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A várzea mudou
from Segunda Divisão
by hns2020
E V O L U Ç Ã O D O F U T E B O L A M A D O R
Por André Mota e Leonardo Sena
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O futebol é o esporte mais famoso e praticado do mundo, principalmente no Brasil, que é conhecido como o “país do futebol” . Ser reconhecido pelo esporte é o sonho de muitas crianças que crescem jogando, seja nas ruas ou nos campos dos bairros onde vivem. E por ser muito praticado no país, o caminho para chegar no futebol profissional é muito estreito. Mesmo quem não consegue atingir a carreira profissional busca outras formas de se manter no ambiente futebolístico, participando de amistosos e torneios amadores, podendo até ganhar um extra. Alguns jogadores chegam a lucrar 400 reais num final de semana de jogos na várzea, muitos fazem desse dinheiro como renda familiar. Como é o caso de Denis Marcelino que ganha entre R$1800 a R$2000 por mês, ajudando a sustentar sua família. Isso mostra o quanto os campeonatos de várzea se valorizaram nos últimos anos, com a modernização dos campos que em sua maioria são de gramas sintéticas. Antes de nos aprofundarmos no atual momento do futebol várzea vamos voltar a origem do termo.
O termo futebol de várzea se originou na cidade de São Paulo, pela prática do esporte em terrenos às margens do rio Tietê, ou seja, nos campos de várzea. Por muito tempo o termo associou-se ao futebol praticado de maneira desorganizada nas periferias da cidade, tanto pelos campos desnivelados quanto pela falta de regras, algo comum no futebol amador. Mas os tempos são outros e quem acompanha o futebol de várzea percebe que houve uma grande evolução na categoria, os campos de terra deram lugares aos campos de grama sintética. Os jogadores que antes jogavam por amor e ajudavam a manter os jogos, hoje chegam a faturar mais que muitos atletas profissionais. Esse é o atual cenário do nosso futebol de várzea.
“Dinheiro, fama, luxo” , essa é a ideia que se vê nas telas de televisão e nas redes sociais dos jogadores profissionais das principais ligas do Brasil e no mundo. Porém esses atletas representam uma pequena parcela de todos os jogadores registrados como profissionais. Segundo levantamentos de dados da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) realizados em 2016, sobre o salário dos
jogadores de futebol registrados em clubes brasileiros, cerca de 4% ganham mais de cinco mil reais, enquanto aproximadamente 82% ganham até mil reais. Uma realidade pouca mostrada pela mídia, e de pouco conhecimento da população, mas reflete a real vida de um atleta futebolístico no país. Por isso que muitos jogadores preferem disputar jogos de várzea do que disputar jogos profissionais para ganhar pouco mais de um salário-mínimo. Segundo relatos de jogadores de várzea, dependendo do campeonato a ser disputado pode-se ganhar até 400 reais em uma partida, ou seja, dá para se tirar uma renda extra ou até viver desses jogos.
Os campeonatos de várzeas na atualidade estão muito valorizados, com grandes premiações. Fazendo com que elevem o nível dessas competições. Fazendo um levantamento dos times campeões das principais competições, os times chegam a gastar mais de 6 mil reais por jogos, pois além dos “bichos” dos jogadores, há o custo de transporte, alimentação, entre outros. Parece organização de futebol profissional.
Atualmente não se fazem mais times campeões apenas com jogadores de bairro, é necessário investimento para conseguir um título de relevância, e isso se deve às altas premiações, como a Copa Pioneer, principal torneio de várzea em São Paulo que premiará o campeão de 2022 com 80 mil reais. Portanto há muita rotatividade dos jogadores nas equipes varzeanas, pelos altos cachês para se jogar uma partida de um grande campeonato. Há atletas que disputam até 6 jogos num fim de semana por times diferentes.
Para explicar um pouco da grande valorização destes torneios, têm-se a Copa Pioneer. Segundo Sérgio Pioneer, fundador do torneio em 2016, para que a copa chegasse ao status Por exemplo um dos campos sede, a Arena Santa Amélia, foi realizada uma grande restauração para que tivesse condições de jogo, houve construção de arquibancadas, reformas de gramados e reforma de infraestrutura, o estádio virou uma verdadeira arena na periferia. E conforme Sérgio, o objetivo não era só se ter um grande torneio no extremo sul de São Paulo, mas também trazer melhorias para sua comunidade. Fazer com que a população em volta utilize o espaço.
E pelo jeito ele conseguiu, pois apesar das duas primeiras edições terem trazido prejuízos para os organizadores, hoje o torneio conta com equipes de toda região metropolitana de São Paulo, duas sedes extremamente bem cuidadas na periferia e parcerias com grandes empresas do mercado nacional. Além das premiações, os campeonatos de várzea são uma ótima oportunidade para os jogadores que “passaram da idade” atingir a carreira de sucesso, pois estão mais em alta do que torneios de divisões inferiores profissionais. Eles são mais divulgados pela mídia, além da grande variedade. Há alguns casos de jogadores oriundos dos campeonatos de várzea que pularam o caminho tradicional da formação de um jogador nas categorias de base e despontaram nos principais gramados brasileiros, como o Bruno Henrique, que após se destacar em um torneio amador de Minas Gerais, foi contratado pelo Cruzeiro aos 21 anos e hoje é um dos principais atletas do do Campeonato Brasileiro, mostrando que é possível chegar ao profissional através da várzea.
A ORIGEM
C R Ô N I C A
Por André Mota
Há não muito tempo, assistindo a uma partida entre Flamengo e Palmeiras pelo campeonato brasileiro de futebol, em mais uma rotineira conversa com meu avô sobre o esporte bretão, o velhão me disse: "Garoto, o futebol está ficando muito distante de sua essência, sinto saudades da época em que o futebol brasileiro era jogado de forma pura e alegre, de forma pouco mecanizada. Os jogadores eram formados no futebol de rua, jogavam em campos esburacados de terra e em cada time havia pelo menos um craque. " Inicialmente eu questionei — diretamente e mentalmente — se essa indignação realmente fazia sentido, pois quem viveu os anos mais vitoriosos do futebol brasileiro tende a ser apegado ao passado e a proteger o que o emocionou em sua juventude, e aquele saudosismo todo que já estamos acostumados. Com o tempo, fui notando que esse sentimento não era exclusivo do meu avô e que, na verdade, era muito mais comum do que eu pensava. Quando muitas pessoas compartilham de uma ideia, há pelo menos duas alternativas: é delírio coletivo ou é realmente algo com algum fundo de nexo. Curioso como sou, busquei a fundo as origens dos principais e mais vitoriosos jogadores da história do futebol brasileiro e percebi que a enorme parte deles tinham origens similares: nasceram em lugares pobres, cresceram jogando futebol nas ruas e em campos de terra e foram extremamente habilidosos em suas carreiras profissionais. Essa era a realidade da maioria dos jogadores que trouxeram as tão aclamadas 5 copas do mundo que fazem o Brasil ser chamado de "país do futebol" . Mais uma vez me questionei se essas origens formaram a tal essência do futebol brasileiro que tanto se falava.
Tempos depois fui perguntar ao meu avô quais as diferenças ele enxergava entre o futebol praticado hoje e o futebol praticado até os anos 90, e ele me respondeu com as seguintes palavras: "meu filho, é simples: antigamente os craques tinham a mesma liberdade que tinham quando jogavam nas ruas, a criatividade guiava o corpo e magia acontecia. Era intuitivo. Hoje parece que os jogadores são robôs e repetem as mesmas jogadas que o treinador orienta. "
Meu avô era um grande sociólogo, interpretava a sociedade e os fenômenos que acercam o comportamento humano como ninguém. Ele transparecia sua indignação de forma tão limpa como quando lidava com pessoas. Eu percebia que ele realmente sentia isso que foi contado de maneira legítima.
Passaram-se meses e essa ideia ficou martelando as paredes da minha cabeça. Continuei refletindo muito se o Brasil realmente deixou de ser o país dominante que foi até os anos 90 porque o futebol de rua e os campos de várzea não são mais presentes na formação desses jogadores.
Pesquisando sobre o assunto, descubro que os principais campeonatos juvenis disputados na França — principalmente em Paris — possuem enorme visibilidade no continente europei. Alguns desses campeonatos são disputados nos subúrbios da capital francesa, de onde saíram muitos dos principais jogadores da seleção francesa, campeão mundial em 2018 e considerada amplamente como a melhor seleção do mundo. Como se a França fosse hoje o que o Brasil foi no passado
Chegando nessa conclusão acerca do futebol francês, fui conversar com meu avô e ele disse exatamente o que constatei no parágrafo anterior: "a França ganhou a última Copa do Mundo porque possuem muitos craques amontoados, eles jogam de forma intuitiva. É a seleção que mais lembra os tempos áureos do futebol brasileiro. " Era uma confirmação de que o velho sabia — nem que seja um pouco — do que estava falando. Talvez o futuro do futebol profissional no Brasil dependa de certo ato: o resgate às origens do futebol de rua.
VOLEIBOL NA CIDADE
M U N I C I P I O D E B A R U E R I D E M O C R A T I Z A A M O D A L I D A D E
Por Glória dos Santos
O vôlei é um esporte que vem se popularizando desde o início dos anos 2000 quando as aulas de Educação Física brasileiras passaram a possuir um maior domínio de conhecimento sobre as ferramentas para ampliar a difusão do voleibol na sociedade. A busca por praticar uma modalidade nasce ou é inserida, principalmente no infantojuvenil, época escolar entre o PEB I e PEB II, e nessa questão, em especial, a maneira como as escolas e municípios abraçam seus talentos e futuros atletas, lutando pela causa de ascensão no esporte.
Estabelecendo como parâmetro na região Metropolitana de São Paulo, a cidade de Barueri desenvolve há mais de 20 anos um trabalho com a base do vôlei feminino do município. Adroaldo Sousa que atua com o voleibol há 30 anos, concursado há 23 anos na prefeitura, hoje coordenando a modalidade de Vôlei em Barueri e auxiliando o Sub-15 feminino, explica que não existe equipe adulta sem um bom desenvolvimento de base.
Por mais que as bases esportivas não sejam difundidas com tanta visibilidade como as demais categorias, é imprescindível que haja o conhecimento de que os atletas iniciam suas carreiras muito jovens para desenvolver suas habilidades e talentos dentro de um nicho, e que em grande parte contam com auxílios mínimos na jornada de virem a ser reconhecidos como profissionais no esporte, seja no futebol, atletismo, natação, basquete ou vôlei.
De acordo com Adroaldo, na categoria feminina do vôlei, a menina é inserida a partir dos 11 anos na realidade competitiva dentro da primeira categoria da federação, e é primordial selecionar muito bem. Em Barueri, a peneira começa com os professores de Educação Física nas escolas dentro das salas de aula onde busca-se os biotipos potenciais que compatibilizam em altura, idade para desenvolvimento e crescimento no processo e claro, o interesse em participar do esporte. Essas seleções chegam a reunir em média 400 meninas que se encaixam no biotipo desejado e, após, passam a ser avaliadas por capacidades técnicas demonstradas nos ginásios.
“Desde o princípio o objetivo é que aquela menina seja uma jogadora de voleibol. Todas são? Não! Mas aí vem a outra parte do projeto, aquelas que não são jogadoras, são inseridas dentro de um processo que vai ajudá-las muito na vida. Muitas conseguem bolsas de estudo, porque o voleibol não tem só um caminho, só um período... ele tem vários. ” Conta Adroaldo, enfatizando que em novembro do ano passado, foi realizado um levantamento e que 22 meninas iniciadas em Barueri de 2012 a 2022 estão em Universidades Norte Americanas com bolsas de estudo através do Vôlei. Além dessas, há também uma infinidade de garotas que foram jogar em clubes europeus e muitas outras jogando na superliga como atletas profissionais.
É importante demonstrar como essas oportunidades transformaram a realidade de meninas que, através do esporte alcançaram não apenas vivências únicas de forma social, como também conquistaram uma boa remuneração, em casos de atletas profissionais, que passaram a poder ajudar suas famílias. Quando salientamos que por mais que exista o amor pelo esporte, mas que a remuneração não deixa de ser fundamental no exercício de qualquer função, lembramos da ligação direta que há entre a motivação do profissional e no caso dos atletas, na qualidade em que irão se desenvolver.
A rotina de um esportista envolve diversos aspectos que requerem uma atenção em relação à saúde física, mental, adequação ao esporte, entre outros. Pensando em como essas meninas irão desenvolver o fortalecimento através da musculação, de consultas com nutricionistas, lidar com pressões externas e internas em acompanhamentos com psicólogos e possuírem o traje correto para a prática do esporte é primordial para formar a atleta. Como trata-se das equipes de base, conclui-se que o município é o órgão que deve promover o acesso a tais práticas.
Questionado sobre a necessidade da influência do município na ascensão de meninos e meninas no esporte, Adroaldo manifestou que é fundamental. “Sem esse empenho do poder público você não tem nada disso, você precisa de uma condição para poder trabalhar. Não basta ter pessoas abnegadas a fazer um trabalho, precisa de investimento. E isso foi uma das coisas que me trouxe pra cá (Barueri). ” E por que o investimento das bases advém do poder público e não é patrocinado pelas grandes marcas como na superliga, por exemplo? Nas palavras de Adroaldo, as empresas ou o mundo privado não tem como investir na base, porque é o processo contrário do alto rendimento, a visibilidade é muito pequena se comparada. As propagandas são essenciais, pois, o marketing é fundamental. Quem acompanha a base são os pais, amigos e familiares, escolas... que estão inseridos em um universo muito menor.
Mas dentro de tantos universos, é importante ressaltar a imagem da menina que está inserida no esporte. Falando sobre o vôlei, na quadra não é apenas desenvolvido um talento e suas técnicas, também se trabalha a autoestima de uma mulher quando refletimos que a altura é um fator determinante para manter-se no esporte e, inúmeras vezes este é o motivo de certa vergonha entre as meninas durante os anos escolares. Adroaldo conta que no primeiro contato com as meninas mais altas nas escolas, elas são, por muitas vezes, as que não gostam de educação física, que sentem vergonha de seus corpos por sofrerem bullying devido à altura... E a partir do momento em que são inseridas no universo esportivo, passam a se
impor de uma maneira física em que, anteriormente andavam curvadas e após o vôlei, erguem a cabeça ao caminhar nos lugares.
O investimento esportivo é nada mais e muito mais que investir em sonhos, sonhos de alguém que nem sabe o que sonhar ainda. É construir uma sociedade baseada no esforço multo, no dividir e ajudar o próximo todos os dias. É desvendar uma nova personalidade dentro de uma mesma pessoa que passa a se enxergar com olhos mais amáveis. O esporte desperta um comportamento sensitivo ao trabalho em equipe e os municípios como Barueri, que investem nos seus atletas, promovem o primeiro passo em garantir a coletividade municipal, para que adiante esses esportistas, jogadores que obtiveram o alcance de uma carreira profissional, unam municípios, estados e países em busca de um feito ainda maior. Formar atletas é também capacitar seres humanos e isso, é um dever de todos.