A AUTORIDADE DA IGREJA DEVIDAMENTE CONSTITUÍDA Diego Silva e Thiago Helker Os adventistas do sétimo dia acreditam que sua igreja foi organizada em razão do cumprimento de profecias (Apocalipse 10, 12 e 14). Logo, ela possui as credenciais da autoridade divina. Mas, com o passar dos anos e o crescimento da instituição ao redor do mundo, ideias divergentes surgiram no seio da igreja. Muitos não conseguiram lidar com essa diversidade, gerando acusações de desvio da verdade, por parte de uns, e de sectarismo, por parte de outros. Se todos concordam que a Igreja Adventista do Sétimo Dia é a igreja da profecia bíblica, como proceder diante de divergências administrativas e de interpretação bíblica? Paulo e Barnabé também tiveram dificuldades de harmonizar suas ideias. Barnabé estava convicto de que a dupla deveria levar João Marcos em sua próxima viagem missionária, enquanto Paulo era irredutível, argumentando que isso traria prejuízo à causa. Cada um defendia seu ponto de vista com bons argumentos bíblicos. Barnabé poderia apontar para a misericórdia Deus. Paulo, por sua vez, poderia citar as palavras de Jesus: “Ninguém, que lança mão do arado e olha para trás, é apto para o reino de Deus” (Lucas 9:62). Nenhum dos dois cedeu. O resultado foi “que se apartaram um do outro” (Atos 15:39). O lado bom dessa história é que Barnabé e Paulo não desistiram do trabalho, mas continuaram evangelizando regiões onde não havia presença cristã. E o Novo Testamento não registra qualquer evidência de que um tentou minar a influência do outro. Então, se prosseguiram pregando, por que também não continuaram trabalhando juntos? A razão é que nenhum dos dois queria se submeter um ao outro. A experiência de Paulo e Barnabé ilustra que, num mundo de pecado, para que haja harmonia, todas as relações humanas exigem submissão por parte de alguém. Não há como escapar dessa realidade. Imagine um casamento onde duas pessoas não estejam dispostas a se submeterem uma a outra. O que acontecerá? Ellen White fez uma declaração reveladora nesse sentido: Na criação Deus a fizera [Eva] igual a Adão. Se houvessem eles permanecido obedientes a Deus – em harmonia com Sua grande lei de amor – sempre estariam em harmonia um com o outro; mas o pecado trouxera a discórdia, e agora poderia manter-se a sua união e conservar-se a harmonia unicamente pela submissão por parte de um ou de outro.— Patriarcas e Profetas, p. 58. Ou seja, após a queda, Deus estabeleceu uma hierarquia no casamento, pois essa seria a única maneira de preservar a união entre duas pessoas. Então, se a submissão é vital no casamento, por que dizer que a hierarquia não é importante no contexto eclesiástico? Pelo contrário, dada a diversidade cultural, étnica, educacional, psicológica e financeira no contexto da igreja, a hierarquia é um elemento fundamental para unir todas as classes no propósito de cumprir a missão dada por Jesus. Quão bom seria que na igreja todos os membros seguissem o conselho de Paulo: “Sujeitando-vos uns aos outros no temor de Deus” (Éfesios 5:21). Mas, visto que isso nem sempre ocorre, Deus estabeleceu entre o seu povo, desde o antigo Israel até à igreja cristã – inclusive na Igreja Adventista do Sétimo Dia – algo que nós chamamos de ordem eclesiástica. Notem a orientação de Paulo: “Obedecei a vossos pastores, e sujeitai-vos a eles...” (Hebreus 13:17). Jesus também ensinou isso, quando falou aos discípulos: “Na cadeira de Moisés, se assentaram os escribas e os fariseus. Fazei e guardai, pois, tudo quanto eles vos disserem (...)” (Mateus 23:2,3 - ARA)
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É verdade que Ellen White muitas vezes advertiu contra o “espírito de domínio” entre líderes que se acham “investido[s] de autoridade para fazer de sua vontade o poder dominante” (Testemunhos para Ministros p. 362). No entanto, é importante considerar que esse espírito dominante não é um problema dos líderes da igreja, mas, sim, um defeito da natureza humana. Qualquer pessoa que não esteja inteiramente entregue a Jesus demonstrará uma administração que não se harmoniza com os princípios revelados na liderança de Cristo. Além do mais, Ellen White fez uma separação entre os perigos de uma “autoridade suprema” na igreja, quando o juízo de uma só pessoa, ou de um pequeno grupo de pessoas predomina, e a autoridade da igreja devidamente constituída, quando “responsabilidades são divididas entre grande número de homens competentes” (Testemunhos para a Igreja, vol. 8, p. 236). Divergências administrativas existirão entre os adventistas, bem como diferenças de intepretação das Escrituras. Alguns têm dificuldades de ceder aos seus irmãos, achando que sempre estão corretos, e que seria condescendência com o erro, ou mesmo apostasia, submeterem-se num certo ponto enquanto consideram errada a conclusão alheia. Essa é uma característica da natureza humana. É justamente por isso que Deus estabeleceu a ordem evangélica. Os que são inclinados a rejeitarem toda e qualquer tipo de autoridade, seriam justamente os mais arbitrários se estivessem em posição de liderança. Ellen White advertiu: Os que são inclinados a considerar como supremo seu critério individual, acham-se em grave perigo.—Atos dos Apóstolos, p. 164 Precisamos da inteligência de espíritos diversos, mas não devemos criticá-los se suas ideias não se adaptarem exatamente às nossas. —Testemunhos, v. 5, p. 581. Ellen White aconselhou contra o pensamento de que “suas próprias interpretações das Escrituras são sempre corretas” (Testemunhos para Ministros, p. 76). As palavras dela a Stephen Haskell são pertinentes para ilustrar os perigos: Se Deus achar por bem que Seu povo se abstenha da carne de porco, Ele os convencerá a respeito. Ele está tão disposto a mostrar o dever a Seus filhos sinceros, como também a indivíduos sobre quem o Senhor não confiou as responsabilidades de Sua obra. Se for dever da igreja abster-se da carne de porco, Deus o revelará a mais do que duas ou três pessoas. Ele ensinará à igreja o seu dever. Deus está guiando Seu povo, não uns poucos e separados indivíduos aqui e acolá, um crendo de uma forma e outro diversamente.— Testemunhos para a Igreja, vol. 1, págs. 206, 207 O interessante neste caso é que Haskell estava teologicamente correto. O seu problema era o espírito independente que o estava conduzindo. Poucos compreendem o quanto Ellen White valorizou a autoridade da igreja, mesmo admitindo a realidade de que líderes têm suas faltas e podem errar em suas decisões. Ela escreveu: Muitos há que não avaliam a santidade da relação da igreja, e são contrários a submeter-se à disciplina e restrição. A direção que seguem mostra que exaltam o próprio juízo acima do da igreja unida; e não cuidam de guardar-se para que não estimulem um espírito de oposição à voz da mesma. Os que ocupam posição de responsabilidade na igreja podem ter faltas semelhantes às de outras pessoas, e podem errar em suas decisões; não obstante, a igreja de Cristo na Terra investiu-os de uma autoridade que não pode ser levemente estimada.— Testemunhos para a Igreja, vol. 4, p. 17.
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Se a Igreja Adventista ainda é a “menina dos olhos de Deus”, como devemos nos relacionar com sua organização? Qual deve ser nossa postura em relação à Associação Geral, por exemplo, quando a direção por ela apontada não está em harmonia com nossas ideias? Escrevendo a um pastor que discordava das decisões da Associação Geral sob a justificativa de que Deve obedecer a Deus, e não aos homens, Ellen White escreveu: “Foi-me mostrado que o julgamento de nenhum homem devia render-se ao julgamento de outro. Mas quando o julgamento da Associação Geral, que é a mais elevada autoridade que Deus tem sobre a Terra, é exercido, independência e julgamento particulares não devem ser mantidos, mas renunciados. Seu erro foi em manter persistentemente o julgamento individual de seu dever contra a voz da mais alta autoridade que o Senhor tem sobre a Terra. Depois de ter-se demorado, e depois da obra ter sido bastante prejudicada por sua demora, você veio a Battle Creek em resposta aos chamados repetidos e urgentes da Associação Geral. Você manteve firmemente que tinha feito bem em seguir a própria convicção do dever. Considerou uma virtude sua manter persistentemente sua posição de independência. Você não parecia ter percepção verdadeira do poder que Deus tinha dado à Sua igreja na voz da Associação Geral. Pensou que, ao responder ao chamado que a Associação Geral lhe fizera, estava se submetendo ao julgamento e à mente de um homem. Por conseguinte, manifestou independência, um espírito inflexível e voluntarioso, que era inteiramente errado. Testemunhos, v. 3. p. 492. É provável que erros sejam cometidos por administradores, teólogos ou pastores nos diferentes ramos da Igreja ao redor do mundo. Porém, tais falhas decorrem da natureza humana caída, contra a qual todos, líderes e membros, precisam lutar incessantemente. Ademais, erros de procedimento e diferenças na interpretação de estilo de vida não nos dão o direito de menosprezar a autoridade da igreja, pois, nas palavras de Ellen White, “passando por alto a autoridade da igreja, demonstram menosprezo por Deus, que deu à igreja sua autoridade” (Atos dos Apóstolos, p. 306). Portanto, é preciso ter cuidado para não confundirmos a individualidade pessoal e a liberdade de consciência com a insubordinação à mais elevada autoridade que Deus tem sobre a face da Terra.
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