospitalar, no momento em que se planeia a alta e a transferência dos doentes para os CLD. Esta mudança pode determinar, por exemplo, maior susceptibilidade à reactivação de uma doença e uma menor disponibilidade de recursos de saúde e de cuidados médico-sociais permanentes. Em todo o caso, o autor supramencionado, propõe uma análise da vulnerabilidade individual que se refere também aos padrões de literacia (percepções sobre condição de saúde), à forma como os indivíduos lidam com as questões de saúde e como agem para se proteger. A vulnerabilidade social entende-se pela avaliação da disponibilidade de recursos materiais e cognitivos, e pelo sentido de participação nas decisões formais e institucionais existentes. Finalmente, a vulnerabilidade programática relaciona-se com a avaliação de medidas desenhadas para responder às necessidades, no caso de CLD, seja pela análise do grau de compromisso da política, das instituições, pela existência
65
de recursos, do acesso e através da monitorização da qualidade das respostas (Ayres et al., 1999, citado por Sanchez & Bertolozzi, 2007, p.321)
Qualquer das dimensões da vulnerabilidade, visa constituir uma referência para melhorar a compreensão do indivíduo no seu meio envolvente, mas também para aferir situações críticas, de exclusão social ou de extrema vulnerabilidade (Palma & Mattos, 2001). Partindo destes pressupostos acima mencionados procedeu-se à análise do diagnóstico social e do planeamento da alta, entre cuidados hospitalares e cuidados de proximidade, na perspectiva do Serviço Social:
1) Através da perspectiva individual e social da vulnerabilidade (via do método científico), constituindo uma matriz heurística que categoriza e define amplitude e os graus de complexidade; 2) Através da perspectiva programática (política), recorrendo a interlocutores-chave para uma avaliação do programa /Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI).
O modelo de aferição que interliga os aspectos individuais, sociais e programáticos não quis colocar os limites na vulnerabilidade, sob pena de não se apurarem algumas das suas causalidades, mas na perspectiva multifactorial da saúde pública, de natureza sistémicoecológica: o modelo das Determinantes sociais da saúde (DSS) de Dalhgren & Whitehead (2006).
A abordagem na perspectiva do diagnóstico social da vulnerabilidade reconhece neste modelo a compatibilidade teórica e metodológica na abordagem da intervenção do Serviço Social hospitalar. O estudo considera a dimensão biopsicossocial, ponderando um conjunto alargado de indicadores e propondo outros eixos no cálculo da vulnerabilidade, designadamente a dimensão programática (política) e a social, que consolidam o diagnóstico social e aperfeiçoam de forma participada, as diferentes possibilidades de intervenção social que, segundo o autor “(…) Dizem respeito à participação activa da população na procura solidária de estratégias possíveis de execução e de encaminhamento/equacionamento de problemas e de necessidades em saúde” (Ayres et al., 1999, citado por Sanchez & Bertolozzi, 2006, p.323) 66
SOBRE O MODELO DAS DETERMINANTES SOCIAIS EM SAÚDE NO SERVIÇO SOCIAL O conceito de “Determinantes sociais da saúde” está associado aos valores básicos de justiça social, de equidade e de defesa dos direitos humanos (Bywaters et al, 2010). Foi concebido pela OMS, pelo impacto que poderia gerar sobre as políticas de saúde como “o conjunto de condições sociais em que as pessoas vivem e trabalham” (OMS, 2008, p.14). Agregado a este conceito está o modelo ecológico de Dahlgren & Whitehead (2006) que coloca as pessoas no centro de um conjunto de camadas de influência e de condições, que numa última análise, constituem o seu meio envolvente.
A determinação da saúde como um estado de bem-estar físico, mental e social e a contribuição dos paradigmas sistémico/ecológico contribuíram para demonstrar que a realidade é multidimensional e que os fenómenos da humanidade são influenciados por factores complexos e diversos, que se relacionam entre si. Como sugere o autor: “ A dimensão biológica, psicológica e social não estão pois, separadas, mas integradas, sendo o ser humano uma totalidade biopsicossocial” (Reis, 1998, p. 67). Esta visão tem correspondência directa ao modelo ecológico já citado, pois incorpora factores sociais e a compreensão do comportamento dos indivíduos no planeamento dos cuidados de saúde.
AS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE E O DIAGNÓSTICO SOCIAL HOSPITALAR
O Modelo de Dahlgren & Whitehead (2006, ver figura 4) representa as principais Determinantes sociais da saúde e organiza-se por camadas, que se distinguem, à medida que se vão distanciando do centro (determinantes micro) para a periferia (determinantes macro). Assim, na base do modelo encontram-se as características individuais (idade, sexo, factores genéticos) que têm uma forte influência sobre as condições de saúde, fora do ambiente hospitalar. Numa segunda camada identificam-se os comportamentos e estilos de vida dos indivíduos que se afiguram relevantes. A terceira camada salienta a influência das redes sociais e comunitárias, diferenciando os níveis de coesão social ou de fragmentação, sendo de grande valia para a promoção da saúde na comunidade. A quarta camada diz respeito às condições de vida e de trabalho, em que as pessoas vivem ou nas quais se encontram. Incluem-se nestas, o acesso a bens de consumo e a serviços sociais, à saúde, à educação e à habitação. Por fim, destacam-se as determinantes macro, que abrangem entre outras 67
dimensões, os efeitos da globalização, das influências económica, cultural e ambiental da sociedade a que todos os indivíduos estão sujeitos, sem excepção, e cujos impactos têm efeitos directos sobre todas as outras camadas, entretanto referidas.
Figura 4 - Determinantes sociais da saúde (Dahlgren & Whitehead, 2006, p.20)
Reconhecidas como as “causas das causas” (Marmot et al., 2008) cujos efeitos se espelham sobre o estado de saúde dos indivíduos, a hierarquia das Determinantes sociais da saúde define as circunstâncias do contexto político, social e cultural e implica uma visão holística que providencia um conhecimento multinível da realidade social, permitindo o desenho de intervenções conducentes à melhoria das condições de saúde (Raphael, 2008, citado por Craig et al., 2013, p.312).
A perspectiva das Determinantes sociais no modelo de camadas, atrás afigurado, tem enquadramento nos valores fundamentais do Serviço Social, já que a Federação Internacional dos Assistentes Sociais (FIAS) defende a saúde, como uma matéria simultaneamente dos direitos humanos e da justiça social (Karban, 2010). Para além de se concentrarem mais nos efeitos sociais do que propriamente na doença (Volland, 1996, citado por Craig et al., 2013), o corpo de conhecimentos dos assistentes sociais leva os indivíduos a focarem-se na perspectiva ecológica, enquadrando-os dentro dos vários sistemas que os envolvem (Berkman, 1996, citado por Craig et al., 2013). Os assistentes sociais da área da saúde hospitalar cumprem a sua actividade junto dos utilizadores dos serviços e providenciam planos de continuidade de cuidados para os doentes.
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Em síntese, o que importa salientar na intervenção do Serviço Social em meio hospitalar está associado ao processo dominante (mainstream), que se inicia com o diagnóstico social, e que é seguido, de um plano de intervenção, da própria intervenção e de uma avaliação (Baldwin & Walker, 2005; Carvalho, 2012) e que coloca o indivíduo e os seus sistemas interligados. É na aferição de critérios de risco, num quadro compatível com as Determinantes sociais da saúde, que os assistentes sociais avaliam as dimensões com as quais classificam a população admitida, num primeiro screening; e numa lógica de risco e de vulnerabilidade, numa segundo screening quando se evidenciam problemas no planeamento da alta hospitalar (Colomer, 1974, Richmond, 1917, citados por Carvalho, 2012, p.67). No binómio “risco e vulnerabilidade”, considera-se que o segundo conceito arroga maior complexidade que o valor probabilístico do primeiro, especialmente na viabilidade da continuidade dos cuidados. A vulnerabilidade conjuga determinantes sociais que extrapolam a regularidade dos riscos, já que o seu processo adaptativo exige maior monitorização, das redes de proximidade de apoio social e na área da saúde.
No capítulo seguinte apresentam-se as determinantes sociais mais relevantes quando conjugadas, e que por esse motivo, potenciam situações de extrema vulnerabilidade devendo beneficiar de acompanhamento especializado, tanto pelas unidades hospitalares como pelas instituições de proximidade.
5.3. DEPENDÊNCIA,
DOENÇA CRÓNICA, COMORBILIDADE E INEXISTÊNCIA DE REDE DE
SUPORTE FORMAL: FACTORES DE AGRAVAMENTO DA VULNERABILIDADE NA ALTA HOSPITALAR
Ao inferir sobre as causas/factores que mais contribuem para a vulnerabilidade no plano da alta hospitalar salienta-se, em primeira linha, o aumento da proporção das pessoas idosas relativamente às mais jovens, que é revelador do crescente envelhecimento da população portuguesa. Segundo Dahlgren & Whitehead (2006), as determinantes demográficas que se consubstanciam na baixa natalidade, na diminuição da população jovem e no aumento da esperança média de vida (António, 2009) têm provocado efeitos contraditórios na sustentabilidade e na procura/oferta de cuidados de saúde e de apoio social. Assim, o envelhecimento tem vindo a constituir-se simultaneamente como uma determinante individual: “base do processo natural que advém da evolução degenerativa das células vivas 69
e que acontece a cada vez mais pessoas” (Cancela, 2007, p.3) e como uma macro determinante já que, enquanto fenómeno representa um “dos desafios mais importantes do século XXI, obrigando à reflexão sobre questões como: a idade da reforma, os meios de sobrevivência, a qualidade de vida dos idosos na sociedade, a solidariedade intergeracional, a sustentabilidade dos sistemas de segurança social e de saúde e o próprio modelo vigente” (INE, 2007, p.10).
Não restam dúvidas que o aumento da esperança média de vida foi criando novas necessidades na sociedade nas dimensões biológica, psicológica, económica e social (Durham, 1989). Estas evidências, despoletadas pelos ganhos em saúde ao longo dos anos, têm tido um grande impacto nos sistemas sociais, que actualmente já não conseguem ser eficazes no acompanhamento e controlo do fenómeno, que agora exige um esforço significativo da sociedade civil, do Estado e das famílias. Tais acontecimentos ocorrem, porque apesar da idade cronológica não significar, per si, uma condição de dependência, as pessoas mais idosas são por excelência, o grupo populacional que tem o mais elevado nível de consumo de cuidados (Lage, 2005), e que está mais exposto a factores de risco, pelo conjunto de modificações morfológicas e fisiológicas que se vão processando ao longo do ciclo da vida.
A DEPENDÊNCIA NA TRANSIÇÃO DOS CUIDADOS HOSPITALARES PARA OS CLD
A dependência como conceito, ainda que relacionada com a problemática do envelhecimento, assentou na especificidade da transição entre níveis de cuidados de saúde. Dessa compreensão pareceu útil e apropriada a definição aferida pela Unidade de Missão para os Cuidados Continuados Integrados (UMCCI) que se designa por: “Situação em que se encontra a pessoa que, por falta ou perda de autonomia física, psíquica ou intelectual, resultante ou agravada por doença crónica, demência orgânica, sequelas pós-traumáticas, deficiência, doença severa e ou incurável em fase avançada, ausência ou escassez de apoio familiar ou de outra natureza, não consegue, por si só, realizar as Actividades da Vida Diária (AVD) e ou Actividades Instrumentais de Vida Diária (AIVD) ” (UMCCI, 2009a,p.5).
Ainda numa perspectiva de referência também se considerou, de acordo com a Legislação Portuguesa, a diferenciação entre os dois graus de dependência existentes: O primeiro que determina que os indivíduos não têm autonomia para exercerem Actividades Básicas da Vida 70
Diária (ex. alimentação, higiene pessoal, locomoção); e o segundo que agrega as situações de primeiro grau, acumulando a condição de acamado e/ ou de quadros clínicos compatíveis com demências graves (DL 265/1999 de 14 Julho, art.4).
Encarando as opções acima descritas como relevantes para os CLD em Portugal, importa mencionar que depois da avaliação objectiva das causas e do grau de dependência, cabe ao Serviço Social hospitalar determinar com doentes e famílias (participativamente) as opções e a tipologia de cuidados que deve ser acautelada nos locais de destino, após a alta. Neste sentido, viabiliza-se a transferência da responsabilidade do hospital para a rede familiar/informal e/ou formal de proximidade. De referir, que a avaliação da dependência pode ser coadjuvada por escalas e indicadores que apoiam a decisão, estando os assistentes sociais, apetrechados de alguns instrumentos técnicos que facilitam a ponderação, atentas as especificidades dos serviços, das patologias e das redes de suporte envolvidas. No momento da alta são definidos critérios que traduzem apreciações qualitativas, por exemplo, de baixa, média ou alta autonomia, ponderações de ordem física, psicológica e de contexto (Imaginário, 2008, p.48-50) ou de acordo com a Classificação Internacional do Funcionamento, da Incapacidade e da Saúde (CIF) que revela o carácter multidimensional da incapacidade (OMS, 2004), envolvendo a condição de saúde, os factores sociais e meio que envolve cada indivíduo.
A DOENÇA CRÓNICA E A CONTINUIDADE DOS CUIDADOS
A incidência da doença crónica marcou o início do século XX e conquistou até aos dias de hoje, grande parte do espaço da doença aguda e/ou infecciosa. No passado recente a OMS (2000) projectou a sua representação para 2020, em cerca de 60% da procura total de cuidados de saúde nos países europeus desenvolvidos. Acrescenta-se que este tipo de morbilidade seria responsável, nestes países, por mais de ¾ do número total de mortes. Foi também do reconhecimento desta organização internacional que se adoptou o conceito genérico de doença crónica como: “doenças de longa duração e de progressão, geralmente, lenta” (OMS, 2008) e mais especificamente, por outros autores “como designação (…) que abrange doenças prolongadas, muitas vezes associadas a um certo grau de incapacidade ou a uma causa que produz sintomas e sinais num período de tempo variável, de curso longo, e da qual só há recuperação parcial” (Phipps et al., 2003, p.145). 71
Importou salientar que as patologias de maior peso dentro da doença crónica, na região europeia e em Portugal, estão relacionadas com doenças cardíacas, respiratórias, oncológicas, com a diabetes e com as doenças de saúde mental (OMS, 2005). Em qualquer dos casos, o objectivo, ao contrário da doença aguda, não está focado no processo de tratamento/cura, mas na gestão dos cuidados de saúde, na minimização do sofrimento e no prolongamento da qualidade de vida. É também por esta sequência de necessidades que se torna mais complexa a intervenção social, já que independentemente da natureza da patologia, envolve durante o ciclo da vida cada vez mais determinantes sociais que vão intricando a gestão da doença. Em particular quando esta resulta numa qualquer incapacidade, dependência ou perda de autonomia para as AVD (Figueiredo, 2007).
Quem sofre de doença crónica, consegue viver com qualidade durante anos desde que esteja devidamente acompanhado e siga orientações preventivas e educativas que possibilitem a manutenção do estado de saúde e a continuidade dos cuidados. Sendo este diagnóstico um problema transversal ao género, à idade e à condição económico-social acaba por exercer pressão no próprio sistema de saúde dada a sua prevalência. A totalidade destes doentes exprime cerca de 50% a 80% das despesas globais levantando questões sérias de sustentabilidade financeira (OMS, 2008), que são tão lineares como se caracteriza o desajustamento entre o panorama da morbilidade do século XXI e o modelo dos cuidados de agudos do século XX, que ainda vigora, resultado do lento e imponderado processo adaptativo às novas representações das doenças crónicas no sistema de saúde português.
QUE PAPEL PARA O SERVIÇO SOCIAL
Considerando que o sistema de saúde não está ajustado ao que estatutariamente se consagra, para o acompanhamento da doença crónica, mantendo activa a lógica da fragmentação e da prestação episódica dos cuidados agudos, pode afirmar-se que é fundamental calibrar as respostas de transição dos cuidados às necessidades dos doentes. A gestão da doença crónica para os assistentes sociais tem sido um desafio delicado. E não é só a quantidade de apoio formal e informal que é necessário agilizar para uma segura transferência dos cuidados, mas todo o trabalho de sensibilização e de capacitação, junto dos doentes e cuidadores para viáveis processos de gestão de cuidados, após o período de internamento hospitalar.
72
Os assistentes sociais prestam serviços de saúde, de acordo com a configuração da continuidade de cuidados e apoiam heterogeneamente a população, designadamente, pessoas independentes ou dependentes, activas ou inactivas, bem como as que se encontram internadas ou integradas em instituições comunitárias. Independentemente da sua condição, o diagnóstico e a avaliação de necessidades, a partir do apoio psicossocial constituem as etapas mais importantes da intervenção social (Berkman et al., 2002). A este nível, na doença crónica sobressaem as técnicas de entrevista e a visita domiciliária, bem como as técnicas de advocacia social e de capacitação em benefício dos doentes com doença crónica (DGS, 2007), estando essas práticas subordinadas segundo os autores: “1) Ao estabelecimento da relação empática; 2) explanação do motivo da avaliação; 3) consideração pela observação e avaliação clínica (interdisciplinaridade); 4) avaliação das preferências do cliente; 5) percepção de comportamento e da dinâmica do cuidador”; e finalmente, pela “6) demonstração da competência cultural para abordar vários tipos de pessoa” (Berkman et al., 2002; Geron, 2006, citados por Christ & Diwan, 2009).
A COMORBILIDADE E AS DOENÇAS CRÓNICAS
A tendência da evolução dos cuidados de saúde ruma no sentido do agravamento da doença crónica. Em muitos casos, estas evidências estão relacionadas com factores ambientais, estilos de vida e com os comportamentos dos indivíduos. Porém, grande parte da formação dos profissionais de saúde, ao contrário dos assistentes sociais, permanece focada em modelos de acção orientados para a doença, e não para o indivíduo como o centro da prestação de cuidados. Na verdade, a maioria dos doentes crónicos têm comorbilidades, ou seja, apresentam simultaneamente mais do que uma ou múltiplas doenças crónicas (Grumback, 2003). A comorbilidade pode definir-se como: “any distinct clinical entity that has co-existed or that may occur during the course of a patient who has the index disease under study” (Feinstein, 1970:456-457).
A resposta à doença crónica não deve ser desfasada das suas comorbilidades. Entendendo a lógica do SNS, a responsabilidade do seguimento dos doentes está centralizada no eixo comunitário e de proximidade da Medicina Geral e Familiar, em articulação, bem entendido, com as referidas
especialidades
e com
a equipa local de saúde, constituída
multidisciplinarmente. Assim, o papel do assistente social no planeamento da alta hospitalar 73
para doentes com comorbilidades para os serviços de proximidade deverá focar-se: na mobilização de recursos que vão ao encontro das necessidades do doente, no apoio à autogestão da doença através da capacitação e da preparação dos doentes e famílias e na agilização de uma prestação de cuidados eficaz e eficiente que garanta o bem-estar biopsicossocial do doente (Bodenheimer et al, 2002).
Em síntese, lembrar que a comorbilidade identifica doentes clinicamente complexos e vulneráveis. Por tal, deve existir um esforço para colocá-los no centro dos cuidados e no seu meio ambiente. Neste prisma, aferir a complexidade da situação social e das condições de vida torna-se crucial pois reconhece-se que a comorbilidade aumenta em função da idade (Van der Akker et al, 1998) e é responsável por despoletar um maior número de utilizações dos serviços de saúde (Schellevis et al, 1993). O seu impacto afecta objectivamente os níveis de funcionalidade e a esperança média de vida dos doentes devido à forma não-linear, como se conjugam os múltiplos problemas de saúde. Estes implicam a jusante, o aumento da procura de cuidados hospitalares e a incidência em número de internamentos, reinternamentos e de protelamentos de alta (Bindman et al, 1995: Wolff et al, 2002).
A INEXISTÊNCIA DE REDE DE SUPORTE FORMAL NA ALTA HOSPITALAR
A rede de suporte de um indivíduo é constituída por: um sistema informal que agrega a rede familiar, o grupo de amigos e a sua rede de vizinhança e; por um sistema formal, que inclui serviços, instituições e agentes/profissionais que prestam serviços à comunidade. Ambos os sistemas participam na mobilização de recursos e no apoio instrumental e/ou material para a correção de desequilíbrios provocados por episódios de internamento/doença, permitindo a satisfação de necessidades sociais básicas ou instrumentais (Caplan, 1974; Thoits, 1982). Considerando
as
premissas
do
modelo
ecológico,
esta
interacção
de
sistemas
(Bronfenbrenner, 1979) pode articular-se providenciando o suporte adequado para colmatar necessidades a quem transita dos cuidados hospitalares para os CLD. Este suporte, que se ancora à ideia de protecção em situação de crise ou stress (Cobb, 1976), manifesta-se de grande utilidade para minimizar os efeitos das doenças, da comorbilidade e da dependência, provocadas pelas causas que levaram um qualquer indivíduo a ser hospitalizado e a necessitar de apoio social e/ou de cuidados de saúde depois de ter alta hospitalar.
74
No caso concreto parte-se do conceito de rede social “conjunto de relações interpessoais e sociais diferenciadas da massa anónima social e estabelecidas por determinado indivíduo” (Alarcão, 2000, p. 352). Em Portugal, há claramente uma divisão entre a rede de suporte formal (dos programas, das medidas pecuniárias/ espécie e dos serviços disponibilizados pela RSES) que é contratual; e da rede de suporte informal (da família, dos amigos e dos vizinho) assente na solidariedade, no vínculo de parentesco e no voluntarismo (Paúl, 1997).
As redes sociais, predominantemente constituídas, por membros da família ou por outras redes informais, são muitas vezes insuficientes para assegurar com segurança e qualidade as necessidades aos doentes se não forem complementadas com o apoio de uma rede formal que previna riscos e perigos desnecessários. Contudo, muitos familiares e outros membros pertencentes à comunidade/sistema dos doentes com quem são estabelecidas relações de grande proximidade, assumem integralmente o papel de cuidadores principais ou secundários após o período de internamento hospitalar (Ubeda et al., 2000). Até ao planeamento da alta os cuidadores informais vão adaptando, por vezes a custo, as suas condições individuais às necessidades dos doentes agindo por afeição, por afectividade ou negociação familiar (AttiasDonfut, 1995; Finch & Mason, 1993; Subramanian et al., 2006). Porém, o que é tido como importante neste processo de transição de cuidados para o domicílio são: a qualidade das interacções, dos contactos e dos vínculos e a sua real efectividade (Griep et al., 2005), num processo de cuidados que foi desenhado e planeado no momento da alta hospitalar.
Uma vez que esta dinâmica apesar de parametrizada por definição e aconselhada por tipo e frequência de cuidados, na realidade não permite aferir a efectividade e o cumprimento dos diligências que devem ser asseguradas, devem considerar-se os preceitos da teoria das funções partilhadas (Litwak, 1985). Por outras palavras, deve permitir-se que a rede informal, actue autonomamente, mas não excluindo a monitorização formal, de proximidade, de acompanhamento, que muitas vezes tem a capacidade de minimizar a ocorrência de riscos, evitar novos internamentos e solucionar problemas através da activação de cuidados de saúde ou de apoio social adequados.
A rede informal ao garantir, quase em exclusividade, a grande fatia de cuidados a pessoas vulneráveis (ex. idosos, dependentes, entre outros), desaproveita alguns benefícios para o doente porque não transfere responsabilidades a profissionais especializados, não podendo 75
evitar riscos que seriam dispensáveis caso se permitisse uma monitorização num contexto de proximidade. Esta visão entre cuidados formais e informais reivindica a perspectiva de que nos doentes mais vulneráveis até as solidariedades familiares não substituem as solidariedades públicas pelo que se considera que as tarefas partilhadas ou a complementaridade é sempre mais benéfica porque traz heterogeneidade e especialização nas tarefas que são levadas a cabo (Litwak, 1985; Attias-Donfut, 1995).
Em conclusão, refere-se que em Portugal, como noutros países familiaristas (Romão & Gerardo, 2008) da Europa do Sul, são cada vez mais prementes as soluções mistas para a gestão dos cuidados, principalmente para doentes vulneráveis que ficam exclusivamente dependentes da responsabilidade da rede de suporte informal. Defende-se portanto, depois de aferido o diagnóstico social na perspectiva ecológica da necessidade de recursos de suporte (Cantor, 1992), que se privilegie a escolha do doente e da família pelo apoio informal, mas no caso de este se manifestar insuficiente, incerto ou indisponível que se solicite, antes da alta hospitalar, o mais adequado apoio formal de proximidade.
5.4. SERVIÇO SOCIAL
HOSPITALAR: DO DIAGNÓSTICO À AVALIAÇÃO DE SITUAÇÕES DE
VULNERABILIDADE
Este subcapítulo pretende esclarecer a intervenção e o contributo do Serviço Social hospitalar com os doentes mais vulneráveis. Para esta reflexão importou compreender a evolução da teoria e da prática desta disciplina das ciências sociais, destacar o método e as técnicas e assimilar o modelo de intervenção que lhe está subjacente.
No decurso do capítulo quis evidenciar-se o facto da aferição do risco e das Determinantes sociais da saúde (avaliação diagnóstica da vulnerabilidade) serem conciliáveis com as fases de observação, hipótese e estudo, do método científico. Também se quis demonstrar que o planeamento da continuidade dos cuidados (diagnóstico e intervenção social), enquanto processo, pode estar relacionado com a etapa do tratamento (Barker, 2003) sendo esta, por sua vez, compatível com a decisão do doente e da família por determinado projecto após alta, definido com o assistente social que medeia e acompanha cada situação.
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ORIGENS E INSTITUCIONALIZAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL HOSPITALAR EM PORTUGAL
O Serviço Social assumiu a sua identidade na área hospitalar no início do século XX e acompanhou a transformação de paradigmas e de conceitos em saúde, permitindo o seu desenvolvimento enquanto disciplina e como profissão. Implementado entre 1905 e 1907, no Hospital Geral de Massachusetts, o Serviço Social foi instituído internacionalmente, como uma das áreas disciplinares de apoio à prestação de serviços de saúde. Naquele tempo, as suas funções dominantes direccionavam-se para a compreensão das condições psíquicas e sociais que estavam na origem da doença, ou por outras palavras, para os factores de natureza psicossocial que impediam ou dificultavam o tratamento dos doentes (Martins, 1995). Como melhor explicita a citação, aos assistentes sociais competiam as seguintes atribuições: “Social worker function lay in a enlarged understanding of any psychic or social conditions which may be at the root of the patient`s distress of mind and body” (Cannon, 1913, citada por Jonhson, 1995, p.132).
Em Portugal, o Serviço Social hospitalar integra a acção desenvolvida por instituições e serviços estatais que visam a promoção da saúde, a prevenção da doença, o diagnóstico e o tratamento dos indivíduos, consagrando o direito do artigo 64º da Constituição da República Portuguesa. Refere-se também que as primeiras alusões ao Serviço Social da saúde constam da Lei nº 2011/46, de 2 de Abril, na qual se elencam as especificidades relativamente à cabimentação de recursos humanos e à formação de assistentes sociais, no quadro dos hospitais regionais e sub-regionais. Depois da criação do Instituto de Serviço Social de Lisboa (1935) e da Escola Normal de Serviço Social em Coimbra (1937), surgem entre os anos 40 e 50 do século XX: o Serviço Social nos Hospitais da Universidade de Coimbra (1941), no Hospital Júlio de Matos (1942), no Instituto Português de Oncologia (1948) e mais tarde, nos Hospitais Civis de Lisboa (1955).
A institucionalização do Serviço Social hospitalar fica no entanto, marcada pelo conservadorismo ditatorial que privilegiava a ordem social através do modelo corporativo vigente. Este condicionou a acção dos assistentes sociais, principalmente ao nível da mediação das relações entre o estado e os indivíduos. Se por um lado, a corrente higienista e da medicina social ditavam as principais funções dos assistentes sociais numa perspectiva claramente biomédica, por outro, estavam ligadas à educação para a saúde e à influência dos 77
princípios do catolicismo na intervenção com doentes e famílias (ex: prevenção de doenças contagiosas e epidemias; ensino de boas práticas de higiene). Nesse tempo, duas técnicas assistiam a intervenção social, tanto ao nível do diagnóstico de necessidades como na definição de critérios de risco potenciadores da doença: o inquérito social e a visita domiciliária. Contudo, a intervenção social estava circunscrita à cultura assistencialista dominante e a um modelo, ainda redutor centrado na doença, como se descreve na seguinte citação: “O seu papel era contribuir para solucionar os problemas individuais que agravaram os seus problemas de saúde (…) fosse ajudando a encontrar ou a manter o emprego ou dando-lhe ajuda concreta com dinheiro, alimentação, vestuário ou abrigo” (Carvalho, 2003, p.34-35)
O Serviço Social voltou a sofrer alterações quando se definiu, por decreto, o Estatuto hospitalar e o Regulamento geral dos hospitais. Nesse momento, a acção dos estabelecimentos e serviços hospitalares passa a caracterizar-se por ser, em simultâneo, médica e social, passando o Serviço Social a assumir a definição de “Serviço de Acção Médico-social da comunidade dando prioridade à pessoa doente como razão de ser e objectivo final da instituição” (Decreto-Lei 48357, art.º14, secção III). O mesmo Decreto-lei justificava que a intervenção social em meio hospitalar tinha como propósito a adequação das necessidades pessoais e familiares com a situação de doença, promovendo e facilitando o contacto dos doentes e famílias com as instituições da comunidade, com o fim de solucionar situações de necessidade. Na mesma linha orientadora determinam-se as funções do Serviço Social na colaboração com os serviços de acção médica no estudo dos doentes, tendo como missão a determinação das causas e consequências sociais da doença, a resolução dos estados de crise ou de carência dos doentes, estabelecendo os contactos com serviços internos e externos, de acordo com a sua especificidade (Decreto-Lei 48358, art.º 97, nº1).
Actualmente, o Serviço Social hospitalar tem uma intervenção importante em todos os enquadramentos de apoio assistencial: na área do internamento, no regime ambulatório e nos serviços de urgência e faz parte de projectos, de comissões, equipas e núcleos de natureza interdisciplinar e pluridisciplinar que actuam ao nível da prevenção, promoção, tratamento e da reabilitação da saúde dos doentes. As competências dos assistentes sociais apesar de hoje terem assumido as capilaridades da contemporaneidade, conservam as funções clássicas do Serviço Social, designadamente a componente: “ (…) assistencial, a investigadora, a docente, 78
a de gestão clínica, a de prevenção e a de informação e educação para a saúde” (Masfret 2012, citada por Carvalho, 2012, p.55-56)
ATRIBUIÇÕES E COMPETÊNCIAS DO SERVIÇO SOCIAL HOSPITALAR: A ACTUALIDADE
A década de 60 conduz o Serviço Social a uma nova conceptualização da profissão, influenciada por movimentos sociais de esquerda e por princípios democráticos que vão permitir o desenvolvimento de um modelo instrumental que liga o humanismo à técnica e que aceita o indivíduo como um ser pleno de direitos e deveres. Este modelo passa a ser adoptado na área hospitalar e a considerar a avaliação sistémica dos indivíduos no seu meio ambiente, não esquecendo os objectivos de coerência do funcionamento das próprias unidades hospitalares, que também assentam em padrões de qualidade, de eficácia e de eficiência a um nível institucional. No que concerne à especificidade do Serviço Social hospitalar, pode concluir-se que este assume como objecto teórico: “o modo como vivencia a situação da doença e a interacção deste com os grupos a que se referencia, tendo presente a integração destes grupos em quadros sociais mais amplos com os quais interagem e dos quais dependem com maior ou menor determinância, visando o adequado funcionamento de grupos e estruturas relativamente à satisfação das necessidades dos doentes”
(Couto, 1998, citado por
Carvalho, 2003, p.32) Genericamente identifica-se também o “modus faciendi” que tem relação com a prática profissional hospitalar na transição dos níveis de cuidados, salientando as atribuições delineadas pela Direcção Geral da Saúde (DGS), no âmbito da RNCCI. Pode dizer-se que representam as linhas de intervenção social mais recentes no que concerne à transição dos cuidados de saúde pois pressupõem sempre a transferência de cuidados (primários ou hospitalares) para CLD, tenham estes como destino o domicílio dos doentes, as instituições ou as unidades de CCI. Assim, confirma-se que o papel do assistente social na transição dos cuidados considera as seguintes premissas: “Avaliação dos factores psicossociais interferentes na saúde das pessoas, grupos e comunidades com especial atenção a grupos e situações identificadas como de risco e vulnerabilidade”; “Na avaliação dos factores psicossociais envolvidos no tratamento e reabilitação”; “Na intervenção psicossocial a nível individual, familiar e grupal”; “No aconselhamento e intervenção em situações de crise por motivos médicos e/ou sociais”;
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“Na promoção da prestação de serviços de qualidade centrados no doente e baseados em parcerias com o doente, a família e cuidadores informais”; “Na advocacia social em favor do doente”; “Na avaliação e criação de recursos sociais nas comunidades locais de referência”; “Na definição e realização de programas de prevenção e promoção da saúde e de intervenção comunitária”; “Na educação e informação em saúde”; “Na mobilização, organização e coordenação das entidades e actores sociais relevantes para a prestação de cuidados de saúde e sociais” (DGS, 2007, p.11-13)
O PLANEAMENTO DA ALTA COMO PROCESSO-CHAVE PARA A CONTINUIDADE DOS CUIDADOS
O planeamento de alta representa um dos mais importantes processos do Serviço Social hospitalar e caracteriza-se pelo “conjunto de actividades que se inter-relacionam ou interagem entre si, transformando elementos de entrada em elementos de saída” (Colomer & Rustullet, 2010, p.122). Para coadjuvar esta etapa são levados a cabo procedimentos e acções que servem fins específicos. Os processos que legitimam a instrumentalidade da intervenção dos assistentes sociais podem ser aferidos, pelo menos, em dois momentos distintos: numa perspectiva inaugural, de avaliação diagnóstica (na admissão hospitalar) e numa perspectiva de transição dos cuidados (no planeamento da alta). Acrescenta-se também que todas as acções organizadas têm um impacto directo na qualidade da prestação de serviços hospitalares: quer sejam promovidas pela detecção/alteração dos constrangimentos à alta, quer pela diminuição dos riscos de infecção hospitalar ou pelo desempenho eficiente da capacidade instalada (Marra et al., 1989).
A título de exemplo, ainda no planeamento de altas para os CLD, e com base no que foi referido, salienta-se que é possível chegar a protocolos interdisciplinares, como se justifica na integração de doentes na RNCCI. Para além do normativo legal é também accionado um protocolo de Serviço Social, com um plano de pormenor para cada doente, identificando as diligências a seguir em situações clinicamente elegíveis.
Factualmente, a American Hospital Association (AHA) e a Social Work Directors Society (SWDS) determinaram a alta social como um processo “centralizado, coordenado e interdisciplinar, em que os membros da equipa de saúde colaboram com doentes e famílias, em antecipação das necessidades destes após a hospitalização, desenvolvendo um plano que 80
vai ajudá-los a ganhar independência e a manter os benefícios obtidos” (SWDS, 1973, citado em Carvalho, 2012, p.65)). Partindo do pressuposto que os doentes em risco e em maior vulnerabilidade constituem uma sobrecarga para os seus cuidadores, fica clara a necessidade de ampliar o número de respostas de proximidade. A articulação com as redes de suporte pode ter um papel decisivo na prevenção das readmissões hospitalares e na redução substantiva da sobrecarga familiar (Naylor et al., 1994).
O carácter individual e exclusivo de cada planeamento de alta altera-se, de acordo com variabilidade das situações-problema, nomeadamente: o estado físico, funcional, a utilização de recursos, o suporte formal e informal, entre outros indicadores de relevo. Esta avaliação deve realizar-se numa fase inicial, de acolhimento, através da interacção directa com doentes/famílias/equipa multidisciplinar, de forma a poder confirmar-se ou infirmar-se, a necessidade de agilização de recursos e de redes de apoio, no momento da transição de cuidados (Kennedy et al., 1987). A continuidade dos cuidados fora do contexto hospitalar legitima o valor do planeamento da alta para as populações vulneráveis, conservando a manutenção dos ganhos obtidos no internamento. Esta justificação reside no facto das pessoas entrarem mais rapidamente em declínio quando regressam ao domicílio, devendo ser apoiadas por estratégias e intervenções que possam colmatar as suas necessidades, num ambiente de proximidade, reduzindo também a utilização excessiva das unidades hospitalares (Naylor et al, 1994; Jack et al, 2009).
Em síntese, pode dizer-se que o planeamento de alta gere o resultado de um conjunto de acções médicas e sociais que possibilitam ao doente e à família um regresso confortável ao seu meio envolvente. O Serviço Social hospitalar fazendo uso das suas competências, avalia o estado funcional, a dependência, a situação socio-familiar e facilita os recursos internos e externos, tanto na área social como na saúde (Colom, 2000, Rodriguez-Maribona, 2010). Por outras palavras, os assistentes sociais identificam constrangimentos e oportunidades, que impedem e/ou potenciam a transição do nível de cuidados de saúde. Contudo, a sua responsabilidade na esfera hospitalar ganha outra dimensão com as situações de maior vulnerabilidade pois são as que constituem maiores riscos endógenos (ex. protelamentos de alta e ineficiências) e exógenos (ex. alavancagem de recursos e de regimes de subsidiariedade), e nessa medida, exigem uma atenção redobrada.
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Finalmente explicita-se em que medida a intervenção do assistente social, como profissional de apoio à acção médica, é expressiva, de acordo com a exposição a riscos ou a determinantes sociais que envolvem o sistema-ambiente dos doentes. Este garante o “ desenvolvimento de competências sociais no doente e na família, preparando-o (doente) para o regresso à comunidade – casa, família, contexto social – mobilizando recursos internos e externos, necessários ao seu bem-estar (Carvalho, 2003, p.31).
5.4.1 A PRAXIS NO RISCO, NA INCERTEZA E NA VULNERABILIDADE
Tanto o risco globalizado (Beck, 2000) como as Determinantes sociais da saúde, encontram no Serviço Social hospitalar a disciplina que pode alavancar a mudança e gerar compromissos de solução, para situações aferidas no Diagnóstico social. Para além das “velhas” questões da pobreza e da exclusão, surgem configurações recentes, “novas incidências” geográficas e alteram-se até, os indivíduos, os grupos e as comunidades que podem envolver-se em situações-problema. Em pleno século XXI, a European Association of Schools of Social Work (EASSW) identificou a seguinte definição para o Serviço Social: “O Serviço Social é uma profissão de intervenção e uma disciplina académica que promove o desenvolvimento e a mudança social, a coesão social, o empowerment e a promoção da Pessoa. Os princípios de justiça social, dos direitos humanos, da responsabilidade colectiva e do respeito pela diversidade são centrais ao Serviço Social. Sustentado nas teorias do serviço social, nas ciências sociais, nas humanidades e nos conhecimentos indígenas, o serviço social relaciona as pessoas com as estruturas sociais para responder aos desafios da vida e à melhoria do bem-estar social “ (EASSW, 2014).
Conseguem distinguir-se nesta declaração: a ideia de adaptação à mudança, através da articulação de meios e recursos que protegem necessidades de natureza instrumental e material; e a de capacitação para a mudança, através de apoio psicossocial, aconselhamento e advocacia social que representam estratégias de natureza imaterial.
Na saúde este caminho desenvolveu-se após o reconhecimento das limitações do modelo biomédico, que se caracterizava por regular e/ou controlar os efeitos das doenças e por abrigar “pobres e excluídos” (Castel, 2003) em detrimento de uma maior interferência nas causas dos problemas. Tendo o trajecto, especial importância para os modelos de intervenção social, a definição que apresenta maior compatibilidade com a expressão da praxis na saúde, norteia-se 82
por dois eixos: o eixo regulador (reparador) e eixo emancipatório (Mouro, 2006). Este “quadro” interventivo não exclui os métodos clássicos do exercício da mediação para a integração social, mas inclui a perspectiva da globalização e da sociedade do risco pela via da cidadania, potenciando a transformação e a mudança no conjunto de sistemas sociais que interagem com cada indivíduo. Ambos os eixos de intervenção, têm uma influência no universo dos riscos e das Determinantes sociais da saúde que são fruto de: transformações provocadas pela governação das políticas de saúde, dos novos e complexificados problemas sociais, que resultam dos desequilíbrios de um mundo globalizado, da adopção de estilos de vida e do impacto das alterações do ambiente, na vida dos doentes.
De facto, os assistentes sociais hospitalares centram-se, numa primeira fase, no eixo regulador que advoga a integração dos doentes em situação de risco ou de exclusão, e fazem uso de estratégias de mediação para intervir ao nível das relações que os colocam nesses processos de desqualificação (Castel, 2003). Numa segunda fase, o eixo emancipatório possibilita o desenvolvimento de estratégias pela via do empowerment, nos “problemas de sociabilidade primária ou secundária, de vulnerabilidade ou de evitação” (Mouro, 2006, p.389). Este dinamismo desenvolve-se a partir da via pedagógica da intervenção que reforça o sentido de coerência dos doentes, permitindo desenvolver factores de resistência que conseguem reformar o comportamento de um doente ou de uma família, relativamente a uma decisão crucial durante a estadia hospitalar ou no momento da alta.
O enquadramento da praxis hospitalar nos eixos regulador e emancipatório, em simultâneo, manifestam uma clara modernização da profissão, de acordo com a sua própria integração na sociedade de risco e de incerteza, tendo o Serviço Social optado por acumular estratégias de capacitação, às estratégias de adaptação. Não sendo a realidade estática, o Serviço Social reconhece na abordagem polissémica, a prática mais coerente para responder validamente a situações de vulnerabilidade. Entenda-se, no entanto, esta noção de modelos de prática da intervenção social, distinta dos modelos teóricos do Serviço Social, ou seja, os modelos da prática relacionam-se com o “método (…) instrumento para alcançar objectivos previamente determinados” (Robertis, 2005, p.111) que visam a mudança, a transformação e o desenvolvimento social.
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Em suma, a abordagem polissémica do Serviço Social com doentes e famílias acaba por legitimar e ir ao encontro do modelo teórico sistémico-ecológico, pois torna-se claro que a interferência nos sistemas micro, meso, macro é apenas possível quando na intervenção social com os indivíduos/grupos ou comunidades há lugar a mudanças ou transformações que alterem os seus sistemas (Robertis, 2005). O assistente social, com o objectivo de provocar a mudança e a transformação social, para o funcionamento e equilíbrio do sistema, tenta agilizar recursos, instrumentos e processos através de dois mecanismos: através da “acumulação e sistematização pragmática”, que identifica por tentativa e erro as estratégias mais adequadas ao contexto profissional; e pela via da “sistematização científica” que está relacionada com a componente de investigação e que tenta criar quadros teóricos e orientações de acção social que se coadunem com a resolução de determinados problemas (Robertis, 2005, citada por Santos, 2012, p.126), como se pretende com esta investigação.
O CASO DOS CENTROS HOSPITALARES
Os Centros hospitalares inscrevem-se num modelo gestionário que tenta calibrar a oferta de cuidados diferenciados, mantendo os níveis de eficácia e potenciando a eficiência e a qualidade da prestação de serviços de saúde. Do mesmo modo, também os departamentos de Serviço Social têm sido agregados, a partir de 2005, por inerência da política de governação hospitalar que assenta nos pressupostos do novo institucionalismo na gestão pública (Harfouche, 2012). Esta trajectória de mudança tem sido fundamental para a harmonização da intervenção social enquanto prática, facilitando os níveis de acção dos assistentes sociais através de processos e procedimentos. No contexto dos centros hospitalares, a praxis caracteriza-se como instrumento da acção profissional (Robertis, 2005; Ranquet, 2007; Adams et al., 2011), pois seria talvez ambicioso inferir que directamente, pudesse revelar o carácter ideológico e político de mudança societal.
A organização da prática profissional em modelos de intervenção, no caso da saúde, acaba por servir dois propósitos que se complementam: o primeiro certifica que o “modus faciendi” cumpre normas, procedimentos próprios e uma sequência de acções em função do bem-estar de doente/família; o segundo dignifica a prática, torna-a mais eficaz e organizada, mais padronizada e sujeita-a a processos de melhoria contínua.
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Desta reflexão, o Serviço Social hospitalar depois de mais de 70 anos de institucionalização, tem vindo a sistematizar as suas práticas e a envolver-se em processos de organização metodológica, que partem dos modelos clássicos do Serviço Social de caso (Richmond, 1917), grupos e comunidade (Dubois & Miley, 1996; Ranquet, 2007), para as expressões mais recentes da intervenção social. Estas fundamentam-se na sua vertente mais operativa pelos modelos de intervenção que têm uma maior ligação à teoria social e comportamental, designadamente: aos modelos de intervenção na crise (contextos de urgência) e de intervenção sistémica/ecológica (áreas de internamento e ambulatório) (Payne, 2002; Viscarret, 2007).
O Serviço Social hospitalar ainda que indirectamente, tem um papel crucial na construção e no desenho das políticas sociais de saúde, que lhe permite discutir medidas mais justas e adequadas pela experiência aferida do exercício profissional e da avaliação da intervenção (Becket, 2009). Todavia, este trabalho que coloca a intervenção social no domínio da acção política merece um lugar de destaque que deve ser levado a cabo, paralelamente, não ao nível das funções executivas dos serviços hospitalares, mas com assistentes sociais que marquem a diferença em organismos de gestão e de planeamento da saúde, numa perspectiva consultiva. Estes devem exercer funções normativas e de supervisão, de acordo com os reflexos da acção executiva dos hospitais, tanto ao nível da Direcção Geral da Saúde (DGS), como da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) que têm por desígnio regular, coordenar e fiscalizar as actividades de saúde.
A saúde, enquanto dimensão do Serviço Social começou a desenvolver o reconhecimento da sua prática à medida que as políticas de saúde foram sofrendo alterações e evoluíram para paradigmas mais compreensivos e menos positivistas, designadamente pela defesa da multidimensionalidade como um estado individual de completo bem-estar físico, mental e social (OMS). Esta transição desencadeou o entendimento de um novo objecto de intervenção social, centrado no que se designa por situação-problema. O objectivo da intervenção social passa a centrar-se na mudança ou na transformação social, ainda assim, dentro das limitações do Serviço Social enquanto agente prestador de serviços de saúde.
No final da década de 80, o Estado deixa de protagonizar o papel equilibrador que aproximava a distância entre os indivíduos que se encontravam do lado dos meios de 85
produção e do capitalismo e daqueles que lutavam por melhores condições de trabalho e de vida. A partir de então, começa a abrir-se espaço a outros sectores da sociedade para se organizarem em função das necessidades e de um modelo de protecção social (welfare mix). Neste domínio foram ponderadas, em substituição das medidas de apoio (desemprego, rendimento mínimo) meramente distributivas, por exemplo, a introdução de outras, com maior cunho de responsabilidade. Estas incluíam princípios de participação e envolviam uma responsabilização contratual nas quais eram estabelecidas “medidas activas” (Hoven, 2003).
O papel dos assistentes sociais começa a focar-se no sentido da contratualização instrumental, que por sua vez, vai ao encontro da integração e da inclusão social. Na saúde, os indivíduos/famílias são levados a participar na activação de medidas disponíveis através da informação de direitos, deveres e benefícios. Este processo envolve a acção dos assistentes sociais, o desenvolvimento de certos processos-chave e uma sequência de procedimentos (método e técnicas) que são utilizados para definir as linhas da intervenção, de acordo com determinado contexto/ambiente. Hoje, o Serviço Social hospitalar, paralelamente a outras áreas, assume a polissemia no modelo e nas técnicas de intervenção que utiliza, na medida em que, não sendo o método infalível, deva caber ao assistente social a habilidade/arte de fazer uso da estratégia mais conveniente e criativa para o alcance de um resultado, adaptando hipóteses de resolução às solicitações dos problemas e necessidades em saúde. A sistematização da prática num Centro hospitalar teve como pano de fundo: o quadro alargado das Determinantes sociais da saúde (Dahlgren & Whitehead, 2006), o modelo da teoria sistémico-ecológico, que centra o indivíduo no seu meio envolvente e a abordagem polissémica da intervenção social. Esta conjugação permite: Na componente da prática - Dar continuidade ao desenvolvimento de intervenções que possam adequar-se a realidades em constante mutação; Na componente política – Observar o comportamento de certas políticas de saúde e das suas repercussões na população utente (ex: RNCCI, aumento taxas moderadoras); Na componente teórica – Contribuir para o desenvolvimento do conhecimento do Serviço Social através da sistematização da prática profissional.
Em suma, pode afirmar-se que a abordagem polissémica organiza, num nível transversal a intervenção social em momentos distintos. Por um lado, actua de forma centrada no indivíduo 86
e/ou no conjunto das suas relações sociais, formais ou informais; por outro, utiliza estratégias mais abrangentes da intervenção que envolvem o doente, a família enquanto partes de um sistema, em interacção com um conjunto de sistemas, como melhor se explana: “ A organização da prática profissional em modelos de intervenção procura (…) uma postura consonante com uma prática sistemática e transformadora que não se satisfaz com uma explicação breve e simplista das situações, mas busca a sua compreensão a partir da problematização do real, permitindo o diagnóstico e o estudo social de uma forma mais ampla, específica-transversal-global, com base em instrumentos metodológicos e no registo detalhado da informação recolhida”
(Santos &
Reis, 2010; Robertis, 2005, citados por Santos, 2012, 134)
5.4.2.
O
MODELO
DE
INTERVENÇÃO
SOCIAL
HOSPITALAR
NA
AFERIÇÃO
DA
VULNERABILIDADE: QUE EVOLUÇÃO
A intervenção do Serviço Social caracteriza-se por seguir os preceitos do método científico validando factos, observações e outras evidências que podem explicitar o fenómeno da vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Os assistentes sociais ao combinarem o estudo/diagnóstico/hipóteses de intervenção/tratamento na sua prática profissional, conseguem tornar mais claras as causas que estão na origem dos problemas, o que lhes permite melhorar e redefinir estratégias de acção (Kisnerman, 1998; Barker, 2003; Viscarret, 2007).
Constituído pelas etapas supramencionadas, o método do Serviço Social de casos foi assumido, como um dos principais eixos da intervenção social na saúde. O seu “modus operandi” parte de uma intervenção individual, centrada na pessoa, para uma visão colateral que envolve as redes formais e informais. No fim, prevê uma reflexão globalizada que enquadra o indivíduo na complexidade do seu contexto social. Como definição de referência apresenta-se a seguinte declaração que ainda hoje se mantém “viva”: “Método de ajuda baseado num corpo de conhecimentos, na compreensão do cliente e dos seus problemas e na utilização de técnicas específicas, que procuram ajudar os indivíduos a ajudarem-se. É científico, na medida em que os seus conhecimentos derivam da ciência e é artístico, na medida em que o seu exercício deve constituir uma verdadeira arte” (Moix, 1991:313).
A actuação profissional resultava de um processo de escuta, de estudo, de reflexão e até de crítica para uma mudança objectiva no doente, ao pressupor o indivíduo como o centro da 87
intervenção, implicando a sua relação com o meio e a articulação com a rede de suporte (formal e informal). Mais tarde, a passagem dos métodos clássicos para um novo quadro de referência, que se operacionaliza em modelos de intervenção, encerrou a divisão metodológica anterior na área da saúde, ultrapassada entretanto pela complexidade e pela evolução da própria teoria do conhecimento do Serviço Social (Viscarret, 2007). Actualmente, reconhece-se o modelo psicossocial (Rubí, 1992) como um dos que, defendendo a posição do método integrado de intervenção na dimensão microssocial ou macrossocial (Robertis, 2003), “refresca” a actividade em saúde pelos assistentes sociais, pois ao manter os pressupostos de centralidade da intervenção no doente e a análise “caso-a-caso”, incorpora sem discutir fronteiras os preceitos dos três níveis de intervenção clássicos (casos, grupo e comunidades). Este posicionamento traduz-se para a prática hospitalar, sendo o ponto de partida para assistentes sociais, apoiarem os doentes na promoção da saúde e a responderem, através de práticas centradas no indivíduo, às Determinantes sociais da saúde que se lhe colocam. Os assistentes sociais utilizam práticas participativas (colaboração com doentes e família) e cooperam com organizações e agentes de todos os sectores de actividade, coordenando acções que garantem a organização sustentada da prestação de serviços. Estas acções são perpetradas através da rede de apoio formal e informal de proximidade com a finalidade de promover a reintegração social (Almeida, 2012) após episódio de internamento hospitalar.
Nesta dinâmica da intervenção social, o assistente social promove a rede de relações pessoais e institucionais do indivíduo, no seu meio ambiente, numa perspectiva biopsicossocial. Neste registo, salvaguarda todas as dimensões que fazem parte do processo de stress e da gestão da doença, quer directamente (mobilização de recursos ou de medidas políticas de protecção na saúde e social), quer indirectamente, interferindo nos elementos de contexto (físico, psicológico, social, económico, emocional, entre outros). Este modelo está orientado para a pessoa em situação de doença/vulnerabilidade (como centro da intervenção), e organiza-se numa triangulação de factores. Um dos vértices cabe ao doente, apetrechado com os seus factores de protecção/resiliência, o outro assume a situação-problema/stress que se coloca, e finalmente, um terceiro que converge na relação de ambos os vértices (Núncio, 2010, p.129). Salienta-se, que em sentido figurado, o terceiro vértice do triângulo é assumido como objecto da intervenção psicossocial, permitindo, a resolução dos problemas e a adaptação às situações (ex: aceitação da doença, compromisso com a perda, gestão da dependência), ou dando azo a 88
desequilíbrios na relação entre indivíduo e meio envolvente, requerendo medidas mais vinculativas. Em síntese, os momentos metodológicos centrais desta intervenção são:
1. Diagnóstico
2 .Tratamento
3. Avaliação
Figura 5- Etapas do Modelo psicossocial (Risco)
1- Diagnóstico – Corresponde à fase prévia da identificação da situação-problema, e da necessidade que afecta o doente, procurando estabelecer nexos de causalidade relevantes. Posteriormente são avaliados os recursos pessoais, familiares e sociais numa colaboração estreita entre assistente social e doente. Finalmente, depois da aferição da análise linear é estabelecido um plano de acção, em que se estabelece uma estratégia de intervenção (Hamilton, 1950; Woods & Hollis, 1990; Payne, 2002; Carmo, 2007; Núncio, 2010) 2- Tratamento – Pressupõe procedimentos de Serviço Social directo para solução de problemas endógenos do doente (ex: aconselhamento, suporte emocional, advocacia social), e de Serviço Social indirecto, que implicam a solução de problemas exógenos que afectam o doente no meio em que está inserido (Richmond, 1917; Robertis, 1988; DGS, 2006; Viscarret, 2007) 3. Avaliação – Pode implicar o fim da relação de ajuda/ apoio por parte do Serviço Social hospitalar no caso de uma situação regular ou, a utilização de um modelo de intervenção de maior abrangência (modelo sistémico-ecológico) (DGS, 2006; Viscarret, 2007, Núncio, 2010).
O MODELO SISTÉMICO-ECOLÓGICO
Relativamente ao modelo anterior, a aplicação do modelo sistémico altera a perspectiva linear centrada no indivíduo/meio, para se focar na apreensão dos fenómenos num paradigma holístico, no qual a causalidade é circular e é influenciada através das interacções do indivíduo, nos seus múltiplos sistemas. Por outras palavras, este modelo de intervenção considera todos os factores/determinantes de saúde na análise de problemas, e identifica através da circularidade de análises, o plano e as medidas, para os quais são constituídas 89
hipóteses interventivas, com o intuito de reverter a representação das situações problemáticas e fomentar a mudança. Identifica-se aqui o modus prociendi do modelo ecológico, a nível micro (praticas para e com o cliente), meso (identificação de recursos e mobilização de acesso), exo (participação comunitária,). O diagnóstico social implica um conhecimento aprofundado no indivíduo e no meio em que é aferido, dos elementos de stress ou das situações problema que advêm das pressões ambientais, dos relacionamentos interpessoais e das transições do ciclo vital (Gitterman, 1996;Viscarret, 2007). O planeamento assenta na capacitação/responsabilização do indivíduo e dos elementos da rede de suporte familiar, potenciando factores de protecção, de resiliência e de autonomia. Assim, o planeamento é participativo sendo o doente/cuidador/família parte desse processo, mas por outro lado também é integrado e regulador pois também envolve a prestação de serviços hospitalares e de proximidade de forma colaborativa. Importa referir que o planeamento coincide com objectivos de intervenção que são contratualizados entre o assistente social e o doente, devendo ser avaliados continuamente (eficácia na gestão da alta, prevenção de riscos causados pelo protelamento, prevenção da vulnerabilidade no ambiente de destino). Por fim, a etapa da intervenção propriamente dita é despoletada quando se encontra o foco do problema partindose para a hipótese que poderá soluciona-lo. Esta é estabelecida pela via contratual (escrita /verbalizada) de acordo com as características dos indivíduos/famílias e dos próprios serviços implicados. Importa salientar que a via contratual negociada reveste-se de grande importância por duas razões distintas: a primeira, porque constitui prova da responsabilização pela eventual mudança social, a segunda porque é a etapa que reúne mais resistência, podendo “deitar-se por terra” o projecto/plano de acção entretanto desenhado (ex. recusa de apoio formal, recusa de apoio subsidiário). Mais se acrescenta que é nesta fase que a intervenção social pode ser mensurável, como sendo eficaz ou ineficaz, o que coloca na “arte” do assistente social, a capacidade para gerar esse “sentido de coerência” nos indivíduos e nas partes interessadas envolvidas. Em suma, e depois dos momentos metodológicos tratados no modelo psicossocial, seguem-se outras etapas que estão mais alinhadas com a complexidade da intervenção e com o planeamento da continuidade de cuidados de situações de maior vulnerabilidade.
4.Análise Diagnóstica
5 .Planeamento integrado
6. Intervenção e transição de cuidados
7- Avaliação
Figura 6 - Etapas do Modelo sistémico-ecológico (vulnerabilidade) 90
4 – Diagnóstico /análise – Pressupõe um novo questionamento das causas, centrado na relação circular com os múltiplos sistemas incluindo: “ser centrado nos problemas e necessidades (…) na organização e nos recursos existentes, ser construído em parceria com cliente, família e organizações; reconhecer circunstâncias materiais, cultura e redes sociais (…) conflitos, diferentes interesses e poderes, procurar alternativas e hipóteses explicativas dos acontecimentos (Baldwin & Walker, 2005, p.39). 5 – Planeamento Integrado – Implica a estratégia participada do doente /família com a rede formal e informal, de acordo com objectivos estabelecidos num plano de acção e de intervenção. Estabelecem-se acções (espácio-temporalmente), definem-se executores dessas acções e a sua avaliação, o que pressupõe da parte do assistente social algum dinamismo, uma adequação caso-a-caso, criatividade e capacidade negocial para produzir os efeitos pretendidos (Holloway, 2005; Viscarret, 2007). 6 – Intervenção e Transição de cuidados – A intervenção dimensiona os aspectos da concretização, da execução e da monitorização de acções planeadas para determinados objectivos (Ng & Chan, 2005). O profissional assume a ambivalência da sua acção: entre o estabelecimento de uma relação empática e a necessidade de definir metas e reduzi-las a escrito ou a outras formas de contratualização. Neste processo do Serviço Social, o profissional assume o papel de facilitador, de consultor, (advocacia social) e de gestor de caso (ocupando-se de forma negociada/contratualizada das acções que devem ser realizadas para atingir mudanças nos indivíduos, seja ao nível do apoio social, da saúde ou do acesso a regimes de subsidiariedade). 7 – Avaliação /Acompanhamento – A avaliação refere-se a um processo de continuidade que deve estar presente antes e durante o diagnóstico social e depois da intervenção (Bell, 2005, citado por Carvalho, 2012, p.94). A avaliação de resultados, especialmente após a alta hospitalar de doentes vulneráveis é crucial para aferir os níveis de participação da rede social de suporte, a pertinência das acções implementadas, o grau de aderência das partes interessadas e, finalmente, a adequação das acções. Tanto as avaliações pontuais como as de acompanhamento (sequenciais) são justificáveis pela monitorização dos riscos e pela
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necessidade de manutenção dos padrões de funcionamento de indivíduos e das suas redes de suporte.
O
CONTRIBUTO DAS PRINCIPAIS TÉCNICAS DE
SERVIÇO SOCIAL
NA TRANSIÇÃO DOS
CUIDADOS
Os modelos de intervenção social harmonizam etapas, processos e acções que coadjuvam o exercício dos assistentes sociais (sistema interventor) para que estes possam solucionar as situações colocadas pelos doentes e suas famílias (sistema cliente). Assim, as pessoas que têm necessidades podem beneficiar daqueles que têm a competência para as apoiar (Carmo, 2007). Estes dois sistemas complementam-se através da utilização da linguagem (Carvalho & Iamamoto, 2005), e o assistente social assume nesse aspecto um papel preponderante, que proporciona respostas direccionadas a objectivos de mudança.
Neste sentido importou destacar as técnicas do Serviço Social hospitalar que possibilitam esta comunicação entre sistemas sendo “o Serviço Social uma das formas institucionalizadas de actuação nas relações entre os homens no quotidiano da vida social” (Iamamoto, 1995, p.101) e que maior impacto têm na redução de riscos e de eventuais vulnerabilidades na transição dos cuidados hospitalares para os CLD.
Antes de enveredar pelas técnicas/instrumentos do Serviço Social, quis salientar-se que estas, em regra, implicam um envolvimento “face-a-face”, ainda que existam outras, indirectas, que tradicionalmente são utilizadas depois do compromisso da relação interpessoal, e que se traduzem normalmente por: pareceres sociais, avaliações sociofamiliares, actas, relatórios, entre outros. Assim, salvaguardando a interacção “face-a-face”, que “permite que a enunciação de um discurso se expresse não só pela palavra, mas também pelo olhar, pela linguagem gestual, pela entonação, que vão contextualizar e, possivelmente, identificar subjectividades de uma forma mais evidenciada” (Magalhães, 2003, citado por Sousa, 2008, p.126) salienta-se o contributo da Entrevista de Ajuda e da Visita Domiciliária no contexto da transição dos cuidados.
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A ENTREVISTA DE AJUDA
A entrevista de ajuda constitui um exercício de comunicação entre o assistente social e o doente/ elementos da sua rede de suporte. O papel do profissional, ao representar a instituição hospitalar conduz a entrevista e direcciona-a de acordo com objectivos definidos, não sendo sempre possível conciliar as expectativas de todas as partes interessadas. O diálogo deve decorrer dentro dos padrões éticos do respeito pela diferença, sendo essencial que haja oportunidade para esclarecimento de dúvidas e de posições. Por conseguinte, a partir da relação empática, deve permitir-se a possibilidade do profissional reflectir sobre a construção da realidade dos factos, que é descrita e pormenorizada por quem a narra. Neste espaço, o doente expõe o modo e a forma como vive, bem como enuncia o tipo e as relações que para si são relevantes, sejam familiares ou de outra natureza.
A entrevista assume-se como um instrumento de trabalho natural do assistente social, sendo a partir da colecção da informação, que este tem a capacidade de elaborar o Diagnóstico Social (Richmond, 1917). O seu propósito serve duas dimensões, uma processual, que certifica o registo que propõe a aderência a benefícios sociais e a formalização de respostas sociais, e outra psicossocial, que se concretiza no papel de mediador de um processo de resiliência/ desenvolvimento ou de crescimento do entrevistado, no âmbito de uma “relação de ajuda”. Em contexto hospitalar, a técnica da entrevista é utilizada na fase de acolhimento e, durante o internamento, ou posteriormente, no momento da alta hospitalar constituindo-se como um meio para aferir ou clarificar situações-problema e oportunidades de intervenção. Numa abordagem clássica, a sua orientação serve três objectivos: “1) reunir dados e informações detalhadas dos indivíduos; 2) formular um diagnóstico prévio ou uma solução para os problemas; 3) oferecer a quem pode beneficiar o caminho para a solução dos problemas” (Rogers, 2000, p.11). A entrevista, como sumariamente se explanou, é o suporte para o desenvolvimento da relação que proporciona ao doente a capacidade de clarificar o que vivencia, e para que possa ser convenientemente ajudado. Esta técnica deve ser estabelecida a partir de laços de confiança e de empatia entre assistente social e interlocutores e prevê o domínio operativo da sua execução, para que possa ser útil e alcançar os objectivos pretendidos.
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Inicialmente deve procurar-se a escuta activa, numa fase de acolhimento, preservando a cordialidade, explanando o propósito da entrevista e a forma como irá decorrer. Numa segunda fase, após circunscrito o contexto, são realizadas questões que norteiam a recolha de informação e de história relevante. Depois, surge o momento reflexivo que é despoletado através das transferências e contra-transferências de informação, pelo entrevistado e pelo assistente social, existindo espaço para a reflexão e para a clarificação de ideias que podem interferir no sentido de coerência dos entrevistados. Podem explorar-se dimensões de grande relevo se forem indispensáveis à solução dos problemas colocados, mas por outro lado também deve ser dado espaço aos momentos de silêncio, muitas vezes característicos de sinais de introspecção. Finalmente, há lugar a uma comunicação do profissional relativamente à forma como se poderá estruturar o processo de mudança da situação-problema que foi exposta, encerrando a entrevista com hipóteses de actuação integrada que vão ao encontro dos objectivos do doente e da família, e das estratégias mais adequadas, para que, em benefício próprio possam decidir, de forma informada e esclarecida (Lewgoy et al, 2007).
A VISITA DOMICILIÁRIA A visita domiciliária tem como objectivo conhecer “in loco” o contexto (condição e modos de vida) dos doentes e dos seus agregados familiares. A sua utilização como instrumento de avaliação ganha posição por conseguir aproximar a instituição hospitalar à realidade do doente/cuidador/família, sendo que a decisão ao seu recurso pode ser tomada em qualquer fase do processo de intervenção. No caso concreto da visita domiciliária, após internamento hospitalar, a atitude do assistente social, deverá ser neutra, descontraída e cordial; mas este terá de estar munido de informações precisas e fidedignas para aferir se as condições de vida e o apoio formal/informal são suficientes para assegurar o bem-estar e qualidade de vida dos doentes, bem como para avaliar o impacto da vulnerabilidade do doente nos cuidadores.
A visita domiciliária é acordada previamente e pode ser levada a cabo, isoladamente pelo profissional que planeou a alta com o doente/família, com o assistente social dos CSP ou por ambos. Em regra os elementos convocados para esta iniciativa são: o doente, a família (cuidador principal) e o assistente social. De qualquer forma, o desempenho dos assistentes sociais hospitalares desenvolve-se ao nível da interacção do doente/dependente/família com o seu meio envolvente. (DGS, 2007, p.59-60). 94
A justificação da visita domiciliária, após episódio de internamento pressupõe o cumprimento do plano de cuidados e a avaliação exarada da alta hospitalar para o domicílio, sendo fundamental verificar requisitos, como o cumprimento dos ensinos para o auto-cuidado, para a prestação de cuidados pelo cuidador/familiar e/ou por prestadores externos. Será também importante, caso se enquadre, a verificação de activação ou de manutenção de serviços de saúde ou de apoio social de proximidade, previamente contratualizados. Importa avaliar que tipo de necessidades materiais (ajudas técnicas), económico-financeiras (acesso a regimes de subsidiariedade) e que dinâmicas profissionais ou familiares sustentam a vida dos doentes e como se entrosam entre os vários elementos da família ou da rede formal/informal.
Em conclusão, a visita domiciliária aprofunda o conhecimento sobre situações de grande vulnerabilidade diagnosticadas na gestão da alta para o domicílio, e garante recursos e o acompanhamento necessário, para que doente e família possam alcançar níveis razoáveis de segurança e de bem-estar. Salientam-se, de acordo com a necessidade de acompanhamento algumas das atribuições dos assistentes sociais no âmbito da visita domiciliária: “na avaliação dos factores psicossociais que interferem na saúde das pessoas (…) com especial atenção para as situações identificadas como de risco e de vulnerabilidade; na avaliação de factores psicossociais envolvidos no tratamento da doença e reabilitação” (DGS, 2007, p.11). E especificamente, no campo da continuidade de cuidados, designadamente na “ avaliação da evolução do doente e da adaptação da família, a análise do cumprimento do plano de cuidados e a avaliação de necessidades ou não; da sua correcção e aperfeiçoamento e a promoção da articulação e cooperação de instituições, profissionais e voluntários que contribua para o apoio ao doente e à família” (DGS, 2007, p.63).
5.4.3 A ABORDAGEM POLISSÉMICA NO DIAGNÓSTICO DA VULNERABILIDADE EM CONTEXTO HOSPITALAR
As contribuições teóricas que qualificam o exercício profissional, numa perspectiva que coloca o indivíduo no seu meio envolvente, caracterizam o futuro da intervenção social hospitalar (Thompson, 1992; Saari, 2002). A apropriação do modelo ecológico e a sua disseminação, enquanto prática são férteis no campo das respostas e flexíveis nas estratégias, pois possibilitam aos vários sistemas do indivíduo a procura por soluções adequadas. Por 95
outro lado, conseguem unir-se os métodos tradicionais divididos por questões de natureza micro ou macro, ou por fenómenos de ordem social ou individual, à medida que o modelo centrado no doente e no seu contexto se vai harmonizando com as distinções previamente definidas. Mesmo no sentido prático, os assistentes sociais tendem a utilizar várias ferramentas técnicas para o mesmo fim, no lugar de uma técnica específica ou exclusiva, o que acaba por combater a ideia de uma certa fragmentação e a defesa da interdependência entre os métodos clássicos: serviço social de casos, de grupo e de comunidade, propugnada por Richmond (Cornell, 2006).
A abordagem do Serviço Social apesar de ser compatível com uma tipologia de actuação profissional que é entendida como promocional (por oposição à assistencialista), alicerça-se na participação/motivação e na orientação da acção para a promoção da saúde dos indivíduos (Restrepo, 2003). Contudo, vai mais além e inclui-se no domínio das práticas sociais contemporâneas onde se assume a preocupação com a interacção das pessoas no seu meio envolvente. Há maior plasticidade e abertura e a sua aplicação pode ser atravessada, tanto por dimensões individuais como colectivas, num dinamismo que reconfigura o Serviço Social hospitalar do século XXI num modelo de convergência, no qual a concertação, o diálogo e o trabalho pluridisciplinar e em rede são peças fundamentais. Na verdade, este ecletismo que visa teorizar o Serviço Social como “objecto das práticas” e não das práticas per si (Netto, 1995, p.15) altera a concepção do Serviço Social e remete-nos para uma tentativa de organização metodológica da prática profissional. Ainda que o modelo de Estado na prossecução de políticas de saúde tenha, por escassez de meios financeiros, “delegado” nas experiências de “welfare mix” soluções minor de protecção social, que incluem a esfera pública e a privada, é certo que as políticas activas voltadas para o sentido de inclusão social têm trazido resultados e incentivado pessoas e grupos vulneráveis a participarem no seu próprio processo interventivo. Conjuntamente com os assistentes sociais, as pessoas, pela via do “empowerment”, tomam consciência dos seus direitos e deveres enquanto cidadãos, e de como podem no seu meio (território) utilizar recursos e benefícios, em proveito das suas necessidades e interesses.
Em síntese, pela complexidade e pelas configurações sociais cada vez mais exigentes no âmbito da prática profissional, em contexto hospitalar, é importante adoptar visões de abrangência que se coadunem com os problemas actuais e com as suas exigências 96
fenomenológicas (Almeida, 2012). Esta prática de cariz polissémico, crê no legado dos modelos tradicionais utilizados na actuação profissional, mas não exclui processos adaptativos de continuidade, que possam caminhar em paralelo com as alterações da vulnerabilidade dos doentes e das instituições da sociedade actual, que tal como os factores de risco, não são estáticos e requerem plasticidade para se adequarem às variações do quotidiano.
Na área do Serviço Social hospitalar defendem-se estratégias de intervenção transversal e estratégias de intervenção global (Santos, 2010, p.446). As primeiras modelam-se pela reflexividade analítica da abordagem psicossocial, enquanto as segundas emergem dos estímulos aos factores de resistência do doente e da família, pela via do modelo sistémico ecológico. A intervenção global tende a mobilizar de uma forma integrada as estruturas sociais e as mais adequadas políticas públicas na estratégia interventiva, em função da complexidade dos problemas e do sentido participativo dos doentes e da sua rede suporte. Considera-se que a organização da prática profissional por este motivo, constitui uma estratégia que actua directamente sobre o doente (person-in-environment) mas também sobre o meio que o rodeia e com o qual interage. Esta abordagem de cariz polissémico reflecte-se nas acções estratégicas levadas a cabo pelo assistente social junto do doente, da família, das redes formais e informais, sobre as condições de vida e de trabalho, enfim, numa visão holística em que a abordagem total (compreensiva-humanista) consegue ser mais eficaz do que a soma dos efeitos de outras abordagens dirigidas, ou não tão abrangentes.
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CAPITULO 2 - DO HOSPITAL AOS CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO (CLD): UM RUMO PARA O ENVOLVIMENTO DA REDE SOCIAL E INSTITUCIONAL
RESUMO DE CAPÍTULO
Um dos temas que se aprofunda neste capítulo, assenta na ideia, também ventilada internacionalmente, de que a boa governação e a “formulação” estratégica em saúde não se expressa apenas verticalmente, mas horizontalmente, através da conjugação de meios e de recursos disponíveis. A política de saúde, que passa pela continuidade de cuidados cruza-se, necessariamente, com os CLD, e implica uma governação em rede com outras políticas sectoriais, designadamente com o sector da segurança social. Por tal, reconhece-se uma visão global na condução das políticas que tentam através da coesão institucional e do capital humano enformar a rede de actores, de relações e de organizações que integram o tecido social com o objectivo de atingir resultados de qualidade, com impactos importantes na vida dos cidadãos.
Neste mesmo contexto, defende-se que as instituições contribuem de forma relevante para o desenho de políticas, como entidades formais, numa definição abrangente (Rosamond, 2000). Nestas, são integradas instituições constitucionais e formais, bem como instâncias de interacção informal, daí a atinente introspecção pelas instituições sociais e políticas primárias, o Estado e a Família, dada a sua matricial importância ao longo dos tempos. Neste âmbito, e considerando a contemporaneidade das políticas sociais, demonstra-se como o novo institucionalismo histórico e, nessa linha o institucionalismo de redes, aceitam a visão plural do estado e enfatizam a relevância do contexto institucional.
6. OS REFLEXOS DE UMA NOVA GOVERNAÇÃO EM SAÚDE
A transição demográfica, fenómeno que se tem feito sentir, um pouco por toda a Europa Ocidental tem influenciado a evolução dos sistemas de saúde. Hoje em dia, as grandes questões já não se focam na doença aguda, mas pelo contrário, voltaram-se para a doença crónica. Esta alteração, como tantas outras, determina uma direcção diferente, agora mais centrada nos efeitos da longevidade da população e do processo de envelhecimento. No 98
mesmo sentido que a população vai perdendo a sua autonomia, também se torna mais interessada na sua própria saúde, como atitude à preservação da esperança de vida, valorizando mais os conhecimentos e a informação em saúde e a forma como podem participar activa ou preventivamente, no seu próprio processo de bem-estar físico, psicológico e social.
Globalmente, o desenho dos sistemas de protecção social tem início no final do século XIX, com um modelo-tipo “bismarckiano”, no qual trabalhadores e empregadores financiavam um seguro público ou social, através das suas contribuições. Já em meados do século XX, este modelo foi renovado para outro mais abrangente, o “beveridgiano”. Este pressupunha não só a contribuição dos trabalhadores, mas o financiamento do Orçamento Geral do Estado e da oferta de um SNS às populações. Curiosamente, a difusão destes modelos e a sua evolução inspirou, em períodos diferentes, diversos países e norteou processos de mudança na protecção na saúde, mercê de conjunturas socioeconómicas favoráveis e cuja expansão foi permitindo sustentar, financiar e regular a protecção social. Nesse tempo, a população europeia não era tão envelhecida e as economias de grande parte dos países estavam em franca expansão, com capacidade para suportar e oferecer estabilidade aos modelos de protecção social implementados, nada semelhante à Europa dos dias de hoje, cuja população activa parece não ser suficiente para sustentar as pessoas com direito a serem ressarcidas, neste caso à protecção na saúde, o que coloca em causa o contrato social. Entenda-se que o contrato social representa: “A grande narrativa em que se funda a obrigação política moderna (…) Expressão de uma dialéctica entre a regulação e emancipação social, que se reproduz pela polarização constante entre a vontade individual e a geral, entre o interesse particular e o bem comum” (Boaventura Sousa Santos, 1998, citado por Sakellarides, 2010, p.20) ”.
O contrato social em saúde, que é ao fim ao cabo, uma legitimação do acordo sobre as regras segundo as quais uma comunidade pretende ser governada, porque admite mais vantagens para um bem comum do que conveniências individuais, foi estabelecido em tempos de hegemonia económica e em circunstâncias propícias. No primeiro caso em plena Revolução Industrial (Bismarck), e no segundo (Beveridge), logo após à II Guerra mundial. Hoje a economia global já não permite o crescimento económico explosivo de outrora, e este chega, até a ser limitado nos países europeus, ou a estagnar, como no caso português, que em 2010 99
alcançou os 60% da média do Produto Interno Bruto (PIB) da média europeia, com um crescimento de apenas 10%, desde os últimos 25 anos (Amaral, 2010).
POR UMA SOLUÇÃO DE SUSTENTABILIDADE
Entenda-se que desde a viragem do século XX para o século XXI, Portugal tem apresentado indicadores económicos, abaixo da média europeia, seguindo a mesma tendência nos registos de produtividade e de competitividade, o mesmo não se passa com o desemprego e com o endividamento externo, que por sua vez têm aumentado. Sem bases de sustentabilidade e de desenvolvimento que consigam reverter as condições do contrato social na saúde, os governos que veiculam políticas numa lógica de prestação de serviços e de distribuição justa de bens encontram-se numa situação de fragilidade para responderem às novas necessidades de protecção social na saúde.
O Estado, por seu turno, considerando que as instituições que regula, financia ou tutela, em determinados momentos passam por situações críticas, tenta influenciar positivamente a governação com o objectivo de equacionar alternativas (Skocpol, 1987; Ikenberry, 1994). Estas poderiam passar por uma redução de parâmetros do contrato social, ou pela transformação de um sistema de saúde de duas entradas (um mais qualificado para aqueles que podem pagar ou têm seguro e o SNS para todos os que não podem pagar ou não têm acesso a um e estão sujeitos às ineficiências e aos efeitos do subfinanciamento). Apesar de estas experiências não serem originais, pois outros países optaram por levá-las a cabo para garantirem a sustentabilidade dos seus sistemas de saúde, considera-se ainda uma terceira via, centrada em reforçar os valores fundamentais que conduzem a uma sociedade de bem-estar, introduzindo princípios como a solidariedade, a previdência e a coesão social na dinâmica institucional (Sakellarides, 2010). As circunstâncias que inspiraram o contrato social de Bismarck e de Beveridge no desenho dos sistemas de saúde foram modeladas, de acordo com as mudanças sociais e políticas, para que as instituições pudessem administrar as “regras do jogo” concentrando nelas o poder, ainda que apoiadas por pessoas vocacionadas para a gestão, para o bem comum e para a justiça social (Rawls, 2002; Hall & Taylor, 2003). Um novo institucionalismo histórico que toma em consideração o estado actual das instituições de saúde propõe, atentos os argumentos aduzidos por Sakellarides, no parágrafo anterior, a inclusão de processos deliberativos (Sen, 100
2009), ou seja, alguma flexibilidade para que se possam alcançar níveis mais ajustados de justiça social, que se aproximam das necessidades dos cidadãos e que se caracterizam por uma lógica de inclusão e de adaptação à realidade.
Na verdade, muitas instituições estão apartadas e não cumprem o papel que lhes foi designado, ou por falta de competência no cumprimento da missão ou por resistência à mudança, inviabilizando o interesse da sua existência em proveito do bem comum. Esse efeito descredibiliza as instituições e a própria governação, afectando a confiança dos cidadãos relativamente ao papel do estado na protecção da saúde e da doença, a acrescentar ao facto de já se manifestar um certo distanciamento entre o próprio utente e o Estado, enquanto prestador de cuidados de saúde “contratado”. DA NOVA GESTÃO PÚBLICA À “BOA GOVERNANÇA”: INFLUÊNCIAS DA ACTUALIDADE
A corrente institucionalista que se mantém dependente do trajecto (Thelen, 1999; Hall & Taylor, 2003; Pierson & Skocpol, 2004) defende uma aproximação ao cidadão, colocando-o no centro do sistema de saúde, à medida que se vão introduzindo novos intervenientes que permitem viabilizar de forma sustentada o cumprimento do contrato social da saúde. A inovação em saúde, constitui o denominador comum que pode transformar o conhecimento, não só em produtos, mas em processos, promovendo a produção de riqueza interna e externa, criando mais-valias na melhoria de cuidados de saúde, na economia e nas relações entre os intervenientes que constituem o capital social (Ansell, 2006), colocando a tónica na complexidade das relações que ligam cidadãos, agentes económicos e outros grupos ou organizações que se dediquem à melhoria da saúde dos portugueses. Esta rede de relações entre vários “actores”, é compreendida como uma fonte de recursos num contexto de modernização de processos e procedimentos de decisão no sector da saúde em Portugal. A opção da NGP, como teoria orientadora das reformas de saúde, particularmente, nas unidades hospitalares, foi crucial para aprimorar o comportamento das instituições, ainda que não estejam livres dos constrangimentos de trajecto de outras políticas (Pierson, 2004), como por exemplo, da reforma dos cuidados de saúde primários que não se mostrou tão eficaz na melhoria do desempenho na transição entre níveis de cuidados.
101
Todavia, também se reforçou o capital social (Putnam, 2000, citado por Sakellarides, 2010) junto de certos estruturas e agentes da organização social com potencial para melhorar as relações de reciprocidade com a sociedade civil, e facilitaram o funcionamento das instituições hospitalares, aqui em discussão. Esta capitalização, fruto de um conjunto de interacções, teve como principal alteração o processo de empresarialização dos hospitais e, posteriormente, a criação de centros hospitalares através da fusão de unidades que definiu como objectivo fundamental: “ o aumento da qualidade dos cuidados, a melhoria do acesso e da liberdade de escolha dos utentes e a maximização da eficiência e o controlo de despesa total” (Pereira, 2005, citado por Harfouche, 2012, p.115). Ainda que tenha sido de grande utilidade, pela busca de resultados, pelos modelos de flexibilização e de disciplina na gestão de recursos (Hood, 1991), a NGP não considerou a habilidade para solucionar todos os problemas das instituições de saúde, em particular das unidades hospitalares, sobretudo na área que aqui se pretende aprofundar, relacionada com a transição do “processo de cuidados” entre as unidades hospitalares e as outras estruturas de saúde ou de apoio social de proximidade, que oferecem maior sustentabilidade e são catalisadoras da promoção da saúde dos cidadãos.
Neste contexto, emerge um novo conceito de governação em saúde que promove novas articulações entre instituições e agentes, com o objectivo de altear a qualidade, a eficiência e a sustentabilidade dos cuidados de saúde em benefício dos cidadãos. Esta nova perspectiva, destaca-se da visão tradicional assente em estruturas de saúde de gestão vertical e pouco dinâmicas devido à excessiva concentração de poder (em si mesmas) ou nos profissionais de saúde (corporações), o que não terá gerado mudanças significativas nem alavancado sinergias interinstitucionais que pudessem oferecer novos ganhos em saúde. Uma nova governação em saúde pressupõe, um aparelho estatal flexível que coloque os cidadãos no centro do sistema e a abertura de espaço à sociedade, para que se alavanquem recursos que possam satisfazer as legítimas necessidades destes. Assim, a articulação entre níveis de cuidados de saúde tende a acompanhar o perfil da população utente apresentando outra agilidade e maior adequação para o desafio da doença crónica, também ela associada, à manutenção da longevidade, ao incremento do grau de dependência física e psicológica e à comorbilidade. Se o Estado promover na saúde uma articulação eficaz dos cuidados hospitalares para os cuidados continuados ou de proximidade (Bovaird & Loeffler, 2003), a transição entre níveis de cuidados de saúde “horizontaliza-se”, e reconhece um Novo institucionalismo de redes que é 102
promovido pelo capital social proveniente da cooperação interinstitucional, da negociação, da comunicação e da confiança. Inclui-se nesta “fórmula governativa”, o sector privado e o terceiro sector, que acabam por potenciar o bem-estar das comunidades numa perspectiva holística e promotora de princípios de boa governança, designadamente, de inclusão, de responsabilização e de transparência (Sakellarides, 2010, p.143), interferindo até com outras políticas sociais, mas não esquecendo, as limitações das estruturas institucionais, de nível central, regional ou local que podem condicionar a gestão e a adaptação às exigentes necessidades dos doentes.
Na governação em saúde, particularmente, ao nível da transição de níveis de cuidados defende-se uma maior abertura ao mercado (governance by markets) e às redes de apoio, (governance by networks) visão que, já não está tão centrada nas instituições, mas na gestão da doença, no processo de cuidados (Sakellarides, 2010) e no melhor interesse do doente (Skelcher & Mathur, 2004; Ansell, 2006) maximizando a “teia” de recursos em saúde. Esta abordagem vai ao encontro de uma nova geração de políticas públicas adaptativas (Swanson & Bhadwal, 2009) que consegue lidar com as limitações do percurso das instituições de saúde, especialmente, das unidades hospitalares que se reconhecem na tradição histórica do institucionalismo, mas que encaram a realidade de um sistema cada vez mais complexo.
A transição dos níveis de cuidados em saúde, que tem vindo a marcar o campo da incerteza e da complexidade já não se coaduna com estratégias de governação tradicional, tuteladas directamente pelo poder político, sobre uma rede institucional que se rege por determinadas regras e gere certos bens e serviços. O que pode ser útil, num campo de indefinição, de risco e de incerteza é a manutenção de referências-base ou de mecanismos que possam modelar, para cada situação concreta, as soluções mais adequadas para os cidadãos. Estas, segundo os autores abaixo mencionados, incluem pressupostos que podem ser considerados no desenho de novas políticas, designadamente, nas que promovem a transição entre os cuidados hospitalares e outros níveis de cuidados de saúde ou de apoio social em Portugal, que tem sido, bem entendido, o foco desta investigação. Destacam-se assim, alguns instrumentos para a acção: “Análise prospectiva integrada: importante para identificar factores críticos que afectam o desempenho das políticas, estabelecendo cenários sobre como esses factores podem evoluir no futuro);” 103
“Processo deliberativo envolvendo stakeholders: permitem examinar diferentes questões sobre diferentes pontos de vista, através de processos deliberativos amplamente partilhados; Reajustamentos ou convocatória de novas plataformas deliberativas: a sinalização através de indicadores seleccionados para o efeito de desvios às situações previstas, permite respostas rápidas e automatizadas (…) e novos processos deliberativos se isso não for suficiente;” “Capacitar formas efectivas de auto-organização e interacção: permite assegurar que as políticas não enfraquecem o capital social existente, e antes pelo contrário, facilitam e estimulam o funcionamento de redes sociais que permitem a troca de experiências e boas práticas;” “Descentralização da decisão: Descentralizar a capacidade de decisão para próximo do terreno, com autonomia e responsabilização, aumenta a probabilidade de se conseguirem resposta oportunas e adequadas face a situações novas e imprevisíveis;” “Promover respostas diversificadas, adaptadas às características do meio: (…) adoptar respostas distintas em circunstâncias diferentes, evitando respostas uniformes e “monótonas”; “Avaliações formais e dispositivos de aprendizagem contínua: avaliações regulares do desempenho das políticas, incluindo projetos-piloto, que permitam testar a robustez dos seus pressupostos e instrumentos face à ameaça de vários tipos de mudança” (Swanson & Bhadwal, 2009, citados por Sakellarides, 2010, p.151-152).
Em síntese, algumas das estratégias referidas pelos autores conseguem antever os efeitos de um futuro previsível, enquanto outras fazem sentido porque favorecem processos de adaptação e de ajustamento a necessidades não esperadas no desenho das políticas de saúde. No caso desta investigação, são também este tipo de medidas que devem ser incorporadas e fazer parte de uma estratégia de transição dos cuidados hospitalares para outros níveis de cuidados. De facto, podem adequar-se processos e plataformas deliberativas na gestão hospitalar que legitimem a necessidade e superior interesse dos doentes. Estes, pelas suas características teriam lugar no âmbito da identificação, da preparação e da gestão de altas hospitalares, contexto favorável para a análise integrada, para o estudo das partes interessadas responderem aos desafios, bem como para se ponderarem outros instrumentos para acção considerados por Swanson e Bhadwal (2009).
6.1 A
CONTINUIDADE DE CUIDADOS E A COOPERAÇÃO ENTRE O TERCEIRO SECTOR E O
SECTOR PRIVADO
Os cuidados hospitalares concentram em si o paradoxo que resulta do nível de acesso da população a este nível de cuidados e de uma necessidade de racionalizar as respostas em saúde, tornando-as mais sustentáveis e mais adequadas à realidade portuguesa. Este dilema 104
manifestou-se cedo e dura até aos dias de hoje, já que têm sido desenhadas medidas que podem proporcionar um determinado equilíbrio entre a procura e oferta destes cuidados de saúde diferenciados. Mais recentemente, observam-se os resultados de um conjunto de medidas enformadas pela corrente New Public Management (NPM) ou da Nova Gestão Pública (NGP) que primam pela melhoria da eficiência clínica, organizacional, pelo aumento da qualidade e pela satisfação dos utentes. Como medidas deste impacto evidenciam-se os processos de empresarialização dos hospitais através da constituição de Sociedades Anónimas (SA) e de Entidades Públicas Empresariais (EPE), e mais recentemente, pela fusão destes últimos, em Centros Hospitalares. No entanto, só recentemente é que se determinou com clareza os níveis de prestação das unidades hospitalares, o que poderá ter condicionado o ágil encaminhamento dos utentes entre hospitais (ERS, 2012, citado por Gouveia et al., 2012, p.7).
Assim, se a transição entre níveis de complexidade das unidades hospitalares, endogenamente, demonstrou falhas porque não se harmonizou convenientemente, ou seja, utilizou diferentes critérios para definir a sua complexidade (Ex: regulamentos, referenciação legal, contratualização) também se deverá exigir, exogenamente, a mesma complexidade para a referenciação e para a transição de cuidados hospitalares para os CSP, para a RNCCI, para os CLD e para o domicílio.
A transição natural de transferência de cuidados para os CSP está associada, normalmente, a uma melhoria do acesso e à conveniência para os utentes, sendo que a qualidade e a prestação dos serviços podem ficar comprometidas quando o tipo de cuidados transferidos implica competências que extrapolam as de um médico de Medicina Geral e Familiar (Roland et al., 2005; Sibbald et al., 2007, citados por Gouveia, 2012). Assim, segundo os mesmos autores, a transferência de cuidados nem sempre consegue prever a redução do volume de assistência hospitalar, e por tal não prognostica que impacto terão nos custos globais (custos directos médicos e custos não médicos) pois as situações não são lineares e dependem de factores de contexto. Entendam-se como custos directos médicos aqueles que se relacionam com a remuneração média dos médicos e que são de menor relevo, no caso dos CSP, considerando que os custos não médicos estão relacionados com a redução no tempo e no custo dos serviços de transporte. Ainda nesta realidade, pode referir-se que o encaminhamento e a transição dos doentes para a comunidade, tem por base a política vigente relativa à alta hospitalar, quer na área de internamento, urgência, quer na área das consultas externas e que, por tradição, se 105
consubstancia em três tipos de seguimento clínico: a) uma única consulta hospitalar para um procedimento típico; b) o seguimento para um conjunto de várias consultas de especialidade, e finalmente; c) um seguimento directo para os CSP (Roland et al., 2005, citado por Gouveia, 2012, p. 27-28). Contudo, por definição, os mesmos autores colocam em evidência as estratégias de acompanhamento clínico quando a alta hospitalar tem lugar. Diferenciam três tipos de seguimento: a) o não seguimento; b) o que é alavancado pelo próprio doente e; c) aquele que deve ser acompanhado pelos CSP (Roland et al., 2005, citado por Gouveia, 2012, p. 28). O que importa determinar neste contexto, é de que forma se devem agilizar as transferências de cuidados quando há, ou não, necessidades clínicas e de que modo se pode reverter a utilização indevida de recursos hospitalares, por recursos de proximidade, já que o comportamento que orienta a escolha é estabelecido pela facilidade de acesso a meios e a recursos (Roberts & Mays, 1998) e não propriamente pela elegibilidade/proporcionalidade dessa utilização.
Esta lógica, que justifica a natureza da protecção da saúde em meio hospitalar, foi sofrendo alterações, de acordo com a evolução do perfil típico de doentes que procura este nível de cuidados. Assiste-se a uma mudança de tendência do objecto dos cuidados de saúde da doença aguda para a doença crónica, e essa transformação repercute-se nos hospitais apesar de essa não ser a sua principal vocação. Por outras palavras, acabam por se manifestar, cada vez mais, quadros de doenças crónicas agudizadas, o que deixa pouca margem para a possibilidade de um “não seguimento” (Sibbald et al., 2007) depois de uma alta hospitalar. Nesta medida, a transição dos cuidados de saúde do meio hospitalar para a comunidade começou a ganhar peso, particularmente, ao nível da eficiência da prestação de serviços de saúde, numa primeira fase, aliada exclusivamente a resultados de produção para, numa segunda fase, ser fundamental entre outros critérios de avaliação de qualidade, centrados na melhoria da qualidade de vida e na maximização do bem-estar, só possível e sustentável com a colaboração entre níveis de cuidados e com a rede social envolvente (Kjaer, 2004). Ainda se acrescenta, que abriu caminho a uma governação integrada, estreitando laços entre a saúde e a protecção social, já que se deve responder ao desafio do envelhecimento da população, bem como a todos os indicadores que acompanham esse processo evolutivo que aumentou a longevidade, os níveis de dependência e a comorbilidade dos doentes. A jusante, tornou imperativa a coesão entre os diferentes sectores da sociedade e aumentou o capital social
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(Putnam, 2002), para que pudessem satisfazer, simultaneamente, necessidades de âmbito social e de apoio clínico e que têm por objectivo o bem-estar dos doentes e das suas famílias.
Esta abordagem Welfare Mix (Jonhson, 1987; Evers & Wintersberger, 1990), também na base da criação da RNCCI, rompe com um “estilo” de governo desusado, verticalizado e sem dinamismo institucional para um outro modelo de governação em saúde, em estreita relação com o sector privado (mercado) e com o Terceiro sector (rede social envolvente). Em boa verdade, a transição entre níveis de cuidados acarreta outra abrangência e envolvimento. Esta assenta no pluralismo de actores, sobretudo dos cuidadores e das famílias, como provedores naturais do bem-estar dos doentes, seja este físico, psicológico ou social, como se pretende aprofundar oportunamente.
No entanto, o que deve ficar clarificado são os resultados esperados da convergência destes esforços para o compromisso que se define no momento da alta hospitalar. Tanto o Terceiro sector como o sector privado podem contribuir para o equilíbrio da transição dos processos de cuidados, sendo que este contributo, dependerá diferenciadamente, da missão institucional de cada sector, do seu envolvimento na configuração e no estabelecimento das necessidades dos doentes e na flexibilidade para irem ao encontro das expectativas de cada indivíduo.
O CONTRIBUTO DO TERCEIRO SECTOR NA CONTINUIDADE DE CUIDADOS
As organizações do Terceiro sector, são uma estrutura essencial na oferta de respostas de proximidade, e garantem a grande fatia dos CLD em Portugal apresentando-se como parceiros privilegiados na governação (Almeida, 2011, p.86). Esta oferta pode implicar, na mesma medida, tanto cuidados de saúde ou de apoio social sendo que a partir do século XX, este conjunto de organizações, designadamente, de carácter associativo, cooperativo ou mutualista tem tido uma expressão cada vez maior nas sociedades modernas (Almeida, 2010, citado por Miranda, 2013, p. 15). Ainda que seja de difícil precisão, o conceito “Terceiro sector” consegue incorporar em si outros conceitos, tais como o de “sector não lucrativo” e que se refere à “economia social” (Chaves & Monzón, 2007). No entanto, apesar de algum consenso, as abordagens teóricas não conseguem, em pleno, adequar-se à realidade portuguesa (Sarjado & Chaves, 2006).
107
Numa abordagem genérica afirma-se que o Terceiro sector assume uma relação com os dois níveis institucionais da economia, o sector público e o sector privado. Este conceito, entre outras designações existentes como as acima descritas, justifica a diversidade deste tipo de organizações em Portugal, que certamente são diferentes. Neste sentido, a opção pela definição de Terceiro sector traduz uma perspectiva mais abrangente, que outras de grande relevo, focando as diferentes formas de acção possíveis e respeitando os seus processos de mudança (Laville et al., 1999, citado por Andrade & Franco, 2007). Esta linha de entendimento vai ao encontro do conceito de “Triangulo de Bem-estar” entre Mercado, Estado e Famílias, que justifica a existência de uma diversidade de recursos, que contribui para o bem-estar social, colocando a tónica nas comunidades informais e semiformais, e especialmente, no papel que assumem as famílias (Evers, 1995, citado por Andrade & Franco, 2007). Assim, o Terceiro sector ao integrar esta pluralidade de economias relaciona-se com um quadro institucional dentro do qual convergem os vértices da triangulação acima identificada, ocupando o espaço disponível dentro dessa triangulação.
Teoricamente, para fundamentar a existência deste sector, alude-se à abordagem institucionalista que assenta na premissa de que são instituições, e não apenas as normas e as regras que estruturam comportamentos de indivíduos e que organizam a dinâmica dos sistemas sociais. As instituições são também interacções de indivíduos que revelam capacidade de decisão, intenção e diversidade, pois fundamentam-se em valores, hábitos e regras que dependem da complexidade do legado histórico, cultural e social, levando as economias a estruturarem-se entre todas essas instituições que se articulam entre os sectores que constituem o Triângulo de Bem-Estar de Evers (1990, 1995). A visão bipolar do Estado e do Mercado foi paulatinamente substituída por uma governação pluralista na qual participam “várias estruturas, vários actores, vários processos, várias capacidades (…) e vários mecanismos” (Reis, 2007, citado por Almeida, 2011, p.93). Nesta, o Terceiro sector tem complementado a oferta dos outros sectores da economia evoluindo, de acordo com as circunstâncias históricas, políticas e socio-económicas (Sarjado & Chaves, 2006) ainda que o percurso não tenha sido linear, pelo que se apresenta uma caracterização do sector, atendendo às características específicas do caso português.
Historicamente, as origens da filantropia e da acção caritativa estiveram, tal como noutros países da Europa do Sul, ligadas à Igreja Católica desde o século XII, o que marcou 108
decisivamente a evolução do Terceiro sector dada a natureza vinculativa entre o Estado e a Igreja, fortemente associado a valores cristãos e de Obras da Misericórdia (Franco et al., 2005). Para outros autores, a origem das organizações contemporâneas do sector em discussão teve lugar em pleno século XIX, num cenário fértil de experiências revolucionárias e de hegemonização do liberalismo económico e político, entre outras correntes ideológicas como o socialismo utópico e o social cristianismo. Estas correntes estiveram na base das novas formas de actividade económica, em alternativa, ao capitalismo permitindo que emergisse, o associativismo e o corporativismo (Quintão, 2011).
AS
ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SECTOR: QUE CONTRIBUTO PARA A TRANSIÇÃO DE
CUIDADOS
Para se conceber uma ideia de como pode ser levada a cabo, a transição dos cuidados hospitalares para os CLD ou de proximidade, importou distinguir os principais tipos de organização do Terceiro sector, tendo por base a Classificação Internacional para as Organizações Sem fins Lucrativos (Franco et al., 2005) e a representação actual das organizações do Terceiro sector (Quintão, 2011, p.15). Cabe referir que para a Classificação Internacional são consideradas as organizações que se concentram nos Grupos 3 e 4, pois são estas que designam as organizações de saúde (Hospitais e Casas de Saúde ligadas a ordens religiosas) e dos serviços sociais (Instituições Particulares de Solidariedade Social, Santas Casas da Misericórdia, Cooperativas de Solidariedade Social, Associações Mutualistas, entre outras).
Por
uma
questão
de
homogeneidade
conceptual
optou-se
pela
caracterização/descrição organizacional de Andrade & Franco (2007): 1) “Associações Não Lucrativas - Consideram um conjunto de pessoas que se unem para um determinado fim ou propósito (…) Podem ser associações desportivas, Associações Culturais e Recreativas, Associações de Bombeiros Voluntários; (Andrade & Franco, 2007, p.26) 2) “Associações Mutualistas – (…) São Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) com um número ilimitado de associados, capital indeterminado e duração indefinida que, (…) praticam, no interesse destes e respectivas famílias, fins de auxílio recíproco” (Andrade & Franco, 2007, p. 26-27); 3) “Cooperativas – (…) são pessoas colectivas autónomas, de livre constituição, de capital e composição variáveis que através da cooperação e entreajuda dos seus membros, com obediência aos princípios corporativos, visam, sem fins lucrativos, a satisfação das necessidades e aspirações económicas, sociais ou culturais daqueles (…)”(Andrade e Franco, 2007, p.27);
109
4) “Fundações – São um fenómeno recente em Portugal como tipo de organização sem fins lucrativos, (…) o mundo fundacional é muito heterogéneo, ora por pequenas fundações, com estatuto de IPSS, ora por grandes fundações como a fundação Calouste Gulbenkian ou fundação Champalimaud” (Andrade & Franco, 2007, p. 28); 5) “Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS): São IPSS as constituídas, sem finalidade lucrativa, por iniciativa de particulares, com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral de solidariedade e de justiça entre os indivíduos e desde que não sejam ministradas pelo Estado ou por um corpo autárquico, para prosseguir, entre outros (…) objectivos, mediante a concessão de bens e a prestação de serviços” (Andrade & Franco, 2007, p. 28); 6) “Misericórdias – Estão entre as mais antigas organizações sem fins lucrativos em Portugal. (…). Dedicadas ao cumprimento das obras de misericórdia. Existem quase 400 Misericórdias em Portugal, algumas com mais de 500 anos de existência “ (Andrade & Franco, 2007, p. 29); 7) “Organizações de desenvolvimento Local – sem enquadramento legal específico (foram um fenómeno exponencial a partir da década de 1980, um movimento impulsionado pelo programa comunitário (PIC- Leader). Este (…) surgiu para complementar programas de desenvolvimento rurais já existentes, com formas inovadoras de intervenção através da criação de organizações da sociedade civil.” (Andrade & Franco, 2007, p. 29); 8) “Organizações não Governamentais para o Desenvolvimento (ONGD) – (…) têm como áreas fundamentais de intervenção: a Cooperação para o Desenvolvimento e a Ajuda humanitária e de Emergência. São 49 as associadas na plataforma das ONGD” (Andrade & Franco, 2007, p. 2930).
O Terceiro sector regista uma vasta experiência na resolução dos problemas sociais contemporâneos, um estilo de missão organizacional assente em pressupostos humanistas e o potencial para flexibilizar respostas sociais de acordo com as necessidades dos doentes. Mais do que uma transição para um determinado nível de cuidados de saúde, o Terceiro sector permite alavancar um conjunto de recursos que não são exclusivamente cuidados de saúde, mas outros CLD cujas respostas sociais podem ser conjugadas com as da saúde. Este sector inscreve-se muitas vezes no que se designa por “não seguimento” clínico (Sibbald et al., 2007), ainda que pela contratação de qualquer serviço de vigilância, suporte de actividades básicas da vida diária se possa apostar na promoção e na prevenção da saúde. Na realidade, os desafios que se colocam ao sector, também têm mobilizado novos recursos para a saúde e coadjuvado a acção do serviço público, numa perspectiva de contratualização assumindo funções que envolvem grupos especialmente vulneráveis, e o nível intermédio de cuidados de saúde: os CCI. A montante, têm outro tipo de responsabilidades que não são exclusivas à área da saúde mas que envolvem os seus principais determinantes, designadamente, o apoio económico e social a populações em grande vulnerabilidade ou até em exclusão social. É a 110
este nível que flexibilizam e informalizam as abordagens que não têm lugar na prestação de serviços públicos e nas quais se podem desenhar medidas adaptativas ajustadas e até mesmo parcerias público-privadas salvaguardando o superior interesse dos doentes.
O SECTOR PRIVADO NA CONTINUIDADE DE CUIDADOS
O sector privado tem assumido um papel central na transição dos cuidados hospitalares para a comunidade, complementando a oferta de cuidados de continuidade, relativamente aos prestadores tradicionais. Esta tendência foi motivada pela transição demográfica e pela carência de respostas sociais, acabando por impulsionar o investimento privado não lucrativo, para a área dos CCI (Decreto-Lei 101/2006 de 6 Junho) e para a área dos CLD que abrangem um conjunto de serviços a pessoas com determinado grau de dependência nas Actividades da Vida Diária (AVD) devido a incapacidade física ou cognitiva.
Nesta medida, tal como nos outros dois sectores (público e Terceiro sector), este também oferece uma gama de serviços sociais e de saúde, tanto para pessoas dependentes nas AVD, devido a doença crónica e/ou incapacitante, como enquanto prestador da RNCCI “numa perspectiva global, relativa a todos os aspectos relacionados com os serviços de saúde e sociais. Os componentes principais incluem cuidados institucionais, serviços na comunidade e apoio domiciliário” (Abreu Nogueira, 2009, p.5).
Na realidade, o investimento privado em CLD em Portugal acaba por complementar as ineficiências do sector público e beneficia, ao mesmo tempo, do facto de existir um “mercado”, que procura por este tipo de respostas sociais. Esta terá sido a estratégia de outros países europeus que tentaram controlar os custos que estão associados a esta vertente de prestação de cuidados à população, e que tem sido, em Portugal, afectada por cortes orçamentais, limitações de acesso ou até mesmo pelo aumento das listas de espera. Assim, o aumento pela procura e, simultaneamente, do gasto público em CLD gera dificuldades que não foram abrandando ao longo do tempo, sendo oportuno reequacionarem-se novos modelos de funcionamento e de financiamento dos níveis de cuidados pois começam a estar “em jogo” a manutenção de respostas adequadas e a qualidade de serviços de apoio continuado à população mais frágil e com necessidades de apoio pós-hospitalar. Foi neste contexto que se encorajou o envolvimento do sector privado, até aqui não lucrativo, nos CCI e nos CLD e até, 111
se abriu caminho a outras vias possíveis, como o sistema de protecção nos CLD por entidades seguradoras privadas lucrativas, já que esta última opção, embora residual ou quase inexistente, está em linha com a realidade de outros países europeus que atravessam os mesmos problemas dos portugueses e colocam as mesmas interrogações (Gleckman, 2010; Pinquet & Guillén, 2008; Gibson & Redfoot, 2007;Arntz et al., 2007, citados por Lopes et al., 2010, p.17).
Em conclusão, é importante salientar o papel do sector privado, pela sua cooperação, pela variedade da oferta e pelo nível de qualidade. Deve também considerar-se como vantagem competitiva o facto de algumas destas instituições serem locais, e nessa medida, conseguirem manter uma relação de afinidade e proximidades com a população a quem servem os cuidados. Estas ligações estabelecem-se pela identidade, pelo percurso histórico da instituição e são consolidadas pelo estabelecimento de parcerias e por oferecerem respostas de proximidade em benefício de um bem comum (Sakellarides, 2010).
6.2. O PAPEL DO ESTADO NOS CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO
A adequação dos Cuidados de Longa Duração (CLD) tem sido essencial para Portugal e para outros países europeus, se considerarmos a procura e o custo que representam para as sociedades modernas. Em geral, foram criadas estratégias de ajustamento, flexibilizaram-se modelos de financiamento e de funcionamento, e discutiram-se prestações de serviços essenciais de continuidade a indivíduos em situação de vulnerabilidade, envelhecidos, com doenças crónicas e com necessidades de apoio à recuperação da sua funcionalidade ou de cuidados após internamento hospitalar (Lopes et al., 2010). Nesta lógica, foi imperativo aumentar a capacidade interventiva dos serviços de saúde e de apoio social, facilitar a coordenação/coesão intersectorial, como já referido, e afinar a tipologia de cuidados que devem ser prestados à população, cujas respostas assentam numa determinada oferta de cuidados institucionais ou domiciliários. É nesta linha de entendimento, que a discussão no plano nacional ou internacional deverá ter lugar para poderem ser reconhecidos benefícios, incentivos ou políticas no âmbito dos modelos de CLD. Estes com o intuito de promover a sustentabilidade dos cuidados, e a melhor coordenação entre serviços de saúde e os serviços de protecção social, bem como assim, discutir o papel da família e as áreas prioritárias, sem
112
gerar iniquidades, sem penalizar a qualidade dos serviços e numa lógica de optimização dos recursos disponíveis.
6.2.1. AS RESPOSTAS SOCIAIS EM PORTUGAL
Os CLD têm sido levados a cabo por instituições e equipamentos sociais que se caracterizam como as estruturas que proporcionam determinadas respostas sociais à população (Nogueira, 2009). Estes podem ser dirigidos a pessoas autónomas ou dependentes sendo prestados por um conjunto de organizações autónomas (lares, centros de dia, centros de convívio e apoio domiciliário), ou através de respostas integradas, enquadradas em programas ou em redes, como são exemplo, o Programa de Apoio Integrado a Idosos (PAII) ou a Rede de Cuidados Continuados
Integrados
(RNCCI).
Genericamente,
as
entidades
proprietárias
ou
administradoras destas respostas podem ser lucrativas ou não lucrativas ainda que a representatividade do sector não lucrativo seja o sustentáculo da Rede Social de Equipamentos Sociais (RSES), mesmo com o crescimento do sector lucrativo (Gonçalves, 2010). As respostas sociais e os programas disponíveis para as pessoas idosas, neste estudo com particular relevância, têm o objectivo de promover as condições de bem-estar, favorecendo a autonomia em meio familiar e privilegiando a inserção social e comunitária, como consagra o art.º 72 da Constituição da República Portuguesa que exalta “o direito à segurança económica, às condições de habitação e ao convívio familiar, respeitando a salvaguarda do isolamento e da marginalização social” (CRP, artº 72, nº 1). É neste sentido que importa destacar o Subsistema de Acção Social, que se enquadra na Lei de Bases da Segurança Social (Lei nº 4/2007, de 16 de Janeiro) enquanto promotor de respostas sociais, especialmente pela forma como tem vindo a contribuir positivamente para o processo de transição dos cuidados hospitalares para os CLD, já que encerra em si respostas que estão vocacionadas para a criação de condições de vida, para garantia da autonomia individual e colectiva, assim como, para a integração social dos grupos mais vulneráveis. De facto, são de acentuar este tipo de medidas em pleno século XXI, essencialmente, pela celebração de acordos de cooperação entre o Estado, o Terceiro sector, a rede familiar e outras partes interessadas, com o intuito de se poder alargar a Rede Social de Serviços e de Equipamentos, permitir melhorias nos níveis de protecção social e aumentar a capacidade instalada (Nogueira, 2009).
113
AS RESPOSTAS SOCIAIS: DO CONTEXTO HOSPITALAR À COMUNIDADE
Relativamente à tipologia, elencam-se fundamentalmente, as respostas sociais disponíveis e que estão focalizadas no apoio à população na transição dos cuidados hospitalares para os CLD (Carta Social, 2013), designadamente: para idosos (Tabela 3), portadores de deficiência (Tabela 4), dependentes (Tabela 5), pessoas com doença do foro mental/psiquiátrica (Tabela 6) e sem-abrigo (Tabela 7), de acordo com o relatório mais recente, exarado no ano civil de 2013 pelo Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério de Solidariedade, Emprego e Segurança Social.
Pessoas idosas Serviço de Apoio Domiciliário
Centro de Convívio
Centro de Dia
Centro de Noite
Acolhimento Familiar para Pessoas Idosas
Estrutura Residencial para Idosos (lar de idosos e residência)
“Resposta social, desenvolvida a partir de um equipamento, que consiste na prestação de cuidados individualizados e personalizados no domicílio a indivíduos e famílias quando, por motivo de doença, deficiência ou outro impedimento, não possam assegurar temporária ou permanentemente, a satisfação das necessidades básicas e/ou as actividades da vida diária.” (Carta Social, 2013, p.57) “Resposta social, desenvolvida em equipamento, de apoio a actividades sócio-recreativas e culturais, organizadas e dinamizadas com participação activa das pessoas idosas de uma comunidade.” (Carta Social, 2013, p.57 “Resposta social, desenvolvida em equipamento, que consiste na prestação de um conjunto de serviços que contribuem para a manutenção das pessoas idosas no seu meio sóciofamiliar.” (Carta Social, 2013, p.57 “Resposta social, desenvolvida em equipamento, que tem por finalidade o acolhimento nocturno, prioritariamente para pessoas idosas com autonomia que, por vivenciarem situações de solidão, isolamento ou insegurança necessitam de suporte de acompanhamento durante a noite.” (Carta Social, 2013, p.57 “Resposta social que consiste em integrar, temporária ou permanentemente, em famílias consideradas idóneas, pessoas idosas quando, por ausência ou falta de condições de familiares e/ou inexistência ou insuficiência de respostas sociais, não possam permanecer no seu domicílio.” (Carta Social, 2013, p.58) “Considera-se estrutura residencial para pessoas idosas, o estabelecimento para alojamento colectivo, de utilização temporária ou permanente, em que sejam desenvolvidas actividades de apoio social e prestados cuidados de enfermagem. A estrutura residencial pode assumir um das seguintes modalidades de alojamento: a) Tipologias habitacionais, designadamente apartamentos e ou moradias; b) Quartos e c) Tipologias habitacionais em conjunto com o alojamento em quartos” (Carta Social, 2013, p.58)
Tabela 3 – Respostas sociais para pessoas idosas (Carta Social, 2013)
Pessoas adultas com deficiência Centro de Atendimento/Acompanham ento e Animação P/Pessoas C/Deficiência Serviço de Apoio Domiciliário
Centro de Actividades Ocupacionais
“Resposta social, desenvolvida em equipamento, organizada em espaço polivalente, destinado a informar, orientar e apoiar as pessoas com deficiência, promovendo o desenvolvimento das competências necessárias à resolução dos seus próprios problemas, bem como actividades de animação sócio-cultural.” (Carta Social, 2013, p.58) “Resposta social, desenvolvida a partir de um equipamento, que consiste na prestação de cuidados individualizados e personalizados no domicílio a indivíduos e famílias quando, por motivo de doença, deficiência ou outro impedimento, não possam assegurar temporária ou permanentemente, a satisfação das necessidades básicas e/ou as actividades da vida diária.” (Carta Social, 2013, p.58) “Resposta social, desenvolvida em equipamento, destinada a desenvolver actividades para jovens e adultos com deficiência grave.” (Carta Social, 2013, p.58)
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Acolhimento Familiar para Pessoas Adultas com Deficiência Lar Residencial
Transporte de Pessoas com Deficiência
“Resposta social, que consiste em integrar, temporária ou permanentemente, em famílias consideradas idóneas, pessoas com deficiência, a partir da idade adulta”. (Carta Social, 2013, p.58) “Resposta social, desenvolvida em equipamento, destinada a alojar jovens e adultos com deficiência, que se encontrem impedidos temporária ou definitivamente de residir no seu meio familiar.” (Carta Social, 2013, p.58) “Resposta social, desenvolvida através de um serviço, de natureza colectiva de apoio a crianças, jovens e adultos com deficiência, que assegura o transporte e acompanhamento personalizado.” (Carta Social, 2013, p.58)
Tabela 4 – Respostas sociais para pessoas adultas com deficiência (Carta Social, 2013) Pessoas em situação de dependência “Resposta social, desenvolvida a partir de um equipamento, que consiste na prestação de cuidados individualizados e personalizados no domicílio a indivíduos e famílias quando, por motivo de doença, deficiência ou outro impedimento, não possam assegurar temporária ou permanentemente, a satisfação das necessidades básicas e/ou as actividades da vida diária” (Carta Social, 2013, p.59) “Resposta que se concretiza através de um conjunto de acções e cuidados pluridisciplinares, flexíveis, abrangentes, acessíveis e articulados, de apoio social e de saúde, a prestar no domicílio, durante vinte e quatro horas por dia e sete dias por semana. ” (Carta Social, 2013, p.59) “Resposta, desenvolvida em equipamento, que visa prestar cuidados temporários, globais e integrados, a pessoas que, por motivo de dependência, não podem, manter-se apoiadas no seu domicílio, mas que não carecem de cuidados clínicos em internamento hospitalar.” (Carta Social, 2013, p.59)
Serviço de Apoio Domiciliário
Apoio Domiciliário Integrado - ADI
Unidade de Apoio Integrado - UAI
Tabela 5 – Respostas sociais para pessoas em situação de dependência (Carta Social, 2013) Pessoas com doença do foro mental ou psiquiátrico Fórum Sócio-Operacional.
Unidade de Vida Protegida
Unidade de Vida Autónoma
Unidade de Vida Apoiada
“Resposta, desenvolvida em equipamento, destinada a pessoas com desvantagem, transitória ou permanente, de origem psíquica, visando a sua reinserção sócio-familiar e ou profissional ou a sua eventual integração em programas de formação ou de emprego protegido” ” (Carta Social, 2013, p.59) “Resposta, desenvolvida em equipamento, destinada a pessoas adultas com problemática psiquiátrica grave e de evolução crónica clinicamente estável e que necessitam de treino de autonomia. ” (Carta Social, 2013, p.59) “Resposta, desenvolvida em equipamento, destinada a pessoas adultas com problemática psiquiátrica grave estabilizada e de evolução crónica, mas com capacidade autonómica, permitindo a sua integração em programas de formação profissional ou em emprego normal ou protegido e sem alternativa residencial satisfatória.” (Carta Social, 2013, p.59) “Resposta, desenvolvida em equipamento, destinada a pessoas adultas que, por limitação mental crónica e factores sociais graves, alcançaram um grau de desvantagem que não lhes permite organizar, sem apoio, as actividades de vida diária, mas que não necessitam de intervenção médica frequente. ” (Carta Social, 2013, p.59)
Tabela 6 – Respostas Sociais para pessoas com doença mental ou psiquiátrica (Carta Social, 2013)
Pessoas Sem-abrigo Equipa de Rua para Pessoas Sem Abrigo Atelier Ocupacional
“Resposta social, desenvolvida através de um serviço prestado por equipa multidisciplinar, que estabelece uma abordagem com os sem-abrigo, visando melhorar as suas condições de vida.” ” (Carta Social, 2013, p.59) “Resposta social, desenvolvida em equipamento, destinada ao apoio à população adulta, sem abrigo, com vista à reabilitação das suas capacidades e competências sociais, através do desenvolvimento de actividades integradas em programas “estruturados” que implicam uma participação assídua do indivíduo, ou “flexíveis” onde a assiduidade depende da sua disponibilidade e motivação.” ” (Carta Social, 2013, p.59)
Tabela 7 – Respostas sociais para pessoas sem-abrigo (Carta Social, 2013) 115
Ainda no final da década de 90, e de forma mais consistente no início do século XXI, persistia a convicção de que os equipamentos sociais, tidos como estruturas físicas onde se desenvolvem as respostas sociais (Carta Social, 2000) deveriam ter uma acção não apenas preventiva, mas de promoção da integração social. Desde então que se tem vindo a observar um aumento gradual de respostas sociais, especialmente, na área do Serviço de Apoio Domiciliário (SAD) e dos Centros de Convívio – constituindo estes, também, a forma mais imediata de fazer face ao agravamento da dependência e do número de pessoas em isolamento social.
Neste enquadramento foi elaborado, ainda nos anos 90, um pacto de cooperação entre o Estado, a sociedade civil e as autarquias que subentendia entre todos os intervenientes, uma responsabilidade das partes num pluralismo de actores cada vez mais centrado num modelo de “welfare mix”. Nesta conjugação de esforços, o Estado garantia a melhoria da qualidade das respostas como regulador, legislando sobre as condições de implantação, funcionamento de serviços e equipamentos, tais como SAD, residências, centros de dia, entre outros, tendo o compromisso de salvaguardar o controlo destes equipamentos por intermédio da Segurança Social que autorizava os licenciamentos e se ocupava da fiscalização deste tipo de estabelecimentos de apoio social (Decreto-lei 133/1997-A, de 30 Maio), tendo ainda reformulado o acolhimento familiar a pessoas idosas e adultas com deficiência (Despacho Conjunto nº 727/1999, de 23 Agosto).
Em termos de percurso deve salientar-se que as instituições do tipo, lar ou residência, evoluíram nos últimos 20 anos e que foram geridas em Portugal, maioritariamente, por instituições não lucrativas. Estas valências foram dando resposta, em particular, a pessoas com algum grau de autonomia ou com um grau de dependência parcial (Sousa & Figueiredo, 2004). Durante este mesmo período o sector privado também investiu nestas valências, tendo até instituído novos formatos de resposta social, como as estruturas residenciais. Estas novas respostas residenciais pretendiam denominar: “a) Tipologias habitacionais, designadamente, apartamentos ou moradias, b) Quartos e c) Tipologias habitacionais em conjunto com o alojamento em quartos” (Carta Social, 2013, p.58) tendo a mesma essência do que se designa por “lar”, mas associados a um novo conceito de necessidades que se tem expandido no sector lucrativo, sendo um tipo de resposta legítima desenvolvida, em norma por influentes grupos económicos e numa lógica de mercado. 116
Já os Centros de Dia e de Convívio e os Serviços de Apoio Domiciliário (SAD) têm-se constituído como as respostas sociais de apoio que cooperam na base de apoio à população que pretende a manutenção de cuidados no seu meio envolvente, sendo o SAD, entre estas tipologias, o principal responsável pela prevenção da dependência e da promoção da autonomia, minorando riscos sociais, quer ao nível das actividades básicas, quer das actividades instrumentais da vida diária (Bonfim & Veiga, 1996, citado por Carvalho, 2009b, p.77).
O que se pode observar, ainda que para a concretização deste estudo, sejam de maior utilidade a evolução das respostas sociais para a população adulta e idosa é que de uma forma continuada, e mais recentemente, entre o período 2005-2011, houve grande expressão das respostas sociais que privilegiam a institucionalização, nomeadamente de lares e residências que registou um aumento, neste intervalo cronológico, na ordem dos 34%. Este foi acompanhado pelo aumento do número de vagas, respectivamente, de 5% (lares) e de 3% (residências). Também de registar estão as respostas sociais a favor da população portadora de deficiência ou com incapacidade que apresentou um incremento na ordem dos 4% em Lares residenciais e de 2% nos Centros de Actividades Ocupacionais – CAO (Carta Social, 2012. p.3). Na actualidade, o alargamento destas respostas sociais está de certa forma alinhado com o Plano de Emergência Social (PES) que assume nos seus pressupostos estruturais a maximização da capacidade instalada como forma de reduzir os efeitos do envelhecimento e do aumento do grau de dependência da população, desburocratizando e flexibilizando processos e procedimentos normativos. Este processo tem revelado grande utilidade para o crescimento das respostas sociais e para o aumento da taxa de cobertura das mesmas que se estimam ter aumentado no continente, de 12% para 12,4% ao nível das residências, lares e SAD, considerando ainda o lustro acima referido (Carta Social, 2012, p.4).
A IMPORTÂNCIA DA REDE DE SERVIÇOS E EQUIPAMENTOS SOCIAIS
Desde a viragem para o século XXI que Portugal tem a preocupação de dinamizar a Rede de Serviços e Equipamentos Sociais (RSES), quer pelo aumento do número de respostas, quer pelo desenvolvimento da qualidade das mesmas, sendo evidente, o papel que esta tem representado na transição entre os cuidados de saúde e o apoio na comunidade. A realidade é que a RSES tende a beneficiar um maior número de cidadãos em situação de exclusão, daí 117
que se tenham vindo a incrementar os acordos de cooperação entre o Estado e o Terceiro sector, assim como o investimento em programas que visam o alargamento da Rede e que servem a população, e em particular, os grupos mais vulneráveis.
Ainda que a RSES tenha como objectivo apoiar, genericamente, as necessidades sociais da população, existem serviços e equipamentos que conseguem garantir a transição entre o nível de cuidados de saúde e a comunidade, especificamente, numa população que está mais fragilizada e dependente. Por exemplo, a população idosa que se constitui como o grupo populacional mais representativo da preocupação com a transição do nível de cuidados é também a mais vulnerável à pobreza, ao isolamento e a que mais limitação apresenta no acesso a bens e serviços. Nesta lógica, a acção social, como já se referiu previamente, tem um papel decisivo de protecção, tanto ao nível da prevenção da dependência, em situações de carência e de exclusão social, como na capacidade de promover a integração social dos indivíduos através do desenvolvimento das suas próprias capacidades. A acção social é assim crucial para a coesão social, muito particularmente, através das medidas e programas que se vão desenhando e adequando aos desafios da modernidade e às alterações socioeconómicas e demográficas que nos vão revelando novos riscos sociais. A RSES é um recurso incontornável da política social sendo essencial para a promoção do bem-estar e para a inclusão social. Neste pressuposto de inclusão considere-se a colaboração e as sinergias dos actores e das instituições que intervêm nos distintos sectores de actividade assim como nos programas públicos que têm e tiveram como objectivo expandir os horizontes desta Rede de equipamentos, considerando as assimetrias existentes e a cobertura nacional. A RSES cresceu na última década, na sequência do investimento público e através da aposta em políticas sociais direccionadas para o apoio à família, para a conciliação entre trabalho e vida familiar, de forma a promover a igualdade de oportunidades (Metelo et al., 2010). Para a realidade que se enquadra na transição dos cuidados de saúde para os CLD, tem-se assistido a um desenvolvimento de respostas sociais de relevo “ aproximadamente 38 500 lugares em SAD, 14 000 em residências e Lares de Idosos, 10 200 lugares em Centros de Dia, no período 2000-2009” (Metelo et al., 2010, p.78). Para além das respostas referidas é importante sublinhar que o financiamento da RSES não se destina exclusivamente às transferências financeiras que vão garantindo o financiamento das respostas sociais, estipulados por convénios ou acordos de cooperação, mas incluem outros apoios directos e indirectos que se consubstanciam em subsídios para instalação e aquisição de equipamentos ou de regalias e 118
isenções tributárias por convenções estatutárias de utilidade pública e outros estímulos no âmbito de programas e projectos nacionais e internacionais. A execução dos projectos e programas, que se apresentam, no quadro abaixo representado (Tabela 8), consideram uma lógica de continuidade do investimento público em prol da população e da necessidade de revigorar as respostas existentes: Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos (PARES) Medida de Apoio à Segurança dos Equipamentos (MASES) Apoio ao investimento em Resposta Integradas de Apoio Social (Medida 6.12 -POPH) Programa de Apoio ao Investimento em Equipamentos Sociais (PAIES)
“(…) Criado em 2006 (…) Os incentivos do PARES destinam-se a obras de construção, remodelação ou aquisição de edifícios ou fracções”. (Metelo et al., 2010, p.81) “Criada em 2008 (…), apoio financeiro que se destinou à realização de obras em estabelecimentos de apoio social nas quais se verificasse a necessidade de adaptação de instalações e substituição de materiais e equipamento, colocando em causa a segurança, o bem-estar e a qualidade dos serviços”. (Metelo et al., 2010, p.81) “Medida de apoio destinada a pessoas idosas e com deficiência. (…) Esta medida financia obras de construção, remodelação ou aquisição de edifícios ou fracções (Metelo et al., 2010, p.81) “Criado em 2006, para apoiar o desenvolvimento da RSES através da concessão de incentivos ao investimento privado mediante a comparticipação da componente de juros do empréstimo bancário, com vista à criação de novos lugares em respostas sociais destinadas a crianças, pessoas idosas ou pessoas com deficiência”. (Metelo et al., 2010, p.81-82)
Tabela 8 – Programas e investimento público no apoio à RSES
6.2.2. AS RESPOSTAS SOCIAIS INTEGRADAS: SAÚDE E APOIO SOCIAL
No final dos anos 90, a crescente complexidade dos problemas sociais fez emergir respostas sociais que conseguem conciliar a área da saúde com o apoio social. Inicialmente desenhadas para a população idosa, surgem de um impulso inovador que tinha a pretensão de requalificar e adaptar as estruturas existentes num modelo onde o todo fosse mais eficaz que a soma das partes. Surgem então as primeiras medidas, associadas ao Plano de Apoio Integrado a Idosos – PAII (Despacho conjunto nº 166/1994, de 20 de Julho) que teve início com a criação de um Programa com o mesmo nome (PAII) e que foi sendo sucessivamente regulamentado por um conjunto de orientações, nomeadamente, pelos Despachos Conjuntos nº259, de 21 Agosto de 1997; nº 407/1998, de 18 de Junho e nº 726/1998, de 16 de Outubro. A inovação desta medida apetrechou os Serviços de Apoio Domiciliário (SAD), agora transformados em Serviços de Apoio Domiciliário Integrados (SADI) dotando-os com outras respostas complementares que visavam a melhoria das respostas existentes e a articulação de recursos. Por outro lado, o programa financiava Centros de Apoio a Dependentes (CAD) que antes, se centravam essencialmente em serviços de internamento e de reabilitação, e cuja implantação apesar de 119
não ter sido tão feliz como esperado, permitia a articulação com o SAD em áreas como o apoio social, a reaprendizagem das AVD, a promoção da solidariedade intergeracional, entre outras. Centro de Apoio Dependentes (CAD)
a
Serviço Apoio Domiciliário (SAD)
Formação de Recursos Humanos (FORHUM) Serviço TeleAlarme (STA)
Saúde e Termalismo Passes Idade
para
a
Terceira
“Espaços e equipamentos (…) que prestam serviços de carácter temporário, apoiando não só idosos, mas todos aqueles que se encontrem dependentes e necessitem de reabilitação e reinserção social ” (Carvalho, 2012, p.84) “Oferecem cuidados urgentes e permanentes destinados a manter a autonomia do idoso no domicílio; meios para assegurar a sua mobilidade e a acessibilidade a benefícios e serviços; serviços de apoio às famílias cuidadoras e formação dos intervenientes” (Carvalho, 2012, p.84) “(…)Habilitar a rede informal de suporte às pessoas idosas e dependentes, na qual estão incluídas os familiares cuidadores, vizinhos e voluntários, assim com a rede formal dos profissionais e entidades cuidadoras; (Carvalho, 2012, p.84) “Dispositivo electrónico ligado à linha telefónica que visa apoiar no domicílio, prioritariamente, pessoas idosas em situação de dependência física, mental ou social e atenuar o seu isolamento, contribuindo a para a promoção da sua autonomia, dentro de uma linha de suporte familiar integrado”. (Carvalho, 2012, p.84-85) “Permitir à pessoa com mais de 60 anos (…) o acesso a tratamentos termais (…), assim como prevenir o isolamento social “ (Carvalho, 2012, p.85) “Promover a mobilidade através da redução das tarifas e eliminação das restrições dos horários de acesso aos transportes públicos urbanos e suburbanos de Lisboa e Porto. (Carvalho, 2012, p.85)
Tabela 9 – Respostas inovadoras (Despacho Conjunto nº 259/1997)
Para além das duas respostas centrais (SAD e CAD) o programa, que tinha a base do seu financiamento nas verbas do jogo Joker, incluía o desenvolvimento de respostas transversais: serviço TeleAlarme (STA), a formação de recursos humanos (FORHUM) e a saúde e o termalismo, melhor explicitados, na tabela 9, ampliando o magnitude, a qualidade e a interpenetração de oferta de cuidados e serviços à população mais vulnerável.
Em paralelo ao desenvolvimento do PAII emergiu também, fruto da tendência demográfica e da falta de elasticidade de respostas, a necessidade de criar uma rede de cuidados continuados integrados de saúde, partilhada pela responsabilidade de dois ministérios (Ministério da Solidariedade e do Trabalho e do Ministério da Saúde, Despacho Conjunto nº 204/1996, 3 de Setembro). Apesar da ambição de colocar em funcionamento esta resposta integrada, também muito revolucionária, esta só viria a ser regulamentada dois anos mais tarde (Despacho Conjunto nº 407/1998, de 18 de Junho). Estas respostas estavam vocacionadas para situações de dependência na área dos CLD, tanto ao nível da saúde como do apoio social. O resultado foi a criação de um programa com duas respostas: uma de Apoio Domiciliário Integrado (ADI) e outra de Unidades de Apoio Integrado (UAI). O ADI “ apoia pessoas dependentes e 120
pretende promover a sua autonomia, prestando a poio no domicílio, através de um conjunto de acções multidisciplinares e flexíveis, abrangentes e acessíveis” que incluem o apoio social, a satisfação das actividades básicas da vida diária e os cuidados de saúde” (Carvalho, 2012, p.87). As UAI asseguram “cuidados temporários, globais e integrados a pessoas dependentes que não podem, de acordo com a avaliação da equipa de cuidados da equipa de cuidados integrados (saúde/social) manter-se apoiadas no domicílio, mas que carecem de cuidados clínicos em internamento hospitalar. Estas Unidades providenciam alojamento, apoio social, satisfação de necessidades básicas e cuidados de saúde” (Carvalho, 2012, p.87). Pouco tempo mais tarde, em 2001 foram introduzidas melhorias significativas ao Programa, que saiu reforçado com um maior número de instituições prestadoras de cuidados de saúde, em particular, das que têm responsabilidade na prestação de apoio a pessoas com necessidades especiais, a idosos e a toxicodependentes (Decreto-lei nº 15/2001, de 27 de Janeiro, Portarias nº 380 e nº 381, de 11 de Abril e Despacho nº 20321/2002, de 17 de Setembro). A consolidação do programa originou a primeira lei da rede de cuidados continuados, a qual propunha uma constituição ampla, com o envolvimento de todos os sectores da sociedade (lucrativo, não lucrativo e terceiro sector) que estivessem apetrechados para promover, manter e restaurar a qualidade de vida e o bem-estar dos doentes. Na sua essência, o diploma (Decreto Lei nº281/2003, de 8 de Novembro) definia os cuidados continuados de saúde como sendo: “Prestados aos cidadãos com perda de funcionalidade ou em situação de dependência, independentemente da idade, que se encontrem afectados na estrutura anatómica ou nas funções psicológicas ou fisiológicas, com limitação acentuada na possibilidade de tratamento curativo de curta duração, susceptível de correcção, compensação ou manutenção e que necessitem de cuidados complementares e interdisciplinares de saúde, de longa duração” (Decreto-lei nº281/2003, art. 5).
No que respeita à estrutura (cf. Tabela 10) apresentava-se da seguinte forma: Tipologia de Unidades
Objectivo e Tipo de Cuidados
Unidades de Internamento
“Destina-se aos cidadãos que, na sequência de internamento hospitalar ou por situação de doença, não careçam de elevada tecnologia ou terapêutica hospitalar, se encontrem em situação de perda de funcionalidade ou de dependência e necessitem da prestação de cuidados de recuperação em regime de internamento. Os cuidados prestados são de natureza curativa, paliativa e de reabilitação global (DL nº281, citado por Carvalho,2012,p.86). “Presta cuidados a pessoas em situação de perdas funcionais ou de dependência, que necessitam dos cuidados referidos, que não exijam internamento ou cuidados domiciliários e que reúnam condições que permitam deslocarem-se, ou serem deslocadas, à unidade de dia. (…) Fornece os seguintes cuidados: treino cognitivo e de reabilitação global,
(regime de internamento)
Unidade de Recuperação Global (regime de dia)
121
Unidades Domiciliárias
Móveis
desenvolvimento de actividades terapêuticas e ocupacionais, apoio de natureza informativa e educativa para o auto-cuidado, ensino e formação dos familiares e outros conviventes directos do utilizador na prestação de cuidados informais” (DL nº281, citado por Carvalho, 2012,p.86). “Destina-se a pessoas em situação de perda de funcionalidade ou dependência, tem necessidade de prestação de cuidados no domicílio e reúnem condições para permanecer no domicílio, em lar ou residência colectiva (…) a unidade móvel domiciliária presta cuidados de reabilitação global, cuidados de natureza curativa e paliativa. Informação e educação para o auto-cuidado, ensino e formação dos directos conviventes do utilizador na prestação de cuidados formais” (DL nº281, citado por Carvalho, 2012,p.86).
Tabela 10 – Unidades da primeira lei de cuidados continuados integrados (Fonte: Decreto-lei nº281/2003, 8 Nov)
Como se pode constatar existem diferentes unidades para responder aos desígnios da procura de cuidados continuados integrados. O acesso a esta tipologia pressupunha duas vias de entrada: a hospitalar, onde os indivíduos se encontravam internados e a dos cuidados de saúde primários, que se referia à área de residência geográfica dos mesmos. Efectivamente, a inevitabilidade de responder ao fenómeno da dependência levaria à criação de novas respostas integradas tendo estas recebido o apoio e um lugar de destaque na Agenda europeia. Assim, estavam reunidas as condições para a criação de uma Rede de Cuidados Continuados Integrados - RNCCI (Decreto-lei nº 101, de 6 de Junho de 2006) que emergiu como consequência do percurso percorrido e que vigora até aos dias de hoje. Porém, cabe referir que a criação da RNCCI acabou por revogar o Decreto-lei nº 281, de 8 de Novembro e o Despacho Conjunto nº 407, de 18 de Junho de 1998, mantendo exclusivamente as respostas que se referem à área da saúde mental ou psiquiátrica. É também importante sublinhar que esta lei não se dirigiu unicamente à população idosa e dependente, apesar destas características terem maior prevalência nas referenciações sobre todas as outras. De ressalvar, já em pleno século XXI, o primeiro Plano Nacional para a Acção para a Inclusão - PNAI, 2002-2003 (Resolução do Conselho de Ministros nº 91/2001, de 6 de Agosto) que se dirigia à promoção de políticas inclusivas e ao combate à pobreza e exclusão social. Este Plano passaria a ser renovado, sucessivamente, privilegiando estratégias inovadoras de intervenção, apostando em áreas como a modernização do sistema de protecção social, no alargamento da rede de equipamentos sociais para idosos e dependentes, no trabalho em rede e no envolvimento da sociedade civil.
Em conclusão, salienta-se o Programa Rede Social, iniciado timidamente, no final dos anos 90 (Resolução do Conselho de Ministros nº 197/97, de 18 de Novembro) para garantir a melhoria contínua da qualidade da acção social. Este pressupunha que o sector público, as instituições solidárias e outras entidades que lidam com a área da acção social pudessem unir 122
esforços para prevenir, minorar ou extinguir situações de pobreza e exclusão e que estimulassem o desenvolvimento social local, princípio esse, que ainda se susbcreve na actualidade (Decreto-lei nº 115/2006, de 14 de Junho).
6.3. O CONTRIBUTO DA REDE INFORMAL NA TRANSIÇÃO DOS NÍVEIS DE CUIDADOS
Quando se aborda o tema da transição dos cuidados hospitalares para os CLD identificam-se, desde logo, os conceitos de rede de apoio formal e informal, independentemente, das características do grupo populacional a quem são prestados os cuidados (pessoas idosas, dependentes, com deficiência, doentes crónicos). As redes de apoio formal e informal (Paúl, 1997) distinguem-se claramente: as primeiras dizem respeito a organizações dos sectores (público, privado e terceiro sector) e assistem a população, assumindo uma multiplicidade de respostas sociais que resultam, tanto do apoio das transferências concedidas pelo Estado, como do acesso a respostas sociais da RSES e da RNCCI (Nogueira, 2009). As redes de apoio informal, por seu turno, não têm enquadramento institucional e são constituídas por pessoas com ligações afectivas e pessoais (amigos, família, vizinhança). Estas são consideradas figuras fundamentais na prestação dos cuidados, mesmo que o conceito não reúna o mesmo consenso. Para uns, pode traduzir-se na pessoa, familiar ou amigo, não remunerado, que assume o papel central na organização e/ou assistência de cuidados ao dependente (Braithwhite, 2000). Outros defendem que o cuidador informal é alguém que se ocupa da maior parte dos cuidados diários de quem está numa situação de dependência, sem por tal, auferir compensação remuneratória (Rodriguez et al., 2001; Nieto, 2002, citados por Louro, 2009). Apesar de terem noções muito semelhantes, os cuidadores podem assumir-se como principais ou como secundários. Os primeiros caracterizam-se pelo envolvimento total ou pela maior parte da organização dos cuidados estando-lhes associadas as tarefas rotineiras da vida diária. Os cuidadores secundários ocupam-se em regra, da manutenção de actividades instrumentais da vida diária. Com as devidas excepções, os cuidadores principais são normalmente membros da família de quem recebe os cuidados enquanto os secundários podem recair sobre elementos da rede de amizades ou de vizinhança (Ubeda et al., 2000).
Claro que não existe uma matriz que determine quem devem ser os cuidadores principais ou os secundários, pois não se conhecem, em rigor, todas as circunstâncias ou o tipo de cuidados de continuidade que serão indispensáveis para determinada pessoa. Por se tratar de um 123
acontecimento imprevisível que se vai revelando durante o período em que se planeia a alta hospitalar, ou até posteriormente, os cuidadores vão enquadrando a sua condição, num quadro teórico amplo de entendimento: pela obrigação (Walker, 1991; Martin 1995) sendo forçados pela conjuntura; pela afeição (Lesemann & Chaume, 1989); pela proximidade afectiva (Attias-Donfut, 1995; Kellerhals, 1994,) e até pela negociação familiar (Finch & Mason, 1993).
Se teoricamente a responsabilidade familiar prevê quadros de referência distintos, já a sua discussão entra em dois eixos nucleares: o da obrigação e o da afeição (Lavoie, 2000). Acrescente-se que paralelamente à responsabilidade da rede familiar também são determinantes os papéis da rede de amizade (Paúl, 1997) e de vizinhança (Subramanian et al., 2006). De facto, os cuidados informais não são exclusivos da rede familiar mas abrangem outras estruturas de apoio, que na ausência, na incapacidade ou na inexistência da família tendem a ocupar um espaço de relevo, relativamente a quem se encontra carecido de apoio. Assim, para agregar os CLD numa definição mais abrangente define-se o conceito de Rede Social como: o “grupo de pessoas com as quais o indivíduo mantém contacto de alguma forma ou de vínculo social, que podem ou não oferecer ajuda em diversas situações de vida” (Griep et al., 2005, citado por Louro, 2009, p.68) entendendo-se o pressuposto que quanto maior for a rede social, melhor apoio se poderá usufruir perante uma situação de dificuldade (Antonucci, 2001).
Porém, importa aferir sobre a proporcionalidade existente numa grande ou numa pequena rede social, já que a importância reside na forma como cada rede de pessoas interage com o indivíduo em situação de necessidade. Na prática, é dessa dinâmica que é definida a qualidade das interacções, dos contactos e a estrutura dos vínculos entre as pessoas que a integram. Neste contexto, o autor já referido, define um outro conceito distinto, o de suporte social, que “diz respeito aos recursos postos à disposição por outras pessoas em situação de necessidade e pode ser medido através da percepção individual do grau com que as relações interpessoais correspondem a determinadas funções, como o apoio emocional, material e afectivo” (Griep et al., 2005, citado por Louro, 2009, p.68). Na realidade, não é a grandeza ou a composição da rede social de cada indivíduo que assume a maior importância, mas sim o universo das relações sociais que oferecem determinado tipo de suporte social. Nestes parâmetros verificase um compromisso que legitima não só uma possibilidade, mas um apoio efectivo por parte 124
dos elementos constituintes da rede, que têm um grau de afinidade entre si, independentemente de serem familiares, amigos ou vizinhos.
Finalmente, tenta compreender-se porque se coloca a tónica dos CLD na rede informal. Um dos motivos parece estar directamente associado ao facto de Portugal ser um país de base familiar (Lamura, 2007) e preservar nesse domínio, a responsabilidade da protecção dos cuidados. Esta tese “familiarista” é favorecida pelo próprio poder público porque implica a substituição de funções e competências do Estado na protecção dos grupos mais desfavorecidos. Esta afirmação pode também ser demonstrada, por exemplo, na proveniência do apoio de doentes quando são referenciados para a RNCCI: verifica-se que cerca de 63% estiveram, previamente, na dependência de familiares (UMCCI, 2012, citado por Pego, 2013, p. 17). Na realidade, a rede informal vai garantindo a assistência a pessoas vulneráveis, idosas, com necessidade de cuidados e em situação de dependência, envolvendo um tipo de cuidado não remunerado em que os indivíduos permanecem nos seus domicílios ou na sua comunidade, evitando ou prolongando o processo de institucionalização (Pinto & Leite da Silva, 2010). No entanto, a pretensão de prestar apoio pode não se coadunar com a possibilidade de concretizá-lo, o que acontece quando se transferem funções que foram levadas a cabo pela rede de suporte formal, daí ser imprescindível atestar se há capacidade por parte da rede informal em providenciar o bem-estar necessário a quem tem certas necessidades, até porque as solidariedades familiares não substituem as solidariedades públicas, pois têm naturezas distintas (Attias-Donfut, 1995). Por outras palavras, traduzem um sentido de complementaridade e de sinergia e não uma lógica de exclusividade ou concorrencial.
6.3.1. A FAMÍLIA COMO GARANTE DOS CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO
Tradicionalmente a família tem sido responsável pelos cuidados dos idosos e dos seus elementos mais vulneráveis até ao momento, em que se optou por investir no desenvolvimento dos sistemas de saúde e de protecção social. Esta mudança levou à cooperação entre os diferentes sectores de provisão (Estado, mercado e terceiro sector) num modelo welfare mix, e desde então, “a gestão dos cuidados” tem sido também partilhada com a esfera pública (Jonhson, 1987; Evers & Wintersberger, 1990). Contudo, mesmo subtraídas certas responsabilidades à instituição familiar, esta nunca deixaria de estar na linha da frente 125
dos CLD como principal rede de suporte. Na verdade, quando as políticas de saúde e de apoio social não conseguem conquistar a evolução esperada ou quando a contracção económica não permitir expandir a RSES ou a RNCCI, a colateralidade dessas ineficiências é deixada à mercê das famílias, que na esfera privada, assumem da melhor forma possível, a responsabilidade pelos cuidados dos seus membros.
Portugal, à semelhança dos países da Europa do Sul de índole familiarista (Romão et al., 2008), enfrenta actualmente um período de transição demográfica que exige soluções inovadoras para a gestão dos cuidados, principalmente, para os cidadãos que se encontram numa situação mais complexa. Para além das dificuldades em mobilizar verbas para o Estado social, nem sempre existem soluções alternativas para os problemas, o que onera as famílias, quando há evidências de insuficiência de equipamentos sociais ou de indisponibilidade de vagas nas estruturas da comunidade.
A instituição familiar e a solidariedade entre os seus elementos têm evoluído, numa perspectiva de trajecto, dadas as alterações consecutivas que têm acompanhado a história. O conceito de solidariedade orgânica (Durkheim, 1975) definiu a família como um meio de complementaridade e de interdependência entre membros de uma sociedade. Ambas as concepções serviram para acompanhar o percurso da dinâmica familiar e corroboraram, a um tempo, as mudanças que se fizeram sentir na sua estrutura e no desenvolvimento das suas funções. A família já não representava mais a típica unidade produtiva das sociedades prémodernas, mas um núcleo de afectos com tendência para a redução do número dos elementos que a constituem. Algumas mudanças causaram também o afastamento das obrigações de reciprocidade intergeracional, principalmente dos descendentes para com os seus ascendentes (Parsons, 1971).
Depois da perspectiva de nuclearização familiar, muitos dos estudos referentes à instituição familiar voltaram-se para as relações entre os seus elementos (ex: relações conjugais), já que as solidariedades familiares e as relações de parentesco passaram para um plano secundário. A partir de então, começaram a surgir no campo da investigação temas que incidem sobre relações entre pais e filhos e sobre os fenómenos de mudança estrutural das famílias modernas que se foram desvirtuando dos modelos tradicionais. Aqui incluem-se, por exemplo, o aparecimento das famílias monoparentais e das uniões de facto que acabaram também por 126
fazer emergir, novos indicadores na estrutura das relações e por pesar na esfera dos cuidados familiares, nomeadamente, através do aumento das taxas de divórcio, e da diminuição do número de casamentos. Porém, também outros indicadores contribuíram para as transformações de relevo na solidariedade familiar como: incremento da taxa de actividade feminina, da taxa de emprego das mulheres casadas e as alterações da composição dos agregados familiares das pessoas idosas (Pickard et al., 2000).
As alterações que se fizeram sentir na estrutura familiar foram interpretadas pela evidência, à luz de um período de crise na família moderna, tendo alguns estudiosos, sugerido o conceito de “desfamilização” (Lenoir, 1979; Fernandes, 1997) que justifica um certo desaparecimento de práticas tradicionais assentes na responsabilidade da família. Estas por sua vez, tendem a potenciar o desenvolvimento dos serviços da rede de suporte formal. Por oposição à “desfamilização” ou à ideia de uma crise na família moderna surgem contributos que defendem uma corrente teórica oposta, ou seja, cuja visão sublinha a existência de uma solidariedade intergeracional e não uma noção de afastamento (Pitrou, 1992; Cantor, 1992; Kellerhals et al., 1994; Attias-Donfut, 1995; Fernandes, 1997; Bengston, 2001). Esta tem contornos diferentes dos conhecidos no passado, já que acarreta transformações relevantes ao nível das relações de solidariedade e de apoio intergeracional, desde o plano mais afectivo ou emocional ao plano instrumental (Pimentel & Albuquerque., 2010). Na verdade podem considerar-se três tipos de provisão de apoio familiar, a um nível doméstico (efectivo e material), afectivo (de base relacional) e financeiro (de base económica) (Déchaux, 1996; Fernandes, 2001). Estas relações intergeracionais apelam ao valor do sentido de troca que é tida pela relação entre pais, filhos, netos, no seio de cada família, de acordo com um padrão de ajuda implícito desse processo de transferência de saber, que varia de acordo com as características de cada família, designadamente, com o género, com a situação socioeconómica, com o status, nível de escolaridade, entre outras (Vasconcelos, 2002, Aboim & Wall, 2002, Torres, 2004).
Os cuidadores informais asseguram a estrutura dos sistemas de CLD em muitos países europeus (OCDE, 2011) sendo natural que caiba à família, como instituição de suporte de excelência, o desafio e a responsabilidade de desempenhar um conjunto alargado de funções para colmatar as necessidades dos seus elementos constituintes. Em Portugal também se acompanhou a mudança da estrutura familiar, muito focada na taxa de empregabilidade 127
feminina e na volatilidade das relações conjugais (Wall et al., 2001). Os últimos dados dos Censos também demonstraram uma redução da dimensão média das famílias, “apoiada” pela diminuição da taxa de natalidade (INE, 2011). Estas mutações na estrutura familiar começam a traçar um novo caminho, que ruma à proliferação de famílias unipessoais e à constituição de novas representações da conjugalidade. Estas passam a fazer parte de um reavivado conceito de família nuclear mas com os riscos de ter um impacto negativo na providência de cuidados a familiares idosos e /ou dependentes.
Os portugueses vêem nos familiares mais próximos, principalmente nas mulheres, o suporte da população idosa ou dos membros com dificuldades, como sucede com a assistência acrescida no momento da transição de cuidados (Fernandes, 1997; Gil, 1998; Comas-Herrera et al., 2003;Torres et al., 2004). Na dependência, a família é responsável por cerca de 80% dos cuidados a idosos e dependentes (Brito, 2002) sendo certo que, para se poder providenciar esse apoio, são necessárias condições específicas: um envolvimento emocional, um esforço físico, disponibilidade de tempo para executar um certo número de tarefas consignadas à prestação de cuidados, reunir condições económicas, o que naturalmente, acarreta custos elevados para o cuidador nas várias dimensões da sua vida, para a sua saúde e bem-estar, pelo que cada cuidador pondera e reflecte sobre as suas responsabilidades e sobre o impacto em assumir esse papel (Brito, 2002; Sousa et al., 2004; Lage, 2005; Martin, 2005).
A população idosa e dependente cresce a um ritmo rápido, e paradoxalmente, não é compatível com a dupla escassez de recursos que resulta, de uma baixa provisão de bem-estar por parte do sistema público e pela dificuldade de encontrar respostas na rede informal/familiar. Estas mudanças decorrem também das altas taxas de actividade laboral e da valorização profissional das carreiras profissionais, tanto no género masculino como no feminino e, mais atentamente, da impossibilidade das mulheres estreitarem, como outrora, a sua esfera de acção mesmo que temporariamente, ao espaço doméstico (Hespanha & Portugal, 2002; Pimentel & Albuquerque, 2010).
O que se destaca em Portugal, ao contrário de outros países do Sul da Europa, é que a participação feminina aumentou significativamente no mercado de trabalho e esta evolução não foi acompanhada ou suportada de forma equilibrada, com o envolvimento dos homens na
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esfera doméstica, já que às mulheres continua a caber a grande “fatia” do trabalho doméstico (Torres et al., 2004; Távora, 2012).
Conclui-se que a rede familiar deve obter o apoio indispensável para que possa levar a cabo a prestação de cuidados no meio envolvente de quem necessita, afigurando-se nesta visão, o recuo de uma eventual probabilidade de institucionalização. Contudo, essas medidas devem ter contornos mistos (Lowenstein et al., 2011) e estar ajustadas à realidade portuguesa e às características demográficas actuais, designadamente aos níveis de envelhecimento, de dependência e à propensão para a atomização dos agregados familiares. As alterações da estrutura da família e das suas funções enquanto instituição têm um impacto decisivo na erosão da solidariedade familiar, que se vai agravando pelas assimetrias na distribuição de responsabilidades na esfera privada, entre homens e mulheres e pelo insuficiente sistema de protecção social, assente na transição dos cuidados pós hospitalares (RNCCI) que ainda não está totalmente apetrechada para poder coadjuvar eficazmente as famílias e os seus membros mais vulneráveis. Assim, é cada vez mais imprescindível dotar as redes informais de medidas de incentivo que permitam a conciliação entre o trabalho e a família no caso da prestação de cuidados às pessoas idosas e dependentes (Gil, 2007). Estas podem traduzir-se no desenho de benefícios fiscais, na flexibilidade laboral dos cuidadores ou de licenças de assistência à família, já que não está prevista qualquer protecção a quem abandona o mercado de trabalho, por iniciativa de ser cuidador. O aumento da procura de cuidados fomentado pelo efeito da transição demográfica (aumento da longevidade, da dependência, da incapacidade cognitiva) apela, de facto, a um acompanhamento de continuidade e à supervisão sistemática das dificuldades, das necessidades e dos recursos emocionais e materiais que privilegiem o bemestar do doente e do seu (s) cuidador (es).
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CAPITULO 3 - O
TRAJECTO DA POLÍTICA DE SAÚDE NA ÁREA HOSPITALAR E NOS
CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
RESUMO DE CAPÍTULO
Este capítulo começa por enquadrar o percurso da política de saúde em Portugal, desde a criação do SNS até aos dias de hoje.
Depois, coloca a tónica nos cuidados hospitalares e na sua evolução, bem como no processo que fez emergir os Cuidados Continuados Integrados. Neste último caso, salienta os motivos que estiveram da base da implementação da RNCCI, bem como, de quem protagonizou institucionalmente, um papel crucial na sua constituição e desenvolvimento.
Cabe acrescentar que a abordagem à RNCCI, pela sua existência recente, motivou uma auscultação de interlocutores privilegiados na área da saúde, para além do enquadramento conceptual que aqui se refere. As conclusões dessa análise serão conhecidas no decorrer da investigação.
7. O TRAJECTO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE: DA CRIAÇÃO DO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE À ACTUALIDADE
ANTES DO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE
Durante décadas, ligada a um compromisso de caridade, prestou-se assistência sanitária a doentes com carência económica por instituições públicas e por benfeitores privados. Já em pleno século XIX, associações de socorros mútuos, por meio da divisão dos custos das prestações de saúde, figuravam um lugar de destaque na prestação de serviços médicos e na provisão de medicamentos. Em pleno século XX, impulsionado pelo Estado, institucionalizase o seguro social obrigatório, ainda bem presente em muitos países europeus, e que marca a viragem para a garantia de um direito na área da saúde.
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Ainda que por opção não se explanem, em detalhe os períodos da política de saúde que antecedem a criação do SNS, enunciam-se duas reformas que levaram ao reconhecimento do direito à saúde e à responsabilidade do Estado pela protecção desse direito constitucional. A primeira foi conhecida pela reforma de Ricardo Jorge, que se iniciou, a custo, em 1903 e considerou a publicação de vários diplomas que levaram à reorganização da Direcção Geral de Saúde e Beneficência Pública e à criação de organismos de coordenação, nomeadamente, a Inspecção Geral Sanitária, o Conselho Superior de Higiene Pública e o Instituto Central de Higiene. Neste contexto, foram ainda desenhados os cursos de Engenharia e Medicina Sanitária, bem como foram regulamentadas as entidades administrativas e eclesiásticas em matéria de saúde, delineando o que seriam os alicerces da saúde pública em Portugal (Ferreira, 1990).
A segunda reforma que se consubstancia no Decreto-lei nº 35 108, de 7 de Novembro de 1945, decorrente do Estatuto da Saúde e da Assistência, dá continuidade ao papel supletivo do estado na saúde, responsabilizando-o pelo financiamento das estruturas (Lei nº 2011, de 2 de Abril) e pelo funcionamento das mesmas. Ou seja, determina a organização dos serviços prestadores de cuidados de saúde: Hospitais das Misericórdias, Estatais, Serviços MédicoSociais, de Saúde Pública e Privados. Nesta reforma são criadas duas Direcções Gerais, a da Saúde e a da Assistência. A primeira com funções de regulação da técnica sanitária e de acção educativa e preventiva, a segunda com responsabilidades administrativas sobre hospitais e sanatórios.
Num período de quase 25 anos, de 1944 a 1971, numa lógica de não compromisso para com a responsabilidade pelos cuidados de saúde dos portugueses, o Estado consentiu a criação de um elevado número de subsistemas independentes, “originando duplicações e guerras de competência e rivalidade, que impediam ou dificultavam a formação de equipas multidisciplinares indispensáveis à resolução dos problemas de saúde” (Sampaio, 1981, citado por Rodrigues et al., 1999, p.81).
Foi a partir dos anos 70, e da conjugação com outras transformações societais que se implementaram as mais significativas reformas no sistema de saúde português. Em 1971, sublinha-se o reforço da intervenção do estado nas políticas de saúde, aos níveis da prevenção da doença e da promoção da saúde aspectos esses, de inovação e que estiveram alinhados com 131
as novas orientações políticas e sociais. A nova reforma concretizada pelo Decreto-lei 413/71 reconhecia o direito à saúde a todos os cidadãos, abandonando a “referência à caridade e ao primado das instituições particulares para resolverem os problemas de saúde dos portugueses” (Campos, 1983, citado por Reis, 2011, p.6). Já o Decreto-lei 414/71, organizava o Ministério da Saúde e da Assistência cessando a intervenção supletiva para assumir a responsabilidade pela política de saúde e pela sua execução. Paralelamente, reestruturaram-se os serviços centrais, regionais, distritais e locais e criaram-se as seguintes estruturas funcionais: Centros de saúde e Hospitais.
Estavam desenhados os primeiros contornos do que viria ser um Serviço Nacional de Saúde, contudo, a situação do sistema de saúde português ainda se caracterizava por indicadores sócio-económicos e de saúde muito desfavoráveis quando comparados e outros países da Europa Ocidental, com um conjunto disperso de serviços de saúde de natureza variada e com um diminuto financiamento, de cerca de 2,8% do PIB (OPSS, 2001; OPSS, 2002). Com a reforma de Gonçalves Pereira, abordam-se os três objectivos das políticas de saúde, pela primeira vez, que mais tarde se designarão pelas vertentes preventiva, de tratamento e de reabilitação/recuperação da saúde. As políticas preventivas estavam asseguradas pelos centros de saúde de primeira geração, muito ligados à prevenção enquanto os postos clínicos dos Serviços Médico-Sociais asseguravam os cuidados curativos. Em síntese, a avaliação dos principais indicadores (saúde materno-infantil e doenças transmissíveis evitáveis pela vacinação) alcançou para a época um sucesso notável (Branco & Ramos, 2001).
A CRIAÇÃO E A EXPANSÃO DO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE (SNS)
O SNS foi criado em 1979, e erigido numa base democrática, assente nos princípios da universalidade, generalidade e gratuitidade. Ficou consagrado por regulação jurídica, que o Estado passaria a assegurar o direito à saúde a todos os cidadãos (Decreto-Lei nº 56/79, de 15 de Setembro) de acordo coma a Constituição Portuguesa de 1976 (art.º 64), que afirmava esse direito e o dever de o defender e promover. Na realidade, apesar da salvaguarda jurídica, o desenho do SNS levaria cerca de uma década a capilarizar-se, fruto de constrangimentos e lutas internas entre Estado e o corporativismo médico (Mozzicafreddo, 2000).
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Esta época também ficou marcada pela resistência dos serviços Médico-Sociais da Previdência, à integração nos serviços de saúde e ao aparecimento da Medicina Geral e Familiar como especialidade médica, através da implementação de programas de cooperação europeus, vocacionados para o desenvolvimento dos cuidados de saúde primários em vários centros de saúde portugueses (Biscaia et al., 2005). Esta iniciativa esteve alinhada com o primeiro documento internacional saído da conferência de Alma-Ata (1978), que proclamava a necessidade de uma intervenção multidimensional, e a adopção de medidas de nível intermédio e comunitário para coordenação de serviços de saúde, com outras actividades que contribuíssem para promoção da saúde e dos cuidados de saúde primários.
Mais tarde, impulsionava-se a criação da carreira médica de clínica geral e o regulamento dos centros de saúde (Despacho Normativo nº97/83, de 22 de Abril), nesta fase reconhecidos como centros de saúde de segunda geração, na qual são integrados todos os locais de consulta existentes da antiga Direcção Geral de Saúde.
A DEFINIÇÃO DOS LIMITES: ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO (1982-1995)
Na primeira metade da década de 80, os gastos públicos totais em saúde diminuíram drasticamente, por parte do Estado, em contraciclo com a experiência europeia, em particular com os países da OCDE (Miguel & Costa, 1997). A falta de financiamento, via Orçamento Geral do Estado português, condicionou a expansão e a inovação dos modelos de organização e a transparência, entre interesses públicos e privados. A montante, provocou ineficiências ao nível de acesso e de prestação de serviços públicos de saúde (OPSS, 2001).
Apesar das lacunas evidenciadas, o SNS procurou investir nos cuidados de saúde primários, na reorganização da rede hospitalar, bem como no desenho das carreiras médicas e de enfermagem, entre outras medidas que teriam um impacto importante na evolução dos principais indicadores de saúde, designadamente na diminuição da mortalidade infantil e perinatal e no aumento da esperança média de vida (OCDE, 2001). Para tal, foram fundamentais a criação da Direcção Geral dos Cuidados de Saúde Primários, que uniformizou a prestação deste nível de cuidados através da integração das unidades existentes e da extinção da Direcção Geral da Saúde e dos Serviços Centrais dos Serviços Médico-Sociais, que operavam de forma paralela, assim como de alguns institutos. 133
Este período, também cunhado pela adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (CEE), em 1986, proporcionou uma maior abertura do país ao exterior, até então inexistente, e iniciou uma mudança clara no rumo da saúde, nomeadamente, no aumento do número de unidades hospitalares e na procura da população por serviços de urgência. Esta por sua vez, pouco tempo mais tarde, conduziu a nova legislação hospitalar para confirmar as novas tendências da política de saúde, no caso, pelo Decreto-lei nº 19/88, de 21 de Janeiro e pelo Decreto Regulamentar nº 3/88, de 22 Janeiro.
O processo evolutivo do SNS português ficou no entanto, marcado pelas limitações e potencialidades endógenas e exógenas a nível político, económico, social e cultural. A coexistência de vários subsistemas públicos de saúde, a oposição do corporativismo médico pela defesa do financiamento público da medicina privada e a adopção de um Serviço Nacional de Saúde, a par com outros países da Europa do Sul (Espanha, a Itália e a Grécia) são apenas alguns exemplos. Na realidade, a percentagem do Produto Interno Bruto despendida em cuidados de saúde, é fundamental para que se compreenda o esforço ou o investimento nas políticas de saúde. De facto, entre 1974 e 1990, Portugal aumentou significativamente os gastos totais em saúde, mas de forma inversa à maioria dos países da União Europeia, pois esse investimento foi levado a cabo pelo investimento privado, em detrimento do investimento público (OCDE, 1998). As dificuldades de financiamento do Sistema Nacional de Saúde foram reais, e por terem um impacto crucial na população teriam de sofrer alterações significativas norteadas por orientações internacionais, que visassem um entendimento multisectorial e sistémico dos problemas de saúde e do desenvolvimento de uma estratégia de “saúde para todos”, fomentada pelos preceitos da Organização Mundial de Saúde (OMS, 1997). Tais mudanças, levaram à revisão da Constituição e à criação da Lei de Bases da Saúde (1990).
A Lei de Bases (Lei nº 48/90, de 24 de Agosto) e o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde regularam de forma estrutural o sistema de saúde português, através de eixos centrais que se foram articulando entre si, e em que o fortalecimento dos mecanismos de mercado fez a diferença, por se ter considerado que uma das causas da ineficiência dos sistemas de saúde estaria no peso excessivo do Estado. O SNS prosseguia actividades de promoção, prevenção e tratamento, e abrangia as instituições e serviços prestadores de cuidados de saúde dependentes 134
do Ministério da Saúde. Mais tarde, o Decreto-Lei nº 11/93, de 15 de Janeiro, regionalizava a prestação dos cuidados de saúde, através das Administrações Regionais, coordenando o trabalho entre Centros de Saúde e Hospitais.
Fica também instituído o princípio da responsabilização, pela protecção da saúde entre cidadãos, sociedade civil e Estado. Esta medida fez aumentar os contratos do SNS com o sector privado, permitiu que o sector público consentisse a medicina privada, e aceitou pela primeira vez a concessão de uma unidade hospitalar para a gestão privada. Outras medidas inovadoras foram introduzidas, como as taxas moderadoras, no seguimento da revisão constitucional de uma saúde “gratuita” para “tendencialmente gratuita”. Todos os esforços seguiram o sentido de melhorar os indicadores de saúde, principalmente na diminuição da mortalidade infantil e perinatal e no aumento da esperança média de vida, que mantinham resultados desencorajadores, quando comparados com outros países europeus.
UM NOVO RECUO NA PRIVATIZAÇÃO DO SNS (1995-2002)
Este intervalo cronológico refere-se a um novo impulso do SNS, que propõe uma reforma que possa inovar o sistema de saúde, conferindo-lhe maior elasticidade e autonomia, pela via de novos modelos de organização e cuidados de saúde. É também coincidente com a primeira estratégia em saúde, entre o ano de 1998 e de 2002, e com as 27 áreas de acção estabelecidas em metas tangíveis a 5 e a 10 anos, extensíveis às cinco regiões administrativas que subdividem a prestação de serviços de saúde a nível nacional. Em harmonia com esta estratégia criaram-se os Centros de Saúde de Terceira Geração (Decreto Lei nº 157/99, de 10 de Maio), ligados em rede, contudo, concebidos como entidades jurídicas próprias e com independência administrativa, técnica e financeira. Este viria a ser considerado “o tempo de concepção de uma linha de desenvolvimento instrumental: as primeiras unidades de saúde familiar, as agências de contratualização e os primeiros contratos-programa” (Sakellarides, 2010, p.105). Em paralelo, é criado o Instituto de Qualidade em Saúde, com o objectivo de harmonizar procedimentos, processos e normas que visassem a melhoria contínua da qualidade dos serviços de saúde prestados.
DE VOLTA AO DISCURSO DA SUBSTITUIÇÃO DO SNS POR UM SISTEMA NACIONAL DE SAÚDE (2002-2005) 135
Esta fase corresponde a um determinado ciclo político, e fica conhecida pelos significativos contributos legislativos que alargaram o espectro da prestação de cuidados ao sector privado e ao terceiro sector. Esta “rede de cuidados de saúde”, apoiada na complementaridade sectorial e financiada pelo estado, conduziu a novas políticas assentes, por exemplo, no novo regime jurídico da gestão hospitalar que previu a subcontratação de entidades privadas para o sector público, a criação de unidades de natureza de sociedades anónimas, a gestão privada de hospitais públicos através de Parcerias Publico-Privadas, e a introdução do contrato individual de trabalho como regime aplicável aos trabalhadores do SNS. O funcionamento neste renovado sistema de saúde, funcionava através de uma articulação em rede entre os Cuidados de Saúde Primários, Hospitalares e Cuidados Continuados Integrados. Entretanto, a prestação de cuidados passava a regular-se, no ano de 2003, pela criação da Entidade Reguladora da Saúde que quis salvaguardar a universalidade no acesso dos cidadãos à saúde e promover a concorrência e a adopção de normas entre os vários prestadores de saúde, o que por si afastava o SNS como referência e modelo de cuidados.
A estratégia em saúde implementada também passou a designar-se de Plano Nacional de Saúde (PNS), e identificava uma linha orientadora “para que instituições do Ministério da Saúde (…) governamentais, privadas e de solidariedade social (…) possam assegurar ou contribuir para a obtenção de ganhos em saúde” (Sakellarides, 2010, p.132). Nesta medida, as metas e a orientação das novas políticas em saúde abriam caminho a uma maior sustentabilidade, não só pelo compromisso temporal a que se propunham, mas pelo interesse de organizar um debate público alargado, com representação partidária, e consequentemente com a sua inclusão no programa de governo de 2005.
O REENCONTRO COM A IDEOLOGIA DO SNS (2005-2009)
A política de saúde que assinalou o período entre 2005 e 2009, procurou novamente a referência ideológica do SNS através da conquista de ganhos em eficiência, a partir da reestruturação organizativa e da administração da prestação de cuidados de saúde. Uma das medidas, ao nível dos cuidados de saúde primários, promovida pelo XVII Governo Constitucional, traduziu-se no reconhecimento deste nível de cuidados como estratégia fundamental. Neste âmbito, criaram-se Unidades de Saúde Familiar (USF), com distintos 136
níveis de desempenho e de complexidade, com o intuito de centralizar os cuidados numa lógica de proximidade, principalmente a aproximação da medicina geral e familiar aos utentes. Nos cuidados hospitalares substituíram-se as entidades jurídicas das Sociedades Anónimas públicas (S.A) com capitais públicos por Entidades Públicas Empresariais (E.P.E), anulando por esta via uma viabilidade de privatização. Estas novas empresas públicas, integravam duas ou mais unidades hospitalares que, a breve trecho, foram redesenhando a oferta de serviços de saúde evitando a duplicação e o desperdício de recursos.
A jusante, e considerando o início de um novo nível de cuidados, foi também criada a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (Lei 101/2006, de 6 de Junho) – RNCCI, a qual viria a ser implementada, por um período de dez anos, como resposta ao crescimento dos níveis de dependência da população portuguesa, para novas necessidades de cuidados para as quais os hospitais já não estão vocacionados. Esta rede conjuga esforços do sector público da saúde com o sector social, dividindo-se por várias tipologias de reposta, de acordo com o grau de dependência e com a situação clínica e social de cada doente.
AS
POLÍTICAS DE SAÚDE NO CONTEXTO DO PLANO DE ASSISTÊNCIA FINANCEIRA
(2010-
ACTUALIDADE)
Em Portugal, como outros países europeus, o ritmo de crescimento da população tem sido baixo, tal como a taxa de natalidade e a capacidade de reprodução da população. Por seu turno, o índice de dependência e da esperança média de vida vão alcançando níveis preocupantes, e o envelhecimento populacional torna-se um fenómeno cada vez mais visível, especialmente o crescimento rápido dos efeitos da longevidade, ou seja, de indivíduos com mais de 80 anos de idade. Nas políticas de saúde, uma das principais questões, parece residir na duplicação do rácio de dependência de idosos (1960-2004) com mais de 65 anos e pela redução, pelo menos para metade do número de indivíduos activos profissionalmente (Fernandes, 2008).
Esta tendência demográfica trará por certo um aumento do número de doentes crónicos, que exigem cuidados continuados de saúde – o que implica estratégias adaptativas, para fazer face aos custos do envelhecimento, apostando em políticas de saúde sustentáveis, e numa oferta ajustada à “transição demográfica” que vise a garantia do bem-estar da população, não 137
somente numa perspectiva de cuidados de saúde, mas de prevenção e de promoção, numa articulação em rede/intersectorial com outras áreas ou dimensões das políticas sociais que têm impacto na saúde das populações (OMS, 2008).
Desde que a crise económica e financeira se instalou, através de uma política de austeridade, de controversos aumentos de impostos e de deduções salariais, que os problemas de ordem física e mental se foram manifestando na saúde dos mais frágeis (Falagas, 2009; Marmot, 2009, citados por OPSS, 2011, p. 49). Constitui um facto, todos os sectores, incluindo o sistema de saúde português, sofrerem dos efeitos da crise e do Memorando de Entendimento subscrito pelos partidos do “arco da governação” e das instituições internacionais (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional), como se não bastasse já a actual estrutura do sector da saúde, ser condicionada pelos fenómenos demográficos e pelo percurso histórico do SNS, que foi balançando nas últimas três décadas entre “agendas”, ora de renovação ideológica ou, de maior privatização do sector.
Nesta linha de constatações, instâncias como o Eurostat e o Banco de Portugal aconselharam Portugal para a criação de estratégias nacionais, dadas as lacunas estruturais na prestação de cuidados de saúde, por entidades e agentes de relevo. Deste modo, ficavam explícitos os problemas estruturantes, aos quais se deveria dar resposta: insustentabilidade financeira, carência de planeamento estratégico e elevado nível de ineficiência (Deloitte Portugal, 2011;). OPSS, 2011, p.74).
Verdadeiramente, as linhas de orientação para a governação na saúde e a própria agenda, ficaram subjugadas a uma estratégia global, que condicionou metas e escolhas propostas pelo governo em funções, designadamente, pelo que dependia do Orçamento para a saúde que sofria, paulatinamente, uma redução na despesa do estado com a função social “Saúde” correspondente a 8, 2%, (- 710 milhões de euros) da despesa total consolidada do ministério em 2012 (7.952 milhões de euros) face à estimativa de 2011 (Ministério Finanças, 2012, p. 196).
O Memorando de Entendimento fez-se sentir no sistema de saúde português pelo que foi necessário empreender reformas que pudessem oferecer sustentabilidade, e ao mesmo tempo uma maior cobertura da prestação de serviços à população portuguesa, tanto na área do 138
financiamento, como na do medicamento e da monitorização da prescrição, ou ainda no sector farmacêutico e no sistema de compras e de aprovisionamento de material médico (OPSS, 2011).
Em síntese, ao nível dos Cuidados de Saúde Primários, as opções seguiram a linha de reforço das Unidades de Saúde Familiares (USF) e a garantia da presença de médicos de família de forma mais ampla, pelo território nacional. No que se refere aos cuidados hospitalares, importou ressarcir os fornecedores das dívidas adquiridas, através de um plano concertado, com medidas que reduzissem custos operacionais, investir na área da qualidade, ao nível dos processos, das normas e dos sistemas de auditoria, bem como consolidar a reforma da rede hospitalar, reorganizando e racionalizando recursos humanos e serviços de ambulatório. Finalmente, em algumas áreas transversais importou investir na criação de um sistema electrónico para o registo médico, e tentar reduzir custos relacionados com o transporte de doentes (OPSS, 2011, p 80).
7.1. OS EFEITOS DA EVOLUÇÃO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE NOS CUIDADOS HOSPITALARES
A instituição hospitalar conservou sempre um lugar de relevo, independentemente das referências político-ideológicas dos sucessivos governos. Em todo o caso, a sua posição no sistema de saúde português foi variando, entre influências de orientação hospitalocentrica, onde assumia um papel central, e as influências de orientação sanitarista que lhe conferiam, do mesmo modo, um papel superior, dada a diferenciação do nível de cuidados prestado (Carapinheiro, 1998).
A década de 60, particularmente, o ano de 1968 assinala um dos mais marcantes investimentos no sistema de saúde português, pois aprovava, pelo Decreto-lei nº 48357, de 27 de Abril, um “Estatuto” próprio às unidades hospitalares. Nesse momento, ficou reconhecida a personalidade jurídica e identitária dos hospitais, e o desenho das linhas de orientação para o seu funcionamento. Por outras palavras, o estatuto hospitalar procurava “organizar os hospitais criando um regime de trabalho responsável, com uma administração eficiente, que pudesse racionalizar verbas disponíveis e estabelecer as carreiras profissionais que devem garantir a estabilidade dos trabalhadores hospitalares” (Ferreira, 1990, p. 342). Esta
139
conjuntura arquitectava, pela primeira vez, os alicerces da rede hospitalar nacional, mais tarde reforçada pelas opções políticas e democráticas de Abril e pela criação do SNS.
Após a entrada de Portugal na Comunidade Económica Europeia (CEE) em 1986, o Decreto Regulamentar nº 3/88, de 22 Fevereiro revelou a tendência para o aumento da despesa pública, durante as décadas de 70 e 80, causadas pelo rápido crescimento das estruturas hospitalares. Por esse motivo seria pertinente introduzir critérios de rendibilidade social e medidas inovadoras. A revisão constitucional de 1989, viria a alterar o princípio dos cuidados de saúde gratuitos para um acesso aos hospitais e centros de saúde, numa base “tendencialmente gratuita”, sujeita ao pagamento de uma taxa moderadora. A ideia de uma maior racionalização, já sustentada por Steudler (1974, citado por Graça, 2000), consistia na circunstância de um hospital moderno poder ser gerido como uma empresa, defendendo que nesse modelo, os hospitais estariam, possivelmente, apetrechados para lidar com a evolução deste nível de cuidados, dotando-os de maior racionalidade no controlo, no planeamento e na prestação de serviços à população (Carapinheiro, 1998). Por outro lado, também se introduziriam acções estratégicas e participadas que pudessem acompanhar a dinâmica do seu percurso, submetendo-as a processos de avaliação de qualidade (Graça, 2000). Durante a década de 80, um conjunto de opções contribuiu para transformar o modelo da Administração Pública europeia, estabelecendo o início de uma tendência para prestação de cuidados de saúde, focada nos cidadãos. Este modelo colocava a gestão do lado da eficácia e da eficiência, concentrando os esforços na qualidade e na melhoria contínua de resultados. Nesta linha reformadora os países da OCDE, incluindo Portugal, abriram caminho ao movimento da economia livre, designadamente, no que concerne a estratégias políticas para a saúde. A partir de então, foram recomendadas medidas estratégicas como: a privatização dos serviços, a diminuição do papel do Estado na economia, a adopção da gestão empresarial, a aposta na desburocratização e descentralização de serviços e a colocação da tónica nos resultados obtidos e nos serviços prestados ao cidadão (Hood, 1991).
Estas mudanças nas políticas, agora com maior pendor liberal, e na organização dos serviços de saúde, em particular nos hospitais, foram influenciadas teoricamente, por uma “New Public Management” que pretendia estimular um mercado interno e a competição entre unidades prestadoras de cuidados de saúde (Harding & Precker, 2000). Já na década de 80, houve lugar a uma nova intensificação de medidas, colocadas em prática para potenciarem a melhoria dos 140
resultados económicos, tanto na diminuição dos custos e no aumento dos níveis de eficiência, como na satisfação dos utentes. Em muitos casos, o desenho dessas estratégias passou pela separação entre entidades financiadoras e entidades prestadoras de cuidados de saúde, e pelo aumento do investimento privado, admitindo-se, que uma das maiores causas apontadas para a ineficiência do sistema de saúde poderia ser resultado de uma intervenção excessiva, e por tal mais dispendiosa, do Estado (OPSS, 2002).
Neste contexto de medidas, foram levadas a cabo acções que permitissem a sustentabilidade do sistema, o que conduziria a instituição hospitalar para um novo modelo, mantendo “um conjunto de valores e princípios fundamentais (…) a essência e os valores que um hospital público, melhor uso de recursos (…) sem perder de vista os princípios que orientam uma instituição pública” (Ministério da Saúde, 1999, p.72). Se os hospitais portugueses do SNS já tinham sido declarados “pessoas colectivas de direito público, com autonomia administrativa e financeira” (Decreto-lei 19/88, de 21 de Janeiro), começavam agora a lidar com as novas questões da modernidade e a não conseguir acompanhar o estatuto do passado. Porém, a revogação da Lei Hospitalar de 1988 foi proveitosa para assegurar o trajecto de referência ideológica, agora no quadro de um modelo empresarial. Este detinha a flexibilidade e resistência para lidar com as transformações da sociedade e das instituições aos mais diversos níveis. A mudança de um modelo, do tipo “tradicional”, de gestão hierarquizada, burocrático e vertical, com uma gestão de topo isolada e com débeis mecanismos de avaliação e de comunicação passou para um “novo modelo” de gestão, introduzindo um regime jurídico renovado, aplicável aos estabelecimentos hospitalares que integrassem a “rede de prestação de cuidados de saúde” (Lei nº 27/2002, de 8 de Novembro). Este modelo, que enquadrava a nova Lei de Gestão Hospitalar configurava diversas figuras jurídicas (artigo 2º, nº1) entre as quais: “estabelecimentos públicos dotados de personalidade jurídica, com ou sem autonomia patrimonial, estabelecimentos públicos dotados de personalidade jurídica, autonomia financeira e patrimonial e natureza empresarial, sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos e estabelecimentos privados, com ou sem fins lucrativos” (Reis, 2007; Graça, 2005, citados por Escoval & Campos Fernandes, 2010). Nesta linha de actuação, em Dezembro de 2002, aos hospitais do Sector Público Administrativo (SPA) foi aplicado o estatuto de Sociedade Anónima (SA), mais concretamente, a 34 hospitais públicos que passavam a beneficiar, em particular das boas práticas de controlo financeiro inerentes à sua nova natureza jurídica-identitária. 141
Pouco tempo mais tarde, em 2005, importou revigorar o processo de empresarialização dos hospitais procedendo à transformação de 31 hospitais S.A, em Entidades Públicas Empresariais (EPE), ainda que mantendo a lógica do financiamento público, da adequação de processos e procedimentos de gestão e da procura pela racionalização de decisões estratégicas. Algumas destas unidades hospitalares, paulatinamente, foram-se agregando em Centros hospitalares, estratégia que pretendia optimizar recursos, através da gestão integrada de conjuntos de unidades hospitalares.
OS HOSPITAIS DE HOJE
De acordo com dados recentes, quase 2/3 das unidades hospitalares integra o SNS e para muitas pessoas este continua a ser o nível de cuidados que melhor expressa a representação do sistema de saúde português (Barros, 2009). Os cuidados hospitalares, apesar de serem cruciais para a promoção da saúde e para a protecção da doença (OPSS, 2008) são por excelência o nível de cuidados que mais despende recursos financeiros, materiais e humanos, dada a sua ligação necessária ao estado da arte da ciência e da tecnologia. Todavia, por concentrarem em si, estruturalmente, maior investimento ficam susceptíveis às pressões externas provocadas pelas oscilações da procura ou da oferta de cuidados de saúde.
É por esse motivo que actualmente, os conceitos de Governação clínica (Chandra Som, 2004, citado em ARSLVT, 2009) e de Governação organizacional, assumem particular importância no papel das organizações hospitalares no sistema de saúde, pois vão ao encontro da melhoria do desempenho (Mckee & Healy, 2002) e porque ambos levam em consideração, as questões de controlo de despesa/responsabilidade e da transparência, estando o primeiro focado na prática clínica, e o segundo na relação de equilíbrio estabelecida entre os órgãos de governo da organização (OPSS, 2006). Esta abordagem inovadora, que emerge nas políticas de saúde e na gestão dos sistemas públicos, envolve os prestadores de cuidados e a utilização eficiente dos recursos e prevê a boa governação clínica e empresarial através dos seguintes processos: accountability, transparência, responsabilidade social, segurança e qualidade (Delgado, 2009).
Contudo, o reconhecimento dos conceitos acima citados, não mostrou, por si, ser suficiente para manter, controlar e atingir os objectivos de saúde propostos para uma boa governação 142
hospitalar, dada a multiplicidade de factores que podem interferir no desempenho das suas unidades orgânicas. Assim, a governação integrada, poderia introduzir um novo dinamismo e ser mais abrangente no que respeita à melhoria de qualidade de cuidados. A sua definição está relacionada com “Systems, processes and behaviours by which trusts lead, direct and control their functions in order to achieve organisational objectives, safety and quality of service and in which they relate to patients and carers, the wider community and partner organisations (Deighan & Bullivant, 2006, p.10).
Em síntese, pode concluir-se que a governação hospitalar sustentou nas influências da teoria do “New Public Management” o caminho de importantes reformas, na primeira década do novo século (Harfouche, 2012). Contudo, estas têm as suas limitações e têm vindo a encontrar um novo equilíbrio, mais centrado no cidadão, na assunção dos princípios da boa governança clínica e da governação empresarial ou corporate governance (Sakellarides, 2010). O rumo para o futuro está agora numa governação integrada, coesa e abrangente que inclui os hospitais mas é extensível a todo o sistema de saúde, e pode definir-se como um conjunto de instituições de saúde, redes, sistemas e processos, que orientam e defendem as suas funções, considerando os objectivos organizacionais, a segurança, a qualidade, bem como a articulação entre doentes, a comunidade e os parceiros organizacionais (Deighan et al., 2004).
7.2. A REDE NACIONAL DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS: A RESPOSTA NECESSÁRIA
Depois de uma análise, sobre a evolução das unidades hospitalares na rede de prestadores de cuidados, e considerando o peso que representa nas despesas totais de saúde (OCDE, 2012, Gouveia, 2012, p.18), retiraram-se as seguintes conclusões: A primeira relaciona-se com o facto de Portugal apresentar, a nível hospitalar no ano de 2010, cerca de 36,2% da despesa total em saúde, o que corresponde, sensivelmente, à média das despesas hospitalares dos Estados membros da OCDE, que se pautam por valores na ordem dos 35,4%; A segunda conclusão, emerge da necessidade e da urgência de investir em cuidados continuados em Portugal, justificando este subcapítulo, e que passa pela constatação da assimetria do padrão deste nível cuidados intermédios que corresponde apenas a 1,4% das despesas totais em saúde, por comparação com os valores médios de outros países europeus, cinco vezes superiores, e que cifram esse investimento em 7,5% das despesas totais em saúde (OCDE, 2012, Gouveia, 2012, p. 24). 143
Assim, se o envelhecimento populacional perdurar sem dar tréguas, ou seja, se Portugal for o quarto país da União Europeia, com maior percentagem de idosos e menor percentagem de população activa em 2050 (INE, 2001; Eurostat, 2000, citados em Abreu-Nogueira, 2009, p. 6), cedo se percepcionarão os desafios que se colocam à sustentabilidade da prestação de cuidados de saúde. De facto, os sistemas europeus de cuidados continuados (Long Term Care), têm sofrido profundas alterações durante a última década, designadamente, aos níveis do financiamento, do planeamento e do desenvolvimento da qualidade da prestação de serviços. Estas diferenças também se aplicam nos aspectos centrais da prestação de cuidados continuados, designadamente: ao nível de acesso aos serviços, e ao contributo desenvolvido pelas famílias e por cuidadores informais.
Portugal, ao registar um acelerado envelhecimento, provocado simultaneamente pelo aumento da esperança média de vida e pela diminuição da natalidade, foi compelido a tomar providências e a assumir uma estratégia que se coadunasse com as exigências demográficas do país, dado o aumento dos índices de dependência de idosos e de longevidade, assim como da prevalência de doenças crónicas. O fenómeno do envelhecimento enquanto problemática, via-se associado à restrição da funcionalidade e da mobilidade, confrontando os serviços de saúde com novas realidades e com escassos recursos, tanto ao nível das estruturas e do capital humano, como na forma como os recursos poderiam estar articulados para o benefício da população. Já não interessava responder exclusivamente às necessidades da saúde, seria agora imperativo promover a autonomia e a cidadania, numa perspectiva biopsicossocial, conjugando a organização do sistema de saúde e de apoio social e a organização social e familiar.
Apesar de ser possível, nos dias de hoje, conservar a vida por mais tempo, essas alterações também
foram
acompanhadas
por
novas
consequências
que
decorreram
desses
desenvolvimentos, e que estão inevitavelmente, associados a novos custos e a uma maior despesa pública (Comissão Europeia, 2009), principalmente, no que diz respeito ao impacto gerado sobre o regime das pensões, sobre os cuidados de saúde e, especialmente, sobre os cuidados continuados. Claro que, interessou diferenciar o conjunto de cuidados orientados para o envelhecimento e que se inscrevem num conceito mais lato e abrangente, de CLD e a definição adoptada à realidade portuguesa, e em concreto à política que se designa por Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) que não se dirige exclusivamente a 144
uma resposta à população mais idosa, mas a uma população em situação de dependência, ainda que a relação entre este binómio (entre envelhecimento e dependência) seja naturalmente cumulativa (Abreu-Nogueira, 2009, p.7-8).
O CASO PORTUGUÊS: A REDE NACIONAL DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
A RNCCI foi criada através do Decreto-lei 101/2006, de 6 de Julho, com o desígnio de oferecer uma resposta que satisfizesse as necessidades de saúde e de apoio social, de uma população envelhecida, com alterações no padrão das doenças e na estrutura sociofamiliar. Noutra perspectiva, mais urgente, introduziu um novo nível de cuidados, entre os cuidados hospitalares e os Cuidados de saúde primários, para reduzir o recurso ou a permanência de doentes nos hospitais, por escassez de alternativas compatíveis com a procura de cuidados pela população, cada vez mais distantes da oferta das estruturas do SNS. Finalmente, esta política de saúde viria assegurar uma estratégia inovadora para a protecção social e para a inclusão social, renovando a oferta de serviços relativamente à população mais dependente e com maior predisposição para as doenças crónicas incapacitantes, sinais evidentes de um novo perfil de morbilidade e de vulnerabilidade (Eurostat, 2008).
A RNCCI surge de uma motivação táctica do Programa do XVII Governo Constitucional que defendia, a esse tempo, a instauração de políticas integradas de saúde e de segurança social, e que permitia o desenvolvimento de cuidados de proximidade a pessoas em situação de dependência. Esta meta teve como objectivos: o investimento nos CLD, a qualificação da prestação de cuidados e o aproveitamento dos recursos locais/territoriais, que se definiam como princípios para uma resposta social adequada à diversidade, que caracterizava o envelhecimento da população portuguesa (DGS, 2004). Este modelo tinha a pretensão de promover a abertura organizacional para novas formas de cuidar (satisfazer as necessidades de pessoas dependentes que exigem respostas de natureza intersectorial e multidisciplinar) de natureza preventiva, de reabilitação e paliativa, envolvendo a responsabilização e a participação dos vários agentes sociais, num modelo Welfare Mix (Capucha et al., 2005). O seu carácter nacional e intersectorial, pressupõe a convergência de políticas, e demonstra resultados satisfatórios ainda que se reconheça a juventude do sistema, recentemente implementado em 2006, e ainda em processo de desenvolvimento.
145
Estabelecida num nível de cuidados intermédios, a RNCCI, surge no âmbito do Ministério da Saúde e do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, seguindo o princípio da gestão integrada dos cuidados de saúde e apoio social, e a tendência europeia que defende o princípio de intersectorialidade, como garante das necessidades em saúde das populações. Contudo, ressalva-se a impossibilidade de consenso internacional, resultado das diferenças dos sistemas de protecção social de cada país, o que cria, principalmente dificuldades em termos de comparabilidade, tanto nas definições do tipo de cuidados, como nos modelos de organização, de financiamento e da avaliação do impacto deste tipo de cuidados (Driest, 2006). No caso português, que se apresenta, os CCI são definidos como: “um conjunto de intervenções sequenciais de saúde e ou de apoio social, decorrente de avaliação conjunta, centrada na recuperação global entendida como processo terapêutico e de apoio social, activo e contínuo, que visa promover a autonomia, melhorando a funcionalidade da pessoa em situação de dependência, através da reabilitação, readaptação e reinserção familiar e social” (DL 101/2006, p. 3857)
Os CCI são parte integrante do SNS e do sistema de Segurança Social e veiculam a sua actuação para um paradigma de recuperação e de manutenção global da saúde enquanto processo activo e de continuidade que contempla: “1) a reabilitação, a readaptação e a reintegração social; e a 2) a provisão e manutenção de conforto e qualidade de vida, mesmo em situações irrecuperáveis” (Decreto-Lei nº 101/2006 de 6 Junho, art 5º, p. 3858).
No que toca ao modelo de gestão, cabe referir que a RNCCI se estratifica segundo níveis de coordenação distintos e é constituída por unidades e equipas de cuidados de saúde, de apoio social mas também está habilitada a providenciar acções e cuidados paliativos. Entre múltiplos objectivos específicos constitui-se como objectivo geral “a prestação de cuidados continuados integrados a pessoas que independentemente da idade, se encontrem em situação de dependência” (Decreto-lei 101/2006, art4º, p.3858). Este assenta no princípio da continuidade de cuidados, em harmonia com outras organizações de saúde e de apoio social que integram a rede social e privilegiam a equidade, a multidisciplinaridade, a humanização, a proximidade da prestação dos serviços de saúde, a participação e a co-responsabilização da família, entre outros desígnios (Decreto-lei 101/2006, artº6, p. 3858).
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No que concerne ao seu funcionamento, este sustenta-se pela via da descentralização, com uma Coordenação Nacional, de topo, que se vai estendendo pelas Equipas de Coordenação Regional (Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve), numa articulação próxima com Centros Distritais de Solidariedade e Segurança Social e com as Equipas de Coordenação Local, que por sua vez se abrem à rede social e comunitária e às autarquias. Ainda sobre a gestão da RNCCI, merecem destaque: a monitorização e o registo de actividade assistencial, de acordo com as tipologias de internamento e ambulatório.
As tipologias de internamento são: Unidades de Convalescença (tratamentos e supervisão clínica, continuada e intensiva, com duração de 30 dias), Unidades de Média Duração e Reabilitação (suporte clínico e de reabilitação e apoio psicossocial com perda transitória de autonomia e potencialmente recuperável, com duração entre 30 a 90 dias), Unidades de Longa Duração e Manutenção (doença crónica com diferentes níveis de dependência e que não reúnam condições para serem tratadas no domicílio, com duração superior a 90 dias ou temporariamente para prestação de suporte aos familiares cuidadores) e Unidades de Cuidados Paliativos (doentes complexos e em sofrimento decorrente de doença severa ou avançada, incurável ou progressiva, sem limite de internamento). As tipologias de ambulatório dividem-se em dois níveis, em equipas de gestão de alta e equipas intrahospitalares de cuidados paliativos, (em contexto hospitalar), e nas equipas de CCI e equipas comunitárias de suporte a cuidados paliativos que funcionam através dos CSP (Carvalho, 2012, p.88-89).
Esta resposta que actua entre o espaço dos CSP e dos cuidados hospitalares tem, tal como outros modelos análogos na Europa, desafios que se reflectem ao nível da prestação de cuidados de saúde e da sua evolução, designadamente, no acesso, na qualidade da prestação dos cuidados e na sua sustentabilidade. Contudo, as directivas e os parâmetros da RNCCI não encontram soluções standard, porque não estão harmonizadas com os mesmos conceitos nem têm o mesmo tipo de organização territorial de outros modelos europeus, nem os mesmos padrões de procura de cuidados, que são fruto da preferência e das expectativas dos cidadãos. Neste sentido, não é possível reconhecer uma definição universal para este tipo de cuidados, tidos por Long Term Care ou CLD (Chan & Kenny, 2002).
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Nesta perspectiva um novo conceito, apelidado de “Continuing Care”, tem vindo a ser aprofundado e a assumir uma visão global, de todos os aspectos que se prendem com serviços de sistemas de saúde e sociais, tendo como componentes centrais, os cuidados institucionais, os serviços comunitários e o apoio domiciliário e a variação e conjugação entre estas modalidades. Será através deste aprofundamento e das estratégias de cada país, com um sistema de CCI, que podem ser redesenhadas novas medidas para necessidades não colmatadas ou para as quais a oferta ainda é insuficiente. A forma como se chega a uma estratégia de cuidados continuados, também se reflecte na responsabilidade de quem a financia, seja pela contenção de despesa, no caso do sector público, ou pela questão do financiamento/lucro, da criação de postos de trabalho e da melhoria de acesso a respostas sociais, no caso do sector privado (Comissão Europeia, 2009).
A
EXPANSÃO E A MODERNIZAÇÃO DA REDE DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS EM
PORTUGAL
A RNCCI como política de saúde integrada, ousou quebrar o modelo mainstream dos cuidados hospitalares e dos cuidados de saúde primários, para ir ao encontro das necessidades dos cidadãos. A assunção desta política activa e inovadora, implicou a mudança de um paradigma mais focado na doença para um outro de cariz biopsicossocial em que se concebe uma ideia de integração de cuidados, entre saúde e apoio social. A continuidade de cuidados não sendo estática, actua numa realidade em constante mutação, daí a necessidade de complexificar a oferta da tipologia de cuidados disponíveis nesta rede: desde unidades de internamento e de ambulatório, até às equipas hospitalares e domiciliárias que cruzam a acção de dois ministérios distintos, e a participação do Terceiro sector e das famílias e doentes, num objectivo comum de obter ganhos em saúde e de garantir o máximo bem-estar, tendo em consideração os indicadores de transição demográfica já explicitados.
Devido à sua complexidade, à extensão e ao envolvimento de vários financiadores e prestadores de CCI, coube reconhecer um plano de implementação com uma duração de dez anos, que se iniciou com a promulgação do Decreto-lei 101/2006 e que acabaria no ano 2016, momento em estaria funcionar em pleno. No entanto, uma reprogramação do prazo de implementação total da RNCCI de 2016 para 2013 (Decreto-lei 25/2010, de 29 de Março) acabaria por comprometer a meta previamente definida. A conclusão da terceira fase, que 148
corresponderia à consolidação das unidades e à harmonização do modelo, deveria chegar às 15.308 camas nas várias unidades da Rede, segundo o rácio de camas por população com mais de 65 anos (UMCCI, 2007, citado por ERS, 2013, p.50), o que implicaria, à partida a necessidade da extensão do tempo para a consolidação desta meta, pois ainda subsiste uma derrapagem na ordem dos 150 a 160%, relativamente à cobertura total convencionada. Todavia, as unidades que requerem um redobrado reforço, atentas as metas e ao número de camas, são as unidades de cuidados paliativos. A outra grande lacuna reside na oferta não implementada das equipas domiciliárias comunitárias de suporte aos cuidados paliativos e das unidades de ambulatório de dia e promoção de autonomia, estas últimas inexistentes, por questões de ordem financeira/ recursos, de planeamento e de regulamentação (ERS, 2013, p. 50-52)
Como se pode constatar o percurso da RNCCI não tem sido fácil, pois apresenta divisões de responsabilidade distintas, diferentes organizações de cuidados de saúde e sociais pelo território nacional, e um grau de incerteza substancial sobre o volume e o tipo de procura futura de cuidados continuados (Costa-Font et al., 2008). Esta incerteza da modernização dos cuidados, também tem a influência das transformações económicas provocadas, no caso português, pelas restrições orçamentais do Memorando de Entendimento subscrito por Portugal e pelos parceiros internacionais: a par da instabilidade no financiamento de que depende este nível de cuidados, nomeadamente da captura de verbas dos jogos da Santa Casa da Misericórdia, que acabam por se reflectir na oferta de cuidados e, naturalmente, na dificuldade de acesso. A expansão da RNCCI fica assim, a meio do seu percurso, sujeita a alterações de contexto significativas e que, paulatinamente, tem vindo a exigir novas formas de financiamento e até mesmo de organização, principalmente nos distritos com baixo acesso aos cuidados continuados com internamento, a saber: Lisboa, Porto, Setúbal, Braga, Castelo Branco, Guarda, Aveiro, Leiria, nas regiões Norte, Centro e de Lisboa e Vale do Tejo (ERS, 2013, p. 91). Considerando o caminho já percorrido e a expansão da RNCCI, torna-se agora fundamental modernizar o modelo e a diversidade da oferta, para que tenha maior impacto na população e possa introduzir maior equilíbrio entre a procura de CCI. Neste sentido inovador, equacionar um novo rumo, requer revisitar algumas recomendações internacionais para fazer face aos problemas comuns dos sistemas de cuidados continuados, apesar das divergências de padrões e da dificuldade em perspectivar análises comparativas. Uma dessas recomendações assenta, sobretudo na amplitude de uma gama de serviços de qualidade para idosos, na 149
existência destes cuidados intermédios em áreas distintas: “internamento, ambulatório e domicílio e, dentro da sustentabilidade financeira e da acessibilidade à população” (CruzJentoft et al, 2008, citados por ACSS, 2013, p.22).
Outra recomendação passa pela abordagem holística e inclusiva dos sectores público, privado e do Terceiro sector, bem como na identificação e reconhecimento de ferramentas ou de boas práticas, baseadas na evidência, que conduzam ao progresso, à enformação de políticas e práticas, em questões como a avaliação e monitorização de cuidados, no suporte a cuidadores informais, na governação e nas questões financeiras (ACSS, 2013, p.23).
A POLÍTICA DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS: A EVIDÊNCIA NA BASE DA MELHORIA DA QUALIDADE E DA DEFINIÇÃO DA OFERTA DE CUIDADOS
Discutir o trajecto da RNCCI, enquanto política integrada (de saúde e de apoio social) ainda que esta não esteja plenamente implementada, mas em processo de consolidação, não foi uma tarefa fácil. Porém, quis perscrutar-se um caminho de actuação na tentativa de produzir alterações e de interferir no processo de implementação desta política pública, a partir do modelo sistémico do processo político (Jenkins, 1978).
A matriz desta análise pondera as necessidades de contexto aferidas, até ao momento, os recursos e os apoios disponíveis, bem como a intervenção de interlocutores privilegiados em saúde, do lado dos inputs. Estes, numa lógica de representação de interesse público, tendem a convergir para uma solução consensual, não discutindo a substância da política mas apreciando-a, à luz dos riscos e das vulnerabilidades que se têm colocado no processo de implementação da RNCCI. Alguns deles estão relacionados com a sustentabilidade, com o acesso, com a adequação às necessidades da população portuguesa, e na forma como influenciam os ouputs, aqui tidos por resultados ou ganhos para a saúde, nos planos da eficácia, da eficiência e da satisfação dos cidadãos.
Em conclusão, o que se pretendeu avaliar pela evidência empírica (Parte IV e V, capítulo I) tem por base uma análise do trajecto da política CCI no panorama nacional, designadamente: na forma como se tem expandido e modernizado, na percepção dos riscos e da sua vulnerabilidade, na forma como gere a oferta e a procura de cuidados, entre outras dimensões 150
de substância, já que cabe ao Estado a responsabilidade de zelar e de estruturar respostas, que permitam gerir riscos imprevisíveis, prevendo a sua actuação, em consonância com as alterações ou mudanças no tecido e realidade social. Daí que essa gestão não se limite exclusivamente à prevenção, mas à actuação localizada dos seus efeitos, principalmente numa nova era que apelidamos de “sociedade de risco” (Beck, 2000) em que as políticas de saúde reúnem em si novos fenómenos que decorrem dos processos de desenvolvimento económico.
151
PARTE III
DESENHO DA INVESTIGAÇÃO EMPÍRICA
CAPÍTULO
ÚNICO
-
O PERCURSO DA INVESTIGAÇÃO E A DEFINIÇÃO DA ESTRATÉGIA
METODOLÓGICA
RESUMO DE CAPÍTULO Este capítulo expõe o desenho da investigação empírica, descreve a sua natureza e esclarece os objectivos que se ancoram à pergunta de partida. Também identifica o percurso e as etapas percorridas, bem como os métodos e técnicas de recolha e de tratamento de informação. A investigação cruza abordagens metodológicas: Por um lado, estuda perfis de vulnerabilidade de doentes na transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração (CLD) através da análise de processos avaliados por assistentes sociais. Por outro, descreve, interpreta e categoriza representações da vulnerabilidade entre níveis de cuidados por intermédio de: - Informadores privilegiados (sobre a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) enquanto medida política); - Cuidadores informais de doentes em situação de extrema vulnerabilidade (enquanto prestadores de cuidados). Os mapas perceptuais da análise de processos dos doentes permitiram desvendar diagnósticos de extrema vulnerabilidade, mas também ajudaram a compreender a diferença entre os que não estão expostos a essa condição. Já as explicações da análise de conteúdo das entrevistas admitem um nexo de causalidade entre as lacunas/ vulnerabilidades da RNCCI e a sobrecarga física e psicológica relatada pela experiência dos cuidadores informais.
8. A INVESTIGAÇÃO E A QUESTÃO DE PARTIDA
A fundamentação que esteve na origem do estudo da vulnerabilidade dos doentes (avaliados pelo Serviço Social) na transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração (CLD), foi a mesma que determinou a sequência de capítulos que enquadram teoricamente esta investigação (Parte II). No entanto, este trabalho não reflecte só, uma 152
década de actividade do investigador e assistente social na área hospitalar como justifica a responsabilidade que é colocada diariamente a todos os assistentes sociais que são chamados a intervir em situações de grande complexidade, durante o período, que intervala a admissão e a alta hospitalar. Não deveriam estes doentes estar acompanhados por instituições ou por técnicos da comunidade onde residem, dada a sua exposição a múltiplos factores de risco? Muitas são as questões que condicionam a gestão e o planeamento das altas e que criam constrangimentos à intervenção social e à viabilização de meios e recursos para doentes que agregam simultaneamente diagnósticos clínicos e sociais.
Nesta investigação a vulnerabilidade é esclarecida teoricamente: a um nível individual (doença crónica, de dependência, comorbilidades), social (de contexto: em ambiente domiciliário e com cuidadores informais) e programático (de medidas políticas: RNCCI) (Ayres et al., 1999). A questão central do estudo empírico foca a vulnerabilidade dos doentes, avaliada pelo Serviço Social, na transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Por outro lado, invoca o conceito do risco, não apenas como um continuum, mas como uma evidência percepcionada em distintas dimensões da vida dos indivíduos. No âmbito do Serviço Social coloca-se em evidência a utilização do modelo que teoriza a prática (ecológico) e que assegura que os interesses do doente estão no centro da intervenção social e na dinâmica que capitaliza os conceitos de “sentido de coerência” e de “recursos gerais de resistência” (resiliência) da salutogénese. Este modelo de intervenção social parece ser o adequado para promover a saúde e para se adaptar a realidades sociais complexas, pois conjuga a perspectiva humanista e o modelo sistémico, tendo por objectivo a capitalização de recursos através das pessoas (empowerment), do contexto-ambiente onde são prestados os cuidados e das organizações/indivíduos que constituem o suporte formal/informal dos doentes. Contudo, a vulnerabilidade enquanto diagnóstico social deve ser mensurável para poderem ser diferenciados os casos prioritários dos não prioritários no planeamento de CLD, já que nem sempre são lineares os critérios, que legitimam o acesso às respostas integradas e/ou sociais existentes. Admitindo o conceito de vulnerabilidade como uma dimensão do risco que não faz distinção entre sistemas naturais (processos biológicos/biofísicos) ou sociais (Berkes & Folkes, 1998), foi útil a direcção teórica do estudo que se inspirou no modelo das Determinantes sociais da saúde para circunscrever a vulnerabilidade no quadro da transição dos cuidados hospitalares para os CLD (Dalhgren &Whitehead, 2006). Se no campo teórico o modelo supramencionado foi relevante, a utilização de uma metodologia mista revelou-se 153
essencial para compreender a amplitude da extrema vulnerabilidade, quer através dos resultados das avaliações dos assistentes sociais, quer pelas análises de contexto aferidas pelas percepções de cuidadores informais e de interlocutores privilegiados (Lutrell, 2001; Winkels, 2004, citados por Adger, 2006).
Conhecer a realidade social, tal como se propõe neste estudo, pode contribuir para influenciar a evolução da RNCCI enquanto política integrada de cuidados, mas é essencial para legitimar os protocolos de transição dos cuidados hospitalares para os CLD, através da evidência de um diagnóstico cujo detalhe pode proporcionar maior justiça social aos doentes na elegibilidade de acesso a meios, recursos e benefícios. Os riscos e os processos de exclusão que doentes e famílias em vulnerabilidade vivenciam devem ser conhecidos, analisados e categorizados para que todos os que preservam a manutenção da saúde como um valor fundamental, possam reflectir sobre o fenómeno quando este for desocultado.
A QUESTÃO DE PARTIDA E AS HIPÓTESES O estudo emerge de uma hipótese teórica que observa a vulnerabilidade na perspectiva da praxis do Serviço Social hospitalar, a partir das ligações que se estabelecem entre as instituições hospitalares e os Cuidados de Longa Duração (CLD). As hipóteses associadas à questão de partida alteram o gradiente da vulnerabilidade tornando-a mais complexa. De forma directa pretende conhecer-se a resposta para a interrogação: Qual a vulnerabilidade do doente que regressou ao domicílio, a cargo de cuidadores informais depois de um internamento hospitalar, com elevado grau de dependência, doença crónica e comorbilidades? As questões e a extensão desta investigação podem também ser explanadas através de interrogações secundárias, designadamente: 1 – Consegue definir-se um diagnóstico de extrema vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os CLD através do modelo (ecológico) de intervenção do Serviço Social? 2 - Podem identificar-se as principais Determinantes sociais da saúde na transição de cuidados? 3- A vulnerabilidade na transição dos cuidados pode ser mensurável e quantificável? 4. A vulnerabilidade da política de cuidados continuados repercute-se na família e nos cuidadores informais? 5- A rede familiar é uma determinante crucial numa situação de vulnerabilidade? 6 - Conjugar redes de suporte formal e informal protege os doentes e os cuidadores da vulnerabilidade? 7 – O rendimento disponível de doentes e famílias têm uma relação directa na condição de vulnerabilidade? 8 – O estilo de vida, a habitação e o acesso a serviços de proximidade influenciam o diagnóstico de extrema vulnerabilidade? 9 – A doença crónica, as comorbilidades e a dependência intensificam a condição de vulnerabilidade? 154
10 – O regresso de doentes ao domicílio pode colocar doentes e cuidadores numa situação de extrema vulnerabilidade?
Responder à questão de partida e a todas as outras interrogações que a envolvem justifica um aprofundamento necessário, pelo que o objectivo desta investigação passa por definir a “extrema vulnerabilidade” na transição dos cuidados hospitalares para os CLD através do modelo de intervenção ecológico do Serviço Social. Este implica aferir as principais determinantes sociais da saúde entre níveis de cuidados, conhecer o impacto da extrema vulnerabilidade
nos
cuidadores
informais
e
auscultar
informadores
privilegiados
relativamente às vulnerabilidades da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) enquanto medida política (ver figura 7).
A escolha do modelo ecológico de intervenção do Serviço Social hospitalar foi uma opção que assentou em três critérios: a) Está relacionada com a experiência do investigador e com a especialidade da investigação em Serviço Social;
b) Salienta a praxis de um modelo de intervenção social contemporâneo (num quadro humanista ecológico/ecossistémico) em três instituições distintas podendo ser aprofundadas as relações entre: factores de risco, determinantes sociais da saúde e perfis de vulnerabilidade. Também se reconhece homogeneidade no modelo teórico/prático que possibilita o diagnóstico, a intervenção e a avaliação da extrema vulnerabilidade, impedindo que a amostra se desvirtue com a utilização de premissas distintas de outros modelos de intervenção social.
c) As características e as causas que levam doentes a uma condição de extrema vulnerabilidade não são conhecidas enquanto realidade social sendo importante divulgálas enquanto fenómeno numa população que se assume de alto risco, para que possam redefinir-se estratégias que legitimem a acção do Serviço Social no âmbito da transição e da continuidade de cuidados.
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O MODELO DE ANÁLISE METODOLÓGICO
A extrema vulnerabilidade metodologicamente: - pelos resultados da práxis - pelas representações de contexto
Desfamilização/s olidariedade familiar -Esperiência de cuidar -Sobrecarga e impactos -Conjugação da rede formal/informal
:
Metodologia mista
Triangulação sequencial de metodos: qualitativo e quantitativo
1.Análise documental de 4965 Episodios Sociais
1Representações de peritos em saúde e decisores políticos (programática)
A extrema vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os CLD
-Modelo intervenção ecológico (teoria) -Abordagem polissémica (prática) -estratégias de intervenção transversais e globais
Resultados: -Extrema vulnerabilidade como a conjugação de múltiplas determinantes sociais de saúde - Distinção de vulnerabildade e extrema vulnerabilidade - Ambivalência dos cuidadores - Isolamento social, sobrecarga física e psicológica (impactos no cuidar)
aferida
2Modelo de Intervenção Ecológico (individual e social)
3Representações dos cuidadores informais (social)
-10 Entrevistas aprofundadas
é
2.Análise documental de 1508 Episodios Sociais -Dependência - Doença Crónica Comorbilidades -Domícilio - Cuidador Informal -cuida
Acções e práticas de mudança social -
- Do institucionalismo histórico à governação em saúde (realidade hospitalar) – Influência no modelo do Serviço Social e nos métodos de aferição do risco e da vulnerabilidade (Nova gestão pública)
- Definição de risco como continuum - Definição de vulnerabilidade enquanto conceito (individual, social e programática) – Ayres et al, 1999)
- Categorização da vulnerabilidade no Modelo das determinantes sociais da saúde (Dahlgren &Whitehead, 2006)
11 Entrevistas aprofundadas -Análise SWOT d da RNCCI: -Financiamento, Sustentabilidade, Eficácia, adequação da procura e oferta, articulação sectorial (segurança social).
Medidas promotoras da mudança social
Cuidados de Longa Duração (CLD)
Conclusões: - Definição extrema vulnerabilidade (legitimada pelo modelo ecológico Serviço Social) - Limitações da rede formal/informal na prestação de cuidados de proximidade - Cultura “hospitalocentrista” e não investimento na base da descontinuidade de cuidados (acesso, adequação, escassez de recursos)
- Institucionalismo de redes formais e informais - Capital social -Welfare Mix (Estado, família e Terceiro sector, privado) - Redes formais: - RNCCI, - Redes informais
Resultados: -Emergência articulação sectorial - Racionalização financiamento - Prevalència dos CLD nos cuidadores informais -Aposta na qualidade: acesso, adequação as necessidades e à procura . Valorização dos CSP : - Promoção da saúde - Salutogénese - Sentido de coerência - Resiliência e factores gerais de resistência
: Figura 7 - Modelo de Análise metodológico Legenda: ------ Conceitos, Teorias, Modelos ------ Metodologia
Legenda:
156
A NATUREZA DA INVESTIGAÇÃO E OS CONCEITOS METODOLÓGICOS A investigação, como demonstra o modelo de análise supramencionado tem por base uma orientação teórica que não exclui a construção do conhecimento através da observação empírica. No fundo, assenta num diálogo que opta pelos paradigmas de análise quantitativa e qualitativa (Glaser & Strauss, 1967; Léssard-Hébert et al, 1994) para o qual contribuem os relatos das entrevistas realizadas e a dedução da análise de episódios sociais levada a cabo no CHLO. Deste modo, foi possível conjugar simultaneamente actos epistemológicos de ruptura, construção e validação (norteados por um quadro de referência teórico), com o modelo de análise subjectiva que remete para a sucessão de procedimentos de recolha de informação por indução analítica. A investigação envolveu uma metodologia mista (Jonhson et al., 2007; Creswell, 2010) cuja abordagem pretendeu conhecer a vulnerabilidade dos doentes na transição dos cuidados hospitalares para os CLD através: da perspectiva de informadores privilegiados, da análise de episódios sociais avaliados pelo Serviço Social, e das representações de cuidadores informais. A investigação triangulou sequencialmente cada método de análise (Fielding & Schreier, 2001; Flick, 2005), permitindo a cada um, a oportunidade de complementar distintamente a identificação, a descrição e/ou a interpretação da realidade a aferir.
Tendo em consideração a sequência dos métodos e os objectivos da investigação foram tomadas as seguintes posições metodológicas para o desenvolvimento da teoria:
a) Desenvolvimento de conceitos, de dimensões de análise (saturação/pertinência) e de categorias com relevo para o contexto da pesquisa: teoria validada pela narrativa dos informadores privilegiados;
Esta primeira análise auscultou peritos e decisores em saúde sobre áreas críticas da RNCCI (enquanto medida política), tais como: o financiamento, a procura e oferta, o acesso, a adequação às necessidades, as conjecturas de expansão e de modernização e a eficácia. O estudo, em concreto, iniciou-se com um conjunto de entrevistas orientadas para a informação e para a resposta (Powney & Watts, 1987, citados por Albarello et al, 1997). Estas, por sua vez foram efectuadas a peritos responsáveis por contextos de acção, na área da gestão, do planeamento e da organização dos cuidados de saúde, bem como a decisores políticos, pelas suas posições estratégicas na definição, execução e avaliação de políticas de saúde. O 157
contributo dos informadores privilegiados que apreciaram a RNCCI acabou por influenciar a pesquisa, com base nas vulnerabilidades da análise de conteúdo das suas declarações, tendo a investigação principal (sequencialmente aprofundada pelo método quantitativo) sido dirigida aos doentes que regressaram ao seu meio envolvente (domicilio próprio/outro domicílio) com apoio informal.
b)Desenvolvimento de dimensões pelo processo em ciclo espiral de recolha de dados (Strauss & Corbin, 1994): recolha, agrupamento e interrelação de dados, com vista à construção de relações conceptuais que levam a novas categorias de análise: a teoria é validada pela relação entre agrupamentos organizados de dados e resulta de novas categorias interpretativas nesse processo de análise podendo ser redimensionada ou confirmada à luz de quadros conceptuais;
A segunda análise (perspectiva dos doentes/episódios sociais), ponderada como a mais importante para os objectivos da investigação, procurou desvendar a “extrema vulnerabilidade” na transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Esta permitiu verificar os resultados das avaliações do Serviço Social, a partir do modelo de intervenção em vigor (ecológico), num dos maiores centros hospitalares de Lisboa – o CHLO. O processo analítico passou pela descrição dos dados sociodemográficos dos doentes e fizeram-se associações com os factores de risco social identificados pelos assistentes sociais (estado físico-funcional, situação de dependência, económica, habitacional, familiar, da rede de suporte institucional/informal, entre outros). Depois, procurou-se o alargamento da amplitude da vulnerabilidade dos doentes, através do estabelecimento de critérios cumulativos que favoreceriam o aumento da complexidade na transição dos cuidados hospitalares para os CLD. A opção de critérios elegeu as variáveis seguintes: regresso ao domicílio próprio ou de familiar, manutenção de cuidados a cargo de cuidadores informais, estado de dependência moderado/elevado, e finalmente a presença de doença crónica e de comorbilidades. A conjugação destas variáveis e a sua associação com os diagnósticos de risco social, bem como o estabelecimento de relações entre variáveis mais complexas procuraram definir um perfil de “extrema vulnerabilidade”. Foi neste processo que se identificaram as Determinantes sociais da saúde por correspondência ao modelo que as teoriza (Dahlgren & Whitehead, 2006), a partir da sistematização dos diagnósticos sociais construídos no modelo de intervenção ecológico. 158
c) Desenvolvimento de conceitos, de dimensões de análise (saturação/pertinência) e de categorias com relevo para o contexto da pesquisa: teoria validada pelos relatos da experiência dos cuidadores informais;
A terceira análise surge na sequência da investigação quantitativa, explicitada supra, e como forma de aferir o impacto da extrema vulnerabilidade nos cuidadores. Houve intenção de compreender a vivência da prestação dos cuidados e de conhecer como foi conjugada (ou não) a rede de suporte formal/informal. Para esse efeito desenhou-se uma grelha analítica de entrevista que serviu os propósitos do estudo. Na prática, a estratégia passou por utilizar a técnica de entrevista orientada para a resposta (Powney & Watts, 1987, citados por Albarello, 1997). A informação recolhida traduziu as experiências e a gestão quotidiana dos entrevistados. Os dados recolhidos foram analisados e categorizados à luz de um quadro teórico conciliável com as declarações dos cuidadores, apurando dessa forma, as suas próprias fragilidades enquanto responsáveis pelas actividades básicas e instrumentais de doentes muito complexos.
8.1. PERTINÊNCIA E APLICABILIDADE DO ESTUDO
O paradigma salutogénico visa a promoção da saúde através do desenvolvimento de práticas e de comportamentos saudáveis, estando em harmonia com as premissas do modelo ecológico do Serviço Social. Esta afinidade conceptual tem permitido a assistentes sociais, doentes e familiares a gestão dos agentes de stress e de outras adversidades, que se diagnosticam no planeamento das altas hospitalares. Por outras palavras, a praxis tem garantido soluções que passam por: “fortalecer as capacidades adaptativas das pessoas e por influenciar os seus ambientes para que as transacções sejam mais adaptativas” (Payne, 2002, p.201). Contudo, o Serviço Social enquanto facilitador e mobilizador de medidas preventivas/ promotoras da saúde (Frankenhoff, 1998) tem colocado em evidência um grupo de doentes de elevada complexidade que exige ser estudado em profundidade, mercê da conjugação das suas determinantes individuais, sociais e de contexto. Estes doentes apresentam diagnósticos sociais que extrapolam o nível de acção do Serviço Social hospitalar e, por tal, criam dificuldades à mobilização de recursos e às soluções adaptativas, já que estas passam pela manutenção de CLD quando os doentes já não necessitam de cuidados hospitalares e devem regressar ao seu meio envolvente. 159
Assim, com o intuito de identificar e apreender o fenómeno supramencionado, coube utilizar uma metodologia mista. Esta seguiu um padrão sequencial de utilização de métodos para aferir a vulnerabilidade na transição de cuidados, estando norteada por uma questão de partida que pressupôs três análises distintas: 1) Análise de contexto da política de cuidados continuados integrados (RNCCI); 2) Análise de resultados da praxis do Serviço Social do CHLO (Quadriénio 2009-2012); 3) Análise do contexto dos cuidadores informais (de doentes em extrema vulnerabilidade).
Os contextos da vulnerabilidade foram analisados pela metodologia qualitativa e os resultados pela vertente quantitativa, pois o dinamismo dos processos biofísicos e sociais só pode ser quantificável, fidedignamente, quando os impactos e a sua complexidade se expressam simultaneamente (Alwang et al., 2001).
DELIMITAÇÃO DAS UNIDADES DE ANÁLISE: AMOSTRA E PROCEDIMENTOS A amostra traduz o número total de pessoas/processos estabelecidos no desenho da investigação. Desdobram-se então, nas três unidades de análise, as suas características essenciais.
Relativamente à primeira análise, de abordagem qualitativa, foram entrevistados 11 interlocutores de relevo. O objectivo da recolha de informação passou por identificar e por explicitar aprofundadamente as forças/vulnerabilidades e as oportunidades/ameaças da RNCCI, enquanto medida política de transição de cuidados hospitalares para CLD. A escolha dos entrevistados foi avaliada com o apoio da academia. A opção compreendeu requisitos como: a notoriedade, a experiência e o envolvimento na política de saúde portuguesa e no panorama internacional. O acesso à amostra foi desencadeado pelo contacto (via correio electrónico) e pela explicitação do estudo que tinha como principal objectivo aferir posições de interlocutores privilegiados relativamente à boa governança da RNCCI. A recolha de dados foi fundamentada por dois guiões de entrevista (um para peritos em saúde e outro para decisores políticos) cada um constituído por uma bateria de questões semi-directivas, inscritas em grelhas de análise, em que o entrevistador foi mantendo maior ou menor controlo no decurso do processo, ora estimulando a espontaneidade das respostas ou, optando por imprimir maior directividade e exercer algum controlo na largueza das respostas. A escolha 160
dos entrevistados pesou as variações necessárias, assegurando a diversidade da amostra. O anexo 11 distingue e justifica a colaboração dos interlocutores privilegiados, de acordo com as suas características pessoais e profissionais (diversidade / saturação dos respondentes). Daí a insistência nos contributos que pressupõem a heterogeneidade de opiniões, nomeadamente, a existência de diversificação externa (peritos em saúde com formação profissional diversa, activa e relevante no plano nacional e internacional) e diversificação interna (decisores em saúde dos principais partidos políticos portugueses), em que se explora a diversidade mais restrita de perspectivas (Pires, 1997, citado por Guerra, 2006). Entrevistaram-se então: 6 Interlocutores que, pela sua actividade técnica, científica e académica assumem um papel dominante na definição de linhas de orientação, de execução e de avaliação de políticas de saúde; 5 Interlocutores que, pelo seu posicionamento, têm um papel preponderante na construção, definição e no planeamento de políticas de saúde; O objectivo da recolha de informação, para além de aferir a vulnerabilidade programática da RNCCI através da perspectiva dos interlocutores privilegiados, permitiu tornar mais evidente a interrogação de partida da análise quantitativa da investigação. Os dados foram recolhidos entre os meses de Janeiro e Dezembro de 2011, de forma a serem devidamente analisados e interpretados até finais de Janeiro de 2012.
A amostra da segunda análise (abordagem quantitativa) identificou os doentes com episódio social avaliados pelo Serviço Social do CHLO, no quadriénio 2009-2012. O CHLO inclui os hospitais de Santa Cruz, de S. Francisco Xavier e de Egas Moniz. Nestas três unidades foram analisados 4965 episódios sociais que correspondem ao conjunto de doentes mais vulneráveis aferidos pelo circuito de recolha, arquivo e de tratamento de informação que é disponibilizado pelo Sistema de Apoio ao Serviço Social (SAAS). Por episódio social entende-se: “grau de complexidade compatível com o conhecimento aprofundado da situação individual, familiar, comunitária: Diagnósticos sociais definidos, informação/preparação/articulação da rede formal e informal, intervenção social com execução de propostas de aderência consentidas, constituídos como projectos de apoio pós-alta” (Manual de qualidade SSCHLO, 2013). Considerando os termos supracitados, ficaram excluídos da análise os processos sociais sem
1
ANEXO 1- Justificação da colaboração dos interlocutores privilegiados 161
complexidade, bem como os de baixa complexidade. A amostra compreendeu, numa primeira fase, todos os episódios sociais (4965 doentes). Estes correspondem a 11,2% da totalidade dos doentes avaliados pelo Serviço Social, no período a que se refere a investigação (N= 46 906). O estudo privilegiou a caracterização sociodemográfica deste conjunto de doentes esclarecendo os seguintes aspectos: sexo, idade, estado civil, habilitações literárias, situação perante o trabalho, fonte de rendimento. Depois passou para a descrição das variáveis que determinam os factores de risco social, entre as quais se distinguem: o estado de doença, a dependência, a existência de comorbilidades, a natureza do destino após alta e a natureza do risco, quer seja de origem isolada, individual, familiar, económica, associada ao trabalho, à educação, à protecção social, às condições de habitação, ao diagnóstico clínico, entre outras.
Numa segunda fase, e com o objectivo de determinar a extrema vulnerabilidade na transição do hospital para os CLD foram estabelecidos os seguintes critérios de inclusão na amostra: Dependência moderada /grande dependência Doença crónica Comorbilidades Regresso a domicílio próprio ou outro domicílio após a alta. Prestação de CLD pela rede de suporte informal A investigação prosseguiu com a identificação de 1509 episódios sociais. Em seguida, a utilização da análise multivariada no tratamento dos dados permitiu cruzar os critérios de inclusão e as variáveis que traduziram os riscos sociais e que estão relacionadas com as Determinantes sociais da saúde. Este conjunto de procedimentos possibilitou associar e relacionar informação relevante, fazendo com que os resultados dessas operações pudessem ser apresentados e interpretados diferentemente, através do recurso a um modelo teórico (modelo por camadas das determinantes sociais da saúde). A intenção passou por dimensionar a extrema vulnerabilidade de cada doente num quadro de referência (Dalhgren & Whitehead, 2006) que identificasse o seu meio envolvente, a sua situação socieoeconómica, de trabalho, de vida, as suas redes sociais e comunitárias, a influência do estilo de vida e os factores individuais (físicos e comportamentais). Esta análise tem como unidade amostral a área de influência do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental (concelhos de Oeiras, Cascais, Lisboa, Amadora e Sintra), que corresponde a uma população aproximada de 993 000 habitantes (INE, 2011). A opção justificou-se por dois aspectos: por reunir áreas territoriais distintas (diversidade) e pelo facto da organização do 162
Serviço Social, enquanto prática, estar assente no modelo ecológico. O acesso aos dados/informação, designadamente, ao Sistema de Apoio ao Serviço Social (SAAS), foi requerido ao Conselho de Administração, à Comissão de Ética para a Saúde, ao Departamento de Investigação Clínica e à Direcção do Departamento de Serviço Social do CHLO. Estes foram disponibilizados pelo gestor da base de dados SAAS, em suporte Excel, tendo sido necessário proceder à reorganização da informação, para que esta pudesse ser tratada, recorrendo a técnicas de análise e de tratamento estatístico. As informações recolhidas foram agrupadas e estabilizadas numa base de dados original, em articulação com a compatibilidade do Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 19.0, que acabou por transformar as variáveis para o plano compreensivo-interpretativo. A análise estatística descritiva e inferencial distinguiu-se como técnica na caracterização geral dos Episódios sociais/doentes e na identificação das determinantes sociais da saúde, já o SPSS foi útil, por permitir a ordenação e a reorganização da informação. Temporalmente, este estudo decorreu, entre os meses de Fevereiro e Junho de 2013, após processo de adequação de técnicas e do tratamento de informação.
No que concerne à terceira análise, de cariz qualitativo, a amostra contou com 10 cuidadores informais de doentes em extrema vulnerabilidade (6 mulheres e 4 homens), a quem foram recolhidas informações através da técnica de entrevista em profundidade. Nesta coube avaliar as representações dos cuidadores, relativamente às suas experiências na gestão da doença, à forma como foi conjugada a rede formal/informal e de como foi sentido o impacto da extrema vulnerabilidade. O anexo 22 distingue os diferentes cuidadores, de acordo com os pressupostos de diversidade /saturação (Pires, 1997, citado por Guerra, 2006). O acesso à amostra passou por duas fases: a primeira identificou os cuidadores através do cruzamento dos dados da análise de clusters. Depois estabeleceu-se, ordenadamente, um primeiro contacto com os primeiros 1343 cuidadores do cluster 4 (8,8% da amostra), por intermédio das assistentes sociais do CHLO que acompanharam estes casos em concreto, conferindo a disponibilidade/elegibilidade de cada um deles para a participação no estudo. Destes: 52 não foram elegíveis por falecimento dos doentes (> 1 ano); 28 recusaram colaborar alegando dificuldade psicológica, má experiência ou indisponibilidade; 17 não foram elegíveis porque os doentes estavam institucionalizados (> 1 ano); 13 não foram elegíveis por terem cuidadores formais permanentes no domicílio; 2 3
ANEXO 2 - Identificação dos cuidadores informais ANEXO 3 – Identificação dos cuidadores informais contactados 163
14 não estavam contactáveis através da informação existente nos processos dos doentes.
O acesso à amostra, apesar de difícil (pelos constrangimentos supramencionados) partiu para uma segunda fase onde o investigador, primeiro por contacto telefónico, e depois presencialmente, explicitou os objectivos do estudo e a sua finalidade. As entrevistas tiveram lugar, preferencialmente, no domicílio do doente/cuidador tendo sido norteadas por um guião de entrevista constituído por um conjunto de questões semi-directivas, inscritas numa grelha analítica, em que o investigador foi mantendo a direcção das respostas e o controlo das declarações no decurso do processo de recolha de informações. Os meses de Junho, Julho e Agosto de 2013 foram eleitos para a identificação e para a marcação de entrevistas, já os meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2013 foram os escolhidos para a análise e interpretação das informações cedidas pelos cuidadores.
Em síntese, salientam-se questões procedimentais e aspectos éticos relevantes para a investigação: 1. Todos os intervenientes (abordagem quantitativa/qualitativa) foram devidamente informados sobre os objectivos, a natureza e a finalidade da investigação quando aceitaram participar; 2. O estudo envolveu a anuência do Conselho de Administração, da Comissão de Ética e do Departamento de Investigação Científica do CHLO, bem como, a explicitação do caderno de recolha de dados, do anonimato e da garantia da confidencialidade das declarações.
8.1.1. TÉCNICAS E PROTOCOLO DE RECOLHA DE INFORMAÇÃO A entrevista determinou a abordagem qualitativa da investigação. Neste sentido importou explicitar a sua escolha e esclarecer as diferenças da sua utilização. Entende-se a técnica de entrevista como “um encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha informações a respeito de um determinado assunto, mediante uma conversação de natureza profissional” (Lakatos & Marconi, 1996, citado por Albarello et al., 1997, p.141). A entrevista foi útil para recolher dados sobre experiências, opiniões e ideias dos sujeitos observados. Nos casos em concreto, a técnica teve como finalidade a obtenção de informações sobre forças e vulnerabilidades da política de cuidados continuados integrados (RNCCI) e, 164
por outro prisma, de auscultar cuidadores informais de doentes em situação de extrema vulnerabilidade, também com o objectivo de compreender o contexto das experiências de cuidar, e o impacto directo na vida daqueles que cumpriram essa função.
DA ESPECIFICIDADE DAS ENTREVISTAS No plano de recolha de informação foi introduzida a técnica de entrevista orientada para a informação (Powney & Watts, 1987, citado por Albarello et al., 1997), a peritos em saúde na área da gestão, do planeamento e da organização de cuidados de saúde (Tabela 11). A finalidade da sua utilização foi de ampliar conhecimentos e manter em aberto linhas orientadoras para a investigação quantitativa – sense making. Para estas entrevistas elaborouse um guião de entrevista constituído por um conjunto de questões semi-directivas, inscritas numa grelha analítica4. Inscreve-se no mesmo plano de técnicas de recolha de informação, a entrevista orientada para a resposta, na qual o entrevistador mantém maior controlo no decurso de todo processo. Esta tem uma natureza mais estruturada e refere-se a um quadro conceptual pré-estabelecido, que visa também a recolha de informações, mas sem considerar a ordem de aparição das mesmas no desenvolvimento do processo (Tabela 11). Como a técnica foi utilizada, simultaneamente, para informadores privilegiados e para cuidadores de doentes vulneráveis, foram construídos, à mesma semelhança, mais dois guiões de entrevista, em grelhas analíticas. Nas entrevistas orientadas para a informação foram colocadas questões abrangentes e dada maior abertura à espontaneidade das declarações para a recolha de dados. Por outro lado, para o grupo de decisores políticos5 e de cuidadores informais6, sujeitos a entrevistas orientadas para a resposta, foram construídas questões mais directivas, de acordo com a fundamentação teórica subjacente. Importa esclarecer que para além da escolha pelos tipos de entrevista ja mencionados, a opção metodológica passou por incidir sobre a sua profundidade (Poirier & Valladon, 1999, citados por Guerra, 2006). Esta escolha assenta na sequência e no conjunto de operações que orientam a técnica. Numa primeira fase, todas as entrevistas foram gravadas integralmente em locais apropriados da conveniência dos entrevistados. Seguidamente foram transcritas com base numa primeira audição ou em audição recorrente. Finalmente, foram redigidas, em discurso coerente, mantendo a fidelidade das declarações. Numa segunda fase as entrevistas foram transcritas e impressas para poderem ser anotadas, deixando-se margens à esquerda e à direita, de cada entrevista. Procedeu-se à 4
ANEXO 4 – Grelhas de construção de entrevista a peritos em saúde ANEXO 5 – Grelhas de construção de entrevista a decisores políticos 6 ANEXO 6 – Grelhas de construção de entrevista a cuidadores informais 5
165
leitura de cada entrevista e sublinhou-se a cores: cor verde para factos e cor azul para frases ilustrativas. Ainda nesta fase registaram-se os seguintes apontamentos: na margem esquerda uma breve análise temática; e na margem direita, a correspondente análise problemática (assinalada a vermelho). Deste exercício surgiram outros temas e indicadores de análise que foram integrados na construção do documento, complementando e identificando, através do discurso, um quadro mais rico de problematização. A partir do material recolhido foram construídas sinopses para as entrevistas, em grelha vertical apresentando as problemáticas, a priori (do guião de entrevista) e a posteriori (introduzidas pela leitura/analise das entrevistas). Estas contêm as declarações essenciais, segundo as categorias problematizadas e são fiéis ao discurso directo dos entrevistados (no fundo e na forma). Neste contexto foi necessário proceder ao enquadramento das narrativas com os conteúdos, adequando-os de acordo, com as problemáticas correspondentes. Foi possível afinar e comparar declarações através de uma leitura horizontal permitindo maior rigor na operação que se seguiu: a análise descritiva. Seguidamente, categorizaram-se os elementos obtidos pelos discursos dos intervenientes, possibilitando a ancoragem para a explicação dos factos. TÉCNICA
Entrevistas orientadas para a informação
Entrevistas orientadas para a resposta
QUEM
Peritos em Saúde
Decisores Políticos
Nº.
INSTRUMENTOS E OBJECTIVOS
6
Entrevistas registadas em áudio, posteriormente transcritas, reduzidas e analisadas. Elaboração de guião e bateria de questões semi-diretivas (grelha analítica) – O protocolo da recolha de informação pretendeu auscultar/caracterizar as representações de peritos em saúde relativamente à política de cuidados continuados integrados relacionando-a com a transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Houve pretensão de identificar forças, vulnerabilidades, ameaças e oportunidades em várias questões de interesse para as necessidades dos doentes relativamente à RNCCI: acesso, adequação às necessidades, perspectivas de expansão, financiamento, sustentabilidade, performance da política., entre outras.
5
Entrevistas registadas em áudio, posteriormente transcritas, reduzidas e analisadas. Elaboração de guião e bateria de questões semi-diretivas (grelha analítica)– o protocolo de recolha de informação pretendeu auscultar/caracterizar as representações ideológicas dos decisores em saúde relativamente à política de cuidados continuados integrados. Houve também a pretensão de identificar forças, vulnerabilidades, ameaças e oportunidades assim como as perspectivas de posições mais liberais ou conservadores relativamente à RNCCI: acesso, adequação às necessidades - perspectivas de expansão, financiamento, sustentabilidade, performance da política,.
Entrevistas orientadas para a resposta
Cuidadores Informais
10
Entrevistas registadas em áudio, posteriormente transcritas, reduzidas e analisadas. Elaboração de um guião e bateria de questões semi-diretivas (grelha analítica) – O protocolo de recolha de informação previu a aferição de experiências, atitudes e comportamentos dos cuidadores (homens e mulheres) na extrema vulnerabilidade, sobre vivência dos cuidados, sobre a utilização de apoios formais/informais, e ainda relativamente aos impactos (pessoais, sociais, familiares,..) de cuidar na extrema vulnerabilidade.
Análise documental de processos (episódios sociais)
Doentes avaliados por Assistentes sociais
4965
Base de dados do Sistema de Apoio ao Assistente Social (SAAS): plataforma de registo, compilação e arquivo da actividade do Serviço Social do CHLO. Os Episódios sociais são processos sociais complexos registados por assistentes sociais.
Tabela 11 – Técnicas de recolha de informação
166
A ANÁLISE DOCUMENTAL A permissão para aceder ao Sistema de Apoio ao Assistente Social (SAAS) foi requerida formalmente ao Conselho de Administração, ao Departamento de Serviço Social, à Comissão de Ética e ao Departamento de Investigação Clínica. O acesso à base de dados do CHLO subentendia o cumprimento de requisitos éticos e institucionais, que foram entretanto demonstrados através de uma proposta de investigação (procedimento mandatório). Outra questão relevante comprometia-se com a possibilidade do administrador do SAAS (empresa) poder colaborar com a investigação, depois da anuência do CHLO, cedendo as informações, de acordo com os objectivos da mesma. O acesso à base de dados visava a recolha da intervenção social levada a cabo durante o período de 2009-2012, entre assistentes sociais e doentes/família/rede social. Essa informação encontrava-se devidamente classificada, organizada e arquivada em processos individuais (centrados nos doentes). Finalmente, depois de cumprido o protocolo de acesso, que também implicava o respeito pelo anonimato e pela confidencialidade, a autorização de recolha de dados acabou por ser cedida para a realização da investigação. A identificação dos doentes foi disponibilizada num suporte diferente (em disco externo) para evitar o seu manuseio indevido por terceiros, já a base de dados, com os conteúdos da informação foi codificada numericamente para poder ser identificada apenas pelo investigador.
As opções metodológicas consideraram ainda os seguintes aspectos na recolha de dados: a) A investigação está centrada na vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Neste sentido foram apenas utilizados para estudo os doentes que estão classificados como Episódios sociais, já que estes identificam exclusivamente, os casos mais complexos avaliados pelo Serviço Social; b) Sendo do interesse deste estudo o conhecimento da amplitude dos casos de maior vulnerabilidade, coube incluir os critérios que constam da questão de partida da investigação, e que podem, eventualmente determinar maior ou menor risco na transição entre os níveis de cuidados. São eles: a doença crónica, a dependência, as comorbilidades, o regresso ao domicílio e a prestação de cuidados a cargo de cuidadores informais.
Apesar de diluído na praxis do Serviço Social hospitalar, o tema em estudo é de interesse público, na medida em que pretende identificar uma população latente, que pelas suas 167
características deveria beneficiar de uma intervenção prioritária ou mais vinculativa na transição dos cuidados.
A inexistência e a dificuldade em investigar este tipo de vulnerabilidade acabaram por fomentar este estudo transversal sobre episódios sociais (doentes complexos) levado a cabo no CHLO. A recolha de dados/resultados ofereceu uma representação fidedigna do tipo, da extensão e da exposição de cada doente às determinantes da vulnerabilidade, bem como das associações relevantes, quer estas sejam de natureza individual, social ou de contexto. Esta representação de vulnerabilidade após alta hospitalar e a categorização das associações da exposição dos doentes às determinantes (biofísicas e sociais) são os alicerces que comandam esta investigação e que acabam por dar resposta às suas questões essenciais.
Contudo, mercê das limitações, no que concerne à análise de informação recolhida procurouse enquadrar nas descrições e nos resultados aferidos, os discursos e os contextos da vulnerabilidade, como já explicitado – por intermédio da auscultação das vulnerabilidades da política de CCI e das experiências dos cuidadores de doentes em extrema vulnerabilidade.
8.1.2. A ANÁLISE E O TRATAMENTO DE INFORMAÇÃO
A análise de conteúdo caracterizou-se como a técnica de abordagem qualitativa mais importante desta investigação, tendo sido utilizada para colocar a informação recolhida pelas entrevistas aprofundadas numa perspectiva diferente. Esta permitiu a categorização dos achados da pesquisa, a partir da interpretação das declarações de interlocutores privilegiados, na primeira fase do estudo, e numa segunda fase, a partir dos cuidadores de doentes na extrema vulnerabilidade (ver Tabela 12). Fase 1 – Categorização de vulnerabilidades através da ferramenta de gestão (análise SWOT); Fase 2 – Categorização de vulnerabilidade através de diagramas axiais interpretativos. A técnica (Vala, 1986) permitiu retirar conclusões tendo potencial para evidenciar aspectos que não se afiguraram numa primeira análise, mais descritiva. Servem para esta abordagem as opiniões que se referem à postura analítica e da reconstrução do sentido que permitem ao investigador a interpretação dos factos narrados, admitindo a produção de categorias e de 168
proposições úteis ao entendimento dos fenómenos (Demazière & Dubar, 1997, citados por Guerra, 2006). Neste sentido, importa também referir que a análise compreensiva da primeira análise (apreciação da RNCCI por interlocutores privilegiados), desvendou linhas importantes, dado o desconhecimento generalizado do fenómeno em estudo (Bertaux, 1997, citado por Guerra, 2006). Nesta lógica, algumas das interpretações (hipóteses explicativas) relacionadas com as vulnerabilidades da medida política foram, a posteriori, desenvolvidas com o prolongamento da pesquisa, através de métodos quantitativos.
Já no campo dos episódios sociais dos doentes do CHLO foi fundamental proceder à sua análise quantitativa e tratar estatisticamente a informação (Bruyne et al, 1975, citado por Léssard-Hebert et al., 1994), depois de a recolher, a partir da plataforma de dados oficial do Serviço Social. Este procedimento pretendeu identificar a vulnerabilidade dos doentes durante o processo de internamento, no quadriénio 2009-2012, salientando os que se encontravam numa situação mais vulnerável. Inicialmente analisaram-se 4965 episódios sociais nas três unidades hospitalares que compõem o CHLO. Numa segunda fase, estudaram-se 1509 doentes que se encontravam numa situação ainda mais crítica (admitindo critérios de inclusão de complexidade).
Os dados obtidos foram cedidos em bruto, directamente pelo administrador do SAAS (empresa) que os compendia, e que é responsável pela gestão e arquivo do workflow dos assistentes sociais. Procedeu-se à migração de dados para a ferramenta de cálculo Microsoft Excel 2010, por inexistência de outra viabilidade técnica, compatível para suportar a informação recolhida e aproveitar a riqueza do seu conteúdo. A partir desse momento a informação foi estabilizada, tratada e reorganizada de forma a poder ser explorada estatisticamente por uma ferramenta de análise e de tratamento de dados. O instrumento eleito para sistematizar a informação, agrupar e cruzar variáveis através de tratamento estatístico foi o Statistical Package for Social Sciences 19 (SPSS).
A análise estatística descritiva distinguiu a utilização de frequências, de medidas de tendência central e de medidas de dispersão (mínima, máxima e desvio padrão). A análise inferencial também foi utilizada, socorrendo-se de testes não paramétricos como o teste de KolmogorovSmirnov e o teste Shapiro-Wilk, quando as variáveis de estudo não apresentavam uma distribuição normal. Finalmente, e como forma de ir ao encontro das questões da 169
investigação, depois de conhecer os doentes e as variáveis em estudo, realizou-se exploratoriamente uma análise de dados de múltiplas variáveis, através do resumo de informação em índices ortogonais (análise de componentes principais) e de definição de grupos de sujeitos estruturalmente semelhantes (análise de clusters).
A sequência de procedimentos foi a seguinte:
As variáveis para a análise de componentes principais (Marôco, 2011) que transformaram um conjunto de variáveis correlacionadas num conjunto menor de variáveis independentes foram: Doença Crónica Comorbilidade Situação Dependência Destino Pós-Alta:
De seguida, realizou-se uma análise exploratória correspondente para a definição do número de dimensões encontradas tendo sido encontradas 11 dimensões pela diferença entre o total de categorias em presença e o número de variáveis. Depois de definidas as principais dimensões de análise (valores próprios: do quanto contribuem para a extrema vulnerabilidade) optou-se (Pestana & Gageiro, 2005) por uma solução de duas dimensões, por serem as que mais se destacam e por terem o maior número de variações, e em que: Primeira dimensão foi caracterizada pelas variáveis de doença crónica, comorbilidade e situação de dependência (dependência/doença);
Segunda dimensão dizia respeito ao destino após alta (institucionalização/domicilio).
Depois de identificadas as variáveis que mais discriminam por dimensão foram analisadas as relações que se estabeleceram entre as suas categorias (por proximidade ou afastamento). Pela proximidade das categorias associaram-se quatro grupos distintos: Grupo I - associado a acolhimentos para crianças (dimensões de doença crónica não são discriminantes);
Grupo II - associado a destinos após alta para o domicilio, centros de acolhimento para sem-abrigo ou outros (não associado às dimensões de doença crónica, comorbilidade ou dependência);
170
Grupo III -associado à situação de dependência e destinos após alta para lares/casa de repouso/residência de idosos ou outros hospitais;
Grupo IV - associado à comorbilidade, doença crónica, dependência, destinos pós-alta para a RNCCI e outro domicílio.
Com a definição de perfis, insistiu-se na exploração dos dados no sentido de classificar os indivíduos e operacionalizar os grupos identificados pela análise topológica de componentes principais. Com este objectivo em mente, efectuou-se uma análise de clusters para assim passar “da Topologia para a Tipologia” (Carvalho, 2004, p. 166).
A análise de clusters afigurou-se crucial para a identificação da extrema vulnerabilidade e das principais determinantes sociais da saúde (já que reconhece uma tipologia classificatória do conjunto de associações de variáveis que a constituem) na transição dos cuidados hospitalares para os CLD. Ao permitir agrupar sujeitos em grupos homogéneos (Marôco, 2011), aproveitando a definição das duas dimensões definidas pela análise de componentes principais, verificou também a existência de quatro perfis, também de acordo com a análise hierárquica de clusters para os quais se utilizaram três métodos de comparação (Centróide, Vizinho mais afastado e Ward). Nas comparações consideraram-se os coeficientes das vinte últimas combinações e o quadro da distância Euclideana.
Estes procedimentos permitiram uma categorização de quatro clusters como a mais adequada, pois um número maior não aduzia “saltos” significativos nos coeficientes de fusão. Depois desta confirmação procedeu-se ao método não hierárquico de K-Médias (SPSS) que permitiu aceder à distribuição percentual dos casos/sujeitos pelos quatro clusters, sendo que para a aproximação à configuração topológica do objecto de estudo foram utilizadas as dimensões da HOMALS para construir tipologias classificatórias (análise de clusters).
Mais se acrescenta que: Para a composição de clusters foi considerada a probabilidade de erro de tipo I ( ) de 0,05 em todas as análises inferenciais;
O teste do Qui-quadrado concluiu se houve relação entre variáveis estudadas e clusters (ajustados positivos); 171
A relação entre as Determinantes sociais da saúde e os clusters foram calculadas apenas nas dimensões que têm relação com os clusters e/ou que não mais do que 20% das células tenham frequência esperada inferior a 5.
TÉCNICA
COMO
Nº.
Entrevistas a peritos em saúde e a decisores políticos
Análise de conteúdo (qualitativa)
11 Entrevistas
Análise estatística Episódios sociais de doentes
Entrevistas a cuidadores informais
Análise Exploratória de dados, de múltiplas variáveis (resumos de informação índices ortogonais) Análise de componentes principais Análise de clusters
Análise de conteúdo (qualitativa)
OBJECTIVOS Categorização analítica que permitiu esclarecer as vulnerabilidades da política de CCI numa perspectiva diferente da recolhida na fonte – Análise SWOT: forças, vulnerabilidades, ameaças e oportunidades
4965 Doentes
- Análise de dados, de múltiplas variáveis, através do resumo de informação em índices ortogonais (Análise de componentes principais) e definição de grupos de sujeitos estruturalmente semelhantes (análise de clusters)
1509 Doentes
- Análise de dados do cluster da extrema vulnerabilidade, de acordo com critérios de inclusão: (dependência, doença crónica, comorbilidades, destino para domicilio com cuidador informal) e a sua relação com as Determinantes sociais da saúde.
10
- Categorização analítica que permitu esclarecer a a experiência de cuidados, a articulação entre rede formal /informal e o impacto da extrema vulnerabilidade nas várias dimensões dos cuidadores informais – Diagramas Axiais compreensivos da aferição da realidade estudada.
Tabela 12 – Técnicas de tratamento de informação
172
PARTE IV APRESENTAÇÃO E DESCRIÇÃO DOS DADOS EMPÍRICOS QUALITATIVOS E QUANTITATIVOS
CAPÍTULO 1 –
PERSPECTIVAS DE DECISORES E DE PERITOS EM SAÚDE: FORÇAS E
VULNERABILIDADES DA POLÍTICA DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
RESUMO DE CAPÍTULO
Este capítulo descreve a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) na perspectiva de decisores políticos e de peritos em saúde, colocando a tónica nas vulnerabilidades desta medida política/programática (Ayres et al, 2003). A RNCCI é aqui desdobrada por reconhecidos interlocutores que ao longo das suas narrativas vão salientando virtudes e debilidades, tendências expansionistas e de modernização, não esquecendo, as dimensões do risco e da incerteza, relativamente às questões da adequação às necessidades dos doentes e à gestão da procura e da oferta deste nível de cuidados.
9. UMA
APRECIAÇÃO PRELIMINAR DA REDE NACIONAL DE CUIDADOS CONTINUADOS
INTEGRADOS
UMA OPINIÃO POSITIVA QUE NÃO EXCLUI DIMENSÕES CRÍTICAS Na legislatura do antigo ministro da saúde, Correia de Campos (2005-2007), organizaram-se os conceitos e o modelo de CCI. Optou-se por um sistema semelhante ao modelo da Catalunha, que foi fruto de um trabalho levado a cabo em parceria, de planeamento e de transferência de know-how. Com essa experiência foi projectado o modelo para a população portuguesa com medidas e iniciativas para os vários níveis de cuidados, como expressa, o parágrafo que se segue. Simultaneamente, procedeu-se a uma avaliação de todo o sistema de saúde, tendo sido privilegiado, por um lado o investimento nos CSP, e por outro a criação e o alargamento da RNCCI. “Com o governo do Prof. Correia de Campos reorganizaram-se os conceitos à volta dos CCI (…), adoptou-se, decalcou-se até o sistema da Catalunha, (…) “Foi uma continuidade com uma reestruturação dos conceitos que esteve sempre muito interessante” (EG). “(…) Tivemos uma verdadeira preocupação de racionalizar todo o sistema, (…) standards, normas, de rigor, (…) Critérios, absolutamente escritos no papel, grelhas de avaliação”(EF). 173
Auditorias internas da rede, que são as equipas de coordenação local, existem 90 e tal, e por auditorias externas que a Rede contrata todos os anos, auditorias clínicas e organizacionais” (…)“Há muitas coisas a afinar, nomeadamente a própria formação de todos os profissionais da rede”. (EB)
Houve um investimento na qualidade, nos profissionais e na avaliação de desempenho com normas, critérios formalizados, grelhas de avaliação, monitorização e controlo de várias dimensões (auditorias internas e externas; clínicas e organizacionais, requisitos, registo, avaliação). Segundo alguns interlocutores porém, houve respostas que ficaram aquém dos resultados esperados e que, estão relacionadas directamente com o insucesso da reforma dos Cuidados de Saúde Primários (CSP). “A RNCCI ficaria de facto, reforçada se a rede de cuidados na comunidade, baseada nos CSP funcionasse, mas como sabemos não funciona, ficámos à espera que funcionasse com um novo modelo de reforma, o que de alguma forma atrasou o desenvolvimento dos cuidados, nomeadamente, domiciliários e de outros cuidados da parte da RNCCI” (EG).
Não obstante, elencam-se algumas vantagens da criação da RNCCI como um projecto de raiz, pioneiro, dinâmico e de custos amparados. No entanto, a sua expansão mantém-se vulnerável e deverá ser concertada com a acção social, conforme explanam as declarações mencionadas. Na mesma lógica, afirma-se que o impacto da criação da rede foi positivo porque não só aliviou alguns hospitais de doentes crónicos, como colocou doentes num nível de cuidados mais adequado. “Em termos financeiros não foi muito difícil por duas razões, primeiro começámos por muito pouco, não é, começamos de quase 0, (…)”A questão é que não é sustentável que expanda mais, sem esse exercício de concertação com a acção social e de definição de prioridades,”. (EA) “O impacto foi positivo no sentido de aliviar hospitais de agudos de pessoas com doenças crónicas, (…). Eu por mim acho que o objectivo é um bem societário, ou seja não é só uma questão de aliviar hospitais de agudos, é porque as pessoas são submetidas a um nível de cuidados que efectivamente precisam e merecem”. (EE)
No quadro das mais-valias da existência de uma Rede é útil referir a questão financeira. Esta acautela um mecanismo de preços bem estruturado, um sistema de informação que permite o acompanhamento de informação e que, impossibilita a exploração do Estado pelo Terceiro sector. Por outro lado, também pensa na melhoria da monitorização dos cuidados de saúde quando for introduzido o registo electrónico do doente, como salienta um dos entrevistados.
174
“O grande enzima ou o grande indutor de isso funcionar bem é existir uma avaliação e uma pressão extrema, alguém tem de ver o que está a acontecer. Instrumentalmente, o registo electrónico de saúde electrónico era muito importante” (ED). “Criámos um mecanismo de preços que é absolutamente à prova de betão, de betão, completamente blindado” (EF).
OS FACTORES DE BLOQUEIO: DA INFLEXIBILIDADE DO MODELO À ASSIMETRIA DA OFERTA No que concerne a constrangimentos, muitos interlocutores declaram o seu carácter restritivo, centralista, burocrático e pouco flexível, bem como a escassez de unidades e de equipas de cuidados domiciliários e paliativos. Citam os exemplos testemunhados: “A rede tem um carácter restritivo, muito burocrático, provavelmente tem que ser”. (ED) “Aquilo não está a funcionar muito bem por variadíssimas razões, desde logo por escassez de recursos, muitos deles podiam ser de Apoio Domiciliário não existem, não existem equipas”. (EK) “Nalguns sítios há pouca cobertura de RH ou há uma maior dificuldade em abranger, ou são zonas muito densas, muito pobres (…)”. (EI) “Eu acho que os números, não os conhecem em rigor, mas eu acho que continua a haver muita falta de recursos de unidades de cuidados continuados e paliativos”. (EE)
Acrescenta-se a insuficiência de respostas a um nível mais objectivo, de unidades e do número de camas, nas regiões metropolitanas com maior densidade populacional, principalmente em unidades de Longa Duração e Manutenção. Como se verifica através das declarações: “Acho que ela (RNCCI) não tem crescido á medida das necessidades mas de uma forma heterogénea e assimétrica”. (EH) “Pelo que eu julgo saber nós estamos mal aqui na área metropolitana de Lisboa e Setúbal, porque lá para o Norte como havia muita misericórdia, para o Norte há muita coisa”. (ED) “O maior constrangimento é de facto da rede ser muito insuficiente, pelo menos nas zonas urbanas, de facto a rede está muito aquém”. (EJ)
Segundo os interlocutores as Unidades de Longa Duração e de Manutenção são as menos atractivas em matéria de ressarcimento financeiro, o que coloca em causa o bem comum, e origina assimetrias na procura e na oferta. Um dos entrevistados, sobre esta questão, acusa as esferas políticas de contaminar as opções de verdadeira gestão, designadamente por influências de cariz económico, em detrimento da necessidade das populações, como justificam as declarações dos entrevistados.
175
“Avalio menos bem a incapacidade da rede se deixar deturpar pelas preferências económicas dos prestadores senhoriais”.(EG) “O elo mais fraco das respostas em internamento é precisamente o LTC, porquê, porque para as IPSS, é o menos interessante do ponto de vistas financeiro, portanto há aqui qualquer coisa que tem de ser repensada”. (EG)
Como súmula desta apreciação, fica explícito que é necessário corrigir os resultados menos positivos e estimular rapidamente a área dos cuidados domiciliários integrados, pois estiveram planeados desde o início, e tem cabido aos CSP a execução de cerca de 80% de CCI. Estes, em regime indiferenciado de CLD, por falta de recursos humanos, no geral, e de profissionais de saúde adequados à promoção da diferenciação de cuidados, em particular - que pecam por juntar os vários tipos de cuidados, correndo o risco de os indiferenciar: “Os Cuidados Domiciliários que estão planeados desde o início não aconteceram, as Unidades de Reabilitação com uma acção activa e eficaz são praticamente inexistentes”. (EG) “Eu receio que a RNCCI se torne uma enormíssima salada russa, digamos assim, e que isso não permita uma coisa que é essencial neste tipo de cuidados que é a diferenciação dos cuidados”. (EH) “A maior parte não chega a entrar na tal rede, sei lá, 80% não chega a entrar na rede, são mantidas em casa enfim, com o médico, o enfermeiro, com a família. Aliás com os cuidadores informais, enfim. São mantidas em casa”. (EI)
De particular relevo, como crítica final, e sendo uma resposta de saúde e apoio social é também colocada em causa, por alguns interlocutores, a inacessibilidade à Rede por critérios puramente sociais e a escassa participação estatal quer na prestação, quer na provisão de CCI. “É critério social só, a direcção da rede não quer assumir que é só preciso apoio social”(…) “E isso tem de ser mais flexível”. (EI) “A RNCCI tem muito poucas instituições públicas propriamente ditas, do estado, é tudo feito em parceria, financiada pelo estado, mas da economia social”. (EH)
9.1. O RISCO E A INCERTEZA EM CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS DO RISCO DEMOGRÁFICO À INSEGURANÇA FAMILIAR Ao se interpelarem os entrevistados, em relação aos riscos e às incertezas associados à RNCCI, evidencia-se claramente o impacto do fenómeno do envelhecimento populacional. Este tem sido um desafio constante e fonte de preocupação para a gestão da Rede Nacional e para a concepção e execução de políticas de saúde. O envelhecimento populacional encerra
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em si, uma série de outros problemas, como o agravamento das doenças/s crónica/s, o surgimento de comorbilidades e a questão da sobrecarga familiar. “O envelhecimento da população é desafio para tudo. É desafio para o financiamento, é um desafio para o acesso a cuidados de saúde, é desafio para a literacia”. (EA) “Estamos a falar de pessoas idosas, muito frágeis, com doenças crónicas, comorbilidade, com muito grau de isolamento (…). Quarto país mais envelhecido de 2050. (…). Somos o quinto país com maior dependência, na Europa dos 25”. (EB)
Dos relatos dos entrevistados, sobre os níveis de risco para a RNCCI são referidos como factores de agravamento, de sobrecarga ou dependência, os seguintes: a diminuta taxa de natalidade, a tendência crescente da esperança média de vida, especialmente, no género feminino, e a ausência de uma política de emigração adequada. “Eu costumo apresentar uma pirâmide etária que projecta a evolução demográfica para 2050 e até digo (…) que vamos ser um país envelhecido de mulheres pobres e viúvas e, nós não estamos a ter nenhuma dinâmica contra isto até porque a emigração está a ir-se toda embora outra vez e a nossa natalidade contínua pelas ruas da amargura (…)vamos ter uma dependência deste tipo de cuidados que vai fazer com que este sector seja provavelmente o predominante”. (EG)
Sobressai como uma necessidade premente para a RNCCI, a actualização e o investimento na especialização, designadamente na área das doenças crónicas e na área da saúde mental. A população idosa exige a actualização das respostas sociais da rede, a preparação de novos equipamentos e a formação de recursos humanos, o que eleva os custos e pode colocar em causa uma sustentabilidade a prazo. “No meio disso tudo têm de haver outras respostas que se articulam para dar continuidade de cuidados, e essas respostas podem ser de largo espectro, que podem integrar aqui desde: CSP, (…) Long Term Care, nos quais se inclui a RNCCI”. (EB) “E isso leva-me a uma questão muito importante que é a questão da Saúde mental (…). Os CCI não estão preparados para as demências, para o Alzheimer”. (…)“o nosso país não está preparado para as demências, não há equipamentos não há ajuda, o que há é a chapa um da resposta”. (EK)
Um outro risco associado identifica a sobrecarga das famílias que têm à sua responsabilidade idosos dependentes porque não existem estruturas de apoio suficientes e eficazes na RNCCI e noutro tipo de CLD. Destaca-se sobretudo, a escassez de equipamentos sociais com cuidados diferenciados que privilegiam a institucionalização, de acordo como as necessidades dos utentes. 177
“Existe uma enorme institucionalização, e cada vez vai ter que existir mais. Tem é que se humanizar esta institucionalização, porque não se conseguem ter pessoas de 90 e 100 anos em casa”. (EB) “É a família ficar sobrecarregada, a ter que muitas vezes que despedir-se do seu trabalho para ficar a acompanhar o seu familiar, das duas uma: ou é o marido ou a mulher também já idosos, eles próprios a precisarem de ajuda porque têm de estar a apoiar 24 horas a acompanhar uma pessoa cada vez mais dependente, não é, ou então são os proprios filhos e familiares, que são sobrecarregados, porque não há, não há estruturas de apoio”. (EK)
O apoio domiciliário é apontado como uma importante estratégia que beneficia a população idosa, sendo referido, como uma das áreas de cuidados menos desenvolvidas pela RNCCI. A necessidade recorrente de apoio domiciliário aponta para medidas políticas que promovam a valência, já que segundo um dos entrevistados (EB), cerca de 95% das pessoas que entram na rede têm algum grau de dependência. “Pois, eu acho que isso é uma área (apoio domiciliário) em que estamos bastante atrasados (…) acho que é um problema de outra natureza, não tem propriamente a ver com os serviços de saúde, é mais uma questão social, hoje vive-se mais, somos velhos durante muito tempo (…) significa, em muitos casos, que estamos muito sós, há muito idoso em Portugal que vive sozinho, sem apoios, e há, julgo eu que há uma responsabilidade do estado”.(EH)
Um dos riscos apontados por quase todos os interlocutores entrevistados está relacionado com a sustentabilidade da RNCCI. Esta é influenciada pelos factores demográficos já mencionados, pela actual crise económico-financeira e pela inalterada primazia do investimento estatal nos cuidados hospitalares. “E isso vai ter consequências gravíssimas a nível de orçamento de estado” (…) “Esqueça o SNS se continuarmos a investir nos hospitais, esqueça o SNS se continuarmos a insistir no episódio agudo e não na reabilitação e na valorização do cuidado”. (EB) “Aliás, julgo que os actuais custos para o estado não cobrem sequer grande parte das despesas destas instituições, portanto há aí um problema de financiamento, não sei se estas instituições têm capacidade de financiamento, para elas próprias terem uma rede”. (EH)
A insustentabilidade da RNCCI poderá estar associada ao subfinanciamento já que depende financeiramente de verbas provenientes dos jogos sociais da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e estas podem vir a ser alteradas. Por outro lado, a moderada intervenção do Estado não assume uma responsabilidade cabal efectiva, de reengenharia financeira no orçamento para a saúde, e delega no sector privado e no terceiro sector dimensões (criação de equipamentos e manutenção de unidades) que criam alguma insegurança. 178
“Não é possível continuar a rede em termos financeiros se houver uma quebra na receita dos jogos sociais. Só é possível manter a rede a desenvolver-se e a crescer retirando recursos e orçamento ao sector hospitalar. Os subsistemas e eventualmente os programas de financiamento apoiado podem ser introduzidos e direccionados para este tipo de respostas mas implicam uma “mossa” nas políticas de saúde, em geral”. (EG)
A INCERTEZA NA PROCURA E NA OFERTA DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS Perante o cenário de envelhecimento de crise económica e financeira que o país atravessa abre-se um espaço para a incerteza na procura e na oferta de CCI. Assim sendo, as opções da oferta da RNCCI tidas em matéria de financiamento público, privado sem fins lucrativos e sector social, podem determinar o nível do grau de cobertura de CCI. Os entrevistados apontam para um momento de incerteza de médio/longo prazo sobre a natureza das necessidades dos cidadãos, pelo que a gestão dessa tendência e trajectória deverá ser monitorizada. Referem ainda a existência de uma disfunção entre as necessidades reais da população e a forma como a rede cresceu e se desenvolveu. “Depois de decidir que esse financiamento é feito pelo sector público, pelo privado, pelos dois, o sector social. Isso são decisões críticas que têm que ser feitas e essas decisões vão determinar qual é esse grau de cobertura”. (EA)
Relativamente à procura, persiste a insuficiente passagem de informação entre profissionais de saúde e população sobre os propósitos e a existência das unidades de CCI levando as famílias a idealizarem estas unidades como respostas permanentes (lares, casas de repouso) e não como uma resposta intermédia/transição, entre níveis de cuidados. Há uma dúvida em saber se, futuramente, as unidades da RNCCI não correm o risco de se poderem tornar “fiéis depositárias” de cuidados de saúde e apoio social em que não haja diferenciação de níveis de cuidados. Esta questão torna evidente o investimento na promoção da educação da saúde. “Mais educação das pessoas para a saúde, mais informação e termos uma resposta no SNS, uma resposta, que não seja apenas a resposta curativa, a resposta aguda, mas que permita de facto outro tipo de respostas que vão conformando e mudando o nosso paradigma, para que as pessoas no fim da vida, digamos, não se sintam, por um lado ou abandonadas, ou internadas num hospital”. (EH)
Avança-se (EH) que a evolução da saúde/tecnologia deve ser encarada como uma conquista e não como um problema, dado que esta contribuiu para uma maior longevidade e para o aumento da esperança média de vida da população. No entanto, face a este quadro 179
demográfico, a procura dos CCI permanece elevada e a oferta da RNCCI não permite cobrir todas as necessidades da população. Confirma-se que a imprevisibilidade da procura deste tipo de cuidados, implica a realização de estudos, estimativas e projecções que vão coadjuvando (sucessivamente através de reavaliações) quem dirige unidades de CCI e permitirá redireccionar melhor as respostas existentes ou criar novas respostas (EJ). Já o aumento da oferta de CCI vai depender dos cuidados hospitalares, da articulação com a rede, de um maior investimento na reabilitação e de unidades da rede pública. A educação das pessoas para a saúde e a revalorização dos cuidados (EB e EJ) devem também assumir um papel de relevo. “Tem de se fazer através de estudos, de estimativas, daquilo que é a evolução (…) “Há depois também profissionais, que permitem analisar e projectar para a frente, tendo sempre em conta o que é uma projecção e uma estimativa”. (EJ) “No dia em que deixar de ter regras os hospitais tomam conta da Rede e transformam-na em hospitais de retaguarda. E fazem transferências directas de todos os doentes que tiverem” (…) “o PIB vão subir com as despesas da saúde, se não tivermos em conta que temos de criar outras alternativas em LTC”. (EB)
A principal razão para desequilíbrio existente entre oferta e procura de CCI (EG) é de que a oferta não conseguiu desenvolver-se como estava conceptualmente planeada, apesar de ter os instrumentos legais para avançar. A tentativa de criar maior eficiência económica através de incentivos e das características/necessidades de cada localidade, bem como a aposta na literacia em saúde para os cidadãos como respostas à mudança gradual de paradigma sobre o sector hospitalar, poderão inverter o desequilíbrio entre a oferta e procura de CCI (EI). “Eu tenho uma população de 1900 pessoas e entre o ano de 2010 o que é que eu precisei da RNCCI? Que me ajudasse a colocar uma senhora num lar e convencê-la que não poderia ficar em casa” (…) As USF têm como sabe, alguns incentivos, não é por poupar dinheiro, mas é por atingir os objectivos de eficiência. Economicamente funciona, e não deixam de receitar coisas que as pessoas precisam, mas pensam duas vezes”. (EI) “As pessoas com mais condições são as mais instruídas, são os que usam mais racionalmente as coisas, que menos desperdícios fazem (…) que a gente, de todos os impostos que se colectam, nós achamos aceitável gastar 10% globalmente com a saúde, agora como é que o gastamos, agora vamos hierarquizar as necessidades, dos CCI, não é para manter estruturas que vamos pagar só para existirem“ (EI)
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9.2. EXPANSÃO E MODERNIZAÇÃO: QUE PROPOSTAS
ESTRATÉGIAS E PROPOSTAS DE MELHORIA No que se refere a uma estratégia futura de CCI, ressaltam duas variáveis independentes geradoras de serviços que afiançam uma maior acessibilidade, isto assumindo as palavras de um dos entrevistados. A primeira variável está relacionada com um conjunto de regras e limitações, sendo a curto prazo, de difícil negociação, a não ser que o “core” do financiamento na saúde se altere ou que sejam assumidas prioridades chave que vão ao encontro das necessidades. Por outro lado, existe uma segunda variável que surge como um complemento da primeira, sendo a sua escolha livre no contexto das opções de mercado. “Há dois contextos de escolha. Duas teorias de escolha. Uma é com o meu dinheiro e outra é com o nosso. Com o meu dinheiro eu quero escolher onde quero. E nós temos que organizar a escolha porque nós estamos numa sociedade de escolhas. E acho muito bem. Mas quando fazemos o contrato social a escolha é feita com as regras do contrato social”. (EA) “Se no campo dos CCI, o financiamento é limitado e tem que ter prioridades, se eu quiser assegurar aí, tenho que ter outra forma de financiamento, isso é óbvio”. (EA)
Ainda em defesa de declarações dos entrevistados, a estratégia vindoura poderá passar pela reorganização das unidades hospitalares, designadamente, pela eliminação do número excessivo de camas que são desnecessárias e que criam desperdício ao Estado. Há, identicamente, depoimentos que versam sobre o estímulo ao afastamento de cuidados agudos, com referenciações criteriosas de acesso a cuidados diferenciados e numa mesma lógica o incremento da capilaridade dos CSP. “Nós temos camas hospitalares de agudos que não necessitamos que são um verdadeiro cancro do sistema, (…) é por essas camas que estão em excesso que o sistema entra em processos, de, enfim, de deficits constantes nas organizações da prestação de cuidados de saúde, nomeadamente, das hospitalares”.(EG) “Temos de afastar as pessoas dos hospitais porque as pessoas têm de sentir seguras com outras respostas”. (…) “A porta do hospital tem de estar fechada. As pessoas só podem ir ao hospital quando necessitam
e
quando
são referenciadas pela
pessoa,
pelo
clínico que
os acompanha
permanentemente”.(EB) “Mas isso é o grande investimento que tem de ser feito. Mas não é médicos de família apenas por trás da sua secretária, são médicos de família na casa das pessoas. São equipas na casa das pessoas”. (EB)
Há ainda quem concorde, pelas declarações descritas, que o estado deve definir a natureza da Rede e a sua tipologia. Depois, deve integrar e associar vários actores, tanto do sector privado 181
como do Terceiro sector e promover estratégias de Benchmarketing, numa aprendizagem que permita evitar o erro e replicar boas práticas, em domínios importantes. “O que o estado tem de definir e bem é a natureza da Rede e a Tipologia, e depois pode chamar a integrar a rede e a colaborar na rede”(…) “Existem vários modelos de associação e integração. Mas vai ser a área onde o Terceiro Sector está que vai ter que ser chamada. Mais até que o sector privado, porque as margens são pequeninas.” (ED) “Eu acho que nós aí beneficiámos da experiência dos outros, eu acho que o facto de termos beneficiado da experiência catalã” (…)” Eu acho que nós evitámos os erros dos franceses, os franceses gastaram muito dinheiro em coisas de luxo”. (EF)
Importa salientar que o futuro dos CCI pode estar na partilha de recursos do Ministério da Saúde (MS) e do Ministério da Solidariedade e da Segurança Social (MSSS) e da oportunidade que está, no reforço da sua frágil relação, como atestam os contributos de certos depoimentos, designadamente: “Uma das soluções seria passar a transferir estas decisões para um nível técnico, para decisores técnicos que não fossem só políticos, de uma forma geral, o que queria sublinhar é isso. Simplificar. Criaram-se pontes, entre MS e MSSS, essas pontes são frágeis e têm de ser muito mais reforçadas no futuro, porque é evidente nos dois sistemas os recursos têm de ser claramente partilhados”. (EG)
No mesmo sentido, defende-se uma maior acessibilidade e a redução da burocracia, ambas a criarem despesas inúteis. Acrescente-se, o incentivo à diferenciação de cuidados, em especial, na saúde mental e nos cuidados paliativos. “Por um lado crescimento e cobertura mais homogénea no território nacional, a diferenciação e facilidade de acesso” (…) “a burocracia só gera rotina, lentidão na resposta e despesa, mas acho que tenho de imaginar uma gestão da rede leve, com estruturas descentralizadas, comunitárias que tenham capacidade e autonomia de gestão e de decisão, acho que é uma boa maneira de poupar”. (EH) “Deve haver equipas especializadas e essas especializações e essa diferenciação, porque de facto os cuidados paliativos têm outras exigências que os CCI não têm, ditos tradicionais, a saúde mental também comporta um conjunto de exigências próprias”. (EJ)
Não se tratando de uma projecção propriamente dita, mas de soluções recolhidas através de depoimentos que podem alavancar a perspectiva futura deste nível intermédio de cuidados, tomando por exemplo, a gestão partilhada dos CCI através de uma parceria público-privada ou por outro organismo independente que fosse responsável pela monitorização e validação de toda a actividade que decorre dentro da RNCCI. 182
“Devia haver uma monitorização específica, se fosse no âmbito de uma parceria público-privada ou de uma gestão privada, ou que houvesse um organismo que fosse monitorizando e validando tudo aquilo que se passa com a actividade da RNCCI, e como a actividade é única se é partilhada tem de haver gestão partilhada.” (EE)
Uma outra ideia ventilada por um dos entrevistados está na compensação/penalização pela eficácia e eficiência assente em pressupostos estabelecidos, bem como a transparência na redução de atritos desnecessários, ao bom funcionamento da Rede desenvolvendo uma cultura nova de medicina e de enfermagem de base comunitária. “Aquelas exercerem melhor as competências de relação ou de ligação devem ser premiadas financeiramente, as outras devem ser castigadas”. (ED) “É preciso partir e é preciso criar uma cultura nova que é de facto a medicina e a enfermagem de base comunitária“.“Não é ter um médico avençado que vai lá medir a tensão e passar as receitas ou os certificados de óbito. Não é nada disso. É ter equipas que efectivamente fazem a ligação com os CSP”. (ED)
Finalmente, de acordo com um dos peritos, a RNCCI terá de ser ramificada e evoluir para além da reabilitação, tanto para a área da saúde, como para a vertente social. “Mas o que acontece é que a rede tem de ter duas conexões rápidas para sair, para sair para a vertente saúde e para sair para a vertente social, mas não quer. É mais social, pronto, ficava, mas isso também se vai afinando porque a RNCCI acaba por ter de evoluir com maior entrosamento para os dois ramos”. (EI)
SOBRE ESTRUTURAS E EQUIPAMENTOS Tendo em consideração a opinião do modelo madrileno (benchmarketing) ressalta a aposta nos cuidados paliativos e nos cuidados domiciliários integrados com a garantia da diferenciação de recursos específicos. Defende-se, paralelamente, de acordo com interlocutores privilegiados, o alargamento homogéneo de equipamentos, particularmente, o reforço dos CSP e das equipas domiciliárias, em especial nos centros urbano-periféricos. “A tendência é que sempre que se possa o doente volte ao domicílio” (…) “Há uma equipa de suporte domiciliário, com médico, enfermeiros que são recursos específicos em cuidados paliativos, formados para esse efeito”. (EC) “Tentava ampliar os recursos nas grandes cidades estão”. (…) “E na periferia das grandes cidades, que é onde neste momento os principais problemas sociais”. (EF)
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“O importante é que é preciso dar uma grande volta na questão da gestão e da eficiência, e valorizar os cuidados de saúde primários, não tenho qualquer dúvida”. (EK)
Em Portugal, defendem-se, de acordo com as descrições, três áreas essenciais, designadamente, as unidades de reabilitação, de longa duração e de cuidados domiciliários. “A cobertura de respostas sim, sobretudo nas unidades de Média Duração e Longa Duração, aumentar a resposta também no domínio dos Cuidados Domiciliários Integrados, seriam três áreas cruciais”. (EG)
SOBRE O PLANO FINANCEIRO O investimento em CCI é imperativo e tem um custo muito menor do que com doentes internados em unidades hospitalares e é igualmente necessário, à semelhança da experiência de outros países (por causas como envelhecimento/doenças crónicas), cita um dos entrevistados. Outros declarantes anunciam uma verba exclusiva e transparente rubricada no orçamento de estado. “Portanto, do ponto de vista geral e societário e desejável e até do ponto de vista económico, a minha pergunta é, o que é expectável prever, assumindo o envelhecimento, as doenças são mais crónicas”(…). “Eu era capaz de dizer, conceptualmente, que as necessidades de cuidados continuados são ela por ela com as necessidades de agudos”. (EE) “Eu só preciso de 200 milhões de euros” (…) “Sim, o orçamento de estado, neste momento são agora 8 biliões” (…) “Neste momento, gastámos cerca de 158 milhões de euros desde que a rede começou, precisamos de mais de 200 e tal milhões”. (EB)
O PAPEL DOS AGENTES E DAS INSTITUIÇÕES Concretamente no contributo dos agentes existem, de facto, múltiplas alusões pelos entrevistados, a aspectos que podem fortalecer os processos que estimulam a RNCCI. A grande evidência materializa-se na multidisciplinaridade e na intersectorialidade tanto ao nível das instituições formais (Centros comunitários, Igreja, as Equipas de gestão de altas) como das informais (famílias, associações de moradores) e na existência de um gestor da família. Como modelo de gestão, honra-se a autonomização das equipas multidisciplinares e a definição da sua coordenação. “Sempre aparecem as palavras, integral porque se entende, o doente, a família, as equipas multidisciplinares, médicos, enfermeiros, trabalhadores sociais, psicólogos, consideram o apoio a família, o apoio emocional, procurando a qualidade de vida e o conforto, e consequentemente, o bemestar.” (EC) 184
“Primeiro é preciso ter coaching das famílias (…) Deve ser alguém que está próximo daquela família, daquela comunidade que pode ser o profissional, o assistente social, pode ser o enfermeiro, pode ser o psicólogo, o médico ou outra pessoa qualquer que conhece aquela família e gere aquela família.” (ED) “Nós temos reforçar a ideia do gestor da família, o gestor da família gere as necessidades de saúde, e antecipa problemas, antecipa comportamentos errados, é um tipo de resposta que é quase uma espécie de oferta irrecusável”.(ED) “Desburocratizar e por mais equipas multidisciplinares definindo bem a sua coordenação e a sua condução”. (EH)
Salienta-se igualmente, por declarações expressas, uma ideia de operacionalização imparcial e apolítica por tecnocratas ou por instituições independentes que possam decidir e não sejam sensíveis aos grupos e às pressões dos sectores fortes das áreas de influência. Assim não haveria lugar a retaliações, na eventualidade, por exemplo, de serem retirados recursos aos hospitais. “É importante é que haja uma instituição independente que vá retirando ilações, dos possíveis “vieses”, mas há aqui uma coisa que é fundamental e que não está sempre garantida que é um reconhecimento real das necessidades das populações”. (EG)
Em conclusão, importa salientar os contributos de alguns interlocutores, tal como a defesa de princípios éticos na prática da medicina, através da evidência científica, a integração das profissões de reabilitação e outros profissionais especializados (assistentes sociais e psicólogos) e a consolidação da formação académica especializada. “Nem é para poupar dinheiro ao estado é para praticar boa medicina, tudo o que a gente aqui pedir tem de seguir os princípios da ética, é o primeiro princípio é, não fazer mal, o segundo princípio é fazer bem, isto é, tudo o que gente fizer mesmo que não faça mal, se não fizer bem não devemos fazer”. (EI) “Depois era necessário que o sistema crie mecanismos que possibilitem a integração das profissões de reabilitação, não podem ser só enfermeiros, mais enfermeiros, mais enfermeiros” (EG) “Nesta avaliação as famílias têm que participar (…) Se não se puser psicólogos nem assistentes sociais (…)”. (EB).
O CONTRIBUTO DO SECTOR PRIVADO A análise das respostas de alguns dos intervenientes reconheceu a abertura ao sector privado como uma opção clara à resposta pública e à prestação de cuidados informais fomentando a flexibilização dos agentes prestadores. Salienta-se, a este nível, e até na mesma linha de raciocínio a existência de um “tecto” de financiamento estatal, a partir do qual cada indivíduo seria livre de tomar outras opções, como se pode verificar nas transcrições que se seguem. 185
“Acho uma opção, é positivo desde que seja coordenado”. (EG) “Isso tem uma implicação nas políticas de financiamento, se de facto tiver uma política de financiamento que queira gerar uma dinâmica de apoio às respostas, de forma natural de acordo com as necessidades e também flexibilizar-se o mais possível, num plano desse género faria sentido”. (EG) “Eu devo ter um regime de protecção que é explícita e que é transparente, depois os doentes se quiserem cobrir por eles próprios o risco adicional por fora é com eles. O Estado não tem de se meter nisso, o estado deve dizer é o seguinte: Eu, famílias até 1500 ou 1000 euros comparticipo a 90 %, acima deste valor comparticipo a 50 %, se o mercado organizar produtos para suportar aquele diferencial esse é um problema das pessoas e das empresas”. (ED)
Noutra perspectiva foi também reconhecida, nesta matéria, a consciencialização ética do lucro bem como um regime de seguros com rubricas renovadas que contemplem o conceito de envelhecimento, as novas configurações de dependência e a tipologia de cuidados continuados e paliativos. “A gente percebe que eles têm uma actividade lucrativa. Temos de estabelecer um negócio de cavalheiros em que esse lucro tem de ser ético, comedido e não podem ser lucros (…) de 80% e 90% e100%. Não pode, tem de haver aqui um lucro ético”. (EE) “Há muitos seguros, que não contemplam as unidades de cuidados paliativos, isso é um non-sense”. (…) “A minha posição é, se os seguros de saúde querem comparticipar de alguma forma nos cuidados (…) têm de obrigatoriamente de se adaptar a esta realidade, aliás, , sairá mais barato, talvez porque os cuidados paliativos e continuados, uma das razões porque singraram foi por serem mais baratos.”(EE)
9.3. CUIDADOS CONTINUADOS EM PORTUGAL E NA EUROPA
PERSPECTIVA SOBRE O TIPO DE RESPOSTAS DE CUIDADOS CONTINUADOS NA EUROPA Relativamente às diferentes modalidades de CCI na Europa, uma boa parte dos entrevistados não respondeu às questões colocadas. Os sistemas são plurais e diversificados demais para se proceder a uma comparação fidedigna. Existem países muito avançados e outros em que o nível de cuidados está em vias de desenvolvimento ou é praticamente inexistente, o que se relaciona, provavelmente, com o peso da intervenção estatal. No entanto, dentro do quadro das respostas, alguns interlocutores justificam: “Há uma parafernália de sistemas, todos muito diferentes uns dos outros. Na Europa temos, desde as respostas para as demências, as respostas em ambulatório, (…), ao nível das IPSS, as ONG e a articulação com as autarquias” (…) É completamente diferente daquilo que nós temos.” (EB)
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Das afirmações possíveis verifica-se que países mais desenvolvidos, neste nível de cuidados, renovaram a prestação dos seus cuidados de saúde, e desde há alguns anos foram reduzindo em cerca de 30%, as camas de doentes agudos, para unidades de pós-agudos, seguindo a trajectória das necessidades exógenas e endógenas que se foram progressivamente colocando, como atestam as afirmações seguintes: “ Há sistemas de saúde que nos últimos 15 anos, 20 anos reduziram mais de 30% as suas camas de agudos, repare com negociação e com transferência de recursos dos cuidados agudos para cuidados pós agudos, não é que esses sistemas de saúde, por exemplo o francês, tenham feito uma redução de camas de agudos para poupar dinheiro, não foi, não é o caso.” (EG) “Os ingleses são mais poupados, tiveram mais restrições e mantiveram os cuidados continuados, no domicílio”. (EF)
UMA APRECIAÇÃO POSITIVA DE PORTUGAL NO CONTEXTO EUROPEU Os especialistas e os decisores políticos em saúde foram chamados a classificar o nível de Cuidados Continuados em Portugal e na Europa numa escala de 0 a 10, em que 0 corresponde a uma prestação muito fraca, e 10, a uma prestação muito forte. Na mesma medida, talvez por se requererem avaliações objectivas ou pela presença de uma diversidade de sistemas foram obtidas poucas opiniões. Contudo, foram declaradas opiniões positivas e opiniões menos positivas: “(…) Nós (Portugal) mantemos uma aparente necessidade de estas camas de agudos, na verdade o sistema nunca permitiu que se desenvolvessem respostas pós agudos, alternativas, e a ensinar os doentes a não estarem sempre a entrar e sair dos hospitais”. (EG) “Os países mediterrânicos, a Espanha também é muito avessa, se olharmos para a Catalunha o nível será 7, 8, de facto aí os serviços estão muito desenvolvidos, não há confusões de respostas, as soluções necessárias estão integradas, existem de facto processos da reabilitação que são visíveis, mas não será o caso, se calhar na Galiza, que já tem outra realidade, tem mais dificuldade em encontrar as respostas. Se olharmos para outros países, por exemplo, os países escandinavos, a Suécia, a Holanda, são países com cuidados continuados muito fortes, daria 8,9, em termos da qualidade e do efeito, que é sobretudo a reabilitação”. (…)“Mas se pensarmos em países como a Inglaterra, 8 ou 9”. (EG)
Denota-se, por seu turno, em Portugal uma apreciação que regista a necessidade de maior integração entre saúde e apoio social e a consolidação de respostas de cuidados pós-agudos. “Eu acho que foi uma boa iniciativa e deram visibilidade a uma área de necessidades sociais e em saúde que estava por acautelar e que agora o próximo passo é a sua melhor integração, quer com a saúde, quer com o sistema social, em geral, acho que foi boa iniciativa”. (EI) 187
Genericamente, há uma avaliação harmonizada, por comparação com outros países da Europa: uma boa prestação no que concerne às Unidades de Convalescença e oportunidades de melhoria nas unidades de Média Duração, de Reabilitação e de Longa Duração e Manutenção. Apresentam-se, de seguida algumas classificações no quadro europeu que caracterizam as informações cedidas: “Em Portugal será 5”(…)“eu dou 5 porque apesar de tudo, as respostas de convalescença para algumas tipologias de doentes funcionam relativamente bem, não dou mais de 5 porque as outras tipologias deixam muito a desejar, há concelhos inteiros onde não há nada, há convalescença e mais nada”. (EG) “8”. (…) “Nos dois”. (Portugal e Europa). (EE) “Acho que a situação é muito desigual, há países em que isto nem existe, há países em que isto existe a sério, mas eu acho que nesse domínio, em matéria de saúde não perdemos na comparação” (EH) “Ora bem, se for de 0-10, a partir de 5 é positivo, dou para aí 5”. (EH) “Ou seja, 6, 7”. (EJ)
As Equipas domiciliárias, depois de alguns anos de implementação, são ainda escassas para fazer face às necessidades da população portuguesa, ou seja, estão aquém do espectável, com uma percentagem reduzida de resultados esperados, como se pode verificar: “Os resultados ao fim de 6 anos e meio estão muito aquém daquilo que seria necessário e desejável. Eu tenho consciência que se partiu do nada, agora passados 6 anos e meio só temos 10% das unidades asseguradas e sem termos começado com uma rede efectiva das equipas de apoio domiciliário”. (EK)
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CAPÍTULO 2 – O SERVIÇO SOCIAL NA DETERMINAÇÃO DOS FACTORES DE RISCO: UM ESTUDO SOBRE A VULNERABILIDADE DOS DOENTES EM CONTEXTO HOSPITALAR
RESUMO DE CAPÍTULO
O capítulo que se apresenta ilustra como o Serviço Social hospitalar avalia factores de risco e de como os diagnósticos sociais que vai elaborando lhe permitem a compreensão do grau e da vulnerabilidade dos doentes.
Depois do enquadramento, no capítulo da problemática, da intervenção social por actos sociais, numa perspectiva genérica da actividade assistencial, importou aprofundar o estudo dos episódios sociais – que constituem a centralidade desta investigação. Neste âmbito foi traçado o perfil de doentes através de uma abordagem sociodemográfica, destacando as determinantes sociais e de contexto que constam da pergunta de partida.
Por fim, coube analisar os múltiplos factores de risco destacados pelos assistentes sociais nos 4965 doentes em estudo (modelo ecológico). Estes foram agrupados em categorias/subcategorias (individuais, familiares, socioeconómicas, habitacionais, educacionais, de protecção social).
10. O PERFIL DOS EPISÓDIOS SOCIAIS: UMA VISÃO SOCIODEMOGRÁFICA
Para se esclarecerem os diagnósticos sociais foi necessário identificar as características fundamentais da população. Assim, pode dizer-se que no conjunto dos episódios sociais (4964) houve um predomínio de doentes do sexo feminino (53%) relativamente aos doentes do sexo masculino (47%), como se pode visualizar no gráfico 4, abaixo representado.
189
Gráfico 4 – Distribuição de episódios sociais por sexo - 2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
Já a variável idade apresentou irregularidades na sua distribuição. Estas irregularidades foram clarificadas com a aplicação dos testes Kolmogorov- Smirnov e Shapiro-Wilk, tendo sido posteriormente confirmadas através do histograma abaixo afigurado – gráfico 5, bem como pelos testes específicos: Stem-and-Leaf Plots e Normal Detrended Q-Q Plots – gráfico 6.
Gráfico 5 – Distribuição de episódios sociais por idade -2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
O que justifica a distribuição assimétrica da idade dos doentes, bem como algumas características de estudo mais aprofundado são as situações complexas, que decorrem no âmbito dos serviços de Pediatria e de Ginecologia/Obstetrícia, relacionadas com casos de crianças e jovens em risco e/ou em perigo, com o acompanhamento de maternidades precoces e/ou de mães adolescentes. Estas situações, em termos de complexidade estão no mesmo patamar de vulnerabilidade de idosos isolados, com elevado grau de dependência e/ou com pouca rede formal ou informal. A heterogeneidade, constante no gráfico 6, do que se estabeleceu como o que é vulnerável cria enviesamentos e repercussões no cálculo da média de idades que acabou por se fixar nos 59,04 anos de idade.
190
Gráfico 6 – Distribuição de idade: teste Detrendend Normal Q-Q Plot SPSS - 2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
Depois da percepção sobre o sexo e idade desdobrou-se a distribuição dos episódios sociais pela tipologia de estado civil (N 4964) – gráfico 7, e neste caso, evidenciou-se claramente uma predominância entre os doentes casados (33%), solteiros (32%), e viúvos (24%). Deve considerar-se que dentro dos solteiros se incluem as crianças e jovens (tracejado azul) cuja incidência é também bastante representativa, dada a complexidade de problemas que se colocam ao Serviço Social.
Gráfico 7 – Distribuição de episódios sociais por estado civil- 2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
Relativamente às habilitações literárias dos doentes, expostas no gráfico 8,comprovou-se que, maioritariamente, estão ao nível da escolaridade obrigatória, ainda que esta seja tendencialmente mais expressiva no 1º Ciclo. Destaca-se particularmente o número de crianças em idade pré-escolar, que nos remete para as situações acompanhadas, como já referido, nos serviços de Pediatria e de Obstetrícia.
191
Gráfico 8 – Distribuição de episódios sociais por habilitações literárias -2009-12 (Fonte SAAS, 2013)
Constatou-se também que a relação com o trabalho da população em estudo é predominantemente inactiva (90%), relativamente ao conjunto de utentes que se encontravam em actividade (10%). No entanto, o gráfico 9, esclarece com maior detalhe estas diferenças, distinguindo a situação perante o trabalho dos doentes, no contexto dos episódios sociais.
Gráfico 9 – Distribuição de episódios sociais por situação perante o trabalho- 2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
Depois da observância do gráfico acima apresentado concluiu-se que os rendimentos provenientes do trabalho, neste tipo de população são diminutos e estão na ordem dos 5%. Acrescenta-se que os reformados e os pensionistas são os mais representativos na distribuição desta variável (71%). Já os estudantes e aqueles que estão em formação profissional, assim como, os que não têm qualquer ocupação têm a mesma representatividade cifrada nos 8 pontos percentuais.
Esta dimensão também identificou, em parte, a proveniência dos rendimentos da maior parte da população doente, como se demonstra no Gráfico 10, remetendo para um encadeamento lógico que entrecruza a situação perante o trabalho e a fonte de rendimento do doente.
192
O que se encontra, na maioria dos casos são: rendimentos provenientes de pensões e reformas (75%); rendimentos que derivam de uma dependência do agregado familiar (6%); e rendimentos provenientes da força do trabalho (5%). Fonte de Rendimentos
Gráfico 10 -Distribuição de episódios sociais por fontes de rendimento-2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
10.1. AS DETERMINANTES SOCIAIS E DE CONTEXTO: UMA ANÁLISE DE FACTORES DO RISCO
A avaliação dos assistentes sociais permitiu o entendimento e a percepção de indicadores de risco distinguindo, frequentemente, um maior ou menor impacto destes na transição entre níveis de cuidados. Neste sentido, e assumindo as principais determinantes de risco para a saúde nos episódios sociais, assinalam-se como fundamentais, e de acordo com a questão de partida: A existência de comorbilidade, o grau de dependência e o estado de doença.
Gráfico 11- Distribuição de episódios sociais /estado doença- 2009-12; Gráfico 12 – Distribuição episódios sociais/ comorbilidade-2009-12; Gráfico 13- Distribuição episódios sociais /grau de dependência- 2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
A observação dos gráficos acima afigurados (gráficos 11,12,13) demonstra que uma grande percentagem de doentes hospitalizados admitia simultaneamente uma patologia crónica (gráfico 11) associada ao episódio agudo que promoveu o acesso aos cuidados hospitalares. O 193
conjunto dos dados também revelou preocupação pelas situações que apresentaram um determinado grau de dependência, afectando quase cerca de 70% dos doentes, e aqueles que acumularam outras comorbilidades (18%). Numa outra lógica que perpassa o aprofundamento pelas determinantes sociais identificou-se uma característica de contexto para esta investigação que incide sobre o processo de transição entre níveis de cuidados de saúde e de apoio social. Assim, foi de grande utilidade obter informações sobre o destino dos doentes após a sua alta hospitalar. Claramente, como refere o gráfico 14, ficou patenteada a incidência no regresso dos doentes ao domicílio (56%), sendo que a integração em instituições da comunidade assumiu capilaridades distintas tais como, transições dos cuidados hospitalares para Lares ou Residências para idosos, para unidades da RNCCI e outras instituições de acolhimento de doentes.
Gráfico 14- Distribuição dos episódios sociais / destino após alta hospitalar-2009-12 (Fonte: SAAS,2013)
Independentemente das variáveis já expostas, que acompanham a questão de partida, enunciam-se outras determinantes sociais, de vivência da doença que marcam cada doente isoladamente, como traduz e melhor explicita o gráfico 15. Entre os mais relevantes, denote-se o peso atribuído à dependência do utente por parte de outras pessoas (familiares/amigos/vizinhos/instituições) – designadamente, em mais de 50% se forem considerados em conjunto a dependência de terceiros (27,1%), a dependência de serviços (10,3%) e a incapacidade de gerir recursos (15,2%).
194
Factores de Risco Social Isolados (N 3363) Vitima discriminação
1,2%
Habitos aditivos
1,3% 2,2%
Dificuldades Comunicacionais
2,6%
Baixa Auto estima
4,2%
Comportamentos Risco
4,6%
Dificuldade de Gestão Mudança
5,7%
Desajustamento Psicossocial
6,6%
Isolamento Familiar
8,0%
Outros
9,5%
Dependente de Serviços
10,3%
Desconhecimento Direitos
15,2%
Incapacidade de Gestão de Recursos
27,1%
Dependente Terceiros ,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
Gráfico 15 – Episódios sociais /factores de risco social isolados -2009-12 (SAAS, 2013)
De
referir
ainda,
o
isolamento
social,
com
um
valor
alarmante
dada
a
ausência/indisponibilidade de interlocutores para se acautelarem determinadas necessidades, bem como o desconhecimento de direitos e benefícios ao serviço dos utentes carenciados. A variável Outros justifica um impacto de cerca de 8% porque agrupa os remanescentes 18 factores (frequências inferiores a 1%), entre os quais se distinguem: a tentativa de suicídio, a recusa de visitas da família, a recusa de alta hospitalar, a automutilação, a fuga de casa, o desenraizamento social, a privação do cônjuge, actos ilícitos, entre outos.
No que se refere à perspectiva familiar foi possível recolher uma quantidade considerável de factores de risco social que vão desde a recusa, aos maus tratos, ao abandono, à negligência, à indisponibilidade, à incapacidade, à sobrecarga ou até à ausência de familiares dos utentes em questão. Todavia, a distribuição associada a um risco familiar está concentrada em duas características principais, que se materializam na incapacidade e na indisponibilidade familiar para a gestão de cuidados de saúde, conforme se verifica através do gráfico 16. Estas representam mais de 30% dos factores que concorrem para o risco associado à família. São seguidas, embora em padrões distintos, pelas situações de disfunção familiar (11,0%) e nos casos de inexistência/ausência de qualquer membro da família (7%). Mais uma vez, a 195
variável Outros (12,2%) surge sobrerepresentada pois refere-se ao conjunto de 19 variáveis, que individualmente representam valores frequenciais iguais ou inferiores a (1%), como são exemplo, os casos de abandono, abuso sexual, gravidez não desejada, negligência educacional, problemas conjugais, violência doméstica e violência familiar, entre outros. Factores de Risco Social na Familia (N 3148)
2,0%
Superprotecção
2,3%
Sobrecarga Familiar
7,0%
Ausência Família 3,2%
Recusa de Alta
3,7%
Familia Recusa Incap. Doente 1,7%
Problemas Pais/Filhos
1,2%
Problemas Legais
12,2%
Outros 2,2%
Neglig. Prestação Cuidados
2,0%
Neglig./Insuf. de cuidados
1,3%
Negligência de afectos
1,6%
Monoparentalidade
1,4%
Maus tratos psicológicos
1,1%
Maus tratos físicos
1,5%
Maternidade Precoce
12,9%
Indisp. prestação cuidados
17,8%
Incapac. prestação cuidados Familiar Pat. Psiquiátrica
3,1%
Familiar Idoso Depen.
3,2% 11,0%
Disfunção Familiar 2,5%
Conflitos Familiares
3,2%
Ausência Plan. Familiar ,0%
2,0%
4,0%
6,0%
8,0%
10,0%
12,0%
14,0%
16,0%
18,0%
Gráfico 16- Episódios sociais / factores de risco social na família- 2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
De acordo com os factores de risco social, na vertente económica, analisados no gráfico 17 e apresentados na página seguinte, depreende-se que estes incidem maioritariamente sobre a insuficiência (55,4%) e até mesmo, com a ausência de rendimentos (13,9%). De valorizar, numa linha de escassez de recursos económicos estão assinalados, os encargos/gastos com despesas de saúde: transportes, tratamentos e medicamentos (14,4%).
196
Factores de Risco Social Económicos (N 2113) 1,0% 1,4%
5,8%
Má gestão de recursos
6,2%
Endividamento 13,9%
Encargos elevados outros
14,4%
Encargos elevados hab.
55,4%
Ausênc ia de Rend. Encargos elevados saúde Baixo Rend. Trabalho
Gráfico 17 – Episódios sociais / factores de risco social económicos – 200-12 (Fonte: SAAS, 2013)
Em parte, justificando a tendência do risco, provocado por insuficiência ou escassez de rendimentos, fica demonstrado no gráfico 18, uma outra dimensão de análise que apoia essa tendência e que vai caracterizando a população representada nos episódios sociais. Este disponibiliza os dados colhidos sobre a situação perante o trabalho exercida pelos doentes, evidenciando a sua natureza. Justificando alguns dados anteriores, constatou-se a existência de um elevado número de desempregados (44,1%) e de um importante grupo com baixas qualificações profissionais (39,0%), Por outro lado, importou destacar também o número considerável de doentes (27,8%) com ausência de hábitos de trabalho – que os coloca numa situação ainda mais frágil. Factores de Risco Social associados ao trabalho (N 758) 44,1% 0,45 0,4 0,35 0,3 0,25 0,2 0,15 0,1 0,05 0
39,0% 27,8%
9,3%
8,4%
10,3%
3,0%
Actividades marginais
Ausência Hábitos de trabalho
Baixa qualificação profissional
Desemprego
Inadaptação
Outro
Trabalho incerto
Gráfico 18- Episódios sociais /factores de risco social associados ao trabalho -2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
Interessou elencar os factores relacionados com a educação da população - gráfico 19 - para esclarecer dinâmicas da compreensão da doença, da aprendizagem ou das diligências promovidas por profissionais. Sobressaem essencialmente factores de risco associados a uma
197
população mais jovem distinguindo-se claramente o abandono escolar (25%) e o insucesso escolar (21,4%) como factores de risco transversais à doença. Factores de Risco Social na educação (N 206) 40,0%
25,0%
20,0%
21,4%
19,0%
14,2%
10,1%
4,3%
6,0%
,0%
Gráfico 19 – Episódios sociais / factores de risco social na educação-2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
Assimetricamente, o importante a reter foram os 19% de analfabetismo que têm comprometido a população mais idosa no acesso a respostas que colmatem as suas necessidades de saúde e de apoio social. Estes não têm a capacidade para gerir meios e recursos, pois implicam o conhecimento de processos e de diligências, que se encontram fora do contexto social que dominam.
Relativamente aos factores que envolvem a protecção social dos utentes, figurados no gráfico 20, a grande parte, que corresponde a 38,5%, foi identificada pela ausência generalizada de recursos. Um valor significativo referia-se à ausência de resposta às situações que se colocam na comunidade, de cerca de 15,7% - e, com valores equivalentes, na ordem dos 13,8% predominaram a falta de cobertura de equipamentos e a falta de cobertura económica para responder às necessidades sentidas. Factores de Risco Social na Proteção Social (N 445) Trabalho precário s/descontos
1,7% 38,5%
Ausência de Recursos 4,8%
Outro
15,7%
Ausência de Resposta
13,8%
Falta de cobertura equipamentos
13,8%
Falta cobertura económica Doença S/Protecção
3,3% 7,3%
Desemprego S/ Protecção Atraso Prestação Seg Social
1,1%
Gráfico 20 – Episódios sociais/ factores de risco na protecção social-2009-12 (Fonte: SAAS, 2013) 198
Finalmente, e ainda no domínio das determinantes sociais elencadas na população em estudo salientam-se no gráfico 21, os factores de risco subordinados à vertente habitacional. Concluiu-se que mais de 50% desses factores se relacionavam com a presença de barreiras arquitectónicas, no momento da transição de cuidados hospitalares para a comunidade. Estas subentendiam muitas as vezes a capacidade de reformular, transformar e arquitectar novas formas de responder a uma situação de saúde nova, de caráter provisório ou permanente, bem como à necessidade de providenciar ajudas técnicas de apoio à doença. Por outro lado, foram colhidos dados referentes a falta de condições de higiene habitacional (10%), sobrelotação (5,5%) e ainda evidências de utentes sem abrigo (6,4%) e sem domicílio fixo estável (5,3%), Factores de Risco Social Habitacional (N 562)
54,6%
60,0 50,0 40,0 30,0 20,0 10,0
6,4%
5,3%
10,0% 3,0%
3,6%
5,5%
3,4%
4,1%
2,8%
,0
Gráfico 21 – Episódios sociais/ factores de risco social habitacional- 2009-12 (Fonte: SAAS, 2013)
Em conclusão, no gráfico 22, evidenciaram-se os principais problemas de saúde associados aos episódios sociais. A análise evidenciou uma predominância pelas patologias do aparelho urinário (19,1%) do aparelho circulatório (14,2%) e do aparelho respiratório (8,1%). Num segundo nível, as patologias associadas à saúde mental, à traumatologia múltipla e as relacionadas com o sistema nervoso tiveram distribuições na ordem dos 6%. As 13 áreas clínicas (num total de 30), que aqui se representam, expressaram, conjuntamente com a variável outros (7,6%), cerca de 88,7% da totalidade dos episódios sociais. Assim, as 17 outras áreas, não identificadas, representaram no seu conjunto cerca de (11,3%). Todas assumem valores inferiores a 1,1% dos episódios sociais. De todas essas interessou identificar as mais representativas, designadamente, as do aparelho genital masculino e feminino (1,1%); do foro dermatológico e da pele (1,1%); do foro hepatológico (1,1%), do foro traumatológico tóxico (1,0%) e do foro hepatológico (0,7%).
199
Factores de Risco Social por Áreas Clínicas (N 3049) 19,1% 20,0% 18,0% 16,0% 14,0% 12,0% 10,0% 8,0% 6,0% 4,0% 2,0% ,0%
14,2% 8,1% 2,0%
2,3%
3,3%
4,6%
6,4%
6,1% 3,5%
1,8%
6,6% 3,1%
Gráfico 22 – Episódios sociais /factores de risco social por áreas clínicas- 200-12 (Fonte: SAAS, 2013)
Sintetizando, a vulnerabilidade dos doentes, como se explanou neste capítulo descritivo, emerge de uma avaliação diagnóstica inicial que norteia a intervenção social. Se o problema social for pouco complexo a resolução social enquadra-se no âmbito dos recursos disponíveis e o grau de vulnerabilidade é controlado. Se tal não acontecer haverá lugar a discussão de hipóteses de intervenção à co- responsabilização de agentes sociais pelo projecto de vida (família, instituições de suporte, hospital). Nestes casos depreende-se que o grau de vulnerabilidade do doente foi motivado por múltiplos determinantes sociais, tais como: o enquadramento sociodemográfico, a conjectura pessoal, a vida familiar, os recursos económicos, as condições habitacionais, a vida profissional, entre outros.
200
CAPÍTULO 3 -
CUIDADORES
DE
DOENTES
EM
EXTREMA
VULNERABILIDADE:
DO
PLANEAMENTO DA ALTA HOSPITALAR AO DOMICÍLIO
RESUMO DE CAPÍTULO
Este capítulo expõe a vulnerabilidade do doente numa perspectiva mais abrangente, não per si, mas pelo olhar e pelas percepções dos seus principais cuidadores. As declarações dos entrevistados serviram para enriquecer a compreensão do fenómeno, valorizando a importância dos cuidadores informais (família) nos CLD. O objetivo do estudo passou por recolher depoimentos sobre a experiência vivida pelos cuidadores, pelas ligações entre cuidador/doente a agentes ou instituições formais/informais de prestação de cuidados, e por fim, pela obtenção de reflexões sobre o impacto da vulnerabilidade nas dimensões da vida do cuidador, colocando em evidência algumas diferenças de género na prestação dos cuidados.
11. REPRESENTAÇÕES
NO PROCESSO DE
“CUIDAR”:
DA EXPERIÊNCIA DO CUIDADOR ÀS
ESTRATÉGIAS DE ESTABILIZAÇÃO DOS CUIDADOS
A ESCOLHA DO CUIDADOR E O IMPACTO INICIAL DA TRANSIÇÃO DO NÍVEL DE CUIDADOS A escolha do cuidador tornou-se o resultado de um consenso (habilidade) ou de um conflito instalado (inevitabilidade) colocado aos familiares de linha directa/colateral do doente. Por habilidade entenda-se a experiência prévia como cuidador/a ou a capacidade de adaptação para gerir uma determinada condição de dependência. A questão da habilidade distingue uma predisposição para o apoio às actividades básicas e instrumentais da vida diária, por vezes repartidas entre um ou vários cuidadores, geralmente entre elementos da mesma família. “Lá no hospital deram-me a etiqueta de cuidador? (risos) eu apenas dava ajuda a minha mãe naquilo que era possível. Levava-o para fazer quimioterapia, para ir ao médico, para ir às consultas”.” (E9)
201
Por inevitabilidade entendeu-se, nas situações descritas pelos entrevistados, uma escolha de cuidador assente nas circunstâncias de ausência de prestadores óbvios (filhos, cônjuges) ou de ausência de alternativas negociadas, no caso da inexistência de descendentes, por exemplo: «Eles não tinham mais ninguém que tratassem deles, que olhassem por eles”. (E1) “A experiência pessoal tive de arranjar, não é.” (E4)
Segundo a versão das declarações, a escolha do cuidador, tanto no género masculino como no feminino foi determinada por duas ordens de razão que se conjugaram: a necessidade efectiva de cuidados ao doente e a afeição (familiar directa ou colateral). As variáveis que se distinguiram estiveram mais ao nível da relação de intimidade entre os intervenientes e traduziram-se por uma maior ou menor relação de pertença com o doente ao longo da vida. Essa proximidade ou afastamento originou um “estilo” de prestação de cuidados: De um lado, a obrigação moral; do outro a reciprocidade e o dever de responsabilidade: “E também é de obrigação, não é.” (E3) “Eu senti-me mais na obrigação de fazer.” (E1) “O médico disse que ela não deveria estar sozinha, deveria estar sempre acompanhada (…) e chegámos à conclusão que o melhor de facto era ela vir para casa.” (E7)
Uma última variável aferida traduziu uma prestação de cuidados de total disponibilidade, natural, sem impedimentos e exclusivamente por amor - tanto mais próxima quanto maior o nível de afectividade entre cuidador e doente, tal como mencionam nas seguintes asserções: “ Eu disse… ela precisa do apoio e a pessoa para lhe dar o apoio tenho de ser eu.” (E8) “Eu tratei dela em Torres Vedras com todo o meu carinho, com todo o meu amor e acho que fiz uma boa figura a tratar dela.” (E10) “Nem acho que é troca, nem uma obrigação, é mais de sensibilidade. Se tem empatia com alguém não pensa se custa ou se deixa de custar fazer qualquer coisa, é um impulso que tem, espontaneamente, não custa nada” (E2)
Relativamente à experiência pessoal na transição dos cuidados, os aspectos que mais se evidenciaram entre os entrevistados foram sentidos diferentemente entre homens e mulheres. Para os cuidadores do género masculino a questão central residiu no apoio que o doente recebeu por parte dos equipamentos de proximidade aquando o seu regresso ao domicílio. Por outras palavras, traduzem as dificuldades em beneficiar ou “fazer uso” do apoio formal por instituições de apoio pontual (apoio domiciliário) ou permanente (lares). As causas indicadas 202
para tais constrangimentos estão ligadas à escassez dos equipamentos e, consequentemente, ao seu acesso dada a sobrelotação dos recursos existentes. “Foi difícil, eu tive três anos à espera de uma vaga”. (…),”De apoio domiciliário.” (E3) “Do AVC, desde quando deu o AVC até aos cuidados domiciliários, (…) passaram-se dois anos, dois anos e meio, sensivelmente.” (E9)
No que concerne à experiência da transição dos cuidados para o domicílio, as cuidadoras colocaram a tónica das suas declarações em duas áreas distintas: Numa primeira, demonstraram apreensão pelos impactos subjacentes à dinâmica familiar, designadamente, por terem de lidar com um maior grau de dependência e com recursos insuficientes, o que condicionaria mais ainda a sua capacidade e disponibilidade. “. Foi muito complicada porque efectivamente a minha tia saiu de casa para ser internada, numa situação débil mas ainda com alguma autonomia e voltou completamente dependente”. (E5) “Implicava, fazer compras à minha mãe todos os dias, implicava o meu marido, muitas vezes, cozinhar em casa, e em casa da minha mãe quando estávamos lá.” (E6)
Ainda na perspectiva familiar, para as cuidadoras, a transição dos cuidados pressupôs maior diversidade de apoio familiar, mais colaboração e influenciou o grau de incerteza relativamente à capacidade objectiva do apoio no domicílio. “E quem tinha mais disponibilidade para tratar da minha tia era a minha mãe, que também já tem, na altura tinha 73 anos, ou seja, era já uma velhota a tratar de outra velhota, (E5)
A segunda área, considerada pelas mulheres cuidadoras, consubstanciou-se na articulação entre doente, família e unidade hospitalar. Por um lado, destacaram-se as considerações negativas sobre o planeamento da alta hospitalar e referentes aos reinternamentos sucessivos por agudização da doença. Por outro, as apreciações positivas, decorrentes do suporte ao ensino, à aprendizagem de técnicas e à passagem de Know-how no domínio da prestação dos cuidados. “O meu pai que estava numa situação debilitadíssima, que de mês a mês quase, era internado no hospital e ia para S. Francisco Xavier”. (E2) “Sim lá em casa, acamou. (…) Quer dizer eles lá no hospital viram perfeitamente que ele já não passava muitos dias, mas eles não querem lá ninguém e então mandam para casa” (E1) “Custou um bocadinho” (… )“ mas depois com a continuação (… )no hospital ensinaram-me a por o saco, e eu comecei a ver, a ver, e eu já fazia aquilo com uma certa rapidez”. (E10) 203
GRAU,
TIPO, DURAÇÃO E FREQUÊNCIA DO APOIO NO DOMICÍLIO: DA INSEGURANÇA À
ESTABILIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS
Quando há referência a um determinado grau ou tipo de cuidados, subliminarmente, pensa-se num denominador comum, a dependência. Esta pode assumir contornos de grande complexidade sendo mensurável numericamente através de escalas de medida, ou através de tipologias, previamente definidas, teoricamente. No âmbito deste estudo foram focadas, em todos os casos extraídos das asserções dos cuidadores entrevistados/as, situações de comorbilidade e de total dependência de actividades básicas e instrumentais da vida diária. De forma particular também se referiram a doentes que necessitavam permanentemente de terceiras pessoas (cuidadores) para que lhes pudessem ser garantidas essas necessidades, sob pena de ficarem comprometidas e de constituírem um risco de vida efectivo, caso não fossem colmatadas com a regularidade devida. Eis alguns exemplos: “Tinha um corpo muito pesado, não se mexia, já não andava” (E1) “Não se conseguia equilibrar de pé. Para se levantar tinha de ser ajudada, para tomar as refeições tive que lhe dar de comer também” (E7) “Quem a lavava era eu, limpava-a, levava-a para a sanita na cadeira do banho” (E8)
Apesar do “tipo” de dependência ser variável, fruto da diversidade de patologias e complicações inerentes a cada caso particular, o grau de dependência demonstrou sempre os valores mais críticos nos casos que estes cuidadores acompanharam, como comprovam algumas das suas declarações: “Sozinho não, ele tem um problema no andar, tem spina bífida, e depois tem um conjunto de problemas, já foi operado aos rins, já foi operado ao coração, e pronto, a gente tem-no mantido em casa” (E3) “Depois a própria doença dele que era a pior, Parkinson, juntamente com os AVC, s, segundo o médico, davam-lhe AVC, s constantes, de repetição, apesar de serem quase imperceptíveis” (E9)
A gradação crescente e/ou cíclica da instalação da incapacidade foi muitas vezes sugestiva de reavaliação médica e esta desencadeou, frequentemente, a prestação de cuidados mais complexos, ora com maior frequência de regime diário, ora com aumento de complexidade. “Foi-se degradando, degradando, degradando e eu de maneira que eu praticamente tinha de fazer tudo.” (E4) “Levou dois bypass, isto em 2007… ou 2006 e a partir daí, teve uma série de confusões… ficou diabético, depois teve glaucoma nos olhos e teve que ser operado porque ficou meio cego” (E2)
204
A calibração de novas necessidades foi, não raras vezes, sustentada, provisória ou permanentemente por meio de produtos de apoio de suporte de vida, tais como o recurso a oxigenioterapia e à manutenção da actividade respiratória (ventilação invasiva e não invasiva) - como ainda no apoio a actividades básicas essenciais para a vida diária, como meios de auxílio à alimentação (sonda nasogástrica), e à eliminação (aspiração de secrecções, colostomia, algaliação, diálise). “E esteve muito mal… ali no HSFX… teve quase a patinar… depois esteve ligada à ventoinha (ventilador). Eu ia lá e não falava comigo.” (E10) ” “O mais complicado de a minha tia estar acamada era ter de fazer a diálise em casa” (E5)
DURAÇÃO E A FREQUÊNCIA DOS CUIDADOS Em sentido lato, o tipo de assistência dedicada a estes doentes traduziu-se por um compromisso de empenho de longa duração, caracterizou-se pelo elevado registo de reinternamentos hospitalares e pelo aumento gradual da frequência de cuidados ao longo da evolução da doença, como atestaram as declarações dos cuidadores. A prestação de serviços aos doentes foram em alguns dos casos, exclusivas dos cuidadores principais, noutros foram partilhadas por familiares directos ou colaterais e nalguns casos aliaram instituições de suporte, maioritariamente, de apoio domiciliário. “Foram anos. Para aí uns três ou quatro anos assim. Sim, eu ia lá todos os dias, todos os dias, ao sábado e ao domingo também” (E1) “Durante três anos tive que tratar da minha mãe, que ela começou a fica debilitada e eu tinha que lhe fazer quase tudo em casa.” (E4) “Acabou por se passar um ano… este ano foi portanto o mais complicado.” (E5) “Portanto, eu, estes 10 anos é que lhe dava o comer, eu é que a vestia”.(E8)
ESTRATÉGIAS NA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS NO DOMICÍLIO Face aos elementos aduzidos nas declarações anteriores que qualificaram a natureza dos cuidados, foram relatadas as estratégias interventivas como resposta à compreensível insegurança na assunção da responsabilidade por doentes que estão numa situação de extrema vulnerabilidade. Foi possível apurar pelos depoimentos dos cuidadores (homens e mulheres), que o processo de adaptação de respostas resultou de duas ordens de razão: Uma primeira, relacionada com a eliminação de barreiras arquitectónicas para facilitar o máximo bem-estar ao doente; “Fizemos uma casa de banho própria, com duche, cadeira” (E2) 205
“Quando fizemos obras o meu irmão disse não vale a pena uma banheira aqui, aqui basta um duche, e foi melhor, que é muito mais fácil.” (E6) “Modifiquei a casa de banho” (…)Comprámos uma cadeira, só para ela ir ao banho mesmo.” (E8)
Uma segunda que derivou da adaptação do doente e do cuidador a técnicas substitutivas de autonomia funcional (oxigenoterapia, hemodiálise, alimentação entérica por sonda nasogástrica) e a técnicas de apoio às actividades básicas da vida diária (colostomia, algaliação). “A única coisa que precisou porque tinha muita falta de ar, era do aparelho ligado à electricidade (concentrador de oxigénio), ainda o tive aqui dez dias” (E4). “Depois da hemodiálise, colocaram-lhe um saquinho, portanto, um outro tipo de hemodiálise, grande parte do dia a minha tia passava presa à máquina que lhe permitia fazer a diálise (peritoneal)” (E5).
A ESTABILIZAÇÃO DOS CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO Depois da integração das medidas, referidas nos parágrafos anteriores, tidas como fundamentais por diminuírem o impacto da vulnerabilidade no domicílio, e em concreto, nos cuidadores informais, importou compreender como se consolidou o apoio, até ao ponto em que se estabeleceram os cuidados e o equilíbrio da dinâmica familiar e se foram diminuindo os riscos e a incerteza para os cuidadores. Entre os homens e mulheres entrevistados ficou reconhecida uma estabilização positiva e, uma outra, negativa. A estabilização positiva patenteou-se pela adaptação do doente e do cuidador (motivação e participação) tanto ao nível da eliminação das barreiras arquitectónicas como da tolerância e adaptação a técnicas invasivas de apoio. “Como ela se viu e como ela se vê agora, não está boa, boa, boa, boa…mas está dentro do nível. Acho que ela foi uma grande mulher “ (E10) “Mas agora quando foi operado ao rim e não tem urina” (…) “A máquina é que separa, já está melhor do que estava” (E3)
A estabilização negativa esteve associada à recorrência excessiva aos serviços de urgência, a cuidadores formais substitutivos por incapacidade familiar e à dificuldade do doente gerir a sua própria doença. “Quase que de mês a mês, era internado no hospital e ia para S. Francisco Xavier” (E2) “O que me incomoda mais é que ele tinha uma algália, e muitas vezes a algália saía do lugar, e era um cheiro a urina, porque ele tinha uma infecção e era um cheiro insuportável,” (E3) 206
11.1. O APOIO FORMAL E INFORMAL NO DOMICÍLIO: MITOS E REALIDADES A EXPERIÊNCIA FORMAL DO APOIO SOCIAL E EM SAÚDE A experiência formal reconhecida pelos cuidadores foi percepcionada principalmente através do rendimento proveniente do Centro Nacional de Pensões, fruto do regime contributivo ou não contributivo, conforme os casos, da Segurança Social. Houve referências aos apoios subsidiários por invalidez e aos complementos suplementares à reforma, sendo grande parte destas atribuições pecuniárias, agilizadas em contexto hospitalar dada a falta de informação ou a não utilização de recursos. As respostas de certos interlocutores evidenciaram também o desconhecimento de alguns direitos ou a não utilização destes, tanto por recusa familiar, como por preferência de apoio informal. “Pedi o apoio a terceiros, penso que seja a assim que se chama”. (E1) “Ela tinha uma pensão de invalidez”. (E5) “Ela tinha uma pequena reforma, e eu como filha, se ela precisava de alguma coisa eu ajudava”. (E4) “Tem a reforma dele, tem, tem os complementos”. (E3)
O
APOIO FORMAL DAS ORGANIZAÇÕES ESTATAIS, PRIVADAS E DO TERCEIRO SECTOR:
OS
CUIDADOS DE SAÚDE E OS CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS O apoio do Serviço Nacional de Saúde (SNS), segundo as declarações transmitidas pelos cuidadores dos doentes, esteve concentrado em grande parte nos cuidados hospitalares – estendendo-se a estes, o serviço de transporte de doentes e a cedência de produtos de apoio subsidiados (ajudas técnicas). “Tive um apoio grande do hospital. As médicas foram incansáveis pá, todas.” (E8)
“Isso era uma segurança, de serem obrigados a fazerem o transporte”.(E2) “Sim, deram à minha tia.” (uma cadeira de rodas) ” (E1)
Os cuidados de saúde primários, pelas declarações dos cuidadores, assumiram um papel secundário desencadeado a partir das unidades hospitalares de referência, não existindo, em grande parte dos casos, um acompanhamento prévio pelo médico de família ou pela unidade de referência. “Não, ela nunca ia ao centro de saúde, era raro ir” (E4) “Tivemos uma vez (apoio centro saúde) ”Houve uma altura, lá no hospital, fizeram uns cortes, e depois fizeram uns pensos, e nessa altura trouxemos um papel e o enfermeiro ia lá trocar o penso. Mas apenas a esse nível.” (E5) 207
A RNCCI que combina a saúde e o apoio social também desempenhou um papel residual. Quando sugerida pelos profissionais de saúde, segundo as declarações recolhidas, a opção, genericamente entre homens e mulheres foi: A recusa da integração em unidades (dado o custo elevado dos co-pagamentos), a comunicação tardia do tipo de cuidados no domicílio, ou depois de aferida a possibilidade de apoio integrado, a preferência pelo apoio informal. “Depois tenho um processo à parte do centro de saúde (RNCCI), Para a rede de longa duração, o centro de saúde, tratei da documentação toda.” (…) “Não, eles depois disseram-me que de facto havia uma vaga, mas eram oitocentos euros e eu, oitocentos euros, a reforma dele não dá para isso” (E3) “Sim, sim ao princípio, (…) Mas eu também lhe disse a ela, se eu pudesse tomar conta dela e acartasse com as consequências das coisas, preferia que ela não fosse para essas coisas.” (E4)
A IMPORTÂNCIA DO TERCEIRO SECTOR E DO PRIVADO: O APOIO SOCIAL ESTRITO O Terceiro Sector deteve na vertente do apoio domiciliário, segundo as opiniões dos cuidadores, um papel capital no apoio aos cuidados de conforto. Destacou-se pela assistência ao nível da alimentação, higiene pessoal e habitacional. No entanto, apesar de se constituir como a resposta mais consensual, algumas cuidadoras mulheres acumularam em si a responsabilidade por todos os cuidados, bem como houve outras que a conjugaram com as instituições de proximidade da rede pública ou privada. “Não, não, não chegou. Eu cheguei a falar, mas não” (relativamente a SAD) ” (E1) “Nós pagámos junto da freguesia de Caxias, fomos falar com as assistentes sociais” (E2). “Não eu nunca tive nada disso, nunca pedi nada disso, porque achei que conseguia eu fazer as coisas, não é”.(E4)
Os cuidadores homens preferiram e deram maior importância à combinação do apoio formal e informal da rede pública, no entanto, não excluiram apoio privado em caso de necessidade. “Os cuidados, nós tivemos que depois de recorrer, à Associação de Idosos e Deficientes de Oeiras“ (…) inscrevemo-nos lá”, (…) “e conseguimos que viessem dar um apoio todos os dias úteis.” (E9)“E do apoio privado, aos fins-de-semana pagávamos 170 euros” (E9)
O apoio privado serviu apenas para colmatar as insuficiências dos serviços públicos (lotados), estando a principal causa relacionada com o custo dos serviços. Es apoio foi, sobretudo, utilizado aos fins-de-semana e feriados, e em regime provisório, pois grande parte dos serviços da rede pública encerra aos dias de descanso e nos dias de feriado.
208
“De maneira que fizemos um contrato com eles e eles vinham todos os sábados e domingos e quando houvesse algum feriado pelo meio.” (E9).
O APOIO INFORMAL DOS CUIDADORES: QUE EXPERIÊNCIA FAMILIAR O apoio informal, em particular o familiar, foi sem dúvida o mais evidente. Ao principal cuidador coube a gestão dos cuidados do doente, ainda que possa ter existido partilha de responsabilidades entre outros cuidadores formais ou informais. Este esclarecimento tornouse mais claro com os depoimentos de mulheres cuidadoras (em exclusividade), por opção familiar e/ou por circunstâncias geográficas: “Não não houve ninguém”(…) “Sim fui eu que fiz tudo, tudo, tudo o que foi preciso” (E1) “ Eu tenho cinco irmãos, mas praticamente fazia sempre eu tudo sozinha. A não ser um irmão que a transportava quando ela precisava”. (E4) “Como era eu a única que morava mais perto. Fui eu que levei com os problemas todos”. (E4)
Por outro lado, as cuidadoras não exclusivas delegaram funções entre membros da família nuclear e alargada (cônjuge, filhos, sobrinhos, outros) cujas tarefas e tipo de cuidados estão bem definidos entre os vários elementos – normalmente actividades instrumentais da vida diária. “O que nós fazíamos era tentar, entre filhos, (…) conciliar idas lá a casa para o tirar da cama, para o levar um bocadinho ao jardim, ou pura e simplesmente para o levar a ir fazer as necessidades” (E2)
Na experiência informal, salientando a narrativa dos homens cuidadores, foi também a família que se constituiu como a condutora da maior parte dos cuidados, contudo, o principal cuidador não é a referência, ou melhor, não centraliza a maior parte dos cuidados prestados ao doente, tal como acontece no caso das mulheres. Do que foi possível aferir, o homem como principal cuidador assegura, maioritariamente, actividades instrumentais da vida diária, tais como: acesso a transportes, o controlo da medicação, o acompanhamento a consultas, a resolução de questões burocráticas e administrativas, o acompanhamento de processos para integração em instituições. “Eu também ajudava a tirar ou a pôr (mobilização/levante), e a ir depois às consultas, às análises”.(E7) “Para a rede de longa duração (RMCCI), no centro de saúde, tratei da documentação toda.” (E3) “Eu tomei nas minhas mãos a toma dos medicamentos” (E9)
209
Ainda que participe nas áreas “chave” da prestação directa de cuidados, como a higiene pessoal e alimentação, por exemplo, são outros familiares de proximidade, designadamente mulheres (mãe, irmã, filha), ou até a rede formal em regime pontual, a assegurar as actividades básicas da vida diária. “A minha irmã que mora próximo da casa dos meus pais, também dava apoio” (E9) “Tenho as senhoras para me fazerem a limpeza (higiene pessoal), não é, tenho quem lhe faça a higiene, mas vou ter que pagar a uma pessoa para lhe fazer as refeições, mas tenho de resolver não é.” (E3) “E depois havia a questão do banho que era a minha mãe que ajudava”. (E7)
A ARTICULAÇÃO ENTRE APOIO FORMAL E INFORMAL O que foi possível apreender na dinâmica dos cuidadores principais, tanto nos homens como nas mulheres, é de que quanto maior for a conjugação de apoio, tanto mais equilibrada se torna a gestão dos cuidados de actividades e tarefas pois está distribuída por vários intervenientes e sobre o cuidador principal não impende tanto desgaste físico e psicológico. “ (… ) ” Iam dar-lhe a alimentação todos os dias, lavavam-no todos os dias, excepto ao sábado e ao domingo que éramos nós que lavávamos” (E2) “Tivemos que arranjar alguém, porque eu de alguma forma estava numa situação que, não podia abdicar do meu trabalho, porque é a minha fonte de rendimento” (E5)
11.2. O IMPACTO DA VULNERABILIDADE DO DOENTE NO CUIDADOR
A EXPERIÊNCIA PESSOAL A forma como cada indivíduo viveu e geriu a prestação de cuidados manifestou-se em várias dimensões da condição humana. Contudo, no que respeita à dimensão pessoal pode concluirse que o impacto é muito semelhante entre cuidadores homens e mulheres. Dos testemunhos expressos pelos cuidadores, o impacto ao nível individual levou ao cansaço físico e psicológico generalizado, e em situações limite, ao estado depressivo de alguns intervenientes - dado o carácter rotineiro da prestação do apoio (agudizado por vezes, pela condição de doença do próprio cuidador e/ou pela sua idade avançada). Coube ainda nesta dimensão o sobrepeso, relativamente aos cuidadores que se responsabilizaram pelas actividades básicas da vida diária, como a alimentação, a higiene pessoal, a garantia dos posicionamentos no leito, entre outras. “Estava esgotada. A minha mãe não conseguia dormir”(…)” uma das questões quando se passa muito tempo sentada ou acamada é que as nossas rotinas de sono também se alteram,” (E5) 210
“Estava completamente esgotada, daí algum desconforto de relacionamento entre os dois no final” (cônjuge) (E2) “Ao fim de uns anos vi, de facto que estava saturado, e estou saturado, porquê? Porque de facto são muitos anos” (E3) “Foi bastante duro, sobretudo porque eu agora estou, também com uma depressão por não ter dormido o suficiente, nesse espaço de tempo, não é, foram dois anos.” (E7)
O IMPACTO FAMILIAR E RELACIONAL Das evidências possíveis de constatar para as mulheres cuidadoras salientaram-se as questões relacionadas, simultaneamente, com o papel de cuidadora e de mãe de família com filhos a cargo, principalmente no caso de filhos menores e/ou com problemas de saúde. Noutras situações distinguiram-se os casos em que não houve qualquer apoio adicional de familiares com a excepção da cuidadora principal, para que pudessem ser partilhadas tarefas e responsabilidades, o que onera de forma mais incisiva a vida relacional e familiar de quem assegura a totalidade dos cuidados. “Eu tinha duas filhas em que a mais pequenina tinha um ano e a mais velha tinha três, ou seja, eu também tinha duas crianças muito pequenas para tomar conta.” (E5) “Tenho três filhos, portanto tenho de tirar tempo à minha família para dar apoio à minha mãe. (…) Por exemplo, o meu filho do meio, o que é Asperger, é um filho que ainda hoje não lida muito bem com alterações de rotina.” (E6)
Já em relação aos cuidadores do género masculino, o impacto familiar e/ou relacional não se revelou tão significativo, uma vez que a sua condição raramente foi experimentada em exclusividade. Houve, contudo, não de forma muito expressiva, impactos relacionais na relação com grupos de pares. “A maior parte das pessoas, e até de alguns familiares não tão chegados, deixam de telefonar.” (E7)
O IMPACTO SOCIAL A maior ou menor intensidade do impacto social na vida dos cuidadores esteve associada, tal como nas duas dimensões anteriores, ao regime de prestação de assistência a que cada cuidador esteve sujeito, seja por opção do próprio ou por inevitabilidade. Por norma, e como se aferiu nas constatações dos entrevistados, tanto os homens como as mulheres que são cuidadores “exclusivos”, ou seja, que não partilham os cuidados com mais nenhum outro elemento de suporte, formal ou informal, são os mais penalizados na vida social. Conseguiu reconhecer-se que a necessidade/frequência de cuidados diários do doente implica uma directa 211
e comprovada privação de actividades que eram habituais, antes da sua condição enquanto cuidador. Entre estas destacam-se actividades extra laborais, saídas de fins-de-semana, ocupação de tempo livre com hobbys, usufruto de períodos de descanso e férias, enfim, de tempo livre. Todavia, também houve cuidadores que consideraram não ter existido qualquer tipo de impacto nas suas vidas. “Eu não tinha a minha vida própria, por exemplo, ia aos sábados, aos domingos, tinha de estar ali sempre aquela hora, tipo a marcar o ponto, e ele era (…) tinha um feitio horroroso” (E1) “Conciliava a manhã para mim e a tarde para ela até à noite, nunca tive assim problemas.” (E4) “E deixei de ter tudo, a minha vida, os meus amigos, férias. Acabou tudo, não posso ir de férias, não é…E deixar o meu cunhado.” (E3)
“Para mim foi violento porque tive semanas que não saía de casa. (…). Há amigos meus que até há pouco tempo estavam convencidos que eu me tinha zangado ou que estava chateado com eles”. (E7)
O IMPACTO NA ESTABILIDADE ECONÓMICA E NAS RELAÇÕES DE TRABALHO As implicações da prestação de cuidados sobre o rendimento do cuidador não registaram evidências significativas, na medida em que o doente, em regra, aufere rendimentos provenientes de pensões de regime contributivo ou não contributivo. No entanto, o que se salienta como efeito colateral está relacionado com o acesso a serviços e/ou à integração em equipamentos sociais. Pelo facto de integrar o agregado familiar, o cuidador viu-se implicado (como detentor de rendimentos) no processo de capitação. Este procedimento colocou, por vezes, inquietações nas famílias que pretenderam agilizar recursos, tendo naturalmente que submeter-se às exigências e às normas de acesso às políticas sociais, designadamente, nos processos de integração em instituições abertas (serviço de apoio domiciliário), fechadas (lares e residenciais) ou “integradas” (unidades de cuidados continuados integrados). “Anulei (RNCCI) porque não tenho condições para estar a pagar oitocentos euros de mensalidade. Não pode ser, eu não posso pagar. Sou eu depois que tenho de pagar o restante”. (E3)
Se de facto as despesas da saúde aumentaram, tanto com a contratação de serviços, como na aquisição de bens e serviços, e com a medicação, os relatos sugeriram um peso que onera com maior expressividade o doente, já que este é que se constitui como o fiel depositário dos cuidados. “Ela gastou muito dinheiro em ambulâncias e nunca teve a ajuda de ninguém (…) Foi ela não se poder mexer e ter que gastar muito dinheiro nos sacos (colostomia) ” (E10) 212
Ainda que os custos para o cuidador resultem da condição de prestador de cuidados aferiu-se pelo discurso de alguns entrevistados, uma maior preocupação em flexibilizar os seus horários laborais de forma a poderem corresponder às necessidades daqueles de quem cuidam. Mesmo assim, esta representação não é significativa, pois a maior parte dos cuidadores destes doentes esteve livre de ocupação laboral ou beneficiou da flexibilidade da entidade empregadora. “A nível profissional perde-se muita coisa. Não ter aceite certos trabalhos. Cheguei a ser convidado para ir trabalhar nos EUA, tive que adiar e recusei, com muita pena”. (E7) “Eu na altura não tinha trabalho, estava desempregada… e devido à idade dele e às várias dificuldades que ele tinha eu disponibilizei-me para ajudar naquilo que ele precisava”. (E1)
“Tenho uma chefia que me facilitava, eu trabalho na RTP, e nós temos um sistema de cumprimento de horário que nos facilita. (E2)
AS
FRAGILIDADES DOS CUIDADORES: DA GESTÃO DA INCERTEZA À CALIBRAÇÃO DA
RESPOSTA SOCIAL
Entre a “frieza” do atendimento hospitalar, geradora de insegurança e a falta de colaboração do doente, na sua incapacidade de gerir ou de aceitar a sua condição, considerou-se, com o acordo das opiniões transmitidas que a vulnerabilidade do cuidador esteve associada com maior expressão nos casos em que se manifestou agravamento no grau de dependência ou agudização da condição crónica dos doentes. “Ai, custava tanto, tanto, tanto.” (…) Não colaborava com nada”(E1) “Com o meu cunhado, houve muitas vezes que senti que não conseguia”(E3)
De importante ressalva, cabe referir que grande parte dos cuidadores principais do género masculino não assegurou os cuidados básicos da vida diária aos doentes. Para estes, a substituição do cuidador que presta esse tipo de cuidados mais directos, seja a título formal ou informal, constitui um motivo de grande insegurança e inquietude. “Vou ter uma prótese, de fémur“. (…) Estou com medo se me chamarem para ser operado quem é que toma conta do meu cunhado”. (E3) “Tive momentos desesperantes de não conseguir.” (E7)
Relativamente à gestão da incerteza, em consonância com os relatos das mulheres cuidadoras, transpareceram afirmações que estão ligadas à impotência das próprias na resposta ao avanço da doença e nas interrogações às estratégias de apoio permanente e ao manuseio de técnicas específicas, para manutenção das funções básicas da vida dos doentes.
213
“ (sobre diálise peritoneal) “A pessoa ia ligar e obviamente voltava na altura que fosse para desligar e a minha mãe estava sempre em pânico que fosse começar a disparar e que acontecesse alguma coisa à minha tia que ela não soubesse o que fazer.” (E5) “Sinto que realmente há-de vir o dia em que as coisas se vão complicar e vai surgir a pergunta. Vai para uma instituição ou vai ficar em casa?” (E6)
Por outro lado, e sobre a incerteza, os homens cuidadores, em coerência com outras declarações anteriores, destacaram a falta de preparação para responder às exigências dos cuidados e de não saberem a quem recorrer em situações limite. “Nós nunca estamos preparados, nem ninguém consegue dizer que está preparado para situações destas. Mas também não temos informação nenhuma” (E7)
Em jeito de conclusão, as últimas revelações dos cuidadores de doentes em extrema vulnerabilidade, esclareceram como foi possível responder à complexidade das situações por eles/as experimentadas. Por outras palavras, apuraram como se modificaram contextos familiares descritos como inseguros e incapazes, para transformá-los em famílias mais equilibradas pela capacitação dos cuidadores, pela negociação de meios e pela agilização de recursos, designadamente, através do acesso a técnicas de apoio às actividade básicas e instrumentais e pelo encaminhamento/integração em serviços de proximidade. Finalmente, destacaram-se as descrições das cuidadoras como medidas de calibração e de equilíbrio para a manutenção do apoio no domicílio, nomeadamente: através de informações sobre alternativas disponíveis para amenizar a responsabilidade informal, a activação de resposta domiciliária permanente, a institucionalização e o acompanhamento do serviço social hospitalar. “Uma pessoa de confiança” (…) “que havendo a necessidade de mais apoio e aquele nós não podemos dar, a por lá alguém, é ela. É pagar-lhe e ela ficar lá mais tempo porque é a pessoa que conhece os meus pais há 20 anos”.(E6)
No que concerne aos cuidadores do género masculino verificaram-se os testemunhos da necessidade de um aumento no apoio formal e a aceitação da institucionalização como resposta à insegurança do cuidador, como se comprovou pelas afirmações seguintes: “Chegámos a pensar em conversa com a assistente social do HEM, ela chegou a arranjar-nos uma listagem com os lares, para tentar, para pormos o meu pai num desses lares.” (E9) “Nem é isso, é como proceder, e onde recorrer no caso de se agravar. Em termos de apoio, era haver uma visita que seja alguém também que venha conversar” (E7) 214
PARTE V INTERPRETAÇÃO E DISCUSSÃO DOS DADOS EMPÍRICOS: QUE RESULTADOS
CAPITULO 1 - A
POLÍTICA DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS EM PORTUGAL:
REPRESENTAÇÕES DE DECISORES E DE PERITOS EM SAÚDE
RESUMO DE CAPÍTULO
O capítulo que se apresenta permite enquadrar conceptualmente o material recolhido através da técnica de entrevista aprofundada a interlocutores privilegiados, e não se limita à descrição (Parte IV), tendo procurado o sentido subjacente dos factos narrados e a sua articulação com conceitos teóricos estruturados. É também importante salientar que a interpretação da análise de conteúdo tem por base a ferramenta de gestão (Análise SWOT) que se constitui por um sistema simples que posiciona a posição estratégica, neste caso das declarações dos peritos e decisores em saúde sobre CCI, no modelo organizacional em questão, estando ilustrada por representações esquemáticas onde figuram as categorias resultantes do processo metodológico.
Considerando as representações da política de CCI, a análise esquematizou os depoimentos dos vários intervenientes, num contexto de forças e de fraquezas, de ameaças e de potencialidades, salientando dimensões de risco e de incerteza (vulnerabilidades), tanto numa perspectiva actual como nas estratégias a adoptar futuramente.
12. A
EMERGÊNCIA DA ARTICULAÇÃO SECTORIAL NA SAÚDE E A SUSTENTABILIDADE DOS
CUIDADOS CONTINUADOS NOS CUIDADORES INFORMAIS
A RACIONALIZAÇÃO DO FINANCIAMENTO No que respeita ao domínio do financiamento dos CCI, em que o conceito e especificidade não estão necessariamente dentro das atribuições de todos os entrevistados, ressaltam duas aproximações consensuais. A primeira diz-nos que o financiamento está ligado à racionalidade económica e à diversidade de financiadores, ou seja, corrobora-se a posição de que: 215
“ (…) “O serviço público não se pode alhear da responsabilidade de gerar diversidade, competição e resposta adequada, de forma a promover uma melhor utilização dos recursos e a proporcionar melhores serviços aos cidadãos (Fernandes et al., 2011, p.92-93).
Assim, há uma compatibilidade com o preceituado por lei no Artigo 46º do DL 101/2006, de 6 de Junho “que obedece ao princípio da diversificação das fontes de financiamento e da adequação selectiva”, da RNCCI (OPSS, 2011, p.14), particularmente entre os decisores políticos, que é também comprovada pelas conclusões do Relatório da Primavera de 2011 “(…) Num momento em que a crise económica e financeira é uma preocupação absoluta em que se questiona a sustentabilidade da Segurança Social, e em que as medidas de austeridade poderão ter repercussões neste nível de cuidados” (OPSS, 2011, p.18). A segunda aproximação entre os especialistas em saúde, revela um conjunto de responsabilidades através de um “novo” contrato social que permitiria o ajustamento à realidade portuguesa colocando o cidadão no centro da prestação de cuidados, e que inclui: “o terceiro sector, os agentes económicos, as profissões de saúde, a formação e a investigação.” Por outro lado, os especialistas consideram ser indispensável “determinar os níveis de desempenho que o financiamento disponível deve assegurar, bem como utilizar “políticas públicas adaptativas” (Sakellarides, 2010, p.161) que retirem financiamento aos cuidados diferenciados. CRÍTICA AO HOSPITALOCENTRISMO E À ARTICULAÇÃO ENTRE SAÚDE E SEGURANÇA SOCIAL Nas declarações dos vários intervenientes entende-se que a concentração contínua de cuidados na área hospitalar não tem permitido levar a cabo, as reformas estruturais desenhadas para o SNS, principalmente no que respeita à reforma dos CSP, e consequentemente, à melhor integração de CCI. Esta transição permitiria equilibrar a despesa pública e beneficiar os cidadãos, e evitava desperdícios/constrangimentos como os que se podem aferir por alguns indicadores, como por exemplo nos Serviços de Urgência: “ (…) O principal motivo apontado pelos utentes para se dirigirem a uma urgência hospitalar (…) é o atendimento mais rápido (42%) sendo justificação particularmente apontada nas regiões Norte e Centro (…), bem como em Lisboa e Vale do Tejo, Região onde os utentes também mencionam mais vezes não querer esperar por uma consulta.”
(Silva & Cabral, 2009,p.86).
Perante as evidências não se estranham as considerações dos decisores políticos da área da saúde. Até porque, inversamente, apesar do esforço adicional nos CSP, em particular nas 216
Unidades de Saúde Familiar continua a (USF) “(…) faltar-lhes o essencial de uma visão integradora dos cuidados de saúde, o que tornará muito difícil afastar a procura da urgência, muita da casuística que hoje aí aflui” (Escoval, 2008, p.267). Esta percepção, por parte dos decisores políticos entrevistados, resulta da tradição desigual de financiamento, alimentada ao longo de décadas de existência do SNS e também“protegida” por muitos profissionais de saúde, enraizando a ineficácia /ineficiência do modelo clássico, em detrimento de um modelo integrador e de uma visão multidimensional, junto das estruturas e dos agentes que dele fazem parte – e que potenciam a continuidade dos cuidados: “A desequilibrada atribuição de recursos do SNS aos cuidados primários e aos hospitalares, é simultaneamente causa e consequência do problema básico: uma manifesta incapacidade da medicina familiar se impor como verdadeiro “gatekeeper” do sistema, tratando com sucesso 80% da procura e derivando para especialistas hospitalares apenas os restantes 20% dos casos” (Escoval, 2008, p.266).
Se endogenamente as contribuições dos interlocutores são críticas, as “reprimendas” à relação entre Segurança Social e Saúde também merecem destaque. Mais de metade dos entrevistados anuncia algum tipo de afastamento sectorial entre ambos os sectores e pretende ver reforçada esta ligação, ainda que não seja uma tarefa fácil, dadas as especificidades de cada sector. Aliás, como demonstra uma das medidas correctivas do Relatório de Primavera de 2011, na rubrica: “Melhorar a articulação entre os diferentes sectores envolvidos (e.g. Saúde, Segurança Social, Autarquias) aumentando a eficácia das intervenções e reduzindo os custos” (OPSS, 2011, p.19). O entrosamento entre Saúde e Segurança Social acarreta a compreensão profunda pelo objectivo da política de CCI, à qual se ancora a indispensável flexibilidade no entendimento do que é do escopo social e da saúde, até porque as questões do envelhecimento ocasionam a alternância do mix de cuidados, nas populações mais idosas, ora entre prestação de cuidados de saúde, ora assistenciais, de apoio social. Essa percepção implica não só uma cooperação intersectorial forte, como a certeza de que se trata de uma política essencial para a sustentabilidade dos CLD em Portugal. Em jeito de conclusão, com o intuito de fortalecer as opiniões dos interlocutores, destaca-se a seguinte afirmação: “There remain many challenges of better integrated care for older persons between health and social services. Frail older persons have complex service needs that often combine acute health care, rehabilitation, nursing care and another social service. Services of prevention and rehabilitation that could contribute to preventing or postponing dependency and functional limitations that lead to the need for long-term-care services are still underdeveloped in many countries. (Huber, 2006, p.114)
217
A SUBSISTÊNCIA DOS CUIDADOS CONTINUADOS NOS CUIDADORES INFORMAIS Das considerações colhidas salientam-se com maior expressão, as interpelações ao investimento na família e nos cuidadores informais. O que se extrai da análise aprofundada das entrevistas é a evidência de uma gradual transferência de responsabilidades do Estado para outros sectores da sociedade, nomeadamente, para o privado, para o Terceiro sector e para a Família. O aumento das necessidades de prestação de CCI causa impactos que envolvem a excepcional compreensão das famílias, na medida em que as transferências de responsabilidade para entidades e organizações que as deveriam executar são morosas ou insuficientes para a procura desse nível de cuidados. Esta situação onera o contrato social celebrado com os doentes e exerce pressão sobre as famílias, pois ao representarem os interesses dos doentes, são sobrecarregadas com o “fardo” das ineficiências da RNCCI, tanto ao nível do acesso a medidas, como da articulação entre cuidados hospitalares e de CSP. Alguns dos constrangimentos têm origem na carência de unidades e de equipas, especialmente domiciliárias, nas grandes zonas urbanas. Outras, estão associadas à gestão das altas hospitalares, em particular, ao tempo que intervala a referenciação e a efectiva integração na RNCCI. Estando o orçamento da saúde esgotado, não é fácil responder ao envelhecimento populacional, ao incremento da dependência e à sobrecarga familiar (cuidadores em idade activa e com responsabilidades pelos seus descendentes). Os entrevistados, alegam que no lugar das respostas de CCI desenhadas e não satisfeitas, deva existir maior investimento nos cuidadores informais (ex.promoção da literacia em saúde): para fomentar a coesão social e para não se aumentar o gasto público em cuidadores formais. Noutra perspectiva, também se deve abrir espaço ao mercado de cuidadores informais para salvaguardar famílias muito vulneráveis da realidade que o sistema de saúde e de protecção social não têm conseguido gerir, porque na ausência, insuficiência, indisponibilidade de vagas, de equipas diferenciadas ou outras, tem sido esta instituição milenar, a dar garantias de continuidade de cuidados, como comprovam as declarações seguintes: “It is generally recognised that long term care very much relies on the participation of private households that still provide the largest share of care hours in all countries and in many cases have also to shoulder a large burden of financing in case formal services are needed. Informal care-giving is consequently an indispensable component of care for older persons with long-term care needs (Moise et al, 2004, citado por Huber, 2007, p.11).
218
FORÇAS
FRAQUEZAS
Reforço nos CSP
Papel dos cuidadores informais e da família
Racionalização do financiamento hospitalar
Diversificação de financiadores de CCI
Pouca diferenciação de cuidados (paliativos)
Articulação do sistema de saúde (afastamento dos níveis de cuidados entre CH, CSP e CCI)
Acesso Aproveitamento da capacidade instalada do terceiro sector
Gestão de altas hospitalares e resistência dos profissionais de saúde aos CCI
CUIDADOS CONTINUADOS EM PORTUGAL
Financiamento (escassez e flexibilidade)
Entrosamento entre MS e MTSS
Fundações como parceiros
CCI rubricado no OE Incentivos às unidades de saúde por níveis de articulação /eficiência
Convergência de respostas de MS e SS para resposta sustentável
OPORTUNIDADES
Má Articulação entre MS e MTSS
Estatal reduzida
Burocracia, Insuficiência de Recursos humanos na SS e MS
Modelo hospitalocêntrico
AMEAÇAS
Figura 8 – Representações dos interlocutores sobre CCI em Portugal
12.1. UMA APRECIAÇÃO “ON-GOING”: POTENCIALIDADES E CONSTRANGIMENTOS
As opiniões colhidas junto dos vários intervenientes despoletaram um conjunto de respostas e interpretações distintas entre si. Muitas resultaram da experiência e da valorização que cada interlocutor atribuiu aos temas em discussão, assumindo-se que as que foram relatadas por um maior número de indivíduos foram certamente as mais relevantes. As referências estiveram relacionadas com: a prevalência dos cuidadores informais na prestação de CCI, com a ineficácia aliada à gestão politizada e à burocracia e com a indispensabilidade da convergência sectorial entre Ministérios da Saúde e da Segurança Social. Houve também espaço para reflectir sobre a qualidade da prestação de CCI salientando o modelo de avaliação e os seus instrumentos de controlo, de monitorização e de verificação. Finalmente, com base na avaliação dos entrevistados, teceram-se considerações sobre potencialidades e constrangimentos da RNCCI, bem como se deram a conhecer algumas advertências e oportunidades futuras. 219
UMA VISÃO GLOBAL Numa perspectiva mais ampla levantaram-se questões fundamentais, que são fruto de uma apreciação consensual entre os vários interlocutores entrevistados. A primeira questão que se colocou assenta no facto de existir uma RNCCI como resposta formal à população dependente que continua a delegar na família a maior parte da responsabilidade na gestão dos cuidados, pela dificuldade de integração/acesso e por não ter equipas e/ou unidades em número suficiente. Estas evidências boicotam a ágil transição entre níveis de cuidados, especialmente dos hospitais para os CCI, penalizando as famílias que, sem alternativas formais, garantem o custo das ineficiências do estado: “A actual existência de formas e mecanismos de solidariedade familiar e vicinal no contexto português é inegável, ainda que nem sempre responda positivamente a todas as necessidades e expectativas dos agentes envolvidos nas redes que as prosseguem e estejam, em certos casos, associadas a modalidades de apoio discriminatórias e selectivas (Hespanha; Portugal, 2002; Vasconcelos, 2005; Wall et al, 2001, citados por Albuquerque & Pimentel, 2010, p.255).
Esta iniquidade entre Estado e família, na perspectiva de alguns, demonstra uma segunda apreciação que é veiculada pela necessidade de convergência sectorial entre Ministério da Saúde e da Segurança Social. Ora, se estes dois patamares são a base da política, esta tem de sentir-se no domínio prático, já que uma melhor performance intersectorial beneficia directamente as famílias, não as sobrecarregando. Não se trata de mais investimento, mas sim da eliminação de desperdício em benefício do reforço da política e, consequentemente do bem-estar dos utentes, como defende o autor: “On theoretical grounds we may assume that the less intense the interdepedencies are (depth), the more flexible the arrangements will be, with its positive and negative aspects. Decision making can be very difficult in these circumstances. In broad constellations, the powers are usually horizontally diverted across a wide variety of actors with different agendas and cultures (Nies, 2008, p.6)”.
A APOSTA NA QUALIDADE: DA INEFICÁCIA AO CONTROLO E À MONITORIZAÇÃO No quadro da prestação de CCI há referências a alguns pressupostos da qualidade. Em primeiro lugar, há um consenso no que se refere à ineficácia da política de gestão das estruturas e dos equipamentos. De acordo com alguns entrevistados o crescimento de unidades de CCI, conjuga preferências e interesses económicos, em detrimento das necessidades reais da população e da justeza do seu desenvolvimento, o que pode provocar desequilíbrio e assimetrias, como melhor se esclarece: 220
”Actualmente, o pagamento aos prestadores é efectuado em função de um valor diário, o que pode provocar distorções dificilmente controláveis. Assim seria desejável que se desenvolvesse um tarifário assente, por exemplo, em tipos de dependência homogéneos, eventualmente baseados em níveis de funcionalidade. (OPSS, 2011, p.17) ”.
Ainda sobre a qualidade, pese embora o âmbito já explicitado, é manifestamente apontado, como factor de relevo, o investimento na melhoria de processos (informatização) e de resultados (relatórios e dados estatísticos), através de medidas de controlo e de monitorização, bem como da avaliação de desempenho dos profissionais. Os entrevistados legitimam as evidências a este nível, reconhecendo o papel das auditorias externas e internas, tanto clínicas como organizacionais como um dos indicadores mais positivo, o que reforça o papel regulador da condução da política, por um lado, e abranda o contributo do Estado como prestador de CCI, por outro, deixando essa tarefa aos equipamentos contratualizados que são submetidos à rigorosidade das normas e enquadramento requeridos. Deste modo, obtêm-se ganhos em saúde significativos com a percepção real, “designadamente, ao nível dos custos de organização, administrativos (monitorização e controlo) e de formação. Sendo este um sector de mão-de-obra relativamente intensiva, são também possíveis ganhos de produtividade” (OPSS, 2011, p.17).
ACESSO, DIFERENCIAÇÃO GEOGRÁFICA E RECURSOS: QUE LIMITAÇÕES Da multiplicidade de factores elencados que estão na ordem dos constrangimentos da política em estudo: o baixo investimento público, em detrimento do investimento privado e do Terceiro sector; o insucesso da política de CSP e o desalinhamento dos níveis de cuidados, sublinham-se as declarações relativas ao que mais consternou a fluidez da política e o bom funcionamento dos CCI. De acordo com a maioria de entrevistados reconhece-se o subdesenvolvimento/escassez de recursos como a limitação mais evidente ao desenvolvimento do RNCCI. Este manifesta-se tanto ao nível das estruturas (número de unidades/equipas existentes), como ao nível dos recursos humanos, especialmente, em matéria de diferenciação de cuidados. Estas adversidades, em conjunto, poderão justificar, per si, a derrapagem na condução das previsões definidas pela Unidade de Missão dos CCI. As opiniões dos interlocutores enquadram-se no que a OPSS, no seu relatório em 2011, publicou em matéria de medidas correctivas para os CLD quando anunciou: “(…) Incrementar as taxas de ocupação das tipologias de 221
proximidade (Equipas de Cuidados Continuados Integrados - ECCI) e promover a implementação de outras respostas em regime ambulatório, como sejam as Unidades de dia e promoção da autonomia previstas no DL 101/2006 ” (2011, p.19).
Ao nível do quadro de profissionais, sobre a captação e a indispensabilidade de diferenciação servem de exemplo as seguintes recomendações internacionais:“ (…) têm sido consideradas várias soluções para lidar com essa necessidade crescente de profissionais em Long Term Care. Uma delas é aumentar o número de profissionais (…) A formação e o treino desempenham um papel importante na garantia da qualidade de cuidados (Abreu-Nogueira, 2009, p.16-17). Analisando, globalmente as lacunas que foram evidenciadas pelos interlocutores, e por ordem de importância dada, emerge o fenómeno da assimetria geográfica na prestação de CCI pelo território nacional, em especial nas grandes zonas urbanas como Lisboa e Porto. Este ponto está caracterizado no Plano Nacional de Saúde 2011-2016 para os CCI em Portugal, que ilustra os argumentos aduzidos pelos entrevistados com o parágrafo que se segue: “Em termos de cobertura nacional, (….) a região de Lisboa e Vale do Tejo (LVT) apresenta a menor
cobertura” (…).”O Norte, uma cobertura cerca de duas vezes menor (- 195%) e em relação à cobertura nacional (242) um valor sobreponível (-185%) (Lopes et al., 2010, p.23) (…) “as unidades de CCI apresentam uma dispersão geográfica regional com algum grau de aleatoriedade decorrente da localização das entidades promotoras, não sendo possível, nos moldes actuais, introduzir maior grau de racionalidade na sua localização e dimensão a não ser que se verifique uma inversão na lógica da organização do processo de financiamento (Lopes et al., 2010, p.40).
Ao mesmo nível, ainda sobre constrangimentos, entre a grande parte dos interlocutores ressalta a questão do acesso à RNCCI, entendido como factor inquestionável da garantia da igualdade e da equidade em saúde. As declarações revelam como factores de inacessibilidade, restrições de ordem diversa que se prendem com: burocracia, inflexibilidade na avaliação das situações referenciadas e a exclusão de acesso por critérios sociais. Estas poderão, em parte, estar associadas à relação entre procura e oferta de prestação de CCI, à questão da descontinuidade de cuidados ou à mera escassez de recursos infraestruturais como patenteia o estudo, desenvolvido pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS, 2011).
222
POTENCIALIDADES
DA
RNCCI:
RESPOSTA ÚTIL, GANHOS EM SAÚDE E VALORIZAÇÃO DOS
CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS
A análise das potencialidades da RNCCI, colhida pelos testemunhos dos vários intervenientes, fez sobressair a valorização dos CSP como elemento fundamental para melhorar a articulação entre níveis de cuidados. Os CSP têm potencial para refrear a cultura hospitalocentrista para um modelo mais consentâneo com as necessidades actuais da população. Este nível de cuidados foi considerado por alguns entrevistados como um dos pontos fortes da RNCCI porque servem de complemento em situações de indiferenciação ou de carência de cuidados, especialmente em áreas do território nacional menos equitativas em termos de oferta de serviços de saúde (ex. fases de transição).No entanto, tem sido possível ultrapassar as fraquezas da implementação da RNCCI, aculturando as unidades para o progressivo desenvolvimento e diferenciação. Contudo, a relevância e o progresso da reforma dos CSP são susceptíveis de confirmação empírica, estando classificados como: “unidades de saúde, com equipas profissionais coesas e disponíveis que (…) resultam num maior sentido de pertença por parte das pessoas, em relação aos “seus” serviços de saúde e tornam (…) uma visível melhoria nos níveis de satisfação dos profissionais em relação às condições em que exercem as suas práticas profissionais” (Sakellarides, 2010, p. 102).
Ainda numa perspectiva de destacar as potencialidades dos CCI, sobressaem dos depoimentos extraídos das entrevistas, duas variáveis que se inter-relacionam. Uma relacionada com a finalidade de implementar uma política de saúde adequada, seguindo as premissas da tendência europeia em matéria de CLD. “A União Europeia tem elaborado algumas directivas para que os países invistam e organizem a política de cuidados”(Carvalho, 2009, p.131). A outra sobressai pela necessidade de investimento numa resposta mais vocacionada aos padrões demográficos e de envelhecimento populacional. “Portugal counted 1 356 709 persons aged 65 and older and this increased to 1 828 617 in 2006. Among the elderly people, women are more represented, with 1 064 865 women for 763’752 men in 2006. Besides, there is an ageing phenomenon of the elderly, with the 75 year old and older passing from 533 379 in 1990 to 820 425 in 2006. Compared to the total population, between 1960 and 2000, the number of persons aged 75 and over increased from 2.7% to 6.7%.” (Joel, 2010,p 6)
A jusante, destaca-se a relação entre o custo e o benefício de uma política desta natureza, especialmente no impacto para a despesa pública, como confirma o seguinte parágrafo: 223
“Efectivamente, o investimento na RNCCI pode e deve conduzir a uma redução de custos com a Rede
Hospitalar, por via da implementação de medidas concretas de reorganização e reestruturação dos hospitais, induzidas, por exemplo, em sede de contrato-programa. Adicionalmente, o investimento na manutenção e/ou recuperação funcional dos idosos terá custos mais baixos que o oposto.” (OPSS, 2011, p.19). FORÇAS
FRAQUEZAS
Predomínio dos Cuidadores Informais na prestação de CCI
Monitorização e Controlo
Investimento na qualidade, Necessidade de reavaliação e correcção de planeamento de respostas
Sustentabilidade financeira comprometida
rometida após período inicial de Necessidade de custos amparados Concertação entre
Intersectorialidade entre saúde e segurança social na prestação de CCI
Informatização como meio de monitorização (prescrição electrónica e registo de saúde electrónico
Heterogeneidade, adulteração e indiferenciação de cuidados (muito mix – cuidados continuados, paliativos)
Informalidade no apoio pelas estruturas de CCI na comunidade – cultura do desenrasca
Ministério da Saúde e Ministério Trabalho e Segurança Social
Auditorias internas e externas: clínicas e organizacionais
Ineficácia aliada à gestão, politização e burocracia (preferência e jogos de interesse económico)
REPRESENTAÇÕES DA
RNCCI Acessibilidade limitada (critérios sociais, burocracia, inflexibilidade, restrição)
Conceito como bem societário por responder às necessidades da população
Baixo custo de Unidades de CCI
Investimento em CCI
Valorização dos CSP (colmatam a falta de diferenciação)
Descentralização do Estado na prestação do CCI
OPORTUNIDADES
Subdesenvolvimento dos CSP e desalinhamento entre níveis de cuidados
Diferenciação urbana/rural, assimetria na cidade de Lisboa
Baixo investimento do estado
Subdesenvolvimento, escassez de equipamentos, de recursos humanos e de formação especializada
AMEAÇAS
Figura 9 – Representações da análise aos CCI em Portugal
224
12.2. A
VULNERABILIDADE DA REDE NACIONAL DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
(RNCCI): A VISÃO DOS PERITOS
Tendo em consideração as entrevistas e a forma como foram descritos os factos propôs-se uma análise interpretativa que segue o mesmo princípio orientador (categorização por análise SWOT). Deste modo, procedeu-se a uma decomposição de conteúdo de entrevistas que se alinham com os depoimentos dos vários intervenientes sobre a vulnerabilidade da RNCCI, a incerteza da sua implementação, e em particular, sobre as questões em que é indispensável intervir. A RNCCI como medida que conjuga dois eixos de governação do Estado, a saúde e o apoio social, tem necessidade de revitalizar a sua forma de actuar e a sua orientação para os resultados. Esta abordagem pretendeu ir ao encontro de uma apreciação objectiva dos CCI, dada a imprevisibilidade do contexto socio-económico actual.
OS RISCO (S)
DO ENVELHECIMENTO EM PORTUGAL: ENTRE A DOENÇA CRÓNICA E A
SOBRECARGA FAMILIAR
No que respeita ao fenómeno do envelhecimento da população portuguesa, em que o conceito e a sua especificidade não estão necessariamente dentro das atribuições de todos os entrevistados, a apreciação consensual é a de que este está, intimamente associado ao aumento da dependência (agravamento de doenças crónicas e comorbilidades) e à sobrecarga familiar. Neste sentido, também se reconhece o binómio “envelhecimento e dependência” como “um estado em que se encontram as pessoas que, por razões ligadas à falta e perda de autonomia física, psíquica, intelectual, têm necessidade de assistência e de outros recursos para realizar as actividades correntes da vida diária” (Cabrero, 2000, citado por Carvalho, 2009a, p.68). Por via de dúvida, para clarificar a prestação de apoio familiar corrobora-se a ideia, de que a “maioria dos cuidados prestados às pessoas idosas é assegurada por cuidadores familiares, e que Portugal não é uma excepção” (Quaresma, 1996, citado por Carvalho, 2009b, p.86).
O PESO DOS FACTORES DEMOGRÁFICOS Na ligação entre as políticas de saúde e de protecção social os CCI surgem como um instrumento atenuador que responde ao fenómeno do envelhecimento. Contudo, os efeitos da transição demográfica e o aumento da dependência potenciam os custos dos CLD, designadamente pelos factores colhidos através dos interlocutores. Confirmam-se, teoricamente, as declarações com a evidência de que “Portugal será o 4º país dos 25 da 225
União Europeia com maior percentagem de idosos (31,9%), só ultrapassado pela Espanha, pela Itália e pela Grécia” (Eurostat, 2000) e que este envelhecimento incidirá, sobretudo na população feminina (INE, 2001) e fará diminuir a taxa de natalidade, a longo prazo.
Face às evidências acima descritas é com grande probabilidade que as situações de dependência se agudizem e haja uma maior necessidade de cuidados. Resta acrescentar que o decréscimo dos óbitos e dos nados vivos, simultaneamente (INE, 2005), fizeram incrementar o índice de dependência dos idosos dando origem a resultados semelhantes aos que aqui se demonstram, relativamente ao ano de 2004, em que “existiam 16300 pessoas idosas com pluripatologia e dependência, entre 160 000 e 250 000 com demência e mais de 16 000 doentes terminais (Campos, 2008, p.10). Estes dados confirmam a necessidade de investimento, na diferenciação dos cuidados, em geral, e na gestão das doenças crónicas e da saúde mental, em particular.
O EQUILÍBRIO ENTRE ESTRUTURAS E RECURSOS HUMANOS Os interlocutores realçaram que há necessidade de criar novos equipamentos sociais para respostas sociais que carecem de especificidade, por exemplo, na área da saúde mental e dos cuidados paliativos. Outros, defendem que a diferenciação de cuidados só é possível se a RNCCI contemplar um maior número de profissionais das diversas áreas (medicina, enfermagem, fisioterapia, terapia da fala, serviço social, psicologia, nutrição). Defende-se, em teoria, o aumento de profissionais, bem como da sua formação, de forma a garantir-se os padrões de qualidade indispensáveis: “uma das estratégias para aumentar o número de profissionais é recrutá-los no seio da população inactiva, que inclui aposentados, desempregados e voluntários” (Abreu-Nogueira, 2009, p.17) ou então investir em políticas “que façam melhor uso dos profissionais disponíveis, o que inclui medidas para a retenção de profissionais, fornecer suporte a cuidadores informais e a melhor coordenação de cuidados” (Abreu-Nogueira, 2009, p. 18). Qualquer escolha é legítima e implica custos que impendem sobre todos aqueles que “saldam” a factura deste tipo de cuidados. No que diz respeito ao aumento de unidades de CCI deve ser tida em consideração, a opinião do cidadão português em situação de dependência que aponta para: 50% de preferência da prestação de cuidados sob a responsabilidade da família, 21% na responsabilidade de um serviço prestador de cuidados, 6% no domicílio com um cuidador e 11% sobre a responsabilidade de uma instituição, perfazendo uma escolha que supera os 80% por opções de apoio domiciliário 226
(Comissão Europeia, 2007). Um relatório europeu realizado quase em paralelo, também clarifica que a prestação de cuidados na comunidade ou residencial é preferível aos cuidados institucionais (Comissão Europeia, 2008).
(IN) SUSTENTABILIDADE DA RNCCI Considerando as projecções da OCDE e as dos interlocutores privilegiados podemos afirmar que a despesa na área da saúde irá aumentar, em especial nos CCI, situação muito semelhante noutros países da Europa do Sul (Espanha e Itália).“O envelhecimento populacional (…) exigirá, um acréscimo de recursos que desafiará a sustentabilidade financeira da RNCCI, em particular, mas também do SNS e do sistema de protecção social na sua globalidade” (OPSS, 2011, p.12). No entanto, é importante esclarecer que Portugal representa o quinto país que mais despende em Saúde, de acordo com a percentagem do PIB da Europa a 27, mas que assimetricamente, é dos que menos investe em CCI (Comissão Europeia, 2009). Caberá agora, no conjunto das funções do Estado e da estratégia em saúde, privilegiar também este nível de cuidados em detrimento do contínuo investimento na área hospitalar. A diversidade do financiamento da RNCCI, como foi concebida, é assegurada pelo orçamento do Estado. Para tal servem as verbas provenientes dos jogos sociais que a Santa Casa Misericórdia de Lisboa explora, divididas pelos ministérios do Trabalho e da Solidariedade Social (34,8%) e da Saúde (16,6%), bem como da comparticipação dos utentes/agregados familiares consoante os seus níveis de rendimento. Em Portugal, devido à inelasticidade de verbas para investimento, a melhor receita para a sustentabilidade dos cuidados continuados passa pela diversidade dos agentes de financiamento e pela correcta conjugação de serviços, sejam estes de carácter formal ou informal (OCDE, 2005).
A PROCURA E A OFERTA DE CCI EM PORTUGAL: A MONITORIZAÇÃO NA BASE DA OFERTA Em rigor, nas declarações colhidas apura-se que a RNCCI ainda não desenvolveu todas as suas estruturas e unidades, existindo algumas tipologias em fase de consolidação ou em projecto (Unidades de Dia e Equipas domiciliárias), sendo estas, simultaneamente, as que representam menor custo e maior solicitação pelos doentes e famílias. Os entrevistados também se interrogam sobre as necessidades de CCI, ou seja, em saber se são efectivamente indispensáveis ou fruto da liberdade que o Estado cede aos prestadores do Terceiro sector e do sector privado, para desenvolverem respostas de CCI, segundo interesses que podem não se coadunar com os da procura da população portuguesa. Para tal, é indispensável que se invista 227
em estudos que permitam comparações ao longo do tempo, de forma a poder monitorizar-se a evolução da dependência na população, em especial da mais carenciada físicofuncionalmente, pois é certo que se reconhece o amplo grau de incerteza acerca do volume e do tipo de procura em serviços de CLD (Comas-Herrera, 2003). Portugal enquadra-se na tipologia europeia apelidada de “Family Based Countries” (países de base familiar), tal como Espanha, Irlanda ou a Grécia. Este modelo assenta em três pressupostos-chave que são classificados de acordo com a distribuição e a forma como se organizam os cuidados de saúde, designadamente, a procura dos mesmos e a sua relação com a provisão de cuidados formais e informais. No caso português ressalta efectivamente uma elevada procura de cuidados, uma provisão de cuidados informais de nível médio e uma escassa provisão de cuidados formais (Lamura et al., 2007), pelo que esta tipologia consegue clarificar de algum modo, alguns dos focos de intervenção no panorama nacional, aos quais é necessário oferecer respostas em matéria de CCI. FORÇAS Envelhecimento populacional
FRAQUEZAS
Desafio do contrato social
Opções claras para o envelhecimento/nata lidade baixa
Elevadas taxas de reinternamento nas unidades de agudos
Resistência da sobrecarga familiar Estudos e projecções da realidade para ajustamento/assentes na evidência
Saúde Mental e demências
A VULNERABILIDADE NOS CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
Apoio domiciliário
Visão economicista da contratualização de unidades pelos privados
Cultura organizacional
Vulnerabilidade do idoso (doença crónica e comorbilidades) grau de dependência
Escassez de RH qualificados
Subfinanciamento e sustentabilidade a prazo Probabilidade quebra jogos sociais
Financiamento múltiplo Institucionalização
Literacia e educação para a saúde/ da cultura hospitalar para a continuidade de cuidados Incerteza da procura natureza das necessidades futuras dos cidadãos
OPORTUNIDADES
Procura elevada e necessidades insatisfeitas
Transformação das unidades CCI em hospitais de retaguarda
Ameaça da transferência dos níveis de cuidados Medicalização da sociedade
AMEAÇAS 228
Figura 10 – Representações da vulnerabilidade nos CCI em Portugal
12.3. EXPANSÃO
E MODERNIZAÇÃO DOS CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS: DA
ESTRATÉGIA GLOBAL AOS CUIDADORES
No seguimento dos temas subordinados aos CCI evidenciaram-se linhas orientadoras que se podem ajustar às necessidades dos portugueses, designadamente, em termos de configuração da capacidade instalada e de estratégias a desenvolver no futuro: tanto numa vertente expansionista, como numa perspectiva inovadora. Foi neste sentido que os interlocutores privilegiados teceram as suas considerações. Da decomposição do conteúdo das entrevistas destacaram-se três áreas interdependentes: a Estratégia, o Financiamento e as instituições e/ou recursos humanos afectos ao sector. ESTRATÉGIA: GESTÃO EFICIENTE E TRANSPARÊNCIA REGULAR DE RESULTADOS No plano estratégico distinguem-se categorias importantes que, apesar de não encontrarem representatividade entre todos os interlocutores merecem ser mencionadas pela singularidade do seu ângulo de análise. Ao nível da gestão, sugere-se maior ancoragem aos processos de benchmarketing, para efeitos de controlo de execução e melhoria no desempenho. Na perspectiva operacional defende-se maior liberdade dos utentes na escolha de unidades de CCI, assim como a revisão dos critérios de referenciação para a melhoria da acessibilidade. Por outro lado, defende-se o investimento na ligação, quase inexistente, dos utentes à área de abrangência da saúde e ao domicílio, quando o planeamento da alta é efectuado da RNCCI para o domicílio/ ou outras instituições de referência. Paralelamente, na economia de mercado, salienta-se o estímulo às instituições seguradoras para cobrirem novos riscos e oferecerem produtos consonantes com o aumento da esperança média de vida e com a actualização do índice de envelhecimento da população portuguesa. Entre dimensões principais e as acessórias destaca-se, em particular, maior diferenciação dos cuidados paliativos, ainda que o consenso seja moderado, entre os entrevistados. Ainda assim, há quem defenda uma distinção entre as duas áreas, não sendo possível incluir cuidados continuados e paliativos na mesma tipologia de serviços (CCI): “ (…). Pela especificidade e complexidade inerente, e de acordo com as orientações internacionais para esta matéria, sempre frisámos que cuidados paliativos e continuados não são sinónimos, embora os primeiros se integrem no âmbito mais alargado dos últimos (…)” (Neto, 2005,p.36). 229
De forma mais concertada ressaltam da mesma análise duas dimensões de relevo, em resposta à estratégia no domínio da expansão e da modernização dos CCI: a primeira está associada à desburocratização, em que se defende uma maior agilidade na gestão, a competência técnica e apolítica, a autonomia e a capilaridade às estruturas comunitárias. A segunda está relacionada com controlo, monitorização e com a transparência e partilha de resultados entre Ministérios da Saúde e Segurança Social. Em todo caso, na primeira dimensão, importa desmistificar que a categoria assume a sua indispensabilidade de maior disciplina e de eficiência na gestão de uma orgânica tão ramificada como é a RNCCI. Essencialmente, requer-se maior rigor e autonomia na avaliação de situações elegíveis para referenciar à Rede, no entanto, devem simplificar-se os circuitos e processos, evitando períodos de espera. Esta é também uma oportunidade de melhoria a considerar, também referida nas medidas correctivas no relatório do OPSS (2011), nomeadamente quando destacam os “sistemas de referenciação e a articulação entre diferentes níveis de cuidados e a articulação entre os diferentes sectores envolvidos (e.g. Saúde, Segurança Social, autarquias), aumentando a eficácia das intervenções e reduzindo os custos” (OPSS, 2011, p.19). É também extensível, como exemplo, à segunda dimensão que clarifica a necessidade de uma maior convergência de esforços entre sectores. Quanto à questão do controlo e da monitorização de desempenho e de resultados, esta coaduna-se com as convicções do European Centre for Social Welfare Policy and Research, no documento Health systems and Long-term care for Older People in Europe quando propugna “que se devem identificar, reconhecer e estabelecer boas práticas que permitam informação para políticas e práticas, nomeadamente na avaliação e monitorização da qualidade de cuidados, na reabilitação, suporte a cuidadores informais, governação e questões financeiras” (Nogueira, 2009, p.17).
FINANCIAMENTO: ALARGAMENTO DA INTERVENÇÃO ESTATAL OU ABERTURA AO PRIVADO A discussão do financiamento surgiu como um dos eixos centrais na estratégia dos CCI, nas declarações da maior parte dos interlocutores. Do que foi possível aferir, as opções mais representativas recairam ou sobre uma maior intervenção do Estado, ou de uma maior abertura ao sector privado. Sobre a maior intervenção estatal pode concluir-se que esta entra em rota de colisão com a “parcela” orçamental concedida para o investimento hospitalar, o que não significa, obrigatoriamente, maior gasto em saúde, mas preferencialmente uma adequação coerente na evolução e requalificação dos níveis de cuidados. Por outras palavras “o investimento da RNCCI pode e deve conduzir a uma redução dos custos com a rede 230
hospitalar, por via da implementação de medidas concretas de reorganização e reestruturação de hospitais” (OPSS, 2011, p.19). Também foi referido, por alguns interlocutores, a existência de uma rubrica no orçamento de Estado que contemple este nível de cuidados, para que não existam oscilações em razão da imprevisibilidade dos resultados dos jogos sociais da SCML. Segundo as conclusões do OPSS “este modelo de financiamento tem de ser preparado para corresponder ao contínuo aumento dos custos (…) Todavia, a maior pressão advirá da progressão do fenómeno do envelhecimento populacional” (OPSS, 2011, p.19). Em similar número de declarações, houve quem sustentasse a introdução de uma rede contratual, através da lógica dos seguros privados, para a oferta deste CCI, o que agilizaria, a montante, uma forma de investimento diferente, beneficiando o funcionamento da economia de mercado. Seria “uma rede contratual, de seguros, de mutualidades, de subsistemas a nível empresarial – que cuidaria de quem decidisse prescindir (…) dos serviços estatais gratuitos (…) através do opting out” (Escoval, 2008, p. 41). Deste modo, haveria lugar para a conjugação de uma rede pública e privada em que a oferta e a procura estariam mais articuladas entre si, e em que o contrato social da saúde e a livre escolha (co-pagamento) ditariam outras “regras de jogo”. Ainda que as estratégias que envolvem a RNCCI estivessem direccionadas, ora para um papel mais representativo do Estado, ou da iniciativa privada, foram várias as declarações que se referiram a acções que permitissem evitar desperdícios financeiros, tais como: racionalização de contratos (ex: capacidade ocupada versus capacidade instalada); a exigência no cumprimento de normativos legais e procedimentais; e a flexibilidade de respostas. O
CONTRIBUTO DAS INSTITUIÇÕES E DOS AGENTES NA ESTRATÉGIA DE EXPANSÃO E
MODERNIZAÇÃO DOS CCI
Os interlocutores nas suas respostas atribuíram um papel importante ao capital humano e às instituições de saúde. Relativamente aos profissionais de saúde, aclarou-se a ideia das famílias poderem beneficiar de acções de coaching para se capacitarem para a prestação de CLD e para gerirem melhor a doença crónica no seu meio envolvente. Neste sentido, certos elementos (médicos, enfermeiros, assistentes sociais) assumiriam funções de gestores da família, ou seja, de alguém que se ocuparia, particularmente ao nível dos CSP, do acompanhamento destas situações. A um nível mais consensual, e colocando a “fasquia” numa maior rigorosidade de evidências entre entrevistados, seria importante apostar em 231
cuidadores informais, tal como defende a seguinte declaração de um estudo “It is estimated that informal care covers 60 to 80 percent of the care that is delivered in society” (Nies, 2008, p.1), o que per si justificaria uma abordagem ainda mais proveitosa, tanto ao nível do treino e ensino de competências, como na flexibilização da legislação de trabalho ou de outras circunstâncias que permitissem rentabilizar os recursos disponíveis. Tendo como exemplo, as considerações dos entrevistados houve ainda duas áreas que se distinguiram como estratégias de expansão da RNCCI. Uma prende-se com o aumento de recursos humanos, muito concretamente na área da gestão de altas e do Serviço Social, e a outra com o aperfeiçoamento/ incentivo à formação direccionada, por um lado, para a comunicação em saúde, e por outro, para a diferenciação se refere às distintas tipologias de unidades da Rede. No alinhamento desta última vertente salienta-se a prestação de cuidados assente na premissa “estratégica dois, prioridade D”, que versa sobre a melhoria contínua da prestação de CCI e que propõe acções que dinamizam “formação e coaching aos profissionais da Rede que fazem acompanhamento técnico às Unidades” e que “criam/ajustam e disseminam suportes à prestação de CCI. (UMCCI, 2009b, p.7).
Em matéria de equipamentos e, de acordo com as declarações obtidas, foi possível confirmar duas áreas cruciais na lógica da modernização e da expansão dos CCI. Uma delas está relacionada com o contínuo empenho na reforma dos CSP esclarecendo a sua importância, como apontam cerca de ½ dos declarantes, e dentro deste investimento defende-se maior redistribuição/equilíbrio por nível de cuidados, principalmente entre CCI e cuidados hospitalares. Fica, para sublinhar a aposta nos CSP, a seguinte reflexão: “ (…) Para melhorar a proximidade e a acessibilidade certamente não basta aumentar o número de Unidades de Saúde Familiares (USF) e os Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES). É preciso solidificar todo o planeamento realizado e que exista um redobrado empenho por parte de todos os profissionais ligados directamente ou indirectamente à saúde ” (Fernandes, 2011, p.46)
Na sequência do investimento na capilaridade de cuidados, as unidades preferenciais a desenvolver na RNCCI, de acordo com as declarações dos entrevistados, foram as de apoio domiciliário (Equipas de Cuidados Continuados Integrados). As declarações manifestaram necessidades de homogeneização de cobertura, tanto das equipas domiciliárias como das Unidades de dia, pois são estas que correspondem a uma procura não satisfeita – tendo ainda a mais-valia, como se confirma infra, dos seus custos de manutenção/implementação serem mais reduzidos. 232
“Comparando os custos unitários por tipologia de prestação de CCI são evidentes os ganhos financeiros, da passagem de cuidados institucionais para cuidados domiciliários (OPSS, 2011, p.17)
FORÇAS
Formação específica na área dos CCI e na Comunicação em saúde
Transparência e monitorização regular de resultados, monitorização e gestão partilhada
FRAQUEZAS
Valorização dos CSP Maior equilíbrio entre níveis de cuidados
Benchmarketing
Capilaridade de estruturas na comunidade, solidariedade e participação
Cobertura de RH nas equipas de gestão de alta e serviço social Maior Investimento do Estado
EXPANSÃO E
Investimento privado e abertura ao regime de seguros em CCI/ Ética lucro/transparência
Reestruturação de tipologia de seguros face às alterações da idade adulta e do envelhecimento progressivo
Agilidade, gestão técnica e apolítica, autonomia, desburocratização e capilaridade de estruturas
Necessidade de convergência de sectores MS E MSSS
MODERNIZAÇÃO NOS CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
Investimento nos cuidadores
Ampliação e homogeneidade de Unidades de Apoio domiciliário
Coaching das famílias e figura do gestor da família
Respostas após RNCCI inexistente
CCI nas áreas metropolitanas
Revisão da diferenciação de Cuidados (saúde mental e paliativos)
Racionalização do contrato social/ Redução de camas de agudos
Remover constrangimentos financeiros, menor custos de contratação, flexibilidade
OPORTUNIDADES
AMEAÇAS
Figura 11 – Expansão e modernização nos CCI em Portugal
233
12.4.CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS EM PORTUGAL E NO CONTEXTO EUROPEU
Esta análise (figura 10) tinha o objectivo de recolher exemplos de boas práticas, de conhecer novas tipologias de cuidados, e até de identificar opções menos eficazes levadas a cabo por outros países. Contudo, as declarações dos interlocutores demonstraram que as divergências nos sistemas de protecção social e nos sistemas de saúde não permitem comparações fidedignas, pois não estão enquadradas no conceito de Cuidados Continuados Integrados (Continuing care). Estão integradas num conceito mais abrangente, de Cuidados de Longa Duração (Long term care), que assume outras conexões intersectoriais, a utilização de um maior número de recursos e de prestadores de cuidados de saúde e de apoio social. No entanto foi possível esclarecer dois factos: o primeiro esclarece que a pluralidade dos modelos de cuidados continuados não permite uma comparação assente em pressupostos lineares e harmonizados pelas mesmas variáveis de análise, dadas as especificidades de cada país. O segundo, ainda que impreciso pela abrangência, tende a aproximar o modelo português ao modelo europeu de Cuidados de Longa Duração (CLD), assente numa base geográfica, e que distribui os modelos pelo posicionamento dos países: Europa do Norte (Suécia, Noruega, Finlândia, Dinamarca), Europa Central (Inglaterra, Alemanha, e Holanda), e Europa do Sul (Portugal, Itália, Espanha).
A
DIVERSIDADE
DE
SISTEMAS
DE
CUIDADOS
CONTINUADOS
NA
EUROPA:
UMA
CLASSIFICAÇÃO ASSENTE NA POSIÇÃO GEOGRÁFICA
Os vários intervenientes não esclareceram as diferenças entre os CCI em Portugal e os que são prestados na Europa. A maior parte dos entrevistados não quis posicionar-se dada a diversidade de sistemas de protecção social e de saúde. Houve até quem defendesse a impossibilidade de permitir qualquer comparação. Contudo, fica a afirmação seguinte para ilustrar essa dificuldade: “(…) recent studies confirm that Member States still difer widely in the ways long-term care is organised and funded, and in the total public expendidure made available. This is the case for all the core aspects of long-term care: access to services and their financing, the role of families and of the informal care, as well as the quality of care. Better integration of or cooperation between health and social services remains an important challenge in most countries.” (Huber, 2007, p.12)
Os interlocutores identificaram assimetrias importantes entre países e as políticas nesta vertente de cuidados. No entanto, são consensuais quando destacam a família e os cuidadores 234
informais como os verdadeiros alavancadores da continuidade dos cuidados. Estas opiniões são também coincidentes com a seguinte afirmação: “The majority of services is provided in private households by informal care givers (family or friends), with or without the support of publicly provided services. This is the case for all (European) countries, even for a country with rather generous public service provision like Sweden” (Huber, 2007, p. 1)
Os países europeus, motivados pela contínua necessidade, desenvolveram e aprimoraram formas de financiamento, de distribuição, de planeamento e de provisão de cuidados continuados. Daí que, novos esquemas programáticos como o sistema de seguros em CLD (Alemanha) ou os personal budgets (Holanda) acabaram por surgir como formas alternativas para alterar as regras de acesso e/ou como forma de adequarem a oferta de serviços ao aumento da procura. Segundo os interlocutores, no caso português, alude-se a uma maior integração entre os cuidados de saúde e o apoio social, bem como àconsolidação de respostas para os cuidados pós agudos (ex. reabilitação Acidentes Vasculares Cerebrais). Relativamente aos países da Europa do Norte foram tecidas opiniões mais positivas (modelos experientes), enquanto no Sul a organização dos cuidados tende a ser mais descoordenada (sistemas jovens e inexperientes). Salientaram-se ainda os bons exemplos do modelo inglês, sueco, holandês e alemão quando sugerida uma classificação comparativa, com o modelo português, também bem classificado pelas representações, mas com necessidades de melhoria relativamente à orientação estratégica.
Finalmente, também se registaram exemplos de limitações entre os modelos de cuidados continuados. No caso holandês, por exemplo, discute-se a fusão e a partilha de recursos como forma de lidar melhor com o aumento da complexidade dos cuidados. Na Alemanha, os cuidados continuados apresentam-se ainda como um enigma de difícil resolução. Os projectos existentes têm sido programáticos e de curta duração e ainda não têm o impacto expectável para o futuro, tanto ao nível da inovação como na distribuição regional. No Reino Unido, à semelhança de Portugal, existem problemas em definir respostas de continuidade aos cuidados hospitalares, o que implica protelamentos das altas clínicas, por falta de estruturas comunitárias.
235
FORÇAS
FRAQUEZAS
Indefinição do conceito de CCI e de CLD (Europa)
Assimetrias na distribuição de CCI (Portugal e Alemanha)
Portugal Family based countries
Fusão de prestadores de serviços de CCI e SAD, Casas de Repouso para respostas complexas – (Holanda)
Bom funcionamento das Unidades de Convalescença (Portugal)
Diversidade de modelos europeus de CCI não permite comparações
Descoordenação de Países do Sul (Portugal, Espanha)
Atrasos e protelamento da alta clínica por falta de estruturas comunitárias. (Portugal e Reino Unido)
CUIDADOS CONTINUADOS PORTUGAL E NA
CCI reduzem em cerca de 30% as camas de agudos, para pós agudos – a um período de 15 anos (França) Maior integração entre Saúde e SS (Europa)
Predomínio dos cuidados continuados no domicílio (Europa)
OPORTUNIDADES
EUROPA Ineficácia e impotência da Reabilitação de AVC (Portugal)
Programas de CCI de curta duração sem expressão regional e sem inovação (Alemanha)
Escassez de Unidades de Apoio domiciliário (Portugal)
AMEAÇAS
Figura 12 – Cuidados continuados em Portugal e na Europa
236
CAPÍTULO 2 – O GRAU DE VULNERABILIDADE DOS DOENTES DO CHLO: UMA ANÁLISE QUE CONJUGA DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE
RESUMO DE CAPÍTULO Este capítulo teve como desígnio responder à questão de partida: Qual a vulnerabilidade dos doentes que regressam ao domicílio, a cargo de cuidadores informais depois de um internamento hospitalar, com elevado grau de dependência, doença crónica e comorbilidades? Para chegar a esta conclusão coube analisar os episódios sociais de doentes (4965) avaliados pelo Serviço Social, no período de 2009-2012. Assim, o capítulo inicia-se com a análise das componentes principais das dimensões contidas na questão de partida, para depois seguir para uma definição de clusters, utilizando diferentes métodos comparativos. Depois de se estabelecer uma tipologia classificatória (de quatro clusters) examinou-se a composição de cada um deles recorrendo ao teste
(Qui quadrado).
A análise permitiu observar a concentração dos factores de inclusão da questão de partida, num dos clusters de referência (1509 doentes), admitindo a evidência de um diagnóstico de extrema vulnerabilidade. Neste sentido, foram aprofundadas as variáveis que identificam esse mesmo diagnóstico, nas suas múltiplas vertentes (individual, social, familiar, ecomómica, redes formal/informal) compatibilizando-as com as Determinantes sociais da saúde (Dahlgren & Whitehead, 2006). Este método de dedução analítica permitiu reconhecer a extrema vulnerabilidade no manancial da intervenção social, justificando uma abordagem que possibilite ao Serviço Social a legitimação da continuidade de cuidados pelas estruturas comunitárias de proximidade, minimizando a exposição ao risco e garantindo o ganho em saúde promovido pelas unidades hospitalares.
237
13. O
CAMINHO DA VULNERABILIDADE: DAS DIMENSÕES CRÍTICAS DE ANÁLISE À
CONSTITUIÇÃO DE CLUSTERS
O caminho e a extensão da vulnerabilidade dos doentes assistidos pelo Serviço Social no quadriénio 2009-2012 foram determinados a partir de uma matriz analítica. Esta considerou a totalidade dos doentes complexos (4965 episódios sociais), as principais Determinantes sociais da saúde colhidas em contexto de intervenção social, as variáveis sociodemográficas relevantes e a conjugação com as dimensões críticas integradas na questão da investigação: (i) doença crónica, (ii) comorbilidade, (iii) grau de dependência, (iv) o domicílio como o destino após alta hospitalar e a (v) prestação de cuidados por cuidadores informais.
A
ANÁLISE DE COMPONENTES PRINCIPAIS: DAS DIMENSÕES À QUANTIFICAÇÃO DE
CATEGORIAS
Numa primeira fase, coube explorar estatisticamente os dados nas suas múltiplas variáveis, através do resumo de informação em índices ortogonais (análise de componentes principais) e pela definição de grupos de sujeitos estruturalmente semelhantes (análise de clusters). Esta observação possibilitou relacionar a doença crónica, a comorbilidade, a dependência e o destino após alta, como “componentes principais”, constituindo-se como mais-valia enquanto “técnica de análise exploratória multivariada que transforma um conjunto de variáveis correlacionadas num conjunto menor de variáveis independentes, de combinações lineares das variáveis originais” (Marôco, 2011, p. 441). Esta abordagem permitiu uma inovadora abordagem ao fenómeno.
Demonstra-se então, na Tabela 13, que se segue, a distribuição de frequências e de variáveis para a análise de componentes principais, acrescentando também que desses dados se seguiu para a definição de um número máximo de dimensões. Nesta foram reunidas 11 dimensões que foram encontradas pela diferença entre o total de categorias em presença e o número de variáveis [(3*2)+(1*9)-4]– ver Tabela 13 e gráfico 23.
238
Frequência
Percentagem
ACP
Doença crónica
Valido
Doença crónica
2560
Não Doença Crónica
2404
48,4
Total
4964
100,0
51,6
ACP
Dependência
Frequência
Percentagem
Válido
Situação dependência
2495
50,3
Não situação dependência Total
2469 4964
49,7 100,0
Frequência
Percentagem
40
,8
21 2119 346 511 169 199 256 135 3796 1168
,4 42,7 7,0 10,3 3,4 4,0 5,2 2,7 76,5 23,5
4964 Frequência
100,0 Percentagem
ACP
Destino Após Alta
Valido
Acolhimento Crianças
Em falta
Acolhimento Sem Abrigo Domicílio Falecimento Lar/ /Residência Idosos Outro Outro Domicílio Outro Hospital Unidade RNCCI Total 99
Total ACP
Comorbilidade
Valido
Comorbilidade
564
11,4
Em falta
Não comorbilidade Total 99
2485 3049 1915
50,1 61,4 38,6
4964
100,0
Total
Tabela 13 – Análise de componentes principais (distribuição de frequências e dimensões) -Fonte: SAAS, 2013
Gráfico 23 – Análise de componentes principais – 2009/12 (Fonte SAAS, 2013)
Os dados do gráfico 23 apuram como contribuiu cada uma das dimensões explicitando a variabilidade contida nos dados, constituindo-se ao mesmo tempo, como valores médios das medidas de discriminação. (Pestana & Gageiro, 2005). Assim, a via que determinou a 239
continuidade da pesquisa centrou-se na expressividade das dimensões 1 e 2, assinaladas no gráfico supramencionado com tonalidade laranja, por duas fortes razões: pelo facto de se destacarem dentro das outras dimensões e por deterem o maior número de variações.
Após a escolha pelas duas componentes ortogonais, procedeu-se à análise das medidas de discriminação que fornecem, à partida, a informação relativa ao contributo de cada variável para cada uma das dimensões. MEDIDAS DE DISCRIMINAÇÃO Dimensões Destino após alta hospitalar
1 ,350
2 ,730
Média ,540
Situação de dependência
,770
,073
,422
Doença Crónica
,421
,383
,402
Comorbilidade
,264
,048
,156
Total Activo
1,805
1,233
1,519
Tabela 14- Distribuição das variáveis por principais dimensões 2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
Assim, e em consonância com a Tabela 14, acima representada, escolheram-se as variáveis que mais discriminaram cada dimensão, ou de outro modo, cujas medidas de discriminação são superiores aos respectivos valores médios da própria dimensão (identificados a cor azul). Destas especificações resultaram as seguintes conclusões: Dimensão 1 – Uma primeira dimensão caracterizada pelas variáveis de doença crónica, comorbilidade e situação de dependência, e neste sentido relacionada com o binómio: (dependência/doença); Dimensão 2 – Um segunda dimensão caracterizada pela sua associação ao destino após alta, e neste sentido associada ao binómio: (institucionalização/ domicílio).
Depois de reconhecidas as variáveis que mais se discriminam por dimensão, foram decompostas as relações que se estabeleceram entre as suas categorias, seja por proximidade ou por afastamento, através de um processo de quantificação categorial – conforme tabela 15. Deste, para as duas dimensões em estudo, demonstram-se os resultados que se afiguram na Tabela 16: 240
Situação de Dependência
Pontos: Coordenadas
Categoria Situação de Dependência
Coordenadas do Centroide Dimensões 1 2 ,870 ,292
Frequência 2495
Não situação Dependência
2469 Doença Crónica
-,885
-,246
Pontos: Coordenadas
Categoria Doença Crónica
Coordenadas do Centróide Dimensões 1 2 ,625 -,575
Frequência 2560
Não doença crónica
2404
-,672
,662
Comorbilidade
Categoria Comorbilidade
Coordenadas do Centroide Dimensões 1 2 1,245 -,647
Frequência 564
Não comorbilidade Em falta
2485 1915
-,420
-,016
Destino Após alta hospitalar Pontos: Coordenadas
Categoria Acolhimento P/ Crianças
Frequência 40
Acolhimento P/ Sem Abrigo
Coordenadas do Centróide Dimensões 1 2 -2,507 2,095
21
-,924
-1,805
Domicílio
2119
-,319
-,532
Falecimento
346
1,104
,232
Lar/Casa Repouso/Residência Idosos Outro Outro domicílio
511 169 199
1,041 -,448 ,576
1,716 -,529 -,602
Outro Hospital
256
,269
2,098
Unidade RNCCI Em falta
135 1168
1,085
-,299
Tabela 15 - Quantificação de categorias- 2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
Quant (-)
Dimensão 1
Não comorbilidade
Comorbilidade
Não doença crónica
Doença Crónica
Situação de Não dependência
Situação de Dependência
Acolhimento P/ Sem Abrigo Domicílio Dimensão 2
Quant (+)
Outro domicílio Unidade RNCCI Outro
Acolhimento P/ Crianças Falecimento Lar/Casa Repouso/Residência Idosos Outro Hospital
Tabela 16 – Distribuição de variáveis por proximidade/afastamento2009/12 (Fonte: SAAS, 2013) 241
De acordo com esta distribuição de categorias, o Método de Variable Principal, abaixo representado, no gráfico 24, permitiu distinguir e observar a presença de quatro grupos, distintos entre si:
Gráfico 24 - Método Variable Principal - 2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
Grupo 1 - relacionado com o acolhimento para crianças em que as dimensões de doença crónica não são discriminantes; Grupo 2- associado aos destinos após alta para o domicílio, centros de acolhimento de semabrigo e outros destinos, mas distantes das dimensões de doença crónica, de comorbilidade e de grau de dependência; Grupo 3 – relacionado com a situação de dependência e destinos após alta para lares, casas de repouso e residências de idosos ou outros hospitais; Grupo 4- associado à comorbilidade, à doença crónica e aos destinos após alta para RNCCI e para outros domicílios. Com esta definição de perfis houve lugar a nova exploração dos dados no sentido de classificar os utentes dos episódios sociais e operacionalizar os grupos identificados pelo estudo topológico da Análise de Componentes Principais. Nesse sentido, como resposta ao objectivo proposto coube efectuar uma análise de clusters passando de um nível de análise “topológica para uma abordagem tipológica”, como define Carvalho (2004, p.166).
242
A ANÁLISE E A COMPOSIÇÃO DOS CLUSTERS: NO TRILHO DOS MAIS VULNERÁVEIS
A técnica exploratória de análise multivariada por clusters (Marôco, 2011, p.531) também permite agrupar sujeitos ou variáveis em grupos homogéneos a características comuns. Por esse motivo, e pela procura dos mais vulneráveis, utilizou-se essa mesma técnica, tendo sido aproveitadas, novamente, as duas dimensões já definidas pela Análise de Componentes Principais. Este procedimento analítico originou quatro perfis/grupos, após o procedimento de definição de clusters. Para chegar a esse resultado foram utilizados três métodos de comparação
e
consideraram-se
os
coeficientes
das
últimas
vinte
combinações,
designadamente: através do Centroid Clustering (Cluster Centróide) - Gráfico 25, do Furthest Neighbour (Vizinho Mais Afastado) – Gráfico 26 e Ward – gráfico 27. Para todos os casos, a medida utilizada foi o quadro da distância Euclideana.
Coeficientes
Centroide 12,000 10,000 8,000 6,000 4,000 2,000 ,000 1
2
3
4
5
6
7
8
9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
Numero de Clusters
Gráfico 25 – Método de comparação cluster Centroide – 2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
Vizinho mais Afastado Coeficientes
50,000 40,000 30,000 20,000 10,000 ,000 1
2
3
4
5
6
7
8
9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
Número de Clusters
Gráfico 26 – Método de comparação cluster Vizinho mais afastado – 2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
243
Coeficientes
Ward 14000,000 12000,000 10000,000 8000,000 6000,000 4000,000 2000,000 ,000 1
2
3
4
5
6
7
8
9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
Número de Clusters Gráfico 27 – Método de comparação cluster Ward- 2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
Qualquer um dos métodos conferiu uma solução de quatro clusters como a mais adequada, pois um número de clusters superior a cinco, já não corresponderia a qualquer vantagem na expressão de resultados, ou por outras palavras, não se conseguiriam aferir significativas alterações aos coeficientes de fusão.
Neste encadeamento, a etapa seguinte passou pelo método não hierárquico de K- Medias (SPSS) com uma solução de quatro clusters, mantendo como base as duas dimensões resultantes do procedimento de Análise de Componentes Principais, já que é importante salientar que os clusters são utilizados por norma, como variáveis suplementares apesar de ajudarem a um melhor entendimento da realidade a estudar. Assim, apresenta-se a distribuição percentual de casos pelos clusters encontrados, conforme gráfico 28. Clusters
valor
Cluster 1
2469,000
Cluster 2
141,000
Cluster 3
845,000
Cluster 4
1509,000
Validos Em Falta
4964,000 ,000
Cluster 4 30%
Cluster 1 50% Cluster 3 17%
Cluster 2 3%
Gráfico 28 – Distribuição de clusters – episódios sociais 2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
No gráfico 29, abaixo representado, é possível aferir a disposição das variáveis e a localização dos clusters construindo uma tipologia classificatória, a partir das dimensões da HOMALS 244
(análise de homogeneidade) e da configuração topológica do objecto de estudo (Carvalho, 2004, p.186).
Gráfico 29 – Método de Variable Principal com clusters - 2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
A COMPOSIÇÃO DOS CLUSTERS: DA DEPENDÊNCIA AO DESTINO APÓS ALTA
Relativamente à composição dos clusters foi considerada uma probabilidade de tipo I ( ) de 0,05 em todas as análises inferenciais.
SOBRE A DEPENDÊNCIA
O teste do
permitiu concluir que há relação entre clusters e situação de dependência (
=
2878.299; gl=3; sig= 0,000) e de que esta é mais expressiva nos clusters 3 e 4. Por outro lado, verifica-se que a não dependência está concentrada nos clusters 1 e 2, como se verifica na tabela 17.
245
CROSSTAB - DEPENDÊNCIA
Situação Dependência
Total
Dependência Frequência Frequência Esperada % Dentro Situação Dependência % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Não Dependência Frequência Frequência Esperada % Dentro Situação Dependência % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Frequência Frequência Esperada % Dentro Situação Dependência % Dentro Número de Clusters
Número de Clusters 1
2
3
4
Total
369 1241,0 14,8% 14,9% -49,5
1 70,9% ,0% ,7% -11,9%
772 424,7 30,9% 91,4% 26,2
1353 758,5 52,5% 89,7% 36,7
2495 2495,0 100,0% 50,3%
2100 1228,0 85,1% 85,1% 49,5 2469 2469,0 49,7% 100,0%
140 70,1 5,7% 99,3% 11,9 141 141,0 2,8% 100,0%
73 420,3 3,0% 8,6% -26,2 845 845,0 17,0% 100,0%
156 750,5 6,3% 10,3% -36,7 1509 1509,0 30,4% 100,0%
2469 2469,0 100,0 49,7% 4964 4964,0 100,0% 100,0%
Tabela 17- Situação de dependência /composição de clusters – 2009/12 (Fonte: Episódios Soc., SAAS, 2013)
SOBRE A DOENÇA CRÓNICA
O teste do
concluiu que existe relação entre clusters e doença crónica (
= 1559.980; gl=
3; sig= 0,000), sendo mais expressiva no cluster 4. Também se verificou que a ausência de doença crónica está associada aos três outros clusters, como se observa pela tabela 18, abaixo afigurada. CROSSTAB – DOENÇA CRÓNICA
Doença Crónica
Total
Doença Crónica Frequência Frequência Esperada % Dentro Doença Crónica % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Não Doença Crónica Frequência Frequência Esperada % Dentro Doença Crónica % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Frequência Frequência Esperada % Dentro Doença Crónica % Dentro Número de Clusters
Número de Clusters 1
2
3
4
Total
804 1273,3 31,4% 32,6% -26,7
1 72,7 ,0% ,7% -12,3
355 435,8 13,9% 42,0% -6,1
1400 778,2 54,7% 92,8% 38,4
2560 2560,0 100,0 51,6%
1665 1195,7 69,3% 67,4% 26,7 2469 2469,0 49,7% 100,0%
140 68,3 5,8% 99,3% 12,3 141 141,0 2,8% 100,0%
490 409,2 20,4% 58,0% 6,1 845 845,0 17,0% 100,0%
109 730,8 4,5% 7,2% -38,4 1509 1509,0 30,4% 100,0%
2404 2404,0 100,0 48,4% 4964 4964,0 100,0% 100,0%
Tabela 18- Doença crónica /composição de clusters – 2009/2012 (Fonte: Episódios Sociais, SAAS, 2013)
246
SOBRE A COMORBILIDADE
O teste do
concluiu que há relação entre as variáveis (
= 947.458; gl= 3; sig= 0,000). A
comorbilidade, tal como a doença crónica assumem maior expressão no cluster 4 mas, em contrapartida, não tem representação nos restantes clusters, como evidencia a tabela 19: CROSSTAB - COMORBILIDADE
Comorbilidade
Total
Comorbilidade Frequência Frequência Esperada % Dentro Comorbilidade % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Não Comorbilidade Frequência Frequência Esperada % Dentro Comorbilidade % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Frequência Frequência Esperada % Dentro Comorbilidade % Dentro Número de Clusters
Número de Clusters 1
2
3
4
Total
37 292,0 6,6% 2,3% -23,9
0 15,5 ,0% ,0% -4,4
42 75,8 7,4% 10,2% -4,6
485 179,8 86,0% 49,9% 30,5
564 564,0 100,0 18,5%
1546 1290,0 62,5% 97,7% 23,9 1583 1583,0 51,9% 100,0%
84 68,5 3,4% 100,0% 4,4 84 84,0 2,8% 100,0%
368 334,0 14,8% 89,8% 4,6 410 410,0 13,4% 100,0%
487 792,0 19,6% 50,1% -30,5 972 972,0 31,9% 100,0%
2485 2485,0 100,0% 81,5 3049 3049,0 100,0 100,0%
Tabela 19- Comorbilidade /composição de clusters – 2009/12 (Fonte: Episódios Sociais, SAAS, 2013)
SOBRE O DESTINO APÓS ALTA HOSPITALAR
Pelo teste do
concluiu-se que há relação entre estas variáveis, nomeadamente entre o
destino após alta e os clusters ( = 4563.266; gl=24; sig= 0,000). Este revelou pelos resultados apresentados, que o cluster 1 tem maior expressão nos destinos para o domicílio de origem e para instituições que lidam com equipamentos sociais para sem-abrigo. O cluster 2 está mais associado a destinos que remetem para equipamentos de acolhimento de crianças, lares e ainda para outros hospitais, por transferência hospitalar. O cluster 3 está relacionado, com destinos como lares, casas de repouso, residências de idosos e outros hospitais, retirando a variável acolhimento para crianças. O cluster 4 está associado aos utentes com episódios sociais que regressam ao seu domicílio, ao domicílio de familiares, assim como, se refere aos destinos para a RNCCI.
247
Salientam-se em pormenor as evidências supramencionadas na tabela 20 abaixo representada:
CROSSTAB- DESTINO APÒS ALTA 1
Número de Clusters 2 3
4
Total
Acolhimento Para Crianças
Frequência Frequência Esperada % Dentro Destino Após Alta Hosp. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Acolhimento Para Sem Abrigo
Frequência Frequência Esperada % Dentro Destino Após Alta Hosp. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Domicílio
Frequência Frequência Esperada
Destino Após Alta Hospitalar
% Dentro Destino Após Alta Hosp. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Falecimento
Frequência Frequência Esperada % Dentro Destino Após Alta Hosp. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Lar/Casa Repouso/ Residência Idosos
Frequência Frequência Esperada % Dentro Destino Após Alta Hosp. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Outro
Frequência Frequência Esperada % Dentro Destino Após Alta Hosp. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Outro Domicílio
Frequência Frequência Esperada % Dentro Destino Após Alta Hosp. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Outro Hospital
Frequência Frequência Esperada % Dentro Destino Após Alta Hosp. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Unidade RNCCI
Frequência Frequência Esperada % Dentro Destino Após Alta Hosp. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Total
Frequência Frequência Esperada % Dentro Comorbilidade % Dentro Número de Clusters
0 18,4 ,0% ,0% -5,9
40 1,5 100,0 28,4% 32,4
0 7,8 ,0% ,0% -3,1
0 12,3 ,0% ,0% -4,2
40 40,0 100.0% 1,1%
19 9,7 90,5% 1,1% 4,1
0 ,8 ,0% ,0% -9
0 4,1 ,0% ,0% -2,3
2 6,5 9,5% ,2% -2,1
21 21,0 100,0% ,6%
1493 975,8 70,5% 85,4% 33,9
0 78,7 ,0% ,0% -13,5
0 412,5 ,0% ,0% -34,1
626 652,0 29,5% 53,6% -1,8
2119 2119,0 100,0% 55,8%
40 159,3 11,6% 2,3% -13,5
0 12,9 ,0% ,0% -3,8
87 67,4 25,1% 11,8% 2,8
219 106,5 63,3% 18,8% 13,8
346 346,0 100,0% 9,1%
0 235,3 ,0% ,0% -22,4
52 19,0 10,2% 36,9% 8,3
413 99,5 80,5% 55,9% 37,7
46 157,2 9,0% 3,9% -11,5
511 511,0 100,0% 13,5%
117 77,8 69,2% 6,7% 6,2
0 6,3 ,0% ,0% -2,6
0 32,9 ,0% ,0% -6,5
52 52,0 30,8% 4,5% ,0
169 169,0 100,0% 4,5%
68 91,6 34,2% 3,9% -3,5
0 7,4 ,0% ,0% -2,8
0 38,7 ,0% ,0% -7,1
131 61,2 65,8% 11,2% 11,0
199 199,0 100,0% 5,2%
0 117,9 ,0% ,0% -15,3
49 9,5 19,1% 34,8% 13,5
207 49,8 80,9% 28,0% 25,7
0 78,8 ,0% ,0% -11,0
256 256,0 100,0% 6,7%
11 62,2 8,1% ,6% -9,0
0 5,0 ,0% ,0% -2,3
32 26,3 23,7% 4,3% 1,3
92 41,5 68,1% 7,9% 9,6
135 135,0 100,0% 3,6%
1748 1748,0 46,0% 100,0%
141 141,0 3,7% 100,0%
739 739,0 19,5% 100,0%
1168 1168,0 30,8% 100,0%
3796 3796,0 100,0 100,0%
Tabela 20- Destino Após alta hospitalar /composição de clusters – 2009/12 (Fonte: Epis Sociais, SAAS,2013)
248
Em jeito conclusivo, na tabela 21, caracterizam-se os clusters com base nos Resíduos Ajustados, identificando-se a negrito as variáveis com os valores mais elevados. Variáveis Dependência
CLUSTER 1 Não Dependência
CLUSTER 2 Não dependência
CLUSTER 3 Dependência
CLUSTER 4 Dependência
Doença crónica Comorbilidade
Não Doença Crónica Não Comorbilidade
Não Doença Crónica Não comorbilidade
Não Doença Crónica Não Comorbilidade
Doença Crónica Comorbilidade
Destino após alta Hospitalar
Acolhimento P/ Sem Abrigo Domicílio Outro
Acolhimento P/ Crianças Lar/Casa Repouso/Residência Idosos Outro Hospital
Outro Hospital Lar/Casa Repouso/Residência Idosos Falecimento
Falecimento Outro domicílio Unidade RNCCI
Tabela 21- Análise resíduos ajustados positivos da Comp clusters – 2009/12 (Fonte: Epis. Soc, SAAS, 2013)
13.1. UMA ANÁLISE SOCIODEMOGRÁFICA SEXO, MÉDIA DE IDADES E SUA DISTRIBUIÇÃO
Pelo teste do
concluiu-se que há relação entre variáveis (
= 15.763; gl=3; sig= 0,001).
Esta relação é estatisticamente significativa para o cluster 3 e para o cluster 4, sendo que o terceiro está mais associado ao sexo feminino e o quarto ao sexo masculino (conforme tabela 22). Número de Clusters
CROSSTAB - SEXO
SEXO
Total
Feminino Frequência Frequência Esperada % Dentro Sexo % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Masculino Frequência Frequência Esperada % Dentro Sexo % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Frequência Frequência Esperada % Dentro Sexo % Dentro Número de Clusters
1
2
3
4
Total
1290 1297,2 49,5% 52,2% -,4
82 74,1 3,1% 58,2% 1,4
487 443,9 18,7% 57,6% 3,3
749 792,8 28,7% 49,6% -2,7
2608 2608,0 100,0% 52,5%
1179 1171,8 50,0% 47,8% ,4 2469 2469,0 49,7% 100,0%
59 66,9 2,5% 41,8% -1,4 141 141,0 2,8% 100,0%
358 401,1 15,2% 42,4% -3,3 845 845,0 17,0% 100,0%
760 716,2 32,3% 50,4% 2,7 1509 1509,0 30,4% 100,0
2356 2356,0 100,0 47,5% 4964 4964,0 100,0 100,0%
Tabela 22 – Relação entre sexo masculino e feminino e clusters -2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
Quando se examinou a variável idade, no gráfico 30, verificou-se que há diferença de média de idades. O cluster 1 (46,5 anos) e o cluster 2 (41,1 anos) apresentam uma média de idades 249
mais jovem do que os indivíduos do cluster 3 (74,9 anos) e do cluster 4 (72,2 anos), sendo as diferenças detectadas estatisticamente significativas (K-S: 898.693;gl:3; sig:0,000).
Gráfico 30 – Idade por composição de clusters - 2009/12 (Fonte Ep. Sociais, SAAS, 2013)
O ESTADO CIVIL E AS HABILITAÇÕES LITERÁRIAS
O teste do
conferiu que há relação entre variáveis (
= 704.109; gl=18; sig= 0,000). O
cluster 1 relaciona-se a indivíduos solteiros e/ou que vivem em união de facto, já o cluster 2 coincidiu maioritariamente com indivíduos solteiros e, nalguns casos, com pessoas cujo estado civil é desconhecido. No caso do terceiro cluster, é evidente o estado de viúvez como o
250
mais relevante, e no quarto cluster os resultados são mais expressivos na condição de casado e também de viúvez, conforme se afigura na tabela 23.
CROSSTAB- ESTADO CIVIL
1
Número de Clusters 2 3
4
Total
Solteiro/a
Frequência Frequência Esperada % Dentro Estado Civil. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Casado/a
Frequência Frequência Esperada
ESTADO CIVIL
% Dentro Estado Civil. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Divorciado/a
Frequência Frequência Esperada % Dentro Estado Civil. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Viuvo/a
Frequência Frequência Esperada % Dentro Estado Civil. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Separado/a
Frequência Frequência Esperada % Dentro Estado Civil. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Desconhecido/a
Frequência Frequência Esperada % Dentro Estado Civil. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados União de Facto
Frequência Frequência Esperada % Dentro Estado Civil. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Total
Frequência Frequência Esperada % Dentro Comorbilidade % Dentro Número de Clusters
1016 705,1 73,9% 45,6% 20,3
76 40,2 5,5% 59,8% 6,9
96 222.3 7,0% 13,7% -11,2
186 406,4 13,5% 14,5% -15,8
1374 1374,0 100,0% 31,7%
619 743,0 42,7% 27,8% -8,0
15 42,4 1,0% 11,8% -5.2
237 234,3 16,4% 33,8% ,2
577 428,3 39,8% 45,0% 10,5
1448 1448,0 100,0% 33,4%
95 112,4 43,4% 4,3% -2,4
1 6,4 ,5% ,8% -2,2
37 35,4 16,9% 5,3% ,3
86 64,8 39,3% 6,7% 3,2
219 219,0 100,0% 5,0%
322 523,9 31,5% 14,5% -14,5
29 29,9 2,8% 22,8% -,2
291 165,2 28,5% 41,5% 12,2
379 302,0 37,1% 29,5% 6,0
1021 1021,0 100,0% 23,5%
43 36,4 60,6% 1,9% 1,6
0 2,1 ,0% ,0% -1,5
12 11,5 16,9% 1,7% ,2
16 21,0 22,5% 1,2% -1,3
71 71,0 100,0% 1,6%
27 34,8 39,7% 1,2% -1,9
5 2,0 7,4% 3,9% 2,2
21 20,1 30,9% 1,6% ,2
68 68,0 100,0% 1,6%
104 70,3 75,9% 4,7% 5,9
1 4,0 ,7% ,8% -1,6
14 22,2 10,2% 2,0% -1,9
18 40,5 13,1% 1,4% -4,3
137 137,0 100,0% 3,2%
2226 2226,0 51,3% 100,0%
127 127,0 2,9% 100,0%
702 702,0 16,2% 100,0%
1283 1283,0 29,6% 100,0%
4338 4338,0 100,0% 100,0%
15 11,0 22,1% 2,1% 1,3
Tabela 23 – Relação entre estado civil e clusters- 2009/12 (Fonte: Ep. Sociais, SAAS, 2013)
Na relação entre habilitações literárias e os clusters identificados também se encontraram resultados positivos através do teste
= (379.537; gl=24; sig= 0,000). Concluiu-se que os
clusters estão associados a baixas habilitações literárias, existindo até no cluster 1 e 2, variáveis que confirmam a não frequência de escola, designadamente pela variável “Crianças em idade pré-escolar”. Esta última definição está intimamente relacionada com os clusters 1 e 251
2. Todavia, são também expressivas no cluster 1 as habilitações ao nível do ensino básico – 3º ciclo. Os clusters 3 e 4 estão associados às habilitações de ensino básico – 1º ciclo, bem como às habilitações desconhecidas – as diferenças são - que o cluster 3, afigura ainda com maior expressão os indivíduos analfabetos e, assimetricamente, do cluster 4 resultam os que gozam de habilitações literárias ao nível do ensino superior. OCUPAÇÃO PROFISSIONAL E ESTADO DE OCUPAÇÃO Houve também relação entre variáveis no concerne à relação entre clusters e ocupação profissional, mais concretamente pela conclusão do teste aplicado:
= 632.299; gl=15; sig=
0,000). CROSSTAB- OCUPAÇÂO PROFISSIONAL 1
Número de Clusters 2 3
4
Total
Desempregado/a
Frequência Frequência Esperada % Dentro Ocupação. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados
90 55,8 69,2% 5,3% 6,2
3 1,9 2,3% 5,1% ,8
12 25,7 9,2% 1,5% -3,1
25 46,6 19,2% 1,8% -4,0
130 130,0 100,0% 3,3%
147 90,1 70,0% 8,7 8,2
2 3,1 1,0% 3,4% -, 7
28 41,5 13,3% 3,6% -2,4
33 75,3 15,7% 2,3% -6,3
210 210,0 100,0% 5,3%
284 128,2 95,0% 16,8% 18,9
9 4,5 3,0% 15,3% 2,2
3 59,1 1,0% ,4% -8,5
3 107,2 1,0% ,2% -13,1
299 299,0 100,0% 7,6%
99 86,6 49,0% 5,9% 1,8
1 3,0 ,5% 1,7% -1,2
35 39,9 17,3% 4,5% -,9
67 72,4 33,2% 4,7% -,8
202 202,0 100,0% 5,1%
891 1199,0 31,9% 52,8% -21,9
41 41,9 1,5% 69,5% -,3
667 552,6 23,8% 85,7% 10,1
1198 1002,0 42,8% 84,8% 14,3
2797 2797,0 100,0% 71,0%
178 128,7 59,3% 10,5% 6,0
3 4,5 1,0% 5,1% -,7
33 59,3 11,0% 4,2% -4,0
86 107,6 28,7% 6,1% -2,7
300 300,0 100,0% 7,6%
1669 1689,0 42,9% 100,0%
59 59,0 1,5% 100,0%
778 778,0 19,8% 100,0%
1412 1412,0 35,9% 100,0%
3938 2938,0 100,0% 100%
Empregado/a
Frequência Frequência Esperada % Dentro Ocupação. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Estudante/Formação Profissional OCUPAÇÂO PROFISSIONAL
Frequência Frequência Esperada % Dentro Ocupação. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Outra Situação
Frequência Frequência Esperada % Dentro Ocupação. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Reformado/Pensionista
Frequência Frequência Esperada % Dentro Ocupação. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Sem Ocupação
Frequência Frequência Esperada % Dentro Ocupação. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Total
Frequência Frequência Esperada % Dentro Comorbilidade % Dentro Número de Clusters
Tabela 24 – Relação entre ocupação profissional e clusters -2009/12 (Fonte: Ep Sociais, 2013)
252
Assim, de acordo com a tabela 24, o cluster 1 é o mais heterogéneo e compreende quatro grupos ocupacionais, a saber por gradação decrescente, Estudantes/Formação profissional, Empregados, Desempregados e Sem ocupação. O cluster 2 está mais relacionado com a variável: Estudantes/Formação profissional. Sem grande margem para hesitações, os clusters 3 e 4 representam maioritariamente os doentes que se encontram reformados e são pensionistas. A análise de variáveis também se debruçou sobre o estado de ocupação profissional e os quatro clusters, tendo-se chegado a um resultado, de relação entre ambos, através do teste do : (
= 57.800; gl=3; sig= 0,000). Deste modo, verificou-se que o cluster 2, 3 e 4
representam uma população maioritariamente não activa, e que o cluster 1 caracteriza, com maior visibilidade a população que se encontra em actividade – como demonstra a tabela 25.
CROSSTAB- ESTADO OCUPACIONAL 1
Número de Clusters 2 3
4
Total
Não empregado/a
Frequência Frequência Esperada ESTADO OCUPACIONAL
% Dentro Estado Cupacional. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados
1874 1950,8 45,7% 86,4 -7,6
114 107,9 2,8% 95,0% 1,9
759 733,0 18,5% 93,1% 3,3
1357 1312,2 33,1% 93,0% 4,7
4104 4104,0 100,0% 89,9
295 218,2 64,3% 13,65% 7,6
6 12,1 1,3% 5,0% -1,9
56 82,0 12,2% 6,9% -3,3
102 146,8 22,2% 7,0% -4,7
459 459,0 100,0% 10,1%
2169 2169,0 47,5% 100,0%
120 120,0 2,6% 100,0
815 815,0 17,9% 100,0%
1459 1459,0 32,0% 100,0 %
4583 4583,0 100,0% 100,0%
Empregado/a
Frequência Frequência esperada % Dentro Estado Ocupacional % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados
Frequência Frequência Esperada
Total
% Dentro Ocupação Profissional % Dentro Número de Clusters
Tabela 25 – Relação entre estado ocupacional e clusters -2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
13.2. UMA ANÁLISE MULTIDIMENSIONAL
Com o aprofundamento da análise foram consideradas exclusivamente as variáveis sociodemográficas e as dimensões que determinam a vulnerabilidade dos utentes em estudo. Nestes privilegiou-se os que têm relação com os clusters, e que não mais do que 20% das células tenham frequência esperada inferior a 5, de forma a distinguir classificações essenciais e acessórias.
253
O DIAGNÓSTICO SOCIAL POR CLUSTERS Ainda que a validação estatística derive de uma determinada percentagem/frequência esperada para ser considerada em qualquer um dos clusters identificados, foi possível encontrar afinidades e relações entre estes e os diagnósticos sociais aferidos pelos assistentes sociais, como se pode observar pela tabela 26. CROSSTAB- DIAGNÒSTICO SOCIAL
Número de Clusters 2
Resíduos Ajustados Positivos Precariedade económica -Precariedade económica -Não precariedade económica Criança/jovem em risco - Criança/jovem em risco - Não Criança/jovem em risco Criança/jovem c/ maus tratos -Criança/jovem maus tratos -Não Criança jovem maus tratos Criança/jovem perigo neglig. - Criança/jovem perigo neg. -Não Criança/jovem perigo neg. Criança/jovem abandono -Criança/jovem abandono -Não Criança/jovem abandono Criança/jovem abuso sexual -Criança/jovem abuso sexual -Não Criança/jovem abuso sexua Suporte primário familiar -Suporte primário familiar Não suporte primário familiar Violência Doméstica -Violência Doméstica -Não Violência Doméstica Problemas Habitacionais -Problemas habitacionais -Não problemas habitacionais Problemas Pessoais Comportamentais /Relacionais -Problemas Pessoais Comp/Rel -Não Problemas Pessoais Comp/ Problemas Emprego/Desemprego/Trabalho -Problemas Emprego/Desemp/Tr -Não Problemas Emprego/Desem Problemas Educação/Formação Profissional -Problemas Educação/For P. -Não Problemas Educação/For. P Problemas Ambiente social. -Problemas ambiente social -Não Problemas ambiente social Problemas Saúde e Sociais -Problemas Saúde e Sociais -Não Problemas Saúde e Sociais Problemas Estilos de Vida - Problemas estilos de vida -Não problemas estilos de vida
Cluster 1
Cluster 2
Cluster 3
Cluster 4
-5,7 5,7
-3,0 3,0
-1,4 1,4
8,4 -8,4
18.0 -18,0
9,6 -9,6
-10,3 10,3
7,6 -7,6
1,4 -1,4
6,4 -6,4
X
Gl
Sig.
75,481
3
0,000
-14,6 14,6
490,59 5
3
0,000
-3,9 3,9
-5,6 5,6
65,900
3
0,000
1,9 -1,9
-3,5 3,5
-4,8 4,8
49,722
3
0,000
-1,2 1,2
10,9 -10,9
-1,4 1,4
-1,4 1,4
119,11 9
3
0,000
7,1 -7,1
,2 -,2
-3,6 3,6
-4,9 4,9
52,888
3
0,000
-15,7 15,7
-3,5 3,5
6,5 -6,5
13.0 -13,0
287,09 4
3
0,000
2,8 -2,8
,4 -,4
-,3 ,3
-3,0 3,0
10,434
3
0,015
-8,1 8,1
-2,2 2,2
2,3 -2,3
7,8 -7,8
84,699
3
0,000
-1,9 1,9
-1,3 1,3
-1,0 1,0
3,3 -3,3
11,944
3
0,008
6,0 -6.0
-2,2 2,2
-4,6 4,6
-2,0 2,0
43,335
3
0,000
3,4 -3,4
-,8 ,8
-1,0 1,0
-2,6 2,6
12,263
3
0,007
-2,3 2,3
-1,4 1,4
-,2 ,2
3,3 -3,3
12,180
3
0,007
-4,6 4,6
,3 -,3
1,0 -1,0
4,1 -4,1
23,148
3
0,000
-6,7 6,7
-1,6 1,6
1,3 -1,3
6,8 -6,8
58,130
3
0,000
Tabela 26 – Relação entre diagnóstico e clusters -2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
254
Deste modo, têm enquadramento para o cluster 1, os seguintes diagnósticos sociais: precariedade económica, problemas laborais/desemprego, problemas educacionais/formação profissional, criança/jovem vítima de maus tratos, criança/jovem em risco, criança/ jovem perigo negligência, criança/jovem perigo abuso sexual, violência doméstica. O cluster 2 salienta com grande expressividade, o diagnóstico de criança/jovem em perigo abandono, e também o indicador criança/jovem em risco. O cluster 4 está isolado na representação dos diagnósticos referentes a problemas pessoais – área comportamental/relacional, problemas relacionados com o ambiente social, problemas relacionados com o estilo de vida, e em conjunto com o cluster 3, a problemas com o grupo de suporte primário/família (principal) e com problemas habitacionais.
A PROVENIÊNCIA DOS RENDIMENTOS
Relativamente à disponibilidade de recursos dos utentes, aqueles que têm afinidade com os clusters, derivam de rendimentos do agregado familiar ( pensões/reformas (
= 11.767; gl=3; sig=0,008), das
= 11.766; gl=3; sig=0,000) e do rendimento mínimo/social de inserção
( = 16.271; gl=3; sig=0,001) – tabela 27.
Estes, em conformidade com a figura 13, estão distribuídos da seguinte forma: Ao cluster 1 estão associados rendimentos resultantes do agregado familiar e das contribuições da segurança social (Rendimento Mínimo Garantido/ Rendimento Social de Inserção). Ao cluster 3 e 4 associam-se os rendimentos provenientes das pensões/reformas dos utentes. Registou-se ainda, entre o cluster 1 e 4 uma particularidade que reflecte a dependência de prestações do Estado, quer pelo regime contributivo (cluster 4) quer pelo regime não contributivo (cluster 1).
Variáveis /rendimento
Cluster 1
Cluster 2
Cluster 3
Agregado familiar
Cluster 4
Não Agregado familiar
Agregado familiar Não Pensão reforma
Pensão/reforma
Pensão/reforma
Rendimento /inserção
Não Rendimento mínimo / social inserção
Não mínimo inserção
Pensão/ reforma Rendimento mínimo/Inserção
mínimo
Rendimento / social
Figura 13- Análise resíduos ajustados: proveniência recursos / clusters (Fonte: SAAS, 2013
255
CROSSTAB - RENDIMENTO 1
Rendimento Agregado Familiar
Total
Rendimento agregado familiar Count Expected Count % dentro Rendimento Agregado F. % dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Não rendimento agregado familia Count Expected Count % Dentro Rendimento Agregado F. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Count Expected Count % Dentro Rendimento Agregado F. % Dentro Número de Clusters
85 66,6 63,4% 3,4% 3,2 2384 2402,0 49,4% 96,6% -3,2 2469 2469,0 49,7% 100,0%
Crosstab 1
Rendimento Pensão Reforma
Total
Rendimento Pensão/Reforma Frequência Frequência Esperada % Dentro Rendimento Pensão /Ref % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Não Rendimento Pensão/Reforma Frequência Frequência Esperada % Dentro Rendimento Pensão Ref. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Frequência Frequência Esperada % Dentro Rendimento Pensão Ref. % Dentro Número de Clusters
436 592,9 36,6% 17,7% -10,4 2033 1876,0 53,9% 82,3% 10,4 2469 2469,0 49,7% 100,0%
Crosstab 1
Rendimento Mínimo/Social de Inserção
Total
Rendimento Mínimo/ Social Frequência Frequência Esperada % Dentro Rendimento mínimo. % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Não Rendimento Mínimo /Social Frequência Frequência Esperada % Dentro Rendimento mínimo % Dentro Número de Cluster Resíduos Ajustados Frequência Frequência Esperada % Dentro Rendimento mínimo % Dentro Número de Clusters
Número de Clusters 2 3 1 3,8 , 7% , 7% -1,5
4
Total
20 22,8 14,9% 2,4% -,7
28 40,7 20,9% 1,9% -2,4
134 134,0 100,0 2,7%
140 825 137,2 822,2 2,9% 17,1% 99,3% 97,6% 1,5 ,7 141 845 141,0 845,0 2,8% 17,0% 100,0% 100,0% Número de Clusters 2 3
1481 1468,3 30,7% 98,1% 2,4 1509 1509,0 30,4% 100,0%
4830 4830,0 100,0% 97,3%
25 33,9 2,1% 17,7% -1,8
4
4964 4964,0 100,0 100,0% Total
296 202,9 24,8% 35,0% 8,2
425 362,4 36,5% 28,8% 5,2
1192 1192,0 100,0 24%
116 549 107,1 642,1 3,1% 14,6% 82,3% 65,0% 1,8 -8,2 141 845 141,0 845,0 2,8% 17,0% 100,0% 100,0% Número de Clusters 2 3
1074 1146,6 28,5% 71,2% -5,2 1509 1509,0 30,4% 100,0%
3772 3772,0 100,0% 76,0%
4
4964 4964,0 100,0 100,0% Total
37 23,4 78,7% 1,5% 4,0
0 1,3 , 0% , 0% -1,2
3 8,0 6,4% , 4% -2,0
7 14,3 14,9% , 5% -2,3
47 47,0 100,0 ,9%
2432 2445,6 49,5% 98,5% -4,0 2469 2469,0 49,7% 100,0%
141 139,7 2,9% 100,0% 1,2 141 141,0 2,8% 100,0%
842 837,0 17,1% 99,6% 2,0 845 845,0 17,0% 100,0%
1502 1494,7 30,5% 99,5% 2,3 1509 1509,0 30,4% 100,0%
4917 4917,0 100,0% 99,1% 1964 4964,0 100,0 100,0%
Tabela 27 – Relação entre a variável rendimento e clusters- 2009/12 (Fonte: SAAS, 2013)
256
A DIMENSÃO PESSOAL E FAMILIAR
Os factores de risco pessoais implicados no processo de gestão da doença interpretam-se pela análise organizada a pela distribuição por clusters identificada na tabela 28, abaixo apresentada. CROSSTAB – DIMENSÂO PESSOAL
Número de Clusters 2
Resíduos Ajustados Positivos Auto marginalização -Auto-marginalização -Não Auto-marginalização Comportamentos de Risco - Comportamentos de Risco - Não Comportamentos de Risco Dependência de Serviços -Dependência de Serviços -Não Dependência de Serviços Dependência de Terceira Pessoa - Dependência de Terceira P -Não Dependência de Terceira P Desajustamento Psicossocial - Desajustamento Psicossocial -Não Desajustamento Psicossocia Desconhecimento de Direitos - Desconhecimento Direitos -Não Desconhecimento Direitos Dificuldade de Comunicação -Dificuldade de Com Não Dificuldade de Com. Dificuldade Mudança -Dificuldade na Mudança -Não Dificuldade na Mudança Incapacidade de Gestão de recursos -Incapacidade de Gestão R -Não Incapacidade de Gestão R. Isolamento Familiar -Isolamento familiar -Não Isolamento familiar Recusa de Alta -Recusa de Alta Hospitalar -Não Recusa de Alta Hospitalar Tentativa de Suicídio - Tentativa de Suicídio. -Não tentativa Suicídio Vítima de Discriminação -Vítima de Discriminação -Não Vítima de Discriminação
Cluster 1
Cluster 2
Cluster 3
Cluster 4
-2,6 2,6
-,5 ,5
,4 -,4
2,7 -2,7
4,5 -4,5
,1 -,1
-3,8 3,8
-12,7 12,7
-3,8 3,8
-38,9 38,9
X
Gl
Sig.
8,834
3
0,032
-1,8 1,8
24,605
3
0,000
7,4 -7,4
9,2 -9,2
199,657
3
0,000
-8,4 8,4
15,6 -15,6
32,7 -32,7
1774,372
3
0,000
1,7 -1,7
-1,5 1,5
-2,9 2,9
1,0 -1,0
11,500
3
0,009
,9 -.9
-4,2 4,2
-2,2 2,2
2,3 -2,3
25,477
3
0,000
-6,3 6,3
-1,9 1,9
3,6 -3,6
4,6 -4,6
49,218
3
0,000
-5,8 5,8
-1,5 1,5
2,7 -2,7
4,6 -4,6
40,443
3
0,000
-22,4 22,4
-4,1 4,1
6,7 -6,7
20,4 -20,4
594,749
3
0,000
-8,3 8,3
-1,2 1,2
5,7 -5,7
4,8 -4,8
79,749
3
0,000
-2,0 2,0
,1 -,1
3,2 -3,2
-,6 ,6
10,768
3
0,013
1,2 -1,2
3,2 -3,2
-1,6 1,6
-1,1 1,1
13,557
3
0,004
5,0 -5,0
-,4 ,4
-2,2 2,2
-3,5 3,5
25,719
3
0,000
Tabela 28 – Relação entre dimensão pessoal e clusters – 2009/12 (Fonte: Ep Sociais, SAAS, 2013)
O cluster 1 assume as maiores evidências registadas pela análise dos dados que se referem a comportamentos de risco e a questões relacionadas com processos de vitimização primária ou secundária. O cluster 2 corresponde a factores que dizem respeito ao fenómeno do suicídio. Já 257
o cluster 3 demarca-se de todos os outros, pois revela as evidências de recusa de alta hospitalar, e em conjunto com o cluster 4, embora menos relevante, o isolamento familiar. O cluster 3 e 4 reúnem dimensões de risco que se prendem com as dificuldades num processo de mudança, dificuldades de comunicação e de dependência de serviços sendo que as dimensões de maior representatividade estatística estejam para ambos os clusters na dependência de terceiros. O cluster 4 reúne em si, de forma particular, factores como a incapacidade de gestão de recursos, o desconhecimento de direitos e a auto-marginalização.
Nos mesmos moldes, na tabela 29, explanam-se os factores de risco familiares em consonância com a distribuição pelos quatro clusters. CROSSTAB – DIMENSÂO FAMILIAR
Número de Clusters 2
Resíduos Ajustados Positivos
Cluster 1
Cluster 2
Cluster 3
Cluster 4
-4,0 4,0
5,3 -5,3
,8 -,8
1,8 -1,8
7,7 -7,7
,1 -,1
-3,7 3,7
4,5 -4,5
2,0 -2,0
4,3 -4,3
X
Gl
Sig.
37,722
3
0,000
-5,4 5,4
61,729
3
0,000
,-9 ,9
-4,8 4,8
30,820
3
0,000
2,9 -2,9
-2,4 2,4
-3,7 3,7
31,484
3
0,000
4,0 -4,0
2,7 -2,7
-3,0 3,0
-2,8 2,8
28,583
3
0,000
11,6 -11,6
5,3 -5,3
-8,1 8,1
-7,9 7,9
192,624
3
0,000
3,8 -3,8
3,6 -3,6
-1,9 1,9
-3,8 3,8
33,088
3
0,000
-6,6 6,6
-1,3 1,3
4,9 -4,9
3,7 -3,7
53,217
3
0,000
-,6 ,6
2,5 -2,5
-1,5 1,5
1,0 -1,0
8,985
3
0,029
-4,6 4,6
-,8 ,8
1,1 -1,1
4,4 -4,4
25,991
3
0,000
5,4 -5,4
9,3 -9,3
-4,0 4,0
-5,9 5,9
137,042
3
0,000
-24,1 24,1
-3,7 3,7
11,0 -11,0
18,5 -18,5
644,999
3
0,000
-18,3 18,3
-2,7 2,7
11,1 -11,1
11,8 -11,8
374,733
3
0,000
Abandono -Abandono -Não Abandono Abuso Sexual - Abuso Sexual - Não Abuso Sexual Ausência de Planeamento Familiar - Ausência Planeamento F. - Não Ausência Planeamento F. Criança/Jovem - Criança/Jovem -Não Criança/Jovem Desenraizamento Cultural - Desenraizamento cultural -Não Desenraizamento cultural Disfunção Familiar - Disfunção Familiar -Não Disfunção Familiar Familiar Com Comportamentos Aditivos -Familiar Comportamentos A Não Familiar Comportamentos Familiar Idosos Dependentes - Familiares Idosos Dep -Não Familiares Idosos Dep Familiar Patologia Psiquiátrica -Familiar Patologia Psiquiat -NãoFamiliar PatologiaPsiquiat. Familiar Dependente -Familiar Dependente -Não Familiar Dependente Gravidez Não vigiada -Gravidez não vigiada -Não Gravidez não vigiada Incapacidade de Prestação de Cuidados - Incapacidade Prestação C. -Não Incapacidade Prestação C. Indisponibilidade de Prestação de Cuidados - Indisponibilidade Prestação C. -NãoIndisponibilidadePrestação
258
Número de Clusters CROSSTAB – DIMENSÂO FAMILIAR Resíduos Ajustados Positivos Maternidade Precoce - Maternidade Precoce -Não Maternidade Precoce Maus Tratos Físicos - Maus Tratos Físicos - Não Maus Tratos Físicos Maus Tratos Psicológicos - Maus Tratos Psicológicos - Não Maus Tratos Psicológicos Monoparentalidade - Monoparentalidade -Não Monoparentalidade Negligência de Afectos - Negligência de Afectos -Não Negligência de Afectos Negligência Prestação de Cuidados - Negligência Prestação C, -Não Negligência de Prestação Problemas Legais -Problemas Legais -Não Problemas Legais Recusa Incapacidade Doente -Recusa Incapacidade D. -Não Recusa Incapacidade D. Recusa de Alta -Recusa de Alta Hospitalar -Não Recusa de Alta Hospitalar Sem Família -Sem família -Não Sem família Sobrecarga Familiar -Sobrecarga familiar -Não Sobrecarga familiar Superprotecção - Superprotecção -Não Superprotecção
2 Cluster 1
Cluster 2
Cluster 3
Cluster 4
8,9 -8,9
1,3 -1,3
-4,6 4,6
-6,3 6,3
6,2 -6,2
2,6 -2,6
-3,4 3,4
6,4 -6,4
,1 -,1
8,2 -8,2
X
Gl
Sig.
86,426
3
0,000
-4,9 4,9
52,327
3
0,000
-3,2 3,2
-4,4 4,4
43,110
3
0,000
-1,2 1,2
-3,5 3,5
-5,6 5,6
67,559
3
0,000
-1,6 1,6
-2,9 2,9
-,3 ,3
,9 -,9
9,445
3
0,019
2,7 -2,7
-.6 ,6
-3,4 3,4
,0 ,0
13,560
3
0,004
5,1 -5,1
-,9 ,9
-2,0 2,0
-3,6 3,6
25,990
3
0,000
-7,0 7,0
-2,0 2,0
4,3 -4,3
4,8 -4,8
60,479
3
0,000
-12,6 12,6
-1,0 1,0
4,4 -4,4
10,4 -10,4
171,307
3
0,000
-3,1 3,1
1,3 -1,3
2,4 -2,4
,9 -,9
11,864
3
0,008
-4,1 4,1
-2,2 2,2
2,2 -2,2
3,4 -3,4
25,046
3
0,000
-6,3 6,3
-1,5 1,5
4,5 -4,5
3,8 -3,8
48,875
3
0,000
Tabela 29 – Relação entre dimensão familiar e clusters -2009/12 (Fonte: Ep Sociais, SAAS, 2013)
Integradas tanto no cluster 1, como no cluster 2, mas com uma preponderância maior no cluster 1, em todas as dimensões expressas encontram-se as seguintes causas: familiar menor (criança
ou
jovem),
desenraizamento
cultural,
disfunção
familiar,
família
com
comportamentos aditivos, maternidade precoce e presença de maus tratos físicos. No primeiro cluster há uma correspondência estatística com o abuso sexual, com a ausência de planeamento familiar, com os maus tratos psicológicos, com a monoparentalidade, com a negligência na prestação de cuidados e com questões de legalidade. O cluster 2 representa factores como: o abandono familiar, a presença de patologia psiquiátrica na família, a negligência de afectos e a gravidez não vigiada.
259
O cluster 3 está directamente associado à inexistência de familiares. Todavia, em conjunto com o cluster 4, mas com maior expressão, reúne os factores de risco: superprotecção familiar e os casos de familiares de doentes idosos e dependentes. Por seu turno, o cluster 3 e 4 confirmam a recusa familiar por incapacidade do doente e a própria recusa de alta por parte da família – mais visíveis no cluster 4. Porém, as causas de maior relevo estatístico, por comparação, encontram-se nos clusters 3 e 4 e versam sobre os riscos associados à incapacidade e à indisponibilidade de prestação de cuidados por familiares. Finalmente, e como características preponderantes do cluster 4 salientam-se os factores relacionados com familiares dependentes.
AS DIMENSÕES ECONÓMICA, PROFISSIONAL E EDUCACIONAL
No que concerne aos factores de risco de ordem económica e à sua distribuição recolheram-se os seguintes resultados, como confere a tabela 30: CROSSTAB – DIMENSÂO ECONÓMICA
Número de Clusters 2
Resíduos Ajustados Positivos
Cluster 1
Cluster 2
Cluster 3
Cluster 4
4,5 -4,5
1,3 -1,3
-4,1 4,1
-2,0 2,0
-11,9 11,9
-3,5 3,5
2,5 -2,5
-2,4 2,4
-2,0 2,0
-3,0 3,0 -8,4 8,4
Ausência Rendimentos -Ausência de Rendimento -Não Ausência de Rendimento Baixo Rendimento Trabalho - Baixo Rendimento Trab. - Não Baixo Rendimento Trab. Encargos Elevados Habitação - Encargos Elevados Hab - Não Encargos Elevados Hab. Outros Encargos Elevados - Outros Encargos Elevados -Não Outros Encargos Elevados Encargos Elevados Saúde - Encargos Elevados Saúde - Não Encargos Elevados Saúde
X
Gl
Sig.
28,830
3
0.000
12,1 -12,1
189,206
3
0.000
-2,2 2,2
5,1 -5,1
28,845
3
0.000
-1,4 1,4
-,3 ,3
4,0 -4,0
28,845
3
0.000
-2,7 2,7
-,1 ,1
10,2 -10,2
114,582
3
0.000
Tabela 30 – Relação entre dimensão económica e clusters – 2009/12 (Fontes: Ep Sociais, SAAS, 2013)
O cluster 1 encerra em si a questão da ausência de rendimentos enquanto o cluster 3 e o 4, com uma representação estatística significativa apresentam como factores, o baixo rendimento proveniente do trabalho (pensão). O cluster 4 circunscreve ainda factores económicos que estão relacionados com o nível de encargos económicos, ao nível da habitação, mas também nos encargos associados à área da saúde.
260
Da análise, cuja expressão estatística foi possível identificar na tabela 31, que se segue, sobressaem três variáveis que remetem para a observância da dimensão profissional. CROSSTAB – DIMENSÂO PROFISSIONAL
Número de Clusters 2
Resíduos Ajustados Positivos Ausência Hábitos de Trabalho -Ausência Hábitos Trabalho -Não Ausência Hábitos Trabalho Baixa Qualificação Profissional - Baixa Qualificação Prof. - Não Baixa Qualificação Prof. Desemprego - Desemprego - Não Desemprego
Cluster 1
Cluster 2
Cluster 3
Cluster 4
1,9 -1,9
3,0 -3,0
-3,3 3,3
-,4 ,4
1,4 -1,4
-2,5 2,5
-3,8 3,8
7,2 -7,2
-1,5 1,5
-4,4 4,4
X
Gl
Sig.
19,626
3
0,000
2,4 -2,4
23,053
3
0,000
-3,7 3,7
53,803
3
0,000
Tabela 31 – Relação entre dimensão profissional e clusters – 2009/12 (Fontes: Ep Sociais, SAAS, 2013)
Deste modo, a variável ausência de hábitos de trabalho está ancorada ao cluster 2, as baixas qualificações profissionais ao nível do cluster 4, e finalmente, destacado, o problema do desemprego patente no cluster 1.
No que respeita às dimensões educacionais, com enquadramento na análise estatística são apenas estatisticamente relacionáveis os indicadores de abandono escolar e de insucesso escolar, ambos do âmbito do cluster 1, como se observa pela tabela 32. CROSSTAB – DIMENSÂO EDUCAÇÃO
Número de Clusters 2
Resíduos Ajustados Positivos
Cluster 1
Cluster 2
Cluster 3
Cluster 4
-Abandono Escolar -Não Abandono Escolar
4,8 -4,8
,1 -,1
-2,6 2,6
-3,1 3,1
- Insucesso escolar. - Não Insucesso Escolar
5,3 -5,3
1,2 -1,2
-2,3 2,3
-4,3 4,3
X
Gl
Sig.
24,339
3
0,000
33,078
3
0,000
Abandono Escolar
Insucesso Escolar
Tabela 32 – Relação entre dimensão educação e clusters – 2009/12 (Fontes: Ep Sociais, SAAS, 2013)
AS DIMENSÕES DE PROTECÇÃO SOCIAL E HABITACIONAL
Relativamente aos problemas que têm uma associação com factores de risco na protecção social ressaltam, de acordo com a análise estatística, as dimensões identificadas na tabela 33.
261
Número de Clusters CROSSTAB - DIMENSÂO PROTECÇÃO SOCIAL Resíduos Ajustados Positivos Desemprego Sem Protecção -Desemprego Sem protecção -Não Desemprego Sem protecção Falta de Cobertura de Equipamentos Sociais - Falta Cobertura de Eq. Sociais - Não Falta Cobertura Eq Sociais Falta de Resposta (comunidade) - Falta de Resposta - Não Falta de Resposta
2 Cluster 1
Cluster 2
Cluster 3
Cluster 4
3,3 -3,3
,9 -,9
-1,1 1,1
-3,0 3,0
-2,6 2,6
2,1 -2,1
1,2 -1,2
-3,1 3,1
-,2 ,2
1,8 -1,8
X
Gl
Sig.
13,558
3
0,004
1,1 -1,1
9,558
3
0,022
2,0 -2,0
10,102
3
0,018
Tabela 33 – Relação entre dimensão protecção social e clusters – 2009/12 (Fontes: Ep Sociais, SAAS, 2013)
Assim, para o cluster 1, a condição de desemprego sem subsídio, com a maior relevância, para o cluster 2, a escassez de cobertura de equipamentos sociais – e finalmente, para o cluster 4, a ausência de respostas comunitárias.
Apesar de não ter a expressão de frequência esperada, como outras dimensões já descritas nos parágrafos anteriores, houve manifestação de relação existente entre clusters na dimensão habitacional nos seguintes factores de risco – como atesta a tabela 34. CROSSTAB – DIMENSÂO HABITAÇÃO Resíduos Ajustados Positivos
Cluster 1
Dimensão Habitação -Sem abrigo -Ausência Domicílio Fixo -Insalubridade -Falta de Higiene -Degradação -Desalojamento -Sobrelotação -Barreiras Arquitectónicas -AusênciaInfra-estruturas Básica -Outro - Sem Alojamento - Inabilitabilidade
2,8 4,6 ,8 ,9 1,3 ,0 2,4 -7,1 ,5 1,2 1,8 1,0
Número de Clusters Cluster 2 Cluster 3 ,9 ,6 1,2 1,9 -,6 -,2 1,9 -,2,5 -,6 ,8 -,3 1,3
-2,5 -2,1 -,8 -1,1 -,1 ,3 ,0 4,1 ,0 -2,4 -1,2 ,5
Cluster 4 -,1-2,7 -,4 -,4 -,9 -,2 -2,8 3,8 -,3 ,8 -,6 -1,8
x2
Gl
Sig.
91,731
3
0,000
Tabela 34 – Relação entre dimensão habitação e clusters – 2009/12 (Fontes: Ep Sociais, SAAS, 2013)
Os casos sem-abrigo e de ausência de domicílio fixo enquadram-se no cluster 1, assim como o problema da sobrelotação. Os clusters 3 e 4 destacam-se pela questão das barreiras arquitectónicas.
262
14. A EXTREMA VULNERABILIDADE NO QUADRO DAS DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE
Depois da descrição e da quantificação dos resultados, primeiro através da análise de componentes principais, e depois através da análise de clusters, foi possível estudar o conjunto de doentes que teve maior afinidade com a pergunta de partida e com as interrogações da investigação. Os achados deste estudo transversal, foram fruto de opções exploradas pela análise multivariada dos Episódios sociais - tendo sido por essa via possível chegar aos doentes mais vulneráveis e ao cluster que representa a extrema vulnerabilidade enquanto diagnóstico social. A partir desse reconhecimento, esse grupo de doentes e a relação entre as suas variáveis foram interpretadas de forma compreensiva, no modelo de camadas das Determinantes sociais da saúde (Dahlgren & Whitehead, 2006). Este quadro teórico permitiu categorizar as variáveis da vulnerabilidade, agrupando-as nas distintas dimensões de análise que afectaram a transição dos cuidados hospitalares para os CLD, sendo também compatível com o modelo de intervenção ecológico do Serviço Social, que esteve na base da aferição dos riscos sociais a que correspondem as dimensões analisadas.
Nesta investigação os doentes em situação de maior vulnerabilidade acabaram por se centrar no cluster 4, por exclusão dos outros três, entretanto também já qualificados. Importa referir, que para além das complexas variáveis evidenciadas, o quarto cluster foi o único que agregou, cumulativamente, os factores de inclusão da questão de partida (doença crónica, dependência, comorbilidade, regresso ao domicílio com apoio informal), que em teoria, poderiam suscitar maior amplitude da vulnerabilidade.
Em consonância com a matriz analítica das Determinantes sociais da saúde, a apresentação de resultados do cluster 4, surge estruturada por camadas. A nível macro, identificam-se as variáveis externas aos indivíduos (condições climáticas, geográficas, disponibilidade de recursos), e a um nível micro, as que interferiram na vida individual destes (aos níveis biológico, psicológico e social). O modelo explana como se podem desencadear situaçõesproblema através da análise das condições dos doentes e do meio onde estes se inserem (perspectiva sistémica). Assim, partindo do nível geral para o particular foram incorporados como Determinantes sociais de primeiro nível, os que se relacionam com as condições socioeconómicas, culturais e ambientais, também conhecidas como determinantes de contexto. Uma segunda camada de determinantes discriminou as condições de vida e de 263
trabalho, designadamente, a situação de emprego, de habitação (domicilio próprio ou de familiares), o acesso a equipamentos e os serviços essenciais e o processo de transição após a alta hospitalar. A terceira implicou as relações existente entre as pessoas, as estruturas comunitárias e a rede social de suporte formal/informal. O quarto nível/camada esteve relacionado com os estilos de vida dos indivíduos e com a sua influência para a promoção da saúde. Finalmente, uma última camada de variáveis evidenciou as Determinantes relacionadas com a idade e com o género, mas também com os factores implícitos no estudo da extrema vulnerabilidade, designadamente, a doença crónica, a comorbilidade e a dependência.
14.1. DAS CONDIÇÕES ESTRUTURAIS ÀS INDIVIDUAIS
A extrema vulnerabilidade enquanto diagnóstico social legitima o estabelecimento da continuidade de cuidados e justifica situações prioritárias no acesso a recursos e a serviços de proximidade. Neste sentido, os assistentes sociais (hospitalares, dos centros de saúde, da comunidade), devem desenhar em conjunto, um plano de cuidados individual para os doentes, que salvaguarde a sua particular susceptibilidade ao risco. As evidências demonstram que já não basta actuar, exclusivamente, sobre as causas porque a complexidade dos problemas e a sua extensão requerem uma vigilância sistemática, caso a caso, com os serviços e instituições de referência que procuram, para cada situação, uma solução e uma prestação de cuidados adequada.
A manutenção da perspectiva hospitalocêntrica, cuja visão mainstream ainda tolda e desvirtua a organização dos cuidados é apenas um exemplo que colide com gestão de situações de extrema vulnerabilidade, dado o escasso envolvimento dos doentes nas estruturas de proximidade. Porém, considerando que muitos dos constrangimentos não são de fácil resolução pelas instituições e agentes responsáveis (Estado, sociedade civil, profissionais, famílias, cuidadores) foi importante encontrar uma alternativa que pudesse apoiar a população mais vulnerável, na transição dos cuidados, de acordo com a realidade actual e não com a realidade ideal. Assim, a agilização de cuidados de saúde e de apoio social pode ser validada tendo em consideração a complexidade do doente e do seu meio envolvente, de forma a não colocar em risco os seus níveis mínimos de segurança e bem-estar. Neste sentido, a proposta que se apresentou foi de identificação de diagnósticos e de definição de situações de extrema
264
vulnerabilidade, a partir da conjugação das Determinantes sociais da saúde nos doentes com Episódio Social, assistidos pelo Serviço Social do CHLO, no quadriénio 2009-2012.
AS CONDIÇÕES AMBIENTAIS GERAIS: O ENQUADRAMENTO GEOGRÁFICO A extrema vulnerabilidade (N 1509) está alicerçada às Determinantes sociais estruturais da saúde. Nestas circunstâncias, devem ser consideradas as condições em que as pessoas nascem, crescem e habitam.
Distrito
N
Concelho> 1
N
Freguesias> 10
N
Beja
1
Almada
5
Ajuda
122
Bragança
1
Amadora
28
Alcabideche
18
Castelo Branco
3
Barreiro
2
Alcântara
98
Évora
1
Cadaval
3
Algés
73
Faro
3
Cascais
101
Algueirão. Mem Martins
11
Ilha Madeira
2
Covilhã
2
Barcarena
33
Ilha São Miguel
1
Funchal
2
Carnaxide
81
Ilha Pico
1
Grândola
2
Cascais
17
Leiria
1
Lisboa
435
Caxias
18
Lisboa
1261
Loures
10
Cruz Quebrada
20
Portalegre
1
Mafra
3
Estoril
15
Santarém
3
Moita
2
Linda-a-Velha
58
Setúbal
32
Montijo
5
Oeiras e S. Julião Barra
116
Viana do Castelo
1
Odivelas
9
Paço de Arcos
53
Oeiras
608
Parede
14
Palmela
6
Porto Salvo
52
Seixal
6
Queijas
21
Setúbal
3
Rio de Mouro
11
Sintra
47
Santa Maria de Belém
30
São Domingos de Rana
22
Concelhos> 1=18
S. Francisco Xavier
21
18
Concelhos <10 = 92
225
Em branco
197
Em branco
212
Em branco
380
TOTAL
1509
TOTAL
1509
TOTAL
1509
Tabela 35 – Determinantes ambientais: Enquadramento geográfico (Fonte: SAAS, 2013)
No âmbito dos factores estruturais surgem determinantes que têm interferência directa na promoção da saúde e no bem-estar da população. Um desses factores ambientais está relacionado com a influência da localização física/geográfica dos indivíduos. De acordo com o modelo de análise foi possível aferir através dos indicadores (distrito, concelho e freguesia) qual a proveniência territorial dos doentes em situação de maior vulnerabilidade. Foi possível verificar que residem (Tabela 35), essencialmente no distrito de Lisboa (n 1261) e que estão distribuídos pelos concelhos de Oeiras (n 608); de Lisboa (n 435), de Cascais (n 101); Sintra 265
(n 47) e Amadora (n 28). As freguesias mais representativas foram, respectivamente: no concelho de Oeiras; Oeiras e S. Julião da Barra (n 116), Carnaxide (n 83), Algés (n 71), Linda-a-Velha (n 58), Paço de Arcos (n 53) e Porto Salvo (n 52) e no concelho de Lisboa: as freguesias da Ajuda (n 123) e de Alcântara (n 98). Estas áreas acolheram ao longo de muitos anos, os movimentos migratórios do interior do país para a maior área metropolitana do litoral, tendo-se expandido para os concelhos de proximidade. Os censos de 2011 indicam que a região de Lisboa representa 26,7% da população do país, tendo aumentado, nos últimos 10 anos cerca de 6% (INE, 2011, p.18). Lisboa e Oeiras, juntamente com a Amadora, Odivelas e a Península de Setúbal são os mais densamente povoados com valores na ordem dos 3751,3 hab/km2 (Oeiras) e os 7363,4 hab/km2 (Amadora). Ao longo dos últimos 30 anos têm contribuído para incrementar o fenómeno do duplo envelhecimento populacional, caracterizado pelo aumento da população idosa e pelo recrudescimento da população jovem. O município de Lisboa, por exemplo, é o que tem a maior percentagem de idosos (23,9%) e o maior índice de envelhecimento (185,8). Essa tendência também se terá traduzido pelo aumento do índice de envelhecimento, de 103 idosos por cada 100 jovens, em 2001, para 140 idosos por cada 100 jovens em 2011 (INE 2011, p.22-23). Depois desta perspectiva abrangente, descrevem-se as áreas mais visadas pela extrema vulnerabilidade, nos concelhos de Lisboa e Oeiras.
Geograficamente, Lisboa está dividida em quatro áreas, de acordo com uma simples definição territorial (Norte, Sul, Oriental e Centro Ocidental). Das 53 freguesias do concelho, 5 da área do CHLO (61 331 habitantes), estão referidas com os mais elevados índices de envelhecimento. Algumas destas identificadas na amostra, designadamente: as freguesias da Ajuda (250,5%) e de Alcântara espelham essa realidade (245,4%), comparativamente, à média das outras freguesias do concelho (185%), sendo este índice, provavelmente, uma das variáveis a considerar na representação da extrema vulnerabilidade (Belo et al., 2009). O concelho de Oeiras, por seu turno, foi o mais visado na identificação do cluster da extrema vulnerabilidade. Contudo, foi também o mais representativo relativamente à área de influência do CHLO (172 120 habitantes). Este concelho, pela sua proximidade a Lisboa acabou por conseguir acompanhar a dinâmica do ritmo da renovação de empregos e de crescimento da população, pela migração de residentes nas décadas de 80 e 90. Aludindo à expressão dos resultados neste concelho, aferida pela informação disponibilizada pela Camara Municipal de Oeiras (CMO), pode referir-se que a proporção do número de população idosa com mais de 266
65 anos, que era menor que a de Lisboa, começou a evoluir a partir de 2008, para valores idênticos aos da capital. Aqui também o envelhecimento tendeu a acentuar-se, já desde 1991, 2001, e a classe etária mais jovem a diminuir nos períodos homólogos. As freguesias mais envelhecidas e de menor dimensão podem ter relação com as situações descritas no estudo. Outro factor importante está associado à diminuição média da estrutura familiar que, não raras vezes, se alia às freguesias mais envelhecidas comprometendo a coesão social. Note-se que as famílias de menor dimensão e mais envelhecidas são provenientes das freguesias: Cruz Quebrada/Dafundo, Algés, Paço de Arcos e Oeiras e S. Julião da Barra, de onde são originárias, por exemplo, algumas freguesias com a maior expressão em número de doentes em extrema vulnerabilidade (CMO, 2009, p.10-11).
AS CONDIÇÕES SOCIOECONÓMICAS: O RENDIMENTO E A SITUAÇÃO PERANTE O TRABALHO Se o posicionamento geográfico assume uma importância relevante, o rendimento e as condições económicas dos doentes e dos seus agregados familiares, constituem a base de grande parte das Determinantes sociais de saúde. No caso vertente, a proveniência dos rendimentos desta tipologia de doentes tem origem na pensão de reforma de regime contributivo (n 1198), o que clarifica de certa forma, que se trata de uma população predominantemente idosa. A população empregada (n 33) ou desempregada (n 25) não foram representativas.
O concelho de Lisboa, representado na vulnerabilidade, apresentou um índice de poder de compra acima da média, que correspondia em 2007 a 235,7% do poder de compra nacional e aproximadamente, a 11 % do poder de compra do país (INE, 2007, p.28). Noutros planos, tais como a competitividade, o emprego e potencial de criação de valor, assumiu a liderança nacional destacando-se em áreas tão distintas como a economia do conhecimento, a educação da população ou a cultura. Porém, numa visão assimétrica, a população mais frágil de Lisboa é proveniente de freguesias residenciais, em que as características de expansão e crescimento económico não são se coadunam com os indicadores de performance globais da cidade, pois afectam principalmente a população idosa, ou seja, reformados que vivem quase exclusivamente das suas pensões (Belo et al., 2009, p. 124-125). O Concelho de Oeiras assegura o segundo índice de poder de compra per capita (n 173), a seguir ao concelho de Lisboa (n 216) tendo no comércio, por grosso e a retalho, a sua principal actividade económica (INE, 2007, p.23). No entanto, a população idosa foi a mais 267
afectada pela extrema vulnerabilidade. Ou seja, enquadrou-se no agrupamento de dados da população inactiva (INE, 2008) que admite um número de 35 814 pensionistas (para um total de 172 120 habitantes), que se encontram subdivididos pelas tipologias: de velhice (n 24 693), de invalidez (n 2990) e de sobrevivência (n 8130). Importa acrescentar que a pensão de velhice tem vindo a aumentar progressivamente, agravando o panorama de envelhecimento vivido no concelho (CMO, 2009, p.76).
Tendo como pano de fundo a condição socioeconómica dos doentes, foi possível verificar que a população mais vulnerável reside, sobretudo, nos principais concelhos da área de influência do CHLO, nomeadamente, em Lisboa e Oeiras. Os doentes mais vulneráveis são idosos, reformados e revelam através da análise estatística, por cruzamento de variáveis, uma situação de precariedade económica, o que comprova, em tese, que as reformas auferidas por estes doentes estão abaixo do limiar, ou do rendimento adequado per capita individual, ou por agregado familiar. Conclui-se também que as mulheres idosas são duplamente afectadas, pois reúnem em si, a grande “fatia” de percursos de vida laboral não contributiva, durante a idade activa, o que influencia directamente os seus rendimentos individuais, no caso de viuvez, e até mesmo os agregados familiares constituídos por duas ou mais pessoas. Ainda na componente económica foram analisados os factores de risco com o cluster que concentra a extrema vulnerabilidade. A análise concluiu, que da reduzida percentagem de trabalhadores em actividade, estes são os que apresentam os mais baixos rendimentos provenientes do trabalho, assim como demonstrou que se trata do grupo mais representativo em termos de encargos financeiros, relacionados com despesas de habitação, com despesas de saúde ou com outro tipo de encargos que apoiam a solidariedade familiar (filhos, netos, entre outros). Assim, apesar dos concelhos do distrito de Lisboa terem indicadores do PIB per capita e índices de poder de compra, acima da média, por comparação com outras regiões do país, evidenciam-se profundas iniquidades na distribuição de rendimento que fazem “cair por terra” os padrões de comparabilidade, principalmente nos rendimentos auferidos pelos pensionistas, mas também pelos trabalhadores com baixos salários e pelos desempregados, como traduzem os dados recolhidos por este estudo.
268
AS
CONDIÇÕES DE VIDA: EDUCAÇÃO, HABITAÇÃO, PROTECÇÃO SOCIAL E SERVIÇOS DE
SAÚDE
As condições de vida e de trabalho, também designadas por Determinantes sociais intermédias, são influenciadas por outros fenómenos mais abrangentes, de natureza cultural ou socioeconómica, alguns até, já explanados nesta investigação. Considerando que não foi possível desenvolver integralmente os aspectos que se elencam neste nível de análise, destacam-se exclusivamente, os que foram diagnosticados no contexto da avaliação do Serviço Social hospitalar. Assim, no que se refere aos indicadores sobre as condições de trabalho, assume-se que esta relação causal não é a mais representativa, pois a maioria dos doentes encontrava-se aposentada (84,8%). Contudo, importa salientar as condições que poderão ter influenciado a vida activa dos doentes, como por exemplo, as questões relacionadas com a educação. Neste âmbito, os resultados com dimensão expressiva estão associados a baixas habilitações literárias, ao nível do ensino básico: do primeiro ciclo (n 152), do segundo ciclo (n 50) e do terceiro ciclo (n 42). Há referências ao número de analfabetos (n 88), bem como ao número de doentes com formação superior (n 33), que neste último caso surge, como o mais representativo, quando comparado com os outros três clusters que integram o estudo No entanto, de acordo com os resultados, para a dimensão educação, não se mostraram valores estatisticamente relevantes, nem mesmo, ao nível do diagnóstico social para problemas sociais relacionados com a área da educação ou da formação profissional. Considerando que a taxa de analfabetismo na região de Lisboa (3,2%) fica a dois pontos percentuais abaixo da média nacional, de acordo com os últimos Censos (INE, 2011) e que os dados da região relativos à proporção da população que completou pelo menos o terceiro ciclo do ensino básico é de 60,4 pontos percentuais, comparativamente à média nacional (50%), colocou-se a hipótese dos casos da extrema vulnerabilidade estarem associados a um conjunto de doentes com habilitações literárias baixas, porque estatisticamente, são aqueles que apresentam maior consistência.
A dimensão habitacional foi também abordada através da recolha de dados e da análise estatística. Esta teve a sua influência na transição de nível de cuidados para o domicílio, na medida em que foi necessário acautelar e garantir condições de segurança, de conforto e de apoio à mobilidade dos doentes. O que se verificou na análise ao cluster 4, para confirmação de condições habitacionais foi, essencialmente, uma necessidade objectiva de investir na remoção das barreiras arquitectónicas de forma a providenciar uma melhor qualidade ao 269
doente e facilitar, nos casos específicos, o apoio dos prestadores de cuidados. Esta conclusão foi determinada estatisticamente, mas sem grande surpresa dado o investimento de apoio técnico e logístico associado à gestão da grande vulnerabilidade. No entanto, os resultados para as outras dimensões habitacionais, tais como insalubridade, falta de higiene, degradação, sobrelotação, ausência de estruturas básicas, entre outras relevantes, também analisadas, não suscitaram focos de preocupação, pelo menos no que se refere à sua significativa relevância estatística. Ainda que o tipo de alojamento da área de influência do CHLO tivesse beneficiado de uma melhoria, em termos de condições de habitabilidade, de cerca de dois pontos percentuais (1,9%), relativamente aos resultados dos Censos de 2001, essa não foi extensível para a população mais dependente. O desenvolvimento dos alojamentos clássicos, que assume até, o melhor valor nacional no concelho de Oeiras (0,4%), não terá acompanhado a melhoria das infraestruturas básicas com outras infraestruturas indispensáveis, como as que salvaguardam a população com mobilidade reduzida. Deste modo, pesem embora os avanços relativos à acessibilidade dentro de edifícios, cuja legislação protege os interesses da população, muitos doentes com limitações físicas e funcionais ficam aprisionados aos seus domicílios, dada a inexistência de estruturas e presença de barreiras exteriores aos edifícios (INE, 2011, p.69-73).
No que se refere à protecção social dos doentes do cluster 4, a análise estatística evidenciou um número de respostas insuficiente por parte dos serviços sociais e dos cuidados de saúde de proximidade (sobrelotação). Revelou ainda uma escassa cobertura de equipamentos (carência de recursos). Esta constatação de iniquidades no acesso a estruturas comunitárias e a unidades de saúde parece contraditória, tendo em consideração o conteúdo do relatório do envelhecimento da população portuguesa (Carneiro et al., 2012) que confirma um investimento, durante a última década, na rede de serviços e equipamentos. Neste investimento inclui-se também a Rede Social (Decreto Lei 115/2006, de 14 de Junho), cuja implementação permitiu aos municípios melhorar a organização de respostas sociais, prevendo uma adaptação ao processo de transição demográfica. Na Rede mencionada incluem-se múltiplos parceiros sociais, entre os quais estão: IPSS, associações de solidariedade, associações de voluntários, Fundações e Irmandades da Misericórdia. De acordo com o relatório supramencionado (2012), conferidos os dados da Direcção Geral da Segurança Social, existiriam cerca de 5311 IPSS ou equiparadas (Cooperativas e Casa de Povo), a nível nacional. Relativamente à distribuição distrital destas, pelo território português, 270
a região de Lisboa assumia uma posição privilegiada, com cerca de 967 instituições, cerca de 18,4% do total nacional, por comparação a outros distritos em que a capacidade de resposta foi menor. (Canha, 2010, citado por Carneiro et al., 2012, p.205-206). Outro dado importante, e que é contraditório à análise de resultados deste cluster, está relacionado com o facto das soluções sociais para idosos representarem mais de metade do total das respostas existentes (52,4%), tendo beneficiado de um aumento, desde 1998, de quase 70%, aos níveis das respostas de apoio domiciliário (92,9%), lar de idosos (56,6%) e de centro de dia (47,1%) (Carneiro et al. 2012, p.210). Contudo, apesar do trajecto de ajustamento/alargamento da rede de equipamentos sociais, acima referida, ficaram estatisticamente comprovados no conjunto de
doentes
estudados,
os
casos
de
indisponibilidade/ausência
de
vagas
em
serviços/equipamentos. Por outras palavras, no momento da transição de cuidados, as respostas sociais foram incapazes de oferecer soluções imediatas, dado o número de pessoas com necessidades efectivas ser superior, ao número de vagas disponíveis para cada tipologia de cuidados. Os casos de menção estatística estiveram directamente associados aos tempos de espera para as modalidades de integração que se pretenderam agilizar no momento da alta. Estes cuidados, mercê das circunstâncias de espera, foram transferidos para a instituição familiar e/ou para cuidadores informais de forma temporária ou permanente.
Os serviços de saúde, e em especial as unidades hospitalares, tiveram uma utilização expressiva pelo conjunto de doentes em estudo. De facto, o Serviço de Urgência desempenhou a função centralizadora das necessidades em saúde, tendo-se caracterizado como a “porta de entrada” dos doentes e dos cuidadores com dificuldades em gerir a doença ou a sobrecarga dos cuidados. A facilidade de acesso a profissionais de saúde e à alta tecnologia privilegiaram a relação com o hospital e deixaram para segundo plano, um apoio de proximidade, local, e em articulação com as unidades de CSP e de CCI. Ao nível da prestação de cuidados hospitalares não se constataram constrangimentos de referência, nem qualquer relação de causa-efeito de natureza socioeconómica ou outra que comprometa a acessibilidade destes doentes. Ainda sobre a utilização dos serviços de saúde, fez-se referência à RNCCI, que se constitui pelo conjunto de equipas e de unidades que podem assegurar cuidados de saúde e de apoio social, tanto em regime domiciliário, como em regime de internamento. Apesar de a RNCCI estar vocacionada para o apoio pós-hospitalar e ser uma resposta útil para os doentes em situação de extrema vulnerabilidade, agregando neste cluster, a maior representação do conjunto dos clusters (68,1%), este destino acabou por interpretar 271
apenas 7,9% (n 92) das altas, tendo os restantes doentes ficado a aguardar vaga no seu domicílio e/ou no domicílio de familiares, por impossibilidade de transição imediata entre níveis de cuidados.
AS REDES SOCIAIS E COMUNITÁRIAS: A COESÃO SOCIAL As relações estabelecidas entre doentes e redes de suporte subentendem o conjunto de pessoas e/ou organizações que garantem a coesão social ou que, opostamente contribuem para o seu afastamento. Quando há rupturas nestas ligações, a exposição ao risco e à vulnerabilidade tende a aumentar, sendo por isso importante demonstrar os resultados da análise estatística dos dados. As evidências manifestaram insuficiências no apoio aos doentes do cluster 4 (extrema vulnerabilidade). A análise realçou, com expressividade, as variáveis de incapacidade e indisponibilidade na prestação de cuidados por parte da família. Foram também referidas no mesmo âmbito, embora com menor representatividade, situações de abandono e de sobrecarga familiar (por acumulação de apoio em cuidados a idosos, a doentes psiquiátricos, e a outros dependentes). Numa outra perspectiva, houve referências de familiares e de outros elementos da rede de suporte que admitiram recusar a alta hospitalar alegando incapacidade de gestão do diagnóstico e/ou do grau de incapacidade, comprometendo com essa posição os laços de solidariedade entre doente, família, meio envolvente e a comunidade. Para Dahlgren & Whitehead (1991, 2006), a rede social e comunitária é responsável pela promoção do capital social e abrange o conjunto de relações de confiança de cada indivíduo. A sua importância é tão mais preciosa quanto maior for a necessidade dos doentes. Neste sentido, e apesar da rede social ter ficado muito condicionada pela instituição familiar, como traduziram os resultados da pesquisa, foram planeadas estratégias de intervenção que acabaram por “capacitar” doentes e habilitar cuidadores a reequacionarem alternativas de resposta. Neste contexto, o papel da rede social alargada foi crucial, dada a exigência da gestão dos cuidados, concentrada em variáveis como: “dependência de apoio de terceira pessoa”, “dependência de serviços” e “incapacidade para a gestão de recursos”. Mesmo com carências de apoio relevantes na rede de suporte primária, mas também secundária, não se impediu que a maior parte dos doentes regressasse ao domicílio depois da alta hospitalar: (domicílio próprio - 53,6%; Outro domicílio – 11,2%.). Numa síntese conclusiva, importou salientar o papel do Serviço Social na procura da coesão da rede social. Este contributo foi essencial para a mobilização de recursos e para a capacitação de cuidadores, tendo como objectivo desvendar soluções sustentadas para cada 272
doente, viabilizando a continuidade de cuidados, de acordo com a participação de todas as partes interessadas.
ESTILO DE VIDA DOS INDIVÍDUOS O cluster 4 foi o único que demonstrou a existência de uma relação estatisticamente significativa entre os doentes, e os seus estilos de vida/de comportamento. Dos 1509 indivíduos em extrema vulnerabilidade, 241 (15,9%) apresentaram resultados nestas determinantes sociais da saúde. Os dados obtidos comprovam que 93 doentes (38,5%) se encontravam em isolamento social, 67 (27,8%) manifestavam comportamentos de risco, 34 (14,0%) tinham comportamentos de auto-marginalização e 32 (13,2%) apresentavam hábitos aditivos. Com uma representação mais reduzida, mas dentro das evidências, salientaram-se as situações relacionadas com a indocumentação de doentes (7%), com hábitos etanólicos (4,1%), e com problemas na justiça (2%). No modelo já explicitado, os comportamentos e os estilos de vida são aspectos relevantes na promoção da saúde dos doentes. Alguns foram referidos através de variáveis, enquanto outros estão subjacentes a essas mesmas variáveis: (ex. tabagismo, ausência de actividade física, dieta desequilibrada). As escolhas foram pessoais e, algumas delas acabaram por afastar os doentes da sua rede de pertença, tendo mais tarde um impacto directo no seu bem-estar. Cabem referir por fim, os factores que influenciaram a saúde e que podem, eventualmente, explicitar um perfil epidemiológico, relativamente a patologias não transmissíveis como: doenças cardiovasculares, diabetes, obesidade ou outros factores de risco, como a hipertensão arterial ou a hipercolesterolemia. Considerando os resultados da análise deste cluster, parece que os hábitos e as escolhas de vida dos doentes acabaram também por influenciar a sua saúde.
DETERMINANTES
INDIVIDUAIS DA EXTREMA VULNERABILIDADE: IDADE, GÉNERO, DOENÇA
CRÓNICA, COMORBILIDADE E DEPENDÊNCIA
O modelo conceptual, no qual foi possível enquadrar os resultados do diagnóstico da extrema vulnerabilidade (cluster 4), permite desvendar uma última camada de determinantes sociais que tem na sua base as características individuais dos doentes. Ou seja, depois da explanação das determinantes macro (de natureza ambiental, das condições socioeconómicas) e meso (das redes sociais/comunitárias e dos estilos de vida), salientam-se finalmente, as que resultam das características individuais dos doentes (perspectiva micro). Como se trata de uma população envelhecida, com idades médias superiores a 70 anos de idade (cluster 4 = 72,2) junta-se, a 273
estas determinantes, o factor idade/envelhecimento, se por definição se adoptar o conceito da Organização Mundial de Saúde (OMS) que define a pessoa idosa com idade equiparada ou maior do que os 65 anos. Ainda no mesmo plano, para além do aspecto da idade também se considerou o género, que evidenciou, curiosamente, um equilíbrio entre o número de homens e de mulheres pertencentes ao cluster estudado, com uma ligeira diferenciação no caso dos homens (n 760), relativamente às mulheres (n 749). Ao considerar uma disposição de determinantes
individuais
admitem-se
ainda,
outros
factores
que
vão
marcando
progressivamente a vida dos doentes e que têm um impacto de relevo na promoção da sua saúde. Assim, e de acordo com a evidência estatística salientam-se: a doença crónica, a comorbilidade e a dependência funcional física e/ou cognitiva. A dependência, aludindo a um dos seus muitos significados, pode caracterizar-se como: “Um estado em que se encontram as pessoas que por razões ligadas à perda de autonomia física, psíquica ou intelectual, têm necessidade de assistência e/ou ajudas importantes a fim de realizar os actos correntes da vida diária e, de modo particular, os referentes ao cuidado pessoal” (Conselho da Europa, 1998).
A correspondência entre clusters e dependência no diagnóstico de extrema vulnerabilidade, corresponde a uma percentagem de 89,7%. De forma mais explícita, em 1509 doentes, 1353 apresentavam um moderado ou elevado estado de dependência. Na explanação dos factores individuais sobressai também, a doença crónica, como a que se caracteriza por definição, por ser “de longa duração e de progressão, geralmente lenta” (OMS, 2008). Esta tem uma expressão dentro do cluster da extrema vulnerabilidade de 92,8%. A análise determinou ainda, um último factor individual, que está directamente associado à doença crónica - a comorbilidade. Para o cluster 4, a incidência da comorbilidade cifrou-se nos 86%, o que sugere uma tendência importante do fenómeno, e que dele faz um critério de grande relevância. De acordo com o conceito, a comorbilidade é entendida como “qualquer entidade adicional que surgiu ou que pode ocorrer durante o curso clínico de uma dada doença-índice num doente” (Feinstein, 1970).
274
CAPÍTULO 3 – A
EXTREMA VULNERABILIDADE NA PERSPECTIVA DOS CUIDADORES
INFORMAIS
RESUMO DE CAPÍTULO
No sentido de compreender os cuidadores informais dos doentes em extrema vulnerabilidade foram realizadas entrevistas em profundidade a homens e mulheres, que se mostraram disponíveis, para testemunhar a sua experiência pessoal. A técnica utilizada centrou-se nas declarações relativas ao “acto” de cuidar, à forma como os cuidadores conjugaram a rede de apoio formal e informal, e ainda ao impacto subjacente à condição de ser cuidador, numa perspectiva multidimensional. Finalmente, os achados da pesquisa foram interpretados num quadro teórico adequado à percepção da informação recolhida, estando esquematizados no final de cada subcapítulo, por diagramas compreensivos (análise categorial).
15. A AFEIÇÃO E A RESPONSABILIDADE DE “CUIDAR”: A FAMÍLIA NO CENTRO DA EXTREMA VULNERABILIDADE
O estudo sobre a vulnerabilidade dos doentes na transição dos cuidados hospitalares para os cuidados de longa duração (CLD) motivou uma visão de contexto que quis esclarecer as implicações geradas junto de quem assumiu o papel de “cuidar”. Assim, na sequência da identificação do diagnóstico de extrema vulnerabilidade dos doentes (análise quantitativa), houve uma intenção de aprofundar o fenómeno, através da padronização das representações dos seus cuidadores (análise qualitativa).
A ESCOLHA DO CUIDADOR PRINCIPAL OS dados nacionais revelam que “um total de 648,4 mil mulheres entre os 15 e os 64 anos prestava cuidados a crianças com menos de 15 anos e a pessoas doentes, incapacitadas ou idosas. O que significa que 64,4% dos cuidadores são mulheres” (INE, 2012, p.23). Ainda que esta tendência seja real, importou realçar diferenças e semelhanças no “acto de cuidar”, 275
em situações de apoio a doentes de grande vulnerabilidade, com o objectivo de conhecer se nestes casos houve maior ou menor equilíbrio de género. A escolha do cuidador principal subentendeu duas variáveis comuns, a necessidade do doente e a relação de proximidade entre este, e de quem protagonizou o papel principal enquanto prestador de cuidados. Porém, a dinâmica da relação destas variáveis foi vivida diferentemente entre os entrevistados: uns encararam-na como uma obrigação, outros como um dever de responsabilidade, e outros ainda como um acto pleno de afeição (amor). Ainda que compreendidas nesta tripla possibilidade de resposta, mais de 2/3 dos cuidadores situaram as suas declarações nas duas últimas interpretações, o que nos remete para a discussão do tema da responsabilidade familiar na dependência (Lavoie, 2000) e que envolve, simultaneamente, uma abordagem conceptual de cada causalidade. Neste estudo, cerca de metade dos cuidadores estabeleceramse, no plano teórico, na fase que destaca os aspectos normativos dos cuidados. Nesta, houve claramente, uma sobreposição do “dever de cuidar” em detrimento da afeição. Deste modo, complementa-se a delimitação dos achados da pesquisa referindo que, apesar da existência de sentimentos de afeição, a relação de cuidados foi-se tornando num sentimento de necessidade que evoluiu no seio familiar (“familismo”), para um modelo também marcado pela hierarquia de cuidadores, pela sua divisão sexual e pela ordem de escolha destes (Walker, 1991). Noutra perspectiva, a escolha do cuidador também sugeriu a corrente que reforça a afeição e valoriza “a relação pela relação”, contrastando com a abordagem anterior. Na realidade, para alguns entrevistados houve uma maior ligação entre doente /cuidador (Walker et al., 1990), o que demonstrou uma superioridade de intimidade e de afectos, em contraste com os motivos assentes na responsabilidade (dever filial). Atenta a argumentação conclui-se, que se reconhece o carácter conjugado das responsabilidades familiares na dependência, combinando ainda assim, mais critérios normativos do que critérios afectivos (Lavoie, 2000).
A TRANSIÇÃO DO NÍVEL DE CUIDADOS: DO HOSPITAL PARA O DOMICÍLIO
A experiência dos cuidadores informais foi vivida com intensidade, tanto por homens, como por mulheres. De forma equilibrada, cerca de metade das cuidadoras transmitiram no seu discurso aspectos relacionados com a coesão familiar, enquanto a outra metade, argumentou com motivos de natureza institucional. Os cuidadores do género masculino evidenciaram, exclusivamente, tal como algumas mulheres, aspectos de natureza institucional na discussão da transição de níveis de cuidados. As limitações na articulação entre cuidados hospitalares e 276
CLD no domicílio foram objectivas e estiveram concentradas a dois níveis: na capacidade/incapacidade do apoio familiar e na viabilidade do apoio institucional, em que cerca de 2/3 das opiniões dos cuidadores entrevistados, identificaram dificuldades de ordem institucional, que interferiram na construção das “redes de apoio” (Albuquerque & Pimentel, 2010). Assim, uma das preocupações dos homens e das mulheres enquadrou-se, no que se determina por insuficiência de apoios formais, ou por outras palavras, pela: “ falta, desconhecimento ou inadequação de serviços de proximidade, que poderiam atenuar a sobrecarga do cuidador e facilitar a assunção de responsabilidades, pode ser um factor desmobilizador dos esforços familiares” (Albuquerque & Pimentel, 2010, p.259). Noutra perspectiva, as percepções explanadas pelas cuidadoras dos doentes fizeram referência aos riscos da desfamilização (Lenoir, 1979), expondo o desaparecimento de certas práticas sociais tradicionalmente enraizadas na família, que implicam rupturas das solidariedades intergeracionais (Bengston, 2001). Daí a extrapolação para um entendimento que é compatível com um “sistema de cuidados” que coloca em evidência, não só as instituições formais mas a natureza solidária das relações de cuidados, englobando todas as pessoas envolvidas no acto de cuidar. Esta concepção tem subjacente uma perspectiva holística já que considera a família como um sistema (Jerome, 1996).
OS CONTORNOS DA DEPENDÊNCIA NA PERSPECTIVA DOS CUIDADORES
De uma forma equilibrada, no que se refere à questão de género, verificou-se que homens e mulheres lidaram com a dependência total dos doentes para as suas actividades básicas e instrumentais de vida. Por associação, prestaram apoio a pessoas envelhecidas, com incapacidade física e psicológica e comorbilidades. Noutra vertente, quase metade dos cuidadores lidou com o manuseio de instrumentos /técnicas de suporte (invasivas e não invasivas) para que pudessem ser assegurados os cuidados de saúde, de higiene ou de conforto. Finalmente, todos os entrevistados expuseram uma necessidade de cuidados e vigilância permanente dada a evolução do estado físico e funcional dos doentes e da gradação crescente das suas patologias. Independentemente dos elementos envolvidos na execução de cuidados houve compatibilidade, pelas declarações obtidas, por um enquadramento teórico que se alinhou com a heterogeneidade de práticas (Evandrou, 1992). Segundo o autor, estas levam ao reconhecimento da diversidade dos cuidadores, assim como das experiências e das necessidades dos doentes. Subjacentemente, tomou-se por crucial o entendimento que 277
sustenta a proporcionalidade entre: o volume de cuidados necessários para cada doente e a mensurabilidade do nível de dependência (Knipscheer, 1995; Renaut & Rozenkier, 1995). AS ESTRATÉGIAS ADAPTATIVAS NO “CUIDAR” E A ESTABILIZAÇÃO DOS CUIDADOS
Na tentativa de viabilizar um apoio concertado, quase todos os cuidadores implicados recorreram a duas estratégias facilitadoras: uma relacionada com a remoção ou adaptação de barreiras arquitectónicas; e a outra com a conjugação dos cuidados através da rede de suporte formal. Esta atitude conciliadora entre a evolução da doença vai ao encontro do que alguns autores classificam por “trabalho de cuidados” (Maheu & Guberman, 1992, citados por Gil, 2010) e que implicam a extensão, o alcance e a organização dos cuidados. A sua definição traduz-se pelas tarefas desenvolvidas por um indivíduo com a colaboração de outros, com o objectivo de concretizar um determinado número de actividades para assegurar os cuidados a um familiar dependente. Os autores propõem, a este nível, três tipos de categorias de tarefas que fazem parte deste “trabalho de cuidados”: “tarefas associadas aos cuidados e à assistência; as tarefas associadas à mediação entre o familiar dependente, a comunidade e os serviços públicos; as tarefas associadas à organização e à coordenação do trabalho de cuidados” (Maheu & Guberman, 1992, citados por Gil, 2010, p.55). Para metade dos cuidadores, o sucesso da estabilização dos cuidados, caracterizou-se por colmatar as diferentes “tarefas” que os autores defendem no plano teórico. Esse cumprimento coloca o cuidador em segurança e preparado para lidar com a fragilidade do doente.
Por oposição, ainda que tenham sido levados a cabo os mesmos esforços para calibrar a manutenção dos cuidados no domicílio após a alta hospitalar, alguns cuidadores sentiram-se inabilitados ou inseguros para assegurarem a prestação dos cuidados. Estes sentimentos de inquietude e de incerteza foram também interpretados à luz do conceito de gestão de ambivalência (Lorenz-Meyer, 2001) que reconhece estratégias, nas quais se enquadram os constrangimentos detectados pelos depoimentos dos cuidadores, designadamente, a exaustão familiar, a dificuldade do doente gerir a sua própria incapacidade e o conflito entre a prestação de cuidados no domicílio com apoio informal /formal.
Numa síntese conclusiva sobre os primeiros contributos dos entrevistados que versaram sobre: (i) como se tornaram cuidadores; (ii) como vivenciaram a experiência da transição de 278
cuidados; (iii) quais foram as suas estratégias adaptativas e (iv) como estabilizaram a continuidade dos cuidados sugere-se, para melhor entendimento, um diagrama (figura 14) que coloca em evidência as declarações dos cuidadores, por género (cor de rosa: mulheres /cor azul: homens) pelas categorias mais relevantes.
I.Processo de cuidar
Escolha
Transição nível de
cuidador
cuidados
Estabilização dos Estratégias Adaptativas
Segurança e
Dever de
Acesso a equipamentos
Equilibrio entre apoio
responsabilidade
de proximidade
formal e informal
E2;E5,E6,E3,E9
E3,E7,E9
E4,E5,E10,E3
Amor
Dependência serviços de saúde E2,E10,E1,E8
E4,E10,E8
cuidados
estabilização dos Cuidados E4,E10,E7,E8,E9
Eliminação de barreiras
Insegurança e
arquitectónicas
estabilização dos
E2,E6, E8,E9
cuidados E1,E5,E3
Solidariedade Famíliar E1,E5,E6
Figura 14 - Diagrama axial I: representações dos cuidadores sobre o “processo de cuidar”
15.1. ENTRE O APOIO FORMAL E INFORMAL: UMA REALIDADE FAMILIAR QUE NÃO EXCLUI A REDE DE EQUIPAMENTOS DE PROXIMIDADE
O APOIO FORMAL NOS CUIDADOS DE LONGA DURAÇÃO: A SAÚDE E O APOIO SOCIAL
Considerando as estratégias para a população idosa, dependente, com doença crónica e comorbilidades foi possível aferir, pela maioria das declarações dos cuidadores, que o apoio aos doentes esteve relacionado com as prestações da Segurança Social do regime contributivo 279
e não contributivo. Deste modo, a intervenção pública na dependência foi reconhecida pelos entrevistados como a via formal de apoio ao doente e cuidadores, sendo o Complemento por Dependência para idosos (Decreto Lei nº 265/99, 14 de Julho), a medida disponível que mais privilegiou a manutenção dos cuidados no domicílio. A interpretação das declarações reforça a ideia de que, a família se constituiu ainda, como o lugar privilegiado da prestação de cuidados pelo que se compreende que quase metade dos cuidadores tenha recusado deliberadamente o apoio formal por equipamentos da rede formal, sendo esta representação maioritariamente feminina. Estes depoimentos expressam o contributo de autores “quando referem que as redes sociais têm um carácter vertical, consanguíneo e estão fortemente polarizadas em torno de personagens femininas; sendo a família directa, o núcleo verdadeiramente “activo”, em situações de doença” (Renaut & Rozenkier, 1995; Kellerhals, 1995, citados por Gil, 2010, p.223).
No que se refere à utilização do SNS, os cuidadores demonstraram uma nítida preferência pelas Unidades Hospitalares em detrimento dos CSP para a resolução de problemas, dúvidas relativas ao bem-estar do doente, agilização de serviços e benefícios sociais. Esta realidade acaba por reforçar a cultura “hospitalocentrista” (Campos & Simões, 2011) como tendência histórica do SNS, que apesar de contrária à defesa de uma progressiva descentralização e aos princípios de apoio de proximidade, designadamente ao “comunitariocentrismo” (OPSS, 2008), continua a ser defendida por profissionais de saúde, decisores políticos e pelos próprios cidadãos (como se verificou). Ainda numa perspectiva welfare mix (Capucha et al., 2005, p. 205) evidenciaram-se as declarações de recusa dos cuidadores, relativamente à utilização da RNCCI (Decreto Lei 101/2006, de 6 de Junho) e das suas unidades e equipas especializadas. Esta rejeição resultou, por um lado, do valor de co-pagamentos de unidades (excessivo) e, por outro, de uma maior preferência pelos cuidados informais.
No que se refere aos cuidados de apoio social estrito, pode afirmar-se que algumas das respostas dos cuidadores estão relacionadas com a escassez de equipamentos sociais e/ou com a demora na agilização do apoio pelas instituições de proximidade, em particular, na resposta: Serviço de Apoio Domiciliário (SAD). As declarações sugerem evidências de sobrelotação de vagas, principalmente nos doentes que só podem beneficiar do apoio da rede pública de serviços. Sobressaiu também, a recusa pelo apoio de instituições privadas, principalmente por motivos económicos, ainda que alguns destes cuidadores tenham tido essa experiência, por 280
imperiosa necessidade, até aguardarem resposta da rede pública. Esta constatação corrobora a tese de que os actuais serviços de apoio domiciliário não estão vocacionados para uma população em situação de incapacidade severa (Gil, 1998) pois mostram-se desadequados para muitos casos que impliquem cuidados de longa duração.
A FAMÍLIA COMO O SUPORTE DE EXCELÊNCIA NA EXTREMA VULNERABILIDADE
Este estudo, inspirado a partir das contribuições dos cuidadores de doentes em extrema vulnerabilidade, salientou que o principal suporte do doente, aquando o seu regresso ao domicílio, foi a sua família mais próxima. Deste modo, retiram-se ilações que vão ao encontro dos contributos de Kellerhals (1995) quando se refere à concentração de familiares em torno do laço biológico. Assim, foram cônjuges, filhos, sobrinhos, cunhados e outros de linha directa ou colateral que, estiveram na base da prestação de cuidados em permanência. Acrescenta-se que não foi possível determinar diferenças de género significativas na regularidade dos apoios, pois o papel de cuidador principal ou secundário foi conjugado entre vários elementos da família. Não podendo admitir que a selecção dos membros da família que exercem os cuidados depende do género, verificou-se que entre ambos há uma elevada participação dada a vulnerabilidade do doente e da sua necessidade de cuidados. O que se afigurou relevante foi a distinção das tarefas realizadas, mais relacionadas com cuidados instrumentais no caso dos homens, mesmo quando cuidadores principais, e mais ligadas às actividades básicas da vida diária, no caso das mulheres. Confirmou-se também que o apuramento do discurso dos cuidadores revela uma concentração de cuidados em torno da família directa ou colateral e não num contexto de rede social composta por outros elementos de suporte informal ou formal, ainda que presentes e de grande importância para o equilíbrio dos cuidados. De certo modo, salientam certas considerações teóricas quando se referem a “cuidados na comunidade” para amenizar o seu verdadeiro sentido de “cuidados promovidos/providenciados pela família” (Martin, 1995).
O papel do cuidador regeu-se pela concepção de responsabilidade familiar sendo que as motivações dessa escolha assentaram no carácter vinculativo das relações criadas através da afinidade biológica ou matrimonial, que se estabeleceram ao longo da vida, e que também se designam por “compromissos negociados” (Finch, 1989). No entanto, para a compreensão dos achados da pesquisa que justificam a acção dos cuidadores depreendeu-se que, as regras de 281
responsabilização tiveram na sua base o “estatuto ocupado na família” (Lavoie, 2000). Por um lado, originadas pelo amor e pela afeição, em quase metade dos entrevistados, sobretudo no caso das mulheres e dos cônjuges homens. Nestes casos, transparece do discurso dos cuidadores, o que o autor expressa por: “dom, que não espera retorno, nem sobre a forma de objectos, nem mesmo sobre a espécie imaterial de amor em retorno” (Boltanski, 1990, p.173). Neste tipo de responsabilização distingue-se o apoio exclusivo ou quase exclusivo por parte de um cuidador, acima de todos os outros familiares, como o responsável máximo pelos cuidados. Noutra versão mais moderada, a acção dos cuidadores e o sistema de cuidados estão associados à ideia de justiça e de reciprocidade. Contudo, a acção está limitada pelos “recursos pessoais disponíveis” (Lavoie, 2000, p.135), em mais de metade das declarações, o que também justifica a partilha de responsabilidades entre cuidadores, através do consenso e da indisponibilidade/incapacidade para a prestação dos cuidados de alguns dos elementos da família. Esta partilha de responsabilidades foi levada a cabo por uma rede de duas a três pessoas, normalmente duas, uma mulher e um homem, que não partilham uma divisão igualitária das tarefas. Neste âmbito cabe à mulher (ex.cônjuge, filha, irmã) a prestação de cuidados de âmbito pessoal (Horowitz, 1985) e ao homem um “apoio intermitente, pontual e pouco intenso” (Stoller et al., 1992), afastado das actividades básicas da vida diária, como a higiene pessoal e a alimentação, mas empenhado nas actividades instrumentais relacionadas com o apoio no transporte, na medicação, entre outros.
Finalmente, introduz-se o conceito de reticência que é extensível ao doente e aos cuidadores deste, como forma de compreender, por um lado a recusa, mas sobretudo a aceitação do apoio formal em articulação com o apoio familiar, considerando a gravidade e a evolução do estado de saúde apesar de “ manifestarem (…) uma atitude de reserva face à utilização dos serviços, independentemente da proveniência do serviço (público, comunitário, voluntário, privado) ” (Paquet, 2003, p.169). A articulação entre cuidados formais e informais esteve quase sempre ligada a custos familiares e pessoais e à dificuldade em conciliar aspectos base (trabalho, condições psicológicas) que, depois de aceites, produziram efeitos positivos para o equilíbrio familiar em torno da situação concreta do doente. Sucintamente, tal como no subcapítulo anterior, comprovam-se os achados da informação recolhida pelos cuidadores informais sobre a experiência de apoio formal e informal nos CLD nas áreas da saúde e do apoio social. Para tal, apresenta-se um diagrama (figura 15) que expõe os achados da pesquisa pelas categorias desvendadas, aludindo aos contributos dos homens (a cor azul) e das mulheres (a 282
cor rosa). Por um lado, demonstra resultados: (i) a nível estatal; (ii) no contexto da RNCCI; (iii) no terceiro sector e (iv) no sector privado. Por outro, revela resultados da experiência informal, de vertente familiar, (i) em exclusividade, (ii) partilhada com outros elementos da família (iii) e/ou conjugada com apoio formal.
Apoio familiar conjugado com publico/terceirosector E2,E5,E3,E9 Apoio familiar exclusivo E1,E4,E10,E8
Apoio familiar partilhado entre 2 ou + cuidadores E5,E6,E3,E7,E9
Experiência Informal
II. Apoio Formal e informal: Cuidados sociais e de saúde
Experiência Formal:
RNCCI
Estado
Sector privado
Terceiro sector
Recusa de apoio formal E4,E6,E10,E8
Apoio domiciliário integrado esporádico E10,E5, E3
Protecção social (rendimento, complementos) E1,E4,E9
Recusa de integração por co pagamentos elevados E4, E3
Serviço Apoio Domiciliário (SAD) E2,E5,E9
Serviço Apoio Domiciliário (SAD) E5,E9
Recusa de Serviço Apoio Domiciliário E1,E4,E10,E9
Hospitalocentrisdmo E1,E4,E2,E8 Escassez / Demora na formalização de apoios comunitários E1,E5, E3 / E5, E3,E7
Figura 15 -Diagrama axial II: representações sobre apoio formal e informal: cuidados sociais e de saúde 283
15.2. O
IMPACTO DA EXTREMA VULNERABILIDADE NO CUIDADOR: UMA PERSPECTIVA
MULTIDIMENSIONAL
O impacto da vulnerabilidade do doente no cuidador traduziu-se pelo esforço pessoal de um indivíduo, em função de outro que é dependente, que não consegue gerir as suas actividades da vida diária e ser auto-suficiente. Em termos conceptuais, esta responsabilidade por terceiros enquadra-se no “conceito de carga” que, por sua vez, se associa a uma ideia de peso e de responsabilidade acrescida. Na análise realizada reconheceu-se o valor teórico de carga como um fenómeno bidimensional, em que se discriminam a “carga subjectiva e carga objectiva” (Schene, 1990; Martinez et al., 2000, p.102). A objectiva é responsável por alterações da vida familiar, na área laboral, na vida social, relacional (dentro e fora da família). Nessa objectividade a carga pode ser mensurável, por exemplo, pelo tempo e dinheiro despendidos, bem como pelos problemas comportamentais ou de saúde provocados. Contudo, os depoimentos dos cuidadores versaram também sobre o que se designa por carga subjectiva, incorporando os ecos do acto de cuidar numa perspectiva emocional, mais relacionada com a envolvência sentimental da experiência de cada cuidador.
A EXPERIÊNCIA PESSOAL: RISCOS DO DESGASTE FÍSICO E PSICOLÓGICO
O processo de escolha do cuidador não implicou qualquer tipo de preparação prévia. No entanto, a forma como cada um aceitou essa condição e a incorporou num novo papel social produziu efeitos e trouxe repercussões, durante e após o período de prestação de cuidados. Apesar da resistência, da personalidade de cada indivíduo e da afinidade com o doente, denotou-se que mais de metade dos entrevistados mencionou o cansaço físico como o impacto mais intenso a nível pessoal. Já o impacto psicológico, aqui referido como carga subjectiva do conceito (Schene, 1990; Martinez et al, 2000), também adquiriu uma representatividade de destaque, pelos mesmos cuidadores que mencionaram cansaço físico, mas com menor expressão. Finalmente salientaram-se os casos “limite” (três cuidadores/em dez), que necessitaram eles próprios de apoio adicional para recuperarem de uma condição física e/ou psicológica, provocada pela exaustão do papel que desempenharam enquanto prestadores de cuidados. Neste último caso, o conceito de carga funde-se com o modelo teórico do stress que sustenta a ideia de um prestador de cuidados que pode chegar a uma situação, cujo impacto de
284
“cuidar” leva a estados depressivos, à doença física e até, ao recurso à institucionalização (Pearlin et al., 1990).
O CUSTO FAMILIAR E DAS RELAÇÕES DO CUIDADOR NA VULNERABILIDADE
O impacto de viver o papel de um cuidador numa situação de extrema vulnerabilidade implica um alargamento das relações sociais (Grand et al, 1988). Neste âmbito, os autores citados no parágrafo seguinte, defendem que as relações não se limitam à família, e devem estender-se às redes de amizade e de vizinhança, ampliando a percepção das funções da rede social e familiar, que se materializam no suporte social e na sociabilidade. “O suporte social é o que a pessoa recebe ou pode receber e corresponde à dimensão passiva das suas relações na rede. A sociabilidade é o contacto social estabelecido, é o investimento do indivíduo na sua rede social. Ela corresponde à dimensão activa das relações da pessoa”. (Grand et al., 1988, p.52)
Contudo, nem sempre se harmonizam as condições necessárias e/ ou adequadas e o suporte social pode ser insuficiente, ineficaz e até provocar stress crónico (motivado pela individualização dos cuidados). A este nível, como refere Imaginário (2008): “São várias as tensões que os membros de uma família podem sofrer perante a prestação de cuidados (…) o acréscimo de responsabilidades (…) podendo mesmo haver necessidade de iniciar novas aptidões (…) um condicionalismo das relações sociais por parte do cuidador…” (Imaginário, 2008, p.76)
Nas declarações que revelaram uma escassa cooperação da rede social na prestação dos cuidados, faz-se uma associação ao conceito de carga objectiva, já introduzido anteriormente. Neste âmbito foram reconhecidas as dificuldades de homens e mulheres conciliarem a sua vida familiar e relacional enquanto cuidadores. Por um lado, as mulheres admitiram maior impacto, dado o comprometimento para com os seus filhos menores e para com o cônjuge, no âmbito da família nuclear. Os homens confirmaram que os constrangimentos se verificaram pela exigência de terem a seu cargo outros membros da família dependentes, que implicam, simultaneamente, cuidados e vigilância. Também identificaram uma diminuição de contactos com a família alargada (distante da dinâmica dos cuidados).
285
UMA VIDA PARALELA DE RESTRIÇÕES E DE ISOLAMENTO
Na abordagem da prestação de cuidados, o impacto na vida social de cuidar na extrena vulnerabilidade, esteve associado ao regime de prestação de assistência permanente a que o cuidador esteve sujeito, tenha sido por sua iniciativa (autocrítica do cuidador) ou por dificuldade em gerir a situação com outros elementos da rede familiar. Os entrevistados revelaram que o afastamento das suas relações sociais de referência influenciou directamente o seu quotidiano. Tanto homens como mulheres (cuidadores) confirmaram perdas de momentos de lazer, privação de contactos com grupos de pares e indisponibilidade para a realização de actividades extra-laborais ou hobbys. Salienta-se que os casos mais profundos de retraimento surgiram entre os cuidadores do género masculino e que o afastamento da vida social foi transversal a todos os cuidadores. Esta ideia reforça a evidência de que a extrema vulnerabilidade pressupõe uma preocupação constante, permanente, num regime de tensão que parece não cessar. No que se refere ao impacto social, sublinha-se que a falta de tempo para a gestão do dia-a-dia e o rombo nas alterações ao estilo de vida de cada cuidador, abriram caminho a situações de isolamento, potenciando sentimentos de frustração, de perda de intimidade e de afecto. Estes sentimentos foram responsáveis por desencadear outros problemas, designadamente, relacionados com a partilha de responsabilidades (Paul, 1997) e com a falta de atenção para com as suas famílias nucleares.
UM TRABALHO VOLUNTÁRIO DE DUPLA JORNADA
O apoio a doentes em extrema vulnerabilidades no domicílio envolveu, por inerência, um acréscimo na despesa de saúde (medicação, fraldas, consultas médicas, ajudas técnicas) e na contratação de serviços formais ou informais. Todavia, verificou-se que a maioria dos cuidadores não esteve implicada no financiamento/custeio destas despesas. Os custos ficaram a cargo do doente e/ou do agregado familiar, nomeadamente pela via da pensão de velhice, de invalidez e/ou através da requisição/benefício do complemento por dependência. Em todo o caso, algumas poupanças economizadas dos doentes foram utilizadas em seu benefício e só, excepcionalmente, é que o cuidador se colocou, numa situação de comparticipar financeiramente alguma resposta formal. Ainda assim, apesar do nível socioeconómico influenciar o impacto sobre o cuidador, no caso de uma condição desfavorável ou de baixo rendimento (Roig et al., 1998), não se comprovou que os cuidadores tivessem saído 286
prejudicados por terem contribuído financeiramente para a gestão dos cuidados. As declarações concluem que o cuidador foi um membro da família directo/ colateral, não remunerado pelo empenho e pela prestação de cuidados. Os cuidadores/familiares mostraramse conscientes da sua interferência no cálculo de co-pagamentos a instituições da comunidade ou a unidades da RNCCI, por capitação do rendimento do agregado familiar. Tais afirmações determinam que indirectamente têm conhecimento que o grau de parentesco (Roig et al. 1998) e o facto residirem na mesma habitação fiscal podem traduzir, a montante, uma maior sobrecarga económica.
Relativamente ao impacto da prestação de cuidados na actividade profissional dos cuidadores, os entrevistados referem não ter existido particular interferência. A maior parte dos cuidadores activos não chamou apenas para si a prestação dos cuidados. Por outras palavras, partilharam a gestão dos cuidados com outros elementos da família, em regra, com quem se mostrava mais disponível e próximo ao doente durante o período laboral, permitindo flexibilizar a actividade profissional com o papel de cuidador. Contudo, apesar desta elasticidade verificaram-se casos de “dupla jornada” que se devem à acumulação da actividade de “cuidar” com a actividade profissional (Sousa & Figueiredo, 2004).
AS ESTRATÉGIAS DE ADAPTAÇÃO NUM CONTEXTO DE EXTREMA VULNERABILIDADE
A experiência de ser cuidador de doentes em extrema vulnerabilidade foi vivida com muita intensidade. As narrativas fizeram emergir medos e sentimentos de impotência, principalmente ao nível da gestão da doença. Estas sensações subjectivas de carga foram motivadas pelo grau de impreparação e pelas dificuldades inerentes ao manuseio das técnicas de apoio. A incerteza e o receio dos cuidadores, tanto de homens como mulheres, estiveram relacionados com a gravidade do estado de saúde e com a condição de dependência, tendo também em consideração, a frequência e o regime de cuidados necessários. Deste modo, os cuidadores foram compelidos a aumentar a sua capacidade de resposta e a readaptar-se às exigências e à gradação do nível de cuidados. Esta realidade colocou-os numa situação ambígua, que os fez ponderar, em manter o apoio aos doentes ou ceder/aceitar outras possibilidades de suporte informal ou formal. Estas interrogações chamaram a si a perspectiva que assenta nos pressupostos da ambivalência (Connidis & McMullin, 2002), tendo este conceito a capacidade para enquadrar as várias posições dos cuidadores durante a alta 287
hospitalar, bem como, as relações que foram estabelecidas após o processo de transição de cuidados (no ciclo da vida do doente e à medida que se foram renegociando as relações entre este e o cuidador). . Finalmente, as respostas de calibração ou de capacidade adaptativa que se manifestaram entre os cuidadores abriram espaço ao tipo de estratégias utilizadas na gestão da ambivalência. As declarações enquadraram-se no reforço do apoio formal e informal, como defendem mais de metade dos cuidadores. A partilha de responsabilidades foi distribuída entre os elementos da família, sendo complementada com o apoio formal, principalmente ao nível do Serviço de Apoio Domiciliário. No entanto, perante estratégias de não comunicação, a alta pode ser forçada e/ou pressionada para os CLD, através de um dos membros da família, normalmente do género feminino, ou no limite, também se pode recorrer à institucionalização, embora esta opção, não seja tão expressiva como as duas anteriores (Lorenz-Meyer, 2001). Em tom conclusivo, revelam-se através de diagrama axial (ver figura 16), as categorias relatadas que expõem o impacto da vulnerabilidade no cuidador evidenciando as dimensões: (i) pessoal; (ii) familiar; (iii) social; (iv) económico-laboral. Identifica-se também o “modus prociendi” da gestão do risco e da incerteza no quadro dos CLD no domicílio considerando o aumento gradual da vulnerabilidade no doente e a necessidade de readaptação do cuidador a novos contextos de prestação de cuidados.
288
Hospitalização E2,E7 Reforço apoio formal ou informal E2,E4,E6,E10,E3,E7
Institucionalização E1,E5,E9
Calibração Vulnerabilidade E1,E5,E6,E2,E7
Adaptação E4,E10,E3,E8,E9 Gestão da Incerteza
III. Vulnerabilidade do doente e impacto no cuidador
Impacto Pessoal
Físico E1,E2,E4,E5
Impacto Familiar
Impacto social
Menores E5,E2,E6
Isolamento social E7,E8
Adultos dependentes E6,E3,E7
Perda de relações sociais E2,E5,E3,E7,E9
E3,E9
Psicológico E2,E5,E3,E9
Patológico E1,E7,E8
Quebra de relações familiares alargada E5,E6,E7
Impacto Económico e laboral
Influência indirecta no cálculo rendimentos doente E5,E3,E9
Constrangimentos planeamento trabalho E2,E7
Perda de espaço família nuclear E3,E7
Figura 16- Diagrama axial III: representações sobre o impacto da vulnerabilidade do doente no cuidador
289
PARTE VI
CONCLUSÃ&#x2022;ES E CONTRIBUTOS
CAPITULO ÚNICO – CONCLUSÕES, CONTRIBUTOS E LIÇÕES APRENDIDAS
RESUMO DE CAPÍTULO A investigação focou-se na determinação do gradiente de vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração. Considerámos a análise dos casos mais complexos colocados aos assistentes sociais do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, entre os anos 2009-2012, bem como, a reflexão sobre a construção e a definição de diagnósticos sociais. Atingir tais objectivos passou por definir critérios no planeamento da alta, que aliados ao cruzamento das dimensões individuais, sociais e de contexto, permitiram medir a vulnerabilidade entre os doentes assistidos. A experiência desenvolvida permitiu desocultar variáveis latentes, mostrando-se sensível para depurar riscos que podem comprometer a continuidade de cuidados, mas também para prevenir, priorizar ou legitimar medidas de intervenção social, para os que revelaram estar numa situação mais frágil. Não bastou analisar e interpretar a praxis do Serviço Social nos doentes mais exigentes, categorizados como Episódios Sociais (N 4965) pelos assistentes sociais. Importou também, estudar o fenómeno da vulnerabilidade através de representações de contexto: Na perspectiva programática, através de peritos e decisores políticos em saúde, que se debruçaram sobre as limitações e sobre as potencialidades da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, enquanto medida política; Na perspectiva dos cuidadores informais, que se responsabilizam pelos cuidados de quem fica numa situação de extrema vulnerabilidade e regressa ao domicílio.
A estratégia metodológica aclarou os objectivos da investigação e deduziu dos resultados/ representações o esclarecimento sobre o gradiente da vulnerabilidade. A explicação da extrema vulnerabilidade é-nos dada a conhecer pelo modelo ecológico do Serviço Social e pela utilização de técnicas inovadoras que conjugam as determinantes sociais da saúde e as dimensões críticas definidas na transição dos cuidados, contribuindo para aferir com maior justeza os parâmetros de vulnerabilidade dos doentes.
16. AS CONCLUSÕES A análise de dados evidencia que os assistentes sociais do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental norteiam a sua metodologia de acção por um modelo teórico de intervenção social. Esta dedução confirma-se pelo estudo da actividade do Serviço Social, entre 2009-2012, período em que foi possível aferir a dinâmica existente entre “sistema interventor” e “sistema cliente”.
Ao analisar os pressupostos do modelo ecológico verificámos a relação entre o referencial teórico e o método utilizado para a resolução de problemas sociais e para a prevenção de riscos que podem tornar os doentes mais ou menos vulneráveis, após o internamento hospitalar. O que se observou foi a organização da prática profissional de acordo com o método científico, desde o momento de acolhimento ao planeamento da alta. Apesar de não ser fácil conceptualizar empiricamente a intervenção social, acabámos por ter essa oportunidade, pois beneficiámos da prática consolidada em meio hospitalar, que não se rege exclusivamente por princípios teóricos, mas também por linhas de orientação metodológica e procedimental. No caso vertente, os assistentes sociais assumiram institucionalmente o papel de mediadores de doentes e famílias. Estes procuraram capacitar o “sistema cliente” para acções que levem à contratualização de medidas e projectos de acompanhamento e de continuidade de cuidados. Os profissionais estiveram directamente implicados com a rede social e com medidas de apoio à prevenção, promoção e reabilitação da saúde, tendo a intervenção social sido focalizada na pessoa e no seu meio envolvente. As etapas identificadas comprovam o alinhamento teórico-prático no plano da intervenção social, designadamente, no que concerne à avaliação e diagnóstico do doente, à rede de suporte formal e informal, ao planeamento da alta, à facilitação de serviços e recursos, e à vinculação e acompanhamento desses serviços (Viscarret, 2007). Estas evidências foram reconhecidas a partir da análise processual dos doentes, onde se explana com detalhe a intervenção com o doente e com os seus sistemas (redes de suporte formal/informal, equipamentos sociais e outras dimensões relacionadas com condições de vida e de trabalho).
Determinar o gradiente da vulnerabilidade na transição dos níveis de cuidados, implicou conjugar as variáveis de risco identificadas através do modelo ecológico, e incluir cumulativamente, critérios a priorísticos que potenciam essa condição. Assim, dentro dos doentes complexos, categorizados pelo Serviço Social, conseguimos encontrar os que ficam numa situação de extrema vulnerabilidade. Estes, para além de agregarem determinantes 290
sociais que comprometem a continuidade de cuidados, são doentes crónicos, com comorbilidades, dependentes de terceiros e que regressam ao domicílio com apoio informal. Os resultados que emergem do estudo da actividade assistencial do Serviço Social no quadriénio 2009-2012 desocultam a amplitude da vulnerabilidade dos doentes. Já a análise de múltiplas variáveis, permite observar prioridades de intervenção social e pode levar à tomada de medidas preventivas que meios tradicionais de diagnóstico ainda não conseguem alcançar.
Se por um lado, o estudo da praxis dos assistentes sociais foi decisivo para determinar a vulnerabilidade dos doentes, consubstanciando a expressão dos resultados da intervenção, as representações de contexto também deram o seu contributo, passando por: Compreender a vulnerabilidade da Rede Nacional dos Cuidados Continuados Integrados (enquanto medida política), recorrendo a informadores privilegiados e fazendo sobressair questões centrais em áreas como: o financiamento, o acesso, a sustentabilidade, a adequação às necessidades, expansão e modernização; Aferir o impacto da extrema vulnerabilidade dos doentes, nos seus cuidadores informais, compreendendo dimensões de fundo como: a análise do processo de “cuidar” no destino/domicílio, a conjugação de apoio formal e informal, e os impactos do exercício dessa função. Em síntese, concluímos no plano do conhecimento do Serviço Social, que a praxis e o modelo ecológico, ao estarem relacionados, permitem definir o gradiente da vulnerabilidade dos doentes entre a avaliação inicial e o planeamento da alta. Nesta lógica, o método de trabalho assume um papel relevante no balizamento da complexidade da intervenção junto de cada doente, distinguindo as suas dimensões críticas e as dimensões de risco controlado, avaliando sobre as quais é possível intervir. Na vertente que está relacionada com o impacto da vulnerabilidade nos cuidadores informais, quis conhecer-se o que experienciaram quando se responsabilizaram pelos doentes, como se adaptaram à dependência e à necessidade de cuidados, como foram ministrados esses cuidados, se os partilharam com a rede de suporte formal, e ainda que impactos, essa sobrecarga representou nas suas vidas.
Finalmente, ao nível da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados ainda se reconheceram, através de contributos de interlocutores privilegiados, os pontos fortes e as 291
vulnerabilidades que emergiram desta medida política, bem como se colocou a tónica nas oportunidades e nas ameaças que condicionam a sua sustentabilidade futura.
SOBRE A PRAXIS
Este estudo evidencia que a organização da prática profissional parece ser compatível com o modelo ecológico, sendo essa a referência conceptual que norteia a metodologia de acção dos assistentes sociais do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental. Por outro lado, confirma que esse modelo esteve na base da aferição de um gradiente de vulnerabilidade nos doentes complexos (n 4965) assistidos pelo Serviço Social, bem como na definição de diagnósticos de extrema vulnerabilidade (n 1509). Esta associação verificou-se pela análise da prática dos assistentes sociais e pela sucessão de procedimentos que fundamentaram a sua intervenção. O modelo pressupõe que os profissionais diagnosticam as situações-problema dos doentes logo desde o acolhimento, o que permite que se reconheçam durante o internamento, os factores de risco numa perspectiva micro, meso, exo e macro (Dalghren & Whitehead, 2006; Viscarret, 2007). Durante este processo, e até ao momento da alta, a complexidade do doente é avaliada, tendo em consideração o impacto da conjugação das determinantes sociais da saúde e/ou dos factores de risco, no seu meio envolvente. Nesta linha de entendimento, reconhecemos que a acção do Serviço Social considera os factores que promovem a saúde (Antonovsky, 1996), designadamente, as condições de acesso a serviços, a articulação com o apoio social e o sentido de pertença à comunidade, mas que opera sobre as dimensões que a colocam em risco (Long, 2001, Carrondo, 2006).
Ao estudarmos os doentes mais complexos através do circuito de recolha, de controlo e de tratamento de informação social disponibilizado pelo Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, explorámos os domínios da percepção do risco, verificámos a pluralidade e o tipo de intervenções, analisámos o potencial de reabilitação/integração social, bem como a eficácia e a eficiência das situações que se colocam ao Serviço Social. Instrumentalmente, conferimos as técnicas directas e indirectas deste Serviço, que garantiram a adesão das partes interessadas (pessoas e instituições), relativamente à contratualização de medidas que facilitem a continuidade de cuidados. Ao explorar estatisticamente os dados nas suas múltiplas variáveis, especialmente nas dimensões críticas da transição de cuidados e nas determinantes sociais da saúde, chegámos à conclusão que é possível estabelecer um gradiente de vulnerabilidade nos 292
doentes durante o planeamento da alta. Tal, ocorre especialmente se destacarmos as variáveis que assumem um maior número de variações entre os doentes, e se as classificarmos através de uma análise por componentes principais ou por clusters, identificando com maior certeza determinados grupos de doentes.
Da percepção dos doentes analisados no Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, reconhecemos quatro grupos estruturalmente semelhantes (Maroco, 2011) e alcançámos uma tipologia classificatória, a partir da análise de homogeneidade (Carvalho, 2004) que se estendeu, a todas as “camadas”/níveis do modelo teórico de determinantes sociais da saúde (Dalhgren & Whitehead, 2006), quer pela exposição ou pela confirmação de certas características individuais, associadas ao estilo de vida, à rede de suporte e ao contexto de vida, de trabalho e/ou ambiental. Nestas, evidenciaram-se cumulativamente (por estudo de hipóteses) os factores subjacentes ao estudo: situação de dependência, de doença crónica e de comorbilidade. Salientam-se ainda, os doentes que regressaram ao domicílio e que beneficiaram de Cuidados de Longa Duração pela via informal. O que constatámos é que existe uma harmonização/compatibilidade entre os riscos avaliados pelo modelo ecológico em Serviço Social (Viscarret, 2007; Duque, 2013) e as determinantes sociais da saúde que os enquadram.
No que se refere aos doentes em extrema vulnerabilidade há evidência de que os homens são ligeiramente mais afectados (50,4%). Relativamente à idade, confirma-se uma prevalência maior nos idosos, com uma médiade 72,2 anos. A análise concluiu que a maioria dos doentes dependentes (52,5%), com doença crónica (54,7%) e comorbilidades (86,0%) está incluída neste grupo. Os restantes estão repartidos por outros três grupos estruturalmente semelhantes (clusters). Com base nos resíduos ajustados, concluímos que a maioria dos doentes regressa ao seu domicílio (53,6%), ao domicílio de familiares (11,2%) ou acaba por integrar Unidades de Cuidados Continuados Integrados (7,9%). Porém, há um número significativo de mortes antes da transição do nível de cuidados (18,8%).
Relativamente a outros indicadores sociodemográficos do cluster da extrema vulnerabilidade como o estado civil, salientamos que grande parte dos doentes é casada (45%) ou viúva (29,5%), em contraponto à minoria de solteiros (14,5%) e de divorciados (6,7%).
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Na perspectiva da ocupação profissional, os resultados mostram-nos que a maioria dos doentes é reformada (84,8%) ou está sem ocupação (6,1%).
Os problemas sociais mais evidentes, por ordem de importância e com valores de resíduos ajustados (> 1,96) foram: 1. Problemas com a rede de suporte primária (13,0); 2. Precariedade económica (8,4); 3. Problemas habitacionais (7,8); 4. Problemas relacionados com o estilo de vida (6,8); Relativamente às dimensões pessoais que derivam das situações-problema identificadas supra, e de acordo com a análise estatística, salientam-se: 1. Dependência de terceira pessoa (32,7); 2. Incapacidade de gestão de recursos (20,4); 3. Dependência de serviços de comunidade (9,8); 4. Isolamento familiar (4,8); 5. Dificuldade na comunicação (4,6); 6. Dificuldade na mudança (4,6). Na dimensão familiar a análise multivariada permitiu chegar aos seguintes diagnósticos: 1. Incapacidade de prestação de cuidados ao doente (18,8); 2. Indisponibilidade de prestação de cuidados ao doente (11,8); 3. Recusa da alta (10,4); 4. Recusa/negação da incapacidade do doente (4,8); 5. Familiar dependente (4,4). No que concerne às dimensões de risco aliadas a precariedade económica, destacam-se em especial: 1. Baixo rendimento pensão/trabalho (12,1); 2. Elevados encargos saúde (transportes, medicação) (10,2); 3. Encargos elevados com a habitação (renda, electricidade, água) (5,1). A expressão estatística por resíduos ajustados, não reconheceu a dimensão educacional, e considerou exclusivamente, a baixa qualificação como dimensão profissional (2,4), embora com um peso inferior a todas as outras já mencionadas. Em termos de protecção social como dimensão de risco para a transição de cuidados, o diagnóstico mais relevante foi a falta de 294
resposta institucional das estruturas da comunidade (2,0). Na dimensão habitacional, o diagnóstico com maior afinidade com o cluster foi a evidência de barreiras arquitectónicas (3,8). Depois de reconhecida pelos assistentes sociais nas suas dimensões de análise num quadro que se alinha com o modelo ecológico, a extrema vulnerabilidade é interpretada à luz do modelo das determinantes sociais da saúde (Dahlgren & Whitehead, 2006). Assim, no primeiro patamar deste quadro conceptual sobressaem as determinantes individuais relacionadas com a idade (média de 72,2 anos), com o género (masculino), e ainda com a doença crónica (92,8%), com as comorbilidades (86%) e a dependência (89,7%).
Na vertente dos estilos de vida (15,9%), identificou-se um nexo de causalidade associado a doentes que se encontram numa situação de isolamento social (6,1%) e a outros processos de auto-marginalização (2,2%). Ainda houve evidências que comprovaram uma conduta de comportamentos de risco (4,4%), principalmente associados a hábitos etanólicos e tabágicos (2,1%).
Relativamente às questões associadas à rede social e comunitária, as evidências foram expressivas nos doentes com uma ligação frágil à sua rede de suporte familiar, especialmente por indisponibilidade e/ou incapacidade de esta se responsabilizar pela gestão ou pela prestação dos cuidados. Com uma representatividade menor, também se destacaram situações de sobrecarga familiar e de exaustão, comprometendo a rede que articula o hospital, o doente, a família e a comunidade. Na vertente formal, as determinantes relacionaram-se com a ausência e a sobrelotação de equipamentos de proximidade e com a desadequação da oferta de serviços, face às necessidades (indiferenciação de cuidados). No que concerne às condições de vida, o estudo identificou doentes com pensões de velhice baixas e/ou inferiores à remuneração mínima nacional vivendo, por isso, num contexto socioeconómico desfavorável, sem outros recursos ou fontes de rendimento. A sua condição foi agravada por encargos excessivos, sobretudo com despesas de saúde e de habitação, estas acrescidas de despesas de adaptação provocadas pelas barreiras arquitectónicas.
Finalmente, no que respeita às determinantes estruturais, são de salientar: no quadro da crise socioeconómica, o contexto das medidas de ajustamento impostas pelas entidades internacionais que impediram o desenvolvimento sustentado da Rede Nacional de Cuidados 295
Continuados Integrados (RNCCI), e que por tal, depreciaram a intenção de oferecer uma resposta ágil à tendência dos principais indicadores demográficos em Portugal. Na perspectiva cultural, o “hospitalocentrismo” ainda predomina como ameaça, desvirtuando, num tempo de estagnação da doença aguda e do desenvolvimento da doença crónica, a organização dos níveis de cuidados. Esta realidade tem polarizado a cronicidade nas estruturas de resposta à doença aguda (hospitais), em detrimento de um acompanhamento estruturado, frequente e de continuidade, centrado nos cuidados de proximidade e na RNCCI. Em conclusão, destacam-se as regiões geográficas afectadas, pela extrema vulnerabilidade, sendo que no distrito de Lisboa há a referir os concelhos de Lisboa e Oeiras, e dentro desses, as freguesias da Ajuda, Alcântara, Oeiras e S. Julião da Barra, Algés, Cruz Quebrada-Dafundo e Paço de Arcos. Estas localidades são também algumas das mais povoadas do país, têm dos maiores índices de envelhecimento e destacam-se por terem acolhido durante décadas uma considerável parcela dos movimentos migratórios do interior de Portugal (INE, 2011).
Podemos afirmar que não são os factores individuais da extrema vulnerabilidade num doente, per si, que influenciam a transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração, mas sim a forma como estes se conjugam com outras determinantes sociais da saúde, especialmente ao nível do socioeconómico e da cisão entre a rede de suporte informal e formal. Os resultados da investigação demonstram que é possível agir preventivamente junto de doentes em situação de extrema vulnerabilidade, se aperfeiçoarmos as técnicas de diagnóstico e se os sinalizarmos, para que possam ser devidamente acompanhados por estruturas da comunidade, evitando riscos escusados que provoquem a descontinuidade dos cuidados e, inevitavelmente, a procura inútil por cuidados diferenciados. Neste estudo que reflecte sobretudo a intervenção do Serviço Social hospitalar nos doentes mais vulneráveis, mas que também considera as representações de informadores privilegiados na área da saúde e de cuidadores informais, é importante salientar o seguinte: Na vulnerabilidade distinguem-se dois grupos de doentes: um que afecta uma população jovem, autónoma, com doença crónica, em idade escolar ou desempregada e que vive num contexto socioeconómico precário; e outro que atinge a população idosa, dependente, com doença crónica, comorbilidades, inactiva, com ausência ou insuficiência de apoio da rede familiar e que aufere pensões contributivas ou não contributivas de baixo/mínimo valor; As situações de extrema vulnerabilidade lesam os mais pobres e polarizam-se nos idosos que são, distintamente, os que têm maior dificuldade em gerir meios 296
e recursos para garantir necessidades no seu meio envolvente, especialmente após um episódio de agudização de doença crónica. A extrema vulnerabilidade, conceito-chave que sobressai desta investigação, não resultou da análise que soma ou que inventaria os factores de risco que caracterizam os doentes mais complexos avaliados pelo Serviço Social. Sobre a condição de cada doente em particular, coube a acção interventiva do assistente social. A gestão e o planeamento da alta, bem como as escolhas que se admitiram nesse processo participativo e responsabilizador, é que deixam incertezas na satisfação das necessidades fundamentais para a reabilitação dos doentes. A insegurança em prestar cuidados fora do ambiente hospitalar, residiu na dificuldade de monitorizar e de providenciar o acompanhamento e a pedagogia adaptativa necessários à sua manutenção. Quando está em causa a fragmentação dos recursos de proximidade não é fácil estabelecer a transição de cuidados no melhor interesse dos doentes.
SOBRE OS CUIDADORES INFORMAIS
A experiência dos homens e das mulheres como cuidadores na extrema vulnerabilidade, revela-nos que o apoio familiar e formal no meio envolvente dos doentes, pode não ter sido o mais adequado às suas necessidades. Em primeiro lugar, não foi fácil o processo de escolha e definição
do
cuidador
e
das
suas
responsabilidades
inerentes.
Este
papel
de
responsabilidade/obrigação foi estabelecido por uma relação de afinidade filial ou de afecto (Lavoie, 2000), deixando para segundo plano, os aspectos que se referem à habilidade e à competência demonstrada para a execução dos cuidados (Walker et al., 1990). Em segundo lugar expuseram-se as diferenças de género entre cuidadores: Nos cuidadores homens, a probabilidade de se encontrarem vulnerabilidades foi maior quando a articulação com a rede formal de proximidade se apurou frágil ou inexistente; No caso das mulheres, a situação tendeu a agudizar-se quando as cuidadoras se viram isoladas na sua função, e não conseguiram identificar quem pudesse substituí-las nas suas ausências. As mulheres também se destacaram por serem mais prevenidas que os homens no que respeita à autoridade que poderá, formalmente oferecer os cuidados de saúde no caso de uma necessidade iminente, referindo-se à ligação ao serviço hospitalar e às equipas terapêuticas.
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Finalmente, num quadro de consensualidade, homens e mulheres reconheceram o equilíbrio entre o apoio formal/informal e as vantagens na adaptação das habitações perante evidências de sobrecarga de cuidados. Já a estabilização e a resistência dos cuidadores na extrema vulnerabilidade, só foi possível porque estes souberam adaptar-se aos novos hábitos, ao aumento de frequência de cuidados e à aprendizagem e manuseio de técnicas de suporte de vida.
A perspectiva debatida pelos cuidadores informais admitiu fragilidades na rede de suporte do doente e no seu sistema de protecção de saúde e apoio social. O registo das experiências demonstrou que os apoios de proximidade foram estruturalmente providenciados por membros da rede familiar (Martin, 1995), apesar de não rejeitarem nalguns casos, a complementaridade de serviços e equipamentos da sua área de residência. O apoio formal nestes doentes foi reconhecido pelos cuidadores: Na área social, pela resposta de Serviço de Apoio Domiciliário (SAD) da rede pública, apesar da sua morosidade, saturação e/ou desadequação face à complexidade das situações dos doentes (Gil, 1998; Albuquerque & Pimentel, 2010), bem como pelo direito/acesso às prestações sociais de regime contributivo e não contributivo, assumindo as pensões de velhice e o complemento por dependência, as medidas mais utilizadas no apoio à manutenção de cuidados (apoio social); Na área da saúde, pelas unidades hospitalares (Campos & Simões, 2011), deixando para segundo plano os Cuidados de Saúde primários (CSP) e a Rede de Cuidados Continuados integrados (RNCCI). Os primeiros por não terem a diferenciação desejável, os segundos por serem dispendiosos (co-pagamento de unidades) e não permitirem, no domicílio, uma conjugação integrada de cuidados. Em síntese, concluímos que os cuidados a doentes em situação de extrema vulnerabilidade foram prestados essencialmente pela família e que grande parte dos cuidadores, principalmente as mulheres, rejeita o apoio formal (Lenoir, 1979; Bengston, 2001). Os cuidadores principais foram, em regra, da família nuclear ou outros membros que por parentesco ou afinidade, estiveram próximos dos doentes (Renaut & Rozenkier, 1995; Kellerhals, 1995): cônjuges, filhos, sobrinhos e cunhados. Pudemos igualmente comprovar que a partilha de responsabilidades é diferente entre homens e mulheres cuidadores. Apesar de ambos participarem, há uma clara distinção de tarefas: as mulheres assumem a 298
responsabilidade pelas actividades básicas da vida diária dos doentes (Walker, 1991; Paúl, 1997), enquanto os homens se ocupam mais com actividades instrumentais.
Independentemente da forma como cada cuidador cumpriu o seu papel, pode concluir-se que a condição de extrema vulnerabilidade marcou a vida dos que tiveram essa responsabilidade (Schene, 1990; Maheu & Guberman, 1992; Martinez et al., 2000, Imaginário, 2008), comprometendo a condição física, psicológica e em certos casos, levando à doença (Perlin et al, 1990). No seio familiar também houve repercussões, sobretudo nas mulheres com filhos e nos homens com outros dependentes a cargo, bem como na inibição do contacto (homens / mulheres) com amigos e com a família alargada. Na vertente social, em ambos os géneros, mas sobretudo no masculino, ficou reconhecida uma tendência para o isolamento social e para a perda de relações entre pares (rede de amizades/rede de vizinhança). Finalmente, na vertente económica, evidenciou-se o efeito penalizador da integração dos cuidadores nos agregados familiares/ fiscais dos doentes (Roig et al., 1998). Estes passam a integrar o cálculo da capitação de rendimentos para a agilização de apoios sociais. As observações permitiram concluir que esta condição acaba muitas vezes por motivar a recusa de respostas formais (Pacquet, 2003), tanto ao nível do apoio pontual (serviço de apoio domiciliário) como permanente (lares, casas de repouso).
Em suma, o percurso dos cuidadores que disponibilizaram a sua experiência para a compreensão do fenómeno da prestação de cuidados de longa duração a doentes em vulnerabilidade extrema, foi atribulado. As narrativas transpareceram medos e sentimentos de impotência, motivados pela impreparação para a execução de tarefas intrínsecas à continuidade de cuidados, que implicam a aprendizagem de técnicas de apoio. No fundo, a incerteza e o receio de homens e mulheres cuidadores, está relacionado com o grau de dependência e de vulnerabilidade e, naturalmente, com a frequência e regime de cuidados necessários ao bem-estar dos doentes. Os cuidadores são colocados numa situação de ambivalência na forma como vão lidando com o carácter evolutivo de cada doença e à medida que vão renegociando as suas relações de suporte (Connidis & Mcmullin, 2002). Já a resposta de calibração ou a capacidade adaptativa para a gestão dessa ambivalência focaliza-se em duas estratégias: no reforço do apoio formal e informal, como defende a maioria dos cuidadores (Grand et al., 1988), e na institucionalização, embora essa expressão não seja tão significativa. 299
No que concerne ao impacto da extrema vulnerabilidade nos cuidadores informais, conferimos que a instituição familiar foi a principal responsável pelo cuidado dos doentes mais críticos, designadamente, entre os elementos que têm os laços de parentesco e/ou afinidade mais próximos. Ainda que determinados por uma obrigação familiar ou pela afeição ao doente, a maioria dos cuidadores passou por situações de ambivalência, e enquanto uns encontraram a forma de se ajustarem a uma realidade cada vez mais difícil e exigente, outros não conseguiram ter essa capacidade. Assim, encontraram-se dois tipos de cuidadores: • Os que resistiram e que acabaram por sair penalizados, fisicamente ou psicologicamente, nas suas relações pessoais e familiares e noutras redes (amizades e vizinhança); • Os que não conseguiram sustentar a situação e acabaram por conjugar a rede de suporte formal para reduzir a sobrecarga dos cuidados, e até mesmo, por aderir a respostas institucionais num regime de permanência. Pode concluir-se que a prestação de cuidados na extrema vulnerabilidade implica um desgaste físico e mental, bem como um custo efectivo que se traduz na vida familiar, conjugal e nas relações sociais, principalmente, se não existir uma solidariedade formal/informal para compartilhar tão grande responsabilidade. O isolamento a que muitas vezes o cuidador foi sujeito, tanto pela sua rede de relações, como pelos serviços comunitários, levou-o à exclusão social, não só pela via penalizadora associada ao exercício da função, mas pela ausência do seu reconhecimento social. A forma como os portugueses querem ser assistidos na doença crónica, num panorama sociodemográfico que acentua o envelhecimento populacional, a vulnerabilidade dos doentes e a dependência de terceiros é uma interrogação deste século que se coloca aos cidadãos/contribuintes, cujas famílias, se têm vindo a organizar (em sobrecarga), em menor número ou quase isoladamente. Tal assim sucede, porque o sistema de bem-estar e a rede de apoio que lhes assiste é insuficiente, fragmentada e não tem conseguido, pelas transformações socioeconómicas ocorridas na primeira década deste novo século, adaptar-se às necessidades reais da procura de cuidados de saúde e de apoio social.
Ainda que os detentores do diagnóstico de extrema vulnerabilidade tivessem em teoria, maior legitimidade para serem apoiados, por Cuidados de Longa Duração ou por Cuidados Continuados Integrados através das vias formais, os resultados da análise reconheceram, com as devidas excepções, que os responsáveis por estes doentes foram, sobretudo membros da rede familiar (Úbeda et al., 2000; OCDE, 2011). Os familiares dos doentes, forçados pela 300
expressiva necessidade de assistência e movidos pela cultura que caracteriza a Europa do Sul (Walker, 1991; Lamura, 2007), assumiram o suporte social dos doentes, no que se refere ao apoio emocional, material e afectivo. O posicionamento dos cuidadores pautou-se, por duas linhas
norteadoras:
uns
fizeram-no
pela
obrigação/
responsabilidade
de
cuidar,
nomeadamente, os que sentiram maior sobrecarga, enquanto outros adoptaram o mesmo papel, apenas ancorados a sentimentos de afecto (Lavoie, 2000). Confirmou-se que a gestão informal da extrema vulnerabilidade teve um impacto severo na vida pessoal, familiar, social e laboral do cuidador, sendo importante dotar as redes informais de medidas de incentivo que possam permitir a conciliação do trabalho com a gestão da vida familiar (Gil, 2007). Estas medidas podem surgir de benefícios fiscais, de licenças de assistência, da flexibilidade laboral, da elegibilidade para ingressar na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, entre outras estratégias, num tempo em que é imperioso agir, pois o número de doentes nesta condição tende a ser proporcional ao efeito da transição demográfica a que assistimos. No futuro, a par da solidariedade familiar (Fernandes, 1997; Pimentel & Albuquerque, 2010), que absorve como se verificou, a grande “fatia” da responsabilidade dos cuidados, deve favorecer-se uma equilibrada distribuição da sobrecarga nas situações de maior vulnerabilidade, através de ajustamentos ou do redesenho das políticas de welfare mix (Evers & Wintersberger, 1990; Capucha et al., 2005).
SOBRE REPRESENTAÇÕES DA REDE NACIONAL DE CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS
A Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, enquanto política que segue directivas europeias de organização programática (OCDE, 2005; Carvalho, 2009), aceita os princípios da diversidade de financiamento (sustentabilidade) e da adequação selectiva (acesso a cuidados de saúde e a apoio social). Por outro lado, tem tentado adequar-se às necessidades dos portugueses e à evolução do seu padrão demográfico, epidemiológico e de dependência (Campos, 2008; Joel, 2010). Porém, as medidas de austeridade e a crise económico-financeira ameaçam a sua sustentabilidade (OPSS, 2011), sendo os peritos e os decisores em saúde a favor de que o futuro deve passar pela conservação eficiente da sua capacidade instalada, pela redução de custos e pela manutenção do nível de qualidade das unidades existentes e das suas equipas técnicas (Fernandes et al., 2011). Conjuntamente comprovou-se, que a visão hospitalocêntrica perturba as orientações estratégicas que tentam melhorar a sua performance (Escoval, 2008; Sakellarides, 2010; Silva & Cabral, 2009) e que ainda não existe uma 301
articulação sectorial entre a Saúde, a Segurança Social e as autarquias que permita uma maior agilidade na transição entre níveis de cuidados (OPSS, 2015).
No âmbito da sustentabilidade, as propostas de melhoria vão no sentido de criar uma rubrica inovadora no orçamento do Estado para o financiamento da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, subtraindo o valor dessa parcela, à despesa com a reorganização da rede hospitalar (OPSS, 2011; OPSS, 2015). Numa vertente mais liberal, pode ser dada uma abertura ao sector privado para introduzir uma rede contratual de inspiração bismarckiana, através de uma lógica de seguros pré ou pós-pagos (Escoval, 2008).
As representações dos decisores e dos peritos em saúde esclarecem as assimetrias na expansão e no crescimento da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e a necessidade de provisão de equipamentos sociais e de recursos humanos (Abreu-Nogueira, 2009, OPSS, 2011). Na mesma medida, confirmam o rigor, a inflexibilidade no acesso e a escassez de unidades e de equipas, nas áreas com maior densidade populacional, como Lisboa e o Porto (Lopes et al., 2010, ERS, 2011). Em matéria de adequação de cuidados defendem que as respostas sociais integradas não estão ajustadas à procura, mas que se regem, de acordo com a oferta das unidades disponíveis (Huber, 2006).
Em jeito conclusivo foram identificadas vulnerabilidades no desenho da medida política de transição de cuidados (Ayres, 2003). Estas têm uma relação directa com a manutenção da cultura hospitalocêntrica (Cabral & Silva, 2009) e com a orientação da oferta de Cuidados Continuados Integrados em equipamentos fechados onde são predominantes as unidades: de Convalescença, de Reabilitação, de Manutenção e de Cuidados Paliativos. Os referidos destinos após a alta têm sido favorecidos em detrimento de respostas de proximidade (também previstas) e de estímulo à manutenção dos cuidados no meio envolvente dos doentes (Unidades de Ambulatório), típicas do modelo que melhor caracteriza Portugal e outros países vizinhos da Europa do Sul (Lamura, 2007). As opções preferenciais dos portugueses para a continuidade de cuidados são aquelas que ficaram por desenvolver quando se instaurou o cenário da crise económico-financeira que assolou Portugal, a partir de 2008, e mais tarde, durante o período de recuperação estabelecido pelo Memorando de Entendimento, entre o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu (Comissão Europeia, 2008). 302
16.1. O CONTRIBUTO TEÓRICO – PRÁTICO: DIAGNÓSTICOS DE EXTREMA VULNERABILIDADE
A investigação confirma que o modelo ecológico está relacionado com a prática dos assistentes sociais do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental. Os profissionais têm a capacidade de discriminar situações sociais complexas, de outras com resolução linear, colocando o doente e os seus sistemas no centro da sua intervenção.
Com esta investigação verificámos que planos individuais de cuidados foram traçados por acordos entre partes. Estes incluíram a capacitação individual e a participação da rede social e conduziram a uma transferência de cuidados, alinhada com a segurança de cada indivíduo e com o princípio da proximidade. Nesta linha de entendimento, o estudo confirma que o modelo pelo qual os assistentes sociais norteiam a sua praxis é fundamental para a determinação do risco (Dean, 1999; Beck et al., 2000) e da vulnerabilidade dos doentes (Ayres, 2003; Adger, 2006), bem como, para influenciar junto da sociedade civil e das redes de proximidade, o apoio a iniciativas de mudança estimulando a organização de cuidados e dinamizando medidas adaptativas.
A mudança que se ancora ao sentido de coerência e aos recursos gerais de resistência dos doentes (Long, 2001; Lindstrom & Eriksson, 2005) tem origem no processo de planeamento de alta e favorece a coesão de indivíduos e organizações, em função do bem-estar de quem se encontra numa situação frágil. Na verdade, os assistentes sociais do Centro hospitalar onde teve lugar a investigação, foram responsáveis pelo êxito da transição de cuidados para os serviços da comunidade, mesmo nos casos em que o gradiente da vulnerabilidade atingiu um patamar elevado e o risco demonstrou ser contínuo (Dean, 1999) e exterior à doença e ao grau de dependência dos doentes (Giddens, 2000).
O modelo de intervenção social que evidenciámos na análise dos 4965 doentes deixa para segundo plano o enfoque cognitivo-comportamental para a resolução de problemas que interferem na promoção da saúde (Hudson & McDonald, 1986; Sheldon, 1995). Contudo, importa referir que o Serviço Social não perdeu a linha de continuidade que foi construindo, desde a década de 50 do século XX, até aos dias de hoje, mas foi adequando os modelos às necessidades dos doentes e à evolução do conceito de saúde. Actualmente o Serviço Social estrutura-se pela corrente ecológica (Von Bertalanffy, 1971; Bronfenbrenner, 1979; Germain 303
& Gitterman, 1980; Viscarret, 2007; Duque, 2013) para chegar a resultados que as teorias psicodinâmicas, só por si já não poderiam alcançar. A intervenção do assistente social, para além da sua função reguladora e educativa (Dal Pra, 1998) passou para uma dimensão que instiga a inclusão social através do estímulo à participação (via do empowerment) e que o coloca, não apenas como um mero facilitador da coesão e do capital social (Putnam, 2002) entre doente, família, sociedade civil, Estado e Terceiro sector, mas como um profissional que inova, que cria e que estimula medidas adaptativas na rede social para garantir a segurança e o bem-estar dos doentes, depois de uma hospitalização (Gabarino, 1983; Walton, 1986; Chadi, 1997; Escobar & Elizalde, 1999). A investigação permite verificar que o modelo de intervenção do Centro Hospitalar Lisboa Ocidental é compatível como o modelo ecológico e passa pelos seguintes níveis de intervenção: A um nível psicossocial reconhece-se a situação-problema, delimita-se o escopo da
intervenção, traça-se um diagnóstico inaugural, recolhem-se dados relevantes através do estabelecimento de uma relação empática e de confiança. Capacitam-se doentes e cuidadores a mobilizarem recursos materiais e imateriais (Jonhson et al., 1995; Frankenhoff, 1998; Lindstrom & Eriksson, 2005); A um nível ecológico facilita-se a intervenção na rede social e no sistema dos doentes (micro, meso, exo e macro), e viabiliza-se a continuidade de cuidados hospitalares para os cuidados de longa duração (Gitterman, 1996; Ceconello, 2003; Baldwin & Walker, 2005, Viscarret, 2007).
Também observámos que para aferir diagnósticos de extrema vulnerabilidade em meio hospitalar, continua a ser indispensável envolver os assistentes sociais desde a primeira abordagem, quer através do acolhimento sistemático, em contexto de enfermaria, quer pela via do encaminhamento de profissionais de saúde ou, até mesmo, através da própria solicitação do doente/família. Estas diligências são levadas a cabo em qualquer área funcional: Urgência, Ambulatório ou Internamento. Na abordagem inaugural, o profissional estabelece um diagnóstico que admite, de acordo com os contornos da situação, uma condição de menor ou de maior complexidade. Se a exposição ao risco for relevante e evidenciar determinantes sociais da saúde cruciais ao funcionamento regular da vida dos indivíduos, estabelece-se um plano interventivo adequado. Este considera um diagnóstico social que desenhe o perímetro em torno das situações-problema detectadas. Quando se verifica um articulado de riscos sociais que colocam o doente numa situação de grande vulnerabilidade, a 304
intervenção dos assistentes sociais passa por estimular o sentido de resiliência (factores de protecção do doente e familiares) e por mobilizar a rede de serviços e equipamentos, como estratégias que podem travar ou atenuar a sua amplitude. Num hospital, os profissionais disponibilizam-se para fortalecer a coesão entre doente e a sua rede social, interferindo nos sistemas-chave que contribuem para a reversão dos comportamentos individuais, familiares e/ou institucionais que estão na origem das causas das situações de vulnerabilidade no momento da transição dos níveis de cuidados.
A investigação empírica quis demonstrar que é possível estabelecer um nexo de causalidade entre o diagnóstico social aferido pelas técnicas de intervenção dos assistentes sociais nas suas múltiplas dimensões de análise, e as variáveis estudadas que mais determinam a transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração. Assim, através do estudo dos processos dos doentes onde está registada toda a actividade assistencial, entre os anos 20092012, foi possível discriminar o gradiente da vulnerabilidade na transição dos Cuidados e ainda identificar as situações prioritárias e de extrema vulnerabilidade (Santos, 2012).
Logo na fase de acolhimento, como durante todo o período em que se vai estabelecendo o diagnóstico social, os assistentes sociais percepcionam situações críticas e actuam em conformidade, convocando a rede social a aderir intensivamente, para que os apoios fundamentais possam estar disponíveis no momento da alta hospitalar. Estes profissionais de saúde enquanto facilitadores, tentam promover a rede de pessoas e de equipamentos que garantem o apoio às actividades diárias (básicas e instrumentais) indispensáveis ao bem-estar dos doentes. Ao mesmo tempo, fazem-no de acordo com a pluralidade de actores disponíveis (família, rede de vizinhança, instituições, Estado), como forma de legitimarem, e até contratualizarem os serviços que podem provocar a mudança numa situação de extrema vulnerabilidade. Neste trabalho de “mediação” entre o doente e os seus sistemas (intervenção polissémica), importa também a capacidade técnica/arte (habilidades) do assistente social, na forma como facilita e promove o acesso aos cuidados que se exigem, para a manutenção da qualidade de vida fora do contexto hospitalar.
As questões que se colocam neste estudo sobre a transição dos cuidados, interferem na actividade assistencial dos hospitais, principalmente ao nível da eficiência. Contudo, o diagnóstico da extrema vulnerabilidade é crucial para os assistentes sociais, que são os 305
profissionais que garantem o planeamento e a gestão das altas, e quem negoceia a adesão a serviços e equipamentos – também regulamentados por critérios de preferência e de elegibilidade. Esta competência dos assistentes sociais consegue gerar confiança nas instituições de destino e legitimar o envolvimento e o sentido de co-responsabilização, permitindo alcançar melhores resultados. De acordo com o que observámos, a condição de extrema vulnerabilidade pode ser um diagnóstico prioritário a considerar na integração dos doentes, tanto ao nível das estruturas comunitárias de proximidade, como no acesso à Rede de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI). Esta posição do Serviço Social admite uma visão que coloca o cidadão no centro do sistema de saúde, e permite viabilizar de forma sustentada o contrato social, mesmo fora do perímetro hospitalar. Ao legitimar o papel que lhe compete, propõe às instituições de proximidade, a flexibilidade para se alcançarem níveis mais consentâneos de justiça social (Sen, 2009) que se aproximem das necessidades dos cidadãos e que se caracterizem pela lógica da inclusão e da adaptação à realidade. Neste contexto, o institucionalismo em rede como capilaridade do novo institucionalismo (Ansell, 2006), pode por hipótese, estar associado ao trabalho de mediação/facilitação exercido pelos assistentes sociais hospitalares. Note-se que este é promovido simultaneamente por relações estabelecidas com as estruturas e equipamentos da comunidade, como pela rede informal dos doentes que se encontram em situação de vulnerabilidade (capital social). O modus prociendi dos assistentes sociais transparece estabilidade e solidez e aspira ao melhor reenquadramento dos doentes no seu meio social, caminhando no sentido de uma governação integrada (Sakellarides, 2010; Harfouche, 2012;), coesa e abrangente, para um nível de cuidados de longa duração. Esta perspectiva de actuação pode ser extensível a outras unidades hospitalares e ao conjunto de instituições, redes e sistemas que orientam a acção social na saúde, pois leva em consideração os objetivos organizacionais, a segurança, a qualidade e a articulação entre doentes, comunidade e a diversidade de parceiros (Deighan et al, 2004; Ansell, 2006).
A investigação contribui para definir um gradiente de vulnerabilidade e diagnósticos de extrema vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para os Cuidados de Longa Duração. Esta realidade, apesar de estar patente no conjunto de doentes avaliados pelos assistentes sociais no quadriénio 2009-2012, ainda não tinha sido desocultada. A sua identificação enquanto diagnóstico social acaba por ser uma mais-valia para a melhoria da qualidade da praxis:
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Na melhoria dos processos (eficiência): os assistentes sociais podem passar a tomar sentido das dificuldades acrescidas que se repercutem no planeamento da alta e na agilização de recursos (permitindo-lhes agir precocemente nos casos mais complexos, bem como a justificar medidas de actuação e a regular as altas sociais dos doentes, de acordo o binómio tempo de internamento/ grau de vulnerabilidade; Na melhoria dos resultados (eficácia): os assistentes sociais podem legitimar as acções que levam a cabo com os serviços da comunidade e com outras instâncias públicas e privadas e do Terceiro sector que promovem o bem-estar dos doentes no seu contexto de referência (validando critérios de necessidade e de elegibilidade de acesso à rede de equipamentos e a benefícios sociais). Acrescente-se também que um diagnóstico de extrema vulnerabilidade tende a obter maior adesão da solidariedade familiar e informal, pois justifica uma prestação de cuidados adicional após a alta hospitalar.
16.2. LIMITAÇÕES, LIÇÕES APRENDIDAS E RECOMENDAÇÕES
As experiências de terreno levadas a cabo nesta investigação e as conclusões que se admitem relativamente à aferição de um gradiente de vulnerabilidade, podem ser extensíveis a outras áreas, desde que o modelo de intervenção social seja compatível ou tenha contornos semelhantes ao campo de análise que foi objecto de estudo. Por outras palavras, esta investigação poderá servir outra organização, na qual o Serviço Social se institua enquanto modelo numa perspectiva ecológica, e seja possível avaliar a complexidade dos problemas individuais, comportamentais, sociais e/ou ambientais, recorrendo à análise da sua amplitude.. Deste modo poder-se-á actuar junto da população utente e dos seus sistemas, a partir do desdobramento dos factores de risco, (Viscarret, 2007; Duque, 2013) legitimando a adesão a serviços, que face a diagnósticos de vulnerabilidade ou de extrema vulnerabilidade, justificam uma intervenção prioritária
As variáveis que integram a questão de partida desta investigação e que foram confirmadas empiricamente para desvendar a extrema vulnerabilidade, podem ser replicáveis noutros contextos de acção. Essas variáveis não excluem outras dimensões de análise que podem ser aprofundadas com o intuito de se identificarem novos diagnósticos de extrema vulnerabilidade. A utilização da mesma metodologia noutros doentes estruturalmente 307
semelhantes, designadamente em clusters identificados mas não explorados, são apenas um exemplo que pode reforçar uma visão mais abrangente do significado de extrema vulnerabilidade na transição dos cuidados hospitalares para o domicílio.
Estando o diagnóstico da vulnerabilidade directamente associado ao modelo de intervenção do Serviço Social que estuda, reconhece, analisa e intervém junto dos doentes e dos seus sistemas, é imperativo melhorar os instrumentos de recolha e de monitorização da actividade assistencial, tornando a construção do diagnóstico num processo cada vez mais preciso. Assim, pode ser possível aferir-se em tempo útil as situações de maior vulnerabilidade. Esta mudança, a estender-se aos assistentes sociais da área da saúde seria decisiva para legitimar a coesão entre níveis de cuidados e para justificar a elegibilidade na adesão a respostas de proximidade.
No campo das recomendações para a praxis do Serviço Social hospitalar salientam-se três linhas de orientação: Uma diz respeito à indispensabilidade de aferir diagnósticos de extrema vulnerabilidade no quadro da prática processual e procedimental do Serviço Social hospitalar. Para que tal possa ser possível, os assistentes sociais devem apoiar-se no modelo de intervenção ecológico que estabelece as etapas que devem ser seguidas: acolhimento, diagnóstico de factores de risco/determinantes sociais da saúde, intervenção polissémica (utilização de técnicas distintas) e planeamento da alta.
A segunda recomendação identifica no diagnóstico de extrema vulnerabilidade, o critério social de referência, ainda inexistente, para que um doente possa aceder ou ser elegível para integrar a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, pela via hospitalar.
A terceira recomendação está relacionada com a replicabilidade do método de monitorização da extrema vulnerabilidade aos assistentes sociais dos Cuidados de Saúde Primários e dos Cuidados Continuados Integrados, permitindo prevenir e controlar riscos sociais, em contextos de proximidade, bem como contribuir para a harmonização de práticas entre níveis de cuidados.
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UMA CRITICA CONSTRUTIVA
A investigação confirma que o modelo ecológico influencia positivamente a prática dos assistentes sociais e é uma mais-valia para doentes, profissionais e para as organizações que promovem a coesão social numa lógica de proximidade. Contudo, a instrumentalização e o culto da racionalidade e da eficiência centrada nos resultados arriscam comprometer a dimensão ética e política e a identidade do Serviço Social enquanto profissão (McDonald, 2006). Aos assistentes sociais, não lhes basta fazer corresponder o perfil de cada utente/doente a um tipo de recurso ou resposta social. O mais importante reside no compromisso de promover os direitos e a justiça social, de acordo com as necessidades e os desejos de cada indivíduo.
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BIBLIOGRAFIA TEMÁTICA
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335
LEGISLAÇÃO
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Decreto Lei n.º 101/2006, de 6 de Junho. Diário da República nº 109/2006 – Série I-A. Ministério da Saúde. Lisboa Decreto Lei 25/2010, de 29 de Março. Diário da República nº 61/2010 – Série I. Ministério da Saúde. Lisboa Decreto Regulamentar nº 3/88, de 22 de Janeiro. Diário da República nº 18/1988 – Série I. Ministério da Saúde. Lisboa Despacho nº 20321, de 17 de Setembro de 2002. Diário da República nº 215/2002 – Série II. Gabinete Secretário Estado Adjunto Ministro Saúde. Ministério da Saúde Despacho Conjunto nº 204/1996, de 3 de Setembro. Diário da República nº 204 – Série II. Ministério da Saúde e da Solidariedade e Segurança Social. Lisboa Despacho Conjunto, nº166/1994, de 20 de Julho. Diário da República – Série II. Ministério da Saúde e da Solidariedade e da Segurança Social. Lisboa Despacho Conjunto n.º 259/97, de 21 de Agosto. Diário da República nº 192/1997. Série II. Ministério da Saúde e da Solidariedade e Segurança Social. Lisboa Despacho Conjunto nº 407/1998, de 18 de Junho. Diário da República nº 138/1998 – Série II. Ministério da Saúde e da Solidariedade e Segurança Social. Lisboa Despacho Conjunto nº 726/1998, de 16 de Outubro. Diário da República – Série II. Ministério da Saúde e da Solidariedade e Segurança Social. Lisboa Despacho Conjunto nº 727/1999, de 23 Agosto. Diário da República nº 196/1999 – Série II. Gabinete Secretario Estado da Inserção Social e do Emprego e Formação. Lisboa Despacho Normativo nº97/83, de 23 Abril, Diário da República nº 93/1983 – Série I. Ministério dos Assuntos Sociais – Secretaria de Estado da Saúde. Lisboa Lei nº 2011/46, de 2 de Abril, Diário do Governo, I Série, nº 70. Promulga as bases para a organização hospitalar. Presidência da República Lei nº 48/90, de 24 Agosto, Diário da República n.º 195, I Série. Lei de Bases da Saúde. Assembleia da República. Lisboa Lei nº 27/2002, de 8 de Novembro, Diário da República nº 258/2002 – Série I-A. Assembleia da República. Lisboa Lei nº 4/2007, de 16 de Janeiro, Diário da República nº 11/2007, Série I. Bases Gerais do Sistema de Segurança Social. Assembleia da República. Lisboa Portaria nº 380/2001, de 11 de Abril. Diário da República nº86/2001, Série I-B. Ministério da Saúde. Lisboa
337
Portarias nº 381/2001, de 11 de Abril. Diário da República nº 86, Série I-B. Ministério da Saúde. Lisboa Resolução do Conselho de Ministros nº 197/1997, de 18 Novembro. Diário da República nº 267, Série I-B. Presidência do Conselho de Ministros. Lisboa Resolução do Conselho de Ministros nº 84/2005, de 27 de Abril. Diário da República, Série IB. Presidência do Conselho de Ministros. Lisboa Resolução do Conselho de Ministros nº 91/2001, de 6 de Agosto. Diário da República nº181/2001, Série I-B. Presidência do Conselho de Ministros. Lisboa
338
ANEXOS
ANEXO 1 JUSTIFICAÇÃO DA COLABORAÇÃO DOS INTERLOCUTORES PRIVILEGIADOS
: ACTORES
JUSTIFICAÇÃO DA COLABORAÇÃO
Área da Saúde
Interlocutores chave
Constantino Sakellarides
Licenciatura em Medicina
A – Presidente da Health Cluster Portugal
Director Académico da Escola Andaluza de Saúde Pública,
Director da Escola Nacional de Saúde Pública, Presidente eleito
Espanha (1985-87)
da Associação Europeia de Saúde Pública
Director para as Politicas e Serviços de Saúde OMS/Europa, Copenhaga
(1991-95)
Presidente do Conselho de Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (1996) Director
Geral
da
Saúde
(1997-99)
Presidente do Conselho Científico da Escola Nacional de Saúde Pública (2004-2006) Inês Guerreiro B - Coordenadora Nacional da RNCCI
Licenciada em Sociologia Ex-Coordenadora Nacional para a Saúde dos Idosos e Cidadãos em Situação de Dependência. Responsável pela elaboração de legislação que serviu de base à criação da Rede de Prestação de Cuidados Saúde de Longa Duração, através da Direcção-Geral da Saúde. Directora Regional da Segurança Social da Região Autónoma da Madeira e Presidente do Centro Regional da Segurança Social.
Sónia Bravo
Licenciada em Enfermagem
C - Supervisora Chefe Oncologia
Enfermeira Directora do Pabellon de Cuidados Paliativosno Hospital General Universitário Gregório Marañon, em Madrid Experiência profissional na área e atenta à necessidade da abordagem de benchmarketing, por comparação à área específica de cuidados continuados
Adalberto Campos Fernandes
Médico em Saúde Pública
D – Ex-Presidente do Conselho de Administração do CHLN
Ex-Presidente do Conselho de Administração da Medis, Professor universitário na Escola Nacional de Saúde Pública, Investigador Gestor executivo no sector público e privado
Nuno Gil E – Oncologista (Sector Privado)
Médico oncologista do Hospital da Luz Crítico da dualidade entre prestação de serviços público e privado e defensor da humanização dos serviços de saúde
António Correia de Campos
Médico
F – Presidente do Conselho Directivo do Instituto Nacional de Administração, IP, Ex – Ministro da Saúde do XVII Governo
Ministro da Saúde de Março de 2005 -2008, Ministro da
Constitucional
Saúde2001 - 2002. Presidente do Conselho Científico do Instituto Europeu de Administração Pública, Presidente do Instituto Nacional de Administração (INA) 1997 2001. Professor Catedrático da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa (1995-1997).
339
Paulo Kuteev- Moreira G – Deputy Head of Unit at European Centre for Disease
Professor em estratégias de Acção em Saúde e especialista em Comunicação e Políticas de Saúde
Prevention and Control Estratégias de Saúde, Colaborador em Projectos na área social –
Conhecimento privilegiado na área das políticas de saúde,
Professor da Universidade Nova de Lisboa (Escola Nacional de
investigador, defensor do modelo holístico da saúde, expert na
Saúde Pública)
área das políticas de saúde, saúde comunitária, principalmente nas áreas de qualidade, experiências de implementação de projectos diversos nas áreas em estudo em Portugal e no estrangeiro.
João Semedo
Médico
H – Deputado do Bloco de Esquerda
Presidente do Conselho de Administração do Hospital de
Vice- Presidente da Comissão Parlamentar de Saúde
Joaquim Urbano Membro da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Membro da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Cidadania
Vítor Ramos
Médico
I – Médico da Unidade de Saúde Familiar
Membro do Centro de Saúde de Cascais Professor Auxiliar Convidado da ENSP – Universidade Nova de Lisboa (Grupo de Disciplinas de Políticas e Administração de Saúde)
Paula Santos
Química
J – Deputada do Partido Comunista Português
Membro coordenador do grupo parlamentar da saúde
Teresa Caeiro
Advogada/Jurista
K – Vice- Presidente do CDS/PP
Exercício de Advocacia na PLMJ, Sociedade de Advogados Coordenadora da Comissão Parlamentar da Saúde CDS/PP Secretária de Estado da Segurança Social no XV Governo Constitucional
340
ANEXO 2 IDENTIFICAÇÃO DOS CUIDADORES INFORMAIS
Nº
Cuidador principal
Residência Doente
Residência Cuidador
Sexo
Idade
Estado civil
Ocupação
E1
Sobrinha
Algés
Linda-aVelha
F
57
Separada
E2
Filha
Caxias
Lisboa
F
54
Casada
Auxiliar Acção médica Fotografa
E3
Cunhado
Porto salvo
Porto Salvo
M
58
Casado
Reformado
E4
Filha
Alcântara
Ajuda
F
56
Casada
Reformada
E5
Sobrinha
Cascais
Cascais
F
45
Casada
Consultora informática
E6
Filha
Abóboda
F
43
Casada
E7
Sobrinho
Paço de Arcos Lisboa
Lisboa
M
53
Solteiro
Educadora de infância Designer Industrial
E8
Cônjuge
78
Casado
Reformado
Filho
Linda-aVelha Oeiras
M
E9
Linda-aVelha Oeiras
M
66
Casado
Reformado
E10
Prima
Lisboa
Torres Vedras
F
68
Solteira
Refomada
341
ANEXO 3 IDENTIFICAÇÃO DOS CUIDADORES INFORMAIS CONTACTADOS
ID
ESTADO_CIVIL
1 Casado(a)
HAB Curso técnico - profissional
2 Viúvo(a)
IDADE
SEXO
EST_OCUP
OCUPACAO
PROFISSAO
62
Masculino Activo
Ensino Básico 1º Ciclo
90
Feminino
Não Activo
Trabalho p/ Conta Própria Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
3 Viúvo(a)
99
75
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
4 Viúvo(a)
87
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
5 Casado(a)
99 Ensino Básico 1º Ciclo
34
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
6 Viúvo(a)
99
60
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
7 Viúvo(a)
99
68
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
49
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
9 Solteiro(a)
99 Ensino Básico 3º Ciclo
33
Masculino Activo
10 Solteiro(a)
99
72
Feminino
11 Casado(a)
99
82
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
12 Viúvo(a)
Desconhecidas
87
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
13 Casado(a)
99
76
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
14 Casado(a)
99 Ensino Básico 2º Ciclo Curso técnico - profissional
65
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
36
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
81
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
99
90
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
18 Solteiro(a)
99
56
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
19 Casado(a)
99
87
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
99
91
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
21 Viúvo(a)
99
89
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
22 Casado(a)
99
80
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
99 Curso técnico - profissional
63
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
74
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
25 Viúvo(a)
99
81
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
26 Solteiro(a)
99
94
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
27 Casado(a)
67
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
79
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
29 Divorciado(a)
99 Ensino Básico 1º Ciclo Ensino Básico 3º Ciclo
69
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
30 Divorciado(a)
99
70
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
99
68
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
32 Viúvo(a)
99
78
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
33 Viúvo(a)
99
84
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
34 Casado(a)
99
68
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
35 Viúvo(a)
Licenciatura Ensino Básico 2º Ciclo Ensino Básico 1º Ciclo
63
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
42
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
39
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
99
54
Feminino
8 Solteiro(a)
15 Solteiro(a) 16 Casado(a) 17
20
23
99
99
99
24 Divorciado(a)
28 Casado(a)
31
36 Solteiro(a) 37 Solteiro(a) 38 Divorciado(a)
99
Não Activo
Activo
Desempregado s/ Subsidio S/ Ocupação
Outra situação
342
39
99
99
84
Masculino Não Activo
40 Casado(a)
Analfabeto
86
Masculino Não Activo
41 Casado(a)
99 Curso técnico - profissional
83
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
60
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
64
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
44 Viúvo(a)
99 Ensino Básico 1º Ciclo
81
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
45 Casado(a)
99
70
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
46 Solteiro(a)
99
77
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
47 Solteiro(a)
99
43
Feminino
Não Activo
48 Viúvo(a)
99
79
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
49 Solteiro(a)
99
47
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
99
92
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
51 Casado(a)
99
63
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
52 Viúvo(a)
Desconhecidas
89
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
53 Viúvo(a)
99
93
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
54 Solteiro(a)
99
56
Masculino Activo
55 Casado(a)
99
80
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
56 Casado(a)
78
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
57 Viúvo(a)
99 Sabe Ler e Escrever
84
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
58 Casado(a)
99
85
Masculino
42 Casado(a) 43 Solteiro(a)
50
99
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
Desempregado s/ Subsidio
99
99
62 Solteiro(a) 63 Casado(a)
Licenciatura
87
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
64 Casado(a)
99
80
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
65 Solteiro(a)
30
Masculino Não Activo
66 Casado(a)
99 Ensino Básico 2º Ciclo
57
Feminino
Não Activo
67 Casado(a)
99
62
Feminino
Não Activo
68 Casado(a)
99
91
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
69 Casado(a)
99
68
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
70 Casado(a)
99
81
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
71 Casado(a)
99
78
Masculino Não Activo
72 Casado(a)
Ensino Básico 1º Ciclo
59
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
71
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
74 Viúvo(a)
99 Curso técnico - profissional
75
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
75 Viúvo(a)
Ensino Básico
88
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
59 Viúvo(a) 60 Casado(a) 61 Solteiro(a)
73 Casado(a)
Não Activo
Reformado / Pensionista
Trabalhadores não qualificados
Ensino Básico 1º Ciclo Ensino Básico 1º Ciclo Ensino Básico 1º Ciclo Ensino Básico 1º Ciclo
79
Feminino
68
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
50
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
48
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
S/ Ocupação Reformado / Empregados de Pensionista escritório Reformado / Pensionista
343
1º Ciclo 76 Solteiro(a)
99
59
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
99
69
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
73
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
79 Viúvo(a)
Licenciatura Ensino Básico 1º Ciclo
73
Feminino
Não Activo
80 Casado(a) Separado(a) 81 Judicialmente
99 Ensino Básico 1º Ciclo
50
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
79
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
82 Solteiro(a)
Desconhecidas
83
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
83 Viúvo(a)
99
80
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
84 Casado(a)
99
84
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
99
84
Feminino
Reformado / Pensionista
86 Solteiro(a)
99
44
Masculino Não Activo
S/ Ocupação
87 Casado(a)
99
87
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
88 Casado(a)
67
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
89 Casado(a)
99 Sabe Ler e Escrever
69
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
90 Casado(a)
99
89
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
91 Casado(a)
99
70
Masculino Não Activo
92 Viúvo(a)
Ensino Básico 1º Ciclo
78
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
93 Viúvo(a)
99
78
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
94 Viúvo(a)
99
81
Feminino
Não Activo
77
99
78 Viúvo(a)
85
99
Não Activo
95
99
99
79
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
96
99
95
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
48
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
86
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
83
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
48
Feminino
Reformado / Pensionista
101 Casado(a)
99 Sabe Ler e Escrever Ensino Básico 1º Ciclo Ensino Básico 1º Ciclo Sabe Ler e Escrever Curso técnico - profissional
74
Masculino Não Activo
102 Viúvo(a)
Ensino Básico 1º Ciclo
79
Feminino
Não Activo
103 Solteiro(a)
99
79
Feminino
Não Activo
104 Casado(a)
Licenciatura
52
Masculino Activo
105 Casado(a)
99
69
Masculino Não Activo
106 Casado(a)
99
80
Feminino
107 Viúvo(a)
99
62
Masculino Activo
108 Casado(a)
99
77
Masculino Não Activo
109 Casado(a)
99
50
Masculino
99
67
Masculino Não Activo
97 Casado(a) 98 Casado(a) 99 Casado(a) 100 Casado(a)
110
99
Não Activo
Não Activo
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados Reformado / Pensionista Técnico Outra situação Superior Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados Desempregado c/ Subsidio
99
Reformado / Pensionista 99 Reformado /
Técnico
344
Pensionista 111 Casado(a)
Superior
99
92
Masculino Não Activo
99
75
Masculino Não Activo
99
74
Feminino
Não Activo
114 Viúvo(a)
99
79
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
115 Casado(a)
99
64
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
116 Solteiro(a)
Desconhecidas
80
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
99
76
Masculino Não Activo
118 Solteiro(a)
Ensino Básico 1º Ciclo
85
Feminino
119 Casado(a)
99
84
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
120 Casado(a)
99
66
Masculino Não Activo
121 Casado(a)
Ensino Básico 1º Ciclo
77
Masculino Não Activo
S/ Ocupação Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
122 Casado(a)
99
72
Masculino
123 Viúvo(a)
Ensino Básico 1º Ciclo
89
Feminino
124 Casado(a)
99
66
Masculino Não Activo
125 Solteiro(a)
40
Masculino Activo
126 Casado(a)
99 Ensino Básico 1º Ciclo
88
Masculino Não Activo
127 Viúvo(a)
Ensino Básico 1º Ciclo
85
Feminino
128 Casado(a)
99
77
Masculino Não Activo
Reformado / Pensionista
129 Casado(a)
99
74
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
130 Casado(a)
99
83
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
131 Solteiro(a)
99
71
Feminino
Não Activo
Reformado / Pensionista
132 Casado(a)
99
59
Masculino Não Activo
133 Casado(a)
Sabe Ler e Escrever
75
Masculino Não Activo
134 Casado(a)
99
81
Feminino
112 Casado(a) 113
117
99
99
Não Activo
99
Não Activo
Não Activo
Não Activo
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados 99
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
99 Reformado / Pensionista
Trabalhadores não qualificados
Reformado / Pensionista Outra situação Reformado / Pensionista Operário Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados
Reformado / Pensionista Trabalhadores Reformado / não Pensionista qualificados Reformado / Pensionista
345
ANEXO 4 E 5 GRELHAS DE CONSTRUÇÃO DE ENTREVISTA A PERITOS EM SAÚDE E A DECISORES POLÍTICOS
Guião de entrevista imensões
Questões Informação a recolher Cuidados Continuados Integrados Considerando a política de cuidados continuado como forma de responder às necessidades dos cidadãos e ao fenómeno do envelhecimento, tanto ao nível de apoio social como em matéria de saúde – pretendemos saber, genericamente, a sua posição sobre algumas questões que serão aprofundadas posteriormente 1. Na sua opinião como se devem financiar os cuidados Deve ser mantida a Manter a orçamentação existente continuados integrados (CCI)? Apenas com capitais 1.1 Flexibilidade (com os privados) orçamentados pela saúde ou partilhando essa 1.2 Variabilidade (seguros responsabilidade com o sector privado e com o 3º 1.3 De acordo com as Necessidades da população (verbas sector? extraordinárias) 1.4 De acordo com livre escolha (centrada na escolha do cidadão) 2.Pensando na rede de CCI como medida política que Se muito afastamento ou proximidade, deve-se a que Grau de aproximação/ afastamento organizacional factores: existe, numa escala de 0 (afastamento) a 10 2.1 Aos Agentes (muitos ou poucos, formação, escassez) 1. (proximidade), entre a saúde e os serviços sociais? 2.2 Instituições (maior número/ menor não conseguem dar CCI em resposta, desfasamento) Portugal 2.3 Respostas especializadas ( ainda não foram criadas algumas importantes medidas que sirvam a população) 3. Como avalia os resultados da rede nos últimos 5 Níveis anos? Que alterações? 3.1 Intersectorialidade saúde/apoio social 3.2 Potencialidades e constrangimentos (mais valias) 3.3 Monitorização (externa) 3.4 Registo da actividade assistencial 3.5 Tipologias de unidades 3.6 Sistema de avaliação
2. Risco e Incerteza
1. Considerando o envelhecimento progressivo da população portuguesa quais os novos desafios para os CCI?
1.1 Equipamentos (falta de unidades) 1.2 Agentes de mediação (necessidade, boa gestão) 1.3 Apoio financeiro (maior investimento no sistema ou no cidadão) 1.4 Maiores tempos de espera para a integração nos equipamentos
2. Como gerir a incerteza da procura ou da oferta de CCI considerando que se vive mais com maior grau de dependência?
1.1 Volume de doentes (através do aumento ou decréscimo de doentes) 1.2 Tipo de serviços (pela aderência ou pela escolha de apoio informal ao longo de vários períodos) 1.3 Supervisão/Monitorização (contínua, mensal, semestral
3. Reconhece novas respostas no lugar das existentes?
1. Considerando a despesa em CCI, qual a forma mais eficiente para evitar o desperdício de recursos e responder as necessidades dos cidadãos?
3. Expansão e modernização dos CCI
2. O acesso aos CCI não tem critérios sociais que motivem, per si, a sua integração? Quais salientaria? 3.A exigência futura de CCI deve considerar o aumento das estruturas existentes ou um maior investimento direccionado aos cidadãos?
4. CCI no contexto europeu
1. Qual a sua opinião sobre a prestação de CCI em Portugal? E na Europa? 2. Qual a sua opinião sobre a cooperação entre serviços sociais e saúde na Europa, nos próximos 10 anos?
1.1 Novas políticas (por exemplo, maior inclusão de parceiros privados e 3º sector) – delegação de competências do estado. 1.2 Serviços/Instituições (aproveitamento, PPP) 1.3 Agentes de protecção saúde/social (literacia) 1.1 Cuidados Médicos (especialização de médicos, unidades hospitalares apetrechadas com camas para efeito, demora média de x dias de internamento) 1.2 Cuidados Não médicos (aumento da cobertura de prestadores, encaminhamento privilegiado para instituições) 1.3 Decisão de plano de CCI em Nº de dias/horas 48, 72 horas (conforme diagnóstico clínico e situação social) 1.4 Evitar internamentos desnecessários em hospitais 1.1 Isolamento social, rejeição familiar, outros 1.1 Equipamentos (novas unidades de reabilitação, cuidados paliativos, resposta a isolados sociais com necessidades em saúde) 1.2 Utente com acesso a financiamento individual (liberdade de escolha evitando tempos de espera e oportunidade de responder provisoriamente a uma situação que se coloque). 1.1 Numa Escala de 0/10
.1.1 Trajectória da institucionalização/des (institucionalização). 1.2 Combinação de cuidados formais e informais
346
ANEXO 6 GRELHA DE CONSTRUÇÃO DE ENTREVISTA A CUIDADORES INFORMAIS
Dimensões I. Processo de cuidar: a transição de cuidados, a acomodação a novas rotinas, impactos no cuidador.
II – Apoio Formal: cuidados sociais e de saúde
Questões 1.1 Enquanto cuidador pedia que me descrevesse a sua experiência pessoal e me falasse do que o levou a ser cuidador, o trajecto? 1.2 Como tem prestado os cuidados e com que tipo de actividades lida no seu dia-a-dia? 1.3 Qual a dependência e quais as necessidades centrais? 1.4 Como foi esta transição do hospital para casa, as novas rotinas?
Informação a recolher 1.1 Experiência pessoal (mudanças vida/gestão da doença): A escolha do cuidador/ habilidade Processo de escolha, obrigação/dever Descrição dos cuidados 1.2 Descrição dos cuidados/AVDs básicas e instrumentais: operacionalização 1.3 Dificuldades sentidas/ultrapassadas; tipo de dependência; Necessidades do quotidiano 1.4 Acomodação a novas rotina
2.1 Recorreu a apoio de outras pessoas, familiares, do estado ou de outras instituições para facilitar a gestão da situação? Aguardou por respostas do estado? Quanto tempo?
2.1 Experiência formal: terceiro sector, estado, sector privado Cuidados sociais formais: Segurança Social, RNCCI, SAD, CD, LAR, outros Cuidados sociais informais; cuidadores privados, vizinhos, outros familiares, amigos Cuidados de saúde, centros de saúde, subsistemas saúde, hospitais, fisioterapeuta, RNCCI, centros de recuperação/reabilitação 2.2 Posicionamento na articulação entre apoio formal/informal
2.2 Tanto na área da saúde como nos cuidados sociais de apoio? 2.3 É remunerado/a? Qual o montante envolvido na prestação de cuidados?
III – Vulnerabilidade do doente e impacto cuidador
3.1Sente ou sentiu dificuldades na gestão da doença face ás necessidades ao ponto de considerar que não consegui a superar?
3.2 Quais foram ou têm sido as consequências desde que começou a ter este papel como cuidador? A nível familiar, social, económico?
3.3 O que o deixa mais vulnerável?
3.4 Como procede nos casos em que se sente vulnerável e o que o ajudaria a fazer face a essa insegurança
2.3 Remuneração: espécie, contrato, bens materiais, compromisso post mortem 3.1 Impacto individual (físico, psicológico, doença, sobrecarga, dificuldades na gestão da doença face às necessidades ao ponto de considerar que não as consegue superar, surgimento doença, sobrecarga, sensação de aprisionamento)3.2Impacto Familiar (coesão/desfamilização; obrigação/Afeição) 3.2mpacto Social (rede social/solidariedade; Restrição de contactos sociais/trocas sociais) Impacto Económico (custo da vulnerabilidade/recompensa; consenso/conflito) 3. 3 Vulnerabilidade extrema no cuidador por áreas de responsabilidade/dever (as avds, a doença, a incapacidade física, a frequência de cuidados/dia, a ausência de vida relacional, outras) 3.4Impacto Cultural (matrinilinearidade/estereótipo cuidador; dever conjugal/ (des) institucionalismo Procedimento em situações críticas ao dispor (112, hospital referência, linha 24, médico família, enfermeiro, AS).Colmatar a insegurança nestas situações: (rede, lar, apoio económico, dispensa dias de trabalho, flexibilidade laboral, visitas monitorização, aprendizagem e treino de cuidados, formação adequada, politicas novas)
347