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Silêncio dos inocentes
Ajuíza Lou Ieng Ha ameaçou João Miguel Barros com proibição de fazer mais perguntas a testemunhas até ao fim do julgamento, depois de o advogado tentar provar que o seu cliente não tinha cometido o crime de associação criminosa. Segundo a TDM-Canal Macau, a magistrada considerou que ao questionar os investigadores do Comissariado Contra a Corrupção, o advogado desrespeitou o tribunal e a acusação do Ministério Público (MP).
O mais recente episódio em julgamentos com a participação de Lou Ieng Ha aconteceu na quinta-feira, quando João Miguel Barros tentou questionar uma investigadora do CCAC sobre a acusação de associação criminosa.
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A pergunta coloca em causa a acusação do MP. Durante as investigações aos ex-directores das Obras Públicas, o CCAC considerou não existirem provas para fundamentar uma acusação pelo crime de associação criminosa. Apesar das conclusões, o MP decidiu avançar com a acusação contra 18 dos 21 arguidos pelo crime de sociedade secreta em concurso com associação criminosa.
Nas sessões anteriores o assunto tinha causado polémica, porque a presidente do colectivo de juízes não quer que os investigadores do CCAC respondam a perguntas sobre o crime da associação criminosa. Lou Ieng Ha está ao lado do MP, no entendimento que os investigadores não têm de se pronunciar sobre a acusação do MP, principalmente no que diz respeito ao crime de associação criminosa.
Contra a inocência
Na quinta-feira, João Miguel Barros insistiu com a pergunta junto de uma das investigadoras do CCAC e foi ameaçado que seria proibido de fazer mais perguntas até ao final do julgamento.
Segundo a TDM-Canal Macau, Lou Ieng Ha avisou o defensor de Jaime Carion contra a tentativa de “passar a imagem de que não existe o crime de associação criminosa” e acusou-o de “desrespeitar o tribunal e o Ministério Público.”
A magistrada ameaçou ainda o advogado de ser proibido de fazer mais perguntas sobre o crime de associação criminosa. Na prática, esta ameaça significa que o causídico está impedido de defender o seu cliente junto das testemunhas que também foram arroladas pela defesa.
A acusação do crime de associação criminosa é uma das mais relevantes para o Ministério Público, uma vez que acarreta penas de prisão que podem ultrapassar os 10 anos.
Prática pouco habitual
Não é a primeira vez que Lou Ieng Ha ameaça advogados em tribunal, por não pretender que se pronunciem ou indiquem aspectos com os quais não concorda. Si- tuação semelhante aconteceu em Setembro do ano passado, durante o julgamento do caso Suncity, que terminou com a condenação de Alvin Chau a 18 anos de prisão.
Na altura, o advogado Pedro Leal tentava argumentar contra a admissão como prova de depoimentos de arguidos recolhidos pela polícia na fase de investigação. Lou Ieng Ha não gostou e disparou: “O tribunal já tomou uma decisão. Estou a avisá-lo pela última vez, se voltar a mostrar oposição outra vez [como hoje] vou bani-lo de falar neste julgamento a partir de agora”, ameaçou.
Motivo para queixa
O HM ouviu um jurista sobre a situação decorrida em pleno julgamento, para tentar perceber se há enquadramento legal que permita ameaçar os advogados com a proibição de inquirir testemunhas até ao final de um julgamento.
O jurista, que pediu para permanecer anónimo, considerou que a situação é “um abuso de poder”. “Claro que não é normal e é um abuso de poder. Se tais declarações ficaram gravadas podem ser alvo de procedimento disciplinar se for extraída certidão das mesmas a requerimento dos interessados”, foi explicado, ao HM. “Ou então no requerimento formulado mencionar tais factos para solicitar a extracção de certidão. Se houve recusa, há sempre a possibilidade de participação directa ao conselho [dos Magistrados Judiciais]”, foi acrescentado.
Em Setembro do ano passado, o HM contactou o Conselho dos Magistrados Judiciais para perceber quantas queixas tinham sido apresentadas contra a juíza Lou Ieng Ha. Contudo, o conselho presidido por Sam Hou Fai recusou responder, por considerar que a informação é confidencial. João Santos Filipe