Tortura a b i

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TORTURA A . B. I. E AS VÍSCERAS DA SAMAMBAIA

FABIANO VIANA OLIVEIRA


TORTURA A . B. I. E AS VÍSCERAS DA SAMAMBAIA (livro registrado na Biblioteca Nacional)

FABIANO VIANA OLIVEIRA


Dedico esta obra à minha infinita confusão e contradição: sempre entre o amor e a loucura, buscando a paz dentro das minhas próprias vontades. E também à pessoa que mais bem me faz com sua companhia; parte presente nesta história, como uma eterna presença de amor e mistério... No escuro de nossas palavras verdadeiras. O AUTOR


TORTURA A . B. I.

1 O limo verde e escorregadio faz a pele escorregar na parede. O corpo nu não consegue se afirmar de pé por razão da fétida umidade. Mas ele não cai... Franz não deleita a inconsciência como gostaria: mil vezes a escuridão desconhecida a o que está por atravessar seus medos e seus órgãos. É semelhante aos mais bizarros pesadelos de todos os homens, somente diferente, que o grito abafado pela mordaça de couro indo até o céu da boca não será a fonte do seu despertar aliviado... Nu e indefeso, sendo a nudez uma própria fonte de fraqueza nos seus 57 anos de flacidez e desleixo pelo próprio corpo; mas esse não é o seu prioritário pensamento nesse exato instante: as agulhas sim o são. O limo acumulado na parede desliza sua pele e o cansaço nas pernas o faz ceder; as correntes nos pulsos, já judiados por três dias de pé, pendurado, com os braços abertos e convivendo com a própria excreta... Imagina que miserável indolência foi essa em sua vida para estar nesse lugar, machucado, amargurado, com medo, sujo: o mal cheiro exalado por ele próprio deixa uma constante náusea em suas entranhas e faz seu corpo pedir extinção: não mais seria uma auto perda da vontade de viver, mas a proteção de toda espécie humana (racional) para que sua existência seja movida pelo respeito; mas não mais o há: talvez nunca o houve em sua vida: pálido , sujo, esguio e escorregadio: o limo o enoja, penetra-o no seu íntimo, denigre o seu corpo do mesmo modo que toda a monstruoso situação destrói todo seu orgulho de ser vivo: se imagina da maneira que está...: “Eu quero morrer!” As cinco agulhas se aproximam guiadas pelas mãos dos cinco anfitriões desse país de mistérios. Não usam nada além de diversos colares no pescoço. Tatuagens em suas orelhas formam o enigma da procura pela resposta que não existe: eles seguem a auto fidelidade. Os três homens salientam suas excitações como o bônus das atitudes que vêm provendo no homem próximo: a última no se grito de desespero tornara viável as suas bizarras intenções no grupo todo: são as duas mulheres que também aguardam o subjugar da vida e do respeito daquele pobre e quase hirto visitante para enfim cederem seus desejos e dos companheiros: ali mesmo, no limo, no lixo, no verde e negro da tortura... A primeira agulha é penetrada longitudinalmente no pênis de Franz, logo acima dos testículos. O grito e o movimento desesperado dele na sua procura por respostas àquilo reflete nos primeiros movimentos sinuosos dos cinco corpos sedentos pelo veneno mórbido da dor e do sexo: a abominação visível em vida da bestialidade humana sobre sua própria carne: mordidas, socos, espetadas uns nos outros: são as demonstrações do que eles reconhecem como prazer... Por motivo da primeira agulha, penetrada no nervo base de comando da ereção do homem, o pênis de Franz se torna ereto involuntariamente. É a vez da primeira “dama” levar a loucura espasmódica ao corpo da vítima... Com a mão esquerda no próprio sexo ela começa o seu próprio desbravamento já conhecendo que tipo de reação vai causar naquele corpo: a agulha possui 21cm de comprimento! Ela penetra a agulha no canal uretral do obliterado homem; deixando a mesma lá completamente inserida, causando a primeira grande hemorragia quando do cruzamento das duas agulhas na parte interna da base do pênis... Um grito arfante e pausado surge de Franz, mas o adiante já estava sob o choque: com um lúdrico e bizarro relinchar Franz perde o fôlego e entra em choque, finalmente alcançando a inconsciência:


-Voir candë! Ele desmaiou...- Os dois que já haviam completado as penetrações já começam sua bestialidade-filiaca misturados ao limo e à podridão daquele chão de calabouço. Mas os outros três se dividem em excitação e frustração: observam os outros dois em seus bizarros prazeres, tocam-se com desejo, mas se vêem sem ação diante do antecipado desfalecimento da vítima: sua fonte... Os três começam a esmurrar a esmurrar o corpo frio de Franz, gritando seus ódios e insatisfações, exigindo que ele acorde. A mulher que restava tenta uma técnica diferente e começa a praticar sexo oral no homem, mas estava sendo inútil; nem socos, nem pontapés, estava incapacitado de dar-lhes a luxúria mórbida da dor, como tanto queriam... A mulher morde o conteúdo de sua boca em seu acesso de raiva e frustração... -Ete väis!- Seus dentes encontram a rigidez metálica da segunda agulha: “Seria uma dor inigualável...” Mas não havia mais paciência: ela arranca fora o pedaço e o cospe com desprezo pela sua inutilidade, levanta-se e com sua agulha penetra o olho direito de Franz: o ranger de seus dentes ensangüentados demonstra sua cólera... -VAÄZHII!!!- Ela se retira do aposento com os compassos do ódio no seu corpo insatisfeito. Os dois homens esvaem suas raivas no corpo já completamente sem vida de Franz. Batem, chutam, esmurram, até os ligamentos de seus pulsos não suportarem mais e suas mãos se rasgarem do antebraço, fazendo o corpo dele tombar no limo junto ao casal próximo com suas agonizantes e bestiais carícias genitais... Os dois olham com frustração o prazer do casal: estava acabado, sem mais oportunidades até outros virem... -...vaäzhii...- Eles saem sob os sons ininteligíveis daqueles dois, cujos “As” estavam contidos por essa noite: os Absurdos de seus anseios por dor e prazer: as mordidas e danações na demonstração de seus desejos e na complexidade de suas mórbidas realizações: a tortura.

***

Quando se perfura um olho humano com uma agulha de 21cm de comprimento por 1mm de diâmetro, após atravessar o globo ocular causando uma breve, mas forte hemorragia chamada lágrima de sangue; atinge-se a base do nervo ótico causando dano permanente à visão em primeira instância... Com a continuidade da perfuração a agulha encontra o lóbulo superior do cérebro, alcançando-o de baixo para cima e penetrando finalmente na região cortexial, e danificando permanentemente todas as funções somáticas do corpo... Com o não estancamento da hemorragia interna logo se forma um derrame no cérebro e no cerebelo, formando-se em pouco tempo um coagulo, que sem a urgente atuação de uma endoscopia que aliviaria a pressão do sangue acumulado, causa a morte cerebral, comprometendo todas as funções do corpo... E assim se morre.

***

O amarrotado do lençol se move e se refaz em vários desenhos diferentes. Mais rápido, lentamente e se desprendendo da cama sob os movimentos do enfeitiçado casal que devaneia os prazeres de uma ausência oportuna: aproveitam o tempo para mais se


explorarem além das rápidas, frenéticas e deliciosas oportunidades que regularmente têm de treparem fora da inocente consciência de um marido distante, incapaz e corno. Os gritos , gemidos e outras sonoridades emanam do quarto do casal Alexander; mas só a sra. Alexander está presente do referido casal: Giorgiana sente os poderes da juventude penetrando-a sem o prematuro cansaço a que está acostumada. Na pele, sentindo a suavidade de alguém que está mais ali do que num estúdio mal iluminado com preocupações que não a preocupam: no vazio de 35 anos de vida ociosa, e mais de 13 anos de vida conjugal “insatisfatória”. Ela se sente bem com o jovem e forte comprimento de Cesar dentro dela; mordendo-se ao conseguir fazer seu corpo se sentir realizado novamente naquela cama, como talvez nunca tenha estado... No intervalo... - Não é esse o horário que ele liga?- Giorgia olha o relógio do videocassete sobre a TV em frente à cama. Seu rosto ainda está meio entorpecido pelo frenesi recém consumado; e a carne que ela contém na mão direita não a faz pensar muito no marido, agora longe até de seus piores pesadelos de frustrações carnais e emocionais... E eles são (ou eram) muitos... - Verdade... É tão palerma que nem sabe a diferença de horário entre aqui e a Áustria... Só liga de madrugada...- O rapaz dá um sorriso satisfeito pelo efeito que consegue causar naquela mulher, fazendo-a desdenhar o próprio marido. - Talvez ele ligue a essa hora de propósito... Pra ver se não tem nenhum cacetudo aqui enrabando a mulher dele...- Giorgiana sorri do palavreado do rapaz; mas se sente triste: de um modo grosseiro o que ele disse era a mais pura verdade; mas ela se sentia também meio emputecida por estar desse jeito, com outro homem, em sua própria casa e tendo de ouvir tais palavras indecentes: “O que você fez comigo, Franz, seu...” Ela se repreende pelo que iria pensar: onde estava seu polido vocabulário de mulher bem educada?... Mas era verdade: “Meu Deus!” Ela volta a acariciar o conteúdo de sua mão direita: É o melhor (e maior) esquecimento que ela podia ter; teria o máximo, sempre... enquanto pudesse... enquanto vivesse.

***

Durante o frágil café da manhã de uma mulher que há muito tempo esquecera o que é um apetite saudável, o copo com uma leve vitamina natural está suspenso no ar tocado pelas mãos muito bem tratadas pelo tempo vazio e exposto: se Giorgia nunca fez nada na vida... se cuidar ela fez: 35 anos e a transparência do robe matinal mostra uma silhueta de 20; mas um rosto temeroso da própria incerteza demonstra que muito mais tempo de vida infeliz vem perseguindo aquele corpo escultural. - Por que não come comida de verdade, coisa gostosa?- Seus pensamentos são despertados pela faminta volúpia do vocabulário de seu companheiro da noite passada... Ele tem prazer de mostrar o próprio corpo, jovem e viril; de bermuda apertada passeia na frente de Giorgia ao mesmo tempo que degusta de todas as capacidades alimentares oferecidas pelo ignorado marido: Franz... Giorgiana pensa na estranha ausência que sente do marido. Normalmente nem sabe que ele está em casa, mas alguns fatores


físicos denunciam sua “incômoda” presença; agora com ele tão distante, a esposa não pode deixar de estranhar a falta do telefonema da Áustria na noite anterior. Franz viajara há uma semana e meia e nunca deixou de ligar uma noite sequer até há 3 noites... Não houve um desses dias sequer, também, que Giorgia não levasse o amante para a sua cama: de certo modo até a virilidade oca do rapaz começava a aborrecê-la: não é culpa, pelo contrário, cada orgasmo veio com prazer duplo por ter sido na cama de Franz, sem ele saber e até sujando os mesmo lençois que posteriormente o próprio voltaria a dormir... depois de lavados, mas ainda assim... A presença daquele “cavalo” em sua casa naqueles dias de excursão estava se tornando um estorvo de tanta rudeza sexual... Nos últimos 3 dias ela apressara todas as trepadas antes das 2 da manhã, na certeza da ligação de Franz; o que não ocorreu... E nessa mistura de insatisfação e frustração acumuladas por não poder contemplar sua vontade de torturar a ignorância do marido, a constância desse homem que se apateta tentando comer caviar no café da manhã logo a sua frente se tornara bem supérflua; como quase tudo na vida: a procura por pequenos e miseráveis prazeres, no caso: cornear o marido... O vento que vem leve do quintal atravessando a esquadria de vidro e alumínio levemente aberta, levantando sedutoramente o robe e revelando mais ainda todas as tonalidades do sexo feminino e movendo angelicalmente os cabelos castanhos claros de Giorgia, traz junto com o frescor da manhã um pensamento profundamente irritante à mente da séria mulher: “Será que o puto arranjou uma amante?!...” Já se sente lesada o suficiente por toda uma vida de descaso... não consegue admitir ser, também, corneada. Sem mencionar o quão humilhante lhe parece ter uma mulher no mundo que consiga chamar a atenção do marido, quando ela, sendo como é, não o consegue... Ela olha para o amante que estava com uma imensa torrada semi-enterrada na boca e com o nariz sujo de geleia e caviar misturados: “Porco!” - Eu quero que você vá embora. Eu vou viajar!- Se limpando sem muita educação o rapaz se adianta: - Pra onde?- Ele já se levanta e tenta se fazer de sedutor mais uma vez. Um sorriso idiota, um andar de ator pornô de terceira e salientando a coisa que ele mais adora na vida para frente, indo na direção de Giorgia. - Não á de sua conta... Se arrume e pegue seu caminho.- Já junto dela, depois de ter rodeado o balcão, ele começa a se roçar nela; inocente ou muito burro em não notar o quão sério ela estava falando. - Eu disse...- Olhando para ele, totalmente rude, Giorgiana agarra o orgão-mor do rapaz apertando-o com a concentração de força que aprendera na yoga (outra ocupação), fazendo o rosto dele enrubescer e enrugar de dor, e seu corpo curvar-se em defesa: estava claro: -...Vá embora!... Entendeu!? - Uhu!- O doloroso contorcer do rosto dele demonstrava seu entendimento. Giorgia tirava um novo e estranho prazer ao provocar tal dor na genitália daquele homem: todo seu motivo de orgulho em estar vivo estava em sua mãos, livre para fazer tudo que quisesse... Mas no momento ela só queria se ver livre daquele entulho em sua casa: 80 quilos de massa muscular, sexo e beleza que não mais a interessavam por mórbidas razões da sua alma apreendida pelo vazio... Ela o libera e cambaleante ele se dirige ao quarto; com minutos sem fôlego, se vestindo e finalmente partindo: Giorgiana sentia como que um entregador de jornal estivesse saindo de sua casa; com desprezo e desinteresse... Sua mente estava preenchida pelo pensamento que lhe atormentava: Franz?... Termina de beber o seu desjejum com o olhar fixo nas próprias divagações: ciúmes, raiva, dúvida: monstruosa tal imaginação que a faz querer procurar o homem que tanto lhe ignora: amor? Giorgia se irrita mais ainda...


- AH!- Ela atira o copo contra a geladeira, fazendo-o quebrar com um estridente barulho: do asco pela inutilidade da vida e pela força do que a faz mover. - Droga!- Os cacos do copo no chão a lembram do que já está pesado no teor de sua cabeça: “Áustria...seu...” A expressão revela a vontade: ela pode quase se sentir satisfeita por estar tão preenchida por esse sentimento: ódio... Alcançar a resposta do vazio: - Desgraçado.

***

“Sei que não devia fazer isso. A visão dela cativa minha retina de uma maneira absurdamente atraente. Ela parece ter escolhido aquele acento do ônibus de propósito: bem de frente para mim. Vinte e seis turistas pelas ruínas históricas da Grécia e uma mulher incrivelmente linda exibindo sua intimidade somente para meus olhos, a cada vez que cruza e descruza as pernas: um torneada perfeito, com músculos desenvolvidos na medida certa e o sexo exposto por uma estranha armadilha ou coincidência que faz avolumar-me em meu corpo e aspirar com desejo o olhar, claro, de quem sabe que está sendo observada, desejada, profundamente; provocando com um sorriso e um desviar de visão que me arrebata por completo... e nesse ponto não há escolha...: sou casado, mas sou um homem e quero foder essa mulher!” As ladeiras e curvas fazem trepidar a viagem pelo cenário do absurdo esquecimento de uma glória perdida de uma civilização exacerbada de cultura, poder e arrogância: a Grécia não possuí realmente paisagens; ela é uma paisagem em si; na sua própria existência como cultura sobre a Terra: no passado, no presente e no futuro... Mas a visão das alturas, do límpido e azul mar Egeu, aberto ao Mediterrâneo, despontando na linha tênue do horizonte, misturando céu e mar... não é o que chama a maior atenção dentro do ônibus de turismo; ao menos para um seleto grupo desses executivos que nele viaja... E esse privilegiado senhor das operações financeiras se vê abalado como nunca ficou na paranóia rotineira de sua vida bem sucedida: Louis Karr quase pode sentir o cheiro daquele sexo: mais que a masculinidade era atingida por aquele símbolo de feminilidade: sem jeito, sem tipos, sem jogos; perdendo anos sem fontes... só com o dinheiro: daria tudo que possui para por a língua naquele lugar quente e macio; suar sobre aquele corpo, estar entre aquelas pernas e fitar aqueles olhos dizendo másculos palavrões que a levariam ao devaneio que agora ele tem: sua fantasia de anos recusada por uma esposa “normal”: “No cu!”- Ela diria. Do jeito que gostaria de ouvir: sujo, seco, sem medir as dolorosas e morais conseqüências do que é pedir para ser penetrada no ânus. Karr continua a sonhar... O ônibus freia bruscamente. A reação de um bom motorista a um animal que corta a estrada. O Sr. Karr tem o seu bestial pensamento interrompido pelo surpreendente peso que o atinge bem sobre a dolorosa ereção que vinha, com dificuldade, tentando ocultar... A magnifica carne macia daquela mulher cai no seu colo: ela havia se levantado para abrir mais a janela quando o motorista deu a forte freada... Não sabia como reagir: podia abraçá-la por três segundos e com certeza esporraria no fino tecido de sua elegante calça esporte... Mas ainda é um homem racional: mesmo com mil desculpas sem sentido, teria de fingir que ela não havia sentido nada duro pressionado contra sua bunda: o que seria impossível; a não ser que ela tivesse


hanseníase nas nádegas... e bem avançada: que sorte! Que azar! O Sr. Karr não sabe onde enfiar... suas duas cabeças. - Me desculpe! Eu... eu... - Ora... Eu é que me desculpo. Afinal, eu cai em cima de você. - É mas,...- Descontrolado e impreciso: Louis quase deseja que ela fosse uma conta bancária de um dos seus clientes da financeira: saberia o que fazer... - Não se preocupe. (Ela volta a sentar.) Espero que não tenha se machucado.- Ela falava como uma vendedora: praticando uma suave sedução, enquanto ainda deixava aparecer seu paraíso entre as pernas. - Ah, não... Eu... - Eu soube que rigidez muscular bruscamente atingida pode causar rompimento de ligamentos. Seria uma pena tal coisa acontecer. - Uh...- Os lábios de Karr não conseguem emitir outro som . Já vira quase tudo na vida, mas nada o preparara para tal afirmação: não tinha dúvidas, somente um olhar fixo no absurdo daquela situação tão única, tão excitante, tão surreal... e que ele não podia deixar passar sem tirar o melhor prazer possível: no título do capital... e o sexo.

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- Eu espero que você nunca morra, querido!- A frase de difícil entendimento desperta superficialmente o Sr. Karr de suas profusões dentro do corpo de Debra... A deliciosa textura da carne interior de sua vagina deleita a mente de Karr para um mundo totalmente fora da realidade: o rústico ambiente do hotel no interior empoeirado e desértico da Grécia Meridional termina por compor o cenário daquelas depravações carnais que passam pela mente “inocente” de Karr. A inocência está na sua certeza de que o comando daquele corpo embaixo dele é totalmente seu: o dominador... Mal percebe que seu pênis está se tornando um tipo mutável de “cordão umbilical” : estará para sempre dependente daquele calor vivo que envolve o mesmo nesse exato instante; nas suas doces lembranças dos simples sexos que não conseguem achar significado na frase que a mulher acabara de propelir em meio a mais um dos orgasmos de Karr: nem ele mesmo consegue acreditar na vitalidade que está conseguindo manter com essa jovem tão gulosa por MAIS (....). Cada vez mais sua mente traz à tona seu desejo secreto, mas teme pedir: ainda encara como uma situação normal, por mais absurda que já seja. Debra suga; força; cede, fazendo dele o que mais os outros quatro esperam: ela sempre se considerou a melhor prospectora de homens do grupo: o melhor julgamento, os de mais recursos, mais insatisfeitos e os mais resistentes: aqueles que podem ser o suficiente para todos eles... O fracasso do último ainda a está atravessando da garganta à boceta; como uma coceira impossível de ser coçada de fora para dentro; incomodando e levando ao desespero... Mas não ainda dessa vez: só mais duas palavras e o Sr. Karr estará no ponto; pronto para o fim, e Debra estará livre dessa “tortura”... - Ai, ai... É agora...- Finalmente!


- Espere, querido...- Louis pára o movimento para reter o orgasmo; quase já deformado de tanta vontade, mantendo o cacete em leve roçassam e enrugando bizarramente o rosto entre sons ofegantes e arfantes; olhando o rosto suado e brilhante de Debra, aguardando suas palavras... - No cu!- Todos os poros do corpo de Karr começam a se movimentar de uma maneira diferente, como que querendo sugar o suor de Debra: a textura da pele e dos pêlos, os mamilos dos seios pareciam roçar-lhe diferente, os olhos dela não desviavam diante de incerteza ou medo... Karr sentia como se tivesse finalmente atingido um novo plano de vida carnal: só em começar a imaginar aquilo que ela acabara de propor, uma monstruosa sensação de prazer e dominação o percorria das pontas dos fios de cabelo até a cabeça do pau: estaria preparado para tal realização?... Sentia-se o dono da situação, vivo, forte, imortal, o senhor do mundo que pode alcançar tudo que deseja... O foda. - Devagar, querido...- O sorriso no rosto de Debra mostra o verdadeiro vencedor; na verdade cinco... os cinco vencedores. - AH...- Falso. Inerte ao que realmente representa: ela só se satisfaz com o prelúdio que isso representa: “Sssss! A Grécia é bem melhor que a Áustria!”

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A penetração anal é chamada de sexo bestial porque segundo uma bizarra lenda qualquer a besta do apocalipse foi ou será gerada através da “fecundação” anal de uma mulher prostituida, mas virgem de rabo, por um chacal disfarçado de homem enviado pelo demônio. Seria leviano afirmar sobre o lado da mulher, mas para o homem é um prazer extremo, pois além do fator físico que multiplica suas sensações (é apertado); é também um símbolo de dominação sobre a mulher: tanto por causa da posição que ela tem de ficar, quanto pela dor da dilatação que é provocada... Afinal... foi feito para sair... e não para entrar.

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A subconsciência é uma doce lembrança de uma comum porém muito saudosa realidade que há bem pouco era considerada por este: enfadonha: tudo por causa de uma louca fantasia... Não se pode imaginar que fora um total desperdício somente por esta breve razão. O escuro e insalubre cárcere do sr. Karr o faz sonhar enquanto dorme preso a uma parede, de ponta-cabeça; na mais fria das paredes úmidas dos pesadelos de Sir


Poe até o momento que encontrara aquela mulher no ônibus... O pior dos lamentos de Sir Willian ao destronar seus reis numa breve mas poderosa tormenta de desamor e traição... Louis sonha com o seu cachorro marrom correndo pelo quintal verde de sua casa rica de subúrbio nobre; a esposa de avental... e o eterno peso sobre a cabeça e sobre os olhos: todo o sangue banhando sua mente com o peso do corpo no mundo exterior eleva sua inconsciência, fazendo-a iniciar a instintiva viagem de volta da pior maneira possível: talvez agora; atado a um mundo suposto inexistente; mesmo as profundezas do seu cérebro possam dirigir a mesma culpa que o acompanhou cada segundo desde aquele orgasmo: estranhamente a sua última imagem de liberdade, e também a maior sensação de seu corpo, é o que realmente povoa sua fuga interior no pouco sono... Nunca conseguiu saber quanto tempo havia passado, ou se ainda estava na Grécia, ou mesmo na Terra: a um olho cético podia ser considerado a porta do inferno e não um quarto de hotel rude; e isso pode ser considerado o inferno em si... Karr começa a alcançar a saída de sempre de todos os sonhos terminados em pesadelos... Como pôde trocar o que tinha na vida por um cu?... Seu corpo consegue responder ao início da consciência; mas ainda sim não faz sentido: a ereção começa na mistura da lembrança com o sonho, se tornando um terrível pesadelo. A cada sensação antes do orgasmo ele se contorce na parede: prazer, dor e culpa se juntam para juntar o final trágico da sua presença nesse cenário bizarro: Karr acorda gozando no sonho, urinando no próprio rosto mediante a posição e clamando com “gritos” sem fôlego diante das lágrimas que escorrem sobrancelhas e testa acima; sendo da reviravolta que a vida teve por razão de uma simples penetração anal. - Por favor... Eu sinto muito... Me desculpem por tudo... Eu quero vi...- Suas arranhadas palavras são engolidas por mais um espasmo no seu estômago: a náusea é a constante física de si próprio: parte do cenário... - ...Haurr...- Mais uma vez bílis e sangue jorram de sua garganta, com dor, muita dor... mas muito além das lágrimas doloridas está o pensamento no rosto mortalmente triste: “Por favor... Eu quero morrer!” O paradoxo da resistência desse homem... Agora ele pode ouvir claramente o horror da frase daquela sua mortal parceira: “Espero que você nunca morra!” A contração dolorida no esôfago se acalma por um instante: “Mas por que? Como pode? Por que?” A límpida lágrima escorre para a mórbida sujeira, como no desvirtuamento da alma humana por conta das dúvidas das possibilidades: Louis se arrepende... por tudo.

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Quando se está de cabeça para baixo a circulação de sangue no cérebro é 24% mais densa: o que causa um forte descontrole de certas capacidades mentais conscientes; porém a atividade para-consciente aumenta de maneira imprevisível... De uma maneira óbvia pode-se admitir que tal posição afeta os sonhos, mas o modo que isso acontece e com que intensidade é ainda um mistério e talvez sempre o seja.


Vomitar normalmente causa trauma(dor) no aparelho digestivo. Vomitar continuamente e de estômago vazio causa traumas em todo corpo, podendo causar danos permanentes aos sistemas vitais do ser humano... e com o tempo a morte.

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- Eu acho que Deby gostou de ser currada por ele...- Quatro olhares sarcásticos e inquisidores aguardam Debra refratar-se por sua hesitação: não sabe o que fazer... - Ele... - Será que é melhor que nós três?!- Artur é quem melhor sabe usar a tortura verbal: dependendo da resposta Debra podia ofender os três homens presentes, ou pior, se mostrar fraca, piedosa... Mesmo assim ela consegue sorrir antes de se pronunciar... - Pra primeira vez, até que ele não foi mal... teria futuro...- Era a garantia de ainda ser quem ela é: já esquecera quantas vezes já deu o cu: sente saudades da dor das primeiras vezes; nem se lembra com quem foi, mas a origem do instinto já estava lá: no prazer gerado pela dor... Hoje: - Eu só acho que fatiá-lo é comum demais; vai chegar ao fim muito rápido... Sem graça. E eu já estou ficando sem graça também pra sempre o mesmo...: agulhas, grampos, presilhas, anzóis... Cacete... deve haver mais no mundo!- Eles se entreolham sérios antes que Artur novamente se pronuncie: - Esse cara deve ter te enrabado legal mesmo!- Os quatro riem bizarra e maudosamente... Mas Debra referia-se seriamente ao modo como as coisas vinham caminhando: desde a chagada deles na Europa, há cinco anos, nada de novo tem realmente acontecido: sem desafios... Ela recorda com satisfação de seus tempos no Egito: a descoberta:

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“A noite mal iluminada do porto do Cairo e o forte cheiro de peixe do depósito dos pescadores compunham o cenário da degradante iniciação de Debra no mundo A.B.I. Os oito corpos sem rosto circulavam continuamente ao redor de sua azulada nudez que brilhava no suor e frio da dolorosa corrente que a estendia com os braços para cima, pendurada às vigas do alto teto do depósito. Inidentificáveis, utilizavam seus conhecimentos de carne, nervos e falismo no formação de um crivo sobre a bela mulher que reagia calada a cortes, perfurações e escárnios, na tentativa de se preencher daquela mesma dor: ouvia o silêncio dos seus próprios gritos quando criança e retia os gritos que surgiam naquele momento: a base sempre foi superar a dor em nome de um prazer maior que supera o mistério carnal e absorve as necessidades do corpo por satisfação; como uma extremamente dolorosa metamorfose que transforma o receio da dor em pura vivência do mesmo e daí a transformação do choque nervoso, o trauma, em um tipo de mensagem diferente para a mente: prazer... Protege, mas consome o corpo e faz


necessitar de um estranho alimento: mais e mais: desafio da tortura sempre superada: procurar fazer sentir mais dor do que já sentira antes, todas as vezes... O corpo de Debra é decido; está exausto, mas era o fim somente da primeira fase: tinha-se de atingir as superfícies do corpo e da alma antes que a bizarra montanharussa de bestialidade se contemplasse no corpo de quem se propunha; achava-se necessitado de mais além das sensações da carne: Debra buscou mais em toda sua vida de auto-sobrevivência na África do Norte, até achar este grupo... Os primeiros a experimentarem na pele alva e macia dela o sub-prazer das agulhas durante as duplas e triplas violações voluntárias de áreas em seu corpo onde a memória somente remetia ao medo da infância na rua, e a sobrevivência na mesma: a primeira fonte da dolorida penetração que começava a sentir. Ela se fez forte; suportável, e “sã” ao seu próprio modo de viver a vida... até encontrar esse grupo... Esse grupo cujos nomes só sabe um; até hoje ao seu lado... noutra lembrança das consequências da sua tão “doce” iniciação A.B.I. Nove horas... O fedor do depósito se confunde com os seus próprios fluídos violados com tanto empenho e com seu sangue exaurido não sabe de onde, mas muito da dormência que sente entre as pernas e o latejar do seu rosto, seios e crânio... o sorriso doentio do seu encontro consigo mesma surgia no simples fato de estar viva após tudo, e mais: o que realmente aprova: ela deseja por mais: assim começa a fome, a necessidade vem logo...: sete nomes e uma imaginação muito fértil será a ocupação: agora pode mais que muitos e as restrições parecem simplesmente ter fluído pelas feridas de suas unhas arrancadas: no ápice do começo de sua “vida”...”

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A fonte de toda aquela imaginação parece lhe escapar agora. Os risos relaxados de quem só consegue ir até onde o corpo alcança: já houve épocas gloriosas com este mesmo time, mas parece uma desesperadora falta de novas fontes: coisas novas a que desafiar, atravessar os campos dos túmulos sem vida que andam pelas ruas e encontrar tudo que um corpo pode oferecer... Deby se frustra ao não ver uma saída para isso: com raiva por não ser, na verdade, eles, é ela: os olhos de Roger notam um espantoso “medo” nela que o amedronta também: como há muito tempo não parecia surgir nas garras aptas à tortura de Debra: Como podia ainda se delinear uma fertilidade tão original num momento tão inerte, quase triste? Todos ficam sérios... - Precisamos pensar!- Artur finalmente se pronuncia ao verdadeiro problema: “A.B.I. e com problemas existênciais”: “Roger trouxe Debra do Egito como a melhor promessa para o grupo: sob uma imaginação sem fim os frutos vieram com satisfação para todos como uma muito esperada renovação da mesmice do absurdo das noites de Amsterdã: o que surge hoje não mais impressiona a idade do líder Artur: pouco recorda do seu começo; na verdade o problema é a insatisfação de Debra, e nisso há o mistério de sua própria alienação e excesso de violência algumas vezes diante da frustração... Artur teme por isso, e por Roger... e até pelo pobre sr. Karr pendurado na parede da outra sala (nesse caso com uma leve ironia): até onde eles podem realmente ir?” - Talvez Debra tenha razão...- Um pesado senso do incerto desaba na reunião: o apoio inesperado e o ardor de uma possível nova arte do que eles tanto procuram numa vida formada e dedicada a dor (ter e provocar)... Roger olha novamente para Debra... - Eu tive uma idéia!


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A visão do seu novo mundo de cabeça para baixo faz a metódica aproximação dos cinco uma primordial forma de tortura psicológica que se forma no interior humano ao confrontar qualquer expectativa. O asco do período preso à parede o faz imaginar do mais terrível ao esperançoso e impossível doce sonho de libertar-se; mas nem da culpa consegue estar mais livre... Debra vem a frente: sua avessa nudez não mais o cativa como a lembrança vinda durante o sonho; é o que assusta mais, diante da total ignorância do que está vindo em sua direção: ódio, dor, amor, morte?... Provavelmente a fonte de tudo isso na estranha ligação agressiva que faz tais cinco pessoas virem em sua direção com propósitos desconhecidos, mas com certeza adversos a ele... Sem nem ao menos saberem quem realmente é Louis Karr: provavelmente não importa o conteúdo de quem eles estão obliterando; simplesmente a vasta criatividade do que eles fazem de melhor e que precisam fazer: Karr sente... Seja a razão qual for, ou mesmo nenhuma, não mais embora dali ele irá; e nem mesmo inteiro ele vai existir ainda... Não mais nada. Abominações travestidas de seres humanos que rondam as vidas daqueles que não vêem a verdade do que está nas cidades: colhedores de uma mórbida e insistente tristeza que tira o sono das crianças e dilacera o coração de seus pais nos seus leitos frios e sem luxúria; na raiva escondida do que eles não conseguem mais sentir, pois o mundo do lado de fora considera ou desconsidera: ignoráveis todos os instintos mais básicos do animal homem que sente como todos os outros animais, mas como nenhum outro é contido por si mesmo, seu ego, sua vida, o vizinho que pode ouvir os estranhos gritos emanados do seu quarto, com sua esposa: é sua vida... ou deles. Eles se aproximam de mais um ícone humano do vazio sem sentido de dia após o outro que sofre de úlcera e hipertensão simplesmente porque não consegue dizer o que realmente pensa, somente o que é mais conveniente no momento... Artur lidera de uma maneira psicológica: sabe dizer a coisa certa que amarra as vontades não reveladas de cada um em idéias cada vez mais absurdas: é Artur quem vê que a fraqueza da idade está começando a surgir nos corpos de todos; Debra, a mais jovem, é a conexão com um presente mais criativo: por isso ele deu razão a ela: sabe que há necessidade em todos, mas Debra é sempre quem melhor expressa essa dor por novas e originais fontes de dor e prazer... Experiência é quem comanda; é quem corrobora a força, a juventude, imaginação, o talento e o vazio numa só sede por dor. Artur é o padrasto, o patriarca da honestidade de se expor num mundo onde todos simplesmente se escondem. Passos nobres de criaturas que não condizem suas aparências com suas intenções. Olhos assustados vendo o fim se aproximar da pior maneira que pode imaginar que ainda não é a pior maneira que se pode alcançar... Prestes a se encontrarem os dois extremos das condições humanas ajustadas e completamente


marginais e ignoradas: o executivo e os executores do adverso modo de viver... As lâminas em suas mãos, a nudez dos seus corpos e a inexpressividade de seus rostos atraem para o homem o ardor do pavor vindo da dor... Quem anda por esse chão descalços a absorver a sujeira do mundo...: Roger e Tomaz erguem seus punhos até os calcanhares de Karr e desatam suas dolorosas amarras de sustentação. A instantânea queda o deixa na posição de quatro ainda com os pulsos amarrados na parede. A visão agora se limita às pernas dos cinco; mas a apreensão se redobra na medida do que ele não consegue enxergar como suas ações. Debra se agacha e se aproxima do rosto sofrido de Karr: - Bom, Loui... Imagino que você gostou de ter me currado, não foi?- O tom da “doce” e selvagem mulher assustava mais ainda pela incerteza do que aquilo transmitiria: talvez a resposta salvasse a sua vida, mas já havia a resposta: ele realmente adorou; o arrependimento só veio depois... - Eu quero lhe mostrar como eu também gostei... e a melhor maneira é fazendo você sentir o mesmo.- Ela se levanta com um característico sorriso. A mente cansada de Louis demorara um pouco, mas logo lhe veio o significado daquilo... De repente morrer não parecia ser uma idéia tão ruim: Recorda-se das três imagens que vieram em sua direção: estava muito além do suportável; pelo seu calculo de cabeça para baixo: uns vinte centímetros além... Sua expressão se altera; um pavor além do além já imaginado: os olhos se abrem perante o cansaço desaparecido: o desespero chega a sua boca: - NÃO! Por favor, não! Isso não!- Uma nova fonte atingia o corpo de Artur: o medo do homem diante de uma coisa tão simples e corriqueira se tornava numa fonte de tortura totalmente nova: o líder sorri com sua ereção, diante da criatividade, exposta por Roger, mas forçada por Debra: orgulha-se... - Andrea... Traga a câmera.- A ordem confunde Karr mais ainda, mas o toque que ele começa a sentir o destoa de tudo mais: um desespero em cada nervo do seu corpo o fazia contrair partes do corpo que ele nem lembrava existir: queria poder se tapar, fugir, mas era tarde: a morte lhe parece, mais do que antes, uma escolha mil vezes melhor... Roger e Tomaz agarram um cada perna do homem; mesmo fraco, o instinto podia lhe causar qualquer tipo de reação. Debra fica ao lado, observando as atitudes de sua presa; experimentando o novo: preparando-se para o mais... Andrea volta com a câmera e começa a filmar: o começo do bizarro na vida de Louis Karr estava por começar: - Todos prontos?- Pergunta Artur atrás de Karr... - Agora...- A família de Karr volta a sua mente. Seus olhos se fecham: queria a inconsciência agora... Ana... - AAHHH!- O som da bizarra fonte das novas bestialidades: as abominações deleitam sua arte; um no outro e em todos.


2

Fotografias são mórbidas representações de que já não mais existe; como um não natural congelamento do tempo que singra a imaginação com a dúvida do que poderia estar acontecendo por detrás ou em volta daquela imagem fixa no nada de quem teve a idéia de guardar para sempre uma emoção que na verdade nunca mais existirá... Giorgiana desliza os dedos na foto do Danúbio, que recebera como cartão-postal do marido e compara com a viva imagem do rio que corre a sua frente sob o amarelado do anoitecer de Viena: quase irrita sua fonte ver que apesar de tudo, Franz sabia apreciar aquele espetáculo e que ele o quis guardar para ela, na distância física do que já era a distância do seu fracassado casamento. É uma expressão morta, como a própria representação fotográfica daquela mágica da natureza... Séria, Giorgia revê as imagens de Franz no necrotério: como fora encontrado: sujo, mutilado, inqualificável na agenda dos ricos; como algo nunca a ser visto ou imaginado... Morto pelo desconhecido; humilhado pelo óbvio e totalmente desprezado pela mulher: - “Sim... É ele...”- Sem dor, sem pena, até com satisfação. A caminhada a margem do rio sob o crepúsculo desenvolve a procura pelas respostas jamais perguntadas na existência vazia daquela comum, mas separada convivência. Com Franz morto ela está livre... e herdeira de muito... Mas questões ressoam na mente curiosa: como um lugar de tal paisagem que ela humanamente admira como há muito não conseguia admirar nada na vida, pode promover tal carnificina no corpo “indefeso”de seu marido? Giorgia recorda do estado de sua genitália: era como a atitude de uma vampira vingadora, da sua inutilidade quanto homem; pelo menos para com ela. Quase sorri ao ver que essa outra mulher teve a coragem para punir a flacidez inútil do marido... Mas é um tanto mais sério que isso: a suposta traição pouco a incomodava agora.... ou mesmo o assassinato em si; mas sim a descoberta daquilo como uma bizarra variante na linha normal dos passos que a vida toma num mundo tão novo e estranho. Como o efeito que a iminente escuridão causa na sua caminhada de volta para o hotel: o amarelado do reflexo no rio e no chão se torna rubro e vagarosamente se torna num negro azulado que instiga medo e adrenalina... Giorgiana se sente como se estivesse abrindo portas para mundos jamais visitados pela sua tão valorosa estirpe. - Quarto 901.- O atendente entrega-lhe a chave sob o olhar faminto e indagador de Giorgia. Todos no hotel sabem do desaparecimento do marido dela e do consequente assassinato violento. A presença daquela mulher tanto assustava quanto atraia as atenções: quarto de cortesia (o mesmo de Franz), principalmente porque ele não havia terminado a estadia e a imagem do hotel não podia ser arriscada sob tal desastroso evento... Além da singular situação, a beleza iluminada de Giorgia atrai atenções em qualquer ocasião: O senhor Voghiter, gerente do hotel vinha fazendo uma irritante política com Giorgiana desde que ela chagara há três dias...: após a experiência no necrotério a imaginação de Giorgia mostrou caminhos infinitos para usar a antipática


simpatia daquele gerente em prol de sua procura por respostas: nesse caso, o mais imediato: quem era a mulher com Franz e que lhe arrancou o pau, obviamente... - Espero que o quarto esteja de seu agrado... Se a senhora precisar de algo é só me pedir pessoalmente.- Aquele discurso entrou pelos ouvidos de Giorgiana oito vezes nesses três dias. Ela quase sentia a vontade de esmurrar o sujeito na pele das costas das mãos; mas há muito ela aprendera a conseguir muito mais das adversidades que apenas vingança. Volta o olhar para o homem dois passos atrás. Era o olhar de cale-se; de fazer o homem simplesmente olhar para os seus olhos e deixar-se insultar se fosse necessário. - Na verdade, senhor Voghter... - É Voghiter.- Ele sorri nojentamente educado. - Voghiter (cara de cu, era mais o seu pensamento), eu tenho me sentido um pouco solitária naquele quarto sem o meu Franz. E depois da horrorosidade que fizeram com ele, eu estou até com medo de ficar lá sozinha... Pode acontecer o mesmo comigo... É... quase.- O gerente faz uma rápida e bem treinada expressão de solidariedade diante do teatro de Giorgia: mal conseguia separar o que seu pênis sentia do que a necessidade da profissão exigia: um hóspede não pode ter medo de ficar no quarto do hotel: é péssimo para a imagem, mesmo sendo uma situação tão isolada... E uma mulher dessas dizer que está solitária e de uma maneira tão sedutora só pode significar atração (coceira na racha foi o pensamento exato do polido gerente). - A senhora não deve se sentir assim. Se quiser, mandarei uma haia dormir na sala do apartamento, para lhe fazer companhia...- Estudiosos em neurolinguística diriam que uma mulher que toca na gravata de um homem e começa a alisá-la para cima e para baixo significa assédio... - Eu preferia que fosse o senhor...- O gerente, provavelmente conhecedor de todas as dinâmicas do comportamento humano, devia achar saber muito bem disso: (ela tá a fim de dar, no seu íntimo). Ele olha discretamente para os lados e se aproxima dela. - À que horas? - Vá às onze...- Devidamente cumprimentada, Giorgia se volta para os elevadores sob os olhares do saguão, principalmente o gerente que desde já começa a delirar sua imaginação sobre aquele corpo. Ele suspira satisfeito diante de sua infalível audácia... - Bicha européia lambedor de saco... Humpf...- A verdade da situação não trazia satisfação a Giorgiana; há muito ela conhece o poder que tem sobre os homens; sente-se tão prostituída pela riqueza e pela beleza quanto sempre, mas querendo ou não a morte de Franz lhe afetava os sentimentos. Muito do que esquecido entre os dois na estiagem das lágrimas de sua vida endurecida pelo vazio: são todos os tipos de perguntas que povoam sua cabeça: estava ela alienada do mundo? Esquecida numa cama com outro homem, mas sem ter absolutamente nenhuma atenção do marido... No fim de tudo o que Giorgia mais teme é de que ainda sinta algo pelo falecido marido, algo inócuo e impronunciável que só parece lembrar o dia do seu casamento: na pureza e na simplicidade da ostentação familiar...: Talvez o amor! Mas ainda assim se pergunta: -”Como alguém conseguiu morder o pau dele até arrancar?”

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“Gostaria de poder chorar lágrimas reais de minha culpa sobre este que tenho sido; dos meus desejos adormecidos que se ergueram e me puxaram até o fundo deste poço: como uma nobre e verdadeiramente cega justiça que me fará enxergar através do embaçado destas lágrimas de dor meus filhos e a minha esposa... Por que eu?” Mais um doloroso espasmo sobe à garganta de Louis. Faz o seu cansado tronco contorcesse no total vazio de seu estômago; a lembrança de tudo jorra-lhe a mente como as lágrimas involuntárias que provém a cada espasmo; e novamente só expõe o fluído que o estômago não consegue parar de produzir mais e mais a cada instante que se aproxima o momento de rever Rena e os meninos... A sensação em seu corpo o lembra a todo momento que não há mais uma resposta na vida, como os números no final dos cheques que costumava emitir e que agora não sabe se conseguirá continuar a fazer: um simples ato que parece Inalcançável pela sua simplicidade, pois, simplesmente sentar causa a maior dor... do arrependimento e da vergonha: penetrar e ser penetrado...: na mórbida analogia do que se tornou o vazio de sua vida; não sabe se foi pior ou melhor ter sido deixado vivo: sente medo, sente dor, vergonha e mal sabe o que sentir da lembrança daqueles cinco. Não consegue nem pensar; não quer pensar... Mas não pode esquecer, nunca; o espasmo branco seguinte garante isso: - Uaarc...!- E as lágrimas voltam a escorrer. - Mamãe, cadê o papai. Todos os passageiros já saíram do avião. - Não sei. Talvez seja algum problema com a bagagem. - Oba! Quer dizer mais presentes.- A mãe de 43 anos sorri do modo único do filho pensar diante do atrazo do pai. Desde o telefonema dele antes de deixar Athenas sentira que algo não estava certo com o comportamento dele. Naturalmente entusiasmado, principalmente por voltar às suas amadas cifras com que tem de lidar diariamente... Parecia mais como se estivesse falando com uma secretária eletrônica: as respostas óbivias para as perguntas de sempre: Louis não era mais o mesmo: talvez fosse o excesso de paz da viagem... Acostumado à adRenélina diária de milhões e milhões de outras pessoas e das comissões também milionárias, René podia até querer supor que o ativo marido estava entorpecido pela mágica báltica que o havia rodiado por duas semanas... Mas a voz no telefone parecia... morta... - Olha... lá vem ele!- O garoto mais novo aponta alegre para o pai. Um sorriso quase que forceosamente pintado em seu rosto os recebe no corredor de desembarque... Os olhos infantis só conseguem visualizar os pacotes que tomam os braços do pai de família bem afortunado pelo próprio esforço e pela vontade de fazer a família feliz... Mas a mulher de 12 anos de casamento pode notar que o homem que vinha fraco sob aqueles pacotes; pálido, mesmo vindo de um local de sol forte e mais magro como nunca realmente se lembra tê-lo visto, a não ser em fotos da adolescência: René pode notar que Louis não era mais o mesmo; pôde no telefone e agora pode confirmar na sua visão sem vida; como olhos que encaram as dores do mundo e só retornaram simplesmente para recordar: já vira esse olhar antes; mais tênue na verdade: o pai fora veterano na guerra e por muitas vezes antes de sua morte, passava horas a apreciar um estranho vazio sem expressão; algo que não lembrava nada, a menos que o tenha visto: Louis parecia ter vindo de uma guerra; longe, distante de um par de semanas de férias; numa irreconhecível fonte de mudança... Ela simplesmente “sorri séria”, sem perguntas, mas com dúvidas... Foi o que a mãe lhe ensinara quando do retorno de seu pai da guerra: nunca mencione... até ele mencionar. -Papai!- Karr se agaixa largando os pacotes e sentindo com um empenho sobrehumano a sensação da afeição de seus filhos; na doçura das suas inocências, quase esquecendo a dor em suas entranhas e a vergonha em sua consciência... Abraça forte os


filhos. Pré-sente. Esteve perto do fim, no cúmulo da dor e agora até pede por isso... mas nesse instante simplesmente agradece por poder apertá-los em seu braços novamente... São as últimas coisas seguras de sua vida. Ele sobe o olhar vagarosamente e encontra os olhos da esposa... Os filhos ainda são as últimas coisas seguras da vida: crianças. Sem dúvida, sem máguas, simples... Baixa o olhar novamente: René sabe: Ele sabe... Só as crianças: novamente lágrimas... agora reais.

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O multifacetário verão europeu e a economia que é viajar todo velho mundo em transportes de terra atrai os assíduos e bem sucedidos “yuppies” do mundo para estas portas sempre abertas à riqueza de todo planeta: é só nessa época... Aqui não o Mediterrâneo ou a America do sul para atrair turistas o ano todo. É o ser seleto que agrada mais estes senhores agentes receptivos ao mundo: todas as línguas; vivos em todos os sorrisos que são capazes de emitir decolando o ego de nobres da nova era que desejam encontrar respostas às suas perguntas de frustração, divertimento, infelicidade e luxuria nesse mundo que todos eles acham que podem comprar ou seduzir... - Ei, Tomaz... Olha só... É seu tipo de cliente!- Sentado à sua mesa, o jovem gira a poltrona sob a interlocução do colega de trabalho. A ironia não era destoante às suas práticas comuns... Pela porta de vidro entrava uma das visitantes mais provocantes a pisar em solo vienense e a certamente procurar uma das melhores agências de turismo da Europa: “Da Noruega à Istambul em tempo para o mundo.” Os olhos de Tomaz percorrem todo o corpo da mulher que caminha até o balcão: todos já sabem: há sete anos todas as mulheres daquele porte sempre deixam bons pedaços das suas (ou dos maridos) fortunas na empresa graças ao jovem de expressão humilde que consegue tirar de todas elas a vontade de voltar para casa, simplesmente viajando pela Europa e sempre voltando para ouvir dos lábios do ábil vendedor que elas têm de aproveitar mais a vida e traduzindo-se sempre em mais dinheiro: esse é o seu talento, de seu proveito... muito mais além que o da agência. A recepcionista o indica. Seu olhar ainda fixo vê a aproximação; duplicados os talentos e desejos, Tomaz já percorre com outros olhos o mesmo corpo: sempre existe uma possibilidade: são duas a cada cem: estatistica facilmente ignorada perante a solidão e o pagamento à vista: há muito ele aprendeu que ser um vendedor não só lhe dava dinheiro, trazia um novo e estranho poder sobre as pessoas: sem saber porque ele sempre parece ter a razão... - Olá, meu nome é Giorgiana... A moça disse que você podia me ajudar a escolher um bom roteiro para as minhas férias...- Estava sentada a sua frente e aberta às suas sugestões; só bastavam as informações: é realmente linda: é só começar a vender.

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“A lembrança sempre chega na cor da decoração do bar naquele “happy hour” de segunda-feira. Mais um dia realizado numa vida confusa da qual não se parecia estar tirando nada além de dinheiro, um sucesso vago; reincidente somente na conquista diária que no final da noite não passava do desejo que “ela” fosse somente uma almofada a mais na cama: sempre existindo a procura por mais... Mais o quê? Nesse dia havia o desestímulo total no ar da vida desses corretores: era Outubro de 1987. Horas de telefonemas tentando convencer seus poderosos e temerosos acionistas de que a queda da bolsa é apenas temporária... Mas só restavam poucos com ainda tal poder para manter o dinheiro dos clientes em contas que poderiam desaparecer em segundos; e foi o que aconteceu posteriormente... Porém o que trazia a falta de estímulo ao corpo de jovem Tomaz (corretor) era algo mais profundo e mais pessoal que o seu sucesso nessas tentativas e o fracasso dos outros... Nem na queda total ele caiu... Sempre ao que menos importa: como um presente de seu nato talento: não sabia o que fazer com ele ainda assim. Em meio aos drinks daquela noite e dos lamentos ao redor surgiu o primeiro estímulo real daquele período: começava na fantasia das palavras não ditas, mas que eram facilmente ouvidas quando a intenção se faz presente. Tomaz se aproximou dela sem muito cerimônia; sabia e sabe que tipo de reação deve exercer em cada tipo de pessoa: a melhor coisa que ele sempre soube vender foi a si mesmo... Não demorou para a estratégia os levarem para o apartamento: era uma das poucas vezes onde os caminhos estavam guiados juntos; sabendo que só iria até umas 2 da manhã e depois... O estímulo ainda prosseguia: Os gemidos caminharam normais por um tempo, como em todas as noites. O absurdo começou no primeiro arranhão. Ela parecia avançar a medida da penetração na direção da carne de Tomaz, como uma reação natural: arredio no começo se deixou mais à frente, e mais... Suas costas estavam em pele viva quando ele começou a sentir uma força diferente: a sensação cortava-lhe o corpo com lembranças do inexistente e avançava em golpes cada vez mais fortes dentro dela; era como se quisesse cortá-la ao meio. A mudança de posição simplesmente renovava a vontade: ela subia e descia apreciando cada toque e que se transformavam em pancadas: Tomaz guiava o corpo no instinto das suas sensações... Sua mão esquerda contornou-lhe o dorso e começou a puxar-lhe os longos cabelos: a cabeça dela pendia com dor e prazer a cada próprio movimento; como se pedisse mais. O peito desprotegido de Tomaz foi seu alvo seguinte; as unhas em forma de garras se fizeram num arranhão eterno no peito branco de Tomaz. No momento de sua curvatura um estranho êxtase lhe veio; algo realmente novo estava acontecendo... Sua mão direita agarra o seio esquerdo dela e começa a apertá-lo com força: queria esmagá-lo, atravessá-lo e penetrar na alma dela no mesmo ritmo e violência do seu pênis. Tudo (os dois e seus movimentos) se tornou uma gestão só de bestialidade. Seus olhos brilhantes se encontraram com a expressão do infinito; como o instinto do corpo que diz sempre querer o máximo... - Ahh... É agora.- A garra dela vinha direto para o seu rosto, mas o instinto dele não foi de defesa. Nem mesmo a porta a pouco arrebentada ele ouvira: a explosão do encontro de suas duas mãos vieram junto com o estranho orgasmo: Tomaz gritava como numa batalha, forçando a garganta, penetrando-a com toda força que tinha e tendo o maior prazer de todos ao sentir o pescoço dela se quebrando com a facilidade de um poder que ele não imaginava ter: ofegante olhava ao redor e sentia na exaustão das sensações o suor que escorria junto com seu esperma, misturado aos fluídos dela e no subir e descer, agora de sua respiração, um corpo com um amontoado de cabelos


retorcidos e inerte, a sua frente: a cabeça dela estava virada ao contrário... Mas a nebulosidade dos olhos de Tomaz se discipou não só para notar que havia se tornado um assassino, mas também o casal que o observava da porta do seu próprio quarto; rostos estranhos dentro de sua própria casa que testemunharam; muito além do que o Tomaz sabia; uma grande queda e uma nova ascensão... Ele próprio: o instinto A.B.I. havia rugido nele de uma maneira natural como em nenhum outro elemento jamais revelado... Os olhos de Artur encontraram sorrindo os de Tomaz... - Seja Bem-vindo, Tomaz.- O vendedor.”

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- Então, você recomenda o Norte? - Pra você que já conhece os trópicos, é a melhor escolha: a Europa das “bárbaros”.- Giorgiana sorri sedutoramente. Com a visão constante sobre o, agora, visivelmente vaidoso vendedor, ela deflagra suas falsas intenções de viagem para extrair o máximo: explicitamente vê que será muito mais árduo do que com o patético gerente que ela consumira em 25 minutos da melhor transa que aquele homem já teve, e provavelmente a pior de toda sua vida: mesmo com Franz... O gerente vomitara tudo que ela queria saber enquanto baforava bregamente a fumaça do cigarro: uma ordinária pretenciosidade “Bogartiana”num europeu mestiço semi-bem sucedido que dedicava a vida a puxar o saco dos hóspedes do hotel: sentiu ela vontade de vomitar depois de tudo terminado... por mais de uma razão. - E quanto aqui em Viena... Você pode me recomendar... algo?- Giorgia nota que o rapaz tem a percepção para ver que uma mulher que se dizia sozinha e rica estava abertamentee dando uma deixa para a sua atitude. O sorriso pseudoingênuo dava até mais prazer à contenda por mais atenção: de um ao outro... - Eu tenho a melhor recomendação da agência...:- A isca tinha sido mordida. O sorriso satisfeito de vendedor ao ter-se realizado à vista dos colegas ao redor, com uma mulher como Giorgia: a vaidade se confirmava. Ela sabia que ele próprio se ofereceria para o intento... O deslizar do seu corpo vê que também a mais desafio naquilo: a atração do rapaz fica sendo visivelmente considerada pelos olhos resignados de Giorgia... por descobrir os passos de Franz. Ela sente o que mais temia sentir desde que viu o marido na gaveta do necrotério; como uma auto marginalização para com o mundo a que ela pertência: ansiar pelo novo: desvendar e sentir os mesmos desejos que atuaram...livres em sua opinião... sobre o corpo desprotegido do marido: o porquê. Mas mais ainda: a capacidade. - Eu te espero nesse local às nove.- O rosto dela concorda com a ação de Tomaz. Nota ela se levantar calmamente e sair sob os olhares “canibais” dos homens da agência. Renderia mais uma longa quantidade de piadas de mau gosto durante um bom tempo; mas há anos tem de aguentar a inveja maquiada dos outros através de desprezíveis atitudes, as quais ele também aprendeu a desprezar como aos donos de suas pronúncias... A mulher que saia podia ser mais que esse pobre prêmio que esses gaviões tanto invejam: a satisfação de Tomaz começa na possibilidade que ela realmente representa... para ele e para... os outros... A cicatriz no seu peito começa a letejar, como sempre acontece... O mais que vem sempre a cada nova possibilidade... Muito mais!


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(Som de barulho branco) “Direto de Aspen, as imagens:” “O financista Louis Karr estava desaparecido desde segunda-feira última, quando em rede nacional foi exibido um video amador onde foi reconhecida a imagem do respeitado homem de Wall Street sendo currado por um homem desconhecido. O choque em toda comunidade financeira e nas associações familiares só não foi maior que a revolta dos mesmos grupos por serem tais imagens exibidas sem censura no horário nobre em todos os lares do país. Hoje foi localizado seu paradeiro como demosntram as imagens da pequena cidade. Um ato quase que regular nestes últimos anos na América... Testemunhas que estavam no bar dizem que dois dos clientes que estavam no balcão reconheceram o senhor Karr e exaltaram seus alegres espíritos com um grande estardalhaço no bar anunciando que “o lascado”estava na cidade. Com certeza, certo do total anonimato após abandonar o emprego, a esposa e os filhos, Louis Karr não esperava ter de sofrer tal humilhação de dois caipiras idiotas. Ainda segundo as testemunhas, tudo aconteceu quando um dos matutos notou o sangue que começara a escorrer da bunda do senhor Karr e gritou que o pobre homem estava menstruado, provocando-lhe um...” - Ha, ha, ha!- Dezenas de gargalhadas fluem pela redação da CNN. O mordaz texto do telepronto trazia a verdade dos fatos sobre o que acontecera na cidade de Aspen naquela tarde. O telepronto foi produzido imediatamente após a chegada da notícia na sede da CNN... Após a explosão daquelas imagens na segunda-feira, provocando uma estranha reviravolta no mercado de ações e fazendo desmoronar completamente o casamento de Karr, ele fugira de tudo, deixando somente a sombra de um mistério bizarro demais para se querer desvendar... Um dos editores da CNN foi o primeiro a decidir exibir as imagens enviadas anonimamente para todas as grandes redes de TV do mundo: mantendo as devidas restrições morais ele permitiu que aquela estranha verdade (e íntima) fosse ao ar sem saber com certeza que reação provocaria. A legenda da fita deixava certas informações claras, mas ainda assim lhe fugiam as intenções: foi essa a razão mais forte de sua escolha... Curt Novik é um dos poucos na redação que não está rindo do falso copião que fora montado antes até do que o que foi ao ar: é mais verdade que o que foi exibido, mas o que este constroi nos corações dos seus colegas faz Curt refletir mais ainda das razões de tudo aquilo... Em todo país e até no mundo pessoas estão sabendo e vendo este video feito propositalmente com a intenção de expor a vida do pobre homem; humilhá-lo; torturá-lo... Tudo, diante de uma das sociedades mais conservadoras e às vezes das mais hipócritas do mundo. Sabiam que Karr seria massacrado por todos: sua família, sua vida... Curt pensa em seu senso de justiça crítico: “Os dois matutos mereceram o que tiveram!” A que ponto podia chegar a crueldade humana... As risadas ao redor dizem onde parte deste limite está... Está com a fita original VHS que foi enviada para a rede: nada escrito: tudo de mensagem além das próprias imagens estão em legendas na fita... Não há remetente e o carimbo é local: da


própria agência de correio que fica no prédio da CNN... Não nada, só a vulgaridade e “violência” das iamgens e as dúvidas das razões daquilo, que agora resulta nas imagens que são exibidas na tela de forma jocosa e cruel: as razões que levaram Karr a isso... Curt pensa na esposa e nos filhos do homem: “Será que sobrara tão pouco?” “Karr sentiu transpirar por todas as usa dermes a agressividade que partia das suas últimas fontes de sanidade, no desespero de seus atos, na memória de ações que se abateram como uma doença terminal em último estágio. Nunca pôde esperar levantar-se ao mundo diante de tanto contra ele, tendo somente as imagens da família na cabeça: era a passagem para um novo mundo... Como que infectado por um vírus implantado pelos cinco que manifestaram suas vontades sobre ele; sem mágua, sem remorso... O último que resta nele se esvai enquanto a destruição de todo aquele ambitente que não mais possui referência em sua memória toma conta completamente de sua ações: os dois homens simplesmente não existem; são somente as manchas da fuga de Karr de um mundo que o condenou por ações que ele próprio se permite responsabilizar por causa da lembrança não do que fizeram com ele, mas sim o que ele próprio fez... Acima de todo desdém e desprezo do mundo pelo hoem que se deixou ser currado... trair a confiança de René... destruir sua própria imagem junto aos filhos; deixá-los orfãos e envergonhados... Acima de tudo não importa mais se conter ou sobreviver: correr livre pelas entranhas da agressividade humana, deixando fluir sem responsabilidade; como os cinco; para dentro de um mundo sem consciência que destroi os dois seres humanos a sua frente, visceralmente, como haveria de ser nessa dimensão bestial: sem mistérios mais, sem mais necessidades por respostas ou sustento; eliminando os temores da mente e os tremores do corpo pelo julgamento... a violência... até não restar mais traços do que eles foram; todos eles: os cinco, a família, esses dois que morrem e o próprio Karr.” “A polícia afirmou que muito pouco sobrou dos dois matutos, e na verdade, do próprio bar. O senhor Karr só pôde ser detido após ser almejado por diversos tiros dos policiais da cidade: “Morrera gritando como um animal!”- Afirmou um dos oficiais. Após muita insistência conseguimos falar com a senhora Karr. Ela não deu entrevista, só disse que queria esquecer tudo aquilo e ter paz. A esposa do currado não quis comentar sobre a fita... Talvez ela invejasse o marido!” - “Não! Não pode ser tão pouco...!”- Instiga Curt no oceano das dúvidas.

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- Artur... Como está sentido a volta pra casa?- Tomaz entra no escritório semi iluminado de Artur. Após o retorno a Viena muitos de seus negócios pediram sua atenção pessoal. Cumprimenta o companheiro sem se levantar da mesa e mantendo os olhos sobre os papéis em cima da mesma... Um indigno sorriso comanda a expressão de Tomaz, mas só ele sabe o motivo real... A outra ligação dos dois esteve no mundo há pouco... - E Andrea?...- Tomaz se senta sem cerimônia. - Está chegando do Ocidente hoje. Aproveitei que ela teria de passar em tantos lugares do mundo e pedi que ela fizesse alguns contatos pra mim...


- Não vai trabalhar demais, chefe... Pode lhe tirar o ânimo para coisas mais importantes...- Artur finalmente volta seus olhos para Tomaz: além da recepção à ironia, havia também a reprovação em seu olhar. - Não aqui, Tomaz. - Tá, eu sei... Viu o noticiário ontem?- O sorriso tomou o rosto já meio enrugado de Artur. A magnitude do alcance de suas ações nunca tinha ido tão longe... Sentia-se satisfeito: de volta ao lar e com alto nível de absorção do modo de vida que há tanto não lhe dava tanto prazer; por si mesmo, suas ações, sua imagem; o gratificante resultado do que ele já achava quase que rotineiro em sua vida: ninguém no mundo sabia, mas ele sabia e sabe, e sentiu: sua mórbida presença naquela fita... O sorriso permanece sobre o trabalho: tudo parece no lugar. - Debra deve estar com ego no espaço...- O rosto de Artur muda um pouco diante da verdade da colocação, mas era uma recompensa justa à jovem: nunca na história o prazer da torutra tinha atingido tais consequências, tal distância: foi um tipo de satisfação nova, mesmo para Artur... Principalmente para ele; imagina sobre sua estagnação; o momento morto em que todos estavam: Debra é algo suportável... Artur arruma seu precioso material financeiro e se levanta para acompanhar Tomaz. Livre da preocupação percebe o diferente que toma a feição do grande vendedor. A experiência lhe fez capaz de notar até onde as pessoas estão realmente revelando as razões de suas satisfações: existem aquelas de conhecimento geral que envaidece a todos como uma grande conjunção de realizações, como foi o caso do senhor Karr... Mas algumas vezes homens e mulheres se sentem satisfeitos no íntimo e mesmo não querendo revelar suas razões; seus corpos utilizam uma linguagem inconsciente que coloca emergente tais sentimentos... Artur conhece tais sensações: todos expõem, se sentem bem e se tornam mais imponentes em suas aparências; como que o despejo da vaidade que faz revelar a beleza latente de todos os monstros humanos e a si próprio como princípio. Mas é no caso deles que Artur sabe que pode representar certos riscos: a contenção da vaidade... sempre dentro daquele que a possui: não como Debra... Não é suportável que um só usufrua do prazer. É contra a ética. -Aconteceu alguma coisa mais que eu deva saber, Tom?- Usou uma forma menor do seu nome. Isso não é usual no grupo. É como um sinal de que já se conhece a resposta do que se havia perguntado. Existem poucos momentos como esse na vida desses cinco... Tomaz precisa decidir o que vai dizer e como vai reagir. Tenta se lembrar que é um vendedor... - É que eu fiz uma venda incrível hoje... - Era uma mulher?- Tomaz não sabia se ainda queria fugir daquilo, pelo próprio prazer. Tinha poucos momentos para decidir: tenta imaginar fora da pressão...: talvez não haja perda na sua ação; pode oferecer em tributo depois: algo mais sempre compele o homem a mentir sobre si próprio... É o primeiro passo para o fim. Artur já vê a mentira nos olhos do vendedor... Sente que talvez a fronteira atingida no dia anterior e a volta para Viena tenham trazido novas necessidades ao grupo... Sente-se até um pouco velho por tudo: são vitórias tão pequenas que tem vontade de simplesmente não ligar para o que Tomaz faça... Mas não pode. - Não... Foi um casal... A...- Não importa... No local já estavam Debra e Roger. -Ai... Acabou o agarramento... - E Andrea?...- Os dois se vestem... Era a hora de compartilhar o prazer: Karr e a família. - Está viajando...-


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“Andrea sempre viveu uma vida distante; de nós ou mesmo dela própria. Um hábil e misterioso laconismos... Eu recordo do meu último ano em Amsterdã: estava fechando a filial, a única que dava prejuízo... Foi no ano do auge da praça livre. Os anos A.B.I. me faziam admirar e frequentar como observador o mundo zumbi desses pobres que inocentemente fogem da dor da vida, simplesmente para alcançar mais dor ainda no retorno de um mundo que insiste em não existir, apesar de ser tã desejado: ignorantes. Nunca aprenderam a tornar a dor a amiga da mais torturante das solidões: não haveria viagem melhor: estimulado tudo no corpo, sem realmente precisar parar de sentir cada sensação da realidade... Foi a primeira época que realmente vi o Inalcançável no rosto daqueles zumbis (eles nem podiam sentir) e a sensação morbidamente bizarra de suas deteriorizações me levava a certeza de continuar a busca... Foi na pequena enfermaria da praça que a via: uma médica que vestia preto e tirava a esperança; mas para tais pacientes... não havia necessidade. Não era tratamento. Só eram tratados poucos em overdose, trazidos por amigos, que por razões infinitamente fora do meu entendimento, mas fluentemente dentro do meu prazer, traziam tais miseráveis almas de volta à vida só para levá-la de volta em outra contínua viagem para o vazio: era uma forma de tortura... Andrea aplicava com prazer a agulha de adrenalina nos nervos e vasos exatos para a volta do despertar do infeliz: sentia prazer silenciosa... Na verdade só ouvi a voz dela depois de cinco dias frequentando a enfermaria... Eu a via sentada; alta, com longos cabelos negros e as roupas continuamente pretas; esperando que mais e mais zumbis viessem a ela, a procura de seringas descartáveis, borrachas de enlaçar e queimadores... Comumente ensinava-os a usar os apetrechos médicos e tão frequente quanto, os via voltar com agulhas quebradas dentro das veias, queimaduras no rosto e hematomas diversas... Sua habilidade no mapa do corpo humano parecia ir muito além do que um médico pode querer ir... Por tempos não consegui entender porque ela havia se oferecido para trabalhar naquele local... Hoje sei... E ainda assim seu rosto parecia morto, triste, diante do que fazia, mas não a consternação que atingiria qualquer mortal que tivesse de conviver com aquilo todos os dias... nem holandesa ela era... é. Foi só nos pequenos passos que dei ao conhecê-la para entender o que vinha por trás daquela instigante motivação: era uma médica, que a longo; ou curto, como sempre foi mais comum; prazo trazia a morte aos seus pacientes, uma morte lenta, dolorosa, dependente de artifícios para se guardar da verdade de que a mesma não está chegando, e no quanto mais se foge mais perto dela se chega, até que a porta se escancara na frente deste pobre ser... Andrea vivia nesse mundo e parecia ter origem, parecia ser isso: a razão, os motivos de uma estranha paixão... Não carne a ser exposta... Sempre foi e ainda é uma expressão a ser decifrada... E que sabe provocar dor como ninguém... Observar e servir uma vida A.B.I. Algumas vezes eu a temo por tanto que ela consegue causar: um triste fato da triste expressão que ela consegue conceber: me deixar feliz.” “Quando falei com ela; largou o livro que lia, o pôs aberto para baixo marcando a página na cadeira onde estava(ficava) sentada, veio até mim, pegou minha mão esquerda, espalmou-a e pôs um kit de seringa e agulha sobre... A frieza em ser a guia do último caminho para o Inalcançável... Foi o momento em que me apaixonei!”


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- Droga de CNN... Não mostrou quase nada. - Não sei do que você está reclamando, Roger... A gente nunca tinha ido tão longe... Só famílias tristes que nem cara nós víamos...- Artur observava o prazer no rosto arrogante de Debra com a discussão de vaidades entre Roger e Tomaz... Era um momento de regozijo para todos: aquele algo mais alcançado por todos nessa situação merecia ser apreciado mais que uma noite, como é de costume... Não há preocupação com corpos e etc... somente o prazer da consequência inconsequente da dor causada dentro do corpo e do coração humano... As imagens da família Karr correndo de repórteres completavam ainda mais a sensação do quanto havia sido atingido: tudo gravado; um arquivo magnético que devia ser aproveitado ao máximo antes de ser destruído: apesar de muito agradável, também é muito arriscado; tais imagens no poder destes... - E então, Art... O risco valeu, não valeu?- Debra já sabia a resposta; somente seu ego ainda queria ouvir mais um elogio: cansativo e repetitivo... - Claro que valeu, Debra... Sempre vale...- Mas o olhar de Artur dizia o bastante... Era agora preciso pensar no que vinha a seguir. - “Queria que Andrea estivesse aqui...”- Estar com Andrea sempre é a sua maior segurança quando tem de confrontar-se com o tão “fértil” e jovem casal (Debra e Roger); mas é uma insegurança nunca exposta: muito mais que um líder, garantir tal modo de vida sempre terá que ser uma prioridade; mais que temer um julgamento, é o medo do vazio... - “Droga... Ele sempre está na borda de nossa eterna possibilidade de queda! Odeio isso!”- O que no final afinal?

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“Imagino: se as nuvens fossem partes do corpo de Deus, será que não doe quando o avião atravessa essas massas brancas de algodão celeste... Detesto imaginar que realmente há alguma coisa lá julgando a todos nós: o que ele pode saber... não sente o que nós sentimos, vivendo no lixo todo o tempo; vendo, ouvindo, sentindo e no fim apreciando tudo... Como Deus espera que não comecemos a gostar da dor se é ela quem está sempre junto quando simplesmente ansiamos a paz. Talvez seja este o verdadeiro prazer proibido... Espero que estas nuvens rasgadas realmente o machuquem... do mesmo modo como estes pensamentos devastam a minha cabeça...” Andrea corta os céus da América na mesma velocidade e altitude que seus obscuros pensamentos levam a sua consciência do que realmente é, ou onde realmente está. Sempre dentro da distância que a flui deste mundo para outro mais caótico ainda, no qual ela consegue se sentir muito mais a vontade, a médica da medicina do esquecimento conhece suas missões e obrigações através do mundo; sabe que Nova


York é o novo e o último ponto... Mas é só um trabalho: se sente confortável trabalhando para Artur, e mais confortável ainda por estar longe dele, longe de tudo... São os momentos únicos e constantes que a desfaz da realidade pelo que já conhece há tanto tempo num mundo tão estranho a ela, quanto ela mesma é dele: esse mundo, que se faz sem mistérios, mas viaja cada vez mais fundo para um caos sem resposta... e provavelmente por isso Andrea se perca tanto nas confrontações de suas necessidades: o negro, a dor, o caos... o vazio de seus olhos solitários dentro de um avião cheio de pessoas que... anônimas... também fazem parte dos seus pensamentos: sempre triste parece sempre ser a resposta mais simples... Mas a viagem continua. Da primeira-classe para... “Nem sempre é trabalho!” Não seria sempre instigar que provocaria tal “insana” busca no desconhecido da dor pública de uma família... Procurar as respostas e não fazer respostas: o jornalista acredita na exatidão da realidade, o racional do que é visto; o sentimento como passa-tempo... Mas a realidade é a coisa mais relativa que há... Aquela moça que devaneia-se sozinha em seus próprios pensamentos na primeira-classe conhece a realidade de um modo completamente diferente: talvez ela conheça mais por saber menos... O senhor Novik nesse lado questiona os extremos; o que é a procura do todo, mas há algo mais, e lhe deixa pensativo também o não saber, como a todos. Incomoda... como tudo que é para ser racional e não é: procurar respostas; nessa viagem... pois sempre o porquê vem lhe fugindo: a dor daquela família. Dois no mundo. As diferentes imagens da mesma viagem... E eles não sabem... Talvez nunca saibam... Talvez nunca precisem saber... Talvez não gostem da resposta. Novik faz um reflexo de todos os rostos que já cortaram seu caminho; nunca pensou como seria difícil... impossível contabilizar a real quantidade de diferenças e caminhos... A sua própria história faz parte; é um dos grãos que forma a enorme cultura que se amontoa ao redor do mundo sem a mínima idéia das razões... Imaginaria se todos não estão pensando nisso nesse mesmo instante em todos os cantos do mundo: uma grande união subconsciente que questiona ao mesmo tempo a mesma pergunta, só que cada um dirigido ao seu próprio mundo interno... São como esses outros rostos que o cercam dentro do avião: dentro do íntimo de cada um desses passageiros se escondem incontáveis mundos em forma de interrogações e reflexões; das mais ingênuas às mais profundas que a desenvolvida filosofia humana pode conceber... até agora... Mas então porque uma tão incômoda dúvida persegue o introspecto jornalista na busca das razões para as coisas acontecerem como acontecem: somente um deus conseguiria visualizar a racionalidade de tudo isso, ou talvez nem mesmo eles estejam aptos para entender os caminhos das próprias criações... Só resta a ele então prosseguir... na total ignorância do que vem a frente e sem ainda entender o que acontecera antes; num ponto morto das possibilidades. O mundo de Andrea duas classes à frente é o melhor exemplo: dentro dela como nos mais fundos dos poços; somente preenchido pelo seu estranho vazio.

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- Droga! Que diabo eu fiz? O que estou fazendo?- Tomaz vem se lamentando desde o instante em que expôs sua primeira hesitação a Artur. Era óbvio que já sabia que algo estava para acontecer; algo inconsequente e vivo... Mas o interior de Tomaz pedia uma recompensa individual nesse plano. Estava nas palavras que iria dizer essa realização que no momento aguarda: eternamente se sentirá agradecido ao grupo por lhe oferecer o caminho que vive; nunca se sentira tão ajustado... Mas ainda assim ocultara o encontro que já começa a tomar forma nessa noite: “Talvez possa levá-la a eles depois...” Mas Tomaz conhece seu instinto... O que os unira poderia se tornar o motivo de um doloroso afastamento: detestaria admitir isso como opção; odiaria voltar a estar sozinho; inseguro num mundo que já é visualizado completamente estranho à ele, como já o era antes: gosta do que é, gosta do que faz, um apêndice solitário que só quer ser o que é... Giorgiana chega à frente de sua dúvida; pronta para afugentar os problemas e trazer realizações e satisfações... Eles se observam com poucas palavras na procura de ambos em chegar nas fazes opostas de seus projetos. Giorgia se apresenta com gestos mais livres em suas intenções. O vazio de procuras em sua vida a deixava mais preparada para tais abordagens do sub-mundo da libido humana... Tomaz conhecia um mundo desconhecido: certamente bizarro, mas aquela “infidelidade” o estava tirando a liberdade: “Por que fiz aquilo?” - Insistentemente se pergunta... Somente o clima de Giorgia o mantinha nesse caminhar; ainda é o vendedor... e homem. Não é noite para muito antes... A conversa. A caminhada. Enfim... Muito de muito pouco vem à mente de Giorgia nesses momentos: o vazio penetrante que surge nos seus poros quase que adormece a sensação da verdadeira penetração. Confundem-se o sorriso morto de Franz, com os sorrisos estúpidos de incontáveis companheiros de cama e com o sorriso falso desse que a possui... O empenho dele faz recordar jovens ansiosos pelo desconhecido sexo das virgens, mas ao contrário ele sabe o que fazer e o que tocar com a mesma fome daqueles anos. Seu vazio e seus pensamentos vinham cada vez mais inseridos àquela situação: lembra do nojo que sentira do gerente; pensa no que realmente está procurando e como o que realmente surge é Franz... Em tantos anos, em tanto desperdício e aprendizado sobre coisas no corpo que afugentam a moral da alma; e algumas vezes ela se sentiu sem alma; e agora não é um desses momentos... Há prazer no que está fazendo; seu corpo lê a doce visita daquele homem desconhecido dentro dela como algo de bom... Talvez hormônios demais a estejam entorpecendo, mas sente sua alma voltar ao corpo... continuar a ceder ao estranho: no gosto de suor, no movimento, na inversão dos pesos... Talvez tenha procurado a coisa errada no lugar certo, Franz está morto... Ou talvez tenha simplesmente encontrado o que nunca imaginara que podia existir: conhecimento humano... Um verdadeiro ser humano e que nem se conhece. Nada de palavras. Tomaz imóvel abraça o corpo silencioso da parceira. Ambos de olhos abertos somente dignos de seus próprios mundos... Sentia em seus braços o incômodo conforto da preguiça e da dúvida; transbordavam pelo fundo de seus olhos: a mulher ao seu lado: “Giorgiana. Quem é você? Imagino em que extremo ponto nós chegamos hoje... A distância que alcançamos em nossas ações dentro de um mundo tão estranho a todos, mas que por quase sete anos foi mais próximo que a fugaz família que tive: erguido por mim mesmo naquele mundo que exige tanta competição, mas no fim nenhuma razão para tanto. A


dor faz parte da minha vida há tanto tempo que não consigo conceber uma vida sem essa tão única fonte de prazer... Talvez isso seja a continuação de um sinal que eu não consegui perceber mais cedo: “Artur não prosseguiu a sua repreensão.” E ambos sabemos do risco de tais atitudes no grupo; mas... mas o risco também é parte do prazer: e o que é isso, então? Prazer! Essa mulher... Ela absorveu cada novo movimento meu; só me gerou o melhor; me acompanhou... Faz-me pensar na obscuridade que aproxima Artur de Andrea, e na vivacidade e energia que uni (e muito) Debra e Roger... Eu sempre só quis o calor vivo da dor... Porém algo de diferente surgiu hoje: desde as imagens compostas de dor proporcionadas por Louis Karr, originadas por nós, tanto tempo depois; o meu confronto com Artur; e agora isso: talvez Giorgia se junte a nós; provavelmente não; talvez eu me junte a ela... Talvez tudo precise de extremos para evoluir... Mesmo as abominações que rondam a Terra... Eu chego a me sentir inocente com tais pensamentos... E livre. Quem é você, Giorgia? Sou eu.” Alguma coisa falta nas consciências desses dois que os faz querer prorrogar por tanto tempo a necessidade de ficarem juntos em seus silêncios pessoais. Como se fosse o prévio conhecimento da inevitável diferença de caminhos que os cruzou nesse momento de tão grande prazer, mas que na verdade é o anúncio de algo novo: são as verdadeiras imagens do que cada um está representando nesse instante tão íntimo; suas verdadeiras faces que são negadas pelo silêncio, pelo medo; pela certeza oculta de que estão em lados opostos, em uma batalha que nunca começou: um não-homem e uma não-mulher... pela única vez. Acordados. - Eu sempre me achei meio indiferente ao resto do mundo. - Isso não é tamanha razão para recriminações, Giorgia. As pessoas só tentam ser o que são... A consciência é uma coisa relativa à vida que se vive. - (!!) Eu achei que fossem apenas palavras. - Geralmente são... Vendedores... (Tomaz dá um confortável sorriso) Eu não sei o que há realmente por trás de tudo aquilo... Falsidades de uma vida sob convenções. - Como nós... Estranhos!- O olhar dele não se distingue entre o desmascarado e o melancólico: parecia a verdade em três palavras; e a revelação sobre a vida que todos levam. - É. Estranhos... Eu... me sinto estranho.- Sem dúvida... É o medo do novo desconhecido que está começando a tomá-lo; como um vírus; imperceptível e letal. Não havia o refúgio na ironia de um vendedor, somente seu próprio ser. - “É... Eu sei...”- Giorgia fala para si mesma, perdida numa incômoda insegurança: nunca ouvira um homem falar tão bem depois de uma transa, ou mesmo em qualquer outra hora... Eram realmente completos estranhos um para o outro: era um vendedor e uma “gostosa”; mas agora são interrogações particulares... Somente agora no absurdo de suas intenções e esquecimentos de um mundo real é que a verdadeira sensação de plenitude surge...Não se conformam... Ambos temem o que pode vir a seguir, pois ambos têm o que esconder... Apavorados, mas curiosos... Simplesmente ficam abraçados: mundo com mundo, mas na verdade sem se tocarem... É dia. O quarto de hotel de Giorgiana começa a ser inundado pelo sol. As antivirtudes de um mundo corrupto sendo purificado pelo brilho de um novo dia que enxágua das mentes adormecidas as dúvidas de suas misteriosas existências num mundo que não lhes pertence. Tomaz e Giorgia começam aos poucos a se recuperarem das distâncias dos seus últimos sonhos e a sentirem as texturas de suas peles. Movimentos lentos e sem direção conduzem seus instintos um para o outro, como haveria de ser,


longe das dúvidas que tanto adiaram o sono do prazer da insuperável noite que vinha pelas costas de suas memórias, os fazendo revivênciar o toque, na carne... Tomaz toma-se sobre ela; sente-se confortável à penetração... Talvez no ainda adormecido da sua consciência, põe-se à vontade nos seus velhos e familiares instintos. O prazer da posse visceral e a satisfação de ver as expressões de uma parceira sem o temor do novo ou o pavor do sempre como é muito comum de ver após as revelações de uma noite recente... “Então ela gosta afinal do que mais eu posso apresentar. Imagino que de uma maneira indireta essa mulher tenha achado seu lugar nesse mundo de seus vocabulários difíceis e estrangeiros: talvez levá-la; talvez suprimi-la aqui mesmo... Não... Eu sinto novamente a pureza.” Quando em um universo de perguntas sem respostas concretas, onde os desejos têm vida própria e exalam pelos poros destes seres humanos que contorcem seus corpos como animais selvagens tentando esvair-se de dúvidas tão perturbadoras que os tiram das legítimas direções que haviam se decidido na vida; coisas tão incertas como o dia seguinte mas que ao se racionalizarem as possibilidades apreciadas por seus olhos, tais se apresentam com tanta perfeição que nada mais resta a não ser ceder ao “destino”... Mas esse momento é diferente e os tira dos seus caminhos; sem perguntas e sem respostas: Giorgia sente o sangue dentro dela pulsar a satisfação presa em vidas de frustrações; e Tomaz sente o poder de seu corpo, a beira do Inalcançável, a união de tudo que ele conhece com tudo que ele sempre desejou... O alcance de um estranho vazio de expressões e rostos, mas totalmente preenchido por um calor sem origem e sem direção... Parecia ser a completa equação A.B.I. no seu sentido de vida e existência: a dor, a culpa, o prazer, a alegria, a tristeza, a frustração; o máximo alcançado dentro de faces mortas e por nascerem; o fim de seu ser próprio, a perfeição à sua feição... Tomaz, Giorgia, a luz, o calor... agora somente um mundo.

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Há um perpétuo fascínio pelo desconhecido nas mentes daqueles que buscam mais razões que o que é possível se ver ao se olhar o mundo. Algo nas dúvidas dos temores e da face da morte nas jornadas pelo universo que o homem teima em querer conhecer, quando simplesmente só deveria fazer parte... Por quê essa compulsão às vezes tão nociva de encontrar novas formas de sentir e de viver? Formatos de uma estranha evolução; mórbida purificação através do conhecimento; conhecimento do nada: é o ser humano: protege o que é, mostrando o que nunca foi, tentando revelar o outro... Devia simplesmente ser o que é... O luxo vertical do prédio à sua frente indaga continuamente sobre as razões para estar aqui: são razões que buscam razões... Dito Curt Novik a si mesmo; mas mesmo a busca do racional parece ser irracional quando se passa por um rosto lamurioso e sem destino que vislumbra um mundo vazio a sua volta: as pessoas na rua, faces sem vida; o verde do Central Park, o opaco da falta de sentido; o “glamour” da Park Avenue que ignora o rosto dessa mulher, sem saber que há poucos dias atrás contribuiu


indiretamente para sua profunda e exposta aridez para com o estranho ambiente que a cerca. Curt acompanha os lentos passos da senhora Karr até a entrada do prédio. Seus filhos, um em cada mão, solidarizam a tristeza da mãe: apesar do esforço, em algum lugar, em algum momento, alguém deve tê-los permitido assistir às bestialidades paternas: na ausência e na vergonha que ele provoca... A família desolada sobe de volta para o luxo vazio de seu apartamento; somente sendo refletido por esse que observa ainda em dúvidas das razões: o âmago da tragédia que se tornou a vida de um homem comum... Curt veio decidido a querer saber, mas mais se aprofundava o medo do desconhecido: ainda compelido, mas cada vez mais receioso com as possibilidades dos porquês... desde o momento em que teve aquela fita nas mãos. Atravessa a rua. O cheiro da riqueza o recebe no “lobby” do edifício. 601. É a primeira cobertura. O brilho da nobre madeira se abre para os olhos de quem quer ver mais do que uma herança: um verdadeiro legado de lembranças (alegres), mas que entristecem amargamente seus possuidores... A criada o guia até um dos cômodos do que mais parece ser um frio e silencioso túmulo onde restam as cinzas de uma cara família... A senhora Karr é o composto de uma expressão indecifrável vinda de uma longa caminhada em carpetes espinhosos distantes da eterna maciez de uma vida regular: o marido, os filhos, estar na vida, sem se preocupar em ser a vida... Olha prolongadamente o seu alvo de questionamento: “Como o marido pôde ter “cedido”?”... Mas a responsabilidade dos fatos e da dor vinham na sombra da necessidade da pesquisa: foi o primeiro a exibir: o espetáculo antes... agora vê as consequências: imóvel em seus pensamentos obscuros, como as últimas chamas de uma vela pronta a apagar... -...Senhora Karr... - “...5...4...3...Viena... Desgraça...”- A decida no elevador abrasava a raiva e a náusea: uma incrível revolta perante tão tortuosa situação. Curt sabe que tem culpa; como todos em volta, como todos no mundo, nos bares e guetos, festas, ruas e taxis... O inferno de viver cada dia sem saber a resposta, fugindo das perguntas, tendo que eternamente lembrar da expressão sem vida daquela mulher, se desculpando intimamente por estar vivo e o marido dela não, por existir e ela “não”. Tudo começou a mudar quando ele voltou de sua viagem pela Europa, partindo de Viena...: tão simples... - “L”-* A porta do elevador se abre. A luz da tarde nova-iorquina invade seus olhos distorcendo a iminente visão que coexiste em movimento na calma e elegante entrada do prédio. Aproximando-se ainda na regência da estranha revolta dentro de si, o hesitante homem dilui e conflui seu raciocínio na conclusão para aquela tão desconfortável situação: um denso momento de apresentação do que pode vir a ser a real apresentação da procura e da responsabilidade; tão rápido quanto a sua atitude ao viajar para cá, visitar a interrogação maior de toda questão; trazer ao extremo tudo preso no interior humano afastado do seu sentido e vitalidade; a dedução; o círculo e a confirmação... Sentia seu corpo vibrar em capacidade; gritar por tudo aquilo de somente terrível que conseguia ver; sente aumentar em cada passo: podia destruir tudo e todos no mundo para não ter mais nada na cabeça além de lembranças da infância: o primeiro beijo, os grãos de areia em mãos pequenas e sentir o coração bater ao olhar por um buraco de fechadura... Sai do prédio; dá somente uma rápida olhada: parece até se mexer...: seis andares... “Não! Não mais! Não quero acreditar!” Vira à esquerda e anda seguindo cada passo como o peso de cada nome que já viu ser pronunciado como morto, em todo mundo, em todo país, em sua cidade, sua família, sua vizinhança; a mulher com quem acabara de falar sobre o marido humilhado e morto... e que agora parece também estar morta, um minuto e meio depois, saltando pela janela, alcançando a rua antes dele; desistindo; talvez com sua ajuda, com uma mão a mais para pesar em


sua queda enquanto vinha de elevador... Não quis mais ver. Tudo só fez aumentar ainda mais a pergunta; sua extensão... - “Deus...”- ...O desespero e a insegurança; uma pedra presa na garganta, fazendo doer todo o peito, travando a respiração e fazendo a “alma” doer por estar em um corpo vivo...

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- Por que você demorou tanto?- Andrea anda calma como sempre em direção de Artur. Sua pele branca e gelada extremece o interior sempre tão confiante de Artur, ao senti-la, o beijo da volta dentro daqueles olhos tão escuros e misteriosos quanto lindos. Quase lhe tirando o fôlego antes do fim. - A escala em Nova York foi demorada.- A banalidade não tira o grau de tortura daquela voz que se ergue em sussurro por entre os cabelos negros como uma fria noite sem lua. Volta a extremecer o interior do poder... Nas duas últimas semanas Artur teve de suportar os agarramentos de Debra e Roger sem a companhia tão extremamente ausente de Andrea... Sua sala de trabalho tão somente ligada à sua função se resumia à presença dos dois no momento do reencontro... Ainda olha essa mulher com receio por sua expressão tão arraigada em si própria: Nunca soube realmente o que ela estava pensando em momento algum desde que se conheceram, é somente hipnotizado por sua expressão de liberdade nos momentos viscerais, ao expor o pedaço mais ardente do seu interior; e completamente desarmado nos momentos como este: de uma frase, um toque e uma interrogação... “Parece não pertencer ao nosso mundo, Andrea; e por isso eu sei que não digo; mas eu amo você e tenho medo de você, com pesos indistinguíveis... Talvez por ser esta uma tortura maior que qualquer outra...” E ela sorri: uma perfeição impenetrável, mas parece enxergar pelo lado contrário... Trocar olhares e a translúcida mensagem nos olhos deste; tudo em que ele está pensando e em tudo que pode haver em volta da ameaça... - Nós temos um problema. - O quê? - Tomaz sumiu desde terça-feira. Acho que ele foi embora com... alguém. - E Debra e Roger? - Mandei investigar... qualquer coisa.- Encarar a situação significa admitir uma “deserção” no grupo, o que pode sempre vir a acarretar na exposição ao mundo de um modo de vida anormal, desajustado e psicótico... totalmente vivo nas rotinas de cada um desses, por tanto tempo... É a separação, a volta ao “desajuste”, ao deslocamento, à solidão... - E outra coisa... Perdemos o contato na agência de turismo... Vamos ter de parar por um bom tempo.- Nos olhos escuros, os olhos claros; e a racionalização: o que são frases realmente normais à um mundo que não enxerga a própria insanidade de normalidade vivida a cada minuto em cada imagem na rua, em cada “frame” de TV e em cada rajada de ódio contido... “O que vamos fazer?”... Seu lindo rosto é a fortaleza da lembrança: Andrea recorda...


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“Era um mundo de posteridade bravia que teimava em reconhecer os maus quando vivos e os bons quando mortos. Ter me tornado inconsequente em relação ao estúpido mundo que me cerca e me julga vem daquele primordial pré-julgamento das relações humanas quando mais me decepcionaram os relacionamentos de mentira... Arrastados há muito tempo em minha terra natal, ainda durante a escola de medicina, eles iam e vinham, muitas vezes o mesmo de antes; mas numa interna procura do que realmente procurava nas almas deles, cada vez mais sem alma, mais distantes... semelhantes lúcidos dos mortos-vivos que encontrei depois, aqui na Europa... Sempre foi como lidar com o mesmo tipo de gente; porém estes, mesmo inconscientemente na época, eu sabia que estava ajudando a exterminá-los, em suas fugas e frustrações; fraquezas geradas por um mundo sem controle... enquanto aqueles eu tinha de suportar, até quando tudo aconteceu e eu vim embora... É provavelmente a última lembrança boa que tenho, e provavelmente a primeira ruim: pré-concebido seu maldito julgamento, sua própria fraqueza, sua falta de confiança, seu excesso de honestidade... a falta que você me faz...: deveria entender um pouco mais do comportamento humano e feminino, seu tolo, perdido em si mesmo; nunca me deu a chance de ser “normal” antes de tomar sua própria decisão; moldando a transformação para o que sou hoje e me deixando igual a você; o que você era, sua posteridade; a transposição humana de toda aquela agressividade e amor que você não pode demonstrar, sua impaciência e tudo aquilo que me faz sentir prazer por nós dois ao nos vingarmos do mundo que nos julga e nos condena... Não posse deixar acabar, e você vira sempre comigo...”

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A dualidade de intenções na inexpressividade de um rosto que se esconde na própria beleza e própria tonalidade de mistério e necessidade que manteve sua tão sutil e ao mesmo tão dominante presença em todos os momentos de uma vida que ela própria só passou a identificar-se no instante seguinte de uma dolorosa perda; foi a absorção e o encontro do seu verdadeiro fator de personalidade e desempenho diante do modo de vida dito normal... E tudo fechando-se no círculo ao encontrar este que a observa com calor, desejo e temor; Artur; trazendo-a para uma sub-vivência que finalmente lhe propunha uma verdadeira e única forma de expressão: de dor, agressividade e evasão: uma predadora do descontentamento humano, uma vitoriosa da derrota, uma obstinada. No retorno ao cenário dos acontecimentos o telefonema vinha com Debra e Roger recém indicados na agência de turismo: três dias, a última cliente e o hotel...


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Margear o Danúbio se torna uma das metáforas da procura desse casal em torno de sua vitalidade inabalável diante dos problemas; são sempre presentes no grupo, o estilo de vida, a escolha fácil, a admissão do real ser dentro de cada um... É a tristeza e a falta de visão que caminham junto a todos aqueles monumentos da natureza e do homem que prosseguem os vivos e penetrantes olhos de Debra: toda sua imaginação e diversidade nas certezas das escolhas e nos passos ao lado de Roger; nas eternas lembranças do Egito e no medo ressonante de tudo ter de parar menos de dez anos depois... Jovem, muito jovem, e livre ao se ver levando um estilo de vida ignorado pelo mundo, pela vaga memória de suas origens de fuga e sobrevivência dentro da falta de sentido, e o ser a ser encontrado por si mesma... O Danúbio, a Grécia, a Europa. as realizações, a capacidade de atingir estágios da natureza humana esquecidos há muito tempo pelo medo dos verdadeiros prazeres. Debra nunca teve outro jeito de viver; seria inadequado a tudo, ou melhor, nada seria adequado a ela: a pedra que ondula as águas do Danúbio, e teme o vazio sem dor mais que a própria morte; e por isso vem a frase: “Nunca é trágico morrer pelo que se ama!” Amor... - Que vamos fazer, Roger?... Me sinto perdida... Traída...- As palavras jorravam sobre Roger como o grande participante do jogo do momento: conhecia Tomaz demais para imaginá-lo fugindo com a mulher que encontrara na agência; não vinha no seu costume, desde inúmeras “happy-hours” até as conquistas e descobertas da Europa A.B.I. que eles próprios haviam construído para se suprirem: o que realmente parecia haver de errado na situação; a hesitação mencionada por Artur no dia do seu desaparecimento; seria como o símbolo do real limite que tais criaturas haviam atingido. Roger compreende a situação da companheira: com tanta energia, foi a última a entrar, perder tanto em tão pouco tempo e por razão de uma decisão tão inconsequente... Talvez seja o que eles vêm fazendo a vida toda, talvez Tomaz seja o primeiro de muitos a completar a evolução: o Inalcançável... Ou talvez esteja simplesmente sendo racional demais, tentando evitar a verdade e no fim sentindo o mesmo que Debra: um verdadeiro “porre” de verdade e insatisfação; e admitir que o fim é somente o fim... Os fatos não escondem o medo. - Não sei. Parece a construção de um drama que há muito tempo vem sendo antecipado por Artur e sempre negado por nossas mentes e necessidades tão adversas a esse mundo.- Debra constrói uma expressão totalmente desavisada de completa perplexidade. Roger profetizava o que qualquer coisa podia vir por entre os mistérios daquela partida: como Artur dissera... - Eu quis dizer pra gente encontra novas vítimas?! - Não deve dizer... vítimas... Eu não sei... Em todo caso temos um ao outro...Ela dá um frio sorriso de entardecer no final do verão. - Trepar não basta, Roger.- A revolta da resposta soava compreensiva pelo que conhecia dela. Não era bastante mesmo, mas uma consciência mais apurada e racional podia ver melhores perspectivas por detrás dos piores horrores; analisar as condições do


desaparecimento de Tomaz, cruzar com a evolução de tudo nesses anos, a lembrança de Debra no Egito... Tudo talvez entregasse a Roger a missão de ver e oferecer à sua companheira outra opção de Inalcançável... mesmo dentro da grande dúvida, do futuro e do que é realmente a normalidade. - Quer saber, Debra... Vaa´zhii.(Ela pára de andar bruscamente e olha-o) O que quer que aconteça... eu serei sempre o mesmo.- Aquela palavra é exclusiva para as sessões e sua pronúncia trazia do interior a segurança e a força de volta; a viva fome de Debra; a agressividade e o ser... Eles seguem calados. Em direção ao hotel. E algo familiar estava por vir.

***

O interior de Artur lhe serve par informar de toda a sua experiência num mundo sempre tão aberto às motivações dos espíritos humanos através dos tempos nas entranhas da verdadeira e brilhante sociedade que se forma e se desenvolve ao redor dele e dos seus companheiros. Talvez nunca tenham sido tão unidos como havia por tanto imaginado; distante das tão tentadoras realizações simplistas que a vida apresenta: um dia todos são contaminados e gostam, e aprendem que há mais... O que informa é que uma grande mudança está acontecendo. Quando vir de primeira mão as novas notícias e o que isso influi nas atitudes a serem tomadas: a tortura da ausência, o “amigo”, o prazer da fuga e o choque com um novo tipo de violência... Um círculo de cinco quebrado e uma sensação de descontrole e desconhecimento emergido nesse novo arco restante: do absurdo e o sexo das bestas animais que surgem no enegrecimento da alma; do bizarro distante da sociedade, que visita sua casa insuspeitamente e nunca ultrapassa o revestimento do medo que é encarar o que realmente acontece do outro lado; do Inalcançável afinal, talvez, da dor e do desaparecimento... Na espera pela informação.

3

“O verde brilhante do Central Park me faz lembrar porque escolhemos morar aqui no centro ao invés do campo: uma imagem totalmente paradoxa dessa louca cidade que enlouquece a todos e traz às mentes desejos obscuros de ascensão e vitória... Meu querido marido conseguiu ambos e na verdade nunca soube porque dos tão perdidos e deslocados sorrisos no mundo dos honestos espelhos da sociedade financeira que só refletem o que as próprias realidades e desejos imprimem em seus corações... Louis nunca teve o coração morto, mas fazia parte de todo esse jogo e tinha que sobreviver por mim e pelas crianças; o que agora não representa mais nada... Ninguém entende,


ninguém nunca entendeu o que realmente acontece; ver-se livre das responsabilidades e das consequências: todos acabam encontrando uma maneira... e o que eu posso dizer a você caro Louis é que eu perdou você, pois o único imperdoável é aquele que não consegue enxergar o que existe de realmente simples nas ações de cada um; sem razão e sem motivo... sem destino.” No cúmulo do cansaço de seus julgamentos e pensamentos. As contínuas análises do que o mundo lhe apresentava: as perguntas de um desconhecido e a infinidade de coisas e criaturas que habitam todo vazio do espírito da senhora Karr... Um único e verdadeiro surto de clareza e sanidade na beira do seu ato mais insano: um ponto final à beirada de sua varanda e um último pensamento pelos filhos e pelo marido... Se joga e vive.

***

Quanto mais tentativas de justificar as ações dessas estranhas criaturas surgem à frente das investigações e incursões pelo sombrio da pesquisa jornalística... Mais e mais vem lhe aparecer outra imagem; uma verdadeira vertigem do que realmente vem lhe impulsionando nessa jornada tão cheia de interrogações que só se desdobram em mais perguntas que parecem somente trazer respostas que apavoram a si mesmo... pois é sempre dentro de si que surge o mais elementar dos seres: é sempre a imagem da mulher caída no chão em frente ao tão luxuoso edifício logo após ter lhe revelado tão pouco, mas na verdade exposto nela própria e em si logo após a decisão de ignorância e persistência no “erro” que mais uma vez vem a confirmar no interior da alma confusa de Curt na sua primeira imagem sobre a Europa e ao chegar em Viena sem ter a mínima idéia do que realmente está procurando ao penetrar num mundo tão estranho e ao mesmo tempo tão familiar e atraente... Ele simplesmente enxerga a si próprio nos moldes das atitudes dos desconhecidos; como todos os seres humanos ao estarem diante de uma porta aberta, nova e que na verdade só o faz encontrar a si mesmo. A pequena mala o acompanha na reconstrução do caminho do senhor Louis Karr pelas ruas antigas e bem conservadas da milenar capital das tradições culturais européias. Não é difícil para uma imaginação fértil e curioso perceber o que pode ter acontecido a partir desse ponto na jornada turística do senhor Karr para enfim se deixar “violar” daquela maneira: soava como algo de visão simples que podia ser facilmente planejado e executado, mas que por razão de diferenças de ângulos, nada se nota, nada se vê e “eles” se mantêm até que alguém veja tudo de dentro para fora: fazer o que Karr fez...!!? Perseguir os vultos que aquelas imagens tanto persistiram em indagar ao próprio Curt: “Somos nós!” “Venha nos encontrar!” Nos sons e ecos do sofrimento duradouro sobre a família Karr e sobre sua face oculta que acompanha os passos pela velha cidade em direção do mais óbvio a se investigar: a agência de turismo que planejou a viagem do financista e que terminou por levá-lo a pior das degradações... Porém permanece a dúvida; na história, no fato e na contradição da busca.


***

- E você tem alguma idéia pra onde eles podem ter ido? - Não, Artur... A cabana de pesca era a minha última opção. - Roger... Voltem logo... Temos que decidir o que fazer... Logo. Por favor.- O telefone é colocado no gancho lentamente. Ainda com a mão apoiada sobre o aparelho Artur estala o polegar e forma em seu rosto já um pouco envelhecido uma expressão nova e triste; como o símbolo do medo e do cansaço no grupo ele foge seus pensamentos nas ondulações de suas memórias há tanto passadas em tantas partes do mundo... Vendo em que mórbida ironia se tornaram as suas ações e a dor do seus companheiros: um que foge com a esposa de uma de suas “vítimas”; fraca e indolente, não conseguindo suportar os breves momentos... Imagina como a esposa deveria ser infeliz perante tal monumento de inutilidade, e se houve escolha, Artur bem sabe disso, Tomaz foi a certa: sempre na medida certa dos seus atos e realizações... Mas ainda assim inconsequente a decisão; alienante e também necessária: revelados os medos dos jovens, Debra e Roger, seguidos na trilha de suas preocupações, mas também o cansaço parecia alcançá-lo, o tédio de todos os dias e a eterna procura de um fim desconhecido e sem sentido... Quanta coincidência descobrir a fonte num outro ser e ela, tendo se revelado quem é: Tomaz não deve nem fazer idéia, mas o perigo deixado pelos dois é claro como a transparência dos mortais... Artur sofre com suas especulações interiores sob a participação atenta dos olhos de Andrea e ela sabe o quão perdido ele está; pode enxergar as mesmas ondulações que devastam tanto sua anti-presença naquela sala de onde com tanta firmeza enfrentou todo o fogo do mundo pela conservação do seu próprio modo de vida... Quase sente raiva do parceiro por vê-lo perdido numa situação tão completamente nova: o círculo quebrado: de dentro para fora... - Não tem idéia do que fazer, não é? - É verdade... Você acha que ele pode nos entregar. - Talvez... Afinal, a mulher era... - Eu sei... Ainda não acredito que ele não tenha notado o sobrenome... Debra deve estar virada no demônio... Primeiro o cara apaga antes da hora dele... e depois a mulher vem e... -...Nos destrói... - Eu preferia dizer desfalca...- Mas Artur sabia que um dia, de alguma maneira tudo seria exposto: a mulher que arrancara Tomaz do grupo iria descobrir e a consequência surgiria nas mãos de todos... Talvez fosse parte do risco afinal; como o próprio Tomaz gostava de se referir a respeito de suas conquistas. Ele se levanta sob o olhar de Andrea. Dá a volta na mesa e senta ao lado da única pessoa que parecia ter restado ali para compartilhar a revisão dos seus prazeres humanos; vinha olhando (vigiando), sentindo sua ausência e a pressão dos fatos... Toca no rosto e nos cabelos. A pele sempre um grau abaixo da temperatura ambiente torna o toque a perfeita lembrança da singularidade que ela representa; aquele medo e aquela eterna insegurança de nunca saber onde está realmente pisando: a expressão séria de quem seduz com o silêncio e com a frieza.


- Você não vai até o castelo desde que voltou... Por que a gente não aproveita que os dois vão demorar umas cinco horas pra voltar do lago e tenta esquecer um pouco a loucura e as ameaças...- Primeiro foi pobre, depois se fez rico, nunca admite sua verdadeira origem, vem participando desse estranho mundo de dor e prazer, agora tem o tempo nas costas e a cômoda vontade de parar: chamar de loucura e negar a si mesmo, querer sexo dentro das consequências, fugir na verdade: são as escolhas das atitudes que fazem o homem e sua individualidade...Nesse momento Andrea sente clara a dela, como a dele, como a de todos no verdade, como tem sido sempre, mas no final seguindo no modo como afeta cada um: no que é realmente a dor, a tortura e a sanidade. “Entendo sua decisão hoje e comigo vamos completar o que você começou... Juntos.” É parecer demais levar os desejos da carne nos seus extremos e ainda assim liberar confuso os pensamentos e admitir a “insanidade” como o único meio de vida: é o que as pessoas fazem.

***

A cabana sempre foi o cenário preferido para a procura dos cinco por uma utópica paz de espírito que só fazia lembrar-lhes das contínuas necessidades que precisavam suprir; sempre foi como enfrentar que uma profunda falta de consciência os protegia do mundo que nunca teve também nenhuma com eles: sofridos em suas diferentes histórias e passados, vinham aqui para esquecer o que não podia nunca ser esquecido: suas próprias existências e no mínimo de sentido que elas pareciam ter... Foram as razões para trazerem tão longe Roger e Debra: a dedução dos jovens para o que eles sempre procuravam com a certeza de sempre voltar, mas obviamente Tomaz não tinha intenção de voltar. Debra se senta na escada de madeira enquanto Roger termina de falar com Artur pelo telefone celular. As palavras pareciam não apresentar nenhuma outra opção além da dissolução e do afastamento para a proteção de suas “felizes” sobrevivências... Mas ela olha com ressentimento toda a beleza da natureza crua e solitária ao redor; não pode se conformar com o simples alcance do absurdo em um período de vida tão curto; fora como a política e a ética do grupo... Volta seus olhos para Roger; coloca a “fome” em seus pensamentos para afugentar o medo do futuro, do que pode vir a ser chamado de normalidade... Na imagem consta a iniciação no norte da África: os pontos obscuros em seu corpo revelados por hábeis mãos e dentre elas as de Roger... Talvez ambos se devam a retribuição por todas aquelas noites fervilhadas de gotas de sangue, gritos e múltiplos orgasmos na fria sujeira do castelo ou no calor dos porões gregos... Ela o olha e supre a fome e quer se alimentar.


- Artur disse para voltarmos. - Pra onde? - Como assim... Para Viena! - Pra quê? - Como...- Debra se levanta com os olhos fixos sobre Roger. Suas estaturas e etnias do norte africano colocam suas semelhanças a mostra nos momentos de maior aproximação. Seu caminhar até ele se torna sugestivo desde o primeiro instante, como todas as vezes que se expõe em conjunto para a exposição de sua vontades há muito liberadas e não estranhas ao companheiro... Se estava se tornando uma época de tantas revoluções, porque não criar um novo uso para essa cabana: sempre um dos símbolos de seus rituais em conjunto, algo que sempre representou a vivência do esquecimento, as tentativas de se manterem em contato com o chamado mundo real... Os olhos de Debra desafiam os de Roger a descobrirem o que estão realmente procurando naquele lugar deserto e calmo, que faz emergir na loucura dos dois as novas e velhas vontades de um sobre o outro: com sendo o verdadeiro esquecimento... São cinco quartos na casa de madeira. Foi sempre evitado o contato físico entre o grupo enquanto permaneciam nesse lugar; se tornar um paradoxo de suas naturezas viscerais. O casal se sente livre para explorar todos os cantos da casa assim como um do outro; uma espécie de despedida e uma espécie de iniciação em um novo tipo de relacionamento. Seus corpos começam a se encontrar nas memórias do sangue correndo e a pulsação se erguendo diante das alterações que se constróem com afirmação: da troca dos primeiros beijos à entrada da casa até a procura das aberturas das roupas de cada um, com sempre a constante recordação condicionada de suas mãos, unhas e dentes em descobrir fontes mais selvagens de abertura; como a forte respiração de poros e pulmões que se abrem e fecham, incham e murcham à medida que a tensão aumenta e as partes cada vez mais expostas de suas peles vão se encontrando; quase em vão tentando evitar de se ferirem, mas ainda se contendo por razões de persistentes consciências do que devem ou não devem fazer um com o outro... O chão cru da sala de estar é que primeiro recebe a queda dos corpos nus. Tropeçados um pelo outro, a pancada da queda começa a influir nas explorações de um pelos prazeres do outro. Debra não se retém às primeiras palavras de dor e prazer, enquanto Roger se ergue dentro de Debra nas primeiras ereções; no mesmo poder dos choques e golpes; girando, sentindo e se contorcendo; na procura. atravessando um os limites do outro: mais, mais e mais... Vibrando, gritando, gemendo e gozando... Não resiste à primeira grande sensação correndo seu corpo como um choque elétrico do raio que o percorre de dentro para fora e a faz dobrar-se em si mesma no formato de uma verdadeira fera: suas unhas penetram a carne do peito de Roger cocomitando com o seu próprio orgasmo, fazendo rasgar-lhe o músculo e pressionando o quadril de Debra em um mesmo tempo que a tudo faz girar-lhe de dor pelo leve, mas doloroso rompimento de vazos nas proximidades dos seus rins; e gritos trazem a ambos a confiança de continuarem; uma fatídica percussão sobre o medo que lhes tira a responsabilidade e os faz comprimir mais ainda seus corpos um contra o outro e aprofundar as penetrações e aspirações, fazendo seus membros funcionarem como os instrumentos para o que suas naturezas realmente os construíram: para a dor perante o prazer, a total perda do significado de ambos os termos na continuação das aberrações de um sobre o outro; “vítimas” um do outro, deixados livres e libertando as suas forças primitivas longes das ameaças e das racionalizações... Roger, ainda em meio ao grito, levanta-se com as pernas de Debra enlaçadas no seu meio, comprimindo a cintura dela com força e colocando com força no encontro de seus troncos, permanecendo dentro dela para o novo encalço. As unhas de Debra encontram as costas livres de Roger e logo se dão os poderosos talhos que


escorrem a vida vermelha por todo lado anterior da abominação que toma forma. Contorcendo-se dos cortes, joga-se contra a parede, batendo com extrema violência as costas, bunda e cabeça de Debra, fazendo-se enterrar com mais agressividade ainda o seu pau na racha dela; permanente, dolorido, ansioso por mais; nos idos dessas suas continuidades... Nos movimentos, nos cortes, nas pancadas, nas mordidas, no esquecimento e na fuga da verdadeira exaustão... Eles agora vão na direção da escada... Talvez nunca parem, nunca acabem, nunca alcancem o que nunca procuraram; no calor e na energia das suas juventudes... Sempre querendo mais.

***

O que primeiro faz a caçada do jornalista passar pelo absurdo de querer entender algo que na verdade de seus interesses vem acontecendo em sua vida desde os primórdios dos desejos da carne... Qual foi realmente a surpresa ao saber que o sofrido senhor Karr havia excursionado na direção sul, indo até a Grécia e lá tendo fechado a conta com o hotel e a agência aqui: quem realmente se importaria com um homem rico que paga tudo adiantado para sumir por quase uma semana com uma mulher desconhecida... Nunca os outros executivos fariam qualquer comentário, pois provavelmente todos eles fizeram o mesmo, só que o pobre Louis foi quem deu de cara com algo que nem ele mesmo esperava no momento em que penetrou (essa é a palavra) nessa aventura de prováveis novos sabores em sua vida: a certa fonte da mudança de comportamento mencionada pela esposa: a culpa por ter seguido o instinto... Mas como ele poderia saber no que acabaria... Curt quase pode sentir o mesmo tipo de prazer que deve ter jorrado pelos seus nervos no momento em que agredia aqueles dois matutos no bar: era o mesmo tipo de prazer que aquelas criaturas pareciam transbordas na tela daquela filmagem: repercutir sobre outro ser a verdadeira sensação de poder; algo que o jornalista também sente ao tornar público o que estava escondido: prejudicando uns, ajudando outros, admitindo vários lados da controvérsia e sempre imaginando a imparcialidade... mas sempre conhecendo a grande mentira que é... Que outra surpresa mais poderia representar que um outro homem bem sucedido, também cliente da mesma agência de turismo, fora encontrado morto de forma bizarra em uma rua qualquer desta mesma cidade: por que a sensação constante de que é algo único; que a beleza e o horror de cada cidade desse mundo se juntam numa eterna procura individual; é provavelmente algo de extraordinário poder, de fácil descrença também, algo de invejável liberdade, mas que se perde na própria falta de restrições... A criação de uma simples vontade de permanecer no anonimato das informações, das impossibilidades, a segurança da ignorância... evitar suicídios, ajudar os necessitados, escolher as razões certas para fazer as coisas e deixar essas abominações num plano Inalcançável, onde provavelmente já estão; revelados em si mesmos, suas verdadeiras naturezas agressivas... Coisas pertencentes ao mundo, para não dizer pertencentes a cada um, como a esse jornalista... - “Acho que vou fazer turismo por aqui...” E o desaparecimento do agente que mais vendia... Manter o eterno quebracabeça e nunca perder o sentido das coisas.


***

AS VÍSCERAS DA SAMAMBAIA

Nas muitas vezes em que na natureza se precisa compor situações extremamente fugazes em seus vultos de vida para em fim permanecer e prosperar na existência, o que de fato acontece é a exposição do máximo alcançado pela criatividade da vida em formar seus seres dentro de todas as possibilidades, e na versão fantástica das informações que são passadas adiante para que no contemplar do seu curto espaço de tempo o ser possa usufruir tudo que lhe é dado: do simples poder de criar, ao simples poder de destruir e por fim o poder de querer entender e enfrentar o real alcance de seus extremos. A mesa do porão úmido do castelo está “posta” com o alimento que realmente preenche a presença dos temerosos seres que agora povoam um ao outro na imensa solidão do castelo... Cenários da história, presenças em suas curvas e em seus limos seculares, mortos e renascidos a cada temporada, a cada proprietário, a cada batalha travada pelo seu domínio; mantidos pelo seu último e orgulhoso dono; com seus usos de tão adversa e bizarra vontade que ainda percorre as manchas verde escuro, o rubro coagulado de muito e muito tempo, muitos e muitos “hóspedes”, que deixaram aqui suas marcas, seus pedaços e os ecos de seus gritos anônimos e abomináveis: fontes desse consumo... Os braços e pernas estão atados como no eterno próprio desígnio: Artur sente os choques e arrepios provocados pela umidade e o frio; os leves arranhões das farpas penetrando sua pele nua contra a mesa; as terríveis e doces agulhadas em partes do corpo que a sua perpetradora sabe e conhece muito bem como explorar, trazendo as contrações e as dilatações necessárias para sua confrontação com o desconhecido feminino que fartamente se apodera do seu corpo, absorvendo partes por partes e penetrando todos os caminhos que a perniciosidade humana nunca admite percorrer: são aberrações de cores vibrantes expostas na palidez do voluptuoso corpo de Andrea; as verdadeiras vísceras das almas humanas, nos seus principais limites com a dor, com o prazer e com a morte... Ambos se deleitam e se consomem com seus tamanhos e suas profundidades: novidades reencontradas pela sombra da partida... Os socos da verdadeira tristeza e raiva do desconhecido, as mordidas ferozes que alimentam seus espíritos famintos pelo alimento nunca alcançado, os toques, os cortes, os hematomas, as lágrimas e o sangue do auto-consumo; da real vontade desses dois em quererem entrar um no outro, tornando os símbolos da criação e da destruição em um só ícone dessa negada e amaldiçoada despedida... É a desintegração de um presente fugaz, explorado ao máximo para a procura e o alcance de um distante futuro... A tortura da passagem nos familiares gritos e gemidos ressonantes neste cenário, as verdadeiras perdas de um tempo “criminoso” e absurdo, à borda do mundo real, presente em cinco mundos inexistentes, explosivos, alcançados os seus limites, transformados no que quer


que venham a ser: impuros, ferozes, conhecedores das diversas nuances da natureza humana e eternos fugitivos do melhor período de suas vidas...

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O amanhecer de final de verão do centro europeu. Nuvens azuladas que logo se dissiparão dando lugar ao glorioso firmamento azul... A frente do castelo escolta a despedida de um casal insômnio, que alinha-se no contorno de suas chagas passadas e recentes para finalmente atentarem ao rumo que terão de tomar... - Organize tudo no escritório... Vou ficar uns dias aqui. - E os dois? -...Se já não o fizeram... Diga-os para voltarem para o Egito... A sede de lá sempre foi responsabilidade deles mesmo... - Vejo um lamento a mais... Talvez ela deva saber a verdade!... O olhar de Artur se volta levemente ao céu. Voltando lentamente ao rosto de Andrea... Suspirando. - Criaturas como nós não precisam de pais... Crescemos sozinhos, viscerais e incestuosos por natureza. - Nunca pareceu incesto pra mim... Você sempre adorou...- Ele dá um leve sorriso ofegante. - Por isso era natural... Que melhor criação ela poderia ter...: cheia de restrições?!... Debra é feliz sendo como é... ou melhor... o que é. -...Concordo...- “Mas talvez outras escolhas devam nos rebater agora, Artur... Na sua busca pelo resgate de sua prole, seu erros e transformações ao querer trazer todos para o seu mundo; nem todos se adaptaram e a continuidade de conclusões providas pela sorte me fazem somente refletir as perdas: aquela na profundidade esquecida de minha lembrança: um real sobrevivente da sociedade que soube escolher exatamente o que queria... Eu escolho ter esse filho e criá-lo longe de você, como assim sei que vai desejar, mas também nunca fazendo-o confrontar-se com o mesmo “horror” que você fez todos os outros confrontarem... Pois também ele merecerá uma escolha.” -Descanse... Eu cuido de tudo em Viena.- Verdadeiras aberrações que se separam e se afastam... Um homem e uma mulher que erguem suas solidões como armas para o futuro; marcada vibração dos seus sonhos reais com o esquecimento de seu passados, suas vidas... “Sempre admirei o sacrifício!”

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A samambaia para se reproduzir lança diversos esporos no ambiente. Os esporos em terreno apropriado se desenvolvem numa forma de vida intermediária com um


período extremamente curto de existência, e nesse pequeno período o ser se consome velozmente em si mesmo para poder se desenvolver até o ponto em que terá de se cruzar com um ser semelhante: é dessa união e da fatal eliminação do ser intermediário que se desenvolve a planta como é conhecida: exuberante e viva, mas que depende infinitamente da fugacidade do seu outro ser inerente para crescer e permanecer. FIM


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