Regularização fundiária e a organização da sociedade

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VI Congresso Brasileiro de Direito Urbanístico - “Por um direito urbanístico sem fronteiras”

TEMA: 8 – A proteção do direito à cidade, a ordem urbanística e a sua judiciabilidade.

REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E A ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE: um caso de sucesso na região sudeste Silvio Roberto Bueno Cabral de Medeiros Filho 1

Daniela Lacerda Cabral 2 Marco Aurélio de Lima e Myrrha 3

SUMÁRIO 1.

INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................. 2

2.

O INSTITUTO IDDUS ................................................................................................................................. 3

3.

PROGRAMA LEGÍTIMO DONO ............................................................................................................... 3

4.

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................................ 5

5.

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................................... 6

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Advogado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, especialista em Direito Civil pela Universidade Mackenzie, pós-graduando em Direito Urbanístico pela PUC-MINAS, coordenador jurídico do Programa Legítimo Dono. 2 Advogada pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, especialista em Direito Imobiliário, atua como gerente geral do departamento jurídico do Programa Legítimo Dono. 3 Engenheiro agrícola pela Universidade Federal de Viçosa, administrador de empresas pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, mestre em planejamento e desenvolvimento sustentável pela Universidade Estadual de Campinas, coordenador administrativo do Instituto IDDUS.


1. Introdução O Brasil possui cerca de 12 milhões de imóveis irregulares segundo o Ministério das Cidades, grande parte deles pertencentes às famílias de baixa renda. Sem documentação legal de propriedade essas famílias limitam o valor do seu patrimônio e perdem capacidade de inserção na economia formal. A Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) e a Lei 11977/2009 (Minha Casa, Minha Vida), potencializam a regularização jurídica ou administrativa da maior parte dos 13 milhões de imóveis. No entanto, as iniciativas para viabilizar as regularizações são, na quase totalidade, dos governos municipais e ainda não fazem frente ao enorme desafio. A partir do entendimento dessa realidade e do aprendizado adquirido em implantações práticas em algumas localidades, o Instituto IDDUS desenvolveu um modelo de negócios inovador, capaz de contribuir para a resolução do problema social com baixa intervenção de governos e de gerar um negócio sustentável. O Instituto IDDUS atua diretamente com a população interessada. O trabalho se inicia com o diagnóstico da situação dos imóveis, identificação e capacitação das lideranças, realização de encontros de esclarecimento com a comunidade e realização de contratos com as famílias. Os contratos são elaborados adotando conceitos do crédito solidário para grupos de famílias, ou seja, não é preciso hipoteca nem fiador. O Instituto disponibiliza assistentes sociais para orientar as famílias sobre a documentação necessária para o ingresso das ações judiciais ou administrativas. O Instituto IDDUS possui equipe multidisciplinar nas áreas de assistência social, urbanismo, jurídica e administrativa. Dessa forma, desenvolve todas as atividades necessárias para a conclusão dos processos judiciais ou administrativos. A assistência ao cliente vai desde o primeiro contato na comunidade até o acompanhamento das famílias para a obtenção das matrículas nos Cartórios de Registro de Imóveis. O Instituto está presente hoje em diversos municípios em São Paulo e Minas Gerais. A ampliação das atividades do Instituto se dá através de contatos espontâneos das famílias que apresentam outras áreas às vezes em municípios diferentes. Palavras-chave: Regularização Fundiária, Organização Comunitária.

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2. O Instituto Iddus O Instituto IDDUS é uma organização não governamental fundada há três anos e que está em vias de obtenção do status de OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público). O interesse nesse campo de atuação remonta a 2004 quando, por iniciativa de um dos integrantes da iniciativa, começou atividades de regularização fundiária para famílias de baixa renda em Cotia/SP, através de escritório de advocacia. Após quatro anos de experiências acumuladas nesse mercado, constatou-se que:  Praticamente todos os municípios brasileiros possuíam o problema em menor ou maior intensidade;  O predomínio de imóveis com algum tipo de irregularidade fundiária era de famílias de baixa e média renda;  Essa não era uma questão a ser resolvida por escritórios jurídicos, mas por entidades que possam atender as famílias em larga escala adotando conceitos de empreendimentos sociais e envolvendo profissionais de diferentes áreas, tais como assistentes sociais, urbanistas e agrimensores;  Que os governos federal, estaduais e municipais, apesar de vivamente interessados em equacionar essa questão, não conseguiam atender às necessidades, uma vez que a demanda acumulada é imensa. Atualmente o escritório do Instituto IDDUS funciona no bairro Granja Viana, em Cotia/SP. Possui carteira de 1.200 clientes de famílias de baixa renda. Destes, 550 são pagantes. Os demais são atendidos principalmente com o apoio do Governo Federal.

3. Programa Legítimo Dono O Programa Legítimo Dono é iniciativa do Instituto IDDUS para atender as demandas de regularização fundiária em áreas públicas e privadas, abordando aspectos físicos, jurídicos e sociais dos assentamentos e da comunidade residente. Esse enfoque integrado permite o conhecimento da comunidade, identificando prioridades a serem atendidas e reforçando a interlocução das instituições envolvidas. O Programa Legítimo Dono é importante instrumento para a construção de cidadania e permite articular e catalisar intervenções locais de interesse comunitário. A base jurídica adotada é a defesa dos direitos subjetivos dos cidadãos e a destinação da função social da propriedade prevista no art. 5º da Constituição Federal, que traz o rol, dos direitos e garantias fundamentais do cidadão dentre eles o inciso XXII que reza ser garantido o direito de propriedade, bem como o inciso XXIII rezando por sua vez que a propriedade atenderá a sua função social. A participação social ocorre durante todo o processo de regularização fundiária, iniciando-se com a mobilização e informação da comunidade e culminando com as ações estruturantes. 3


Na maioria dos casos o Instituto IDDUS atua diretamente com as famílias sem recursos públicos. Mas também está preparado para apoiar iniciativas públicas que demandem esforços do Instituto. O trabalho se inicia com o diagnóstico da situação dos imóveis, identificação e capacitação das lideranças, realização de encontros de esclarecimento com a comunidade e realização de contratos com as famílias. O Instituto IDDUS disponibiliza assistentes sociais para orientar as famílias sobre a documentação necessária para o ingresso das ações judiciais ou administrativas. Os contratos são elaborados adotando conceitos do crédito solidário para grupos de famílias, ou seja, não é preciso hipoteca nem fiador. A mensalidade varia entre R$50,00 a R$65,00, durante 60 meses. Caso a família opte pelo contrato solidário, pagará o menor valor. Caso decida pelo contrato individual, o valor será o mais alto. A justificativa já avaliada na prática é que os contratos solidários possuem baixíssima inadimplência. Da atual amostra de clientes pagantes do Instituto IDDUS, aproximadamente 95% possuem imóveis em terrenos de até 250 m2, o que possibilita o uso do usucapião constitucional, previsto tanto na Constituição Federal em seu artigo 183, quanto no Código Civil em seu artigo 1240, ambos com a mesma redação em áreas privadas. Em áreas públicas conforme mencionado anteriormente também atuamos através da utilização do artigo 1º da Medida Provisória nº 2.220 de 04 de dezembro de 2001, a chamada CUEM (Concessão de Uso Especial para Fins de Moradia). Dentro deste quadro também ressaltamos que 95% dos clientes são de baixa renda e o Instituto IDDUS pleiteia em nome dos mesmos a concessão do benefício da justiça gratuita à luz da lei 1060/50. Não menos importante atuamos também dentro das outras formas previstas em lei que apresentam instrumentos capazes à realizar a regularização fundiária, tais quais as outras especialidades de usucapião, previstas nos artigos 1238 e 1242 do Código Civil, que se traduz na usucapião extraordinário e na usucapião ordinário. As atividades iniciam-se com a identificação da região potencial para realização dos trabalhos, através do contato político. Paralelamente é realizada pesquisa junto ao Cartório de Registro de Imóveis para se obter radiografia do problema fundiário local e identificar a viabilidade da implementação das ações. As principais lideranças comunitárias são identificadas, informadas e capacitadas sobre os trabalhos de regularização fundiária. Para facilitar o contato e manter uma vinculação direta com a comunidade, são estruturados comitês pró-regularização, constituídos pelas lideranças locais. O contato com as famílias a serem beneficiadas se dá aproximadamente duas semanas após a estruturação dos comitês pró-regularização, que se incubem de distribuir panfletos convidando para as reuniões agendadas preferencialmente em locais públicos de fácil acesso à comunidade ou centros religiosos. 4


Após essas atividades, são realizadas palestras onde são esclarecidos todos os aspectos e pontos de dúvidas da comunidade. Sequencialmente são agendados encontros de fechamento de contratos e recolhimento de documento das famílias. O Instituto IDDUS envia equipe de arquitetura e topografia geralmente após dois meses do início das atividades. A equipe realiza o estudo e prepara plantas e respectivos memoriais descritivos, de acordo com as necessidades estabelecidas tanto pelos Cartórios de Registros de Imóveis como pelas Normas da Corregedoria Geral de Justiça do estado de São Paulo, para as atuações deste estado, previstas em seus artigos 47 e 48 do Capítulo XX. Esses documentos embasarão as ações jurídicas ou administrativas. Os profissionais do Instituto IDDUS visitam periodicamente as localidades para apresentação do andamento dos trabalhos. As visitas são sempre precedidas por contatos com os componentes do comitê pró-regularização. No mercado privado existem poucas empresas no país que desenvolvem trabalho integrando diferentes profissionais em busca da solução para os problemas fundiários. É muito comum que as comunidades contratem serviços jurídicos de advogados que, na maioria das vezes, não dispõem de estrutura complementar de assistência social e de projetos arquitetônicos e urbanísticos. Boa parte das organizações mais estruturadas que atuam nesse mercado atendem o poder público, que as contrata para realização de ações pontuais em alguns assentamentos elencados como prioridade, na maior parte das vezes tratando-se de áreas públicas. Alguns desses contratos são realizados com recursos financeiros do Ministério das Cidades como parte de um “pacote” que inclui obras de urbanização, na chamada regularização fundiária sustentável.

4. Considerações Finais Os problemas urbanísticos e fundiários são comuns em praticamente todos os municípios brasileiros. Por outro lado, importantes iniciativas do executivo federal, de alguns governos estaduais e municipais, amparados pelas novas legislações vigentes, tais como o Programa Minha Casa, Minha Vida, buscam reduzir o processo de crescimento desordenado das cidades e apoiar famílias de baixa renda que historicamente têm sido as grandes prejudicadas. Apesar desses esforços, o poder público ainda não conseguiu atender a maior parte das áreas com os referidos problemas. Sendo assim, é preciso buscar novas formas de apoiar essa população, de modo a que possa reivindicar seus diretos de cidadãos. Uma importante alternativa é o esforço para que as comunidades que possuem problemas fundiários possam buscar soluções legais sem a participação direta do poder público. 5


5. Bibliografia Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001. Estatuto da Cidade. Lei Federal nº 6.766/79, alterada pela Lei nº 9.785/99, dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano.

Constituição Federal – Artigos 182/183 Código Civil – Artigos 1238 a 1244 Lei Federal nº 11.977/2009. Minha Casa, Minha Vida

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