Revista Gestão Pública PE nº #2

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#2 Recife, junho de 2013

ISSN 2317-2819

SAÚDE PÚBLICA Desafios e avanços

Museus Eles estão se reinventando

Erik Camarano

Presidente do Movimento Brasil Competitivo aponta revolução silenciosa na gestão

dívida

do bem

Sim, ela existe. Pode ajudar no orçamento doméstico

e funcionar como importante instrumento na alavancagem da administração pública. A receita? Saber que dinheiro bom nem sempre é o dinheiro fácil, investir bem e com estratégia.

Divulgação MBC

Isso vale para o gestor público e para você

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Pecado capital da dĂ­vida nem sempre faz mal ao bolso

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editorial

índice

S

im. A dívida do bem existe e a Revista Gestão Pública PE dedica a reportagem de capa desta edição a este tema curioso. Ouvimos especialistas e mergulhamos em experiências governamentais que mostram que é possível realizá-la sem susto. A “mágica” para que uma dívida do bem não se torne ruim é responsabilidade fiscal. Isso vale para todo mundo. Para uma família na hora de traçar o orçamento doméstico e para os governos. Também tratamos dos desafios e avanços que rondam a saúde pública no Brasil. Abordamos experiências que se multiplicam pelo país e aprofundamos a discussão com o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e com a pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz Lígia Giovanella. Fizemos uma viagem pelo universo dos museus para mostrar como eles estão se reinventando em busca da sustentabilidade, indicamos tendências na área de recursos humanos e apresentamos uma entrevista contundente com o presidente do Movimento Brasil Competitivo (MBV), o economista Erik Camarano, que aponta uma revolução silenciosa na gestão pública. Confira como ela está acontecendo e como você pode ser um ator importante nesta transformação.

Foto: divulgação MBC

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INOVAÇão

ENTREVISTA

Museus mais modernos e atraentes

Erik Camarano destaca avanços e gargalos na gestão

62 CINE Star Wars, a história da trilogia

Boa leitura! Foto: Daniela Nader

ISSN 2317-2819

expediente A Revista Gestão Pública PE é uma publicação do Governo de Pernambuco, por meio do Instituto Gestão, vinculado à Secretaria de Planejamento e Gestão – SEPLAG/PE 4

GOVERNO DO ESTADO DE PERNAMBUCO Governador Eduardo Henrique Accioly Campos Vice-Governador João Soares Lyra Neto Secretário de Planejamento e Gestão – SEPLAG Frederico Amancio

Realização Instituto Gestão PE/ SEDMG /SEPLAG Coordenação Geral Instituto Gestão Maurício Cruz Coordenação Geral do Projeto Elisandra Paiva Vânia Campos

Colaboração Canton Wu Daniel Oliveira Lilian Gomes Maíra Fischer Vivianne Câmara Conselho Editorial Frederico Amancio Maurício Cruz Edilberto Xavier

Vânia Campos Elisandra Paiva Iale Alves Conselho Consultivo Evaldo Costa Francisco Saboya Ricardo Dantas Produção Editorial Empresa Responsável Daniela Nader Fotografia e Editora ME


Foto: Claudio Fachel / Divulgação

14 Capa Caminhos para a dívida do bem

22 Especial Saúde: desafios e novas experiências

Foto: Daniela Nader

Jornalista responsável Iale Alves (DRT – 2874) Edição Catarina Lucrécia (DRT – 24330- 003034/91) Reportagens e textos Catarina Lucrécia Tatiana Nascimento

Fotos Daniela Nader Revisão Carolina Leão Projeto gráfico e ilustrações Christiano Mascaro Diagramação e infografia Sebba Cavalcante

Impressão Companhia Editora de Pernambuco - CEPE Tiragem da edição 700 exemplares

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CARTAs Entrevista Erik Camarano

ACONTECE Cursos e oportunidades

CAPA Dívida do bem

ESPECIAL Saúde pública: desafios e avanços

OPINIÃO Luiz Carlos Bresser-Pereira

INOVAÇÃO A reivenção dos museus

CONTA CERTA

Melhoria na qualidade de gastos na América Latina

CAPITAL HUMANO Gestão de desempenho

ESTRATÉGIA Cultura organizacional

CINE Star Wars

Acadêmicos da Gestão Aprendizagem e competitividade

humor Clériston

Cartas à Redação Devem ser encaminhadas para o Instituto de Gestão de Pernambuco (Rua da Aurora, 1377, Santo Amaro, CEP: 50040-090) ou por email revistagestaope@gmail.com

Contatos com a redação

As cartas podem ser editadas caso estejam em desacordo com o espaço da revista

revistagestaope@gmail.com (81) 3182.3826 (81) 3182.3827

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C A R T A S Reflexão

A Revista Gestão Pública é, sem dúvida, um excelente instrumento para contribuir com a modernização da gestão pública no nosso Estado. A sua proposta, de provocar reflexões e apresentar temas e experiências exitosas que sirvam de inspiração para os gestores públicos, faz parte do processo de aprendizado e amadurecimento profissional. É uma publicação voltada para o aperfeiçoamento, urgente e necessário, do perfil profissional do servidor público. Parabéns pela iniciativa!

Parabéns!

Esmeralda Moura Mestre em Gestão Pública (UFPE) Analista de projetos da Unidade de Economia, Estudos e Pesquisas da FIEPE

Amei a revista. Que cuidado. Que primor. Os textos estão ótimos. As matérias bem pautadas. Estou tão orgulhosa. PARABÉNS!!!!! Valeu à pena esperar por essa “filha” de todos e todas da SEPLAG. Está fantástica!!!!! Não vejo a hora de receber o segundo número.

Debates

Virginia Lacerda Secretária Executiva de Planejamento e Gestão Prefeitura de Ipojuca – PE

Marcos Primo Prof. Operações e Gestão de Cadeias de Suprimentos Departamento de Ciências Administrativas – DCA Programa de Pós-Graduação em Administração – PROPAD Universidade Federal de Pernambuco – UFPE

Sou presidente do diretório acadêmico da graduação em Ciência Política da UFPE. Agradeço a atenção, o envio da Revista, bem como o link da versão em PDF. Estaremos divulgando o link junto aos nossos contatos e alunos.

Aprendizado

Raquel Lins Presidente do Diretório Acadêmico da Graduação em Ciência Política Universidade Federal de Pernambuco – UFPE

Gostaria de parabenizá-los pelo nível da publicação que me foi enviada. Aproveito para sugerir a possibilidade de oportunidades para inserção das universidades públicas nos debates dos números seguintes.

Sou um estudante de Ciência Política com ênfase em Relações Internacionais da Universidade Federal de Pernambuco e quando soube da publicação da revista fiquei muito feliz, por saber que estamos investindo na produção de conhecimento sobre a gestão pública. Vou acompanhá-la melhor e compreender mais sabiamente os assuntos de economia, política, tudo sobre o nosso estado e nosso país. Bhreno Henrique Ribeiro Vieira Estudante de Ciência Política Vicência-PE 6

Divulgação

Exemplares

Recebi exemplares da Revista e aproveito para parabenizar vocês. A revista é muito bonita, os temas são bem interessantes, parabéns e sucesso nesse trabalho! Larissa Orro Coordenadoria de Trabalho e Renda Fundação do Trabalho de Mato Grosso do Sul Campo Grande – Mato Grosso do Sul


entrevista

“revolução silenciosa na gestão ” Há uma

ERIK CAMARANO Presidente do MBC

Fotos: Divulgacao MBC

Quando a missão é implantar em um estado, uma grande cidade ou em qualquer município do país um projeto de gestão pública moderno e eficiente, o economista e presidente do Movimento Brasil Competitivo (MBC), Erik Camarano, não faz distinção. Aponta para três frentes: liderança, conhecimento técnico e método de gestão. Não por acaso. Elas estão muito bem afinadas e uma não caminha bem se as outras duas não seguirem no mesmo ritmo. Camarano dá este e outros diagnósticos nesta entrevista. Alguns positivos, outros nem tanto. O que há de bom? O Brasil, de fato, está mais competitivo, mais moderno e há, na avaliação dele, uma revolução silenciosa acontecendo na gestão pública impulsionada pela ética, pela transparência e pelo trabalho com foco em resultados. Os exemplos já são muitos e se multiplicam em áreas estratégicas, como saúde e segurança, mas, ao mesmo tempo em que já existem boas e importantes experiências para contar, o país ainda não fala a mesma língua com relação aos avanços na administração pública por conta de entraves estruturais e das desigualdades. E esse é só um pedaço da parte complicada. O MBC, criado em 2001, é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e tem atuado para tentar equilibrar mais o jogo entre avanços e gargalos, focado na melhoria da qualidade de vida do cidadão. Erik Camarano fala, aqui, deste e de outros desafios.

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O Movimento Brasil Competitivo surgiu com um objetivo ousado, que foi impulsionar a competitividade do país. Podemos dizer que o país avançou ou ainda existem muitos gargalos? Avançamos muito. Dos últimos sete, oito anos para cá, o relatório de competitividade que a gente faz, em parceria com o Fórum Econômico Mundial, tem demonstrado que o Brasil melhora a cada ano a nota de competitividade. Nossa posição no ranking de competitividade global também tem melhorado sistematicamente. O que é possível dizer é que, embora haja melhoria, a agenda de competitividade do país não mudou. Continuamos com os mesmos desafios. É preciso mais velocidade. Se a gente for pensar onde está a agenda hoje, ela está concentrada em educação, infraestrutura, a parte tributária, a parte trabalhista - precisamos modernizar nossa legislação - e, por 8

fim, temos que melhorar a questão da previdência. A maior parte dessa agenda, ou quase toda, cabe muito ao setor público. E, por isso, nossa atuação está concentrada em aproveitar as experiências de gestão das empresas, de alguns governos que vieram implantando ferramentas de gestão, para que seja possível generalizar o uso dessas ferramentas na área pública e aumentar a produtividade do setor público brasileiro em todos os níveis. Dessas cinco áreas, em qual delas o senhor considera que estamos mais travados? Não dá para priorizar nenhuma das cinco em detrimento da outra. É quase como uma estratégia de guerra. Uma ação focada nessas cinco frentes. Por quê? Porque não tem nenhuma ordem necessária para que a gente melhore uma delas antes de melhorar a outra. Algumas dessas questões envol-

vem efeitos de longo prazo, como é o caso da educação, que precisa melhorar o desempenho estudantil. Conseguimos melhorar bastante na questão da inclusão dos alunos na escola, embora ainda tenha um percentual grande de estudantes em idade escolar fora da sala de aula, mas o déficit educacional foi bastante diminuído nos últimos anos. Na infraestrutura, a gente também precisa avançar rapidamente com investimentos. Estamos estimando investimentos da ordem de R$ 560 bilhões a R$ 600 bilhões que deveriam ser feitos nos próximos cinco anos. Esse trabalho exigirá um enorme esforço de articulação entre o setor público e o setor privado. Não tem solução para isso só com recursos do governo nem só com recursos de empresas. Vai ser necessário avançar muito em uma pauta agressiva de parcerias, de concessões para que


Muito dificilmente o governo vai fazer transparência se não tiver foco em resultado. Ele não vai querer mostrar a janela suja”

seja possível colocar em campo um rolo de investimentos dessa ordem. Esse é o tamanho do gargalo de logística que a gente tem hoje no país. A questão tributária e trabalhista você poderia resolver mais rápido. Afinal de contas, investimento leva tempo - construir estradas, ferrovias etc. Na educação também. O impacto é mais de longo prazo. As medidas tributárias, trabalhistas e a questão da previdência são medidas que poderiam avançar mais rapidamente, e o fato de elas não avançarem mostra que ainda não temos uma agenda de consenso para o país. Não temos uma visão consensual sobre qual a nossa visão, o nosso sonho de longo prazo. O Brasil Competitivo sustenta três pilares: ética, foco em resultado e transparência. O que é mais difícil

levar para a gestão pública? Ou, aos poucos, está sendo possível implementá-los? Acho que está havendo um movimento muito positivo no país, hoje, que eu chamo de revolução silenciosa na gestão. Que é um avanço nestas três frentes, nas várias esferas de governo. Acho que esses três temas (ética, transparência e foco em resultados) estão muito correlacionados. Muito dificilmente o governo vai fazer transparência se não tiver foco em resultado. Ele não vai querer mostrar a janela suja. Ao mesmo tempo, para ter transparência e foco em resultado é preciso ter comportamento ético. Desvio de recursos, corrupção, práticas não republicanas vêm à tona muito rapidamente. Felizmente para nós contribuintes. Nós temos uma nova geração de políticos

que perceberam que as técnicas de gestão dão resultados. Elas melhoram a vida do cidadão e, ao fazer isso, deixam esses políticos com mais chances de reeleição. Esse é um fator de incentivo muito importante para quem está no cargo eletivo. Muitos governadores e prefeitos perceberam isso e estão trabalhando fortemente pela gestão. O que é muito bom para todo mundo. É um jogo de ganha-ganha. A pressão popular é fundamental? Imprensa livre e pressão popular. A gente tem que ter esses dois movimentos para manter todo mundo na mira. As pessoas têm que ser cobradas. Responsabilizadas por aquilo que lhes cabe fazer com eficiência, com transparência, com boa gestão dos recursos públicos. Afinal, o dinheiro é nosso. 9


Já avançamos muito neste aspecto. Coisas que não se viam no Brasil hoje acontecem. Redução de regalias, punições... Sem dúvidas. Temos exemplos concretos. Existem alguns órgãos da administração pública que têm total transparência nos seus processos. Tem, por exemplo, um caso interessante no Grupo Hospitalar Conceição. O único hospital administrado pelo governo federal no Rio Grande do Sul. Eles disponibilizam compra de medicamento, licitações para obras, para equipamentos do hospital. Está tudo dis-

bilidade sobre a gestão pública focada em resultado têm que exercer na sua esfera de influência a sua capacidade de liderança. Liderar suas equipes, liderar os processos e fazer a transformação acontecer.

oitenta profissionais todo ano, que entram na carreira de empreendedor de políticas públicas, de gestão governamental. Eles são alocados em diversas áreas do governo, nas áreas fins. São jovens extremamente qualificados, eles passaram por uma universidade, fizeram quatro anos de curso focado na gestão pública e trabalham com remuneração variável. Essa é uma solução extremamente engenhosa e permite que sempre existam quadros novos entrando no Estado. Isso é importante porque a gente já viu várias situações em que as vezes passou dez, 15 anos sem ter concurso para a Secretaria da Fazenda naquele lugar e ai tem um déficit geracional muito grande. Você perde a cultura institucional. É importante, então, que o Governo possa ter mecanismos de azeitamento da máquina pública. Sempre renovando concursos, trazendo gente nova, podendo fazer com que os mais velhos transmitam a cultura e boas práticas para quem está entrando. Esse processo está sendo resolvido de forma cada vez profissional.E essa experiência da escola do Governo de Minas foi reproduzida em alguns outros locais do país com ótimos resultados.

O senhor falou em uma nova geração de políticos. O senhor enxerga também uma nova geração de gestores públicos e de funcionários públicos? A gente tem no Brasil ainda poucas, mas algumas experiências bem sucedidas de formação continuada de profissionais do setor público. Cito, por exemplo, a escola de Governo de Minas Gerais. Eles formam duas turmas. São

A Revista Gestão tratou na edição anterior da dificuldade dos governos de segurar os concurseiros. Transportar para governos práticas da iniciativa privada é um caminho para ajudar a desatar esse nó? A estrutura de carreiras do setor público é uma colcha de retalhos sem nenhuma lógica de produtividade. Infelizmente, em vários casos, especialmente por conta do

não costuma participar de projetos onde não tem um claro envolvimento da liderança. Essa liderança tem que ser exercida em todos os níveis. Se o projeto é do governo do estado, o governador tem que estar empenhado. Esse negócio tem que ocupar tempo na agenda dele. Terá que dedicar algumas horas por semana para esse projeto. Caso contrário, não funciona. Isso se desdobra em todos os níveis. Na Secretaria de Planejamento, de cada departamento, de cada superintendência, cada gerente de área. Essas pessoas que têm responsa-

A estrutura de carreiras do setor público é uma colcha de retalhos sem nenhuma lógica de produtividade. Especialmente, por conta do longo período que convivemos com inflação alta”

ponível no site do GHC. O cidadão entra e acompanha os processos em tempo real. Sabe quem está parado, a quantos dias, sabe se a tarefa está atrasada e porque. Então, não tem a possibilidade daquele funcionário que tem o comportamento pouco ético criar problema para depois vender solução. A formação de lideranças, outro foco do Brasil Competitivo, é importante dentro deste processo? A gente trabalha com um tripé conceitual que é o seguinte: tem que haver três coisas para o projeto dar certo. Liderança, conhecimento técnico e o método de gestão, que é a parte que a gente traz. A gente 10


longo período em que convivemos com inflação alta, perderam-se os mecanismos de se trabalhar a progressão na carreira de uma forma racional, mais vinculada ao desempenho na produção. O que acontece hoje é que os planos de promoção de progressão funcional são muito mais parecidos com uma colcha de retalhos porque foram construídos para atender uma demanda de greves, movimentos e pressões salariais que houve em diversas secretarias, departamentos, carreiras ao longo do tempo. Então quando você vai estudar carreiras de uma área qualquer, seja na prefeitura de médio porte ou governo estadual, as pessoas que entendem do assunto dizem que você precisa ficar uns dois anos para perceber o cenário de carreiras daquele governo. É importante resolver essa questão de formação continuada de mão de obra na área do governo e uma das alternativas que a gente tem apostado muito é essa gestão de competências. O senhor acha que a máquina pública do Brasil ainda é muito arcaica ou avançou? Ela avançou e ela é muito arcaica. As duas coisas são verdade. O Brasil é um país muito heterogêneo. Você tem, em alguns locais, práticas que estão alinhadas com referências mundiais e, ao mesmo tempo, tem um número de municípios com grandes carências na gestão. Cidades com 200 mil, 300 mil habitantes têm carências de gestão absolutas. Você tem , por exemplo, quatro, cinco sistemas de folha de pagamento, não tem uma base de dados consistente sobre as informações dos servidores, não há um processamento

adequado de informações para a área de segurança pública ou da educação. Todo o procedimento de gestão acaba sendo muito prejudicado. O desafio para a modernização do setor público e gigantesco no país. Ao mesmo tempo, a gente tem alguns lugares que estão avançando, investindo com práticas muito modernas de gestão. Quais os modelos que já existem e que poderiam ser replicados no país? Temos muitos casos. Depende muito da área. Por exemplo, se eu pensar em gestão orçamentária eu citaria o caso da Prefeitura de Porto Alegre, que está desde 2005 trabalhando com orçamento por programas. Lá, eles têm um orçamento já com esse desenho

responsáveis por ações em cada projeto. Isso gera uma estrutura bastante alinhada entre objetivos e metas. Também temos o que está sendo feito na segurança pública nos estados de Pernambuco, no Rio de Janeiro com as UPPS ( Unidades de Polícia Pacificadora), pela Prefeitura do Rio com o choque de ordem. Você tem ainda outros exemplos muitos bons de gestão de ponta na área de segurança. No Rio de Janeiro, a prefeitura fez outra iniciativa que é o centro de comando e controle para coordenar previsões de enchentes, acidentes de trânsito, mobilidade urbana etc. É uma solução muito sofisticada, com redesenho de processo, ferramenta de TI que foi implantada para monitoramento com informações em

As pessoas têm que ser cobradas por aquilo que lheS cabe fazer com eficiência e boa gestão dos recursos públicos. Afinal, o dinheiro é nosso”

baseado em programas. Que são transversais. Também têm uma estrutura profissional que acompanha a gestão desses programas. Todos os projetos prioritários da prefeitura são agrupados em 13 grandes programas de gestão. Cada programa tem um gerente. Cada programa se desdobra em projetos. Então, imagine, tem uma secretaria responsável, 13 gestores de programas, 250 gestores de projetos e mais uns 750 servidores

tempo real. É um centro realmente comparado aos melhores do mundo nessa área. Temos avanços pontuais muito importantes. Na área de gestão de Educação, por exemplo, Pernambuco vem tendo um avanço importante. Goiás e Rio de Janeiro melhoraram enormemente em dois anos. São vários exemplos de que é possível, com uma boa prática de gestão, gerar resultados de impacto mesmo em curto prazo. 11


acontece Uruguai promove encontro internacional

Monografia

Se você pretende ir ao Uruguai, mais precisamente de 29 de outubro a 01 de novembro, e tem afinidade com a administração pública, pode aproveitar a viagem e participar do 18º Congresso Internacional do Centro Latino-Americano da Administração para o Desenvolvimento (CLAD). O evento vai tratar da reforma do estado e da administração pública e será realizado no Hotel Radisson, em Montevidéu. A organização é do Governo do Uruguai e do Centro Latinoamericano. Acesse o link e fique por dentro de todos os detalhes.

A Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento lança a VI edição do Prêmio SOF de Monografias. A ideia do concurso é estimular estudos e pesquisas sobre dois temas que estão movimentando o cenário da administração pública no país: “Qualidade do Gasto Público e Aperfeiçoamento do Orçamento Público”. Se você ficou interessado, anote aí. As inscrições ficam abertas até o dia 11 de novembro. O prêmio será, respectivamente, de R$ 20 mil para o primeiro colocado, de R$ 10 mil para o segundo e de R$ 5 mil para o terceiro. Você também pode conferir todo o regulamento pelo site www.esaf.fazenda.gov.br

www.clad.org/congreso-clad

Unicamp terá seminário em setembro Anote no calendário. De 25 a 27 de setembro, a Universidade de Campinas (Unicamp - SP) acontece, no auditório da Faculdade de Ciências Médicas, o V Seminário Nacional da Rede Brasileira de Monitoramento e Avaliação, que vai traçar um retrato de experiências do setor na última década. A organização está sob a responsabilidade do Comitê Gestor da Rede Brasileira M&A. O prazo para envio das propostas já terminou. Aconteceu no período de 15 de abril a 3 de maio. Mais informações: www.redebrasileirademea.ning.com/events/v-seminario-da-rede-brasileira-de-monitoramento-e-avaliacao

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leituraemfoco Produção científica

Dicas e modelo

A Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (Anpad) realiza, de 25 a 27 de setembro, no Rio de Janeiro, o seu 37º encontro. Ele será estruturado em 11 divisões acadêmicas, cada uma delas com as suas especificações. As divisões acadêmicas são permanentes, enquanto os temas de interesse são dinâmicos e renováveis. O objetivo é estimular a produção científica em diversas linhas de pesquisa. Os melhores trabalhos avaliados receberão indicação para serem publicados em uma das revistas da Anpad. O prazo para entrega de propostas já encerrou. www.anpad.org.br/evento.phd?cod_evento_edição=68

Congresso de gestão

Cursos e oportunidades

Mais uma boa dica para você. A Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-Nacional) promove de 19 a 22 de agosto, no Transamerica Expo Center, em São Paulo, a 3ª edição do Congresso Nacional sobre Gestão de Pessoas – CONAR ABRH 2013. O tema central está definido: “Reinventar a Gestão. Uma Construção Coletiva”. A proposta dos organizadores é mostrar como o mundo se transformou nos últimos anos, como os modelos de gestão devem evoluir para as organizações alcançarem metas e se adequarem ao mercado e quem é o RH nesse contexto. Já foram confirmados os primeiros nomes para as palestras. Estarão presentes o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, André Rodrigues Cano (BRADESCO), Brian Welle (GOOGLE), Eduardo Sirotsky Melzer (RBS), Genésio Lemos (Odebrecht) e JayJamrong (Institute for Corporate Productivity). http://www.conarh.com.br/

O Banco Mundial (The World Bank) terá dois cursos interessantes nos meses de setembro e novembro. O primeiro vai tratar do chamado e-learning. Serão examinados os desafios e oportunidades para o desenvolvimento de economias associados à negociação em um cenário de evolução rápida e global. Oferecerá quadros analíticos e provas práticas para identificar as opções estratégicas para responder a padrões mais elevados relacionados a setores como agricultura e comércio. O outro curso, em novembro, vai focar planejamento, finanças e planejamento do uso sustentável do solo urbano. Um tema em evidência. Os participantes terão, por exemplo, uma compreensão funcional e integrada da dinâmica do uso da terra urbana. Confirma outras oportunidades. http://www.worldbank.org

Pacto pela Vida ganha prêmio da ONU O Pacto pela Vida – programa de segurança pública do Governo de Pernambuco – ganhou reconhecimento internacional. A ONU premiou o Pacto pela Vida na categoria “Melhoria na Entrega de Serviços Públicos”, do Prêmio das Nações Unidas de Serviço Público – UNPSA, realizado anualmente. O Pacto pela Vida foi uma das políticas públicas de todo o mundo premiadas no ano de 2013, nas diversas categorias do UNPSA. Desde que o Prêmio foi instituído, em 2003, é a primeira vez que um estado brasileiro é premiado em dois anos consecutivos. O Rio Grande do Sul também foi premiado pela promoção da participação no processo de decisão da política pública através de mecanismos inovadores. A iniciativa apresentada pelo governo foi o Sistema Estadual de Participação Popular e Cidadã. Em 2012, práticas em gestão pública do Governo de Pernambuco foram agraciadas em duas categorias distintas: os Seminários Todos por Pernambuco e o Chapéu de Palha Mulher. A premiação será durante o Fórum 2013 das Nações Unidas para o Serviço Público, que será realizado entre 24 e 27 de junho deste ano no Oriente Médio.

O livro de Haroldo Amaral, editado em 2013, é uma boa pedida para quem pretende mergulhar no universo Business Process Management (BPM), Gerenciamento de Processo de Negócios. O foco são as organizações localizadas no Recife. O autor apresenta um resumo detalhado e preciso de perspectivas sugeridas para compor um modelo de governança corporativa. E aí as informações valem tanto para profissionais que têm como alvo o setor público quanto o setor privado. Amaral ainda relaciona 12 dicas importantes para os interessados em atuar como consultor em BPM. Vale conferir. Edição: 1 Editora: Livro Rápido (PE) Ano:2013 Autor: Haroldo Amaral

Gestão de resultados A experiência acadêmica levada para a vida prática. O livro, último projeto coordenado pelo professor da Universidade Federal de Pernambuco Francisco Ribeiro Filho, que faleceu em 2011, traz uma coletânea de artigos sobre a implantação da gestão em resultados como prática adotada nas organizações públicas. Os autores selecionados têm ampla experiência acadêmica e prática na gestão pública. Os temas são variados. Transitam desde a gestão de pessoas, passando pela contabilidade pública até a inovação no setor público. Edição: 1 Editora: Atlas (SP) Ano: 2012 Autores: Diversos

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capa Foto: Daniela Nader

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OBRAS Porto do Recife passa por intervençþes estruturais dentro do projeto Porto Novo

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Rio Grande do Sul Renegociação do Plano de Ajuste Fiscal com o Ministério da Fazenda garante ampliação da capacidade de endividamento

Foto: Claudio Fachel/ Divulgação

Entre os significados para a palavra “dívida” no dicionário estão “culpa” e “pecado”. Algo sujo de se ter ou fazer. Mas ao contrário do que possa parecer, nem toda dívida é ruim. Existem as boas também. Basta pensar em uma família que faz um financiamento para conseguir comprar a casa própria ou bancar o intercâmbio do filho no exterior. As dívidas, tanto no primeiro quanto no segundo caso, têm como objetivo melhorar a qualidade de vida daquelas pessoas no futuro. Um teto para chamar de seu e das futuras gerações. Uma experiência internacional que pode contar pontos preciosos na futura carreira de um jovem. Com um estado funciona da mesma maneira. Dívidas boas, feitas com estratégia, podem significar mais desenvolvimento. Ou um desenvolvimento muito mais rápido e contínuo. Claro que não é tão simples quanto comprar a casa própria. Mas é por aí, confirma Luciana Pimentel, sócia da consultoria 16

Planus e consultora do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Segundo ela, quando o estado deseja atrair investimentos para uma região, o mais sensato pode ser optar por um financiamento – com responsabilidade fiscal – para melhorar a infraestrutura do local.

Barreiras na legislação podem evitar dívida ruim

“Também é possível oferecer uma tecnologia muito boa para atrair os interessados. É melhor do que, por exemplo, reduzir impostos de qualquer maneira e começar uma guerra fiscal”. Luciana fala em “responsabilidade”. Parece um tanto óbvio, mas esta palavra mui-

tas vezes é esquecida por parte das famílias que se endividam como se não houvesse amanhã, tornando uma dívida potencialmente boa em ruim. Na organização pública, durante anos, contrair empréstimos era mais fácil. Deixar de pagá-los também. Na década de 1990, era comum que os governadores pressionassem os senadores de suas bancadas para conseguir rolar as dívidas. Era o Senado quem legislava sobre a matéria. Então veio a Resolução nº 78/98. Ela determinava que o Banco Central deveria emitir um parecer para autorizar o estado a rolar o débito ou não. Foi um freio na farra do endividamento. E o passo inicial da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de 2000. “Não há nada de negativo em se endividar para fazer investimentos. O que tem de negativo é se endividar em excesso. A LRF foi um marco para o setor público”, afirma Edilberto Xavier, secretário executivo de Planejamento, Orçamento


Foto: Claudio Fachel/ Divulgação

e Captação de recursos da Secretaria de Planejamento e Gestão de Pernambuco. Para fazer o ajuste fiscal, a legislação criou uma série de limites para impedir que o poder público formasse dívida ruim. O primeiro parâmetro é o chamado estoque da dívida. Existe um estoque máximo de contratos de financiamentos que um estado pode ter. Ele equivale a duas vezes o valor da receita corrente líquida (impostos, repasses) do ano em que o financiamento é contratado. Um estado com uma receita corrente líquida de R$ 15 bilhões pode contrair, portanto, uma dívida de até R$ 30 bilhões. Se esse limite for transportado para a vida cotidiana, um trabalhador que ganha R$ 5 mil por mês (R$ 60 mil por ano) só poderia tomar um empréstimo de R$ 120 mil. Ficaria meio difícil de financiar a casa própria. “Isso mostra que a margem de endividamento para o poder público é bem mais conservadora, o que torna bastante segura qualquer

estratégia de investimentos no setor público calcada em captação de recursos através de operações de crédito”, destaca Xavier. Outro ponto que impede o endividamento excessivo é a Resolução nº 43, do Senado Federal. Apesar de poder ter um débito equivalente a duas vezes a receita corrente líquida anual, o estado só pode comprometer, no máximo, 11,5% do total de uma receita corrente líquida anual com o pagamento da dívida. Transportada para a vida cotidiana, esta seria a margem consignável do empréstimo. Tomando o mesmo exemplo do estado com receita de R$ 15 bilhões, a margem consignável seria de R$ 1,72 bilhão. Em um primeiro momento pode parecer difícil de entender. Mas esta é a salvaguarda para que nenhum governante gastador compulsivo resolva comprometer de uma só vez todo o estoque da dívida. O terceiro ponto é o limite da entrada do dinheiro do empréstimo contraído para cada ano: 16% da receita corrente

líquida anual. Se passar disso, os recursos devem ser parcelados. A Secretaria do Tesouro Nacional (STN) analisa se os estados que estão negociando empréstimos com organizações como o BID e o Bird (Banco Mundial) estão cumprindo as regras. Se não estiverem,

Financiamento captado com estratégia ajuda o desenvolvimento os financiamentos não são aprovados. “A lei brasileira é bem avançada e vem sendo razoavelmente cumprida. Tem o respeito de todos os poderes. É reconhecida internacionalmente. Não ficou só no papel”, destaca a consultora Luciana Pimentel. E lembra que não importa se o estado está pedindo di17


nheiro para construir uma estrada, melhorar a mobilidade ou investir em educação. A situação fiscal será analisada de acordo com os parâmetros. São eles que atestarão a capacidade de endividamento de quem pretende contrair o empréstimo. A Lei de Responsabilidade Fiscal é um guia e a STN é o “analista de crédito” que indica para o financiador se aquele é um “bom devedor”. “Quem tem responsabilidade consegue trabalhar a longo prazo”, reforça a consultora.

Tipos de empréstimo

Os que seguem as regras têm à disposição basicamente três tipos de financiamento. O primeiro é o tradicional, aquele em que o dinheiro é captado para financiar empreendimentos específicos. Pode ser ponte, estrada, hospital. É basicamente como se fosse o empréstimo que uma pessoa tira para comprar um carro zero. O segundo é o chamado financiamento misto. Apesar de ser voltado para um investimento ou para um conjunto específico de investimentos, o tomador se compromete a atingir um conjunto de indicadores de desempenho. Já o terceiro começou a ser adotado não faz muito tempo no país. É baseado exclusivamente em indicadores de desempenho. O governo recebe o dinheiro e escolhe onde quer aplicá-lo. O organismo que empresta está mais interessado em resultados do que nos meios para atingi-los e reconhece que o tomador tem capacidade institucional para viabilizar uma estratégia, sem necessidade de definir antecipadamente qual empreendimento o recurso financia. 18

“Nesse tipo de empréstimo, chamado de financiamento baseado em políticas, o estado se compromete em avançar em determinadas políticas públicas para receber um crédito que vai investir. Pode ser um compromisso de melhorar a política fiscal e o dinheiro pode ir para obras de mobilidade urbana. Eu não tenho de pegar o dinheiro e aplicar na área fiscal. Não tem de ser vinculado”, explica Luciana Pimentel. Basica-

dos busquem esta modalidade de financiamento. Em Pernambuco, o dinheiro dos empréstimos tem ido para investimentos nas 12 áreas do mapa estratégico estabelecido pelo governo. Tem recurso que vai para infraestrutura hídrica. Outra parte vai para desenvolvimento de arranjos produtivos locais. A construção de estradas não fica de fora, assim como as ações de mobilidade urbana e a infraestrutura de Suape. Educação, saúde e segurança são

Foto: Daniela Nader

“Não há nada demais em se endividar para investir” Edilberto Xavier, Secretário Executivo de Planejamento, Orçamento e Captação da Seplag/ PE

mente é um cheque especial que os organismos financiadores oferecem aos estados. Mas somente aqueles com a máquina mais azeitada conseguem pegá-lo. “Um estado que não tem hábito de trabalhar com indicadores, metas e resultados vai ter dificuldade”, afirma a consultora do BID. Para ela, a tendência é que mais esta-

as três áreas prioritárias. “O recurso captado junto aos bancos de fomento é fundamental para acelerar a capacidade de investimento do poder público. O estado de Pernambuco tem conseguido gerar excedente de caixa para investir com recursos próprios, mas não teria sido capaz de investir R$ 11,4 bilhões de 2007 a 2012 com o pró-


prio caixa. Sem uma estratégia de captação de recursos contundente, não existiriam a Adutora de Pirapama, a Estrada da Batalha, a Arena da Copa ou mesmo as UPAs e Hospitais Metropolitanos, além de um sem numero de outras obras em todo o território do estado”, conta Edilberto Xavier. No ano passado, o governo estadual contratou uma operação de R$ 940 milhões com o Banco Mundial. De acordo com o secretário

de infraestrutura para a implantação da fábrica da montadora italiana Fiat foram alguns dos destinos do dinheiro do empréstimo do Bird. Em troca do dinheiro, o governo assumiu uma série compromissos. O principal foi na área da educação. Garantiu que vai melhorar a qualidade do ensino oferecido. E não dá nem para tentar enganar o Bird. A qualidade do ensino no país é medida através do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).

do Programa de Consolidação do Equilíbrio Fiscal para Desenvolvimento do Estado da Bahia (PROCONFIS). Segundo o assessor técnico da Secretaria da Fazenda, Augusto Monteiro, coordenador do projeto, os recursos evitaram o comprometimento da capacidade de investimento do estado depois de uma perda de receitas de cerca de R$ 1 bilhão por conta da crise financeira internacional de 2008 e 2009. O desempenho foi tão satis-

Fonte: Balanços gerais dos estados Relatórios resumidos de execução orçamentária dos estados, 6º bimestre de 2012

executivo, o dinheiro, que já chegou, foi aplicado em quase todas as metas prioritárias. Empreendimentos habitacionais, a Radial da Copa (estrada de acesso à Arena Pernambuco), Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), o Cais do Sertão Luiz Gonzaga (museu sobre o Rei do Baião que está sendo construído no Porto do Recife) e obras

O estado também tem um financiamento do mesmo tipo com o BID. A Bahia, primeiro estado a ter um financiamento baseado em política junto ao BID, em 2009, usou os US$ 407 milhões (cerca de R$ 800 milhões) para investimentos estruturantes previstos no Plano Plurianual (PPA) 2008-2011. O dinheiro entrou nos cofres dentro

fatório que um novo financiamento foi feito com o BID. O PROCONFIS II foi contratado em dezembro do ano passado. O empréstimo é de US$ 600 milhões (R$ 1,2 bilhão). Entre os investimentos previstos estão obras de mobilidade urbana e infraestrutura portuária turística, consideradas essenciais para a Copa do 19


Mundo de 2014. Os financiamentos tura de transportes, acessos aos bilhões em investimentos privados preveem em troca que sejam cum- municípios, apoio à modernização fechados. É com isso que vamos pridas várias metas de aperfei- da produção rural, qualificação da enfrentar a crise”, afirma o secreçoamento dos mecanismos e ins- segurança pública. Mais R$ 1 bi- tário. Segundo ele, o governo pediu trumentos de gestão fiscal. “Isso lhão foi financiado junto ao Banco aos bancos para financiar várias ações, apesar do grande volume de certamente tem contribuído para Mundial. Este empréstimo do Bird en- dívida. Como convencimento, aprea expansão das receitas públicas”, afirma Monteiro. Na Bahia, espera- globou outras áreas também, como sentou indicadores de crescimento -se um aumento na arrecadação de a modernização da gestão patrimo- da arrecadação. “Eram áreas que R$ 14,2 bilhões, em 2011, para R$ nial e do planejamento, projetos de não recebiam ações. Na área de inovação tecnológica, 18,4 bilhões em 2014. aumentamos em 50% Para o assessor técFoto: Daniela Nader os investimentos. A nico da Sefaz, o finannova economia presciamento baseado em supõe inovação.” política, além de posEdilberto Xavier, sibilitar uma maior que não tem medo flexibilidade e velodas dívidas (boas), cidade na aplicação espera que o governo dos recursos, permide Pernambuco conte um apoio direto ao siga mais financiaaperfeiçoamento das mentos para tocar os políticas públicas e projetos. “Numa ecoserviços sociais à ponomia que está retopulação. mando sua capacidaJá o Rio Grande de de empreender, o do Sul aproveitou a papel do setor públirenegociação do Placo na oferta de infrano de Ajuste Fiscal estrutura e serviços (PAF) junto ao Minispúblicos de qualidade tério da Fazenda para é fundamental. Com ampliar a capacidade estratégia bem dede endividamento. De finida e capacidade acordo com o secregerencial, é possível tário de Planejamentransformar capato, Gestão e Particicidade de endividapação Cidadã, João “Quando o estado deseja atrair investimento em potencial Motta, o aumento foi mentos para uma região, o mais sensato de crescimento e de R$ 5 bilhões. “Em pode ser optar por um financiamento” reverter o estado de cima desse espaço, Luciana Pimentel é consultora do BID ânimo da economia”, contraímos alguns afirma. Luciana Piempréstimos para mentel lembra que viabilizar os investimentos, principalmente no Progra- meio ambiente e a qualificação da eventos como a Copa do Mundo ma Retomada do Desenvolvimento gestão das escolas. “Temos de in- acabam. Mas a população vai usar (PROREDES).” O primeiro foi o em- vestir na economia do estado, que as obras que foram feitas para mepréstimo de R$ 1 bilhão com o BN- é forte. Temos de induzir o investi- lhorar a mobilidade urbana para DES. Entrou dinheiro para inovação mento e não o contrário. Nos dois sempre. Este é só um exemplo do tecnológica, melhoria e infraestru- últimos anos, temos mais de R$ 20 tal jogo do ganha-ganha. 20


Europa corta na carne

Foto: Tatiana Nascimento

Enquanto uns buscam mais crédito, outros precisam cortar na carne. Ou “desalavancar”. Este verbo feio anda sendo praticado (a duras penas) na Europa em crise. É exatamente o oposto do que vêm fazendo os estados brasileiros para investir mais. Ao invés de contratar empréstimos, os países correm para se livrar das dívidas. Em 2012, os 27 países da União Europeia somaram uma dívida de 11 trilhões de euros. Esse valor equivale a 90,6% do Produto Interno Bruto (PIB) da região. O Tratado de Maastricht, acordo que estabelece os padrões mínimos de desempenho dos membros da União Europeia, autoriza dívidas

de até 60% do PIB. A dor de cabeça dos governos é que, mesmo com as medidas de austeridade adotadas, a dívida subiu 5,5% entre 2011 e 2012. O relatório divulgado pelo Escritório Estatístico das Comunidades Europeias (Eurostat) aponta que 14 países, praticamente a metade da UE, têm dívidas superiores ao percentual autorizado no tratado. O presente de grego da União Europeia continua dando o que falar. A Grécia seguiu com o recorde de endividamento da comunidade: 156,9% do PIB. Um percentual muito acima ainda da projeção de sustentabilidade feita pelo Banco Central Europeu e pelo Fundo Mo-

netário Internacional, que seria de, no máximo, 127% do PIB. Em segundo lugar ficou a Itália, com exatos 127%. Portugal completou o pódio com 123,6%. No caso dos patrícios, a dívida pública deu um salto. Estava em 108,3% do PIB em 2011. A vizinha Espanha só parece um pouco melhor. Mas os 84,1% da dívida em relação ao PIB não escondem os problemas. No ano passado, pela primeira vez na história, a população espanhola encolheu (menos 206 mil pessoas). Os imigrantes fugiram do desemprego, que tem uma taxa média na casa dos 25%. Entre os jovens, beira os 50%. Os espanhóis também foram embora atrás de uma nova chance. 21


especial

Saúde pública avanços e desafios Foto: Daniela Nader

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A

gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) bateu à porta dos 5.564 municípios brasileiros e a resposta veio num grito dos estados. Obrigados a compartilhar essa tarefa com os prefeitos, os governadores precisaram encontrar alternativas que assegurassem as conquistas do SUS e as ampliassem na direção do princípio constitucional do sistema: a universalização da saúde pública. Do governo de São Paulo, veio em 1998 a experiência das Organizações Sociais de Saúde (OSS). No Rio de Janeiro, os caminhos trilhados, a partir de 2007, foram os das Fundações Estatais de Direito Privado e o Programa de Excelência em Gestão. O governo do Paraná instalou uma complexa rede de atendimento aos casos de urgência, a Paraná Urgência. E ao criar uma Comissão InterHospitalar de Qualidade, o estado foi premiado com o distintivo de ser o único do Brasil que possui um hospital reconhecido pela Organização Nacional de Acreditação (ONA).

No Nordeste, Sergipe e Pernambuco também tentam fazer o dever de casa. O primeiro tomou a dianteira e, em 2007, realizou uma ampla Reforma Sanitária e Gerencial do SUS. Pernambuco atua em várias frentes. Descentralizou o atendimento, com a construção de UPAs e novos hospitais, e criou, em 2011, o Pacto pela Saúde. Foca, neste programa, em metas e resultados para reduzir a taxa de mortalidade por causas evitáveis em 4% ao ano. Já está quase lá. Todas iniciativas testadas no sentido de tentar melhorar a qualidade do atendimento ao cidadão e tirar dos governos estaduais a carga pesada de administrar, sozinhos, o Sistema Único de Saúde. Sobre algumas iniciativas pesam várias críticas de especialistas que as enxergam como um risco de “privatização” da saúde pública. De qualquer forma, são tentativas dos Estados no esforço de encontrar saídas para alcançar a eficiência tão perseguida e um SUS melhor e universal.

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PARANÁ

lho realizado no Hospital Infantil Waldemar Monastier. A conquista Rede de urgência se deve ao investimento feito ao reduz mortalidade longo de dois anos pela Secretaria Estadual de Saúde em melhoria A palavra traduz tudo. Urgên- das instalações físicas, dos equicia é a necessidade ou problema pamentos e da dinâmica de trabaque exige solução rápida. Mas lho da unidade através de um Copoucos são os órgãos de saúde mitê de Qualidade. Com um aporte pública que assimilam o conceito inicial de R$ 211,4 milhões, o conem sua essência. Pior, que exer- junto de ações implementadas na cem na prática essa obrigação que rede reduziu em 2012, na relação é um dever moral e uma exigência com 2010, a mortalidade materda lei. Dessa forma, só engrossam na em 21% - índice apontado pelo os índices de mortalidade que pe- Ministério da Saúde como o mais expressivo do país - as mortes por causas exterFoto: Venilton Kuchler nas (decorrentes de atos de violência ou acidentes) em 2,22% e a mortalidade cardiovascular em 0,81%. Segundo o diretor de Políticas de Urgência e Emergência da secretaHospital ria de Saúde do Paraná, Infantil Waldemar Monastier (PR) Vinicius Filipak, o segredo do sucesso da Paraná nalizam a saúde pública no país. Urgência está no modelo de uma O estado do Paraná foge à re- rede de atendimento cujas ações gra e vem se esforçando, há dois são executadas de forma integraanos, para vencer essa disfunção. da. “Isoladamente não haveria reA secretaria estadual de Saúde pa- sultado”, ressalta. ranaense implementou, em 2011, a Paraná Urgência: uma complexa rede de atendimento aos casos de RIO DE JANEIRO emergência em todas as regiões Fundações estatais do estado. de saúde: padrão Ao criar uma Comissão Inter- privado de gestão -Hospitalar da Qualidade, o Papública raná recebeu o título de único estado brasileiro a possuir uma Uma lei estadual de 2007 colounidade hospitalar reconhecicou a saúde pública do Rio de Jada pela Organização Nacional de neiro num novo padrão de gestão Acreditação (ONA), uma organido setor. Mais ágil. Mais transpazação não-governamental que rente. Um modelo de produtividaavalia permanentemente a qualide semelhante ao setor privado dade dos serviços de saúde. O tídenominado de Fundações Estatulo foi conquistado com o trabatais de Saúde. 24

Entidade pública sem fins lucrativos, a Fundação Saúde, criada pelo governo carioca, pertence à administração indireta. Está, portanto, sujeita às regras de licitação, contratação e controle previstos na lei que regula o segmento. Tem patrimônio e receitas próprias e autonomia gerencial, orçamentária e financeira. Possui mais de 4,5 mil profissionais (médicos, enfermeiros, técnicos diversos, fisioterapeutas, dentistas, etc). Seu maior patrimônio, nos seis anos em que divide com a secretaria estadual de Saúde a gestão do setor, está “o fim dos vínculos precários de trabalho (cooperativas) e substituição por concursados”. “Realizamos o primeiro concurso em 2011, que ainda se encontra em vigor. Gradativamente estamos fechando os contratos de trabalho regidos pela CLT e oferecendo salários competitivos com o mercado de trabalho. Isso tem dado mais agilidade à gestão”, informa o diretor-executivo da Fundação Saúde do Rio, Christian Ferreira. Como se trata de unidade gestora, a entidade atua na contratação e capacitação de mão de obra e no gerenciamento financeiro dos hospitais e institutos de saúde do Estado. Não tem como função o atendimento. Hoje, apenas o Instituto Estadual de Cardiologia Aloysio de Castro (IECAC) está sob a gerência da Fundação Saúde. Mas já se encontra em andamento a assinatura do contrato de gestão de mais dois institutos e um hospital: o Hemório (referência em hematologia) e o Instituto de Diabetes e Endocrinologia (IEDE) e o hospital estadual Santa


Maria (especializado em doenças pulmonares).

urgência, emergência e clínicas de cirurgia pediátrica e eletivas. O reforço foi além. O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), SERGIPE que só chegava à capital Aracaju, Reforma pioneira foi estendido para todo o interior. dá nova cara à saúde Foram geradas 36 bases descentralizadas do serviço, reforpública madas 83 Clínicas de Saúde da O pioneirismo do governo de Família, ampliados 23 hospitais e Sergipe abriu um novo caminho construídos dois regionais, além de para a saúde pública no estado. uma maternidade e cinco UnidaMudou uma realidade que parou des de Pronto Atendimento (UPAS). no ano de 2007. Uma ampla Refor- Foram reformadas ainda três Farma Sanitária e Gerencial do SUS mácias Populares e implantados custou aos cofres públicos R$ 169 cinco Centros de Especialidades milhões. Mas a renovação estrutu- Odontológicas. A área ambulatoral, gerencial e de recursos huma- rial especializada, os chamados Centros de Especialidades Odontológicas (CEOS), também recebeu estados apostam em investimento do novos modelos de gestão governo da ordem de R$ 416 mil. para melhorar o Para este ano, estão previstos mais atendimento e driblar R$ 5 milhões para o gargalo dos manutenção dessas unidades. investimentos no setor “É óbvio que essa rede ainda tem dificuldades nos da rede pública pagou o preço. para funcionar, principalmente a Hoje, o estado é outro. Embora ain- hospitalar, onde é mais difícil a da esbarre no problema do subfi- gestão e mais caro o investimennanciamento, comum aos demais, to. Mas hoje temos outra realidade para avançar na direção da univer- em Sergipe. Hoje, os cidadãos têm um atendimento mais próximo. Onsalização do sistema. Um conjunto de leis aprovado, tem, eles morriam antes mesmo em 2007, pelo governo fez valer a de chegar ao hospital. Sergipe fez Reforma Sanitária e Gerencial do a sua parte mesmo enfrentando o SUS. Com ela, a Fundação Estadual problema do subfinanciamento que de Saúde comandou todo o proces- dificulta demais a implantação do so de transformação do setor, livre modelo universalista que a gente da gerência direta do governo. E le- desenhou”, lamenta a diretora gevou a cada região do Estado – são ral da Fundação Estadual de Saú27 no total – um hospital com UTI, de, Cláudia Menezes.

A Reforma Sanitária e Gerencial do SUS do Estado de Sergipe não teve apenas a estrutura como foco. Voltou-se também para a formação e capacitação de recursos humanos, cujo investimento alcançou a cifra, de 2009 a 2012, de mais de R$ 6 milhões: 28 mil profissionais de saúde formados e capacitados depois de selecionados por concurso público. Para 2013, mais de 30 mil serão inseridos no SUS. E com a conquista da Certificação de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS), conferida pelo Ministério da Saúde, a Fundação de Saúde do Estado “terá mais recursos livres para investir em assistência, ampliando nossas expectativas de ter um SUS universal”, aposta Cláudia Menezes. A CEBAS é concedida a entidades jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, que prestam serviços em saúde, educação e assistência social. Com ela, as entidades ficam isentas de contribuições para seguridade social. Mas precisam preencher os requisitos impostos na lei 12.101/2009.

SÃO PAULO

Um polêmico modelo de gestão da saúde pública Eficiência com legalidade. Foi apostando nessa combinação que o governo do estado de São Paulo encarou a grande polêmica que envolve as Organizações Sociais de Saúde (OSS) – tida por alguns especialistas da área como a “privatização da saúde pública” – e desde 1998 adota o modelo de gestão. Mesmo consideradas entidades sem fins lucrativos, 25


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Fontes: Ministério da Saúde; Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz); IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD)


Foto: Icesp/ Divulgação

gestão Instituto do Câncer de São Paulo segue modelo da OSS essas unidades do terceiro setor ainda não venceram a resistência que encontram em segmentos da área de saúde e da própria sociedade civil. Brechas abertas em seu modelo de funcionamento – como a da compra de alguns bens que não cumpre o trâmite exigido aos órgãos públicos – aumentam as desconfianças. Aliada à maior delas: a precária fiscalização da aplicação dos recursos. A pesquisadora titular da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, Ligia Giovanella, engrossa a ala dos que consideram a gestão pública por OSS um risco à privatização do setor. Embora reconheça que não há muitos estudos para uma avaliação precisa das organizações, Ligia atesta, sem meias palavras, que elas “não têm eficiência comprovada e não são, seguramente, a alternativa mais barata”. “As experiências internacionais têm

mostrado que a gestão privada é sempre mais cara que a gestão pública. Quer um bom exemplo? Os Estados Unidos. Eles gastam 16% do PIB com saúde, enquanto os países europeus gastam em torno de 10%. E os Estados Unidos, que têm a cobertura basicamente feita por institutos privados, têm muitos problemas de acesso à saúde pública. As OSS são uma espécie de privatização (da saúde), seja do ponto de vista da prestação do serviço ou da própria gestão”, avalia. No Brasil, a adoção das OSS é vista pela especialista como um modelo ainda mais arriscado. O argumento: a prestação dos serviços públicos de saúde no Brasil já é bastante “privatizada”. “Somente 34% dos leitos hospitalares são públicos e os que são disponibilizados pelo SUS são mais ou menos 72% do total dos leitos do país”. Em São Paulo, até 2011, estavam sob a gerência das OSS: 37 hospitais, 38

Ambulatórios Médicos de Especialidades (AMEs), um centro de referência, duas farmácias e três laboratórios de análises clínicas. O Instituto do Câncer de São Paulo (Icesp) é um exemplo. A Secretaria de Saúde não atualizou os dados para a revista Gestão Pública PE. Doutor em Saúde Pública pela USP, o professor Gilson Carvalho foge à polêmica em torno das Organizações Sociais de Saúde (OSS) por entender que ela se resume ao contraponto “legalidade com eficiência”. “Confunde-se administração através de fundações com uma terceirização do setor público. Por engano ou mesmo por má-fé. Os atos públicos podem ser feitos pelas administrações direta e indireta. Nada de ocupar o lugar. Apenas complementar o que Estado não está dando conta de fazer”, contra-argumenta o professor. Carvalho lembra que as Organizações Sociais existem há 15 anos. E ainda 27


que sofram condenações por parte, inclusive, de órgãos judiciais, como o Ministério Público Federal, “elas são instituições legais”. Defende que as OSS são um modelo de gestão pública que “diminui muito as amarras em duas áreas cruciais: contratação de pessoal e processo licitatório (mais simplificado)”. “Para mim, o cerne da questão está em saber o que deve ser feito e buscar fazê-lo. Sou um defensor da saída pelas fundações estatais. Não como panaceia, mas como uma alternativa legal para fazer a gestão pública menos paquidérmica e mais eficiente. Dentro do estado de direito e da legalidade”.

Pernambuco

Aposta em monitoramento e estratégia

O mapa na tela do computador mostra o município de Ouricuri. O sinal vermelho acende no painel de monitoramento dos gestores do

Pacto pela Saúde. As estatísticas indicam um aumento de casos de doenças gastrointestinais exatamente lá. Naquela região do sertão. A seca prolongada, que provoca graves impactos na economia do Estado e do Nordeste, também fragiliza a saúde de homens, mulheres e crianças. A falta d’água ou a má qualidade com que chega para a população merece cuidados e orientações redobradas, mas há algo errado. É preciso intervir. Detectado o problema, o alerta é dado imediatamente a IX Gerência Regional de Saúde (Geres). A sede é em Ouricuri, mas ela abrange outros dez municípios que somam quase 328 mil habitantes. De lá deve sair o estudo do caso e o mais importante: as providências para frear a escalada da doença. É essa a essência do Pacto pela Saúde, programa implantado em 2011, com foco em metas, resultados e na melhoria do atendimento para o cidadão. Tanto lá na ponta, nas pequenas cidades, como nas principais unidades de saúde. O secretário executivo de Ges-

PERNAMBUCO Reuniões de avaliação do Pacto pela Saúde acontecem sistematicamente

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tão por Resultados do Governo, Bernardo D’Almeida, conta que a política segue a linha do Pacto pela Vida, cujo objetivo é reduzir índices de violência no estado, e do Pacto pela Educação, criado para melhorar o Índice de Desenvolvimento Educacional (Ideb). Na Saúde, o foco é a redução do índice de mortalidade por causas evitáveis. A secretária executiva de Saúde do Governo, Ana Paula Sóter, diz que a meta é que essa redução chegue a 4% ao ano. Até o final deste ano, segundo ela, o objetivo será atingido. Ana Paula destaca que o caminho exigiu emprenho e muito estudo. “Foi um grande desafio escolher um indicador síntese para a Saúde por que ela é multideterminada. Além do mais, no SUS nenhum ente federado é responsável sozinho. Sempre há uma divisão em três partes”, explica, ressaltando que para um município colocar em funcionamento uma unidade de Saúde, por exemplo, alí terá recursos federais, estaduais e do próprio município. “O desafio foi escolher o melhor Foto: Sec. Saúde/ Divulgação


Foto: Secretaria de Saúde de Pernambuco/Divulgação

indicador que pudesse sintetizar esse esforço coletivo para o sistema de saúde funcionar. O Pacto é uma experiência inédita porque traz para a Saúde um novo jeito de governar”. O índice de mortalidade por causas evitáveis no Brasil, de acordo com as estatísticas mais recentes do Ministério da Saúde, é de 282 por 100 mil habitantes. O estado que está mais distante de atingir esse índice é o Rio de Janeiro (363/ 100 mil habitantes), seguido do Rio Grande do Sul (333/ 100 mil habitantes) e do Espirito Santo (325/ 100 mil habitantes). Pernambuco divide com Alagoas o sexto lugar neste ranking, registrando 309 mortes/ 100 mil habitantes. Mas como chegar lá? O Pacto pela Saúde investe no monitoramento, como o que ocorreu em Ouricuri, e em planejamento para atingir o resultado esperado. Não por acaso, assim como nas demais áreas, o acompanhamento meticuloso das ações é considerado indispensável. As reuniões acontecem sistematicamente e em várias esferas. Uma vez por mês, ocorre a chamada reunião estratégica, com a presença de secretários, com a equipe de gestão e dos gestores das doze Geres. Um grande fórum. Depois, ela acontece dentro das

Geres - a chamada reunião intermediária - e, por fim, a proposta é promover os encontros com os profissionais que atuam na ponta. Quando o assunto é gestão por resultados, seja em qual for a área, Bernardo D’Almeida explica que é preciso levar em consideração o que os especialistas chamam de valor público. Que, em resumo, é como um conjunto de ações vai melhorar a vida das pessoas. Nada é feito aleatoriamente. “Se a gente pede uma ambulância que seja, a gente faz essa avaliação do valor público”, ressalta. “A gente precisava, portanto, ter um indicador que fosse aferível e de maneira confiável, que a gente pudesse ter um acompanhamento das políticas geradas e saber se essas políticas iriam de fato gerar valor público”. O Gerente Geral de Gestão por Resultados na Saúde, Gustavo Abreu, explica que tanto as Geres quanto as unidades de saúde e os hospitais têm um acompanhamento sistemático. O cuidado com os dados é sempre ressaltado. As estatísticas são levantadas de maneira meticulosa. Não é fácil, até pelas disparidades entre os municípios, mas Pernambuco tem conseguido resultados importantes. A defasagem é de três meses, em média, mas muitas vezes supera o desempenho de estados maio-

res. O monitoramento nos hospitais, por exemplo, tem dado um boa radiografia do desempenho de cada um. São avaliados em cinco indicadores: tempo médio de permanência, taxa de ocupação, producão cirúrgica, taxa de mortalidade hospitalar e o percentual de urgência com internação. Este último, uma novidade introduzida para que se saiba se o paciente que chega aquela unidade deveria mesmo ser internado lá ou se tem o perfil do paciente que poderia ser atendido em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), por exemplo. E aí, entra a preocupação com a descentralização do atendimento. Um problema que o governo vem atacando com a construção de novos hospitais, na capital e no interior, com as UPAs - que atendem urgências e emergência - e, mais recentemente, com as Unidades Pernambucanas de Atenção Especializa (UPAEs), uma rede de consultas especializadas e de exames clínicos que está sendo implantada para garantir a integralidade da assistência aos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) em todas as regiões do Estado. Até 2014, a meta é que sejam construídas doze, de tal forma que garantam cobertura em todas as regiões do Estado. O investimento previsto é de R$ 200 milhões. 29


Fonte: Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) 30


>> entrevista Ligia Giovanella Fundação Oswaldo cruz

O

sistema público de saúde ainda é o mais procurado pela população brasileira. Cresceu de 51% para 69% o percentual de pessoas que recorrem a esses serviços. O descompasso entre o aumento da procura e o baixo investimento, uma doença que agoniza o Sistema Único de Saúde há 25 anos, tem impedido o SUS de cumprir com seu princípio constitucional de cobertura universal à saúde. No Brasil, menos de 50% dos gastos com saúde são públicos. De todas as nossas riquezas produzidas, só 4% vão para investimentos na área. Faltam recursos, sobram leitos. Paradoxo? Não. De fato o SUS tem uma disponibilidade de hospitais vantajosa: 72% do total existente no país. O problema é que somente 34% são públicos. O que dá ao Brasil o nada honrado título de o país com uma rede hospitalar extremamente privatizada. A pesquisadora titular da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, Ligia Giovanella, revela esses e outros dados em entrevista à revista Gestão Pública PE. E aponta caminhos para o Brasil. Que só serão seguidos se houver de fato interesse em garantir a plena cobertura universal à saúde.

Arquivo pessoal

“Cobertura universal só com mais investimentos”

Há solução, a médio ou longo prazos, para o nó da gestão da saúde pública no Brasil? É sempre importante lembrar que no Brasil o financiamento no SUS e na atenção básica é extremamente baixo e insuficiente, considerando nossa receita nacional e a obrigação constitucional da garantia do direito universal à saúde. Nos países europeus que alcançaram a cobertura universal como a Inglaterra, Espanha e Suécia, os gastos públicos correspondem a 8 ou 9% do Produto Interno Bruto (PIB). No Brasil, contabilizam no máximo 3,7% a 4%. Temos condições econômicas para dobrar nossos gastos. Nossa riqueza nacional nos permite. Pode-se dizer que o SUS é extremamente eficiente considerando tudo o que se produz com recursos tão irrisórios. Então a senhora reconhece que o problema não é o de ineficiência na gestão? Com certeza o problema do investimento é muito mais grave. Os baixos investimentos nos estabelecimentos públicos de saúde produzem estruturas inadequadas o que torna o problema mais grave. Mas temos problemas de gestão. É uma conjunção de problemas. 31


Mas sem um maior financiamento do Sistema Único de Saúde nunca avançaremos na cobertura universal como pretendemos. Quais os países mais avançados em gestão pública de saúde? Em termos de sistemas públicos universais, os países escandinavos, como Suécia e Dinamarca, e os europeus, como o Reino Unido e a Espanha. A Espanha talvez seja o modelo mais próximo do brasileiro em termos de organização do sistema público de saúde. É um país federado como o Brasil, o sistema de saúde está descentralizado para as comunidades autônomas que correspondem aos nossos estados. E, como no caso do Brasil, produz problemas adicionais em termos da organização de uma rede assistencial resolutiva. A prestação assistencial em atenção primária, na Espanha, também é feita em centros de saúde públicos com profissionais assalariados como no Brasil. Na Espanha, os serviços são descentralizados para as comunidades autônomas, cada comunidade organiza o seu e, assim, têm-se exemplos de organização diferenciados como os de Andaluzia ou no País Basco. São exemplos que deveríamos olhar para construirmos nosso sistema público universal como manda a Constituição. Que avaliação a senhora faz dos 25 anos do SUS? Tivemos um avanço em atenção básica no Brasil muito ampliado na última década. Principalmente com essa experiência do piso de atenção básica, de 1998, e com a implantação dos serviços de saúde da família. Atualmente o PSF cobre talvez mais de 50% da população brasileira, tendo na região Nordeste uma proporção mais ele32

“Temos condições econômicas para dobrar os gastos em saúde. A riqueza nacional nos permite. O SUS é eficiente considerando o que produz com recursos irrisórios” vada. Uma pesquisa nacional de amostra domiciliar da PNAD Saúde mostra uma ampliação importante de pessoas que procuram o serviço regularmente: aumentou de 71% para 79% da população brasileira em 2003. Os centros de saúde públicos é a modalidade mais procurada pela população, constituindo um serviço de procura regular para 57% da população, com maior proporção entre as pessoas de menores faixas de renda (77%). Consultórios médicos particulares são serviços de procura regular para 19% da população, com maior proporção entre o grupo de maior renda (71%). Nós temos agora todos os municípios responsáveis pela atenção primária à saúde. Claro que temos dificuldades em algumas cidades do interior, mas, sem dúvida, houve uma ampliação da assistência médica. O problema é que essa ampliação da cobertura pelo SUS não foi acompanhada por um financiamento proporcional à ampliação de uma cobertura que antes era oferecida pela assistência médica da previdência social ou, parcialmente, para indigentes por alguns serviços públicos de saúde. Como se trabalha o conceito de gestão da saúde pública nas universidades do Brasil? Dá para

apostar em uma nova geração de gestores? Podemos, sim, apostar numa nova geração de gestores porque, há alguns anos, vêm sendo implantado cursos de graduação em saúde coletiva. Não sei exatamente a quantidade, mas já passam de 17, e há também os cursos de pós-graduação em gestão da saúde pública que formam professores, pesquisadores, o que nos leva a apostar que daí sairá uma leva de pessoal capacitado para atuar melhor na gestão do SUS. Qual sua avaliação das Unidades de Pronto-Atendimento, as UPAs, adotadas em vários Estados do Brasil? Temos de analisar com cuidado a regulamentação das UPAs. Há uma dubiedade na política federal de qual deve ser a prioridade em termos do modelo de atenção à saúde. Há um discurso de que as equipes de saúde da família e de atenção primária devem atuar nas unidades de atenção básica e acompanhar os usuários ao longo do tempo. Mas com a ideia de desafogar as emergências dos hospitais dos grandes centros urbanos, o Ministério da Saúde incentiva a criação das UPAs 24 horas, que dispõem de uma estrutura de complexidade intermediária, mas que precisam


estar articuladas com os centros de atenção básica e nem sempre essa articulação ocorre. Portanto, enquanto modelo, as UPAs acabam competindo com os serviços de atenção primária de procura regular. Fizemos um estudo da implantação das unidades do PSF em quatro grandes centros urbanos,

perlotação dos hospitais, agravada por um crescimento de oferta. Por mais que se tenha a prevenção, certamente ainda necessitamos de ampliar a garantia do acesso à atenção hospitalar. Mas é claro que precisamos avançar na prevenção assim como na promoção da saúde. Por exemplo, iniciativas para

“Nos países europeus que conseguiram a cobertura universal, como Inglaterra, Espanha e Suécia, os gastos públicos correspondem a 8% ou 9% do PIB” em 2008 e 2009, que revelou que em algumas grandes cidades o horário de atendimento das unidades básicas de saúde ia até às 22 horas. Isso facilita o acesso. As UPAs deveriam ser, de fato, unidades emergenciais. Elas têm uma composição de profissionais e de equipamentos que as tornam unidades de urgência e emergência mais resolutivas. Mas muitas concorrem com o modelo de saúde da família, cujos médicos, no geral, atendem problemas que deveriam ser atendidos nos centros de saúde. A questão da prevenção ainda é um problema relegado no Brasil? Ainda há no Brasil uma insuficiência de unidades básicas de saúde, de centros de saúde em atenção primária, cujas funções são as da promoção da saúde, da educação e da prevenção. Por isso ainda enfrentamos esse problema da su-

controlar a prevenção do cosumo de sal e do açúcar. São ações em que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária poderia atuar, mas esbarra na receptividade da indústria de alimentos, que deveria ter uma prática colaborativa. No caso da vacinação, avançamos muito, assim como no campo da atenção pré-natal. Embora ainda tenhamos uma mortalidade materna bastante elevada relacionada, entre outras questões, à insuficiente qualidade do atendimento pré-natal, mas, sobretudo, ao excesso dos partos cesarianos que respondem a mais de 50% dos partos no Brasil. No setor privado, eles chegam a 90%. Outra causa da mortalidade materna é a criminalização do aborto. Isso tem de ser pensado como um problema de saúde pública e é uma hipocrisia criminalizá-lo. Mulheres de classe média pagam o aborto em clínicas privadas, enquanto as de renda mais

baixa não têm essa possibilidade e são submetidas a intervenções de baixa qualidade que produzem mortes maternas. Mas atribuir a superlotação dos hospitais só à falta de prevenção não é correto. Alguns estados têm adotado experiências complementares, como as Organizações Sociais de Saúde (OSS), na gerência da saúde pública. Que avaliação a senhora faz dessa ferramenta? Esse é um tema realmente polêmico. Não há muitos estudos para se identificar eficiência nas OSS, mas certamente elas não são as mais baratas. Um bom exemplo no qual a experiência da saúde privada é muitíssimo mais cara do que a pública são os Estados Unidos. Eles gastam 16% do PIB com saúde, enquanto os países europeus cerca de 10%. E ainda assim, os Estados Unidos têm problemas de acesso, uma cobertura que é basicamente por serviços privados, cuja regulamentação, a melhor, foi essa agora da reforma Obama de 2010. Nos EUA se oferece uma maior cobertura para idosos, para a população de baixa renda, mas a cobertura pública passa de 24% da população. Os gastos públicos dos países europeus, que têm sistema público universal de saúde como o SUS, são em torno de 70% a 86%. No Brasil, menos de 50%. Voltando às OSS, elas são uma espécie de privatização (da saúde pública): seja do ponto de vista da prestação do serviço ou da própria gestão do sistema. É o caso do Rio de Janeiro que tem OSS no gerenciamento da atenção primária. E no Brasil, a estrutura de prestação assistencial já é muito privatizada. Só 34% dos leitos hospitalares, dos 72% disponibilizados pelo SUS, são públicos. Temos uma rede hospitalar extremamente privatizada. 33


Ministro diz que desafio é aproximar produção acadêmica do paciente Q

uando o tema da saúde pública no Brasil está em questão, seja no universo acadêmico, profissional ou na mais alta cúpula de gestão do setor (o Ministério da Saúde), o problema do baixo investimento em recursos leva todos a falarem a mesma língua. Se chegarmos até ao cidadão mais desavisado, seguramente esse indicativo também será apontado por ele como o principal gargalo para o país ainda não ter alcançaso uma cobertura universal em saúde como manda a Constituição. Mas os problemas da gestão pública da saúde no Brasil decor34

rem de muitos outros fatores. Um deles, o da precária formação dos profissionais da área, concorre quase em pé de igualdade com o estorvo do baixo investimento. Em alguns casos, até o ultrapassa. É só mergulhar pelos mais longínquos rincões do país, que facilmente se tropeça em gestores públicos sem formação alguma na área e desprovidos de uma total habilitação em gerência. Estão muitas vezes ali porque a política os acomoda. A Gestão Pública PE conversou sobre o tema com o ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Ele

reconhece, e é fato, que o Brasil tem se esforçado para ampliar a produção científica e investir na formação técnica de seus profissionais de saúde – os capacitando não somente para a atuação médica ou de pesquisa, mas os preparando como gestores. Em estrutura, o país deu passos importantes. Aumentou seus cursos de mestrados e doutorados, ampliou o número de instituições em pós-graduação, assim como o das escolas de saúde pública, e fechou várias parcerias com países europeus que adotam o sistema universal de saúde como


Foto: Daniela Nader

Precisamos construir o conceito de saúde-escola para que a formação esteja atrelada a melhoria do serviço de saúde

Alexandre Padilha Ministro da Saúde

o SUS. Graças aos resultados do Programa Nacional de Imunização, criado há 40 anos, e que colocaram o Brasil entre os melhores do mundo na área, nosso país atraiu a atenção do Canadá, Reino Unido, Portugal e Espanha. Resultado: consolidou-se um espaço de intercâmbio de informações voltadas para a o fortalecimento do sistema público de saúde. Esse esforço brasileiro é validado por uma das fundações mais conceituadas do país: a Oswaldo Cruz (RJ). A Fiocruz atesta, na prática, o empenho da União em formar melhores quadros na saúde.

Mas comunga da mesma lamúria do ministro Padilha: a de que ainda é preciso melhorar muito. Porque a “boa vontade” do governo central esbarra na descentralização político-administrativa da saúde, definida pela Constituição de 88: a chamada municipalização. O que desafia o governo a não se acomodar com as conquistas, tampouco se abrigar no discurso fácil do “estou fazendo a minha parte”. O ministro Alexandre Padilha vai até mais fundo na defesa do Brasil avançar na formação de seus gestores públicos. Propõe como “desafio maior” uma reno-

vação no conceito de formação de uma nova geração de profissionais da saúde no Brasil. “Precisamos construir o conceito de sistema de saúde-escola para que a formação, dentro de um processo de educação permanente, possa estar o tempo todo atrelada à melhoria dos serviços de saúde. Neste sentido, o envolvimento entre as universidades e os sistemas estaduais e municipais de saúde é fundamental. O grande desafio é fazer com que essa produção acadêmica se aproxime cada vez mais do serviço ao paciente”. 35


opinião

Administração pública e de empresas:

duas coisas muito diferentes

Bresser: “empresas privadas competem no mercado, já as empresas públicas são monopolistas” 36


Foto: Divulgação Por Luiz Carlos Bresser-Pereira Professor emérito da Fundação Getúlio Vargas

O ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira não abre brecha para dúvidas. A administração pública e a administração privada têm focos e objetivos bem diferentes. E, segundo ele, não dá mesmo para misturar. E quem mistura, avalia, está cometendo um equívoco. Um erro que vem lá dos anos 1960, quando houve a definição legal da carreira de técnico de administração – posteriormente mudada para a de administrador – envolvendo tanto a administração pública quanto a administração de empresas. Estava feita a confusão. Um equívoco que chegou a algumas universidades e, claro, multiplicou-se. Neste artigo, Bresser deixa tudo as claras. Para ele, é exato como na matemática. Enquanto a administração privada mira a expansão e o lucro em benefícios dos seus proprietários, a organização estatal foca o bem público. E ele aprofunda-se mais. “Ressalta que para formar o administrador público não basta ensinar-lhe estratégias e métodos de gestão e controle, além de métodos quantitativos de administração e tomada de decisões. É preciso ter uma compreensão ampla da instituição normativa e organizacional que realiza essa coordenação. Ou seja, do estado, das teorias que buscam explicá-lo e relacioná-lo com a sociedade”. Já para o administrador de empresas, Bresser atribui a seguinte condição: ele precisa ter uma ideia clara de finanças e dos mercados. O que aponta, evidentemente, para a necessidade de conhecimento dos negócios. E para ilustrar o que diz, ele vai buscar o exemplo dos Estados Unidos, onde as escolas de administração de empresas são chamadas business school. Parece mesmo bem simples. O objetivo das escolas de administração de empresa são os negócios, os da administração pública, o estado. Confira. 37


A aproximação que ocorreu no Brasil entre o ensino da administração pública e da administração de empresas decorreu de um equivocado entendimento do que seja administração pública. Ela nasceu da definição legal ainda nos anos 1960 da carreira de “técnico em administração” (depois mudada para a de “administrador”) envolvendo tanto a administração de empresas quanto a administração pública, quando são profissões muito diferentes. Foi um equívoco que levou muitas universidades a oferecer cursos de administração com especialização em administração de empresas ou em administração pública, como se o gênero fosse a administração e as duas espécies, a de empresas e a pública. Assim, a administração de empresas seria o processo de tomar decisões em uma empresa sobre como ela deve ser organizada e controlada, enquanto que a administração pública seria a mesma coisa aplicada ao estado, ou, mais amplamente, às organizações públicas. Tanto a administração de empresas como a administração pública seriam processos de tomada de decisão em organizações. Podemos pensar em administração pública nestes termos, mas, nesse caso, seria melhor falar de 38

gestão pública. Administração pública propriamente dita é outra coisa: é um dos dois elementos que constituem um estado, o outro sendo a lei ou a ordem jurídica. O estado é o sistema constitucional-legal e a administração pública que o garante. Portanto, administração pública é sinônimo de aparelho ou de organização de estado. O estado, em cada estado-nação, é constituído, de um lado, pela ordem jurídica que inclui as políticas públicas e os usos e costumes, e, de outro, pela organização formada e dirigida por oficiais ou burocratas públicos, tanto os não-eleitos (servidores públicos e militares) quanto os eleitos ou os políticos. A administração pública é também uma disciplina ou área de estudo. Nesse caso, é a área de conhecimento que tem como objeto o aparelho do estado. Compreendida nesses termos, a administração pública está mais próxima da ciência política (cujo objeto é o estado como um todo), ou do direito (cujo objeto é a lei) do que da economia e da administração de empresas. É também preciso administrar o aparelho do estado, geri-lo de forma eficiente, mas a diferença entre as empresas e a administração pública é muito grande. Enquanto as primeiras vi-

Foto: Teresa Maia/DP/D.A PRESS

Este texto é uma versão ampliada da intervenção feita na Audiência Pública sobre as Diretrizes Curriculares para Curso de Graduação em Administração Pública e Políticas Públicas, realizada no Conselho Nacional de Educação do Ministério da Educação, Brasília, 5 de abril, 2010


sam a expansão e o lucro em benefício dos seus proprietários, a organização estatal visa o bem público. Enquanto uma compete no mercado, a outra é monopolista. Na administração pública, o essencial é sua soberania ou seu poder de estado, é sua (dos políticos) capacidade de definir boas leis e políticas públicas, e sua (dos servidores) capacidade de executá-las de forma efetiva e eficiente. Um curso de graduação em administração pública não se limita a formar servidores para a administração pública; forma também, de um lado, políticos, e, de outro, administradores das organizações públicas não-estatais, principalmente das de advocacia ou de responsabilização política através das quais a sociedade civil busca responsabilizar a administração pública. Podemos pensar no burocrata público como um mero executor das decisões tomadas pelos políticos em nome de seus eleitores. Essa é uma visão linear e equivocada do que é um servidor público. O servidor público não é um mero administrador; ele é, essencialmente, um agente político, como também o é o político eleito; por isso, ambos são “oficiais públicos”. O servidor público não se limita a executar leis e políticas definidas pelos políticos; ele ajuda os políticos eleitos a formulá-las ou a reformá-las. Seu poder não é apenas o poder de um administrador sobre seus subordinados. Ele fala e age em nome do estado, ele partilha do poder de estado – do poder extroverso e soberano que só o estado tem sobre sua sociedade nacional. Para formar um administrador público não basta ensinar-lhe estratégias e métodos de gestão e controle, métodos quantitativos de 39


de empresas são os negócios; o das de administração pública, o estado. Na formação de administradores públicos – de um grupo restrito e altamente qualificado de agentes públicos dotados de poderes e responsabilidades públicas – sempre se inclui a ampla discussão do que seja o etos público do servidor. Uma escola de administração pública ou de políticas públicas não pode se limitar a ensinar os valores liberais

Foto: Daniela Nader

administração e tomada de decisão, e uma visão geral da sociedade e de como ela é coordenada. Além desses conhecimentos gerais, que também o administrador de empresas necessita, o administrador público precisa ter uma compreensão ampla da instituição normativa e organizacional que realiza essa coordenação, ou seja, do estado; das teorias que buscam explicá-lo e relacioná-lo com a sociedade; da

ENSINO Objetivo das universidades de administração de empresas é formar o profissional com foco nos negócios democracia que é a forma por excelência que assume o estado moderno e desenvolvido; do direito, não apenas o administrativo, mas principalmente o constitucional, que se consubstancia na lei; e do papel fundamental que o aparelho do estado desempenha em todo esse processo político. Já o administrador de empresas precisa ter uma ideia clara das finanças e dos mercados – dos negócios. Não é por outra razão que, nos Estados Unidos, as escolas de administração de empresas são chamadas “business schools”. O objeto das escolas de administração 40

baseados na liberdade negativa de cada cidadão de não ser incomodado se não estiver infringindo a lei. O debate sobre a liberdade positiva ou sobre a concepção republicana de política e de serviço público é fundamental em um curso de graduação em administração pública. Poder-se-ia argumentar que todo curso universitário deveria incluir essa preocupação. Sem dúvida, já que todas as profissões supõem comportamento ético e implica uma ética própria a ela. No caso dos oficiais públicos eleitos e não-eleitos, porém, o etos republicano está no

próprio coração dessas profissões. A sociedade exige de cada profissão a respectiva ética; dos políticos e do administradores público ela exige a responsabilidade pela res publica, exige seu comprometimento com o interesse público. A responsabilidade pela construção de um estado democrático e republicano é de todos os cidadãos, mas é principalmente de seus oficiais públicos. A administração pública foi objeto de duas grandes reformas. A primeira ocorreu nos países mais avançados no século XIX e, no Brasil, a partir de 1937. Foi a reforma burocrática ou weberiana, que tornou o serviço público profissional e efetivo. A segunda ocorreu a partir dos anos 1980, na Europa e nos Estados Unidos, e a partir de 1995, no Brasil. Foi a reforma gerencial da administração pública. Esta segunda grande reforma buscou adaptar algumas estratégias de gestão – principalmente a da administração por resultados – para a administração pública, mas os critérios de êxito continuaram muito diferentes: em um caso, o interesse público, no outro, o lucro. No caso dos administradores de empresas também existe uma responsabilidade ética, mas ela é contraditória, porque seu critério principal de êxito não é o bem público, mas a expansão e o lucro da empresa. O bem público só entra através da “mão invisível” de Adam Smith: se cada um defender seu próprio interesse, o interesse geral será automaticamente garantido


pela competição no mercado. Ora, Foto: Daniela Nader sabemos como essa tese é parcial e, por isso, eminentemente equivocada. Poucas vezes o mercado é suficientemente competitivo ao ponto de garantir o interesse de todos. Muitos setores são monopolistas. E a economia como um todo não pode ser bem coordenada apenas pelo mercado. Na verdade, a grande coordenação de todas as socieBrasil implantou, dades modernas cabe ao estado. A a partir de 1995, ele cabe, inclusireforma gerencial ve, regulamentar os mercados para da administração que funcionem bem. O neolibepública ralismo – a ideologia que foi dominante no mundo nos 30 Anos Neoliberais do Capitalismo (1979-2008), um período de baixo crescimento, grande instabilidade financeira, e forte aumento da desigualdade – não foi apenas um assalto ao estado. Esse era seu objetivo, mas afinal foi também um assalto ao mercado, uma instituição que pretendia defender, mas que afinal foi desmoralizada na medida em que os mercados financeiros foram desregulamentados e, por isso, funcionaram mal. No Brasil, interesses corporativos e incompreensão do que seja a administração pública pressionam para que o estado não a distinga da administração de empresas. Mas, em síntese, elas são muito diferentes. Mais do que um processo de tomada de decisões, a administração pública é uma parte constitutiva do estado; a administração de empresas é apenas um processo. PRINCÍPIOS E, enquanto processos, seus objeSociedade exige ética de cada profissão. tivos ou critérios de excelência são Do administrador público, responsabilidade muito diferentes. 41


inovação

M u s e u s 42


A arte de se reinventar sem MUITOS mistérioS Que o olhar misterioso na Mona Lisa, de Leonardo da Vinci, encanta o mundo há muito tempo não é novidade, mas, convenhamos, quantas vezes você voltaria ao Louvre, de Paris, para ficar cara a cara com a imagem de uma das mulheres mais comentadas e estudadas da história da arte mundial? Duas, cinco, dez vezes. Se é para ficar cara a cara com a Mona Lisa tudo bem, vamos considerar o exagero: dez vezes. Mas o caso do Louvre é bem particular. O museu parisiense é o recordista disparado de público, com quase 10 milhões de visitantes só em 2012, de acordo com o jornal The Art Newspaper, o mais importante do setor. O Louvre se beneficia também por estar na cidade mais visitada do mundo. O fato, portanto, é que quem quer fazer sucesso neste ramo e não tem uma Mona Lisa para chamar de

sua, nem conta com o magnifico potencial turístico de Paris, investe para incorporar a gestão uma dinâmica nova, que passa por estratégia administrativa, inovação, planejamento e interatividade. O universo dos museus, definitivamente, não é mais necessariamente estático. Do ponto de vista de gestão, entretanto, continua desafiador. O Brasil dormiu no ponto por muito tempo, mas acordou. Correu atrás do prejuízo e conseguiu dar saltos importantes nos últimos dez anos. Inclusive, do ponto de vista qualitativo. Tomou providências em série. Deu o start com a Política Nacional de Museus, em 2003. Viabilizou, a partir daí, a construção do Sistema Nacional de Museus, que, por sua vez, culminou em outras providências: o Cadastro Nacional dos Museus (CNM) e o Estatuto de Museus, principal ferramenta de

gestão. Por fim, investiu na criação do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), vinculado ao Ministério da Cultura (Minc). Também foram criadas políticas de financiamento e fomento através do Fundo Nacional de Cultura, de Mecenato (captação de recursos através de incentivo fiscal) e Editais, como o de Preservação de Museus (BNDES) e apoio a Cultura-Patrimônio, da (Petrobras). Levantamento do Ibram revela que no âmbito do Sistema Minc, tanto em termos de aporte direto de recursos quanto na modalidade Mecenato, o salto de investimento no setor foi significativo. Dados mostram que até 2011, os recursos destinados anualmente ao setor passaram de R$ 20 milhões, em 2001, para R$ 216 milhões, um aumento de quase 1.000% em termos nominais. “A médio e longo prazo, o objetivo é superar os investimentos orçamentários em relação aos aportados pelas leis de incentivo. A expectativa, com isso, é minimizar as disparidades regionais”, informa o Ibram. Mas dá para pensar os museus sob a ótica econômica? Do ponto de vista de lucro, a reposta é não. Nenhum museu do mundo é superavitário. Nem o imponente Louvre chegou lá. Quase 50% dos seus recursos são injetados pelo governo. Do ponto de vista gerencial, claro que sim. E isso vale tanto para os museus.gov quanto para os museus s.a. 43


Fotos: Daniela Nader

Museu da Língua Portuguesa, São Paulo Em 2010, com o surgimento do Estatuto dos Museus, o Cadastro Nacional de Museus passou a adotar o conceito de museus previsto na Lei 11.904, que estabelece no Artigo 1º que museus são instituições sem fins lucrativos. Isso não significa, entretanto, que não possam trabalhar para tentar atingir o mínimo de sustentabilidade. O próprio Ibram avalia que gestão e sustentabilidade são os grandes desafio dos museus. Para o Instituto, eles terão que aprimorar a gestão administrativa, desenvolver planejamentos estratégicos e se capacitar em instrumentos de captação de recursos para assegurar a tal sustentabilidade de suas ações e funções diante de orçamentos cada vez mais exigentes. O desafio vale para praticamente todos os museus do Brasil. A publicação Museu em Números, traça a radiografia do setor no país, mos44

tra que de um total de 1.500 museus cadastrados no CNM, 77% informaram que não têm orçamento próprio para realizar suas atividades. E entre as que declararam ter orçamento anual (22,3%), a maioria é composta por instituições de natureza administrativa municipal. Depois aparecem os museus da instancia federal e estadual. O Ibram avalia, entretanto, que nos últimos dez anos, com as políticas públicas desenvolvidas para o fomento do setor, para o financiamento e a modernização dos museus, houve um salto qualitativo extraordinário, mas reconhece que ainda há muito a ser feito. É preciso, por exemplo,estimular cada vez mais os museus a entrarem no cotidiano da cidade para que seja identificado, reconhecido e usufruído pela população local e identificado pelos turistas como um lugar a ser visitado.

Para chegar a esse padrão, é necessário, segundo o Ibram, continuar com as políticas públicas já adotadas e avançar em outras políticas setoriais, destacadamente relacionadas ao setor de turismo. É assim nos grandes centros mundiais. O secretário de Cultura de Pernambuco, Fernando Duarte, avalia que o caminho é bem por aí. Interatividade, conteúdo consistente, sintonia com a cidade, além do que ele chama de “bossa”, formam um conjunto relevante de ações que deve ser considerado na concepão moderna de museus. Duarte acha que tecnologia deve vir sempre acompanhada de um conteúdo de peso. Afinal, diz ele, não se trata de um jogo de videogame. E, mais uma vez, o exemplo citado é o museu da Língua Portuguesa. Que tem tecnologia, mas sobretudo um conteúdo fantástico.


Instituto Ricardo Brennand, Recife

Planejamento

O museólogo pernambucano Aluízio Câmara aposta no planejamento estratégico e investimento em pessoal para melhorar a situação gerencial dos museus brasileiros. Formado na escola do Louvre, Câmara elogia a legislação brasileira. Classifica como muito pertinente, sobretudo na questão do Plano Museológico, instituído pelo Estatuto dos Museus, em 2010. “Na França, nós temos o projeto científico, o que equivale ao nosso plano. Cada museu tem que ter o seu. É como nas escolas, que anualmente precisam preparar o projeto político pedagógico definindo ações, metas e objetivos. O plano museológico nasce com esse objetivo”, ressalta. Câmara bate na tecla do planejamento como uma questão fundamental. E dentro disso, avalia, que uma das coisas necessárias é

trabalhar o público cativo. E aí ele dá como exemplo o que vem sendo pensado para o Museu do Trem de Pernambuco, que vai funcionar no prédio da antiga Rede Ferroviária, no centro do Recife, e tem inauguração prevista para setembro. “Vamos tentar criar uma coisa específica para o bairro do Coque por conta da proximidade com o Museu”. É o público de proximidade que, conforme ensina o especialista, deve ser considerado.

Tecnologia

E por falar em público, o Brasil já conseguiu resultados importantes. O mesmo The Art Newspaper que coloca o Louvre como recordista mundial em fluxo de visitantes, também traz boas notícias para nós. A publicação lista três exposições no Brasil entre as mais visitadas do mundo no ano passado. Amazônia, Ciclos de Modernidade,

realizada no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, nos meses de maio e junho, foi a segunda mais vista no mundo com a marca de 7.928 visitantes por dia em média. Perdeu para a mostra Antigos Mestres Holandeses, que apenas no Museu de Arte Metropolitana da Tóquio, recebeu uma média diária de público de 10.573 visitantes. Excelente notícia, mas ainda é um desafio para os museus fazerem com que a pessoa que cruzou a porta de entrada uma vez sinta-se estimulada a voltar. Conteúdo consistente e o mix de atrações é um caminho. O curador Marcello Dantas (ver entrevista) acha que outro fator é que o museu tem que estar em sintonia com a comunidade local. O Museu da Gente Sergipana, em Aracaju,do qual Dantas foi curador, é o primeiro 100% interativo do 45


Nordeste, segue essa concepção e é um sucesso. O diretor do Instituto Banese, Ézio Deda, responsável pelo museu de Sergipe, conta que a ideia foi criar o link com as pessoas do lugar. E deu certo. “A gastronomia fala do que a pessoa come em casa, na praça você tem imagens de praças da cidade e do interior. Há uma identidade. Tanto é que se transformou no centro cultural de Aracaju”. Desde que foi inaugurado, em novembro de 2011, já recebeu 120 mil pessoas e deve ultrapassar 150 mil até completar dois anos”. Ézio conta também que o museu, mantido pelo Instituto Banese, foi reconhecido como instituição de utilidade pública municipal, estadual e federal e poderá ser beneficiado com a política de isenção fiscal.

Caminhos

Mas como conciliar público satisfatório com sustentabilidade? O desafio é latente, mas muitos museus estão encontrando caminhos. O Instituto Ricardo Brennand, no Recife, de iniciativa privada, mas reconhecida como de utilidade pública pelo Governo de Pernambuco, já consegue pagar as próprias contas. Claro que não vive só de público, nem dos produtos vendidos na lojinha ou das vendas da charmosa lanchonete. A bilheteria é um dos fatores, mas o aluguel do espaço para eventos e a política de parcerias têm assegurado boa parte da receita. A coordenadora de gestão do Instituto, Nara Galvão, conta a estratégia e como tem atingido resultados importantes. O modelo é voltado para três focos: cultura 46

enquanto educação, cultura enquanto turismo e o museu como possibilidade econômica para se tornar autossustentável. “Não dá só para ficar vinculado a patrocínio, a gente tem que ter o máximo de receita possível para ficar autossustentável sem esquecer a missão”, destaca, ressaltando que um dos aplicativos mais importantes para atingir o objetivo são as estratégias usadas através do Plano Museológico. Sem isso, na avaliação dela, tudo ficaria muito difícil. Melhor: impossível. Nara compartilha da mesma opinião de Aluízio Câmara e acha que todo museu deveria estar antenado a isso. Afinal, considera que é a base de todo planejamento. No Instituto Ricardo Brennand é assim há quase dois anos. Primeiro foi definida a parte operacional, quando foi diagnosticada a real situação do Instituto. Depois, foi diagnosticada a situação ideal (mostrando o que deveria ser feito para atingir essa situação ideal, que vai do ponto de vista operacional ao econômico) e, por fim, que é a fase atual, é a definição de projetos para sanar falhas e atingir objetivos. Dentro da estratégia do Instituto, planejamento é lei. “Por volta de julho, todos os setores entregam o planejamento do ano seguinte. Eles têm autonomia para planejar e propor o que acham que será produtivo, eu compilo tudo, apresentamos em assembléia, e daí sai o orçamento e o plano do próximo ano”, conta Nara, destacando que assim os resultados estão chegando de maneira satisfatória. “Adotamos um sistema de análise administrativa no qual é possível identificar pontos fracos e pontos fortes e a partir daí ataca-

mos o que temos que atacar e exploramos o que temos de melhor”. Nara já tem mesmo o que comemorar. O instituto Ricardo Brennand é o nono museu mais visitado do Brasil e o primeiro do Nordeste. A média de visitação não é inferior a 150 mil visitantes por ano. Em dez anos de funcionamento, 1,8 milhão de pessoas já passaram por lá. A receita deste sucesso também é mergulhada em estratégia. É trabalhada uma dinâmica para o acervo, para que sempre desperte a atenção, e também existe um trabalho de formação de público. Um desses projetos é o Acordes para o Museu, que leva música aos jardins do Instituto uma vez por mês. Só isso tem garantido um incremento de público de pelo mesmo 100 pessoas. E vem mais novidades por aí. Além de novas exposições, o Instituto vai deflagrar no segundo semestre deste ano um trabalho com a comunidade da Varzéa, atento ao seu papel social. Quer interagir com a comunidade em via de mão dupla. Indo até ela e a atraindo para o museu. O Museu de Arte do Rio de Janeiro, inaugurado recentemente, segue a linha de identificação com a comunidade. Desenvolveu uma agenda específica de atividades para os moradores do seu entorno. Com base em um cadastro, o acesso é gratuito.

Alternativas

Se sustentabilidade é meta, São Paulo encontrou o caminho das organizações sociais da cultura (OS). A Secretária estadual de Cultura informa que estão sob o comando dessas organizações dezoito museus. Entre eles, o badalado


plantação da política definida pelo poder público. A informação dá conta de que, no caso dos museus, a parceria garantiu mais agilidade na execução das exposições e da programação cultural, incluindo mostras internacionais. Outro ponto destacado é a possibilidade de contratação profissionalizada, o que garante a manutenção de quadro de pessoal qualificado e eficiente. “Depois da adoção do modelo de gestão por Organizações Sociais de Cultura houve um aumento significativo de

Portugesa, que tem 4.333 metros) até o modelo de gestão. Modelo que ainda está em estudo pela Fundação Gilberto Freyre, que fez convênio com o governo do Estado no projeto, mas uma coisa o secretário executivo de Desenvolvimento Econômico,Felipe Chaves, adianta: “a sustetantabilidade é uma meta”. Interatividade, tecnologia, acervo atraente, exposições itinerantes, diálogo com outros museus da cidade, portas abertas para a economia criativa. Muita coisa vai acontecer neste novo espaço e o foco é o pú-

Foto: Inst. Banese/ Divulgação

Foto: Tatiana Nascimento

Museu da Língua Portuguesa, que atingiu a marca de três milhões de visitantes em maio, o Museu do Futebol e a Pinacoteca. O diretor do Museu da Língua Portuguesa, Antônio Carlos Sartini, diz que os desafios continuam, mas já dá para respirar. O governo entra com aporte de 60% dos recursos e os outros 40% devem ser gerados por estratégias de gestão estabelecidas. E isso a OS é que tem que dar conta. Existem metas a serem cumpridas e elas são perseguidas. A Pinacoteca, segundo a

Louvre, Paris - Museu mais visitado do mundo secretaria, é outro bom exemplo. Em 2011, o museu captou R$ 1.596.737,00 com atividades e produtos diversos, superando em 6% a meta estabelecida no contrato de gestão para esta ação. Outros R$ 7.043,890 foram captados através de patrocinadores. No final das contas, o resultado é que a Pinacoteca captou em fontes externas 25% do seu orçamento total. A secretaria de Cultura informa, ainda, que o contrato firmado entre Governo e OS melhorou a im-

Museu da Gente Sergipana, Aracaju

público atendido, da qualidade dos serviços prestados e da preservação dos acervos que constituem o o patrimônio museológico do Estado”. Em dezembro, os pernambucanos vão ganhar um moderno equipamento. O Centro Cultural Luiz Gonzaga, com investimentos previsto até agora de R$ 63 milhões, é um projeto ousado. Desde a área, que vai ocupar - 7.500 metros, no cais do Recife Antigo ( maior do que o Museu da Lingua

blico. Muito público. Mas como acomodar tanta gente, ônibus de estudantes, de turistas em uma área já tumultuada do trânsito na cidade e precária em termos de estacionamento? A logística também está sendo cuidadosamente estudada. Os museus, como se vê, estão buscando novos caminhos e a tendência aponta para muitas novidades. O Brasil avançou, encarou os desafios e nessa nova ordem, criatividade, tecnologia e boa gestão caminham juntas. 47


Foto: Arq. pessoal/ Divulgação

>> entrevista

Marcello Dantas | Curador

Você acha que os museus estão em uma fase de reinvenção? Eu acho que o que aconteceu com os museus no Brasil é que durante todo o período da ditadura e depois da recessão o Brasil não só não criou museus como não repensou seus museus. Eles ficaram meio que congelados no tempo. Só que o mundo mudou. Há uma revolução digital, uma revolução de linguagem, uma mudança de como a gente utiliza esse instrumento superpoderoso que são os museus para a sociedade. Ao ficarem congelados, eles perderam completamente sua eficácia. E o museu é um excelente instrumento de inclusão social. Como você enxerga o museu? É uma porta de resgate de coisas que ficaram perdidas. Ao mesmo tempo permite, hoje, uma composição de novas possibilidades. Um novo desenho de como a gente quer conviver com o País. Que é um país inclusivo. Há uma transformação enorme neste cenário. E 48

Um nome: Marcello. O sobrenome: Dantas. Vários adjetivos. Mágico dos museus. O fazedor de museus. Não por acaso, esse curador carioca, radicado em São Paulo, é tão badalado. As digitais dele estão em alguns dos projetos mais ousados e comentados do Brasil. Sempre como sinônimo de sucesso, como o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, e o Museu da Gente Sergipana, em Aracaju,onde arte e tecnologia são parceiras. Dantas fala, nesta entrevista, das tendências e dificuldades do setor. E avalia que os museus estão, de fato, passando por um processo de renovação. nos últimos anos, o Brasil correu atrás desse prejuízo. Toda uma mudança que houve no mundo nos anos 1960, 1970, 1980 e que o Brasil não acompanhou. Nos últimos dez anos o país acordou para fazer alguma coisa importante. Por sorte, hoje o Brasil tem uma referência forte no mundo como um lugar que conseguiu pensar o papel de exposições e museus para o grande público. Sistematicamente, The Art Newspaper, que é a principal publicação de arte no mundo, coloca o Brasil no ranking de exposições mais visitadas do mundo. Você acha que existe uma receita de sucesso para os museus? Receita é um negócio complicado, mas uma coisa eu posso garantir. Não se pode excluir o jovem nem as crianças dos museus. Isso é certo porque eles representam mais de 50% do público. Isso é uma lei. Alem disso, é preciso fazer coisas que aproximem as pessoas dos conteúdos. Que fa-

çam elas se sentirem convidadas. Se sentirem entendendo aquilo que está lá. O brasileiro pode não ser profundamente letrado, mas ele é muito fortemente alfabetizado audiovisualmente. Tem uma educação audiovisual muito forte por causa da televisão. O uso de tecnologias audiovisuais tem um funcionamento muito eficaz nos museus porque o brasileiro é acostumado com isso. A tecnologia veio para ficar realmente neste setor? Isso vale para sociedade como um todo. Os museus são apenas um pequeno retrato disso. A tecnologia faz parte de como a gente se relaciona hoje. Não é mais uma coisa eventual. É uma coisa que está ai a cada minuto. A cada telefone, a cada facebook, a cada twitter. Ela está entrando na nossa vida. Isso é uma condição da sociedade. Agora, o que eu acho é que é preciso prestar atenção para a gente não perder. O museu não é um parque tecnológico.O museu


nunca deveria falar da tecnologia, deveria falar da vida. No Museu de Sergipe falamos do peão, do jogo de amarelinha, do carrossel, do barco... Só que para fazer isto dentro de um museu fica muito mais interessante com o uso da tecnologia. Estamos falando de coisas que são do mundo normal. Qual a avaliação que você faz, do ponto de vista de gestão, dos museus. gov e dos museus s.a?

cher as lacunas que ela tem. Por isso tem uma ansiedade em cima daquilo. Tem umas coisas que eu acho meio malucas. O Museu de Rodin, na Bahia, não vejo o menor sentindo porque não agrega absolutamente nada. Não cria o link. Você pode ter Frans Post em Recife que é excelente. É muito bacana porque tem a ver com o Brasil, com compreensão da nossa identidade. O Museu da Língua chega no cenário real-

Se o museu oferecer a mesma coisa que o Google é melhor fechar. A experiência do museu é muito mais rica. O que eu adoro no Museu da Língua é que quando a garotada houve falar dele a reação é a seguinte: museu? Uhhhh!, Língua portuguesa? Uhhhhh. Museu? Língua Portuguesa, de jeito nenhum. E sai de lá adorando tanto museu quanto a língua portuguesa porque é divertido. Essa é a jogada da coisa.

Museu só vai funcionar com parceria público-privada

O museu só vai funcionar se houver uma parceria público-privada. Precisa das duas coisas. Vai precisar do governo sim, porque boa parte do patrimônio espacial está nas mãos dele, como os imóveis, e vai precisar do dinheiro privado sim, de autonomia de gestão que permita que eles sejam tratados com agilidade. Vai precisar de uma junção de forças. As duas coisas são importantes. A gente não pode separá-las. Os museus fazem parte de uma ação para o benefício comum da sociedade. O museu da Língua Portuguesa é uma referência no tocante ao sucesso de público, as novas tendências? Não existe uma única fórmula. O que existe é que em cada sociedade você tem que ir lá e preen-

mente como novidade no cenário porque propõe uma ideia completamente ousada. É uma coisa que nunca tinha sido usada, falar da língua, e ao mesmo tempo usando fortemente a tecnologia para apresentar essa língua. São duas coisas muito inusitadas. Você acha que o Brasil avançou do ponto de vista de incentivo; da própria legislação? Estamos em sintonia com o que acontece no mundo? Acho que o Brasil está em sintonia sim. O problema do Brasil é como conseguir acervos. A gente não encontrou um caminho eficaz de fazer isso, mas acho que isso vai mudar. O Brasil está alinhado com o que está acontecendo no mundo. O museu concorre com o Google?

O Museu da Língua fez a estreia dessa nova linguagem no Brasil. Houve muita resistência? Muitas. Desde o uso do imóvel até a própria ideia, mas como a gente tinha um projeto que era bastante forte, ele ia empurrando as etapas. A partir do momento que o negócio vira um sucesso, mesmo quem era contra, todo mundo passa a paternalizar. Faça sucesso que vai ter vários pais. Quando você pensa um museu, você pensa em sintonia com a comunidade? Eu tento criar um museu para as pessoas daquele local. Para que que as pessoas tenham orgulho. O museu de Sergipe virou o centro cultural do lugar. E isso que eu quero. Que seja um polo. 49


Museus em

nĂşmeros

Fonte: Cadastro Nacional de Museus - Ibram / Minc, 2010

50


Que museus são organizações, ninguém duvida: empregam pessoas que prestam serviços para atender a clientes/ usuários agregando valor ao negócio, atraindo e fidelizando esses clientes, mesmo que, essencialmente, não tenham foco na mercancia. Em sendo organizações, operam em mercados. No caso dos museus, atuam nos mercados da cultura, do lazer, da informação e do entretenimento, nos quais vários atores – públicos e privados – coexistem, e cujo público consumidor, na essência, é um só, ainda que possa ser segmentado em clusters como, por exemplo, “poder aquisitivo”, “estoque cultural” ou “grau de instrução”. Museus disponibilizam aos seus usuários conteúdos informacionais, produtos que também são entregues por outras mídias. Por exemplo, informações sobre animais pré-históricos podemos obtê-las nos livros, ou acessar conteúdo na internet, ou visitar um museu de história natural. Para vermos o sorriso da Mona Lisa, o temos disponível em versões impressas, eletrônicas e ao vivo, no Louvre. A diferença entre essas mídias reside na forma de entrega: ao museu, soma-se ao serviço básico a experiência contextualizada, orientadora do pensamento dos usuários, o que normalmente não é oferecido por esses outros atores. Organizações que entregam produtos ou serviços semelhantes em mercados não monopolizados enfrentam CONCORRÊNCIA. E como Michael Porter nos ensina: para obter o sucesso nesse ambiente demandam estratégica competitiva. Assim, museus convivem hoje em dia em um ambiente concor-

rencial, no qual atuam produtos substitutos. Olhando-os como um negócio, para fazer frente a esses substitutos, precisam se valer de estratégias competitivas baseadas na diferenciação, ou seja, oferecer produtos e serviços – os conteúdos informacionais – que agreguem maior valor aos clientes do que aqueles oferecidos pelos concorrentes. Para o gestor de um museu, um ponto de diferenciação pode residir no conteúdo. Para o bom combate a esses concorrentes, ao gestor compete utilizar as ferramentas de gestão na qualificação do que é oferecido ao visitante, na forma de MAIS conteúdo do que, por exemplo, os livros ou a grande rede disponibilizam. Museus diferenciam-se através da orientação do pensamento do visitante, fazendo-o explorar o imaginário, oferecendo uma experiência única, sensorial até, inserindo-o naquilo que está sendo mostrado. Esse é o mundo da interatividade, no qual bons conteúdos informacionais – e é importante não esquecer essa qualidade intrínseca de um acervo museológico – são enriquecidos com experiências estimulantes, que conduzam o visitante a vivenciar a realidade ali reproduzida. E interatividade não é, necessariamente, tecnologia, mas sim um meio de comunicação, usado para facilitar a geração, no observador, de saber e de conteúdo sobre o que está sendo observado. O gestor de um museu pode tomar emprestadas as reflexões da Teoria Neoclássica acerca dos Arranjos Organizacionais para extrair outra ferramenta muito útil na gestão desse negócio: a estruturação matricial em rede.

Foto: Daniela Nader

CONTRA PONTO

Vânia Campos Gerente Geral de Profissionalização da Gestão Secretaria Executiva de Desenvolvimento do Modelo de Gestão-Instituto Gestão PE Secretaria de Planejamento e Gestão

Esta visão demanda aos gestores enxergar esses equipamentos como estruturas componentes de uma rede sistêmica, articulada, integrada e complementar, de instalações que servem à cidade e aos seus habitantes em diversas áreas, tais como educação, cultura, lazer, preservação da identidade, produção do conhecimento, formação de cidadania, documentação do patrimônio e inclusão social, dentre tantas. Foi-se o tempo em que o museu era visto como um fim em si mesmo. O museu serve à cidade, e não ao contrário. Nela cumpre um papel, e é nela que deve buscar a fatia principal de seu público. Esse novo foco demanda aos gestores a busca constante de alternativas para enriquecer as interações com as diversas comunidades por ele afetadas: oficinas, cursos, programações para públicos específicos, políticas de acessibilidade física, sensorial e intelectual, exposições extra-muros, atividades educacionais, articulações com outras mídias, prestação de serviços... enfim, i-n-o-v-a-ç-ã-o! 51


conta certa

Por Mariano Lafuente Especialista Sênior para a Modernização do Estado, BID

Melhoria da Qualidade dos

Gastos Públicos na América Latina: rumo à Consolidação da Orçamentação por Desempenho 52


Muitos governos latino-americanos, tanto em nível nacional quanto estadual, estão empenhados em aumentar a qualidade dos gastos públicos e melhorar a capacidade do setor público de alcançar resultados no processo de desenvolvimento. Aumentar a qualidade do gasto público exige, dentre outras ações, o fortalecimento dos elos entre as prioridades estabelecidas para curto e médio prazo, suas dotações orçamentárias e os resultados esperados e alcançados. A introdução da orçamentação por desempenho, que tem como objetivo final melhorar a qualidade dos gastos públicos através de uma alocação mais eficiente e uso dos recursos de acordo com objetivos políticos e sociais, é claramente um dos principais instrumentos que os países em nossa região têm utilizado nos últimos dez anos para atingir este fim. Orçamentação por desempenho é geralmente um dos componentes presentes nos grandes esforços do setor público mais alinhados com as prioridades de modernização do governo, que visam melhorar a eficiência e a eficácia dos serviços públicos. Segundo Allen Schick, “[...] O orçamento por desempenho pode prosperar somente quando incorporado aos arranjos gerenciais que produzem resultados primordiais [...]”. Orçamentação não pode ser significativamente alterada de forma isolada do contexto de gestão em que atua. Esta ligação faz com que a reforma do orçamento seja tanto mais complexa quanto mais simples -

mais complexa, porque a agenda sistemática da orçamentação por da reforma deve ser ampliada para desempenho e a ênfase em dispoincluir a gestão pública, e mais nibilizar tais informações de uma simples, uma vez que o orçamento forma simples, constituem bases por desempenho pode ser imple- necessárias para melhorar os nímentado com sucesso quando as veis de responsabilidade social, unidades de gestão são orientadas transparência e capacidade de respara resultados (Schick, 2003: 102). posta (Arizti et al, 2009). Tal uso da Em muitos casos, essas refor- informação dos resultados no plamas também foram concebidas nejamento de atividades públicas para promover a capacidade de e a garantia da responsabilização resposta do setor público e a trans- pelos resultados, permitindo uma parência na prestação de contas à variação na maneira de como essa sociedade. Além de promover um informação é usada, pode ser defimaior alinhamento entre as prio- nido como orçamentação orientada ridades estratégicas, as efetivas pelo desempenho. dotações orçamentárias e a sistemática aperfeiçoada de monitora- Orçamentação por mento de projetos estratégicos, o desempenho versus orçamento por desempenho cria novos incentivos para as Secreta- orçamentação tradicional Há três características princirias, órgãos do governo e gestores, pais do sistema de orçamentação no sentido de aumentar o foco em pelo desempenho que o distingue desempenho e resultados. Como se procede esta aloca- dos sistemas de orçamento tradição mais eficiente de recursos em cional: I. foco explícito na consecução consonância com objetivos políticos e sociais? Orçamentação por dos objetivos do programa público desempenho torna a informação do e seu alinhamento com as políticas resultado (2) disponível para os to- governamentais, evidenciado pelos madores de decisão de forma que A orçamentação por lhes permite co n e c t á - l a desempenho é um dos principais – em geral instrumentos que os países – com planejamento em nossa região têm utilizado e ações gerenciais, de nos últimos dez anos modo que as decisões orçamentárias são informadas por medição seguintes fatores: (a) maior utilide desempenho, além de outras zação de metas de resultado e (b) fontes de informação como a expe- produção e uso de uma variedade riência, informações qualitativas e de indicadores em todo o sistema prioridades políticas. A utilização de orçamento; 53


II. novos arranjos institucionais que criam uma rede de pactos baseados em desempenho, que oferecem incentivos para que o setor público caminhe de uma posição de conformidade com os resultados, em direção a uma cultura voltada ao desempenho e atingimento de metas; e III. ênfase em manter os altos gestores como responsáveis pelas entregas, muitas vezes acompanhada de uma mudança na natureza tradicional do controle de despesas para um controle no qual os gestores são responsabilizados tanto pelos resultados quanto pela utilização dos recursos.

Pré-requisitos básicos para a introdução e consolidação da Orçamentação por Desempenho

O fundamento básico da orçamentação com base no desempenho é a procura e acesso a informações confiáveis e desenvolvimento de sistemas de gestão de informações que sustentem as quatro fases do ciclo orçamentário: elaboração, aprovação, execução e avaliação/auditoria. Além desta condição institucional, deve-se considerar características técnicas que apóiem essa forma de orçamentação. Três das mais importantes reformas técnicas implementadas por países que fizeram progresso nesta área incluem: a classificação dos orçamentos por objetivos e programas; a garantia de um sistema de informação integrado de gestão financeira (IFMIS); e o reforço do papel do monitoramento e avaliação e garantia da qualidade 54

das informações dos resultados. E quais as implicações de tais reformas? I. Classificação dos orçamentos por objetivos e programas. O objetivo é alocar recursos com base nas prioridades das políticas públicas e transformar o orçamento, migrando de um sistema baseado num controle tradicional para um sistema focado em atender às metas de entregas de produtos e resultados. Isto implica na estruturação de ações administrativas em termos de programas que reflitam as políticas do governo e na criação de um programa de estrutura para o orçamento – ou pelo menos partes dele – que permita uma maior autonomia dos gestores, estabelecendo um consenso sobre a utilização de informações de desempenho no orçamento e estimativas plurianuais – e a introdução de mecanismos formais que assegurem que a transparência seja baseada nos resultados destes programas. A introdução de uma classificação programática não representa por si só, uma mudança significativa. Nos estágios iniciais da reforma, um programa pode simplesmente ser a junção de atividades de uma secretaria ou órgão do Estado, ao invés de um reflexo da relação de tais atividades com as políticas do governo. Neste caso, as medidas de desempenho do programa estarão certamente mais ligadas a resultados administrativos do que a resultados das políticas públicas; II. a garantia de um sistema de informação integrado de gestão financeira (IFMIS – Integrated Financial Management Information System), que também seja capaz de suportar sistemas de informação de desempenho. Os elemen-

tos básicos de um IFMIS incluem a gestão de orçamento, contabilidade, tesouraria, gestão da dívida, aquisições e contas públicas. Tal sistema é essencial em todas as fases do processo orçamentário para ajudar a promover uma boa gestão fiscal, especialmente nas duas primeiras fases do ciclo – a elaboração e a execução. Na elaboração do orçamento: quantificar o custo de produção de resultados é essencial para fins de planejamento, como por exemplo: um determinado resultado esperado que custe certo valor não será visto da mesma forma caso seu

Quantificar o custo de produção de resultados é essencial para o planejamento custo seja muito maior. Informações precisas acerca dos resultados do ano anterior e os custos de obtenção de tais resultados são essenciais para o planejamento, uma vez que gestores de orçamento compreendem e negociam o orçamento com base no custo-resultado; Na execução do orçamento: os gerentes precisam de informações reais e devem manter registro do controle de gastos do programa. Quando o orçamento não está integrado com os contratos, contabilidade e tesouraria, nem gestores de orçamento nem gerentes de programa terão valores de despesas que sejam confiáveis para que possam comparar com a execução


orçamentária e física do projeto. Sistemas de controle de acompanhamento frágeis podem ainda esconder obrigações ou contingências em todo o sistema, tornando ainda mais difícil responsabilizar gestores de programas por maus resultados, uma vez que problemas de gerenciamento de caixa pode ser a principal causa. III. O reforço do papel do monitoramento e avaliação e a garantia de qualidade dos indicadores de desempenho. Os indicadores de desempenho precisam ser apoiados por uma avaliação do programa. Por si só, medidas de desempenho normalmente não são suficientes para fornecer evidências conclusivas da eficiência, efetividade e economicidade de um programa. Portanto, avaliações mais aprofundadas do programa são muitas vezes fundamentais para proporcionar avaliações analíticas e qualitativas em vários estágios de implementação do programa. Tais avaliações podem ser realizadas internamente ou por agências externas. Em termos de indicadores, os países da OCDE têm buscado garantir sua qualidade apoiados em medição, monitoramento e relatórios. Estes indicadores são principalmente baseados em produtos e resultados (reduzidos a um número mínimo por programa) e são acordados entre o órgão central – seja o Ministério ou Secretaria de Planejamento – e os órgãos responsáveis pela execução do programa. Cada uma dessas reformas leva tempo para ser implementada e sua revisão periódica e melhoria, juntamente com outros desafios mencionados adiante, devem fazer parte da agenda de qualquer governo comprometido com a im-

plementação da orçamentação pelo desempenho como um instrumento de melhoria da qualidade dos gastos públicos.

Desafios para a Consolidação da Orçamentação por Desempenho

Há riscos e desafios comuns enfrentados pelos governos na implementação da orçamentação pelo desempenho. Dentre eles, incluem-se: o desenvolvimento de fortes indicadores de desempenho que sejam de fácil compreensão; a identificação de maneiras de integrar a informação de tais indicadores nos processos de orçamentação – processos muitas vezes excessivamente rígidos – às informações financeiras tradicionais; o suprimento em tempo hábil de informação apropriada e relevante aos tomadores de decisão e, por fim, a criação de incentivos que considerem esta informação nas decisões orçamentárias e no processo de

América Latina tem um longo caminho para consolidar o orçamento por desempenho apoio a reformas. Em vários países, por exemplo, o Poder Legislativo reclama da sobrecarga de informação fornecida pelo governo através de muitos indicadores que realmente dificultam o processo de análise e priorização. Indicadores

de desempenho podem ser muito técnicos e confusos para o público. Em alguns casos, tais informações de resultados têm ocasionado dificuldades, com órgãos jogando com o sistema, gerando por diversas vezes resultados opostos. A coleta dessas informações pode ainda ser por demais onerosa e isso deve ser considerado em relação aos seus potenciais benefícios. Enquanto há países e governos estaduais que fizeram consideráveis progressos na última década, a América Latina e muitos outros países ainda têm um longo caminho a percorrer para consolidar e institucionalizar o orçamento por desempenho. Quatro dos principais obstáculos que os impulsores da reforma precisam superar são: I. A tendência dos gestores públicos olharem retroativamente, para os gastos do ano fiscal anterior, ao invés de olharem adiante para avaliar as necessidades para o ano seguinte, durante a formulação do orçamento. A maioria dos governos latino-americanos continuam a tomar decisões baseadas no balanço orçamentário do ano anterior, adicionando-lhe um valor incremental, sem que haja relação alguma com os programas e resultados. II. A rigidez do orçamento, as bases legais e os complexos arranjos institucionais. Independentemente do uso de informação sobre o desempenho, durante o ciclo orçamentário, despesas de pessoal e dotações específicas – que já restringem a flexibilidade para a priorização de programas durante a preparação do orçamento – ainda reduzem a possibilidade de ação. O verdadeiro teste é avaliar se a informação do desempenho muda a 55


forma como as decisões orçamentárias são feitas. A não ser que em algum momento durante a formulação do orçamento – ou nas suas fases de execução – haja um processo de decisão para acomodar novas prioridades, o uso de tal informação será puramente formal e muito limitado. As bases legais, por sua vez, tendem a enfatizar o controle e a aplicação de regras, impedindo assim a adoção de ações que os indicadores de desempenho

que garanta que os fundos sejam efetivamente empregados para os fins previstos (Schick, 2008). (iv) A falta de uma cultura orientada pelo desempenho dentro do setor público. Essa questão é refletida nos baixos níveis de responsabilização dos gestores quando os objetivos não são alcançados e na indiferença dos servidores públicos, operacionais em geral, que muitas vezes não se sentem motivados o suficiente para alcançar os

mais decisiva informações de desempenho no ciclo orçamentário. Os pré-requisitos institucionais e técnicos para a orçamentação por desempenho têm evoluído substancialmente. A demanda por informações dos resultados de programas é forte na maioria dos países e tende a aumentar com a consolidação de um novo cidadão, que, através do seu papel de cliente e eleitor, tem percebido mais seriamente sua posição de beneficiário final das polí-

possam sugerir como ideais. Arranjos institucionais tendem a ser complexos. III. A ligação pouco clara entre recursos e resultados e a incerteza de que os recursos alocados para as prioridades da política pública são realmente gastos com o fim para o qual eles se destinam. Embora a informação dos resultados de determinados programas possa ser divulgada, o montante de recursos que lhes são atribuídos podem não apresentar uma relação direta com seus resultados. Além disso, o governo pode não dispor de um sistema de informação confiável

objetivos do programa por falta de uma política de remuneração baseada na meritocracia ou de políticas de promoção funcional, dentre outras questões (Schick, 2008).

ticas do governo, posição essa assegurada por nossas democracias. Essas demandas são apoiadas por mecanismos mais fortes de tecnologia da informação que permitem uma maior participação, visto que informações de desempenho mais transparentes, promovem uma participação mais ativa. Sistemas de gestão financeira tornaram-se mais confiáveis e, em alguns casos, começaram a incorporar informações de desempenho. Alguns países e governos estaduais estão distanciando-se de processos de orçamentação tradicional e gradualmente caminham para a formu-

56

Rumo à Consolidação da Orçamentação por Desempenho na América Latina

Após vários anos de esforços, e apesar dos desafios e obstáculos mencionados acima, alguns governos latino-americanos têm progredido notavelmente na última década no sentido de integrar de forma


lação e execução do orçamento com foco em resultados ou prioridades estratégicas. Monitoramento e avaliação do programa têm melhorado consideravelmente em todos os países, com o desenvolvimento de indicadores de desempenho metodologicamente sólidos e linhas de base de confiança, que são monitorados regularmente. Avaliações de programas externos agora são extremamente comuns na América Latina.

Todos estes esforços contínuos e graduais têm contribuído para o desenvolvimento de uma distribuição mais eficiente e uso dos recursos de forma mais consistente com os objetivos políticos e sociais, melhorando assim a qualidade dos gastos públicos. Dessa forma, os governos se beneficiam ao continuar adotando uma abordagem gradual, certificando-se de que controlam os recursos antes de controlar os produtos ou mesmo fazendo referência aos resultados. A superação dos obstáculos mencionados acima deve levar a uma abordagem mais clara sobre

produtos e resultados durante as discussões do orçamento, direcionando assim a priorização ou a interrupção de programas. Decisões sobre o orçamento devem ser feitas com vistas a um horizonte plurianual, vinculando-se o planejamento ao orçamento. Controles devem ser realizados no sentido de rastrear as despesas, de forma que sejam efetivamente empregadas na sua destinação. O sistema deve ser transparente e capaz de informar aos cidadãos sobre a execução orçamentária, alocação e resultados dos programas do governo. Aos gestores do setor público deve ser dada a maior flexibilidade possível para a obtenção de resultados do programa e devem ser responsabilizados se estes objetivos não forem alcançados. Os resultados obtidos devem ser regularmente comparados aos resultados esperados e a avaliação do programa deve ser institucionalizada de modo a orientar as decisões futuras relativas a novas políticas públicas e formulação de programas. Todos estes esforços devem ser parte de uma agenda mais ampla de reforma da gestão pública, que enfatiza o desempenho e utiliza orçamentação informada pelo desempenho como um dos seus principais instrumentos.

Notas

O artigo, escrito por Mariano Lafuente, está baseado principalmente no working paper de Arizti, Lafuente, Manning, Rojas e Thomas, Performance-Informed Budgeting in Latin America: Experiences and Opportunities (Working paper 0309 Series on Public Sector Management, Banco Mundial, Abril de 2009) (2) O termo resultado, como uma

medida, refere-se não apenas a recursos – mas também a produtos ou resultados, ou mesmo a arranjos gerenciais e processos. Cada vez mais, os países estão tentando avançar em direção a medidas de resultado.

Referências

Arizti, P, Brumby, J; Manning, N; Senderowitsch, R; Thomas, T Results, Performance Budgeting and Trust in Government, Public Sector and Governance Unit for Latin America and the Caribbean, World Bank, Washington, DC, 2010. Disponível em: www.worldbank.org/bookperformancebudgeting Arizti, P.; Lafuente, M.; Manning, N., Rojas, F. and Thomas, T. Performance-Informed Budgeting in Latin America: Experiences and Opportunities, Working paper 0309 Series on Public Sector Management, April 2009. Disponível em: http://siteresources.worldbank. org/EXTLACREGTOPPUBSECGOV/ Resources/LCSPS_Working_Paper_0309_Performance_informed_ budgeting.pdf Shick, A., The Performing State: Reflection on an Idea Whose Time Has Come but Whose Implementation Has Not, in OECD JOURNAL ON BUDGETING – Volume 3 – No. 2, OECD 2003. Disponível em: http://www. oecd.org/dataoecd/35/5/39168822. pdf Shick, A., “Orçamento para Resultados: Obstáculos e Oportunidades”, PRODEV, Banco Inter-Americano de Desenvolvimento, Curso Nacional sobre GpR, Brasília, 2008. vbr/secretarias/upload/Arquivos/seges/prodev/arquivos/prodev_ARQ_ Schick_opportunites19nov.pdf 57


capital humano

Gestão de desempenho, ela veio para ficar e

transformar

Pare um pouco e pense. Como vai seu desempenho no trabalho? “Muito bem, obrigado”, “devagar, quase parando” ou “seguindo a maré”? Talvez você precise de mais algum tempo. Pensar no próprio desempenho pode ser algo novo para você. Mas para muitas empresas não é. Cada vez mais elas têm implantado a gestão de desempenho, que não avalia apenas os indicadores numéricos de produtividade do funcionário. Considera também o comportamento e o desenvolvimento do profissional. Governos e empresas públicas também começam a usar a ferramenta e têm como um dos principais desafios mudar a percepção de que a avaliação de desempenho é uma espécie de inquisição. Para evitar mal entendidos e fazer a ferramenta funcionar de verdade, Vanci Magalhães, diretora da JBV Soluções em Recursos Humanos, afirma que a gestão de desempenho deve ser um desmembramento do plano estratégico da empresa ou governo. “Antes de qualquer coisa, é preciso implantar os indicadores para as funções, ter um plano de carreiras, objetivos e metas”. Vale tanto para o se58

tor privado quanto para o público. “Tem que informar o que espera do profissional. Para medir se ele me atende ou não, dentro daquilo que eu espero dele, tenho de ter aquilo definido. “O setor de recursos humanos deve estar estruturado para isso. “Quando você tem um plano de cargos e carreiras, já sabe para onde vai crescer.” Na Petrobras, o modelo de gestão de desempenho abrange os empregados de todas as unidades. E em todos os níveis da estrutura organizacional. Não escapa ninguém. Segundo a estatal, o modelo é usado como referência para o avanço de nível e promoção, e avalia os empregados por suas metas e competências. Anualmente, todos os empregados recebem uma análise dos próprios desempenhos. “O empregado e seu gerente analisam os trabalhos desenvolvidos e os resultados alcançados e avaliam a oportunidade de desenvolvimento e crescimento do empregado dentro da companhia”, informa a Petrobras. Essa análise conjunta entre chefe e subordinado já é uma evolução das técnicas de avaliação. No artigo Gestão de competências e gestão de desempenho: tecno-

logias distintas ou instrumentos de um mesmo construtor?, os mestres em administração Hugo Pena Brandão e Tomás de Aquino Guimarães destacam a evolução das técnicas no decorrer dos anos. No início, existia apenas um modelo de avaliação de mão única, quando o chefe fazia unilateralmente um diagnóstico dos pontos fortes e fracos do subordinado. Depois, chefe e subordinado passaram a discutir em conjunto o desempenho (como é feito na Petrobras). Mais recentemente, surgiu a avaliação 360 graus. “Ela pressupõe a utilização de múltiplas fontes, ou seja, a avaliação do empregado por diversos atores no trabalho, como os clientes, pares, chefe e subordinados”, explicam os autores. Vanci Magalhães destaca que, se tudo for feito de maneira clara e os resultados forem realmente empregados, a avaliação 360 graus funciona muito bem. Assim como os outros modelos. “A base tudo no RH é a transparência.” No governo de Minas Gerais, a gestão de desempenho monitora as “entregas” de cada servidor com o objetivo de melhorar a qualidade dos serviços públicos prestados à população. Nada mais natural, já que todos es-


Foto: Agência Petrobrás

PETROBRAS Estatal avalia todos os empregados, de todos os níveis, com base em metas e competências tão trabalhando para a sociedade. Há o planejamento, no qual cada servidor tem um Plano de Gestão de Desempenho Individual (PGDI), com a definição das “entregas” previstas para o ano. O desempenho é acompanhado e o servidor vai recebendo feedback, o que permite a correção de possíveis erros. Em Pernambuco, o Programa de Avaliação de Desempenho foi

criado com o objetivo de dar mobilidade e dinamicidade aos planos de cargos, carreiras e vencimentos dos servidores. É um requisito para quem deseja – e quem não deseja? – uma progressão horizontal (passagem entre as faixas salariais) – ou uma vertical (passagem entre as classes). Tem como foco o plano de metas específicas das secretarias, a qualidade dos serviços oferecidos

SAIBA MAIS... Os cinco passos da gestão de desempenho 1. Definir o que a empresa/órgão público deseja e até onde quer chegar 2. Deixar claro para todos o que precisa ser feito para que os resultados apareçam 3. Incorporar a filosofia à rotina do ambiente de trabalho 4. Convencer profissionais que se trata, também, de uma oportunidade de crescimento profissional 5. Capacitar a equipe em relação ao processo de avaliar e ser avaliado

e a melhoria da qualidade do gasto público. A avaliação acontece em duas etapas: chefia imediata e autoavaliação. Também são adotados critérios para análise (12 para quem exerce cargo de chefia e oito para os que não exercem). Durante as avaliações são observados itens como planejamento e organização, trabalho em equipe, foco nos resultados, pró-atividade e liderança, responsabilidade e compromisso e imparcialidade. Para não “queimar” a ferramenta, os líderes de cada órgão recebem treinamento para o estabelecimento das metas junto às equipes e o acompanhamento dos resultados de cada uma delas. Como acontece em Minas Gerais, o servidor é orientado sobre o seu desempenho. Os pontos negativos, depois de identificados, são corrigidos para melhorar a atuação do servidor. Ganha o profissional e ganha a sociedade. 59


estratégia

C ultura organizacional e fo co e m r e s u lta d o s Dez, vinte anos se passaram. Nem é tanto tempo assim, mas para o setor privado no Brasil foi mais do que suficiente para provocar mudanças radicais. Que o digam os setores bancário e automobilístico. A quantidade de trabalhadores caiu para menos da metade, enquanto que o faturamento e o volume dessas organizações aumentou. Foi possível fazer mais com menos recursos. E no setor público? Os efeitos se repetiram com a mesma intensidade, nestes mesmos vinte anos? Ainda não e tansferir a experiência do setor privado para o setor público vai demandar uma verdadeira revolução. Uma forte transformação no status quo. O diagnóstico é do professor da Universidade de São Paulo (USP), André Luiz Fischer, que também é consultor de empresas e agrega ao currículo uma vasta experiência nas áreas de administração, economia e ciências sociais, além de consultorias. Há, na avaliação dele, uma distância importante a ser trilhada entre a cultura organizacional de empresa privada e a cultura organizacional de uma empresa pública. André Fischer aprofunda o diagnóstico. Acha que, se o setor 60

público não acompanhar os mes- cobranças por metas e resultados mos passos da iniciativa privada, acabam criando um ciclo vicioso e o Brasil voltará à periferia da eco- perverso para o próprio funcionánomia internacional. “A sociedade rio. As pessoas não são cobradas precisa e quer saber onde são apli- por resultados e passam a atuar cados os recursos que coloca sob sem muito sentido no seu papel. a responsabilidade dos seus gover- Perdem a motivação. Com isso, é nantes, quais serviços são presta- preciso contratar mais pessoas. dos pelo estado e a que custo. Isso Como os orçamentos são limitasignifica uma cultura organizacio- dos, com mais pessoas as remunal voltada para resultados não para processos”, observa “Críticos de cobranças Fischer, ressaltando por metas e resultados que existe, sim, uma cultura organizaciopodem contribuir para nal no setor público brasileiro, que varia um ciclo vicioso e perverso de órgão para órgão, para o próprio servidor de instituição para instituição. Mas em público” André Fischer boa parte das que ele conhece, a cultura valoriza mais os processos nerações são menores e, sendo do que os resultados. “Na maioria menores, decresce mais ainda a ainda predomina o mau corporati- motivação. E como isso termina? vismo, que procura proteger aque- “Os resultados entregues à popules que trabalham nas instituições lação são ainda mais pífios.” sempre que são cobrados por reA barreira cultural que ainda sultados”. impera no setor público funciona E quais os efeitos dessa práti- como uma espécie de trava para cas? O professor Fischer é taxati- que sejam aplicadas ferramentas vo. Ao pretensamente proteger os que propiciem a competitividade, servidores, diz ele, os críticos das com foco na carreira, na motivação


e na melhoria do serviço prestado. É possível romper essa barreira? Fischer acredita que sim. Um dos caminhos é tornar os gerentes responsáveis por resultados e por suas equipes de trabalho. “Para que isso aconteça, eles têm que ser cobrados também por resultados e metas, caso contrário torna-se muito melhor permanecer na zona de conforto onde todos fazem o mesmo todos os dias”. O especialista destaca, ainda, que ferramentas aplicadas pe-

las administrações públicas mais ousadas estabelecem metas de produtividade para escolas, de resulitibilidade para hospitais, de publicações e patentes para centros de pesquisa e, principalmente, criam um sistema de consequências para aqueles que as cumpre e para os que não as cumprem. É assim que funciona na iniciativa privada. Jânio Diniz, CEO no grupo Ser Educacional, uma das maiores instituições do ensino do Norte-Nordeste, diz que o foco em resultados é uma característica do setor privado. Tudo é planejado com metas concretas, prazos e cronogramas definidos. “Você não vê uma empresa privada começar um projeto e ele não ser concluído, como muitas vezes ocorre no setor público. Alguns governos estão começando a ousar, a usar as mesmas ferramentas das empresas privadas.” A implantação de uma cultura organizacional eficiente no serviço público, enfrenta, entretanto, outro desafio: a rotatividade dos governos. É o que impõe o sistema

eleitoral brasileiro a cada quatro, oito anos no máximo. E como se comporta o staff permanente? A situação não é fácil. O professor Leopoldo Antônio de Oliveira Neto, especialista em psicologia do trabalho, faz uma avaliação contundente. “A cada troca de governo existe sempre a possibilidade de mudança. “Infelizmente, não ocorre uma continuidade daquilo que foi construído na gestão anterior. Acaba havendo, então, um recomeço. As pessoas que não ocupam cargo de confiança acabam tendo que se readaptar as mudanças de redirecionamento, mas passa a existir um descrédito em relação a continuidade. É um problema sério”. E o cidadão. O que tem a ver com isso? O professor Leopoldo avalia que a pressão popular é fundamental. As pessoas acabam relegando a esfera política, aos representantes eleitos, a tarefa de fazer com que as coisas aconteçam. Um comportamento, na avaliação dele, que precisa mudar para que as coisas ocorram de forma mais rápida e adequada. E quando a máquina pública tem problemas e as pessoas não cobram os seus direitos, o caminho apontado pelo professor é um só: tem que haver um esforço maior voltado para a educação de base e uma injeção de estímulo para que ocorra uma participação maior da sociedade na direção das instituições públicas. “Precisamos sair da acomodação que temos quando elegemos nossos representantes, avalia Leopoldo Neto. ”Não vejo outra saída além da educação e dessa mobilização que deve ocorrer de ambas as partes, dos nossos representantes públicos e também por parte da sociedade”. 61


cine

Império de sonhos, A HISTÓRIA DA TRILOGIA

STA R WA R S Por EDILBERTO XAVIER

Edilberto Xavier é auditor da Fazenda, secretário executivo de Planejamento, Orçamento e Captação da Seplag / PE

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Título Original Empire of Dreams: The Story of the Star Wars Trilogy 2004, Estados Unidos Edith Becker, Kevin Burns IMPÉRIO DE SONHOS, A HISTÓRIA DA TRILOGIA STAR WARS é um documentário lançado em 2004 para a TV americana e depois em um “Box” de DVD especial, contendo toda a trilogia original da saga de ficção e fantasia Star Wars. A película nos apresenta, em excelente perspectiva, o contexto político e social da época em que a trilogia foi lançada, seu impacto na indústria do cinema, os bastidores da produção e traça um interessante perfil de seu criador, o cineasta George Lucas. Estados Unidos, segunda metade dos anos 1970. No campo da economia, a crise do petróleo prenunciava um longo período de recessão. Na política, o prolongamento da Guerra do Vietnã e o es-

cândalo Watergate provocaram a renúncia do presidente Richard Nixon, deixando os americanos, antes tão ciosos da integridade moral de seus líderes, decepcionados. O cinema retratava esse desgosto. Dirty Hary e desejo de matar são exemplos de filmes com protagonistas cínicos e amorais. Eis que, em maio de 1977, um pequeno filme de ficção científica juvenil, desdenhado pelo estúdio que o financiou, estourou nas bilheterias. O primeiro filme da hoje hexalogia Star Wars, A New Hope, é a segunda maior bilheteria de todos os tempos nos Estados Unidos (com o preço dos ingressos corrigidos pela inflação) só perdendo para o filme E o Vento Levou. O filme é hoje considerado, junto com Tubarão, o precursor do fenômeno dos filmes “blockbuster”, traduzidos em português para arrasa-quarteirão, em uma alusão às filas quilométricas que se formam ao redor dos cinemas em que são exibidos. O fenômeno é caracterizado por eventos que não eram comuns a época, mas que, inovadores, se provaram bem sucedidos. Nos anos 1970, não era costume lançar filmes de sucesso no mês de maio, nem tampouco lucrar com o marketing de produtos derivados. Com o filme vieram os brinquedos, camisetas, videogames, livros, desenhos animados e quadrinhos que tornaram o criador da série um dos homens mais ricos do planeta. A estratégia inovadora de George Lucas, fazendo os filmes as suas próprias expensas, lhe garantiu não só o almejado controle criativo, mas também uma fatia maior dos lucros. De fato, inovação é a palavra

de ordem quando se fala de Star Wars. A hexalogia mudou a forma como assistimos aos filmes, mas, sobretudo, mudou a forma como as películas são feitas. Boa parte das técnicas de produção de efeitos especiais ainda utilizados hoje foi desenvolvida por uma empresa, a Industrial Light & Magic, fundada por George Lucas a propósito da preparação do primeiro filme. A indústria do cinema deve ainda à Star Wars a criação de inúmeras tecnologias de edição cinematográfica e de som. Outro interesse para a gestão pública é a idéia de renovação. A temática do filme foi inspirada em um livro do antropólogo Joseph Campbell, O herói de mil faces, que teoriza sobre os elementos comuns do heroismo, universalmente partilhados por diversas culturas. A partir dessa premissa, Lucas resgata os elementos essenciais do heroísmo, presentes nos faroestes e filmes de capa-e-espada dos anos 1940, renovando o interesse do público, desgastado com os temas ácidos e os anti-heróis dos anos 1970. A maior inspiração, no entanto, vem da reflexão sobre a figura de George Lucas e a importância do papel da liderança na geração das transformações sociais. A convicção na força criativa do seu pequeno conto de fadas espacial. A obstinação em fazê-lo da forma como imaginado e a determinação inabalável de enfrentar a descrença de todos (inclusive de parte do elenco do filme) para pô-lo de pé, na forma e tempo que julgava relevante foram os motores essenciais da revolução que tomou conta da indústria do cinema a partir de então. 63


acadĂŞmicos da gestĂŁo


A aprendizagem de gerentes em ambientes de trabalho cada vez mais competitivos Por Tarcilene Freitas1 e Vanessa Pedrosa2

Resumo O presente ensaio teórico tem por objetivo promover a discussão da aprendizagem de gerentes em ambientes de trabalho cada vez mais competitivos, orientando-se pela perspectiva da aprendizagem pela experiência. O trabalho justifica-se pela relevância em abordar as mudanças de comportamentos frente ao fenômeno estudado, levando em consideração a aprendizagem continuada e situada. O cenário organizacional é visto como comunidade de prática e seus praticantes da estratégia são os protagonistas das tomadas de decisões das organizações. Para tal faz-se necessário uma apropriação de informações e conhecimentos para corroborar as escolhas realizadas. O contexto sociocultural e as experiências estão imbricados no sujeito da ação no processo de aquisição de conhecimento. Os procedimentos metodológicos utilizados ancoram-se no estudo de artigos seminais e do estado da arte, com objetivo exploratório, tipo da pesquisa bibliográfica e abordagem qualitativa. Apresentam-se nas discussões da aprendizagem pela experiência convergências e divergências no processo de aquisição de conhecimento do praticante da estratégia, necessitando-se de mais estudos acadêmicos para clarificar e solidificar o arcabouço teórico. Palavras Chave: Aprendizagem de Gerentes; Interação; Continuidade; Experiência; Ação

1. Introdução No mundo contemporâneo, há uma volatilidade nas informações e conhecimentos, fazendo com que os indivíduos busquem estar antenados com as tendências. No cenário corporativo não poderia ser diferente,onde os gerentes ocupam espaços nas organizações como protagonistas das estratégias, principalmente no nível estratégico e tático das organizações. É neste contexto competitivo que o tema da aprendizagem emerge como um diferencial de excelên-

cia para aqueles profissionais os quais desejam manter-se na vanguarda, de modo que possam estar melhor preparados para enfrentar situações do cotidiano ou adversas, fazendo uso de decisões mais assertivas e céleres. Partindo-se deste pressuposto, este ensaio teórico objetiva versar sobre a aprendizagem nas organizações, guiado pela seguinte pergunta: como os gerentes aprendem em ambientes profissionais cada vez mais competitivos? Para tal, primeiramente fez-se necessário uma abordagem ampla sobre o

tema, para depois tratar da aprendizagem pela experiência de modo que o trabalho dos gerentes e como os mesmos aprendem pudesse ser abordado. O ensaio teórico ancora-se nas obras seminais de Dewey (1938) e Kolb (1976), apoiando-se também em importantes autores como Mintzberg (1986), dentre outros. A aprendizagem pela experiência, calcada na continuidade e na interação, é o grande farol condutor do ensaio teórico, clarificando a temática, no entanto, a abordagem da aprendizagem na academia ainda caminha 65


por trilhas não convergentes, obrigando a escolha de uma abordagem para arcabouço de sustentação do ensaio teórico. Desta forma, a temática em debate remete à importância dos relacionamentos sociais, das práticas profissionais, do convívio com pares, da educação profissional, dentre outros aspectos para a aprendizagem dos gerentes, de modo que as experiências vivenciadas possam gerar estoques de conhecimento para o enfrentamento de situações cotidianas ou complexas no ambiente organizacional,com uma performance focada na obtenção de resultados positivos.

2. A Aprendizagem Nesta seção, propomos discutir sobre aprendizagem, termo muito versado na área das ciências humanas. O mesmo vem ganhando destaque dentro dos ambientes organizacionais, haja vista que vivenciamos na contemporaneidade a “era do conhecimento”, na qual se faz necessária aos atores sociais e praticantes da estratégia a aquisição de

novos conhecimentos para vivenciar o processo de ensino-aprendizagem. Partindo deste pressuposto, deve-se buscar na teoria da aprendizagem a compreensão deste fenômeno. Para o desenvolvimento do ensaio teórico, cinco orientações de aprendizagem foram analisadas: a behaviorista, a cognitiva, a humanista, a aprendizagem social e a construtivista, tal como a seguir, demonstrado no quadro 1. O Behaviorismo é uma teoria que defende o comportamento adquirido como algo objetivo e não subjetivo. O seu processo dar-se-á pelos estímulos externos ao sujeito, através de recompensas e punições, significando dizer que aprendizagem não é um processo mental, mas uma repetição de comportamentos que pode gerar ao individuo recompensas caso ele atenda o que foi lhe foi proposto ou haverá punição, caso contrário.A teoria traz em seu bojo que a aprendizagem é sinônimo de formação de hábitos e seus princípios que são: a aprendizagem acontece através da repetição a estímulos, os reforços positivos e negativos

têm influência fundamental para a formação dos hábitos desejados e a aprendizagem ocorre melhor se as atividades forem graduadas.Para a teoria, o comportamento dar-se-á através do estimulo e resposta. Em contraponto aos behavioristas, os cognitivistas não veem o sujeito–aprendiz como ser passivo do processo de aquisição da aprendizagem,mas como um ser ativo na construção do fenômeno. O processo é mental e o aprendiz tem o controle de reorganizar suas experiências vivenciadas. Os teóricos desta corrente são:Ausubel, Bruner, Gagne, Koffka, Kohler , Lewin e Piaget. Na teoria humanista, a aprendizagem é algo individual do sujeito cognoscente e ele tem liberdade de agir na busca dos seus conhecimentos e autodirecionamento de escolhas para o seu desenvolvimento. Os pensadores são: Maslow e Rogers. A quarta corrente da aprendizagem social valoriza a relação dos atores (aprendizes) com o contexto social. O foco da teoria é a interação com pessoas, comportamentos e ambiente, conforme menciona Mer-

Quadro 1. As cinco orientações da aprendizagem Pressupostos

Behaviorista

Cognitivista

Humanista

Cognitivista social

Visão do processo de aprendizagem

Mudança no comportamento

Processo mental

Ato pessoal Para cumprir o potencial de forma completa

Interação com e observação dos outros em um contexto social

Construção do significado pela experiência

Locus da aprendizagem

Estímulo do ambiente externo

Estrutura cognitiva interna

Necessidades afetivas e cognitivas

Interação de pessoas, comportamento e ambiente

Construção interna da realidade pelo indivíduo

Fonte: adaptado de Merriam e Cafarella (1999, p.264) apudDidier e Lucena (2008, p. 131) 66

Construtivista


rian e Caffarella,( 1999, p. 265). Na última corrente da análise, a construtivista, tem-se a aprendizagem como uma construção do sujeito com a interação ao meio. Para corroborar esta acepção, Merriam e Caffarella (1999, p. 261) afirmam que, “basicamente, uma posição construtivista sustenta que a aprendizagem éum processo de construção de significados; é como as pessoas formam sentido de suas experiências”. Portanto, o significado é estabelecido pelo aprendiz e depende da estrutura de conhecimento prévio e presente do mesmo. Diante do exposto, percebe-se que das cinco correntes de aprendizagem o behaviorismo demonstra a mudança do comportamento através do reforço e repetição de hábitos oriundos de estímulos advindos de ambientes externos. Em oposição a esta corrente, os humanistas e cognitivistas valorizam o processo mental e sua subjetividade (afetivos) ao qual se verifica o distanciamento das abordagens analisadas, de forma que uma prioriza os aspectos mecânicos e a outra, os mentais e afetivos. As teorias da aprendizagem social e construtivista apresentam approché na perspectiva da mudança do comportamento através da interação do aprendiz com outras pessoas e o contexto sociocultural. A orientação construtivista, em consonância com aprendizagem social, representa as teorias que servirão como âncora para o debate da experiência como processo de aprendizagem, uma vez que essas abordagens vislumbraram que o sujeito pode aprender a partir de experiências próprias ou de outrem com liberdade de resignificar suas expertises de acordo com o rapport

estabelecido no contexto sociocultural.No tópico seguinte, tem-se a aprendizagem pela experiência na perspectiva de Dewey (1938), onde o autor menciona que, apesar da aprendizagem ocorrer em situações sociais, é o aprendiz individual quem aprende. Para enriquecer o debate, também recorre-se a Kolb(1976), que percebe aprendizagem como experimentos à disposição do conhecimento através de um ciclo de aprendizagem, detalhado a seguir.

futuras experiências é deseducativa. Em linhas gerais a teoria da experiência sustenta-se em dois princípios o continuum experiencial e a interação. Conforme Dewey (1938,p.32),

2.1. A Aprendizagem através da experiência

das que não possuem tal

Dewey (1938) em seu livro intitulado “Experiência e educação” leva-nos a refletir que a mudança de comportamento geradora do fenômeno “aprendizagem” dar-se-á através da experiência, a qual está imbricada na vivência do individuo com o meio ambiente. O autor inicia uma discussão acerca da educação tradicional e a educação progressista. De forma en passant, tem-se este preâmbulo para adentrar no epicentro da discussão que é “Experiência”. O citado autor faz comparações das duas formas educacionais, citando os pontos divergentes que levaram à reflexão da educação progressista. Na visão do teórico, a educação tradicional está pautada no método conteudista, visando preparar para responsabilidades futuras e a progressista na relação da experiência com o aprendizado. Ele enfatiza que a experiência não é sinônimo de aprendizagem educativa, ressaltando que ela pode apresentar ações deseducativas. Qualquer experiência que tenha efeito de impedir ou distorcer o amadurecimento para

necessária não somente para

... este principio está envolvido, conforme observei, em toda tentativa de discriminar as experiências de valor educativo valor. Pode parecer supérfluo dizer que esta discriminação é criticar a educação tradicional, mas também para iniciar e conduzir um tipo diferente de educação. ... Admitindo-se que este princípio tenha fortalecido o movimento da educação progressista, por parecer de acordo com o ideal democrático que o povo está com prometido, ao invés dos métodos de escolha tradicional, que têm o modelo autocrático. Outro fator importante de contribuição foi a natureza humana no movimento progressista. O princípio da continuidade se revela no seguinte fluxo: situação > problema >indagação > reflexão > nova situação, ou seja, a aprendizagem ocorre a partir dos problemas enfrentados nos contextos sociais, pelos indivíduos, que são levados a indagarem-se, refletirem e reelaborarem suas experiências, a fim de chegar a uma nova situação ou à resolução de um dado problema. Além 67


disso, para Dewey (1938), este princípio significa que as experiências vividas pelos indivíduos encontram-se interligadas e que toda experiência toma algo das experiências passadas e modifica de algum modo as experiências subsequentes. O segundo princípio - da interação, está baseado na concepção das condições objetivas e condições internas. Significa dizer que o indi-

viduo experimenta várias situações estabelecendo interações com os objetos e as pessoas (DEWEY, 1938, p. 36). Partindo destas proposições apresentadas por Dewey, veremos que Kolb, teórico bastante conceituado na perspectiva da aprendizagem pela “Experiência”, pode corroborar as discussões aqui apresentadas. 68

A aprendizagem na visão de Kolb(1976), tal como o autor trata em seu texto intitulado de “Management and the Learning Process”, aborda este fenômeno através de um modelo que ele denomina de “Empírico” por duas razões: a primeira ligada às origens intelectuais e históricas; a segunda enfatiza os jogos experimentais do processo de aprendizagem. A essência do mode-

lo é a descrição elementar do ciclo de aprendizagem, conforme demonstrado abaixo. A aprendizagem é concebida no quarto ciclo. A experiência concreta imediata é o fundamento para as observações e reflexões, essas observações são assimiladas na teoria de que novas implicações para que ações possam ser deduzidas. Essas

conclusões ou hipóteses também servem de guias para a criação de novas experiências. Para o sujeito colocar-se à disposição do conhecimento serão necessárias quatro diferentes classes de habilidades: experiência concreta, observação reflexiva, a concepção abstrata e a experimentação. De acordo com a percepção de Kolb (1976), o individuo deverá ser capaz de abrir-se para novas experiências sem preconceitos e ter a capacidade de refletir e observar tais experiências de várias perspectivas. A partir daí ser capaz de criar conceitos e ideias que integrem suas observações internas e expressem suas teorias, logicamente expressas. Partindo-se deste pressuposto, o indivíduo terá condições de empregar esses conhecimentos para tomadas de decisões e resoluções de problemas. Pode–se perceber que o framework de Kolb (1976) faz refletir o tão quanto é importante no tocante a aprendizagem o praticante da ação estar disponível a desestabilizar sua homeostase, com propósito de aquisição de novas aprendizagens. Para Kolb (1976), o sujeito cognoscente dar-se-á pela construção do ciclo.

3. O trabalho dos gerentes no contexto organizacional De acordo com Hales (1986, p. 90, grifos do autor), o trabalho dos gerentes no contexto organizacional ancora-se em 5 principais áreas, as quais apontam respostas para 5 questões implícitas pertinentes ao tema:


lidade, confiança e suporte...” são dimensões primárias do contexto organizacional as quais influenciam a proatividade, cooperação mútua e aprendizagem coletiva dentro das organizações. O contexto organizacional, em ação, influencia o comportamento individual dos gerentes. Apoiando-se ainda em Ghoshal e Barlett (1994, p. 104), tem-se a seguir um conjunto de características inerentes ao comportamento individual dos gerentes os quais conectam-se às dimensões disciplina, suporte, flexibilidade e confiança do contexto organizacional caracterizando a qualidade dos trabalho dos gerentes e influenciando a performance dos mesmos. São elas:

1) O executivo é um planejador

o trabalho do gerente (quais

a) Confiança: equidade,

tal afirmação é falsa.

as qualidades existentes no

envolvimento e competência;

trabalho do gerente?)

b) Suporte: acesso aos recursos,

1) Os elementos substantivos do trabalho gerencial (o que os gerentes fazem?); 2) A distribuição do tempo dos gerentes entre os elementos do trabalho gerencial (como os gerentes trabalham?); 3) Interação: as pessoas com as quais os gerentes trabalham (com quem os gerentes trabalham?); 4) Elementos informais do trabalho gerencial (o que mais os gerentes fazem?); 5) Temas os quais compõem

Faz-se importante observar a gama de atividades operacionais, as quais muitas vezes estão acopladas ao trabalho dos gerentes decorrentes da própria dinâmica do contexto empresarial. Micro, pequenas e médias empresas geralmente estão inseridas em ambientes empresariais adversos, possuindo equipes enxutas e com pouca qualificação,fatos que resultam em uma sobrecarga de trabalho dos gerentes. A performance dos gerentes está intimamente ligada aos resultados obtidos pela organização e esta também possui características importantes as quais possibilitam o alcance de patamares significativos. Na visão de Ghoshal e Barlett (1994, p. 91), “...disciplina, flexibi-

autonomia e orientação; c) Disciplina: padrões de performance, ciclos rápidos de retroalimentação e sanções consistentes; d) Flexibilidade: ambição compartilhada, identificação com o coletivo e significação pessoal. Em contraponto às atividades clássicas destinadas aos gerentes, focadas em planejar, organizar, coordenar e controlar, segundo Mintzberg (1986) isto representa apenas um conjunto de mitos, bem distante da realidade desenvolvida pelos gerentes, no seu dia a dia de trabalho. Tais mitos são:

sistemático e reflexivo; 2) O verdadeiro executivo não executa tarefas de rotina; 3) Os principais executivos necessitam de informações agregadas, que podem ser melhor obtidas através de um sistema formal de informações gerenciais. 4) A administração é, ou pelo menos está se transformando rapidamente, em ciência e profissão. Sob qualquer definição de ciência e profissão,

Observando-se também os papéis exercidos pelos gerentes, Mintzberg (1986) aponta dez papéis dentro da organização, os quais são oriundos da autoridade formal dos mesmos, tal como a seguir: chefe, líder, contato, monitor, disseminador, porta-voz, empreendedor, manipulador de distúrbio, alocador de recursos e negociador. Pode-se perceber que os três primeiros são papéis interpessoais, que dão origem aos três seguintes, que são informacionais. Agregando-se os dois primeiros grupos de papéis, o gerente torna-se apto a desempenhar os quatro últimos papéis, conclamados de decisoriais. Desta feita, tais papéis constituem-se de forma integrada, não sendo possível separá-los, em detrimento de algum outro. Corroborando as perspectivas adotas por Mintzberg (1986) emergem 69


aquelas apontadas por Hales (1986), onde faz-se necessário um olhar mais atento às atividades sob responsabilidade dos gerentes, sobretudo quando avalia-se a efetividade das mesmas, no sentido de identificar com clareza o relacionamento entre as funções desempenhadas, tarefas, atividades, comportamentos, enfim, clarificando e distinguindo as performance individual do gerente e outras expectativas organizacionais advindas do trabalho do mesmo (HALES, 1986).

4. A aprendizagem de gerentes A dinâmica da aprendizagem de adultos pode ser clarificada a partir das acepções de Mezirow (1991, p. 13), as quais priorizam as formas pelas quais os adultos formam sentido ou significados a respeito das suas experiências. Desta feita, as pessoas necessitam compreender as suas experiências, com o intuito de enfrentar as situações de forma mais apropriada e, por meio da reflexão, avaliam e podem alterar certos significados, elaborados em ocasiões passadas. De acordo com, Gherardi, Nicolini e Odella (1998, p. 274),

“A maior parte do know-how relevante que distingue um profissional experiente de um principiante é adquirido no dia-a-dia pela ação e reflexão, isto é, pensando sobre o que 70

nós estamos fazendo e por que e conversando sobre isso com os outros [...] Na vida cotidiana, assim como nas organizações de trabalho, pessoas e grupos criam conhecimento, negociando os significados das palavras, ações, situações e artefatos materiais”. Partindo-se deste pressuposto, pode-se vislumbrar que a comunicação no dia a dia representa, em conjunto com uma contínua prática, os elementos focais da aprendizagem das equipes de trabalho na organização. Apoiando-se novamente em Gherardi, Nicolini e Odella (1998, p. 275) tem-se a concepção de que os gerentes aprendem também através de relacionamentos de formaque os “aprendizes como seres sociais que constroem os seusentendimentos e aprendem por interações sociais em ambientes sócio-culturais específicos”. Segundo Lucena (2006, p. 11), o qual realizou um estudo qualitativo com dirigentes de micro e pequenas empresas brasileiras que operavam no segmento varejista de vestuário, objetivando verificar como os mesmos aprendiam, os relacionamentos sociais são grandes proporcionadores de aprendizagem, incluindo a interação com as pessoas da família, amigos e profissionais de outras empresas, constatando que “...aprendizagem profissional contínua dos gerentes-proprietários se baseava mais no desempenho e na

reflexão das atividades de trabalho do que em treinamento e educação. Os gestores aprendiam mais pela prática profissional do que por programas formais de treinamento.” É interessante atentar para o fato de que os gestores necessitam ter consciência da necessidade contínua de aprendizagem profissional, no sentido de desenvolver um olhar atento aos elementos que permeiam o campo organizacional. Oportunidades de aprendizagem profissional podem surgirdos relacionamentos sociais, dos eventos profissionais, do trabalho diário, da mídia e da educação e treinamentos (LUCENA, 2006). De acordo com Kolb (1976, p. 21), o que distingue um executivo de sucesso dos demais profissionais“é sua habilidade de adaptar e controlar as demandas por mudança em seu trabalho através da habilidade de aprender”. No sentido de medir os pontos fracos e fortesda aprendizagem pela experiência do executivo,o autor desenvolveu o Inventário de Estilo de Aprendizagem (LSI), o qual demonstrou que os mesmos tendem a enfatizar mais a experimentação ativa do que a observação reflexiva e quatro estilos de aprendizagem sobressaíram –se: o executivo convergente (converger), o divergente (diverger), o assimilador (assimilador) e o acomodador (accomodator). Faz-se mister observar que os gerentes, em muitos momentos, não disponibilizam de muito tempo para refletir sobre-a-ação no seu ambiente organizacional, visto que, comumente encontram-se em ocasiões de incerteza e completamen-


te novas, demandando, desta feita, decidir utilizando-se do seu estoque de conhecimento e experiências. A reflexão traz em seu bojo a crítica, a reconstrução e o teste de hipóteses, a qual requer um certo tempo para pensar e refletir.

5. Conclusões Este ensaio teórico a respeito da aprendizagem de gerentes em ambientes de trabalho cada vez mais competitivos demonstra como as abordagens a respeito da temática ainda são fruto de debates na academia, inclusive apontando caminhos os quais ainda não apresentaram convergências. Encontra-se também em debateo papel do gerente, o qual muitas vezes é chamado também de líder e dirigente, recebendo rótulos de “místico”, “misterioso”, “escolhido”, “carismático”, esquecendo-se, muitas vezes, das importantes características de ação no trabalho e no ambiente profissional. Estudos apontam que comumente os gerentes não promovem análises a respeito das reflexões construídas no dia a dia, tornando difícil transformar o conhecimento e experiências tácitas em explícitas, no sentido também de preparar novos gerentes e conhecer melhor suas próprias práticas profissionais, identificando pontos fortes e de melhoria. A aprendizagem dos gerentes por meio da experiência traz em seu bojo o desenvolvimento das práticas profissionais, a interação por meio das redes de relacionamento, as quais, atualmente, comungam-se

com as redes sociais e a necessidade de constantemente estar disponível para novos aprendizados. A continuidade e a interação são os grandes faróis condutores e facilitadores da aprendizagem, os quais, certamente proporcionarão experiências bem sucedidas, criando-seum background capaz de proporcionar ao gerente a possibilidade de identificar e avaliar as melhores abordagens, para a consecução de decisões para assertivas. 1 Tarcilene Freitas é aluna do Mestrado Profissional em Administração – Universidade Federal do Estado de Pernambuco 2 Vanessa Pedrosa é aluna do Mestrado Profissional em Administração – Universidade Federal do Estado de Pernambuco

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humor (ClĂŠriston)

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