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BOA NOITE, BATMAN!

O sensacionalismo que esvazia sentidos e não se aprofunda no real sentido dos acontecimentos

Mulher é assassinada a sangue frio pelo companheiro, criança é estuprada pelos pais, assaltante é amarrado a poste. Você, assim como eu, já deve ter ouvido e lido esse tipo de matéria mais de um milhão de vezes, esse que tão comumente é chamado de jornalismo, é apenas uma das várias formas de vender, futilidades e medo.

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Como pessoa, posso dizer que, infelizmente, sou uma das diversas consumidoras desse produto e, que de certa forma, ser plateia de um problema que não é seu pode até ser divertido; até porque, pimenta nos olhos dos outros é refresco, certo? Mas como profissional do jornalismo, posso afirmar que há uma diferença enorme entre notícias e publicidade do caos.

Um dos casos que podem ser citados como de maior repercussão do jornalismo sensacionalista, foi um apresentador de determinada rede de televisão, informar a mãe de uma mulher desaparecida que a filha teria sido encontrada morta, informação essa, passada ao vivo e sem nenhum tipo de filtro para preservar não só a vítima mas seus familiares, que inocentemente pedem a ajuda de meios de comunicação para auxílio de seus pesares.

No filme “Tropa de Elite”, jornais como estes são retratados de uma forma em que mostram como a disseminação do medo pode ser muito bem utilizada a bel-prazer por aqueles que querem entrar na cabeça das massas. Trazendo essa pauta para a não ficção, candidatos que defendem o extermínio de bandidos (pretos e pobres) são cada dia mais vistas nas assembleias e bancadas governamentais. O medo e o ódio contra minorias são inseridos na cabeça de cada um dos telespectadores como sendo normal e corriqueiro.

E a questão que realmente fica é: bandido bom é bandido morto, mas isso vale apenas para o pobre que rouba para comer, e o preto que estava correndo para alcançar o ônibus e tomou 6 tiros de aviso nas costas, ou também vale para o empresário que sonega impostos ou o presidente que além de recusar medicamentos para toda uma nação em meio a uma pandemia, tenta superfaturar cada uma das doses da vacina enquanto milhares de pessoas sufocam por falta de oxigênio em macas estacionadas nos corredores de hospitais completamente abandonados pela gestão pública?

Mais uma das questões levantadas dentro do contexto do jornalismo sensacionalista é a forma com que os envolvidos nos casos são tratados, dentro de uma redação, por mais que estejamos próximos a pessoas de escolaridade igual ou parecido com o nosso, vez ou outra é possível escutar comentários vindo daqueles que mais deveriam preservar as vítimas, críticas e acusações são ridiculamente expostas, e que sinceramente não mudam em absolutamente nada na resolução ou na transcrição do fato.

O último caso que acompanhei e que posso usar de exemplo, foi o assassinato de uma menor de idade em uma cidade metropolitana daqui de Belo Horizonte. O caso em questão aconteceu durante um baile funk em uma comunidade, a menina foi jogada dentro de um carro, sequestrada, abusada, torturada e morta por aqueles que diziam ser seus amigos. Um dos profissionais citou com bastante imparcialidade e julgamento, algumas das postagens feitas pela menor em suas redes sociais, e disse em tom de julgamento, que devido a esta pequena parte exposta da vida da vítima, isso já era previsível.

Acredito, que como pessoa física, o julgamento e o preconceito já estão enraizados em nós, mas que como seres humanos pensantes, a evolução e a censura de nossos próprios pensamentos, ou pelo menos de nossas palavras, deveria ser considerada sempre, ainda mais, quando a profissão que escolhemos é aquela de trazer a verdade independente de concordarmos com ela ou não. Independente da história pregressa da menina, das suas postagens em redes sociais ou do envolvimento dela com este ou aquele, a vítima de todo o ocorrido, foi ela, juntamente àqueles que a amavam e que sempre sentirão sua falta.

Particularmente, acho que a violência desde quando o mundo se tornou mundo, faz parte do ser humano assim como respirar, comer e dormir; por outro lado, penso que a disseminação deliberada de sangue sem nenhum tipo de real informação ou estudo sobre os acontecidos, não passa de barbárie e degustação do sofrimento alheio.

Como dito no começo deste texto, o jornalismo sensacionalista não é feito para informar, e sim divertir (entenda que divertir não é somente rir e passar um bom tempo), de nada mudará sua vida saber que um animal foi abandonado e atropelado diversas vezes na estrada que passa do outro lado do mundo, ou que fulana de tal foi assassinada pelo marido após uma noite de bebedeira.

O jornalismo, o real jornalismo, foi desenhado, criado e esculpido para o progresso, trazer notícias realmente relevantes que façam aqueles que o consomem pensar sobre, a partir do momento em que transformamos nossos meios de comunicação em repetição de ideias que de maneira alguma trarão um bem maior ao mundo em que vivemos, ou aos seres vivos que aqui ocupam, transformamos aquilo em que deveríamos confiar em manipulação e lavagem cerebral para os ignorantes que se sentam em frente aos seus televisores no final de cada dia acreditando estarem bem informados.

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