QUEIMANDO A PELE(contos)
FABIANO VIANA OLIVEIRA
QUEIMANDO A PELE (livro registrado na Biblioteca Nacional)
FABIANO VIANA OLIVEIRA
A VINGANÇA DO MAIS-QUE-PERFEITO Era uma noite de gala. Todas as grandes celebridades acentuadas estavam lá. O ônibus. A árvore. A lâmpada. O relâmpago. O lápis. A grande comunidade das proparoxítonas e todo o resto. Era a reunião anual das palavras acentuadas. A cada limousine que parava em frente ao grande centro de convenções ortográficas, uma onda de fotógrafos e flashes de cinegrafistas se acotovelava para pagar as melhores imagens das palavras e de seus fabulosos acentos gráficos. Alguns estavam ornamentados de ouro e jóias, fazendo-se valorizar ainda mais o status dado às palavras acentuadas. Até os simples as craseados tinham pompa de celebridade, mesmo sendo simples contrações. Uma a uma as palavras acentuadas chegaram e encheram todo salão principal do centro de convenções. Eram trezentos milhões de lugares e estavam quase todos ocupados. Eram muitos reencontros. Palavras que há muito não se viam acertavam de formar frases em algum coquetel ou festa. As palavras femininas se agrupavam e comentavam os acentos umas das outras. Todos estavam animados e felizes, só aguardando a reunião anual, que na verdade é um modo as palavras acentuadas se sentirem melhores ainda com seu prestígio, somente algumas vezes acontecia de se conceder um acento a uma palavra nova, uma nova contração ou um novo verbete; coisa que não iria acontecer nesta reunião, era só a oportunidade delas se refastelarem de suas pomposidades juntas... Enquanto isso do lado de fora, onde só os repórteres, fotógrafos e cinegrafistas aguardavam a hora da saída das palavras, uma incomum aglomeração começava a se aproximar do grandioso prédio do centro de convenções ortográficas... era uma passeata. Vindos de todos os lugares, livros e frases. Eram as palavras conjugadas no pretérito mais-que-perfeito. Desde o início dos estabelecimentos das convenções ortográficas essas pobres, necessitadas e tão importância palavras vinham pedindo para poderem usar acentos agudos nas suas sílabas mais fortes, que eram onde elas enfatizavam sua força e presença dentro das sentenças e muitas vezes mudavam o caminho de histórias importantes. Os jornalistas começaram a ouvir: “Querendo acentos!” “Querendo acentos!” Eram milhares de vozes exigindo a mudança daquela lei tão injusta e víl que os excluía de participar da convenção anual das palavras acentuadas. Os cartazes apresentavam frases fortes que utilizavam o mais-que-perfeito com acentos, todas demonstrando suas importâncias no mundo ortográfico. Elas se aproximaram da entrada do centro de convenções. A essa altura, lá de cima, do salão já se podia ouvir os gritos da multidão mais-que-perfeita e assim todas as janelas estavam ocupadas pelas já amedrontadas e pomposas palavras acentuadas. O tão forte relâmpago já estava completamente apagado. “Queremos acentos!” Elas continuavam. Um muro de seguranças se postou à frente da porta para evitar uma possível invasão, enquanto os repórteres, animados, registravam aquele furo lingüístico. O líder das palavras mais-que-perfeitas fala. Era o exigira: - Senhoras palavras acentuadas. Vocês sabem do nosso pedido. Ele é antigo e vocês o ignoram a anos. Queremos acentos! - Todas elas gritam a essa frase. - Estamos dispostos a entrar civilizadamente na convenção desse ano e finalmente discutir esse impasse que nos tortura e discrimina há décadas. O nosso intento é viabilizar a nossa melhor convivência languis... - e lá do alto um grito surge: - Vão tomar no rabo, seus côrno sem acento... - Era o bêbado. Ele estava completamente bêbado. E cometeu um grande erro... - Então é assim não é... Pessoal, eles querem a guerra. E é isso que eles vão ter. - O exigirá levanta o braço. Todos se calam. Os seguranças começam a tremer de medo. E então: - Atacar: - Todas as palavras mais-que-perfeitas correm e invadem o centro de convenções ortográficas. Os seguranças não conseguem impedir. E os jornalistas queriam era mais notícia. Elas então chegam ao salão e lá a batalha começa, não sendo poupada uma palavra... Déboramdjeudkkkdjdkdueueieísçslslmmbbxxgzfawzezzzzaaaaooslk,,kkmcncbsneeieuaamxnod,ps sskelcacacacacacaczanananananakakammmumeudhçalkdidoleodtqpaçóaisue.ghggg zx.c,sldkfjguroeiqpsosmclaksjkkahstetdeboradeboradeboradeboradeboracacacacainezinexinezinezpatriciap atriciadeborafftysklsmsjdieodjdideieiiesionkjahnhnduilvnxiwrfjhnxxcjxnxhjwojfjfjfj. Foi uma batalha sem precedentes. Os jornais do mundo não sabiam como se referir a tal ato de barbárie lingüística. Pôde-se ouvir as palavras em quilômetros de distância. Foi... Uma semana após a terrível batalha entre palavras acentuadas e palavras conjugadas no pretérito mais-que-perfeito, o mestre supremo da ortografia, da escrita e da língua fez um pronunciamento à nação das palavras: - De hoje em diante eu decreto que todas as palavras conjugadas no pretérito mais-que-perfeito podem ter seus tão batalhados acentos na sílaba mais forte. E no intuito de evitar mais violência sem
sentido como a da última convenção das palavras acentuadas, eu também decreto que toda palavra que achar necessário pode também usar acento, mas com moderação, para não gerar maus vícios na nossa linguagem, já tão deturpada pelos tempos modernos. Qualquer demonstração contrária à minha lei será punida com a omissão da palavra por um ano, não podendo ser escrita, falada ou mesmo pensada. E tenho dito. - E desse dia em diante todas as palavras viveram felizes e unidas, só sobrando um grupo de renegados: os palavrões, que na surdina planejam a sua vingança contra todas as palavras boas e não ofensivas à moral, como eles são e como tanto se orgulham de ser. Mas isso ainda levará muito tempo para acontecer; porque eles próprios não param de se ofender... “Filho da mãe é você, seu corno.” “Corno é ele, seu boiola.” “Boiola é ele, seu...
H.I.V. POSITIVO I A escuridão domina o ambiente e três figuras tão escuras quanto o ambiente penetram numa sala. Nela, existem mesas, bancos de dados, câmaras de vidro e terminais de computadores. - Vigie a porta! - Sim, Sr! - Dois se encaminhas até um dos terminais e o ativam. - Quantos? - Todos! - Uma mulher começa a trabalhar no teclado, muito eficiente e rápida. - Pronto. Vou colocar para imprimir. - Espere. E o barulho da impressora? - Não se preocupe. A sala é a prova de som. - Espere! - Ela aperta um botão e a impressora começa a trabalhar. No papel então surge o nome de Theresa S. M.: HIV+, 26 anos, endereço:... II Na casa, a TV está ligada, mas a espectadora não liga para o que acontece na tela; seus olhos estão mais distantes que a extensão do universo e há tristeza neles. Alguém bate na porta. Ela não ouve de início, mas uma segunda batida mais forte a desperta. Ela anda até a porta e a abre. Era um homem de terno preto, bem alinhado e uma feição muito séria. - O que deseja? - Theresa S. Matheus? - Sim. - E a essa resposta dezenas de tiros são dados contra ela, matando-a violentamente, sem perdão ou compaixão. Então o homem de terno entra na casa e olha o corpo da mulher. - Alvo exterminado! Câmbio! - Ótimo! Limpe tudo e saiam todos daí. Vocês têm dois minutos e meio. Câmbio, final! - Sim, Sr - O homem sai da casa e com um gesto, indica a um dos outros que estavam do lado de fora que se livre de tudo. Outro homem, então, vestido com uma espécie de uniforme se dirige ao corpo e joga sobre ele uma espécie de líquido amarelo, provocando uma fumaça sobre o corpo que em seguida se dissolve em uma pasta amarelada e inerte. - Agora você não vai contaminar ninguém, sangue pobre! - Ele cospe na paste e se vira. - Limpem tudo e caiam fora... ainda temos o que fazer esta noite! III - Norte e mistério na noite! Essa é a expressão com a qual se pode definir a noite passada nesta cidade. 15 pessoas foram assassinadas e aparentemente derretidas em suas próprias casas. Os vestígios indicam características de uma operação militar de alto nível, mas não foi encontrado um mísero cartucho de bala que pudesse colaborar essa hipótese. A polícia está atônita, o governo preocupado e a população com medo, está em todo lugar. E agora a previsão do tempo par... - Não precisa ter medo, meu caro, e não ser que você seja HIV positivo. Hoje começa o futuro e ele será glorioso. - Ele está de pé, de costas para um grupo de fiéis soldados, que tinham acabado de ver as primeiras notícias sobre seus feitos da noite passada e esperavam ansiosos pelo comentário de seu líder. - Bom... o que eu posso dizer? Eu estou orgulhoso! Trabalho limpo, eficaz e da melhor qualidade e isso é só o começo. Nós vamos acabar com essas pestes infectadas e até o final dessa década, a Aids não mais existirá. Agora vão, estudem suas missões seguintes, pois um árduo caminho nos aguarda e a eficiência é a chave para alcançarmos o nosso fim: o extermínio do HIV da nossa sociedade, para sempre! - Aplausos se sucedem por alguns segundos, antes que todos se dispersem e sigam para suas tarefas. - Senhor... É o telefone especial. Acho que a notícia já se espalhou. - Eu vou atender. - Ele anda até uma sala e fecha a porta, dentro, atende o telefone, que é a única coisa na sala, além de um mesa e uma cadeira, onde ele se senta para falar. - Alô.. obrigado... não, nada... bom, é só continuar me informando que tudo vai dar certo... eles vão notar, cedo ou tarde e se forem esperto, não vão se meter, pois o que estou fazendo é um favor a todo mundo... tudo bem... me diga, assim que eles notarem o padrão, para eu poder tomar a medida anticonfidencial... certo... adeus. - Ele desliga e depois de passar a mão no rosto em sinal de cansaço, diz: - Políticos...! IV A casa é pobre, simples. Um casal muito unido se abraça com ternura. E a união e a ternura é o que resta na vida destes dois. - É o nosso filho; o que vai ser dele? - Acho difícil ele não ser positivo. - Ela deixa as lágrimas correrem.
- E se nós não vivermos tempo o suficiente para criá-lo? Como ele vai viver? Ele vai ser discriminado; com certeza! - É... eu sei. - As lágrimas também correm pelos olhos do marido. - Não pense nisso, querida. Vamos tentar viver o máximo do tempo que temos e tentar fazer o máximo pelo nosso filho por nascer. O futuro é um segredo de Deus e talvez a revelação não seja de todo, tão terrível. V É noite novamente e uma marcha insólita renda a cidade. Grupos distintos se espalham pela cidade e onde param um novo massacre se realiza. - Vamos soldados! Ainda temos mais três visitas para realizar. - Ele se vira e todos saem deixando para trás os corpos liqüefeitos de uma família inteira, de cinco pessoas. Enquanto isso em outra parte da cidade um outro grupo se vê preso dentro de um apartamento, onde tinha um serviço. Impossibilitados de sair, pela presença de um carro da polícia em frente ao prédio, que tinha sido chamado por outros moradores que ouviram o barulho; eles tinham que agir: - Chefe, o que faremos? - Vamos usar o plano de fuga dois (proteger os humanos sadios). - Sim, senhor! Todo mundo! Preparam as armas tranqüilizantes e tentem não ser vistos no momento do ataque. - Não se esqueça da amostra, soldado. - Sim, senhor! Você! - Um soldado se aproxima. - Quando eles estiverem no chão, tire as amostras de sangue e as identificações; de todos, ouviu! - Sim, senhor. - E a um comando com a mão eles se preparam para atacar as pessoas em frente ao prédio. - Atenção! Agora! - Tiros silenciosos são lançados do apartamento e uma a uma as pessoas caem na rua, não sobrando ninguém de pé. - Muito bem, vamos sair. Vocês dois, ajudem ele com as amostras; têm muitos lá fora. - Sim, senhor. - Sorrateiros e rápidos eles desaparecem na escuridão da noite; somente três ficam mais alguns minutos, tirando as amostras de sangue das pessoas caídas no chão da rua. E ao fim: - Vamos embora!... Que Deus os proteja de vocês não serem positivos. Adeus. - E eles somem fora da luz da rua, deixando para trás suas vítimas e um monte de questões para o dia seguinte. VI - 18 pessoas mortas e 7 encontradas inconscientes perto da cena de um dos crimes. Esse é o saldo dos assassinatos da noite, assim chamados a série de mortes que se iniciaram a duas noites atrás. A polícia está agora mais confusa que antes, pois entre as pessoas encontradas inconscientes estavam dois policiais em serviço, e que não viram nada, nem ninguém. O governo já ativou a polícia federal, na tentativa de desvendar as mortes. Elas são sem sentido, sem conexão e sem padrão. Veremos... E agora a receita do dia... - Que horror! Tomara que a polícia encontre logo estes monstros. Eu estou com medo de dormir á noite. - Só se você tiver Aids, meu caro! - Era a Dra. Helena, de guarda-pó branco, sentada ao terminal de computador. - O quê? Eu não entendi. - Seu apavorado colega. - Eu cruzei a identidade das pessoas que foram mortas com o nosso banco de dados, e todos eram HIV positivo. - Mas isso... - Não, não é. Alguém teve acesso ao nosso banco de dados e pegou o nome de todos os HIV positivos registrados no país e pior, eles estão sendo exterminados. - Oh, meu Deus. - Aquele laboratórios e aquelas duas pessoas pertenciam a organização HIV test, a maior do país e que mantinha o registro e dados de todos os positivos do país para o governo, com a intenção de ajuda e controle, mas eles acabaram ajudando a outros. - Temos que avisar à polícia! - Não sei se fará diferença. Temos que contratar alguém de importância para cuidar com responsabilidade desse assunto. - Mas que? Quem vai cuidar desses loucos? - Eu vou contratar a capital e tentar falar com o ministro da defesa. Ele poderá encaminhar isso. Meu amigo, eu acho que teremos tempos turbulentos pela frente. - Imagino. Matar todas as pessoas com HIV positivo, vai ser o mesmo que matar todas as pessoas que tiveram nariz. - Hum! - Ela pega o telefone e começa a discar. Sua missão vai ser a de alertar um dos homens mais importantes do país sobre um possível massacre de inocentes, que afetará todo o futuro do planeta. O telefone toca no escritório do ministro de defesa de um dos países mais poderosos do mundo.
- Dra. Helena, pode falar. Diga qual é o problema... certo... Meu Deus... Tem certeza disso?... não diga a mais ninguém... Ah... só vocês dois... tudo bem... não vamos criar pânico... eu vou tomar providências imediatamente... obrigado... vamos ver... Adeus. - Ele desliga o telefone, levanta e se dirige a uma sala à prova de som, ao lado da dele. Dentro, ele pega um telefone e no teclado há apenas um botão e a linha só tem uma direção, a direção da base dos exterminadores... VII - Alô, pode dizer. Não se preocupe. Isso ia acontecer cedo ou tarde, as pessoas não são tão burras, quanto vocês políticos imaginam... Nem pensar... eu não mato pessoas normais... O quê?... você é moral... faça isso você mesmo... Eu estou querendo acabar com a doença e não espalhá-la... Não... eu não vou interferir, mas não me envolva nisso... com o tempo a população vai me apoiar e eu não quero estar envolvido com assassinatos capitais... Tá, adeus. - Batem na porta. - Senhor, os resultados estão prontos. Venha ver. - Os dois se encaminham para o laboratório. Lá, um homem de guarda-pó os recebe. - Senhor, soldado. Bom, estes estão limpos; todos são HIV negativo. - Graças a Deus. Livre-se de tudo. - Sim, senhor. - Ele sai do laboratório e sua expressão preocupada toma, por alguns segundos, uma áurea mais leve, por saber que ainda existem pessoas normais no mundo. Ele é o chefe supremo dos exterminadores, conhecido como o homem que nunca dorme; adorado e respeitado, ele conduz um grupo de homens e mulheres dispostos a se sacrificarem para livrar o mundo da Aids. E agora ele está se dirigindo ao salão onde irá discursar para os soldados a respeito da missão desta noite e assim o fará até que o mundo esteja “limpo”. - Olha, o Talzão vai falar! - Um soldado orgulhoso aponta para entrada, e todos se calam, esperando... VIII - Mais uma noite de medo e morte na cidade. Treze vítimas foram encontradas mortas em diversos pontos da cidade. A polícia liberou alguns dos nomes; dentre eles... - Querido! - Do quarto de uma casa modesta um homem vestido de pijamas atende ao chamado de sua esposa. - O que foi? - Ele pergunta preocupado. - No jornal. O nome de uma das vítimas daqueles assassinados. É o nome da chefe do nosso grupo de auto-ajuda ao HIV positivo. - Ela olha assustada para o marido, acariciando o seu ventre, onde guarda o seu futuro filho. - Não pode ser querida. É só uma coincidência. São tantas mortes. - Mas você não se lembra? Ela mesma previu que o preconceito poderia atingir extremos. - Eu não sei. Eu não quero acreditar em tal coisa. - Eu estou com medo. - O homem se senta ao lado da mulher no sofá e a abraça, deixando, ambos, lágrimas correrem no rosto. Ele, então, olha para ela e diz: - Não tema, querida. Hoje mesmo eu vou preocupar a Dra. Helena do laboratório. Ela poderá me tranqüilizar. Eu tenho certeza que isso foi um engano. - Ele se levanta e se dirige ao quarto, mas antes ouve a esposa dizer: - Querido... tenha cuidado! - Ele sorri olhando para ela e em seguida vai para o quarto, deixando na sala sua esposa; triste, amedrontada, visualizando um futuro ainda mais terrível que o que eles haviam imaginado para alguém com HIV positivo. IX Uma noite calma e um ansioso transeunte se aproxima de uma casa de classe média. Um marido preocupado com o futuro de sua família, ele se encaminha para casa de uma atenciosa cientista que não muito tempo atrás lhe dava a notícia que ele era portador do vírus da Aids, HIV positivo, assim como toda sua família. O nome dela é Dra. Helena e nesse momento ela está em casa com o colega e amigo de laboratório Zed, com o qual ela divide o conhecimento do segredo dos assassinatos da noite e é por conhecer esse segredo que não só o preocupado pai de família está a caminho de sua casa, mas também, um grupo de oito homens, sérios e irrepreensíveis que têm por missão exterminar a boa vontade dos pobres cientistas. Um carro para em frente à casa da Dra.; totalmente escuro, pessoas se movimentam dentro dele. As quatro portas se abrem e sete homens correm sorrateiramente para o perímetro da casa. Enquanto isso uma desavisada testemunha observa a tudo, sem saber que o que ele verá será um homicídio duplo. Instintivamente ele se posiciona atrás de uma árvore do outro lado da rua, notando que um homem havia ficado no carro. Um minuto e meio de espera silenciosa e o temor do pobre homem se revela: diversos tiros são disparados e em seguida os sete homens correm de volta para o carro, saindo em disparada.
Assustado e imóvel, ainda por instinto o homem procura ver a placa do carro, mas nota que ela não existe, era um carro frio. E ele, apavorado, intui: aquilo era obra de alguém poderoso, alguém com disponibilidade... alguém como o governo. E então ele confirma os medos de sua esposa e os seus: alguém muito poderoso e louco está perseguindo todos os HIVs positivos e o assassinato da Dra. Helena confirma que ela tinha descoberta a verdade e agora tinha pago por isso. Finalmente se movendo, o homem vai em direção a sua casa; atônito, com medo, sem saber o que fazer. X - Dois corpos foram encontrados ontem à noite num bairro de classe média. Aparentemente, esse crime não faz parte da onda de assassinatos que amedronta a cidade; as pessoas mortas não foram derretidas como as outras. As duas pessoas eram a chefe de laboratório, Dra. Helena Saxon e o seu assistente, ambos do ... - Idiota! Aquele político estúpido vai enfraquecer o movimento, matando pessoas normais. Mas ele não perde por esperar... - Ele se levanta e desliga a TV. Alto, imponente e triste; essas palavras definem a aparência do líder desse movimento que se propôs a exterminar todos os HIV positivos do planeta. Seu nome é desconhecido, mas todos o chamam de Talzac... E é esse o nome que está sendo pronunciado em voz alta e continuamente no salão principal da base do movimento anti-HIV. Ele se aproxima. Seus fiéis soldados esperam ansiosos pelo discurso do dia. Ele chega à bancada e olha para os rostos de seus soldados por alguns segundos, e então: - Meus amigos. (o silêncio é total agora) Todos conhecem a importância do nosso trabalho e também a nossa dificuldade de aceitação. Na noite passada duas pessoas saudáveis foram mortas devido ao nosso movimento; indiretamente, é claro. - Todos os ouvintes se entreolham. - O nosso apoiador no governo providenciou para que essas pessoas não dissessem ao mundo sobre nosso objetivo principal, exterminar o HIV. Eu fui contra a essa ação, mas não pude evitá-la, cedo ou tarde isso será revelado ao público, de qualquer jeito. Mas como o fato já ocorreu, eu sugiro a todos que intensifiquem os esforços, pois quando o nosso objetivo for de conhecimento público, irão utilizar esse ocorrido para fazer propaganda adversa e quando chegar esse momento eu espero que já estejamos bem avançados em nosso objetivos. Então, agora, vão e acabem com todos os malditos HIVs positivos... Lipem o mundo e salvem o futuro! - E todos gritam: “Talzac! Talzac! Talzac!” E seu olhar se mantém, frio e orgulhoso. XI Numa casa modesta, um casal se apressa em se arrumar para deixar a cidade. A mulher não consegue parar de chorar e o marido, trabalhando depressa, tenta não demonstrar seu medo e desespero para não deixar a mulher mais triste ainda. - Como eles podem fazer isso? Matar pessoas inocentes, por preconceito! - Querida, não tente entender. Eles são animais. Ignorantes e covardes. - E se eles estiverem certos? Acabando com todos os HIVs positivos, se acaba com a Aids. - O homem agarra a mulher pelos ombros, tanto com raiva quanto com medo e diz: - Não diga uma besteira dessas, sua louca! Eles são loucos, fanáticos. Ninguém pode tirar a vida de outro ser humano por causa de uma fatalidade do destino. Se fosse assim eles teriam de matar todos que tivessem lepra, herpes, tuberculose e sei lá mais o que. Não sobraria ninguém no mundo. É como os nazistas, que tentaram “purificar” o mundo com e raça ariana, ou o... - Desculpe, querido, Eu só estou assustada. Por nós, por nosso filho por nascer. Eu não estou pensando com muita clareza. - Ele a senta na cama e a beija. Os dois sabem que tudo que lhes resta é o amor e a confiança um no outro, e por isso eles têm de fugir e se esconder até que o mundo se torne um lugar mais tolerante, onde o amor se sobreponha ao preconceito e à violência. O casal termina de arrumar o que pode e parte para o interior do país. Em suas mentes, dominadas pelo medo, revolta e tristeza, está uma breve esperança: de que um dia eles poderão voltar para casa e ter o mínimo de felicidade na vida. Enquanto o carro se afasta, o casal se olha, e sem saber ambos pensam a mesma coisa: o quanto eles se amam e o quanto os dois amam seu filho, dentro do ventre da mulher, ainda por nascer. XII Na parte mais nobre da cidade, um casal está conversando dentro de um carro, parado em frente a uma das luxuosas mansões. É noite. - O quê? Você sabia antes da gente transar. E não disse nada! - Eu... sinto... muito. Eu não queria... - As palavras do rapaz são abafadas por um soco no nariz, que o faz se curvar de dor. - Você tá ferrado... ouviu bem! Agora saia do meu carro, seu sangue podre! - A garota o empurra para fora do carro com um ponta-pé que o faz cair no chão da rua, e ainda com o nariz sangrando. Ela dispara com o carro e deixa o rapaz para trás, dando uma rápida olhada pelo retrovisor e ao ver o exnamorado lá parado, não consegue conter as lágrimas de frustração, ódio e medo... Agora ela também era
um HIV positivo e isso não significava apenas Aids, mas também um teste de lealdade, aos seus ideais e a seu adorado líder: Talzac. - Cabo Serra se apresentando! - Ela bate continência para o oficial de dia. E ele: - Você está atrasada. Os outros já estão se apresentando no salão. - Desculpe, senhor. Isso não se repetirá! - Muito bem. Vá se trocar e depois se apresente junto com os outros. - Sim, senhor! - Ela se encaminha para o vestiário e põe seu uniforme de cabo; apressada, ela tenta desviar sua mente da terrível revelação do seu namorado: “HIV positivo”. No salão, todos estão à espera das palavras de Talzac; para em seguida irem para suas missões do dia. Entre eles um rosto amedrontado aguarda com mais expectativa que os outros. - ..., vão em paz e limpem o mundo. - À palavra de Talzac, todos se retiram, apenas uma pessoa fica e ela segue em direção de seu líder... - Senhor. - Ela fala timidamente. - Cabo... O que deseja? - Ele, seguro e amigável. - Conversar, senhor. - Pode falar. - Poderia ser um lugar mais reservado, senhor? - Claro. - Ele a olha com desconfiança. - Vamos até minha sala. - Lá: - Então? - O senhor se lembra daquele rapaz que eu fiz a pré-inscrição a algum tempo atrás? - Sim, claro; o de família rica, não é? - Exato, senhor. - Ele é seu namorado, não é? - Ela começa a transpirar. - Era, senhor. - Ele a olha com seriedade, aparentemente, já reconhecendo aquele olhar temeroso. - Muito bem, o que houve? - Ela não contém uma lágrima que desce pelo seu rosto. Mesmo assim mantém a postura firme. - Ele me contou... hoje à noite, senhor... Ele disse que é... HIV positivo, senhor. - Outra lagrima desce pelo rosto da cabo, que não olha mais diretamente para Talzac. - Cabo. - Ela hesita. - Cabo! Olhe para mim! - Ela finalmente olha. - Você fez sexo com este elemento? - Ela, tremendo, diante da autoridade do seu líder, responde: - Sim, senhor. - Ele se levanta de sua cadeira e se dirige até ela: - Você tem duas escolhas: Se matar ou ser morta. Há 90% de chance de você estar contaminada e você sabe que não pode sair daqui viva, carregando essa maldição em seu corpo. - Sim... eu sei, senhor. - Em meio ao medo ela vê que seu líder está orgulhoso com tal fidelidade e isso a alivia um pouco. Mas um pensamento a acorda: - Senhor... eu posso fazer um último pedido? - Eu já sei, cabo. Eu esperava que dissesse isso. - Ela sorri. - Eu estou realmente orgulhoso de você, minha cara. Agora vá. Procure o conselheiro e se prepare para amanhã. Eu darei a ordem e tudo estará em suas mãos amanhã. - Ela bate continência e sai, enxugando as lágrimas, mas, de certo modo, feliz. XIII -... e até onde isso irá? O que o nosso governo fará? O medo... - O governo não fará nada!... Mais uma noite e novamente somos manchete, meus amigos. Eu me congratulo com todos pelo excelente desempenho. - Todos aplaudem e se congratulam, e em seguida se calam ao sinal de Talzac. - Estamos todos aqui hoje para homenagear uma colega. Ela provou sua bravura além da capacidade humana de ser fiel; coisa que espero de cada um de vocês. Ela se revelou ontem como sendo HIV positivo. - Os outros se olham no salão. - E ela, além disso, se revelou capaz de sustentar o nosso ideal: exterminar todos os HIVs positivos do planeta. - Os soldados reagem um pouco confusos, mas atentos. - E aqui está ela, a cabo Serra. - Ela entra sob os olhares atentos de seus companheiros. - Eu só queria dizer que foi uma honra lutar com vocês. Vocês são minha família. - O silêncio domina o salão. - As duas últimas missões da cabo serão, se exterminar e também exterminar o elemento que a denegriu; e aqui está ele. - E pela primeira vez um prisioneiro é levado àquele lugar. Algemado e amedrontado, o rapaz é levado ao salão e é surpreendido ao ver sua ex-namorada lá, com uma arma em punho. - Tam... - E um chute no rosto cala o jovem elemento. - Não pronuncie meu nome, seu imundo! - E Talzac novamente se dirige a seus soldados:
- Nós agora faremos um minuto de silêncio, em homenagem à nossa colega; enquanto ela se dirige para sala de extermínio. Em seguida, todos teremos três horas livres para reflexão. Nos reuniremos aqui mais tarde. - Ele, então, se volta para a cabo: - Boa sorte... e adeus! - Obrigada, senhor. - Ela bate continência para ele e em seguida para os outros, tendo a resposta de todos. Ela se encaminha para a sala sob o silêncio e o olhar de todos, arrastando a sua jovem vítima. A porta se fecha, alguns segundos se passam e ouve-se um tiro e em seguida se ouve outro, com o singular som de um corpo caindo, logo após. Alguns segundos se passam e todos se dispersam. Talzac faz um sinal para o limpador, que se dirige à sala para dissolver os corpos; e Talzac fica sozinho no salão, com seus pensamentos... XIV “Já fazem vinte anos mas eu ainda me lembro com clareza. Foi uma traição, como a que a cabo sofreu, que me fez acabar nesse ponto aonde estou. Em menos de um ano, uma vida bem ajustada e feliz foi transformada num inferno. Meu pai, minha mãe, minha esposa e meu filho de cinco anos: todos mortos. Tudo começou com uma transfusão de sangue para meu pai, daí foi uma reação em cadeia: minha mãe, depois eu, de mim para minha esposa e dela para o meu filho. Quando tudo foi revelado era tarde demais, todos já haviam morrido, somente meu filho durou mais alguns anos e depois, também, tombou diante daquela maldição. Eu queria não ter visto todos morrerem, mas como uma ordem maligna, eu tive de enterrar todos eles e aí eu soube que o meu destino seria sobreviver para acabar com esta maldição que devasta a terra; não por recompensa, nem por reconhecimento, mas por paz interior. Eu não sei onde essa desgraça começou, nem quem inventou ou porque, mas eu sou o escolhido para exterminá-la. Um vingador”. - Cabo Serra! Você também será vingada! Eu prometo! - Grita Talzac, no silêncio do salão. XV - mais uma noite de massacre cobre a cidade e temos notícias de que pessoas foram mortas no mesmo estilo em cidades vizinhas, aparentemente, esse caos e loucura estão se espalhando. Agora, direto do prédio do município, o chefe da polícia está dando pronunciamento: “Nossos técnicos descobriram esta manhã um importante fato para a solução dessa crise”. - O que é chefe? - “Eles acharam um padrão entre as vítimas dos massacres e isso é o primeiro e mais importante passo para se descobrir os assassinos”. - E qual é esse padrão? - “No momento eu não posso revelar, para não atrapalhar a investigação”. - Mas chefe, o povo tem o direito de saber! - “Eu concordo. Mas revelar isso agora poderia afugentar os criminosos e também causar pânico. No momento, o que eu peço a população, é que fique atenta em notar qualquer movimentação suspeita em suas ruas; uma equipe especial da polícia estará de prontidão para atender às emergências; e também que todos fiquem calmos; neste momento o governador deve estar solicitando auxílio do governo federal... Logo esta crise estará terminada... - É o que você pensa, palerma. Agora que já exterminamos com todos os HIVs positivos da cidade, nós vamos expandir e aí será ainda mais difícil de nos encontrar. - No salão, mais uma vez, Talzac discursa aos soldados: - É hora de nos espalharmos!... XVI Na capital do país, o presidente está reunido com os ministros de sua maior confiança: Três. - Que droga! Tanto tempo sem guerra e agora isso. Quando o público souber será uma guerra civil: Aidéticos versus Fanáticos. - O presidente se lamenta, gesticulando e praguejando mais do que quando foi acusado de encobrir corrupção há algum tempo atrás. - Senhor. - Fala o ministro da guerra. - Eu acho que tal ação seria impossível, sem o auxílio de alguém daqui do governo. Esses “exterminadores” são sofisticados demais para um bando de fanáticos. - Ele tem razão, senhor. - Complementa o ministro da fazenda. - Alguns dos vestígios encontrados nas cenas dos crimes mostram que foi utilizada a nossa própria tecnologia militar. - Certo... droga!... Então?... O que devo fazer? - Em primeiro lugar... - Fala o ministro da justiça. ... o senhor deve aprovar um grupo especial de defesa; um que lute com as mesmas táticas e armas. - Muito bem... vocês têm as minhas ordens... Formem esse grupo de contra-golpe e também encontrem o miserável que os ajudou, eu quero ver esse nojento acabado. - Eles cumprimentam o presidente e se dirigem à saída, mas antes: - Ah... senhor. - Ministro de guerra. - É melhor o senhor se preparar para sofrer ataques de todos os lados quando isso se espalhar. - Curioso, o presidente pergunta: - Por que? - Porque o senhor disse na campanha que não ia poupar esforços para acabar com a Aids e de certo modo, é isso que esses assassinos estão fazendo. Senhor? O rosto do presidente se contorce em raiva e tensão, fazendo o ministro se arrepender do que disse e sair dali rapidamente, logo em seguida.
- Meu Deus, como o povo reagirá a isso? Temo pelo futuro! - Pensa preocupado o presidente. E com razão, pois a reação do público será o guia do futuro.
XVII O telefone toca na sala da Talzac. É o seu apoiador na capital. -... não se preocupe, eu já esperava por isso. Nós vamos nos defender, mas vamos tentar poupar o máximo de homem possíveis, afinal eles não são HIV positivo, apenas soldados cumprindo ordens... Claro o senhor tem a minha palavra de que seu nome não será exposto... Até. - Talzac desliga o telefone e não resiste ao comentário solitário: XVIII Mais tarde, Talzac se reúne com seus soldados para o anúncio semanal. Todos estão um pouco tensos com a descoberta da polícia, sobre quem eles estão perseguindo. - Meus amigos, hoje é o meu último anúncio semanal. Com a expansão de nossas investidas, nos reunir aqui toda semana se torna impraticável. Todos já têm seus cronogramas de missões para o próximo mês e cada grupo se reportará a seus chefes, até nos reunirmos no mês seguinte, em lugar a ser determinado. A mais, existe a ameaça da força de emergência do governo federal. Eles irão tentar nos tocaiar na cidade assinalada em seus programas, por isso eu estou designando uma força especial de apoio que irá cobrir os encarregados das missões de extermínio... Se preparem que pela primeira vez vocês terão de eliminar pessoas normais e isso não será muito agradável... Podem ir, e boa sorte. XIX Cinco dias se passam e os massacres se intensificam em toda região central do país, mas uma cidade ainda estava em paz, infelizmente isso era temporário: - Eles estão nos seguindo a horas, chefe. - Eu estou vendo. Vamos manter o plano. - Ele fala pelo rádio: - Sessões, se apresentem! - Grupo 1, missão cumprida, a caminho do ponto de encontro. - Grupos 2 e 3, missões cumpridas e já posicionados. - Grupo 5, missão cumprida e a caminho. - Grupo 6, tudo OK. - Ele desliga e se dirige ao seu time: - Se preparem. Motorista, leve-nos ao ponto de encontro numa via de quinze minutos... Esses soldados não vão nem saber o que os atingiu. XX Algumas ruas se passam e o carro dos soldados de Talzac para em frente a uma casa grande e sem nenhuma outra ao redor. Os agentes do governo chegam logo em seguida, com os faróis apagados e em silêncio. Eles vêem os homens correrem para trás de casa. As ordens deles são de atacar quando forem testemunhas do massacre. Eles saem do carro. São em número de dez. O outro grupo era de seis. Eles, cautelosamente, dão a volta na casa e ao chegarem no fundo se frustram ao ver que não havia ninguém, nem, nenhum movimento. - Vamos tentar a porta! - Nesse momento dois holofotes se acendem e eles são revelados pela luz. - Emboscada! - Eles começam a atirar mesmo sem ver nada. E correm para todos os lados. Alguém atinge os holofotes e então começa a batalha. Os soldados de Talzac são dedicados e obstinados, mas os do governo também não são nenhumas bestas apáticas... Gritos são ouvidos na escuridão, sons de tiros abafam o som de pancadas em todas as partes do grupo. Um bom ouvinte capitaria até o som do pescoço de um homem sendo quebrado. E ao fim de longos três minutos só os homens de Talzac estão de pé, menos três que foram atingidos. Mas todos os dez soldados do governo estão no chão e somente dois ainda vivos. - O que faremos chefe? - Leve os nossos feridos para dentro e trate deles. Os outros levem esses corpos para a fossa e enterrem. - E os dois prisioneiros, chefe? - Ele olha para os dois homens e se lembra das palavras de Talzac: “Exterminar os HIV positivos”! E diz: - Matem-nos! - Com surpresa o soldado fala: - Mas chefe... Eles estão indefesos e são normais! - Os dois homens observam com atenção a discussão sobre seus destinos. - Eles são perigosos à nossa causa. Devem morrer. - E o soldado argumenta: - A nossa causa é salvar o futuro, da Aids e não acabar com seres humanos normais, afinal, é por eles que lutamos também. - O chefe observa os dois homens por alguns segundos e decide:
- Deixe-os presos no porão até nós partirmos, depois nós os libertamos. - Obrigado, senhor! - O soldado. E os dois homens se olham com alívio, mas ainda temendo um olhar de desaprovação do chefe do grupo. XXI Duas horas depois da terrível batalha, os soldados de Talzac saem da casa. Todos já estão prontos para partir, quando... - Chefe, E os prisioneiros? - Podem ir... Eu vou lá embaixo soltar eles. - O chefe desce até o porão. Ele venda os olhos dos prisioneiros e fala: - Eu vou colocar nas suas mãos uma penca de chaves. Uma delas abre as algemas, e até vocês a encontrarem nós estaremos longe. Então, boa sorte! - Ele sai e deixa os dois homens procurando pela chave certa numa penca de mais de 200 chaves, todas iguais. Os carros do exercício de Talzac deixam a cidade, com ela totalmente limpa de HIVs positivos e para trás, também, as marcas de sua primeira batalha com a resistência governamental, que mais que mortes, foi a morte de oito seres humanos normais e essa era a maior dor. XXII Era a última reunião na base central. Todos estão tensos pois a caçada aos HIVs positivos estava para se estender pelo mundo e além disso, muitos ainda sentiam as perdas da primeira batalha com as forças do governo. Na verdade as perdas tinham sido do outro lado, mas a sensação de culpa, por matar pessoas normais, não saia da cabeça dos soldados de Talzac, dele mesmo e principalmente do grupo que teve o contato com os citados homens. Talzac fala... - Meus amigos, a batalha que tivemos há pouco tempo nos tirou um pouco do entusiasmo; eu entendo. O nosso grupo de soldados foi obrigado a se defender e matar um grupo de homens do governo e infelizmente, normais. Não posso lhes dizer que estou contente com nossa vitória nessa batalha, mas estou satisfeito com o retorno ileso do nosso grupo. Só posso agora dizer mais uma coisa: para evitarmos ao máximo as perdas de vidas normais, vamos terminar nosso trabalho antes que mais batalhas aconteçam. Por isso, hoje estão partindo os times de batedores para o exterior e logo poderemos acabar com todos os HIVs positivos do planeta. Vão em paz. - Exonerada a festa que é sempre que Talzac discursa, todos se dispersam, para logo iniciarem a caçada pelo mundo. No salão só ficam cinco soldados que participaram da batalha. Eles queriam ver os noticiários sobre o ocorrido: -... o resto da equipe parece ter desaparecido, mas esperanças de eles ainda estarem vivos são poucas diante do modo como os dois foram mortos. - Na tela aparece a imagem de uma casa bastante familiar aos soldados, era a casa onde eles estavam baseados e para surpresa deles ela estava em cinzas... A reportagem dizia que uma explosão havia matado dois dos homens do governo, que aparentemente estavam amarrados no porão. - “Foi uma eliminação cruel e insana!” - E um dos soldados sabia disso mais que todos. E ele pensa: - “Meu Deus, o chefe matou aqueles dois totalmente indefesos. Que loucura... Será que Talzac sabe disso? O que devo fazer? Será que temos o direito de fazer isso? O repórter está certo - foi insano fazer aquilo. O chefe. Talzac. O futuro...” - O jovem soldado sai do salão com tantas dúvidas na cabeça, que nem percebe seu chefe da missão o observando com atenção... Mas mesmo desatento, ele pensa: “Eu acho que isso é o começo do fim, mas com certeza eu não vou mencionar... poderia ser muito pior.” XXIII 135 soldados partindo para todos os cantos do mundo e 43 destacamentos aguardando as ordens para viajar e exterminar... Assim começa a caçada pelo mundo aos HIVs positivos... Talzac caminha em frente aos seus soldados mostrando o quão orgulhoso está e todos se mostram atentos ao anúncio. - Hoje nós estamos nos expandindo e logo não seremos mais vítimas desse flagelo terrível, a Aids. O mundo logo estará livre e nós também. Aos que ficam, eu os encarrego de procurar os remanescentes internos e exterminá-los. Nosso futuro está próximo e logo ele será uma realidade, com o fim do HIV positivo. - Todos aplaudem sob o olhar firme de Talzac, mas um soldado tem uma expressão diferente. Ele está tenso e bem próximo dele está o motivo de sua tensão: um chefe de equipe que sem dizer uma palavra, o ameaça mais que as forças do governo que tentam encontrar o seu exército. Os soldados se dispersam pela base e o jovem guerreiro se mantém junto a um grupo, temendo o olhar do homem a quem ele chamava de chefe e que assassinou dois homens indefesos, mesmo depois de ter lhe dito que os ia liberar. Mas diante de tanta tensão surge uma voz superior. Talzac: - Venham a minha sala! Vocês dois. - Um olha para o outro e seguem para a sala de Talzac. - Senhor. - Senhor. - Muito bem... Eu já me enchi de ver vocês dois brincarem de ameaça e ameaçado. Soldado, eu sei o que houve na batalha... - Depois dela, senhor:
- Certo. Depois. Não é uma coisa de mérito, eu admito, mas o seu chefe tomou uma decisão de comando e o que está feito, está feito. - Eu entendo, senhor. Eu acho que fiquei confuso. - Quanto a você... Esse jogo de ameaça é coisa que não aprove. Eu lhe dei autoridade de campo e logo eu confio em você. Não precisava essa palhaçada. - Sim, senhor! - Agora podem ir. Temos trabalho a fazer aqui. - Os dois saem, sem nem se olharem. O chefe se esquiva por ter sido repreendido em frente de um soldado. E o soldado, simplesmente, não queria olhar para aquele homem; em sua mente ainda havia um pensamento: - “Tínhamos o direito? Eu acho que uma atitude como essa é uma ameaça ao movimento. Espero que Talzac esteja certo...” XXIV E de todos os cantos do mundo chegavam informes de mais e mais HIVs positivos encontrados e mortos. Os jornais do mundo falavam de medo, desespero e impunidade, mas o exército de Talzac estava confiante no que acreditava e não se importava de ser chamado de assassino; como Talzac dizia, a posteridade julgaria tais atos. Só que os governos do mundo estavam mais preocupados com o momento e a caçada e morte dos HIVs positivos estavam abrindo as portas para uma grande mobilização mundial; um grande perigo para o exército de Talzac. XXV Como um Rei Lear moderno, Talzac se senta sozinho em sua sala e analisa o que já alcançou. Era um sonho, talvez. Depois de tudo que passou na vida... Traições, culpas, ressentimentos, mesmo acreditando que sua “missão” era honrada, ele não podia parar de pensar nas pessoas que eram mortas. De certo modo ele sabia que a posteridade lhe daria o valor que ele tanto se preocupava em manter nos seus soldados. Ele se sentia, mesmo assim, culpado... por ele, pelos mortos, pelos seus fiéis seguidores e por quase tudo que havia de errado no mundo. Ele tentava manter estes pensamentos longe de sua mente pois sabia que isso poderia levar sua obstinação a um estado de psicose e não era assim que ele queria ser lembrado. Talzac descansa sua cabeça a mesa, não tinha paz suficiente para dormir, mas ainda conseguia relaxar, sempre se refugiando nas memórias do passado, quando tinha amigos e não seguidores; um passado que tende a ser esquecido quando surge a breve lembrança da entrada da Aids em sua vida. Ele já beirava os 50 anos, ninguém sabia sua idade ao certo, talvez, nem mesmo ele. O único conforto que lhe vinha à cabeça era quando, ao invés da terrível realidade do seu passado, ele conseguia imaginar o que seria de sua vida, se ela seguisse outro curso ou até como poderia ser seu futuro a partir daí. Apesar de comandar um exercito de exterminadores, perseguidos e temidos em todo mundo, Talzac parecia gostar muito da vida; e finalmente ele dorme. XXVI Um alerta é acionado. Dois nomes da lista nacional tinham surgido como desaparecidos. Um homem e uma mulher e a mulher estava grávida. Talzac ordena a procura dessa pequena família. Imaginava ele, como eles poderiam ter fugido se eles eram da cidade e só foi revelado o intento dos massacres bem depois de terem exterminado todos os HIVs positivos da região. O batalhão que permanecia no comando com Talzac seguiu os passos do casal... hotéis, pequena cidades, motéis de estrada e hospitais, pois cedo ou tarde a mulher teria de dar à luz. E então eles foram achados. Eles estavam vivendo de favor no celeiro de uma fazenda e pareciam bastante doentes quando foram encontrados. A doença já parecia os estar matando. E mais uma vez o impiedoso exército de Talzac exterminou os HIVs positivos que ali existiam. O bebê foi levado de volta à base para exames, eles sabiam que existia uma pequena possibilidade de a mãe não ter transmitido o vírus, mas era uma esperança vã. Ao chegarem na base: - Senhor... nós exterminamos o casal e trouxemos a criança. - Testemunhas? - Ele olhava para o bebê, que estava calmo e “curioso”. - Não senhor. A fazenda onde estavam parecia deserta. Nós checamos para ter certeza. - Muito bem. Levem o bebê para o laboratório. Façam o teste já. - A pressa de Talzac era compreensível. As pessoas rapidamente se apegam a bebês e isso tornaria sua execução ainda mais dolorosa. Três horas se passam e o chefe do laboratório trás o bebê e o resultado do teste HIV à sala de Talzac. Talzac olha o papel... - Eu sinto muito, senhor... - O homem não olha para Talzac.
- (...) - As palavras de Talzac se contêm mas em sua mente: “Ele tem o anti-corpo. Será que a tortura nunca acaba? Ele poderia ter uma vida normal. Mas será que agüentaria uma vida de culpa por transmitir a doença, ver as pessoas morrerem e nunca pegar a doença.” - Senhor!? A quem devo dar a ordem? - A ninguém. Deixe ele comigo. - O homem passa o bebê para Talzac. - Agora saia e lembre-se de riscar o nome da mulher grávida por completo! - Sim, senhor! - O homem saí e deixa Talzac, a completar uma difícil missão.. - Você tem até sorte, sabia?... Não vai ter de passar por tudo que eu vi e passei. Gostaria de saber como esse anti-corpo surge em algumas pessoas e em outras não; talvez essa seja a solução natural para o desenvolvimento humano, mas há muito em jogo para deixar a natureza agir sozinha. Eu espero que me entenda garoto, pois é essa esperança que me dá forças para fazer o que vou fazer... - Talzac deita o bebê no chão, passa o dedo no rosto calmo dele; aparentemente ele tinha entendido, pois até brinca com o dedo de seu algoz. Talzac pega sua arma e aponta para a cabeça da criança, uma lágrima tenta sair dos envelhecidos e fortes olhos de Talzac, mas ele a contém. E um último pensamento lhe vem à cabeça: “Dizem que ao matar uma criança se está matando o futuro, eu espero estar fazendo um...” Ele atira. XXVII Uma reunião de cúpula é convocada entre os dirigente dos países mais poderosos do mundo. Era para ser uma reunião secreta, mas tal coisa foi impossível, diante da grandeza desse movimento. Temerosos por seus povos, eles tentavam decidir o que fazer para deter a onda anti-HIV no mundo. O movimento de extermínio e combate aos assassinos era algo de imediato e drástico. Eles estavam temendo uma futura e crescente simpatia aos exterminadores, pois a esses olhos eles estavam eliminando uma doença e não seres humanos. E havia a possibilidade do exército de exterminadores aumentar através dessa simpatia... - ... e também temos que nos preocupar com essa denotada obstinação. Eles têm de perder força dentro deles mesmos! - Falou o presidente da reunião no seu discurso de abertura. AS decisões foram difíceis de serem tomadas, mas a concordância era necessária e é claro, para alguns dos dirigentes que ali estavam, seus “eleitores” estavam morrendo; a classificação: seres humanos sendo mortos, parecia não tocar a alguns... Três ações básicas foram decididas... E a primeira estava atingindo em cheio o comando Sulamericano do exército de Talzac... - Senhor, esses caras não estão pra brincadeira! - Eu sei soldado! Mas ainda assim, tente somente feri-los. Talzac deu ordens de ao combater, procurar aliados. - Sim, senhor. Vamos tentar... - O soldado se agrupa com seu time e se prepara para avançar. O comando tinha sido cercado na fronteira entre o Brasil e a Argentina, por soldados dos dois lados. Eles estavam se saindo bem, as perdas tinham sido poucas, mas a angústia e a culpa por terem de matar tantos homens normais tinham se abatido com força neles e agora com a aproximação do fim da batalha, eles se vêem na posição contrária à anterior; após eliminarem mais da metade de ambos os batalhões, eles tinham cercado os soldados e pediam suas rendições... - Por favor, entreguem suas armas. Vocês não vêem que a nossa intenção é salvar o futuro do mundo! - Os soldados não querem morrer, mas a rendição seria encarada como traição pela liga de nações. Eles não têm escolha, apenas o sacrifício... Mas eles não vão sozinhos; ao fim da batalha, o comando do exército de Talzac havia perdido cerca de 30 soldados e isso era o suficiente para cobrir uma região em um mês. A desesperança e tristeza começavam a atingir os soldados de Talzac e eles ainda tinham que completar as missões de parte da América do Sul, só que o estímulo já não era o mesmo. XXVIII Talzac recebe o relatório de atividades e se frustra ao ver o resultado da segunda batalha com soldados governamentais. - Senhor, o que faremos? Parece que todo mundo, está atrás da gente. - Isso era esperado. Eu só não queria que tantas vidas normais fossem desperdiçadas. - ... Sim... Senhor. - O soldado se retira e Talzac permanece pensativo; o ministro da defesa o havia alertado da mobilização mundial, mas não imaginava que seria tão forte: os dois batalhões, de dois países, totalmente mortos; eles não quiseram se render. As dúvidas pareciam povoar, também, o grande líder... Enquanto isso no salão, novos recrutas eram classificados para o exército de Talzac: - ..., qualificação e preferência? - ..., auxiliar de dados, trabalho de ajuda interna; se for possível. - Fala alguma outra língua? - Não, senhor.
- Alguma experiência com armas? - Não muita, senhor. - Tudo bem, não se preocupe. Toda ajuda é valida... Você pode ajudar a localizar os remanescentes internos. - Será um prazer, senhor. - Próximo... - O jovem recruta se dirige ao departamento de dados. Em seus olhos a obstinação quase que natural dos soldados de Talzac é substituída por uma intenção única... e sua nova função é um primeiro e importante passo. - Senhor! - Aha! Pegue este terminal. Só o que tem a fazer é procurar nomes... - Eles sorri ao olhar a tela. Nomes ele vai encontrar. XXIX Capital. Um respeitado ministro de estado se dirige ao seu carro oficial. Ele entra e nele, sua tensão evidente escorre pelo rosto. Como todo político num momento de tensão, ele não sabe para onde pender. Escolhas feitas por interesses não honradas acabam se esvaindo em falta de direcionamento e obstinação. Mas isso não importa mais... - O ministro da defesa foi encontrado morto dentro de sua limousine oficial. Ele estava com um tiro na testa e aparentemente não esperava tal coisa pois não havia sinais de qualquer reação. Seu motorista não foi encontrado. A polícia federal disse que está à procura dele para esclarecimentos, mas não se viu nenhuma ação dos policiais ou do governo... - Claro! Foi o governo que fez isso. Aquele idiota teve o que mereceu. Mas eu me preocupo que conseqüências isso poderá ter... - Talzac estava certo, o seu principal informante no governo tinha sido descoberto e morto. A dúvida de como ele havia sido descoberto martelava na cabeça de Talzac, mas outra coisa também o preocupava: eles mataram um ministro e não fizeram nenhum comunicado, talvez eles ainda soubessem mais do que se poderia imaginar. As três metas da liga das nações estavam se concretizando: eliminação, infiltração e descrédito, pois daquele momento o próprio Talzac se encontrava confuso. Agora, não só questões morais e filosóficas povoavam seus pensamentos, era uma questão de estratégia. Era o mundo contra ele. XXX Os massacres prosseguiam em todo mundo. Os relatórios chegavam a cada dia, constatando o extermínio dos HIVs positivos. Talzac comandava seu exército, interna e externamente, mantendo o moral e a vitalidade do movimento... mas uma coisa tirava a paz de todos: não se sabia o que os países estavam planejando. Todos sabiam que havia uma grande mobilização mundial, mas suas ações eram uma grande interrogação. A quantidade de novos recrutas havia se reduzido a um mínimo. De todo mundo se ouvia notícias de mobilizações populares contra os “assassinos preconceituosos”. O descrédito chegava a atingir os soldados de Talzac em alguns lugares. A grandiosidade e honradez do movimento pareciam estar sendo manchadas por uma febre de descrédito e publicidade adversa. Talzac estava posto a prova em seu poder de liderança. A fidelidade, eficiência e obstinação ainda eram a chave do sucesso do movimento. Os países estavam mobilizados. Os exércitos estavam se armando. Os soldados de Talzac estavam sendo observados. Só estava faltando um sinal, algo que quebrasse a força do movimento e o eliminasse. Talzac...
XXXI A lista do país havia chegado ao fim. Num comando enfraquecido pelo movimento contrário em todo planeta, Talzac olha o último nome da lista, entregue pelos seus auxiliares que ficaram com ele no país... - Vocês não têm que se preocupar com este. Ele já está morto. Ele morreu por sua própria decisão. - Então, senhor. Por que seu nome ainda está registrado? - Porque ninguém sabe que ele já está morto. - Então o senhor o conhecia? - Sim. Conhecia. Ele era um grande amigo, de certo modo, foi seu grande sacrifício que me fez organizar este movimento. - Eu sinto muito, Talzac. - Não importa. O que importa é que o nosso país já está limpo. Como vão as equipes espalhadas pelo mundo?... - Um dos soldados fica observando a lista e pensando: “Depois de tanto tempo, ele vem dizer que este já está morto. Por que não fez isso antes? tenho algo estranho aqui e pode ser a fraqueza
que eu vinha procurando.” Ele procura e acha. Ele é o infiltrado e essa é a primeira chance que ele encontra em meses de infiltração. O nome é simples mas incomum, os dados chegam rapidamente ao comando central da inteligência e depois de muita procura em velhos bancos de dados, finalmente vem a identificação daquele significativo nome e o resultado é mais que surpreendente... Os dados e a foto são enviados ao espião que olha com satisfação a apunhalada final no movimento de Talzac: Talzac é HIV positivo. Um soldado reúne todos no salão central da base, uma revelação ele tem a fazer... - Meus amigos, com pesar eu venho lhes dizer que... nós fomos traídos. - Eles reagem com apreensão. - Sinto informar que nosso adorado líder, Talzac, apesar das palavras fortes que nos conduziram nessa guerra contra o HIV positivo; tem em seu sangue o motivo dessa guerra... Ele, Talzac, é HIV positivo. - Os soldados ali presentes reagem com descrença e revolta: - Mentirosos! - Você, é o traidor. - Difamador! - Não, meus amigos. Aqui está a prova; o último nome da lista é na verdade o nosso líder, Talzac. Ele é o traidor da própria causa. - Ele passa os dados e a foto para os presentes e ainda descrentes, alguns começam até a chorar em face de tal desespero: - Não pode ser! Não é verdade. - E nesse momento Talzac entra no salão: - O que está havendo aqui? - fazendo o soldado responder: - Caro líder... Sr. Galei Ferro. Que bom. - O quê? - Talzac, diga que não é verdade! - Então vocês descobriram. - Sim, sangue podre. Todo esse tempo você não passava de um HIV positivo. - Sim, é verdade. Mas eu tenho o anti-corpo, o mesmo que o bebê tinha e eu.. - Não importa... Você nos traiu e merece a punição de todos os HIVs positivos... - Ele pega a arma e aponta para Talzac. - Vocês não entendem, eu tinha que... - Mas sua voz é abafada por um tiro que o atinge no peito. - Espere seu louco, deixe ele explicar. - Explicar o quê? Ele é um traidor. - O espião sabia que não podia dar oportunidade a Talzac, pois sua liderança iria prevalecer. Talzac: - Me desculpem, meus soldados, eu... - Ele morre; todos olham para seu corpo e não sabem se o desespero era maior com Talzac sendo traidor ou com ele morto. - Não fiquem aí parados. Avisem a todos os comandos do mundo. Nosso líder traidor está morto. Eu vou chamar o limpador para dissolver seu corpo infectado. - Os soldados saem tristes, sem nem mesmo discutir a atuação do outro soldado; atônitos, agora, sem esperanças ou fé. Eles se comunicam com os comandos; e ao redor do mundo, aquele nobre e obstinado grupo de homens e mulheres se vêem indefesos, sem seu adorado líder, sem saber o que será o futuro. XXXII Dias se passam e o soldado infiltrado comunica o êxito de sua missão a todos líderes na capital. Na base ninguém nota sua ausência, diante de tanta desorganização. A morte de Talzac tinha enfraquecido todo movimento; em todos os lugares do mundo, as missões de extermínio estavam sendo executadas com ineficiência e comumente os soldados eram pegos pelas forças multinacionais, emboscados em diversas partes do mundo. O conhecimento da traição e morte de Talzac condenou o movimento ao seu próprio massacre e deu aos líderes do mundo a brecha que eles procuravam na força e na obstinação dos soldados de Talzac, que até este ponto eram considerados invencíveis. Era o início do fim... XXXIII Não havia muita esperança. Eles lutavam mais para manter as próprias vidas que para sustentar um movimento totalmente desacreditado. Eram quinze homens e oito mulheres, tudo que restava de um movimento que conseguiu matar quase 900 mil pessoas em todo mundo. Os soldados de Talzac, antes tão temidos, estavam agora à beira da extinção. As forças multinacionais haviam caçado e matado todos os seguidores de Talzac, depois de sua morte ficou até fácil. O último grupo está, agora, encurralado no meio da Floresta Negra, na Alemanha, numa cabana que fora montada como centro de operações regionais, mas agora está exposta, sem mantimentos e os armamentos estão mais que escassos. De todos os lados, soldados das forças multinacionais se aproximam... - Nós vamos morrer! - Isso é óbvio. O problema é que além de morremos, será por alguém que nos traiu. - Ele não nos traiu. - Traiu sim. Ele era HIV positivo e não nos disse.
- Ele tinha que cumprir a missão primeiro. Você não entende. E além disso, ele nunca infectou ninguém. - Isso não fez diferença. Lembra daquele cabo; ela se matou por ser HIV positivo. Ela foi bem mais corajosa que ele. - Não diga isso. Ela era corajosa, é verdade; mas Talzac nos guiou por cinco anos e quase conseguimos, e eu aposto que ele faria o mesmo se tivéssemos conseguido. Ele se mataria, num último sacrifício para salvar o futuro. - Isso não importa mais agora. Todos vamos morrer, estejamos certos ou não; Talzac sendo traidor ou não... - É claro que importa, seu tolo... Todos vocês! Nossas mortes serão documentadas no futuro, nossa tentativa de exterminar os positivos será um marco na história moderna e isso já vale o nosso sacrifício. É por esse esforço que eu peço a todos que quando a batalha começar, lutem como leões e mostrem ai mundo que nos importamos mesmo quando derrotados. - Olhos se entreolham debaixo da tristeza e do desânimo. naquela simples cabana, no meio do mato, o último foco do movimento de Talzac se prepara para morrer, na luta; agraciando a vitória do inimigo com a obstinação que foi sempre sua marca. - E lembrem-se, só atirem nas máquinas e nas pernas deles. Nós não matamos pessoas normais! - Eles vêm vindo! - Todos correm para as janelas; eram centenas; seria um massacre; mas eles não se importavam mais... - Vamos lá, soldados... pelo futuro! - Os vinte e três soldados saem da cabana, ferozes, atirando nas forças multinacionais, demonstrando seu orgulho há muito esquecido. Do outro lado: - Fogo! - E um massacre sem precedente é acometido: mais de 300 homens atirando em 23 pessoas que estavam levemente armadas e tinham mais vontade que balas. Então, um a um os soldados de Talzac vão caindo, cravados com dezenas de balas cada, só a obstinação mantinha os últimos de pé e que por fim também sucumbem àquele enxame de balas. Foi um espetáculo. - Caros amigos do mundo, tenho hoje o prazer de transmitir o fim do preconceituoso e assassino movimento para exterminar os HIVs positivos do planeta. Só lamento ele ter sido alcançado depois de tantas mortes. As pesquisas para se alcançar a cura dessa terrível doença vão continuar e tomaremos providências, em todo mundo, para que o fanatismo preconceituoso não se erga novamente no coração de homens sem fé no futuro da humanidade. Obrigado... EPÍLOGO - Morreu hoje às 10 da manhã o último aidético do planeta. A comunidade científica se lamenta por não poder ter salvado a vida desse homem. Junto com ele, devemos nos lembrar dos dois bilhões de vítimas dessa doença, que desde fins do século XX até hoje desafiou-nos e nos forçou a sermos selecionados pela natureza, para hoje termos 100% da população mundial, HIVs com anti-corpos; o que por anos cientistas tentaram reproduzir para salvar as vidas das pobres vítimas da Aids. Além disso, não devemos nos esquecer do terrível massacre que varreu boa parte dos HIVs positivos do planeta na última década do séc. XX e que de certo modo, apesar do fanatismo e da loucura, foi por causa deles que atingimos este dia histórico, mais rápido que o que poderia ter sido ... Hoje, nós testemunhamos o fim da Aids... Agora as notícias locais... Não há certo ou errado, apenas atitudes, que no fim formam o nosso caráter. Nota: Aids é a doença e HIV é o vírus. Ao se ter o vírus, pode-se ou não se ter a doença; portanto ... “100% de HIVs positivos com anti-corpos ... o fim da Aids”. O Autor
ABSURDO Parte I Arnold andava pela rua à noite, estava quente e ele não agüentou ficar em casa vendo TV. Ele não chegou a sair de sua vizinhança, segura e familiar, mas se afastou o suficiente para cruzar com um grupo de “night bikers”. Foi estranho, ele não tocou em nenhum deles, não sentiu nada enquanto eles passavam, mas era como se aquele barulho de catracas travadas, misturado com o calor e a umidade da noite, tivesse penetrado em sua alma. Antônio, ele não sabia mais para onde estava indo, por um segundo até esqueceu quem era; então ele se vira e anda de volta para casa. Na primeira esquina que ele cruza, ele nota uma coisa curiosa, algo que nunca tinha notado antes; era uma espécie de bar, iluminado; não conseguia imaginar como tal lugar podia estar ali, no seu bairro, sem ele jamais ter notado. Ele se aproxima; por uma janela de vidro ele vê pessoas bebendo, mulheres semi-nuas, um jovem cheirando cocaína numa mesa e até um casal fazendo sexo no chão, bem no meio do bar e o pior é que ninguém parecia ligar. Ele olha para o barman e esfrega os olhos para ver melhor, era Freddie Krueger, ou alguém fantasiado, mas era muito real e ele estava com azeitonas recheadas presas nas garras, preparando martinis. “Que lugar bizarro era aquele afinal?” Ele pensa. E uma mão toca seu ombro, fazendo ele se virar e em seguida gritar de susto... Era uma criatura marrom, semelhante a um urso, só que sem pelos e com uma espécie de língua que saía de um buraco na testa, pingando uma coisa branca todo o tempo. Ele achou repugnante, mas ainda assim ficou lá o tempo suficiente para ouvir a pergunta do elemento: “Esse é o único bar aberto por aqui? As pessoas parecem estranhas!” Arnold não respondeu, mas em sua admiração e surpresa, com uma coisa que perguntava com uma boca e fazia exclamações com outra; ele produziu um som parecido com “Eh!” E então a criatura agradece e entra no bar. Ainda de boca aberta, Arnold dá mais uma olhada pela janela e em seguida continua seu caminho, fingindo que estava tudo bem. Dois quarteirões se passam e o assustado Arnold se depara com algo tão ou mais inesperado; era uma nave espacial do tipo disco-voador; ela estava aberta e de dentro saíram às dezenas, pessoas ou pelo menos pareciam pessoas, todas exatamente iguais a Kiko, da série mexicana “Chaves”, e todos estavam usando os ridículos terninhos de marinheiros. Por um minuto Arnold achou graça, mas lhe veio à cabeça que aquilo era uma invasão do espaço e que os alienígenas só estavam disfarçados e provavelmente seriam perigosos para a Terra. Ele se aproxima mais e nota que os “Kikos” estavam saindo da nave e entrando numa lanchonete McDonald’s; eles entravam, comiam e depois viravam uma esquina, em seguida aparecendo um a um do outro lado, um tanto menos espécies apáticos que os outros e então entravam de novo na nave por uma porta do lado contrário à outra, por onde eles saiam. Arnold fica observando aquilo um tempo, sem saber o que pensar: “Por que alienígenas viriam à Terra, na forma de Kiko, só para ficar comendo e voltando para a nave, o tempo todo?” E o pior que os funcionários da, lanchonete não ligavam, só serviam e pegavam mais e mais dinheiro. Cansado daquilo. Arnold diz a si mesmo: “Que se dane! Kiko é idiota mesmo. Um planeta cheio deles, só pode ser um planeta cheio de idiotas.” Então ele se vira e continua seu caminho para casa. Uma quadra antes de chegar, ele nota mais uma coisa estranha; deixada na calçada. Era uma espécie de cabide, como as de tirar foto, só que com uma cortina na frente e outra atrás, como um túnel. De acordo com os acontecimentos da noite, ele não sabia o que esperar; passou um tempo e nada. Ele não sabia se olhava dentro ou não; mais uma quadra e ele estaria em casa, em paz ou então ele olhava e matava a curiosidade. Arnald se aproxima, acanhado e cuidadoso, então... uma voz ecoa na noite silenciosa; alguém grita seu nome e com o susto ele se joga para dentro da cabine e para sua surpresa nada havia acontecido, ele só sente um mero mal-estar, provavelmente causado pelo susto. Mas passado o mal-estar ele nota que não havia mais cabine e que ele estava no mesmo lugar onde havia começado, ele ainda podia ver os “night bikers” no final da rua. “O que aconteceu? Ele pensa. Teria sonhado aquilo; acordado e de pé? Muito confuso ele começa a fazer o seu caminho de volta para casa, desta vez um pouco mais rápido, pois o quanto antes ele chegasse em casa, mais rápido poderia descansar e esquecer essa noite tão estranha. Mas o estranho poderia estar só no começo. Novamente, lá estava o bar iluminado, só que desta vez com uma figura bem diferente parada em frente à janela de vidro, era ele, de novo. E lá estava a criatura entrando no bar e ele saindo, andando para casa. Arnold não sabia o que fazer. Ele anda até o bar e olha para dentro, estranhou não ver a criatura lá dentro, mas ao se virar para ir embora dé de cara com a mesma e desta vez nem fala nada só sai andando, com o monstro novamente entrando no bar. Arnald estava assustado, não sabia o que pensar, o que fazer, só continuou seu caminho, agora já quase correndo; encontrando logo a muito familiar invasão de “Kikos” ao McDonald’s. Não foi difícil para Arnold notar outra figura conhecida observando a “porta dos fundos” do discovoador, por onde os “Kikos” entravam; novamente era ele; um gelo tomou conta do seu corpo, lágrimas se formam nos seus olhos, ele não conseguia se mover ou ao menos falar: “O que está acontecendo?”
Após alguns minutos ele segue caminho; já sabe ou pelo menos imagina o que vem adiante e então surge, de novo, a cabine e novamente lá estava ele próximo a ela, olhando; desta vez ele tem forças para dar um grito e dizer seu próprio nome, o que faz o outro Arnald se assustar e se jogar na cabine. Ele corre até ela, mas não sabe o que fazer. Agora ele sabe o que a cabine faz, ele poderia ir para casa e esquecer tudo, mas como esquecer que o outro ele está passando produto de novo. Então Arnald decide ir atrás dele para evitar que ele entre na cabine de novo. Ele entra na cabine, chegando a ouvir alguém gritar seu nome, muito alto; mas ao se virar só o que vê são os “night bikers”, novamente lhe provocando um malestar. Ele olha para os lados e vai em direção do bar; correndo, desesperado, tentando se alcançar; mas ao chegar lá só vê aquela criatura entrando no bar, sem nenhum sinal dele. Arnold agora corre para tentar se alcançar na nave. A noite que estava quente e úmida se tornou um gelo, com o pavor que ele sente. Arnold chega a nave a tempo de se ver paralisado diante da mesma, agora era a chance se alcançar; mas no seu desespero ele não notou que vinha sendo seguido e que esse elemento estava para se manifestar; novamente, gritando seu nome. Arnold. Ele se assusta, olha para trás e vê outro ele, aparentemente mais assustado e desesperado que ele, então ele se vira para o outro ele que ele perseguia e vê que esse já havia seguido. Por um momento Arnald ficou confuso sobre o que deveria fazer, então olhou para o ele que lhe havia gritado e decide se virar e correr atrás do outro ele, para impedi-lo de entrar na cabine, novamente; mas foi tarde demais quando ele chegou lá, pois o outro ele já havia entrado. Arnald não sabia o que fazer. Parou um momento e pensou: “Tem outro eu vindo logo atrás de mim. Eu só tenho que esperá-lo e assim ele poderá me impedir de entrar na cabine, mas eu já sei disso. O que vai acontecer então? “E em voz alta: “Vai haver dois de mim?” E da escuridão da rua surge uma voz que diz: “Três!” E depois: “Quatro!” E outra: “Cinco!” E mais uma: “Seis!” ”Sete!” “Oito!”... E de todos os cantos surgiram Arnolds dizendo um número, cada vez maior e que não parava de crescer. Arnold olhou ao redor, assustado, apavorado, bestificado. Parecia que o mundo estava povoado por ele e ele não podia fazer nada para consertar a situação. E um deles diz: “Eu não sei de “vocês” mas eu estou com fome! “E outro diz: “O McDonald’s está aberto! “Outro diz:” “E os kikos?” E outro:” Então, vamos em outro lugar. Existem muitos!” E eles vão em várias direções diferentes, em grupos, divergindo para todos os lados, deixando lá, só, Arnald, confuso. Ele se aproxima da cabine sem saber o que fazer... e é quando alguém grita seu nome e com o susto ele cai na cabine, indo parar... no mesmo lugar... de novo.
COMEÇO Parte II Alemanha, 1943: A guerra fazia brotar das necessidades, as descobertas mais inusitadas. E o cientista alemão, Hans Duuterich, estava sob ordens do reich para descobrir uma nova fonte de energia que sobrepujaria os aliados. E ele estava prestes a descobrir essa fonte de energia. O laboratório está completamente iluminado por uma luz esverdeada e o Dr. Duterich observa atentamente as reações de um globo misterioso, alojado em uma cabine à sua frente. Agora só faltava o acréscimo de um elemento para que o reich tivesse em seu poder a mais extraordinária fonte de energia do mundo. O doutor então se prepara, cuidadosamente, para acrescentar à massa do globo energético uma barra de Verinío 38 magnetizado, que, teoricamente, fará a energia se expandir e ativar o gerador postado ao lado; mas o que ocorre ao invés, é uma exploração luminosa que, paradoxalmente, consume toda a luz do laboratório, fazendo o cientista, a cabine e metade do laboratório desapareceram no espaço. Local desconhecido, tempo indeterminado: Um misterioso grupo de criaturas observa um homem no centro de uma sala circular. O homem é o Dr. Hans Duterich, ele está nu e obviamente apavorado. As criaturas são os Escaterianos, semelhantes fisicamente aos Andorianos da série Jornadas nas Estrelas (original), isto é, azuis, com antenas curtas e com olhos esbugalhados. Elas estão sondando mentalmente o cérebro do Dr. Duterich, para tentar descobrir de onde ele veio, como ele chegou no planeta deles (Escata) e o que é a misteriosa cabine que apareceu com ele, a qual eles tiveram de cobrir com uma espécie de cortina, pois dois escaterianos tinham sumido quando foram iluminados pela luz do globo de dentro da cabine. A mente do cientista está confusa mas os escaterianos conseguem descobrir a origem dele, a Terra, planeta do qual eles tinham ouvido falar há muito tempo atrás; dos Tremechs, seus vizinhos de sistema. Então a curiosidade dos escaterianos aumenta e eles resolvem ir a Terra para descobrir mais sobre aquela espécie e também para descobrir a utilidade da cabine. Galáxia de Zetuner, tempo irrelevante: A frota de discos voadores de Escata viaja a velocidade de dobra, quando uma estrela próxima lança uma chama de raios cósmicos sobre eles. Estes eventos são conhecidos dos escaterianos mas do passageiro terrestre ali presente, não; e ele sofre as conseqüências da desinformação, se transformando
numa criatura de tal repugnância que assusta tanto os escaterianos, como o próprio homem que ainda existia dentro da criatura. O cientista se viu na parede espelhada da neve e se desesperou, correu para todos os lados; os escaterianos não sabiam o que fazer: uma criatura com duas línguas, uma na testa e uma na boca e ainda babando o tempo todo, era demais até para eles. O cientista monstro então avista sua cabine. Ele não sabia ao certo o que ela fazia, mas achou que era uma chance, talvez a única, de se refazer. Então ele corre na direção da cabine e pula dentro dela, provocando uma pequena explosão de luz e em seguida um silêncio sepulcral. Os escaterianos estavam atônitos; com medo de olhar dentro da cabine, hesitaram por horas, esperando talvez que o cientista reaparecesse, o que não ocorre. Então um deles toma coragem e se aproxima da cabine; timidamente o escateriano sobre a cortina e para surpresa de todos não havia nada dentro dela, nem mesmo o globo luminoso; aparentemente a energia cósmica que estava no cientista mostro afetou o globo, fazendo-o sumir. Os outros escaterianos, se aproximam, mas uma coisa inesperada acontece, quando um deles resolve entrar na cabine: o mesmo desapareceu reaparecendo em seguida no lugar onde estivera à 90 min. antes. Todos se assustam com o ocorrido, sem saber exatamente o que havia acontecido; nem mesmo o elemento que fez a estranha jornada estava certo do que tinha ocorrido... para ele a viagem tinha sido instantânea. Então eles fecham a cabine e decidem que ninguém chegaria perto dela até eles chegarem na Terra e alguém os esclareça sobre o assunto. México, 1978: Uma excursão de atores às ruínas Astecas. É noite e todos dormem, menos um; é Ernãndro Paez. Ele está de pé, mijando, junto a um dos misteriosos momentos Astecas; é nesse instante que uma luz intensa o atinge e ele é puxado para um objeto circular postado acima dele. O objeto é a nave mãe da expedição de Escata e os seus tripulantes, os escaterianos, estão ali, seguido as indicações de seus vizinhos Tremechnos, que já estiveram naquele lugar muito tempo atrás; para finalmente esclarecer o mistério da cabine que foi parar no planeta deles. O jovem ator, Ernãndro Paez, treme de medo em frente a tais azuladas criaturas, que sondando sua mente, só conseguem captar uma estranha simbologia, bem diferente da do cientista que eles conheceram; era baseada numa estranha vestimenta: escura, de calças curtas e com um laço ou gravata no pescoço. Aparentemente, tudo que aquele homem sabia estava ligado àquela roupa. Os escaterianos resolvem se afastar da Terra e com o tempo atingir mais conhecimento com aquele homem. Local desconhecido (na Terra), 1994: Uma nave de pequeno porte pousa numa rua, de uma cidade, em frente a uma lanchonete 24 hrs. A nave abre duas de suas portas: a dianteira e a de trás; e de dentro dela, pela porta dianteira, começam a sair homens de fisionomia muito similar, uns com outros. A nave é a menor da frota de Escata e os homens são centenas de cópias do ator mexicano Ernãndro Paez, todos vestindo o figurino de seu personagem mais famoso: Kiko, da série “Chaves”. Eles saem, entram na lanchonete, comem e depois voltam para nave pela porta oposta e só. Não muito longe dali, a nave mãe da frota de Escata se põe sobre uma rua, deserta naquele momento. Um feixe luminoso se liga ao chão, descendo por ele dois escaterianos e mais uma misteriosa cabine, pousando, todos, suavemente na rua. Os dois elementos: - Ia iak sakkakh homo sapiens! - Ia shaxul? Ninnghizhidda! - Homo sapiens ..., akkaj debú! - Então os dois seres se postam juntos, um pouco a frente e em seguida são puxados de volta para a nave, que parte em um salto de dobra, junto com o resto da frota, retornando para Escata. Vinte minutos se passam e um elemento aparece na rua; obviamente curioso, ele se aproxima da cabine e em seguida entra... O elemento é Arnold e o que ocorre é uma posteridade anterior.
AS CONTRA-SAGAS Parte III Parte escura de Júpiter (em órbita)/algum ponto entre 1978 e 1994: Um homem está se deparando com uma realidade aterradora: ele é refém de criaturas alienígenas que o fizeram vestir uma roupa ridícula, a qual ele conhece muito bem; e que ficam o tempo todo invadindo seus pensamentos, querendo saber sobre uma misteriosa cabine ali presente. O homem é Ennandro Paez, ator mexicano, que representa o “Kiko” da série de TV “Chaves”. Os alienígenas são os escaterianos e a cabine foi o motivo pelo qual eles pegaram o ator, pois eles não entendem como ela funciona... Após algum tempo, o ator já estava acostumado àquela rotina, afinal, ele estava sendo alimentado, bem tratado e tudo não deixava de ser uma aventura. Mas os escaterianos estavam ficando impacientes; tanto tempo e não tinham descoberto nada; foi então, que depois de muitos testes com os próprios
escaterianos entrando na cabine e aparecendo aonde estavam há 90 min antes; eles decidiram colocar o ator na cabine para ser se acontecia algo diferente. Os escaterianos chegam no alojamento onde o ator está; sem desconfiar ele os acompanha até a cabine. Lá, os escaterianos apontam para o seu interior e não vendo muita escolha o ator entra na cabine... e para surpresa dos escaterianos em volta, o homem aparece ali mesmo onde eles estavam, mas não do mesmo jeito de antes; ele estava confuso e desorientado. Os escaterianos começam a ler sua mente e então eles vêem que o ator tinha reaparecido, como os escaterianos, onde ele estivera há 90 min antes, só que ele também tinha retrocedido os 90 min e para ele era a segunda vez que aquilo acontecia. Os escaterianos estavam mais confusos que antes; eles lançaram outro escateriano dentro da cabine e só aconteceu o normal. Eles então, fizeram o ator entrar na cabine de novo, mas desta vez deixaram dois guardas vigiando o alojamento do ator, mas não se alterou muita coisa. Seguidas vezes os escaterianos lançam o homem na cabine, acontecendo sempre o mesmo; mas eles esquecem de uma coisa importante: o tempo continuou passando e de repente começaram a aparecer vários homens, todos iguais ao ator, vindo de diversos pontos da nave. Os escaterianos ficaram atônitos; eles não sabiam o que tinha dado errado... em algum ponto do experimento a linha normal do tempo tinha sido mudada e a cabine estava acometendo uma espécie de túnel no espaço/tempo que continuamente estava retornando ao mesmo ponto,, como um eterno “replay”. Os escaterianos estavam apavorados. Eles isolaram a cabine, pegaram todos os “Kikos” e colocaram na mesma nave, ocupando-a totalmente e decidiram voltar a terra para deixar tudo lá: Eles não conseguiam imaginar porque os homens inventariam tal coisa. Qual a utilidade? O pobre ator(es), aparentemente, não se abalou com todo o ocorrido; e afinal, ele(s) estava voltando para casa. Local desconhecido/tempo...: Atordoado, abalado, tonto. Essa é a descrição de como está se sentindo uma criatura caída em uma mata, de árvores altas e verde abundante. A criatura é o que restou do renomeado cientista alemão, o Dr. Hans Duterich. A mata é o típico, que cobre 90% de um planeta distante e completamente desconhecido do homem: Sasquátia, na galáxia de Plifiêrir. Ele anda sozinho, sem saber para onde ir. Ele não via um sinal de civilização. E apesar da floresta ser familiar... algo lhe dizia que ali não era a Terra. Mas ele se aliviava de não ter como se ver, pois ainda se recordava da terrível mutação que o havia atingido. Dois dias (terrestres) se passam e o cientista/monstro decide por acampar num canto da floresta; parecia seguro e ele não tinha visto sinal de nenhum tipo de animal que lhe pudesse fazer mal. mas o que a criatura não sabia é que todo tempo estava sendo vigiada; da maneira mais imperceptível possível, pois as inocentes árvores que cobriam quase todo planeta eram as extremidades das construções de uma sociedade inimaginável pelo homem: eram os sasquátis. Eles vinham sentindo cada passo da criatura desde que ela havia aparecido e o seu presente sono ao canto de uma “árvore” da “floresta”, foi o momento aproveitado pelos asquátis para capturá-lo e esdudá-lo... Uma câmara de vidro, toda transparente; dezenas de seres monstruosos do Dr. Hans Duterich. Ele está assustado. Tinha sido trazido para esse lugar enquanto dormia. Seus anfitriões retiraram amostras de sangue, pele e pelo. E também fizeram leituras cortexiais. O monstro/cientista, agora, aguardava o que vinha a seguir... Os sasquátis colocam uma éspecie de tela junto á parede de vidro. O Dr/monstro observa. Na tela aparecem imagens do espaço e uma seta fica apontando o que os sasquátis querem dizer e é no momento que aparece a imagem da Terra que o Doutor reage, apontando para a mesma. A reação dos sasquátis é um tanto surpresa mas a avaliação já tinha atingido o seu objetivo: os sasquátis sabiam de onde aquela criatura era e iriam levá-lo de volta para casa... Um objeto escuro sobrevoa uma floresta, agora uma mais familiar; no Canadá. O objeto desce no meio da floresta; é noite e a nave se encaixa perfeitamente à floresta, como algo já projetado. Uma porta se abre e dela sai o Dr/monstro e para sua surpresa, ele vê dezenas de sasquátis aguardando do lado de fora. Por um minuto ele pensou que estava de volta a Sasquátia, mas não, era a Terra e ali era um posto avançado dos sasquátis, instalado há milhares de anos terrestres, quando o homem ainda não existia. Por uma saída secreta. o Dr/monstro sai para o exterior, acompanhado do chefe da expedição sasquáti na Terra. Eles andam um pouco, então o sasquátis aponta e “diz”: - VOUN-CÔ-VER - Ele o olha e diz: - Obrigado por me trazer de volta e... - Antes que o Doutor pudesse terminar, o sadquáti dá as costas e dasaparece na “floresta”. O Dr/monstro observa por um tempo esperando que a nave que o trouxe, retorne, mas isso não ocorre: o sistema de camuflagem é perfeito e quem está de fora nunca vê nada. Ele se vira e começa a caminhar para cidade, mas no caminho começa a lembras dos fatos e num momento ele para. O cientista/monstro se lembra que não é mais um homem, é um monstro repugnante com duas línguas. Ele seria perseguido, caçado; ele seria uma aberração. O Doutor se senta no meio da
mata e se lamenta de tudo, sem saber o que será do seu futuro daí em diante... Ele pensa: “Aquela coisa! Aquela maldita cabine! Espero que não exista mais! Ela é uma maldição!” Alemanha 1945: Berlin é um monte de entulho. A devastação é o predominante, onde antes reinava a capital do reich. As tropas aliadas vasculham tudo, a procura de resistências, fugitivos ou ainda, qualquer coisa de valor. E é num dos laboratórios de pesquisa de uma das maiores universidades da Alemanha que é encontrada uma das coisas de maior valor para o futuro do homem: são diversas anotações de pesquisas feitas durante a guerra; todo esforço que tinha sido feito para derrotar os aliados, agora estava nas mãos dos mesmos. E entre essas anotações, se encontra a perquisa sobre uma nova forma de energia, imprementada pelo Dr. Hans Duterich, desaparecido antes do fim da guerra. USA 1975: Num laboratório, da universidade de Stanford, na California; um grupo de cientistas se vê diante de um terrível impasse. Após duas décadas de pesquisa, baseada nas anotações do cientista alemão, Hans Duterich; desenvolveu-se uma cabine, semelhante a das anotações, e dentro dela foi colocado um globo formado por diversos elementos que, ao fim, juntos, só provocavam uma luminosidade orgânica, inútil para geração de energia. Nas anotações do Doutor alemão havia referências a um último elemento, mas que não era revelado, pois o cientista desapareceu antes de concluir o experimento. Os cientistas americanos fazem diversas tentativas com muitos elementos, mas nunca tendo sucesso e agora não estava mais nada que eles pudessem usar para ativar a força da cabine. Então, devido aos fracasos e aos cortes na verba, eles tinham que decidir o que fazer; e a solução mais prática era fechar a cabine e guardar todo projeto, pois, já que não era prejudicial e como não se gasta nada em guardá-la, o melhor era esperar que o futuro trouxesse melhores possibilidades para tudo... Em algum lugar dos USA 1995: O mundo sofre uma histeria coletiva. Devastação ecológica. Inflação. Recessão. Fome. E a deflação de pessoas idênticas pelo mundo, provocando confusão, loucura e mais fome, pelo aumento de população. Numa base secreta americana, um grupo de cientistas analísa uma estranha cabine, supostamente, a causa do aparecimento das pessoas iguais; segundo testemunhas e “cópias”. Dentre os cientistas, dois são especialistas em energia, que também estavam presentes num experimento com uma cabine semelhante, há apenas vinte anos atrás. E pela semelhança, eles não podiam deixar de esperar que essa cabine explicasse o funcionamento da outra. São feitos diversos testes, mantida a devida segurança, que, ao final de um mês, revelam traços de diversos elementos na cabine, tanto fora quanto dentro dela, e dentre estes elementos, um se mostra muito importante: Verínio 38. Era algo que os cientistas, da outra cabine, nunca tinham pensado em usar. Para eles, isso era a revelação que eles precisavam para voltar a estudar o funcionamento da cabine Dutecich, assim batizada desde 1972. A cabine Duterich é trazida para as instalações secretas, onde se faziam os testes. Junto, é também recebida a amostra de Verínio 38, necessário para terminar a experiência. É hora. Os cientistas estão em volta da cabine e tudo esta pronto para se inserir a barra de Verínio 38 no globo; e então... Para surpresa geral, nada acontece. Todos ficam frustadosa. Agora, resta a eles, voltar a fazer testes. Duas semanas de testes se passam e nada é encontrado na outra cabine, que explique o que falta na Düterich. E é no momento em que todos já estão a ponto de desitir, que um jovem cientista, presente na equipe, propõe a idéia mais sem proósito já dada naquele grupo: colocar a cabine Düterich dentro da outra, para ver se o que está presente nesta ativa aquela. A idéia é criticada por todos, considerada absurda; mas mesmo assim, alguém diz: “O que temos a perder?” E esse é o estopim para uma coisa que eles nunca imaginariam. Os cientistas se dirigem para a sala de testes, onde estavam as duas cabines. Eles abrem a cortina de uma e colocam a outra de frente para entrada. Era a Düterich entrando na outra. Todos se afastam e o vidro de proteção é baixado entre eles e as cabines. O braço mecânico, então, começa a empurrar a cabine Düterich em direção da outra. Ela começa a entrar. Certa apreensão afeta a todos, apesar da falta de esperança ... Ela está quase toda dentro e então, a operação é completada. O braço se afasta e nenhuma reação é notada. Sem fé, os cientistas não sabiam que as particularidades de Verínio 38 MAGNETIZADO estavam se juntando à massa do globo e que a radiação cósmica presente na outra cabine estava provocando uma reação em ambas as cabines, que ao final de vinte minutos começaria a agir. Os cientistas se lamentam. Começam a sair da sala quando tudo começa. A linha do espaço / tempo tinha sido alterada. A combinação das cabines começa a atrazar o tempo continuamente,
procurando um começo, para formar o círculo. Os cientistas começam a sumir, pela ordem de suas idades, sempre do mais novo para o mais velho e assim acontece em todo planeta, e também com o planeta e depois com o sistema solar e com os outros sistemas, a galaxia, as galaxias, finalmente abrangendo todo universo, até que fez-se encontrar, no fim, o começo de tudo: o big-bang, e esse fica sendo repetido várias vezes, sem parar. O tempo estava repetindo continuamente o início do universo. E este não mais prosseguirá, pois ficará eternamente, repetindo o seu começo.
AS NOSSAS ÚLTIMAS IMAGENS (PILOTO) O vôo por sobre Athenas. A escuridão eterna manchada pelas luzes sobre as esculturas. A venenosa brisa do mar lança a poeira nos feixes dos holofotes. São o que ainda ilumina as cidades deste planeta ... As gigantescas esculturas demonstram o sinal do mórbido orgulho grego diante da escuridão quando ela ainda estava por vir. “Construir!” - Eles diziam. Alcançar o ponto final da luz ... “Ela nunca vai sumir!” Mas ela se foi há muito tempo. Poucos dos que estão vivos hoje são velhos o suficiente para lembrar como era um dia, a cor do céu, o brilho do sol; o suor dos escultores a mais de 600 metros de altura, finalizando o topo das esculturas. Tecnologia da época. Daqui de cima, nessa eterna escuridão, cair não parece mais nada; não se pode ver o fim; nem mesmo se a queda seguir do holofote. As poucas luzes de fogueiras na cidade não alcançam os olhos daqueles que sobrevoam Athenas. Daqui de cima só se vê o negro e só se ouve a brisa do mar fétido se chocar com o frio gélido da noite eterna, a triste lembrança de quem nunca viu o sol. E a única coisa que se sente além da total alienação que se faz para esquecer a tristeza, a escuridão e o frio, é a chuva que toca com ardor as duas únicas partes descobertas de qualquer habitante desse lugar: as mãos e o rosto ... O rosto mal importa num lugar onde não se pode enxergar a vida em sua frente. Mas para o homem que termina sua obra, a última de Athenas, a única dele; é terrível; é o último artista, o mais velho habitante de Athenas; aquele que vira as três últimas esculturas serem erguidas, naquele tempo: em quatro anos, cada uma com 600 metros de altura. Nessa época ele começara a dele. Mil metros, disse ele ... A maior. A melhor demonstração da arte grega; voltar ao passado: colosso e farois: uma nova era clássica ... Mas a escuridão veio e ele a viu chegar. O frio intenso se apoderou do mundo e ele o sentiu. Toda podridão possível surgira no mundo. A tecnologia sumira completamente. Mas a cada ano ele continuara. A cada metro construído. A cada assistente que o abandonara. A cada grau de temperatura que baixava. A cada índice de luminosidade querecuava ... Aqui no alto ele permanecia. As mãos cada vez mais cruas; o trabalho cada vez mais primitivo: “Se for preciso, até formão e martelo eu usarei!” - Ele dizia. E é o que faz hoje. Agora. Domos Athos está a 983 metros de altura. Tem 37 anos de idade e 26 anos sem pisar no chão. Sobrevoa Athenas com seus olhos. É uma lenda. Mal é lembrado. Ele e sua escultura. “Mil” metros dentro da escuridão. .-.-. Domos para as batidas. Qualquer minuto que ele para o trabalho e permite seu sangue diminuir a velocidade nas veias de suas mãos tão maculadas de calos e cicatrizes, é a oportunidade que o vento gelado e venenoso encontra para dolorir cada um daqueles poros. Ele coloca as ferramentas no cinto e estende as mãos a uma altura que a pequena luz do seu capacete consiga iluminar. Estão do mesmo jeito. Mal consegue esticar os dedos. As unhas completamente exauridas pelo trabalho manual; cada detalhe que foi, e a ser posto; uma mera fresta, que há doze anos seria facilmente esculpida por um computador e um laser, agora precisa ser feita com mãos; elas mesmas... domos desliga a luz do capacete. A bateria tem de ser recarregada por fricção: mais tarde... se vira para “ver”ao redor. Só há a escuridão. Os feixes de luz dos holofotes se movendo lentamente entre o topo de uma escultura e outra é o único sinal de que ainda há vida lá embaixo... Vida!? Domos aspira o ar gelado. Suas narinas doem com o mal cheiro vindo do mar e o frio que o rodeia... Olha novamente para baixo. Sua imaginação desenha o topo de sua escultura sobre a sólida escuridão. Tem essa figura na cabeça há 30 anos. Esta perto e por isso esta com mais medo do que nunca... Sua visão atravessa a escuridão e sua memória começa a lembrar (mais imaginar) como é a vida ;á embaixo: adolescentes e crianças em sua maioria. Esquálidos pela doença, mas fortes pela obstinação e pela falta de senso. Ruas escuras, permanentemente úmidas. O cheiro de putrefação penetrando em cada corpo cada vez mais acostumado àquela vida. Domos imagina como, provavelmente, não conseguia sobreviver lá embaixo. Mas lá embaixo não existe... Estando quase um quilômetro longe do solo... Demoraria quase dois minutos para chegar no chão se fosse pelo cainho mais rápido: caindo. E talvez o chão nem mais exista. Poucos vêm aqui em cima. Por dentro da escultura: o elevador não funciona há anos e somente o elevador manual é utilizado para trazer-lhe suprimentos: de três em três meses. Mas ele é só um. Só se preocupa com o seu trabalho. Se não houvesse o instinto de parar, até lhe passaria comer... Mas ele sempre volta... Na verdade... Domos te me o fim do seu trabalho... Não sabe qual seria sua existência sem o mesmo; talvez deixasse de existir... Ergue o rosto. Começa instintivamente a flexionar os dedos para eles não congelarem... Aí vem ela! - Ele vê... Seus olhos agora estão fixos no “horizonte”. Os holofotes começam a apagar. Vindo do que fora o mar Egéu; a semanal tempestade luminosa. Ela corta todo continente Euro-Asuático; permanente; regular; radioativa. Domos a conhece melhor que ninguém. Foi o primeiro grego imune, hoje é o único afetado por sua tenebrosa beleza. Não é um fenômeno natural, mas ganhou tal status pela falta de outros que consigam incitar tanto os olhos de homens famintos por beleza, num mundo onde mal se enxerga o próprio corpo. E mais que qualquer povo... o povo de Athenas é o que mais ama essa sucessão de explosões luminosos no céu, pois é a única oportunidade que tem de visualizar, em toda sua grandeza, aquelas peças que um dia deslumbraram o mundo: as grandes esculturas. Ninguém se lembra do número exato e nunca há luz por tempo suficiente
para se contar, mas elas são belíssimas. Estranhas, indefinidas, gigantescas... E ninguém as ama mais que Domos; por isso está aqui no alto, esculpido. E por isso está parado nesse momento, sentido as dores de um mundo quase morto, sem entrar para a modesta proteção dentro de sua obra... Só para vê-las novamente sob aquela luz fugaz e próxima. Sua visão é privilegiada. Vai poder sentir as explosões; ver o topo das esculturas; cada pedaço do que o inspirou a vida inteira. Há tempos não é mais a lembrança do dia expondo os colossos para o céu que o resigna... É a escuridão, o frio, aquela dor que o desafiou a desistir e não conseguiu. Será a obra do fim do que um dia foram athenas e o mundo. A transformação, a degradação, o enegrecimento e o medo... Ps “relâmpagos” já estão quase sobre Athemas. Domos já enxerga a silhueta das grandiosas esculturas. Começa a sentir a emoção que ainda persista em seu coração. Normalmente, suas mãos são seu coração. São elas que sentem cada rachadura. Cada dobra do cabo do formão e do martelo. Cada gota da chuva cauterizante. Cada segundo de sua criação. Mas cada relâmpago que acende aqueles gigantes ao seu redor, inclusive o dele, faz com que todo seu corpo sinta o momento... São lindas! Vagamente se vê o começo delas no chão; vagamente o chão é visto... Não é relevante... Mas os topos são vistos com tal clarividência... Domos está acima delas. mais de 300 metros acima e a lembrança do desenho que um dia deveriam ter formado volta a sua cabeça, mas é tão ou mais indefinido quanto cada própria escultura. Ele não lembra. E se Domos não lembra, muito menos os outros irão. São mais jovens. Cada vez mais duros, embrutecidos... Talvez nem sejam mais seres humanos... Mutantes talvez! - Pensa Domos. Mas ainda são humanos. Isso ele sabe, pois ainda lhe enviam suprimentos e provavelmente não resta mais ninguém que o conhecera... Mas a missão ainda provém. Enquanto a escultura estiver crescendo eles saberão que Domos está aqui e por isso sempre mandam mais suprimentos... Mil metros! Eles também querem ver, mesmo sem poder... Somente como agora... A tempestade já passa por toda Athenas. Uma lágrima quente marca a pele gelada de Domos: cada semana pode ser a última; dele, de Athenas, ou do mundo; e por isso ele chora. Mas o temor permanece; a dúvida... Ele olha para cima. Aproveita os últimos reflexos da tempestade para imaginar o resto de sua escultura: 17 metros. o fim. Cada dia mais resignado, eficiente, o anteposto da fadiga em seu corpo... E depois?... Os holofotes são reacendidos... O frio e a chuva são relembrados na pele... A escuridão retoma a vida. -x-x-x-x-x Domos toma seu caminho de volta para o abrigo. Está a três metros dele agora. A cada dez um novo é construído. É o seu local de pouco descanso. Não sente vontade de se afastar do trabalho. É a única coisa que o afasta das tristes reflexões que sempre lhe vêm... O caminho é um pouco árduo; com a tecnologia, bastava se usar o flutuador; mas nada disso mais existe, é agora uma semi-escalada, com o vento insistindo com força sobre seu corpo enfraquecido. Mas Domos conhece bem o caminho, mesmo mal enxergando as frestas por onde tem de andar. De costas para a escuridão da cidade, ele sente a chuva ardente queimar suas mãos descobertas; se preocupa; ainda são seu maior instrumento de trabalho. Relembra com pesar a origem de tudo e a situação presente... Nos seus vinte anos. A sua escultura estava em plena evolução; estava famoso, o apoio ia muito além de suprimentos vez por outra. A luz brilhava em seus olhos, como em tudo mais na Terra. Foi no meio de um verão. O vento que vinha do Egéu se tornou forte e carregado, cada vez mais. A maré e a corrente se tornaram adversas e turbulentas; como uma revolta. As pessoas começaram a ceder às doenças, às dificuldades respiratórias, à falta de soluções. Então, como numa maldição bíblica, a escuridão começou a tomar a Terra. A luz do sol e das estrelas começou a sumir por detrás das nuvens, cada dia mais grossas. O frio começava a aumentar. O calor do sol não conseguia mais se irradiar para o solo. As pessoas em todo planeta começaram a questionar porque, mas a resposta tinha sido deixada para trás; somente a opulência e o desperdício da vida que era vivida estavam contidos naquelas mentes, em todas as mentes. Domos construia sua obra cada dia com menos luz; também não sabia (nem sabe) a resposta; sua escultura era o que importava... E a escuridão foi tomando posse do mundo, até o momento agora, quando Domos só tem a fraca lâmpada de seu capacete para iluminar seu trabalho; pedaço por pedaço... Como antes; no entusiasmo da luz; não havia sentido, mas Domos quer ainda descobrir... Dentro da escuridão. Ele termina seu caminho. Há mais a ser percorrido para dentro de um desconhecido instigante: que outra vongança a Terra ainda pode prover... Terminar sua obra, parece ser sua última, talvez única arrogância; mas crescer sempre foi o intento de todo ser humano... Então como a pergunta ainda consegue persistir em sua cabeça: “E depois?... Como antes não há resposta, só o mencionar... Seu corpo quer descansar. A última imagem de sua obra está lá; no pensamento. O que lhe falta de contemplação na vida: aquela escultura. Sempre. Só. Os suprimentos estão no fim. Descer o elevador. -x-x-x-xEntremente Começo a me recordar de todo começo. Costumamos perguntas quais as origens de tal entorpecimento que conteve nossa total insanidade diante desse distante presente. Uma bastarda e física represnetação do enegrecimento e poluição de nossa alma, de nossa existência. Foi a ignorância, tenho
certeza. A arrogância em primeira instância; nunca realmente aprendemos a que devíamos ter dado razão e/ou importância. Agora, nada mais parece importar... Simplesmente esquecemos para que servia o esforço, somente continuamos; eu continuo... passo a passo, dia escuro a dia escuro, desolado, frio, como nós costumávamos ser com todos em volta e com o planeta que nos acolha. Fomos ingratos!... Ele agora, com todas as consciências maguadas do mundo o qual esmagamos com a mesma arrogância, nos assola na carne e na alma; vinga-se; redime-se do fato de nos ter dado tanto poder... Talvez o que tenha nos faltado fosse a mesma consciência que hoje nos atinge; previamente; premente a nossa desgraça. Não sabíamos, mas com todo poder, toda arte e toda predileção, nós concebemos o nosso próprio futuro; como sempre havia sido designado, só que no momento é real, como a dor que queima nossos coreções: a culpa, o arrependimento, o ressentimento... Só nos restou a arte. Imaginar, concluir, criar; mesmo sem saber o porquê... Talvez nunca haja uma resposta. Nunca! -x-x-x-xO frio dos novos 25 meses e a panor6ancia dessa tão antiga cidade grega se transpõem mais ainda dentro da escuridão. Daqui doa alto, mais próximo do céu que do solo, o observador prega a conclusão de seu trabalho. A figura disforme toma a forma de nossa mórbida e singular imaginação. A volta em seu diâmetro, atingir todo seu perímetro; demonstra o reflexo do que se vive: incerteza, revolta não massificada e sem direção por tudo que se fez e o que hoje é. Domos representa as qualificações; as indagações; quanto mais perto, mais diluído em senso e vontade... Revessa batidas e escalpos na madeira, aço e concreto, criaturas sintéticas de todos os nossos últimos resquícios e tentativas: a natureza nunca se permitiu ser copiada com perfeição; só ela era perfeita; e quando se foram os recursos, só restou a vontade, e essa ainda era perfeita... Mesmo que se tenha somente os ossos dos mortos para se usar... (Ainda não é esse ponto!) Criar é eterno... Cada pedaço do que Domos construiu, pedaços de sua pele que na escultura se solidificaram, parte dela: sua vida (carne e alma) na escultura e ela dentro dele, de onde foi originada, do “nada”, do corpo e do espírito, ambos abatidos pelo ambiente nesse histórico de dias escuros, frios, úmidos, sujos, tristes, vazios... Ela é uma volta pelos momentos da Terra, dos representativos momentos daquela cidade; Athenas; Domos crescera nela e a vira decrescer triste e escura... Todo planeta vira todo planeta... E ele vira tudo em volta, de cima, de longe, mas sentindo mais que todos e transportando tudo para suas mãos... Sua escultura: a obra vida. Perto; muito perto. A escuridão refrata em luminosa cognição a mente de Domos. As voltas em torno de seu trabalho; ratificando cada detalhe na rocha que se cruza com o metal talhado e forma a figura daquele metro quadrado... Só uma consciência sabe o que está fazendo. Não pertence a nenhum sentido. Provavelmente, se a luz de seu capacete apagasse por completo, não haveria mudança em sua atitude de escalada; evoluiria para uma fase mais primitiva ainda, mas com certeza com o empenho triplicado... Mas tal incidente ainda não o atingiu. Manter a criação. Sua prole inanimada que permanecerá em seus mil metros de magnitude, mesmo depois dos fins; nenhum fim alcançara a obra... Será sempre a primeira e a última imagem... “Quem sabe um dia, sob uma nova luz de um futuro desconhecido, sua plenitude seja vista de um céu... (a cor?) e todos se lembrem: que mesmo no fim, nós nos importávamos com o que queríamos dizer!” - “Arte!” - “Devotados”... O seu rosto nas frestas. Uma parada de dúvida; hirto. Olha para cima... Pela primeira vez sente a visão ficar turva. Pareciam os relâmpagos chegando. Os olhos reclamam, as mãos formigam. “Minha obra...” - Domos sente o gosto do fim. A explosão luminosa rebate seus olhos iluminando o topo da escultura. “Meu Deus. está terminada!” Não sentira a tempestade chegar. (Perplexo) Outra vez a explosão sobre o topo: é exatamente o que havia imaginado; mais perfeito que em sua mente. “Mas como pode ser? Eu não me lembro!” Só restavam cinco ou seis metros: era o final monumental... Mas já está pronto! Domos sobrevoa os olhos novamente sobre Athenas; está tudo lá; a tempestade ilumina as outras esculturas. Ele as admira, mas se questiona como não notara a aproximação das luzes; é como um ritual. Sua visão turva novamente. As gotas venenosas da chuva ardem em seus olhos; leva as mãos a eles, e nota: estão em carne viva. A dor queima forte... Nunca como antes. Tenta sentir as pontas dos dedos: elas parecem não mais existir. Um novo e profundo desespero o agarra para a escuridão. Sua mente não parece mais iluminada. A chuva parece aumentar de intensidade, o que faz aumentar também a dolorosa irritação nos olhos. Os relâmpagos estão praticamente sobre ele; maculando sua vista acostumada com a escuridão... Domos volta a olhar para o topo de sua escultura... Está lá; olhando para ele: a figura disforme que ele encarava, e com que por tanto tempo imaginou, estava com os indescritíveis olhos anti-humanos direcionados para si: o vigia. “Nossa consciência!” A culpa. Tudo que ele ainda preterdia criar estava naquele olhar. Era o que tinha imaginado; a vida inteira: “Quem olhar por nossas cabeças.” - Domos exprime sua loucura com um grito apavorado... Seu último resquício de consciência lhe informa diligente: “Está terminado!” - E agoira ele sabe para que... A cabeça de Domos pende para trás. Seu corpo não tem mais sensibilidade. O olhar do “seu” vigia o quer jogar para baixo e seu íntimo quer ver a magnitude de sua escultura... Em último ato sua mão direita desata o cinto de segurança; seu corpo pendia para trás. A queda é lenta. O próprio vento o alivia e a luz da tempestade o vai agraciando
com as imagens fase de sua obra. “É maravilhosa!” - Cada vez maior; cada lembrança; cada mensagem das transposições e transformações daqueles vinte e tantos anos: as lembranças de Athenas. O topo ficando longe. O sorriso final de quem parece ter dispensado as dúvidas: o vigia do mundo; um símbolo para o futuro, quando a luz voltar... 995 metros.
AS NOSSAS ÚLTIMAS IMAGENS (A garrafa de leite) Não há resposta vinculada nesse estranho amanhecer. Criaturas continuamente convertidas pelas circunstâncias da insanidade que é viver: a escuridão também domina essas ruas do subúrbio desconhecido e esquecido da vida na sociedade do passado mordaz do progresso. .. Mais do que sempre: nesse país, a constante e regular definição do que é esse falso modo de vida... Falso antes na manutenção de sua tão sem sentido existência; dia após dia assistindo a vil negritude diante de seus olhos enquanto de muito longe líderes diziam para se acalmar... Mas agora as outras criaturas são que se deleitam com a fragilidade dessa última imagem de ironia, pacífica e patética: uma família, os poucos rostos que se mostram na escuridão artificial, debilmente iluminada pelo último fio de esperança desse passado que ninguém mais se recorda, posteriormente, completamente engolido pela dura escuridão do fim. No chamado prédio do quase tão esquecido consumo assolante do presente-passado desse país ativavam-se as fontes alternativas para ainda persistente busca do preenchimento das lacunas vorazes das vidas desses seres: não construíam, não criavam, não viam, cruzavam a visão do tempo ainda na presença da luz, que já começa a enfraquecer de intensidade; responsabilidade desses também, intermediários ignorantes e ignorados na sociedade do consumo... Layna cruzava sua própria escuridão desde esse tempo, nunca vira a luz ou qualquer imagem: olhos vazios que nunca tiveram de confrontar o desaparecimento das cores ao seu redor, sem real ou qualquer noção das mesmas: somente uma alma visitante em um mundo que há muito esquecera o que é uma imagem bonita; mas ela própria o era, sempre foi e aprimorou isso com o tempo, um paradoxo ao mundo, sem a vaidade de sua própria visão e com o prazer dos pequenos atos... Essa é a seção das frutas. Mãos pequeninas dirigem os seus dedos híper sensíveis na direção correta das disformes formas engendradas para oferecer os sabores e a nutrição artificial do que fora há algum ou muito tempo...uma maçã: todas possuem a mesma forma, o padrão bem conhecido pelos dedos de Layne, mas por mais que insistam os “alquimistas” do futuro esquecido, tudo degenera, e quando mais rápida a geração... Confronta-se ela com a textura da casca e com a resistência da polpa, e mesmo somente com uma leve aproximação pode garantir o aroma, fator decisivo para o julgamento: essa, essa, essa não... e se somam doze no recipiente que a criança carrega: é o limite; tudo no limite, racionado, no limite da razão... Não é Layne que pode enxergar um garoto maltrapilho sendo carregado para a distância cega do beco imundo, onde será...(?) por dois ícones da ordem naquela ordem, naquele tempo: a pequena mão do garoto se ajusta forte à da mãe: a tão poderosa sensibilidade que pode ler medo e apreensão em cada poro percorrido daquela pobre criatura desse tão comum mundo dos seus pais e onde seus olhos começam a também não querer enxergar ... como a mãe: ver o medo ... E o grito estridente contabiliza mais um final, até um extermínio do problema; no que mais aquilo era e no prosseguimento de seus determinados desejos de consumo: todos os presentes, ausentes de expressão: todos, e que seguem para a próxima seção. Um dos seguranças retorna enquanto o outro segue para a coluna, semi-iluminada pelo eterno entardecer, para o registro do (1000...) incidente desde a instalação daquela unidade: liberdade talvez? ele possa pensar em sua inocente ausência de culpa; mas são os tempos: e a coluna computadoriza simplesmente mais um número: centenas de colunas na cidade ... milhares no país: liberdade talvez. A aproximação lenta de um olhar vivo força a pequena mão a apertar com mais intensidade ainda o poderoso tato de Layne: a razão vinha pelos olhos da criança à escuridão da mãe ... O segurança desfilava livre em sua direção com o olhar atento sobre os dois: era a mente inexperiente capaz de enxergar que transpira as derrotas de todas as outras visões do terror para admitir o inadmissível e tremer de dor ao imaginar fazer parte daquele bloco, daquela coluna (claro que não ele!) o “imenso” homem parou diante de seus olhos, agora as duas mãos agarravam a da mãe: imponente, tenebroso à sua idade, gigantesco e monstruoso como as esculturas gregas da TV; a maior provavelmente à sua pequena visão: a imagem da ordem; seu pequeno caos... - É um belo garotinho esse. E bem comportado eu espero ... - E o sorriso simpático da inocente na escuridão: a razão da atração: os medos da criança ... A beleza persistente dessa normalidade ... O prosseguimento da história. “Eu juro!...” A oposição fora sempre um fardo caro a ser sustentado pelo casal que se consolidava a cada dia em uma insólita união. A imagem visível era sempre a da aceitação duvidosa que vinha fortemente transmitida por aquele tão grandioso elemento que a qualquer um representava o medo (ou ordem, nas instituições vagas); para todos, inclusive para o “afilhado”...Mas na companhia de Layne não existia tal instância de eterna violência latente nos atos, atitudes e sustento, daquele homem: ela não podia ver sua figura massificadora do poder naqueles tempos, só podia sentir, feliz, a atenção e carinho que ele lhe prestava com tanto ardor desde o primeiro momento, diante dos olhos apavorados daquela criança, seu futuro, novo e único filho ... Afastados pai e mãe, vistos seus medos do passado; a verdadeira tragédia que
se apresentava em seu primeiro ato ... O nobre e galante segurança da ordem via sua própria fonte de luz diante da escuridão, que se aproximava dia após dia, naquela mulher; ultrapassar os obstáculos; ter a vaga memória de ter uma família; se permitir sentimentos: um filho ... O garoto o temeu como todos o temem, como têm de temer para que a ordem desse país tão poderoso, que se esmurecia pelo vazio vindouro, permanecesse, mesmo após o inevitável. Reservas de x força, em homens e máquinas, aquela agora única fonte de negro fóssil que lhes elevava a esperança vã do rápido retorno da luz, continuar alimentando; mas ainda assim é o único capaz de manter tal contentação; sendo um dos muitos responsáveis nos braços do homem... por enquanto. Foi mesmo antes desse tempo que se fez a lei do controle natal: não vinha mais natural, como nada mais o era e o que restava era contado e recontado desesperadamente: os jogos de contingente populacional... e na verdade o ainda atual escape das colunas de contagem... porém... eles falhavam: falharam: nesse ponto a natureza sempre insiste em prevalecer a curto prazo; como foi sempre de ser...: a natureza humana é sempre a mais difícil de conter ... Fora uma fome de vinte anos que guiou a visão sob o mal iluminado amanhecer do que costumava ser um respeitável bairro de família. Layne saia para caminhar em sua escuridão pessoal para tornar cada vez mais familiar as nuanças de seu bairro: as curvas e desvios; as baixadas e as cercas; os números e detalhes das casas; informações que até mesmo surgindo de uma cega poderiam auxiliar um viajante perdido... ao menos por ali. Seu costume tornava custoso a contenção das vontades desse jovem que guia seus olhos vorazes para ela nesse cenário do passado; não por ser só mais um produto de um mundo sem fronteiras de sentido; era também um fruto de intolerância, violência, mentira, uma “inexistência” que reagia a algo que se tornara incontrolável naqueles últimos tempos de garotos criados fora dos controles genéticos para impulsos sexuais: o que nunca de fato fez o efeito de querer funcionar... Citado de uma frase de um grandioso líder fictício dessa geração que teimava em querer se erguer nos corações das boas comunidades desse país: o Dr. Hanibal Lecter dizia numa das muitas reverberações de falsa justificativa: “Aquilo que mais desejamos é aquilo que vemos todos os dias!” O garoto se sentia compelido pela plena certeza de que via Layne todos os dias; linda; sozinha... e cega... Seu desejo não mias nada além do que uma verdade irrevogável; e todos os dias ele vinha e via e sentia, morbidamente incentivado por aquelas anti-leis, e aos poucos se tornava visível sua ação final... A alma humana se tornara totalmente escura muito antes que a luz desaparecesse dos céus... Quem é esse “homem” agora? Nunca sabia ele que Layne gerou um filho de sua torpe atuação em seu corpo naquela manhã; trazendo pela primeira o horror do mundo para a paz de sua escuridão, revelando medos à imaginação, só quase fazendo restar monstro... E o garoto terminou por se acostumar ao “pai”; à falta dos avós; ao estranho amor “cego” da mãe; ao mundo que o rodeia. A escuridão visceral veio como o arrastar de uma longa noite que começa e nunca chega ao fim. É mais um cúmulo dos paradoxos que a única nação do mundo que ainda perdura com os poucos fios de luz artificial para aqueles que podem pagar o alto preço do racionamento e da energia química, agora tão pendente, seja a mesma nação que contribuiu tanto para a vinda desse vingativa parábola da natureza sobre seus olhos; o negro liquido a química: sempre negados os verdadeiros sinais do quanto aquilo perduraria, o quanto essa escuridão representa o fim da paciência e da arrogância dessas pobres/nobres criaturas que resistem às próprias insanidades, logo do lado de fora de suas poucas casas ainda “bem” habitadas, sempre à beira de serem absorvidas pelo breu desconhecido daquelas outras criaturas, também seres humanos talvez, que não tiveram esse anestésico de luz por tanto tempo... Uma mudança transformação; seres que não podem ver e não podem ser vistos, que na mistura dos valores se tornam atraentes, livres, despidos da pressão que ““essa” luz representa... A família se une sob a luz da lâmpada a querosene: o fornecedor do precioso líquido aparece de trinta em trinta dias... até o dia em que o trigésimo primeiro dia chegar e não houver mais o breu cozido para alimentar-lhes as visões do passado: suas feições, as cores, as formas. “A esquecida cor da grama verde. “É acesa três vezes ao dia, durante às refeições, momentos para as rápidas contemplações do que um dia foram os simples prazeres das famílias desse país: com os rostos mudados a cada dia, o amadurecimento da criança e o declinar dos adultos. As funções diárias foram sempre habilmente cumpridas por Layne, e natural como todo aprendizado do homem: marido e criança foram “confortavelmente” cercados pela escuridão e evoluíram recriados a outras imagens e semelhanças, conjuntos formadores de uma unidade que ainda podia se dizer... feliz; exoneradas as terríveis tragédias e abraçado o calor do mundo interior. E o preço vinha sempre de ser pago...: regenerados atitudes e talentos, o homem ainda sentia o orgulho por trazer ao lar o prazer único de poder apreciar sua esposa; talvez não alternasse se algo mudasse; parecia ser sua truculenta falta de visão que lutava contra a “luz” cega da esposa, mas ele ainda gostava de vê-la, todos os dias... Seu trabalho era caçar os predadores da escuridão; nem os via, somente lutava para moldar aquela figura dentro de sua casa e nunca se fixara na carnificina que podia representar para cada uma daquelas incógnitas criaturas: a cresciam ou não, se pensavam ou não, se viviam ou... não. Simplesmente singrava a noite eterna com outros poucos destruindo aquelas que já ameaçavam a “luz” com algo que o mal humano parecia ser o começo do pior: canibais, fotófobos, de duvidosa racionalidade e que tinham como
ícone de suas lembranças um ser fictício, que há muito já havia assombrado os seres, inclusive Layne, indiretamente, sua família... e seu filho, por que não?... Dr. Hanibal Lecter. Mas subtraiam-se os horrores dos dias de noite eterna para os momentos da família: palavras na escuridão, fugazes visões, um momento após o outro, o crescimento da criança: ser do futuro que “via” dois mundos: aprendia... A quase satisfação contemplativa de estarem todos no mesmo mundo de Layne: vivos e nobres desse mundo, presos a ele. A iluminação das ruas “boas” vem resumida ao limiar das criaturas fotofóbicas são as necessidades de segurança para os resquícios de sociedade e comércio poderem prosseguir em seus tão inseguros intentos: cada canto, cada história, cada cidade, diminuídos às suas insignificantes lembranças de suas grandezas sintéticas. Os entregadores surgem com a regularidade de suas forças: são curtas as distâncias, mas os ânimos se consomem tão rápido quanto as reservas do óleo negro... Vidas em conflito com o encontro de suas obscuridades internas; a visão das lembranças de seus medos revelados no momento em que a escuridão lhes veio e penetrou tão fundo seus olhos, corpos e almas, que não sentem como tendo mais nada; somente a idéia de contínuo e fim. Eles vêm, chegam, deixam lá e se vão; mas a escuridão que perdura tão solene sobre as vidas de todos encontra também os seus aliados de aversão: é a verdade das facilidades que o ambiente impõe àqueles que se submetem ... A sobrevida das criaturas filhas do breu traz uma nova e mórbida concepção de sobrevivência e superação: as quantidades de suas existências fluem pelo coração do mundo, e nesse país a revolta do desconforto, daqueles que se extinguem ainda com luz, e também daqueles que os perseguem na escuridão ... Atravessam um lado da “invisível” metrópole do passado para alcançar a perfeita cronologia dos atos de um dos seus mais fervorosos perseguidores: tão metódico quanto implacável ao viver e trabalhar, exibe sua família na luz daquelas três vezes; irrita os Hanibalanes, acende o intento e condena o seu maior paradoxo de feição escura ... Inimaginável, violento, vingativo, vil ao máximo “visto” alcançado por essas novas mentes humanas: totalmente alheio ao real esforço que foi e tem sido essa vida, nova vida, condenada, pior a cada dia, mas que tinha como único sabor ... o amor. O dia da entrega. Vagos momentos. A oposição do obstáculo à frente do óbvio e frágil passo cego que logo virá... Os pensamentos de quem nunca sentiu o ardor das imagens do mundo na retina. Presa na própria rotina esquecida de escuridão, fazendo Layne quase um “bem” necessário nesses dias, além do tudo que já representa para o filho e para o homem que confrontava com ela cada segundo do endurecimento desse mundo; cada vez mais ao seu redor e ao redor de todos que persistiam na “sanidade” humana, mas no ponto frágil mais culminante de sua alma: somente a vitória do companheirismo, a obstinação por sobre um mundo que devora carnes e alma, o prazer do toque, nos sorrisos dos dois que dependiam dela, atravessando dia-a-dia com um agradecimento no peito por ter tanto, por não ver nada e por sentir tudo ... E de “manhã” levantar com o marido e filho ainda dormindo, para criar o primeiro ambiente, para o primeiro momento de luz, mostrando sua tão simples felicidade por ter homem e jovem olhando para ela, sorrindo, vendo o seu sorriso ... Layne abre a porta dos fundos. Seus passos são seguros, mas algo mais estava por terminar com tudo aquilo; olhos estavam ali para presenciar: o que mais vinha na falta de sentido dessa obra de arte de final de tempos ... na escuridão. Ela tropeça no obstáculo bem posicionado, seu grito agudo não dura, penetra nos sonhos finais de seus dois sonhos ... Sua trajetória é acompanhada, foi calculada, dia após dia ... Seu olho direito encontra a garrafa de leite recém deixada, sua base calçada, sua ponta afiada, o corte perfeito, o brusco silêncio, a travessia do crânio, o desmoronar dos corações despertos: as risadas na escuridão.