Revista In Guardia.4ª Edição.01/02/2012

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Ano I, nº 04, Fevereiro 2012 Revista Bimestral Edição: Emanuel de Oliveira Costa Jr. Diagramação Renan da Silva Cunha Revisora Silvia Elisabeth Design e Logos: Ellen Jordana Portilho Mendes Colaboradores Colunistas dessa Edição: Bruno de Castro Evelyn Mayer de Alemeida Ives Gandra Márcio Antônio Campos Pe. Inácio José do Vale Pedro Brasilino Rafael Brodbeck Rafael de Mesquita Diehl Lizandra Danielle Kairo Neves Lenise Garcia Prof Ivanaldo Carlos Ramalhete Igson Mendes da Silva Karen Mortean Contato:

revistainguardia@gmail.com

Sessão Carta do Leitor Cartas para a sessão carta do leitor poderão ser enviadas para o blof como comentário em www.binguardia. blogspot.com ou ao e-mail de contato da revista: revistainguardia@gmail.com. Página no Facebook https://www.facebook.com/InGuardia Os artigos dessa revista poderão ser reproduzidos desde que se indicada a fonte. O conteúdo das matérias assinadas é da responsabilidade dos respectivos autores. Essa revista tem o cunho essencialmente católico apostólico romano, não devendo ser entendido sob outro prisma ou filosofia. 02 - In Guardia - fevereiro de 2012

Sumário Nossa Capa - 03 São Brás Nossa Equipe - 04 Editorial - 06 Pense como os Santos - 07 Religião e Política com Bruno de Castro - 08 Os limites da relação Igreja e Estado e o papel do leigo na política A Homilia do Papa - 09 Mensagem de Bento XVI por ocasião do XLV Dia Mundial da Paz Lei da Palmada com Evelyn Mayer de Alemeida - 13 Um tapinha não dói Copa do mundo com Ives Gandra - 14 Copa do Mundo e dinheiro público Tubo de ensaio com Márcio Antônio - 15 Cardeal Newman defendendo a paz entre ciência e fé no século 19 Apologética da Fé com Pe. Inácio José do Vale - 17 A traição de Cristo Juventude e Igreja com Pedro Brasilino - 20 Juventude, uma prioridade da Igreja Cívitas com Rafael Brodbeck - 22 Modernidade e senso do ridículo A Homilia de Pedro - 23 Mensagem de SS Paulo VI ao XI Dia Mundial da Paz Arte cristã com Rafael de Mesquita Diehl - 26 Os reis magos na Iconografia Cristã Mariologia com Lizandra Danielle - 28 A Virgem de Guadalupe Sagrada Liturgia com Kairo Neves - 31 As estações Romanas Brasil sem aborto com Lenise Garcia - 35 O dom do filho Vida sim, aborto não com Prof Ivanaldo - 37 Carta de São Carlos O catecismo com Carlos Ramalhete - 39 O Catecismo da Igreja Católica Fé e Verdade com Igson Mendes da Silva - 41 Regras para conhecer a fé verdadeira Sexualidade e Santidade com Karen Mortean - 42 O vício da pornografia Penitência e reconciliação com Ian Farias - 44 A reconciliação com Deus como necessária para o relacionamento fraterno


Nossa Capa

São Brás

Nessa edição nossa capa traz a imagem de São Brás, santo famoso e conhecido, especialmente em alguns lugares do Brasil onde temos a tradição de chamar o santo quanto alguém tosse. São Brás é conhecido também como: S.Blasius em Latim, em Catalão S. Blai, em Francês S. Blaise, em Espanhol S. Blas. São Brás nasceu na cidade de Sebaste, na atual Armênia, por volta do final do séc.III no seio de uma família pomposa, de pais nobres Se tornou médico e depois disso sentiu o chamado de Deus a uma consagração cristã. Deixou a medicina e todo o status que essa profissão trazia. Deixou a sua própria terra indo para os montes, optando por uma modesta vida solitária de oração e de penitência. Ainda em vida a sua fama de santo começou a se espalhar na comunidade de Sebaste e, quando morreu o bispo daquela cidade, todos o aclamaram como novo pastor. Sim, naquela época isso era possível, aclamação dos católicos leigos de um homem batizado como Bispo. São Brás só aceitou a nova responsabilidade pela forte insistência dos membros da comunidade, porque desejava muito mais a vida retirada de oração e contemplação. Mesmo como bispo continuava a viver numa caverna no Monte Argeu, no meio de animais ferozes, com quem convivia, vindo somente à cidade apenas quando as obrigações de pastor o exigiam. Sua vida se passou em uma época difícil de muita perseguição aos cristãos. Nesse caso a perseguição estava ordenada pelo então Imperador Licinius Lacinianus (308-324). São Brás, conhecido pela sua extrema bondade, santidade e milagres, é preso pelo anticristão Agrícola, que governava a Capadócia e a Armênia, e obrigado a adorar os deuses pagãos. Negou-se São Brás, dizendo: “não quero ser amigo dos vossos deuses, porque não quero arder eternamente com os demônios”. Foi açoitado, posto no ecúleo, um espécie de cavalete de tortura, submetido aos “garfos” com puas de ferro e lançado a um lago de água gelada, sendo, por fim, degolado. Decorria o ano de 316. O corpo, recolhido pelos cristãos, teria sido colocado numa pequena igreja em Sebaste. Mais tarde, as suas relíquias foram trasladadas para a atual basílica, cuja localização recebeu o nome de Monte São Brás. Ao longo do tempo, são testemunhados muitos gestos e milagres em favor dos mais pobres e enfermos. Um dia, sem qualquer instrumento, retirou da garganta de um menino uma espinha de peixe, salvando-lhe, assim, a vida. Por este fato, S. Brás é conhecido como protetor contra as doenças da garganta. Até ao século XI São Brás não tinha entrado no calendário litúrgico romano. A partir daí, começa a ter lugar nele pela grande devoção que passou a ser-lhe dedicada em Roma, onde lhe erigiram nada menos que trinta e cinco igrejas. Durante o seu cativeiro, na escuridão do calabouço, obteve de presente de algum de seus amigos um par de velas, com as quais recebia luz e calor. Por isso, na representação iconográfica, o santo aparece portando duas candelas. A tradição da “Bênção de São Brás”, ou “Bênção das gargantas”, que se faz cruzando duas velas sobre as gargantas, se atribui a um milagre que o santo fez em vida, quando curou

uma criança que morria engasgada com um osso na garganta, como já descrito acima. São Brás figura, ainda, entre os catorze santos auxiliadores, e as suas relíquias estão em Brusswick, Mainz, Lubeck, Trier e Cologne na Alemanha. Em França estão em Paray-le-Monial, em Dubrovnik na antiga Iugoslávia, Roma, Taranto e Milão em Itália. Sua festa se dá no dia 03 de fevereiro quando várias igrejas fazem a bênção da garganta cruzando as velas abençoadas na garganta e falando a bênção que deve ser feita por um ministro ordenado.

Oração de São Brás

Ó glorioso São Brás, que restituístes com uma breve oração a perfeita saúde a um menino que, por uma espinha de peixe atravessada na garganta, estava prestes a expirar, obtende para nós todos a graça de experimentarmos a eficácia do vosso patrocínio em todos os males da garganta. Conservai a nossa garganta sã e perfeita para que possamos falar corretamente e assim proclamar e cantar os louvores de Deus. Amém A bênção de São Brás: Por intercessão de São Brás, Bispo e Mártir, livre-te Deus do mal da garganta e de qualquer outra doença. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém

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Nossa Equipe

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Emanuel de Oliveira Costa Jr. - Editor Católico, casado, coordenador do Grupo de Coroinhas e Acólitos da Paróquia do Imaculado Coração de Maria em Goiânia/GO, advogado militante, professor, autor de artigos científicos publicados em revistas impressas e virtuais. Mantém o Blog do Emanuel Jr: www.blogdoemanueljr.blogspot.com Twitter: http://twitter. com/emanuelocjr Facebook: Emanuel Jr.

Rafael Vitola Brodbeck - Colunista Católico, casado, é Delegado de Polícia em Sta Vitória do Palmar, RS, coordena o site “Salvem a Liturgia”. Colunista da “Catequese Litúrgica”, na revista mensal “O Mensageiro de Santo Antônio”, dos Frades Menores Conventuais, membro da Sociedade Internacional Santo Tomás de Aquino (SITA/ Roma), e da Academia Marial de Aparecida. É incorporado ao Regnum Christi (1998). Palestrante de Liturgia e doutrina. rafael@salvemaliturgia.com Twitter: http://twitter. com/rafael_brodbeck Márcio Antônio Campos - Colunista Católico, formado em Jornalismo pela USP e passou pelo Curso Estado de Jornalismo. Jornalista do Jornal Gazeta do Povo. Desde setembro de 2010 é editor de Economia da Gazeta do Povo, e também mantém o blog Tubo de Ensaio, sobre ciência e religião. Kairo Rosa Neves de Oliveira - Colunista Católico, solteiro, estudante universitário, cursa Engenharia Civil na UNESP de Ilha Solteira - SP. Colaborador do site “Salvem a Liturgia”, na coluna de paramentos litúrgicos e dando dicas para solenizar a celebração. Atua no site Movimento Liturgico, responde dúvidas litúrgicas. Mantém, ainda, um blog de imagens litúrgicas, o Zelus. E-mail: kairo@salvemaliturgia.com

Evelyn Mayer de Almeida Colunista Uma filha de Deus, católica, esposa e mãe desejosa em cumprir a doce missão que o Senhor a deu. Professora de Língua Portuguesa, é também dona do blog Fazei o que Ele vos disser e colaboradora do site Rainha dos Apóstolos. Já foi coordenadora da Missão Kerigma Christi. Interessa por Filosofia, Educação, Política e Humanidades. Twitter: @evelynsmalmeida Facebook: Evelyn Mayer de Almeida Ives Gandra da Silva Martins Colunista. Católico. Dispensa maiores apresentações. Ganhador de diversos prêmios, professor em diversas faculdades. Professor Emérito e honoris causa em várias universidades. Doctor Honoris Causa da Universidade de Craiova – Romênia. Um dos mais conceituados tributaristas brasileiros. Supernumerário da Opus Dei. Colar de mérito judiciário em diversos Tribunais do país, bem como medalhas e comendas de mérito cultural. Pedro Brasilino Peres Netto Colunista Solteiro, Católico, estudante de Biomedicina na Universidade Federal de Goiás - UFG, coordenar da Pastoral da Juventude na Paróquia do Imaculado Coração de Maria em Goiânia. Facebook: Pedro Brasilino. Lenise Garcia - Colunista Católica, graduada em Farmácia e Bioquímica pela Universidade de São Paulo, mestrada em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo e doutorada em Microbiologia e Imunologia pela Universidade Federal de São Paulo. Atualmente é professora adjunta da Universidade de Brasília, no departamento de Biologia Celular. Numerária do Opus Dei. Presidente do Movimento Nacional da Cidadania pela Vida – Brasil Sem Aborto


Nossa Equipe

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Pe. Inácio José do Vale - Colunista É sacerdote católico e Pároco da Paróquia São Paulo Apóstolo em Resende/RJ, é especialista em Ciência Social da religião pesquisador de seitas e conferencista, é Professor de Teologia Sistemática na Faculdade de Teologia de Volta Redonda/RJ. E-mail: pe.inaciojose.osbm@hotmail.com Rafael de Mesquita Diehl - Colunista Historiador e Professor formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e atualmente mestrando em História na mesma instituição. Estuda História Medieval e participa dos apostolados virtuais Reino da Virgem Mãe de Deus (www.reinodavirgem.com.br) e Salvem a Liturgia! (www.salvemaliturgia.com). Também é catequista e ministra formações na área de História da Igreja e Arte sacra. Carlos Ramalhete— Colunista Casado, pai de dois filhos adolescentes, e licenciado em filosofia pela Universidade Católica de Petrópolis. Trabalha como professor de filosofia e sociologia, além de manter uma coluna no jornal Gazeta do Povo (Curitiba) e o apostolado A Hora de São Jerônimo, o apostolado de apologética católica mais antigo da internet brasileira (www.hsjonline.com). Bruno Dornelles de Castro - Colunista Católico, solteiro, formado em Direito. Dá formações de Doutrina Social da Igreja. Mantém um blog onde escreve sobre política e filosofia (brunodornellesdecastro. blogspot.com). É incorporado ao Regnum Christi. Facebook: Bruno Dornelles de Castro

Ivanaldo Santos - Colunista. Ivanaldo Santos é filósofo, doutor em estudos da linguagem, professor do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Letras da UERN. Possui vários livros publicados, entre os quais destacamse: Teologia da Libertação: ensaios e reflexões e Linguagem e epistemologia em Tomás de Aquino. E-mail: ivanaldosantos@yahoo.com.br. Karen Mortean - Colunista Esposa, mãe, enfermeira, especializada na área da educação, instrutora do Método Billings da Ovulação p e lo WOOMB/Cenplafam-BR. Igson Mendes da Silva - Colunista Leigo Católico, Solteiro, Analista de Sistemas do Tribunal de Contas do Amazonas, graduando em Teologia, membro da Paróquia de Santa Luzia, palestrante sobre doutrina, ética aplicada aos meios de comunicações sociais; formador, colabora com movimentos eclesiais ligados a Igreja Católica, Dirige o Apostolado Spiritus Paraclitus que se dedica em promover a fé católica. E-mail: igson. mendes@gmail.com Silvia Elizabeth - Revisora Formada em Letras pela Universidade Estadual de Londrina e aluna de Especialização em Literatura Brasileira pela mesma Universidade. Atualmente trabalha no site Christo Nihil Praeponere como redatora e presta serviços para a Editora Ecclesiae como revisora.

Lizandra Danielle Araújo da Silva - Colunista. Católica, solteira, estudante de Controle Ambiental Renan da Silva Cunha no Instituto Federal de Diagramador Goiás. Coroinha há 6 anos Graduando do 3 º ano de Jornalismo na Paróquia do Imaculado pela Universidade Estadual de Coração de Maria em GoiLondrina ânia. Twitter: _lizdaniele

Ian Farias de Carvalho Almeida - Colunista Solteiro, católico, Seminarista do Seminário Papa João Paulo II, Diocese de Jequié-BA, cursa Filosofia na Instituto de Teologia de Ilhéus. http://beinbetter.wordpress.com/ ou : http://www. reflexoesfranciscanas.com.br/ Twitter: @ianfariasca Skype: ianfarias


Editorial Mais uma vez chegamos as mãos de tantos católicos e não católicos que pretendem conhecer um pouco mais dessa fabulosa Igreja de Cristo que possui mais de dois mil anos de história, experiência, conhecimento e graças. Dentro dessa edição teremos uma série de temas como a doutrina social da Igreja discutindo o papel do leigo na política e os limites entre Igreja e Estado. Tal tema é palpitante tanto porque se trata de paixões políticas, algo nem sempre tão fácil de lhe dar e com limites. Limitações impostas são sempre problema em um mundo que prega total liberdade e falta de limites. Na coluna sobre milagres vamos estudar um pouco sobre a Virgem de Guadalupe, padroeira das Américas e que tem no México uma devoção fenomenal. Milagres incríveis, algo inexplicável pelo humano. A leitura realmente vale a pena. Em outra coluna temos um extraordinário artigo sobre pornografia e os efeitos dento da família que essa praga que se torna cada vez mais comum dentro de casa. Crianças, adultos, homens e mulheres acabam sendo expostos a pornografia mais degradante. Uma leitura inteligente e que ficou extremamente interessante. Falando em idade média, temos um estudo sobre a iconografia dos reis magos desse tempo. Interessante perceber o quanto a cultura cristã contribuiu nessa época para que nos tornássemos o que nos tornamos hoje. Enfim, diversas colunas e diversos artigos 06 - In Guardia - fevereiro de 2012

a disposição de todos e com a contribuição de todos esses excelente colunistas. Tudo gratuito, on line e a disposição. Demos graças a Deus por essa nova edição e por termos forças de continuar. Uma boa leitura a todos.


Pense como os Santos

Santo Antônio

“Deus é Pai de todas as coisas. Suas criaturas são irmãos e irmãs.” “Uma água turva e agitada não espelha a face de quem sobre ela se debruça. Se queres que a face de Cristo, que te protege, se espelhe em ti, sai do tumulto das coisas exteriores, seja tranqüila a tua alma.”

“Quando te sorriem prosperidade mundana e prazeres, não te deixes encantar; não te apegues a eles; brandamente entram em nós, mas quando os temos dentro de nós, nos mordem como serpentes.” “A paciência é o baluarte da alma, ela a fortifica e defende de toda perturbação.”

“Como os raios se desprendem das nuvens, assim também dos santos pregadores emanam obras maravilhosas. Disparam os raios, enquanto cintilam os milagres dos pregadores; retornam os raios, quando os pregadores não atribuem a si mesmos as grandes obras que fazem, mas à graça de Deus.”

“Ó meu Senhor Jesus, eu estou pronto a seguir-te mesmo no cárcere, mesmo até a morte, a imolar a minha vida por teu amor, porque sacrificaste a tua vida por nós.”

“Neste lugar tenebroso, os santos brilham como as estrelas do firmamento. E como os calçados nos defendem os pés, assim os exemplos dos santos defendem as nossas almas tornandonos capazes de esmagar as sugestões do demônio e as seduções do mundo.”

“Ó Senhor, dá-me viver e morrer no pequeno ninho da pobreza e na fé dos teus Apóstolos e da tua Santa Igreja Católica.”

“É viva a Palavra quando são as obras que falam.”

“Quem não pode fazer grandes coisas, faça ao menos o que estiver na medida de suas forças; certamente não ficará sem recompensa” 07 - In Guardia - fevereiro de 2012


Os limites da relação Igreja e Estado e o papel do leigo na política Por Bruno de Castro Daí a César o que é de César e a Deus o que é de Deus (Mt 22, 21; Mc 12,17 e Lc 20, 25) Cristo proferiu essas palavras ao ser interpelado por uma pessoa que talvez tivesse a esperança de que, para o Filho de Deus, não fosse correto pagar impostos e teve seu desejo frustrado. Nosso Senhor não somente afirmou que é correto “dar a César o que é de César”, como “César e Deus não podem ser confundidos, cada um tem que receber o que é de si”. Logo, nos causa o dilema: qual é o limite para essa relação política entre Igreja e Estado? Para início de conversa, o Estado é hoje reconhecido pelo Concílio Vaticano II como, se exercitado pela política, o potencial maior promotor do bem comum dentre todas as instituições da terra, incluindo a própria Igreja. Isso porque o Estado não foi feito apenas para o povo de Deus, mas para todas as pessoas que estão inseridas na mesma sociedade que é também ocupada pelo povo de Deus. A “Gaudium et Spes” deixa isso muito claro na relação que o Estado deve possuir com os ateus e, mesmo assim, alguns pertencentes a este grupo insistem em culpar a Igreja pelas insatisfações de suas vidas vazias, o que tampouco caberia entrar no mérito. O Estado foi um ente inesperado pela Igreja Católica. Surgiu como forma de colocar reis em patamares superiores à própria Igreja - na Idade Moderna -, e evoluiu no sentido de afastar qualquer valor moral que essa pregasse - no período liberal. E, de fato, a retaliação ao eclesial resultou no aperfeiçoamento do Estado não por parte dos liberais franceses, revoltos entre si e traumatizados pela cisma causada, mas pelos liberais ingleses que, mesmo ligados ao protestantismo, pregaram a valorização histórica e a moral cristã na forma do puritanismo exacerbado, o que tirou a sociedade política do ateísmo, aceitando a ética cristã, porém de maneira laica, em forma de princípios. Foi assim que a Igreja aproveitou-se de sua universalidade, enquanto protestantes e islâmicos tornavam seus estados identificados com a sua crença (no Ocidente isso fica evidente na Grécia, Rússia, Estados Unidos e Inglaterra), para promover a sua doutrina social e preencher as lacunas que não seriam preenchidas pelo empirismo liberal inglês que tinha uma visível tendência de adesão ao deísmo - uma forma de crença na qual Deus existe, porém não 08 - In Guardia - fevereiro de 2012

intervém em nossa realidade. É por essa razão que não somente a instituição eclesial não pretende qualquer relação com a política local, e ao mesmo tempo mantém relações diplomáticas com países e com órgãos internacionais, em prol da manutenção da paz mundial e da garantia da dignidade de seus fiéis e não fiéis. Muitos erros em relação à política e à Igreja foram cometidos neste caminho, muitos deles já admitidos com direito ao perdão expresso do Santo Padre, como no caso das cruzadas [cruzadas é um substantivo comum, houveram mais de uma, não começa com maiúscula]. Porém, é com a influência da universalidade cristã que hoje a Igreja prega que se devem sair os apostolados cristãos para a política. E, como não pode ser do clero, salvo em matéria moral, tem de ser dos leigos. No século XX, passada a grande guerra, tivemos excelentes exemplos da prática dessa universalidade, na pessoa dos leigos. Leigos católicos, como Jacques Maritain, deixaram a marca da Doutrina Social da Igreja na Declaração Universal dos Direitos Humanos, o documento que criou a ONU. Konrad Adenauer, o católico da Remânia que ousava pregar um novo Estado Federal da Alemanha em pleno reich nazista, foi o primeiro chanceler alemão após a Segunda Guerra Mundial e, em meio a uma Alemanha devastada, restabeleceu uma federação solidarista com a Lei Fundamental de Bonn. Igualmente Alcides De Gasperi, declarado Servo de Deus, na reconstrução da Itália, que mesmo com o fenômeno da transgressão cultural construiu instituições fortes suficientes para o bem comum ser executado socialmente e moralmente, a ponto de dar ao cristianismo um berço onde sua Igreja poderia deitar por mais um século em plena paz.


A homilia do Papa MENSAGEM DE SUA SANTIDADE BENTO XVI PARA A CELEBRAÇÃO DO XLV DIA MUNDIAL DA PAZ 1 DE JANEIRO DE 2012 EDUCAR OS JOVENS PARA A JUSTIÇA E A PAZ 1. O INÍCIO DE UM NOVO ANO, dom de Deus à humanidade, induz-me a desejar a todos, com grande confiança e estima, de modo especial que este tempo, que se abre diante de nós, fique marcado concretamente pela justiça e a paz. Com qual atitude devemos olhar para o novo ano? No salmo 130, encontramos uma imagem muito bela. O salmista diz que o homem de fé aguarda pelo Senhor « mais do que a sentinela pela aurora » (v. 6), aguarda por Ele com firme esperança, porque sabe que trará luz, misericórdia, salvação. Esta expectativa nasce da experiência do povo eleito, que reconhece ter sido educado por Deus a olhar o mundo na sua verdade sem se deixar abater pelas tribulações. Convido-vos a olhar o ano de 2012 com esta atitude confiante. É verdade que, no ano que termina, cresceu o sentido de frustração por causa da crise que aflige a sociedade, o mundo do trabalho e a economia; uma crise cujas raízes são primariamente culturais e antropológicas. Quase parece que um manto de escuridão teria descido sobre o nosso tempo, impedindo de ver com clareza a luz do dia. Mas, nesta escuridão, o coração do homem não cessa de aguardar pela aurora de que fala o salmista. Esta expectativa mostra-se

particularmente viva e visível nos jovens; e é por isso que o meu pensamento se volta para eles, considerando o contributo que podem e devem oferecer à sociedade. Queria, pois, revestir a Mensagem para o XLV Dia Mundial da Paz duma perspectiva educativa: « Educar os jovens para a justiça e a paz », convencido de que eles podem, com o seu entusiasmo e idealismo, oferecer uma nova esperança ao mundo. A minha Mensagem dirige-se também aos pais, às famílias, a todas as componentes educativas, formadoras, bem como aos responsáveis nos diversos âmbitos da vida religiosa, social, política, económica, cultural e mediática. Prestar atenção ao mundo juvenil, saber escutá-lo e valorizá-lo para a construção dum futuro de justiça e de paz não é só uma oportunidade mas um dever primário de toda a sociedade. Trata-se de comunicar aos jovens o apreço pelo valor positivo da vida, suscitando neles o desejo de consumá-la ao serviço do Bem. Esta é uma tarefa, na qual todos nós estamos, pessoalmente, comprometidos. As preocupações manifestadas por muitos jovens nestes últimos tempos, em várias regiões do mundo, exprimem o desejo de poder olhar para o futuro com fundada esperança. Na hora actual, muitos são os aspectos que os trazem apreensivos: o desejo de receber uma formação que os prepare de maneira mais profunda para enfrentar a realidade, a dificuldade de formar uma família e encontrar um emprego estável, a capacidade efectiva de intervir no mundo da política, da cultura e da economia contribuindo para a construção duma sociedade de rosto mais humano e solidário. É importante que estes fermentos e o idealismo que encerram encontrem a devida atenção em todas as componentes da sociedade. A Igreja olha para os jovens com esperança, tem confiança neles e encoraja-os a procurarem a verdade, a defenderem o bem comum, a possuírem perspectivas abertas sobre o mundo e olhos capazes de ver « coisas novas » (Is 42, 9; 48, 6). Os responsáveis da educação 2. A educação é a aventura mais fascinante e difícil da vida. Educar – na sua etimologia latinaeducere – significa conduzir para fora de si mesmo ao encontro da realidade, rumo a uma plenitude que faz crescer a pessoa. Este processo alimenta-se do encontro de duas liberdades: a do adulto e a do jovem. Isto exige a responsabilidade do discípulo, que deve estar disponível para se deixar guiar no conhecimento da realidade, e a do educador, que deve estar disposto a dar-se a si mesmo. Mas, para 09 - In Guardia - fevereiro de 2012


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isso, não bastam meros dispensadores de regras e informações; são necessárias testemunhas autênticas, ou seja, testemunhas que saibam ver mais longe do que os outros, porque a sua vida abraça espaços mais amplos. A testemunha é alguém que vive, primeiro, o caminho que propõe. E quais são os lugares onde amadurece uma verdadeira educação para a paz e a justiça? Antes de mais nada, a família, já que os pais são os primeiros educadores. A família é célula originária da sociedade. « É na família que os filhos aprendem os valores humanos e cristãos que permitem uma convivência construtiva e pacífica. É na família que aprendem a solidariedade entre as gerações, o respeito pelas regras, o perdão e o acolhimento do outro ».[1] Esta é a primeira escola, onde se educa para a justiça e a paz. Vivemos num mundo em que a família e até a própria vida se vêem constantemente ameaçadas e, não raro, destroçadas. Condições de trabalho frequentemente pouco compatíveis com as responsabilidades familiares, preocupações com o futuro, ritmos frenéticos de vida, emigração à procura dum adequado sustentamento se não mesmo da pura sobrevivência, acabam por tornar difícil a possibilidade de assegurar aos filhos um dos bens mais preciosos: a presença dos pais; uma presença, que permita compartilhar de forma cada vez mais profunda o caminho para se poder transmitir a experiência e as certezas adquiridas com os anos – o que só se torna viável com o tempo passado juntos. Queria aqui dizer aos pais para não desanimarem! Com o exemplo da sua vida, induzam os filhos a colocar a esperança antes de tudo em Deus, o único de quem surgem justiça e paz autênticas. Quero dirigir-me também aos responsáveis das instituições com tarefas educativas: Velem, com grande sentido de responsabilidade, por que seja respeitada e valorizada em todas as circunstâncias a dignidade de cada pessoa. Tenham a peito que cada jovem possa descobrir a sua própria vocação, acompanhando-o para fazer frutificar os dons que o Senhor lhe concedeu. Assegurem às famílias que os seus filhos não terão um caminho formativo em contraste com a sua consciência e os seus princípios religiosos. Possa cada ambiente educativo ser lugar de abertura ao transcendente e aos outros; lugar de diálogo, coesão e escuta, onde o jovem se sinta valorizado nas suas capacidades e riquezas interiores e aprenda a apreciar os irmãos. Possa ensinar a saborear a alegria que deriva de viver dia após dia a caridade e a compaixão para com o próximo e de participar activamente na construção duma sociedade mais humana e fraterna. Dirijo-me, depois, aos responsáveis políticos, pedindo-lhes que ajudem concretamente as famílias e as instituições educativas a exercerem o seu direito-dever de educar. Não deve jamais faltar um adequado apoio à maternidade e à paternidade. Actuem de modo que a ninguém seja negado o acesso à instrução e que as famílias possam escolher livremente as estruturas educativas consideradas mais idóneas para o bem dos seus filhos. Esforcem-se por favorecer a reunificação das famílias que estão separadas devido à necessidade de encontrar meios de subsistência. Proporcionem

aos jovens uma imagem transparente da política, como verdadeiro serviço para o bem de todos. Não posso deixar de fazer apelo ainda ao mundo dos media para que prestem a sua contribuição educativa. Na sociedade actual, os meios de comunicação de massa têm uma função particular: não só informam, mas também formam o espírito dos seus destinatários e, consequentemente, podem concorrer notavelmente para a educação dos jovens. É importante ter presente a ligação estreitíssima que existe entre educação e comunicação: de facto, a educação realiza-se por meio da comunicação, que influi positiva ou negativamente na formação da pessoa. Também os jovens devem ter a coragem de começar, eles mesmos, a viver aquilo que pedem a quantos os rodeiam. Que tenham a força de fazer um uso bom e consciente da liberdade, pois cabelhes em tudo isto uma grande responsabilidade: são responsáveis pela sua própria educação e formação para a justiça e a paz. Educar para a verdade e a liberdade 3. Santo Agostinho perguntava-se: « Quid enim fortius desiderat anima quam veritatem – que deseja o homem mais intensamente do que a verdade? ».[2] O rosto humano duma sociedade depende muito da contribuição da educação para manter viva esta questão inevitável. De facto, a educação diz respeito à formação integral da pessoa, incluindo a dimensão moral e espiritual do seu ser, tendo em vista o seu fim último e o bem da sociedade a que pertence. Por isso, a fim de educar para a verdade, é preciso antes de mais nada saber que é a pessoa humana, conhecer a sua natureza. Olhando a realidade que o rodeava, o salmista pôs-se a pensar: « Quando contemplo os céus, obra das vossas mãos, a lua e as estrelas que Vós criastes: que é o homem para Vos lembrardes dele, o filho do homem para com ele Vos preocupardes? » (Sal 8, 4-5). Esta é a pergunta fundamental que nos devemos colocar: Que é o homem? O homem é um ser que traz no coração uma sede de infinito, uma sede de verdade – não uma verdade parcial, mas capaz de explicar o sentido da vida –, porque foi criado à imagem e semelhança de Deus. Assim, o facto de reconhecer com gratidão a


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vida como dom inestimável leva a descobrir a dignidade profunda e a inviolabilidade própria de cada pessoa. Por isso, a primeira educação consiste em aprender a reconhecer no homem a imagem do Criador e, consequentemente, a ter um profundo respeito por cada ser humano e ajudar os outros a realizarem uma vida conforme a esta sublime dignidade. É preciso não esquecer jamais que « o autêntico desenvolvimento do homem diz respeito unitariamente à totalidade da pessoa em todas as suas dimensões »,[3] incluindo a transcendente, e que não se pode sacrificar a pessoa para alcançar um bem particular, seja ele económico ou social, individual ou colectivo. Só na relação com Deus é que o homem compreende o significado da sua liberdade, sendo tarefa da educação formar para a liberdade autêntica. Esta não é a ausência de vínculos, nem o império do livre arbítrio; não é o absolutismo do eu. Quando o homem se crê um ser absoluto, que não depende de nada nem de ninguém e pode fazer tudo o que lhe apetece, acaba por contradizer a verdade do seu ser e perder a sua liberdade. De facto, o homem é precisamente o contrário: um ser relacional, que vive em relação com os outros e sobretudo com Deus. A liberdade autêntica não pode jamais ser alcançada, afastando-se d’Ele. A liberdade é um valor precioso, mas delicado: pode ser mal entendida e usada mal. « Hoje um obstáculo particularmente insidioso à acção educativa é constituído pela presença maciça, na nossa sociedade e cultura, daquele relativismo que, nada reconhecendo como definitivo, deixa como última medida somente o próprio eu com os seus desejos e, sob a aparência da liberdade, torna-se para cada pessoa uma prisão, porque separa uns dos outros, reduzindo cada um a permanecer fechado dentro do próprio “eu”. Dentro de um horizonte relativista como este, não é possível, portanto, uma verdadeira educação: sem a luz da verdade, mais cedo ou mais tarde cada pessoa está, de facto, condenada a duvidar da bondade da sua própria vida e das relações que a constituem, da validez do seu compromisso para construir com os outros algo em comum ».[4]

Por conseguinte o homem, para exercer a sua liberdade, deve superar o horizonte relativista e conhecer a verdade sobre si próprio e a verdade acerca do que é bem e do que é mal. No íntimo da consciência, o homem descobre uma lei que não se impôs a si mesmo, mas à qual deve obedecer e cuja voz o chama a amar e fazer o bem e a fugir do mal, a assumir a responsabilidade do bem cumprido e do mal praticado.[5] Por isso o exercício da liberdade está intimamente ligado com a lei moral natural, que tem carácter universal, exprime a dignidade de cada pessoa, coloca a base dos seus direitos e deveres fundamentais e, consequentemente, da convivência justa e pacífica entre as pessoas. Assim o recto uso da liberdade é um ponto central na promoção da justiça e da paz, que exigem a cada um o respeito por si próprio e pelo outro, mesmo possuindo um modo de ser e viver distante do meu. Desta atitude derivam os elementos sem os quais paz e justiça permanecem palavras desprovidas de conteúdo: a confiança recíproca, a capacidade de encetar um diálogo construtivo, a possibilidade do perdão, que muitas vezes se quereria obter mas sente-se dificuldade em conceder, a caridade mútua, a compaixão para com os mais frágeis, e também a prontidão ao sacrifício. Educar para a justiça 4. No nosso mundo, onde o valor da pessoa, da sua dignidade e dos seus direitos, não obstante as proclamações de intentos, está seriamente ameaçado pela tendência generalizada de recorrer exclusivamente aos critérios da utilidade, do lucro e do ter, é importante não separar das suas raízes transcendentes o conceito de justiça. De facto, a justiça não é uma simples convenção humana, pois o que é justo determina-se originariamente não pela lei positiva, mas pela identidade profunda do ser humano. É a visão integral do homem que impede de cair numa concepção contratualista da justiça e permite abrir também para ela o horizonte da solidariedade e do amor.[6] Não podemos ignorar que certas correntes da cultura moderna, apoiadas em princípios económicos racionalistas e individualistas, alienaram das suas raízes transcendentes o conceito de justiça, separando-o da caridade e da solidariedade. Ora « a “cidade do homem” não se move apenas por relações feitas de direitos e de deveres, mas antes e sobretudo por relações de gratuidade, misericórdia e comunhão. A caridade manifesta sempre, mesmo nas relações humanas, o amor de Deus; dá valor teologal e salvífico a todo o empenho de justiça no mundo ».[7] « Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados » (Mt 5, 6). Serão saciados, porque têm fome e sede de relações justas com Deus, consigo mesmo, com os seus irmãos e irmãs, com a criação inteira. Educar para a paz 5. « A paz não é só ausência de guerra, nem se limita a assegurar o equilíbrio das forças adversas. A paz não é possível na terra sem a salvaguarda dos bens das pessoas, a livre comunicação entre os seres humanos, o respeito pela dignidade das pessoas e dos povos e a prática assídua da fraternidade ».[8] A paz é fruto da


justiça e efeito da caridade. É, antes de mais nada, dom de Deus. Nós, os cristãos, acreditamos que a nossa verdadeira paz é Cristo: n’Ele, na sua Cruz, Deus reconciliou consigo o mundo e destruiu as barreiras que nos separavam uns dos outros (cf. Ef 2, 14-18); n’Ele, há uma única família reconciliada no amor. A paz, porém, não é apenas dom a ser recebido, mas obra a ser construída. Para sermos verdadeiramente artífices de paz, devemos educar-nos para a compaixão, a solidariedade, a colaboração, a fraternidade, ser activos dentro da comunidade e solícitos em despertar as consciências para as questões nacionais e internacionais e para a importância de procurar adequadas modalidades de redistribuição da riqueza, de promoção do crescimento, de cooperação para o desenvolvimento e de resolução dos conflitos. « Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus » – diz Jesus no sermão da montanha (Mt 5, 9). A paz para todos nasce da justiça de cada um, e ninguém pode subtrair-se a este compromisso essencial de promover a justiça segundo as respectivas competências e responsabilidades. De forma particular convido os jovens, que conservam viva a tensão pelos ideais, a procurarem com paciência e tenacidade a justiça e a paz e a cultivarem o gosto pelo que é justo e verdadeiro, mesmo quando isso lhes possa exigir sacrifícios e obrigue a caminhar contracorrente. Levantar os olhos para Deus 6. Perante o árduo desafio de percorrer os caminhos da justiça e da paz, podemos ser tentados a interrogar-nos como o salmista: « Levanto os olhos para os montes, de onde me virá o auxílio? » (Sal 121, 1). A todos, particularmente aos jovens, quero bradar: « Não são as ideologias que salvam o mundo, mas unicamente o voltar-se para o Deus vivo, que é o nosso criador, o garante da nossa liberdade, o garante do que é deveras bom e verdadeiro (…), o voltar-se sem reservas para Deus, que é a medida do que é justo e, ao mesmo tempo, é o amor eterno. E que mais nos poderia salvar senão o amor? ».[9] O amor rejubila com a verdade, é a força que torna capaz de comprometer-se pela verdade, pela justiça, pela paz, porque tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta (cf. 1 Cor 13, 1-13). Queridos jovens, vós sois um dom precioso para a sociedade. Diante das dificuldades, não vos deixeis invadir pelo desânimo nem vos abandoneis a falsas soluções, que frequentemente se apresentam como o caminho mais fácil para superar os problemas. 12 - In Guardia - fevereiro de 2012

Não tenhais medo de vos empenhar, de enfrentar a fadiga e o sacrifício, de optar por caminhos que requerem fidelidade e constância, humildade e dedicação. Vivei com confiança a vossa juventude e os anseios profundos que sentis de felicidade, verdade, beleza e amor verdadeiro. Vivei intensamente esta fase da vida, tão rica e cheia de entusiasmo. Sabei que vós mesmos servis de exemplo e estímulo para os adultos, e tanto mais o sereis quanto mais vos esforçardes por superar as injustiças e a corrupção, quanto mais desejardes um futuro melhor e vos comprometerdes a construí-lo. Cientes das vossas potencialidades, nunca vos fecheis em vós próprios, mas trabalhai por um futuro mais luminoso para todos. Nunca vos sintais sozinhos! A Igreja confia em vós, acompanha-vos, encoraja-vos e deseja oferecer-vos o que tem de mais precioso: a possibilidade de levantar os olhos para Deus, de encontrar Jesus Cristo – Ele que é a justiça e a paz. Oh vós todos, homens e mulheres, que tendes a peito a causa da paz! Esta não é um bem já alcançado mas uma meta, à qual todos e cada um deve aspirar. Olhemos, pois, o futuro com maior esperança, encorajemo-nos mutuamente ao longo do nosso caminho, trabalhemos para dar ao nosso mundo um rosto mais humano e fraterno e sintamo-nos unidos na responsabilidade que temos para com as jovens gerações, presentes e futuras, nomeadamente quanto à sua educação para se tornarem pacíficas e pacificadoras! Apoiado em tal certeza, envio-vos estas refl exões que se fazem apelo: Unamos as nossas forças espirituais, morais e materiais, a fim de « educar os jovens para a justiça e a paz ». Vaticano, 8 de Dezembro de 2011. BENEDICTUS PP XVI


Um tapinha não dói

Por Evelyn Mayer de Alemeida

Já é de conhecimento de todos que o Totalitarismo está se impondo no Brasil. E não é só pelo PT, não. Todo o tipo de “ditador” está fazendo isso. Veja, por exemplo, a questão do uso do tabaco em lugares públicos. Ideia iniciada pelo candidato à presidência no ano passado, José Serra, o direito do comerciante a decidir quem fuma ou não em seu estabelecimento ficou vetado. Isso é totalitarismo, meus caros. É o dono do lugar quem decide quem fuma ou não, e não o Estado. É verdade que esta lei já vem sendo implantada nos EUA e na Europa, o que comprova que o totalitarismo não é apenas coisa de brasileiro, mas sim, um sistema mundial. Agora eles progridem em passos mais largos. Querem definir como os pais devem educar a prole. Lembrava, quando pensava neste assunto, de Platão. Certa vez, li um livro em que o nobre filósofo sonhava com uma sociedade politicamente perfeita. Tudo estava muito bem arquitetado, todos tinham suas funções minuciosamente divididas; ninguém ficaria para “titia” nesta sociedade. Todos teriam o que fazer e com quem. Ao que se refere à Educação, Platão creu que era o Estado quem deveria educar os filhos, pois os pais seriam afetuosos em demasia e as crianças não seriam livres. Até porque, os homens tinham que ser perfeitos, guerreiros e pensadores, e os pais não teriam esta competência. Preciso dizer que esta sociedade sonhada por Platão não saiu do papel? Não, né? Por enquanto, não. No entanto, o atual governo acha que é Platão. Ele crê que o Estado tem sim competência para educar os filhos. Claro que eles não se baseiam em Platão. Talvez nem saibam do que eu comentei acima. Agora, é fato que se baseiam em Rousseau, aquele bêbado que criou uma teoria ‘fantástica’ sobre a pedagogia, mas que abandonou seus cinco filhos no orfanato sob a desculpa de que não era capaz de criá-los. Pode-se, então, perguntar como alguém é capaz de criar teorias, mas não de cumprí-las? Ademais, o governo não tem Moral e Ética suficientes para educar os filhos. Ele não dá conta de subsidiar adequadamente a Educação Escolar, que é sim da sua administração, deixando o Brasil em 85º no ranking e lamentando que a Seleção tenha ficado em 8º na Copa! O governo brasileiro deixa estar os salários dos professores, por exemplo. Em muitas escolas do Brasil não se paga hora-atividade ao professor. Isto é ilegal, sabiam? Só que se passa por legal e ninguém diz nada. Há lugares neste país em que as pessoas têm aula sob um manguezal! O governo sabe disso. E, o que ele faz? Mensalão. O MEC quer porque quer tirar das redes de ensino professores que só tenham Magistério - ou seja, sem formação superior - só que não conseguem porque há professores neste país que só têm o fundamental. E aí, Brasil? Diante desta realidade gritante, diante destes fatos catastróficos, o governo não se mexe, porém empurra com a barriga. E aí, pra mostrar que está de olho no senhor e na senhora que

me lê, cria uma lei absurda em que não se pode dar uma palmada no próprio filho para educá-lo. É uma lei tão enfadonha como a lei de Homofobia. O homossexual já é sim protegido neste país, porque antes de ser gay, ele é gente! As crianças também são salvaguardadas, já que temos o Estatuto da Criança e do Adolescente para ser seguido, entre outros órgãos competentes para tanto. Definir até onde pai e mãe podem ir é intrometer-se onde não é chamado, não acham? Dar em seu filho um tapa que seja para educar, não é ferir: é prevenir. Quem já prestou serviço militar, por exemplo, sabe que se tomar um tapa de seu comandante foi porque cometeu um erro gravíssimo e isto ficará para o que apanhou como lembrança para não mais errar. Na educação isto tem o mesmo sentido. É óbvio que há pessoas que ultrapassam o limite, e aí temos que ver bebês nos hospitais porque foram espancados. É verdade, também, que muitos psicopatas foram espancados na infância; contudo, apanhar na infância não é sinônimo de ser um psicopata amanhã. Suzane von Richtofen que o diga. E, para espancamento já existem leis. A função do governo é fazer valer estas leis que existem e não criar outras para “tampar o sol com a peneira”. Termino lembrando de minha mãe. Quando eu entrei na adolescência, aprontei uma que me rendeu umas boas cintadas. Chorando, perguntei a ela se gostava de me ver naquela situação. Assustadoramente respondeu-me que sim, pois, enquanto eu chorava, era sinal de que eu ainda tinha jeito. A hora em que ela começasse a chorar, então já não haveria mais nada a fazer por mim. Eu não sou psicopata, nem meus irmãos. Todos somos formados, constituímos família, temos filhos - que não se tornaram monstros porque apanharam - e viramos gente. Melhor apanhar do pai e da mãe a apanhar da polícia e do bandido. 13 - In Guardia - fevereiro de 2012


Copa do Mundo e dinheiro público 14 - In Guardia - fevereiro de 2012

Por Ives Gandra

Como contribuinte em um País em que a saúde, a educação e serviços públicos essenciais deixam a desejar, sou contrário a que se desvie dinheiro público -ou seja , dos contribuintes-, para construção de elefantes brancos que serão utilizados para 3 ou 4 jogos da Copa de 2014. Todos nós temos consciência -aqueles que se preocupam pelas finanças públicas das entidades federativas do Brasil- que apesar de a carga tributária atingir a fantasmagórica cifra de 37% do PIB (entre tributos e penalidades, que constituem a obrigação tributária, nos termos do art. 113 do Código Tributário Nacional), sabem que grande parte dela é dirigida apenas para remuneração dos servidores públicos, que , em nível de vencimentos e aposentadorias , estão muito acima dos cidadãos do segmento privado, que, sem gozarem de estabilidade, sofrem para ganhar o pão nosso de cada dia. Veja-se o que foi dedicado no orçamento para o Bolsa Família, 12 bilhões de reais , que atende a 11 milhões de pessoas, enquanto aquilo que se oferece a menos de 1 milhão de servidores federais, chega a 183 bilhões de reais. E, apesar desta cifra, aumentos de até 56% estão sendo outorgados aos que deveriam servir à nação e , na verdade, se servem dela, sendo fartamente remunerados por nossos tributos. Nada obstante, a carga tributária ser tão elevada, o investimento público para o desenvolvimento caiu 4 vezes , em relação ao período em que a carga situava-se em 24%, como informou Delfim Netto, em palestra que proferimos juntos. Hoje, 37% do PIB geram um investimento público de 1% ; antes, 24% geravam um investimento de 4% em relação ao mesmo PIB!!! Todos nós temos plena consciência de que o SUS deixa a desejar, que o sistema de educação é sofrível, que a infraestrutura do País não comporta um desenvolvimento mais acelerado e que , se os governos gastassem menos em despesas de custeio e com a mãode-obra oficial , poderíamos alcançar desenvolvimento econômico e social muito melhor. Estádio do Castelão em Fortaleza

Ora, com todas estas deficiências , desviar recursos públicos para construção de estádios, como ocorreu no Rio de Janeiro, com o Panamericano e a criação deste elefante branco, que é o Engenhão, representa, em verdade, desvio de dinheiro essencial para outras atividades públicas mais importantes. Por outro lado, é do conhecimento geral que tanto a CBF como a FIFA e todo os seus patrocinadores têm recursos de sobra, aliás , bem utilizados “pro domo sua” pelos seus perpétuos dirigentes. Parece-me fundamental - como a Folha de São Paulo realçou em um de seus editoriais - que a CBF, a FIFA, seus patrocinadores, que são aqueles que organizam as Copas, utilizem-se seus próprios recursos , sem tirar o dinheiro do pobre contribuinte, que paga muito e recebe serviços públicos de má qualidade. Creio que um movimento nacional deve ser organizado, para que se preserve o dinheiro público destinando-o a funções relevantes do Estado e que o lazer , representado pelo esporte , seja financiado pelos que dirigem o futebol mundial e no Brasil. Que os candidatos à presidência e os governadores de Estados não cedam à tentação de prometer com o chapéu alheio (dinheiro do contribuinte) auxílio para entidades que , todos sabemos, nadam em dinheiro. E que os prefeitos, que têm tão pouco do bolo tributário nacional, não desperdicem o escasso dinheiro público que possuem , na construção de novos estádios. Isto é tarefa das duas milionárias organizações do futebol internacional e brasileiro e não do Poder Público. Estádio de Cuiabá


Fé e Ciência Por Márcio Antônio Campos

Cardeal Newman defendendo a paz entre ciência e fé no século 19 Não conheço muito da história do bem-aventurado cardeal Newman, fora o fato de ele ter sido clérigo anglicano antes de se converter e entrar na Igreja Católica. Mas, enquanto estava no México, achei na livraria da Universidade Panamericana um pequeno volume, Cristianismo y Ciencias en la universidad, de sua autoria (Eunsa, 2011, 113 páginas). É um livrinho curto, que o leitor pode matar tranquilamente em uma tarde (é bem menor que o The God particle, que eu tinha planejado ler no recesso de Natal, mas não consegui), e que reúne três conferências direcionadas a estudantes da Universidade Católica da Irlanda, que Newman ajudou a fundar e da qual foi reitor por alguns anos. Até por isso, pressupõe-se que sua audiência seja formada apenas por católicos, o que ajuda a matizar algumas das declarações do então padre Newman. A primeira conferência, “Cristianismo e ciência médica”, é de 4 de novembro de 1858 e direcionada aos estudantes de Medicina da universidade. Uma das primeiras coisas que o reitor diz aos alunos é que a saúde do corpo, da qual se ocupa o médico, não é o fim último da existência. Newman cita o exemplo hipotético de uma religiosa que cuida de doentes durante uma epidemia. Os médicos a avisam que, se permanecer no local, acabará doente também ela e morrerá, mas a religiosa insiste (é a mesma situação pela qual passaria são Damião de Molokai). Não é que os médicos estivessem errados, diz Newman; é que a verdade a respeito da saúde da religiosa está, de certo modo, subordinada à sua missão. Newman também pede aos estu-

dantes que não caiam em duas tentações: uma é a de se concentrar apenas em sua profissão e descartar outros tipos de conhecimento; é preciso ver além da Medicina, ver o homem como mais que um aglomerado de funções fisiológicas em nada diferentes das que realizam os demais animais. A outra tentação é a de ceder ao materialismo, já que, enquanto as descobertas científicas são feitas de evidências, a moral e a religião, em comparação, se assemelham a “sombras e contornos”. “Que lânguida é a iluminação que [a consciência] projeta e que fraca sua influência comparada com a convicção que trazem a vista e o tato, que são o fundamento da ciência física”, afirma Newman. Ao convidar os estudantes a recusar o materialismo, o reitor ainda afirma que o médico católico é uma ponte entre ciência e fé. A segunda conferência, “Cristianismo e pesquisa científica”, foi escrita em novembro de 1855, mas nunca chegou a ser lida. Dirigia-se aos estudantes da Faculdade de Ciências, e logo no início Newman se propõe a criticar “o desnecessário antagonismo que às vezes existe entre os teólogos e os cultivadores das ciências em geral”. Um tema recorrente ao longo do livro é o próprio conceito de universidade, não como um amontoado de faculdades isoladas, mas como o local por excelência onde se adquire um conhecimento “universal”, amplo, sem que cada profissional fique “bitolado” em sua área de atuação. Infelizmente isso vem se perdendo hoje. Como diz o professor Carlos Ramalhete, colunista da Gazeta, hoje o advogado já não entende o que diz o engenheiro, que por sua vez é incapaz de compreender o médico, e por aí vai. Não estamos falando do jargão próprio de cada profissão, mas do próprio modo de pensar, dos pressupostos de cada área. O que Newman defende é o papel da Filosofia como eixo comum entre os diferentes conhecimentos. Segundo o reitor, o cientista cristão não deve se alarmar ao perceber que há “diferenças de tom” (e não “uma dificuldade inexplicável, uma contradição assombrosa, muito menos uma contradição em relação a fatos reais”) entre a Revelação e a Natureza. O que parece contraditório na verdade não o é, diz Newman, para quem as coisas que parecem estranhas à imaginação não o são à razão. “O que crê na Revelação com a fé absoluta que é patrimôno do católico não é uma criatura nervosa que se assusta com qualquer barulho repentino e que se sente tomada pelo pânico ante 15 - In Guardia - fevereiro de 2012


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qualquer situação estranha o inédita que se lhe apresente. Não tem temor algum (a própria ideia lhe faz rir) de que por qualquer outro método científico se possa descobrir algo que contradiga qualquer dos dogmas da religião”, afirma Newman. Ele segue falando sobre a “segurança inamovível de que se há algo que parece ser provado por um astrônomo, um geólogo, um cronólogo, um historiador ou um etnólogo contra os dogmas da fé, ao fim isso resultará: ou não ter sido realmente provado; ou não ser contraditório; ou não ser contraditório com nada que tenha sido verdadeiramente revelado, e sim com algo que foi confundido com a Revelação”. O reitor cita dois exemplos: o do heliocentrismo e o da aceitação da filosofia de Aristóteles. Por fim, Newman faz uma defesa ardorosa da liberdade de pesquisa, e afirma que os dogmas católicos não são obstáculos a essa liberdade, assim como as leis físicas não são obstáculos ao movimento do corpo. Também critica os teólogos que, “com uma impaciência nervosa com a possibilidade de as Escrituras não se encaixarem com a última especulação da moda, se empenham em publicar comentários geológicos ou etnológicos que logo precisam ser alterados ou até mesmo retirados antes da publicação devido aos avanços da ciência, essa mesma que tão temerariamente utilizam para auxiliar as Escrituras”. E adverte (ao mesmo tempo tranquilizando) os teólogos de que, ainda que a ciência cometa erros, eles são temporários e benéficos, à medida que, “no fim das contas, o único efeito do erro é promover a verdade”. Confiar na soberania da verdade ajuda a não se inquietar com novidades científicas. O texto que encerra o livro é “Cristianismo e Física”, conferência lida em 17 de dezembro de 1855. Nela, Newman diz querer demonstrar que não há antagonismo entre Física e Teologia e explicar por que, apesar disso, tantas pessoas acreditam nessa incompatibilidade. Mas, antes disso, ele alerta a audiência para não cair nos extremos de rejeitar a ciência em nome de uma certa “pureza de fé”, nem de desprezar a religião em nome dos “avanços da ciência” (um aviso que segue atual, acrescento). Newman passa a explicar as diferenças entre Física e Teologia de uma maneira que faz pensar nos Magistérios Não Interferentes de Stephen Jay Gould. A Física, diz o reitor, é a “Filosofia da matéria”, lida com os fenômenos, as leis da natureza. Mas o espiritual escapa completamente ao escopo da Física. Um físico que também tem fé religiosa manifesta uma opinião pessoal, não “de cientista”, porque a Física “não diz absolutamente nada” sobre as realidades sobrenaturais. O físico lida com fatos e leis; o teólogo, com razões e com o Autor das leis. É verdade, diz Newman, que as Escrituras também fazem afirmações sobre o mundo físico; mas a Igreja sempre se absteve de dar uma interpretação definitiva para essas passagens bíblicas, que admitem tantas interpretações que seria impossível uma descoberta física contradizer todas elas. Assim, a Teologia não

tem nada a temer em relação à Física, argumenta o reitor. Assim, os desentendimentos entre Física e Teologia ocorrem não por causa dos campos de estudo, mas devido ao fato de que uns resolveram impor seu método aos outros. A Física, diz Newman, é empírica e indutiva, vai ordenando e analisando uma massa de informações que se oferece ao cientista, para chegar a novas verdades; a Teologia é dedutiva, trabalha com a Revelação. Na descrição do reitor, “desde a época dos Apóstolos até o fim do mundo não se pode agregar nenhuma verdade estritamente nova à informação teológica que foi inspirada aos Apóstolos para que a guardassem. Naturalmente, é possível fazer inúmeras deduções partindo da doutrina original. Mas, como as conclusões já estavam nas premissas, tais deduções não são, para falar com propriedade, adições.” A seguir, Newman dá exemplos de intromissões. O primeiro deles ocorre quando religiosos, baseados em suas interpretações da Bíblia, tentam fazer afirmações taxativas sobre como o mundo é, como foi ou como deverá ser. O reitor cita profecias milenaristas e a controvérsia do heliocentrismo para ilustrar esse tipo de situação. Depois disso, o reitor passa a criticar as tentativas de aplicar o método indutivo à Escritura, à história eclesiástica e ao mundo natural para tirar daí conclusões teológicas. Newman ataca de forma especial a chamada “Teologia Natural”, que não por coincidência é o nome do livro de William Paley que introduz a metáfora do relojoeiro. Quatro anos antes de Darwin publicar A origem das espécies, Newman argumenta que “colocar o peso da prova principal [da existência de Deus] exclusivamente no argumento de um Desenho que o universo proporciona” é muito cômodo. O sacerdote reconhece que a Teologia Natural (ou Teologia Física, como a chama Newman) tem lá seus méritos, mas aponta que Paley não trouxe nada de novo. “O raciocínio com que Sócrates, diante de Xenofonte, rebateu o pequeno ateu Aristodemo é exatamente o mesmo raciocínio da Teologia Natural de Paley”, diz, citando Thomas Macauley. Newman vai além: levada às últimas consequências, a Teologia Física ajudaria a combater o Cristianismo. O reitor a chama de uma “verdade falsa”, já que é meia verdade. Ela considera apenas três atributos divinos, o Poder, a Bondade e a Sabedoria, colocando peso demais no Poder e peso de menos na Bondade. Fora isso, não diz absolutamente nada sobre o Cristianismo, os demais atributos divinos, a consciência ou a Providência divina; ao colocar ênfase excessiva nas leis da natureza, desconsidera a sua suspensão (o milagre, que é “a própria essência da ideia de uma Revelação”). “O Deus da Teologia Física pode, com muita facilidade, chegar a ser um mero ídolo”, afirma Newman. Ao tirar de Deus a possibilidade de suspender as leis que Ele mesmo criou, a Teologia Física diminui Deus, conclui o sacerdote.


A Traição de Cristo Por Padre Inácio

A pintura de Caravaggio “A Traição de Cristo” (c. 1602) tem como foco principal o momento culminante da traição de Judas no Jardim do Getsêmani, no momento em que ele chega perto de Jesus e lhe dá o beijo traiçoeiro. Jesus com as mãos juntas ao corpo em sinal de entrega nos momentos da sua captura é contrastada com o poder dos soldados com as suas armaduras pretas e polidas. As várias expressões de Jesus, Judas e o discípulo que foge, dão uma profundidade emocional à pintura. As cenas super-populadas de Caravaggio contribuem para o impacto dramático. Perdida por quase 200 anos, esta peça maestra foi redescoberta em 1990 numa residência em Dublin, Irlanda. Está atualmente exposta na Galeria Nacional da Irlanda, na cidade de Dublin. O pintor italiano Michelangelo Merisi, conhecido como Caravaggio (1573-1610), ficou muito célebre não só pela pintura A Traição de Cristo, como também pelas grandes obras de: A Crucificação de São Pedro e o Martírio de São Mateus. Judas e o povo Sawi Até 1962, em Irian Jaya, Indonésia, o povo sawi vivia em completo isolamento do mundo. Os sawis eram canibais e seu mais alto valor como povo era a traição e o engano. Podiam aparentar amizade com as tribos vizinhas durante meses, fazendo se sentirem seguros para então cair cruel e repentinamente sobre eles. Chamavam isso de “cevar com amizade para a matança”. Em 1962, o casal Richardson, missionários americanos, foi viver com essa tribo. O casal aprendeu o idioma sawi e logo pode lhes contar as primeiras histórias bíblicas. Mas os relatos acerca da vida e obra do Senhor Jesus não pareciam interessar os sawis. No entanto, certa vez Don Richardson viu que eles estavam gostando de sua narrativa. Isso aconteceu quando lhes contava como Judas traiu o Senhor Jesus. Os sawis escutaram com muita atenção que Judas havia estado por mais de três anos com o Senhor Jesus, fazia as refeições com Ele, andava com Ele... e, contudo, O traiu. Neste ponto, o missionário percebeu uma admiração especial entre os indígenas... e compreendeu que Judas era o herói, o homem que correspondia exatamente ao mais alto ideal da tribo. Desesperado, ele se esforçou para lhes mostrar a maldade de tal ação; mas naquela noite não conseguiu apagar o brilho dos olhos dos sawis. O Filho da Paz Portanto, o traidor do Senhor Jesus, correspondia ao ideal dos sawis. Don Richardson orou pedindo a Deus a chave para entrar no coração daquela gente para que lhes fizesse entender a grande diferença que existe entre inimizade e traição e a santidade e o amor de Deus. Mas as dificuldades aumenta-

ram. Houve guerra com outra aldeia. Então o missionário presenciou como eles faziam as pazes: um pai do clã inimigo tomou um de seus filhos e o entregou a um homem da aldeia adversária, que o adotou. Dali em dinte, a criança tinha o direito de representar o outro grupo na aldeia dos sawis. Os demais habitantes impuseram as mãos sobre o “filho da paz” que havia sido entregue e firmaram uma aliança que, de acordo com a ética sawi, não podia ser violada mediante traição. Ali estava a chave para abrir o coração dos sawis. Deus enviou o Senhor Jesus, Seu amado Filho, para ser a ponte do intransponível abismo entre os homens e Deus, a fim de oferecer a paz aos Seus inimigos. Porém a humanidade rejeitou e matou o Filho de Deus. Segundo a concepção humana (e também a dos sawis), qualquer possibilidade de paz havia sido anulada. Mas o amor de Deus triunfou sobre o ódio humano. Exatamente em virtude da morte de nosso Senhor Jesus Cristo na cruz, Deus oferece perdão e salvação aos inimigos. Dessa maneira, muitos sawis compreenderam a mensagem de Jesus Cristo e abriram seu coração ao Evangelho. “Mas quando apareceu a benignidade e amor de Deus, nosso Salvador, para com os homens... segundo a sua misericórdia, nos salvou” (Tt 3, 4.5). Judas, o Traidor “Então Judas, o que traíra, vendo que [Jesus] fora condenado, trouxe arrependido, as trinta moedas de prata aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos, dizendo: Pequei, traindo o sangue inocente” (Mt 27, 3.4). Judas não era um dos discípulos do Senhor Jesus? Exteriormente, sim. Contudo, no íntimo ele era o um traidor. Você é capaz de imaginar tamanha vilania? Por mais de três anos Judas havia seguido o Mestre. Nenhum de seus companheiros suspeitava do tipo de homem que ele era um ladrão. Em sua ganância por dinheiro, ele tirava para si mesmo as ofertas que eram dadas para o ministério de Jesus Cristo. Essa ganância foi fatal! Nosso Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, que Se fez Homem para habitar entre os homens, foi rejeitado por Seu próprio povo e odiado pelos líderes da nação, que queriam matá-lo. Mas como poderiam chegar até Ele? Já tinham tentado algumas vezes, porém ninguém Lhe tocou, pois Sua hora ainda não havia chegado. Então surgiu a oportunidade para Judas. “Que me quereis dar, e eu vo-lo entregarei?” (Mateus 26,15). Como os sacerdotes se alegraram! Eles deram ao traidor trinta moedas de prata como recompensa. Então Judas veio juntamente com os “príncipes dos sacerdotes e os anciãos do povo” para prender o Senhor, saudou-O com um beijo hipócrita e assim O traiu. Será que Judas acreditava que as coisas iriam seguir um rumo diferente? O Senhor Jesus não evitou a prisão como em outras ocasiões. Ele foi levado à corte e condenado. Quando Judas viu isso, tentou devolver o dinheiro, dizendo: “Pequei, traindo o sangue inocente.” Mas os chefes dos sacerdotes não mostraram nenhum interesse: “Que nos importa? Isso é contigo.” Ao ouvir isso, Judas 17 - In Guardia - fevereiro de 2012


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jogou as moedas no chão do templo e foi se enforcar. A confissão de Judas não era genuína. Apenas a pressão das circunstâncias a trouxe à luz. Portanto, aos olhos de Deus não era válida. E em sua vida, o que a pressão do dia de hoje tem revelado? Judas Iscariotes “... e Judas Iscariotes, que se tornou um traidor” (Lc 6, 16). O reverendo americano Martin R. de Haan II, pergunta: “O que estava errado com esse homem? Como pôde viver mais de três anos no círculo íntimo de Cristo e então trair o melhor amigo que já tivera?” O editor dos Ministérios RBC-EUA, Rev. Dennis Fisher responde: “Judas é um caso desconcertante. Ele foi escolhido por Jesus para ser um dos 12 apóstolos e tinha a confiança do grupo para cuidar das suas finanças. Por mais de três anos ele ouviu como Jesus ensinava e viu os seus milagres. Porém, depois de ser testemunha daquilo que os cristãos dos 20 séculos seguintes gostariam de ter visto, Judas conspirou traindo a Jesus por 30 moedas de prata – o preço ínfimo de indenização pago por um escravo morto acidentalmente (Êxodo 21,32)”. As vidas de Judas e de Jesus contrastavam fortemente. Judas queria explorar os outros a seu próprio favor, Jesus tinha a intenção de dar a sua vida por eles. Judas permaneceu por detrás dos bastidores a maior parte do tempo. Entretanto, quando estava em jogo uma grande soma de dinheiro, seu coração avarento o empurrou para o centro do palco. Seus motivos eram egoístas e não altruístas. O apóstolo João foi o único dos evangelistas que mencionou a verdadeira motivação por trás da aparente justiça de Judas: “Ele Judas não falou isso por se interessar pelos pobres, mas porque era ladrão; sendo responsável pela bolsa de dinheiro, costumava tirar o que nela era colocado”. (João 12,6). Judas tinha a habilidade de tomar para si o que pertencia aos outros. São João escreveu que Judas “sendo responsável pela bolsa de dinheiro, costumava tirar o que nela era colocado” (12,6). A frase “o que nela era colocado” tem um paralelo inte-

ressante, pois Satanás colocou em Judas a idéia de trair a Jesus (13,2). Judas pensou que sua habilidade de enganar e desviar dinheiro eram formas de manter controle, mas, pelo contrário, foi assim que ele perdeu o controle. Ele se abriu para o mal e fez o jogo de Satanás, para sua própria destruição. Ele não resistiu à armadilha do diabo, não foi submisso a Lei de Deus e deu lugar ao diabo (Ef 4,27; Tg 4,7). Judas auto-consumiu pela overdose do seu egocentrismo radical. Para ficarmos livres dessa overdose catastrófica e de toda armação diabólica, São Pedro dar o remédio: “Humilhai-vos sob a poderosa mão de Deus. Sede sóbrios e vigilantes contra o diabo. Resisti-lhe, firme na fé” (1 Pd 5,6-9¬). Cabe ao servo de Deus a virtude da humildade radical para vencer os inimigos. O Beijo traidor Os judeus haviam festejado a páscoa por milhares de anos e a liturgia era familiar para todos. Cada qual a celebrava com a mesma comida, na mesma seqüência, com as mesmas orações e leituras das Escrituras, antes de cada prato. Mas aquela Páscoa foi diferente para 12 homens judeus. Seu Mestre fez uma afirmação assustadora: “Digo-lhes que certamente um de vocês me trairá” (João 13,21). Mas a declaração não terminou ali. Jesus lhes falou quem seria o traidor. “Aquele a quem eu der este pedaço de pão molhado no prato”. Então, molhando o pedaço de pão, deu-o a Judas Iscariotes, filho de Simão (João 13,26). No antigo Oriente Médio, o anfitrião de um banquete costumava tomar um pedaço de pão, molhá-lo e dá-lo ao convidado de honra. Alguns sugerem que Jesus fez isso como um último gesto de amor para com Judas. Mas Judas havia endurecido o seu coração. Tão logo Judas comeu o pão, Satanás entrou nele. “O que você está para fazer, faça depressa”, disse-lhe Jesus (v.27). É chocante pensar que o próprio diabo estava presente nesse momento tão sagrado. Enquanto Deus realizava um novo pacto para a redenção de seu povo, Satanás realizava o seu propósito de obstruir aquele plano, entrando na mente de Judas. Por meio de algumas decisões insensatas e deliberadas, Judas se tornou a pessoa chave à traição do Filho de Deus. Mas ninguém à mesa entendeu por que Jesus lhe disse isso. Visto que Judas era o encarregado do dinheiro, alguns pensaram que Jesus estava lhe dizendo que comprasse o necessário para a festa, ou que desse algo aos pobres. Assim que comeu o pão, Judas saiu. E era noite (João 13,28-30). Os outros discípulos ainda não entenderam que Judas estava saindo para trair a Jesus. Eles acharam que estava indo comprar algo para suas necessidades ministeriais ou para dar algo aos pobres. Jesus e os outros discípulos deixaram o cenáculo, cruzaram o Vale do Cedrom e entraram num jardim no Monte das Oliveiras. Era um lugar de descanso para eles e Judas sabia disso. Judas voltou aos sumo-sacerdotes para fazer os acordos finais a fim de capturar Jesus. Eles concordaram que um beijo seria o sinal que Judas usaria para identificar o alvo (Mateus 26,47-56). Um destacamento militar de mais de 200 soldados romanos (estacionados na Fortaleza


Antônia, perto do templo em Jerusalém) acompanhou a guarda do templo, que executava as ordens das autoridades religiosas, ou Sinédrio. Era necessário um grupo grande para controlar algum distúrbio, caso os seguidores de Jesus mostrassem alguma resistência. Tendo a Judas Iscariotes como líder, os oficiais religiosos e essa escolta militar ameaçadora foram à procura de Jesus. Armados com lanças e espadas, os soldados levavam tochas e lanternas, criando sombras ameaçadoras na noite escura, ao se dirigirem para a tranqüila caverna onde Jesus havia levado os discípulos para orar (João 18,1-3). O cortejo ameaçador não foi uma surpresa para Jesus, mas em vez de tentar escapar, se submeteu a eles em obediência ao plano de seu Pai. São João escreveu: Jesus, sabendo tudo o que lhe ia acontecer, saiu e lhes perguntou: “A quem vocês estão procurando?” “A Jesus de Nazaré”, responderam eles. “Sou eu”, disse Jesus. (E Judas, o traidor, estava com eles.) Quando Jesus disse “Sou eu”, eles recuaram e caíram por terra (João 18:4-6). Novamente lhes perguntou: “A quem procuram?” E eles disseram: “A Jesus de Nazaré”. Jesus lhes respondeu “Já lhes disse que sou eu. Se vocês estão me procurando, deixem ir embora esses homens”. Isso aconteceu para que se cumprissem as palavras que ele dissera: “Não perdi nenhum dos que me deste” (João 18,7-9). Logo que confirmou a sua identidade, Jesus pediu aos guardas que deixassem seus discípulos ir embora. Por mais de três anos Judas fez parte do círculo mais íntimo dos discípulos. Ele pôde desfrutar da proximidade emocional com Jesus, mas manteve o seu coração fechado. Por recusar entregar a sua vontade ao Senhor Jesus, ele ficou vulnerável à ação de Satanás. Como conseqüência, o anjo caído passou a ter uma presença física através da qual podia se opor ao Filho encarnado de Deus. Jesus falou a Judas: “Amigo, o que o traz?” (Mateus 26,50). Então ele fez outra pergunta: “Judas, com um beijo você está traindo o Filho do homem?” (Lucas 22,48). A recusa do amor Nosso Senhor Jesus Cristo ensinou amar os inimigos, orar pelos perseguidores, ser servidor, lavou os pés dos discípulos, doou sua vida como exemplo para seus apóstolos e seguidores. Doutrinou com caridade abissal sobre a Santa Eucaristia. Sendo esta a mais verdadeira, perfeita e poderosa atitude da Nova e Eterna Aliança trazida por Ele. Exortou que só pode realizar esse Sacramento do Altar quando o amor autêntico for colocado de fato e de verdade em primeiro lugar. O amor, graça, perdão, doação, unidade e comunhão estavam conectadas e configuradas na instituição da Santíssima Eucaristia da Quinta Feira Santa, onde Judas participou. Judas estava ciente que Jesus Cristo se doava por meio da Eucaristia como sinal genuíno de vida e de salvação eterna. Tudo isso Judas sabia, porém, jogou tudo por terra. Judas entendeu, mas não viveu, recebeu, mas não praticou, conviveu com Cristo, mas não nasceu de novo. Por que Judas não reteve a riqueza de graça e a glória das moradas eternas? Porque a sua mente e seu coração estavam tomados por desejos diabólicos e a sua visão era terrena. A sua natureza perversa estava alimentada por demasiados desejos gananciosos. Judas é um tipo de pessoa que para alcançar o seu objetivo vale tudo. A sua ambição é o dinheiro, privilégios e riquezas.

Ele joga com os poderosos contra os pobres, os desvalidos, os órfãos e as viúvas. Judas tem a visão corrupta da vida, ele ama o lucro pela cultura de morte. Na política e na religião são os lugares onde se encontram o maior número de Judas Iscariotes. “Essa opção iscariotesca é a recusa do amor sagrado”. Conclusão Judas Iscariotes entrou para história como o personagem máximo da traição. É uma figura controvertida que deixou para teologia e a história um caldeirão de polêmica, por exemplo: “Ele foi predestinado para trair o Filho de Deus? ele traiu o Cristo por ideologia política ou para promoção de privilégios individualistas? Não teve escolha para sair dessa cena infame? Na instituição da Eucaristia ele comungou do sangue e do corpo de Cristo? Sua morte se deu na forca, na queda, ou por derramamento das entranhas? Ele está condenado eternamente ou não? Tenhamos consciência de tudo isso, e peçamos ao bom Deus sua graça para vivermos a obediência da sua gloriosa Palavra de Vida e de amor. Deus é a nossa meta e a nossa visão é o Céu. Em Deus temos tudo. Com humildade pratiquemos as boas obras de caridade para deixarmos um rastro de bondade e de honestidade às gerações futuras. Fontes Calendário Devocional Boa Semente de 2011. Fisher, Dennis. Judas. O Filho das Trevas, RBC Ministries, Grand Rapids, Michigan-USA, 2007. Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio Século XXI Escolar: O minidicionário da língua portuguesa, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000. 19 - In Guardia - fevereiro de 2012


Juventude, um Por Pedro Brasilino

Ao nosso redor pode haver a escuridão e as trevas, e, todavia vemos uma luz: uma chama pequena, minúscula, que é mais forte do que a escuridão, aparentemente tão poderosa e insuperável. Cristo, que ressuscitou dos mortos, brilha neste mundo, e faz de modo mais claro precisamente onde tudo, segundo o juízo humano, parece lúgubre e sem esperança 20 - In Guardia - fevereiro de 2012

A juventude na Palavra de Deus Já na Sagrada Escritura é possível encontrar um Deus que quer falar ao jovem. É, também, possível encontrar a voz da juventude. Bons exemplos disso não faltam: no Eclesiastes, nos Salmos de Davi, no livro de Isaías e outros. Temos também a vocação do profeta Jeremias, capítulo 1 versículo 4 e seguintes. Nesse texto, vemos um jovem que quer colocar sua juventude e seus medos como empecilho para fazer a vontade do Senhor. Vemos, sobretudo, um Deus que a partir do nosso sim (Fiat) faz sua obra através de nós. Um Deus que escuta nossos medos e dificuldades e que diz: “Não tenhais medo deles, pois estou contigo para defender-te”. Um Deus que estende a mão e que toca a boca de Jeremias e diz: “Eu ponho minhas palavras na tua boca.” Na figura de São João Evangelista vê-se Jesus que escolhe não só aqueles que podem contribuir com a experiência de uma longa vida, mas, também escolhe a grande capacidade de sonhar própria da juventude – era João o discípulo amado. É João quem escreve em sua primeira carta no capítulo 1 versículo 13b: “Eu vos escrevo, jovens: vencestes o Maligno.” A juventude e atual relação com a Igreja Colhemos hoje os agradáveis frutos do Concílio Vaticano II que, com uma abertura austera e de objetivo muito claro, quer dar às diversas faces da Igreja de Deus oportunidades de um real e transformador encontro com Jesus Cristo. Com convicção podese afirmar que as Jornadas Mundiais da Juventude vêm como um desses frutos. Pode-se construir a ideia de um valor de prioridade na figura do jovem a partir dos documentos sobre o setor de juventude da CNBB, além das orientações do V CELAM, realizado em Aparecida-SP, com a presença dos Bispos da América Latina e do vigário de Cristo. Desta maneira, deve-se recordar a figura do Beato João Paulo II, que participou ativamente do Concílio Vaticano II e iniciou as Jornadas Mundiais promovendo a ideia de uma juventude que fosse além do aspecto cronológico e que assim pudesse avançar no correr dos anos com um espírito jovial. Contudo, não é possível falar desse projeto de salvação e construção de uma “civilização do amor” sem fazer menção ao atual sucessor de Pedro. O Papa Bento XVI abraçou os deveres de chefe da Igreja Católica Apostólica Romana já às portas da JMJ realizada em seu país natal, a Alemanha. Em Colônia e a partir dela celebraram-se sempre as jornadas dos dois Papas. Antes de Madri, o Papa Bento escreveu aos jovens dizendo que as Jornadas são espaços frutuosos para se ter um encontro pessoal com Jesus Cristo, fazendo d’Ele um companheiro de vida. Observa-se, claramente, a beleza de uma Igreja que se preocupa com a juventude naquilo que toca suas necessidades, suas preocupações e medos, suas tendências, seu acesso às boas condições de estudos e ao mercado de trabalho. Percebe-se, também, um bom número de jovens que têm conseguido enxergar essa realidade na Igreja. Uma Igreja que quer se preocupar com o que a juventude pensa e que quer dar espaço para que o jovem fale e se


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ma prioridade da Igreja sinta ouvido. A seguir temos algumas palavras do discurso do Papa Bento XVI aos jovens na viagem apostólica em FRIBURGO- Alemanha, sábado, 24 de setembro de 2011: Ao nosso redor pode haver a escuridão e as trevas, e, todavia vemos uma luz: uma chama pequena, minúscula, que é mais forte do que a escuridão, aparentemente tão poderosa e insuperável. Cristo, que ressuscitou dos mortos, brilha neste mundo, e faz de modo mais claro precisamente onde tudo, segundo o juízo humano, parece lúgubre e sem esperança. Ele venceu a morte – Ele vive – e a fé n’Ele penetra, como uma pequena luz, tudo o que é escuro e ameaçador. Certamente quem acredita em Jesus não é que vê sempre só o sol na vida, como se fosse possível poupar-lhe sofrimentos e dificuldades, mas há sempre uma luz clara que lhe indica um caminho que conduz à vida em abundância (cf. Jo 10, 10). Os olhos de quem acredita em Cristo vislumbram, mesmo na noite mais escura, uma luz e vêem já o fulgor dum novo dia. A luz não fica sozinha. Ao seu redor, acendem-se outras luzes. Sob os seus raios, delineiam-se de tal modo os contornos do ambiente que nos podemos orientar. Não vivemos sozinhos no mundo. Precisamente nas coisas importantes da vida, temos necessidade de outras pessoas. Assim, de modo particular na fé, não estamos sozinhos, somos anéis na grande corrente dos crentes. Ninguém chega a crer, senão for sustentado pela fé dos outros; mas, por outro lado, com a minha fé contribuo para confirmar os outros na sua fé. Ajudamo-nos mutuamente a ser exemplo uns para os outros, partilhamos com os outros o que é nosso, os nossos pensamentos, as nossas ações, a nossa estima. E ajudamo-nos mutuamente a orientar-nos, a identificar o nosso lugar na sociedade. Entretanto, algumas tendências postas no meio da juventude têm desfavorecido a visão de que Jesus é a Luz do mundo e que nós também somos luz unidos a Ele. Seria inverídico não dizer que uma grande parcela da juventude não se relaciona bem com a Igreja ou mesmo com a Pessoa de Jesus Cristo. É sensível a presença de pessoas que se confessam por diversos motivos, ateus ou de correntes religiosas anticristãs. Também nesse aspecto, a Igreja tem adotado um discurso de unidade, ainda que as diferenças sejam muitas vezes contraditórias. Nenhum homem é uma ilha em si mesmo, todos nós somos pedaços de continente. Talvez, aprender a respeitar e amar o diferente, sem relativizar questões essenciais da profissão de fé católica seja um dos maiores desafios. Desafio esse de uma juventude que parece, cada vez mais, cansada de ver o histórico de guerras feitas com plano de fundo étnico/religioso. Novamente, podemos eleger as Jornadas Mundiais da Juventude como um bom espaço para o fortalecimento de uma nova consciência. Em Madri, os presentes no evento católico tiveram que enfren-

tar o protesto de parcelas da população européia laica, que não estavam de acordo com os gastos do governo em favor da visita papal e dos peregrinos. Na Jornada do Brasil essa realidade de conflito voltará a ser colocada. Desta vez não apenas com a participação dos laicos, mas, também com a presença de algumas correntes protestantes que já se manifestam contra o evento. Diante desta realidade os cristãos católicos terão mais uma vez que provar o gosto das opiniões contrárias sendo levadas às ruas e meios de comunicação. A resposta para tudo isso não deve ter outra base senão o Evangelho, onde é colocada a intenção de amar os inimigos e de rezar por aqueles que nos difamam. O próprio Jesus mostra do alto da Cruz essa verdade quando pede ao Pai que perdoe seus algozes, pois não sabem o que fazem. A Esperança da Juventude Uma juventude consciente do seu papel na Igreja e no mundo resulta no aumento da esperança. De fato, não é por acaso que o Sucessor de Pedro reservou muito de seu discurso no primeiro dia do ano de 2012 para falar aos jovens. Pois, se o próprio Deus quis por falar aos jovens na Sagrada Escritura, então, é justo que também o vigário de Cristo se dirija a juventude. “Ninguém te despreze por ser jovem. Ao contrário, torna-te modelo para os fiéis, no modo de falar e de viver, na caridade, na fé, na castidade”. (ITim4,12) Contudo, a fonte dessa esperança não pode ser outra senão o próprio Jesus Cristo que se torna tangível na Eucaristia e no amor encontrado nas relações humanas. Somos a luz no mundo, porque Ele é a luz do mundo. Que os jovens, filhos da luz, queiram levar e ser essa luz nos mais diversos e difíceis ambientes dissipando, assim, as trevas.


Modernidade e senso do ridículo 22 - In Guardia - fevereiro de 2012

Por Rafael Brodbeck

Li em vários lugares que algumas igrejas estão implantando, pretensamente por razões de segurança, um sistema de “velas eletrônicas”. Consistiria tal artifício em uma máquina, na qual o fiel depositaria uma moeda de determinado valor, fazendo o mecanismo “acender” uma “vela”. Não há fogo, não há chama, não há cera. A tal “vela” é um cilindro com luz elétrica na ponta. Ora, isso é a prova cabal da total falta de senso do ridículo. Como católico, não posso deixar de me insurgir contra um descalabro de tal proporção. Já não basta, à revelia das orientações da Santa Sé, aposentarem os órgãos e substituírem por bandas de rock, deixarem de lado as melodias gregorianas e polifônicas para inserirem letras teológica e espiritualmente pobres, de gosto estético duvidoso, quando não heréticas. Não basta, contrariamente ao que manda a Igreja, deixarem as batinas, as camisas clericais, as casulas, os incensos, a sacralidade na Missa, a tradição litúrgica. Não, isso não basta. É preciso inovar mais. Sem constante mutação, ignorando completamente o que o Papa Bento XVI chama de “hermenêutica da continuidade”, não pode haver a sonhada revolução que os modernistas, progressistas e “teólogos da libertação” de toda ordem implantam, no mínimo desde os anos 70 cá na Terra de Santa Cruz. Ora, a vela “tradicional”, se é que podemos chamar assim – dado que só existe um tipo de vela, e a eletrônica não é e nunca vai ser uma vela – tem uma força simbólica impressionante. Não se trata de mero apego ao passado, arcaísmo, birra. O tema é mais profundo. A cera que derrete representa que nos

consumimos diante do Senhor, que só podemos cumprir nossa missão quando nos esvaziamos, quando morremos para nós mesmos. A vela só ilumina se vai morrendo: assim é conosco, em analogia com a parábola do grão que é lançado à terra pelo semeador, morre e, de sua semente, sai o trigo. A vela só tem sentido quando vai lentamente se apagando, e, para que se apague, deve iluminar. Para que dê luz, deve, aos poucos, consumir-se, apagar-se, diminuirse. Sentido absolutamente cristão. Que coisa mais estranha uma “vela” que não se extingue! Representa, quiçá, uma vontade nada religiosa, quase atéia, de não morrer, de não se sacrificar por Deus e pelo próximo. É isso que indica a “vela eletrônica”. Querem preservar o patrimônio histórico de uma igreja centenária? E o patrimônio espiritual da Igreja, com “i” maiúsculo, que é bimilenar? Adaptar a linguagem da pregação, atualizar-se nas mais modernas técnicas de gerenciamento de grupos, de administração paroquial, usar sistemas de vigilância, luzes elétricas, alto-falantes, internet, tudo isso é lícito. É saber discernir os sinais dos tempos. Mas, sacrificar a piedade? Há outras formas de defender a paróquia de incêndios. O Vaticano e outras igrejas na Europa, tão ou mais antigas do que as nossas, não precisaram apelar para essa legítima dessacralização. Quando a vela de verdade se apaga para dar lugar a esse esdrúxulo sistema, é como se a fé católica fosse morrendo no coração do povo. Pergunto-me se não é isso que querem seus inimigos, ainda que, infelizmente, ministros ordenados da Igreja Católica…

A vela só ilumina se vai morrendo: assim é conosco, em analogia com a parábola do grão que é lançado à terra pelo semeador, morre e, de sua semente, sai o trigo. A vela só tem sentido quando vai lentamente se apagando, e, para que se apague, deve iluminar. Para que dê luz, deve, aos poucos, consumirse, apagar-se, diminuir-se. Sentido absolutamente cristão.


A homilia de Pedro MENSAGEM DE SUA SANTIDADE PAPA PAULO VI PARA A CELEBRAÇÃO DO XI DIA MUNDIAL DA PAZ 1 DE JANEIRO DE 1978 NÃO À VIOLÊNCIA, SIM À PAZ Ao mundo, à Humanidade, Nós ousamos dirigir, uma vez mais, a palavra suave e solene Paz. Esta palavra oprime-Nos e exalta-Nos. Ela não é nossa: desce do reino invisível, o reino dos céus; e Nós advertimos bem a sua transcendência profética, que não é extinguida pelos nossos humildes lábios, que lhe prestam a voz: « Paz na terra aos homens, a quem Deus quer bem » (Lc. 2, 14). Sim, Nós repetimos: a Paz deve existir! A Paz é possível! Este é o anúncio: é esta a nova, uma sempre nova e grande mensagem; é este o Evangelho, que também no dealbar do novo ciclo sidéreo, o ano da graça de 1978, Nós devemos ainda proclamar para todos os homens: a Paz é o dom oferecido aos homens, que eles podem, eles devem acolher e colocar no vértice dos seus espíritos, dos seus programas, das suas esperanças e da sua felicidade. A Paz - para já o recordamos - não é um sonho puramente ideal, não é uma utopia atraente, mas infecunda e inacessível; é, sim, e deve ser uma realidade: uma realidade móbil e a produzir em todas e cada uma das estações da civilização, do mesmo modo que o pão de que nos nutrimos, fruto da terra e da divina Providência, mas produto também do homem trabalhador. Porquanto a Paz não é um estado de ataraxia pública, em que quem dela desfruta está dispensado de toda e qualquer preocupação e defendido contra toda e qualquer importunação, e pode conceder-se uma felicidade estável e tranquila, a qual terá mais a feição de inércia e de hedonismo do que de vigor vigilante e operoso; a Paz é um equilíbrio que se apoia sobre o movimento e que desenvolve continuamente energias de espírito e de acção; é uma fortaleza inteligente e viva. Nós, por isso mesmo, também no limiar deste novo ano de 1978, suplicamos a todos os homens de boa vontade, às pessoas responsáveis pela conduta colectiva da vida social, aos Políticos, aos Pensadores, aos Publicistas, aos Artistas, aos inspiradores da opinião pública, aos mestres das escolas, da arte e da oração, e depois, aos grandes ideadores e operadores do mercado mundial de armas, a todos, que retomem com generosa honestidade a reflexão sobre a Paz no mundo, hoje! Parece-Nos a Nós que há dois fenómenos capitais que se impõem à atenção comum, com clara relevância na avaliação da mesma Paz. O primeiro fenómeno é magnificamente positivo, e é constituído pelo progresso evolutivo da Paz. Esta é uma ideia que vai conquistando prestígio na consciência da humanidade; ela vai avançando e precede e acompanha a ideia do progresso, que é a da unidade do género humano. A história do nosso tempo, há que dizê-lo para sua glória, está toda ela matizada pelas flores de uma esplêndida documentação em favor da Paz, pensada, querida, organizada, celebrada e defendida: Helsínquia o ensina.

E confirmam estas esperanças a próxima Sessão Especial da Assembleia Geral da ONU, consagrada ao problema do desarmamento, assim como os numerosos esforços de grandes e de humildes operadores da Paz. Ninguém hoje em dia ousa sustentar como princípios de bem-estar e de glória programas declarados de luta mortífera entre os homens, isto é, de guerra. Até mesmo onde as expressões comunitárias de um legítimo interesse nacional, sufragado por motivos que parecem coincidir com as razões prevalecentes do direito, não conseguem afirmar-se mediante a guerra, como via de solução, confia-se, ainda aí, que possa ser evitado o recurso desesperado ao uso das armas, hoje como nunca loucamente homicida e destruidor. Mas a consciência do mundo, no entanto, sente-se horrorizada pela hipótese de que a nossa Paz mais não seja do que uma trégua e de que uma incomensurável conflagração possa ser fulmineamente desencadeada. Nós quereríamos estar em condições de afugentar este imanente e terrível pesadelo, proclamando com grandes brados o absurdo da guerra moderna e a absoluta necessidade da Paz, não já fundada sobre o prevalecer das armas, hoje em dia dotadas de uma infernal potência bélica (recordemos a tragédia do Japão), ou sobre a violência estrutural de alguns regimes políticos, mas sim sobre o método paciente, racional e solidário da justiça e da liberdade, qual é o que as grandes instituições internacionais hoje existentes estão a procurar promover e tutelar. Nós confiamos em que os ensinamentos magistrais dos Nossos grandes Predecessores, Pio XII e João XXIII, hãode continuar a inspirar quanto a este tema fundamental a sapiência dos mestres modernos e dos homens políticos contemporâneos. Mas queremos aludir agora a um segundo fenómeno, este negativo e concomitante com o primeiro: é o fenó 23 - In Guardia - fevereiro de 2012


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meno da violência passional, ou cerebral. Ele está a difundir-se na vida civilizada moderna, valendo-se das facilitações de que goza a actividade do cidadão, para insidiar e ferir, à traição habitualmente, o concidadão-irmão que constitua legalmente obstáculo a um interesse próprio. Esta violência assim, que podemos ainda denominar privada, se bem que astutamente organizada em grupos clandestinos e facciosos, está a assumir preocupantes proporções, tais que a fazem tornar-se costume. Poder-se-ia defini-la como delinquência, pelas expressões anti-jurídicas com que ela se caracteriza; mas as manifestações que, de há tempos para cá e nalguns ambientes, ela tem vindo a apresentar, exigem uma análise apropriada, assaz diversificada e difícil. Promana a violência de uma decadência da consciência moral, não educada, não assistida, permeada habitualmente de um pessimismo social, que extinguiu no espírito o gosto e o empenho pela honestidade professada por si mesma, bem como aquilo que há de mais belo e de mais ditoso no coração humano, o amor, o amor verdadeiro, nobre e fiel. Com frequência a psicologia do violento tem como ponto de partida uma raiz perversa de vingança ideal, e por conseguinte de uma justiça insatisfeita, curtida em pensamentos amargos e egoístas, e potencialmetne desabusada e desenfreada no sentido de alcançar o ojectivo seja ele qual for; e então o possível substitui-se ao honesto; o único entrave é o temor de incorrer em alguma sanção pública ou privada; e por isso, o modo de comportar-se habitual de uma tal violência é o de agir às escondidas e de perpetrar actos vis e proditórios, que compensam a mesma violência com o sucesso impune. A violência não é fortaleza. Ela é, sim, a explosão de uma energia cega, que degrada o homem que a ela se entrega, rebaixando-o do plano racional para o nível passional; e até mesmo quando a violência conserva um certo domínio de si, ela procura vias ignóbeis para se afirmar, as vias da insídia, da surpresa, da vantagem física em confronto com um adversário mais fraco e talvez indefeso; vale-se da surpresa e do medo deste adversário e do desvario próprio; e se isso se passa assim entre os dois contendentes, qual deles será o mais vil ? E quanto a um aspecto da violência erigida em sistema « para ajustamento de contas », não recorre, ela, acaso, a formas abjectas de ódio, de rancor e de inimizade que constituem um perigo para a convivência e que desclassificam a comunidade, na qual a mesma violência vai decompondo os próprios sentimentos de humanidade, que formam o tecido primário e indispensável de qualquer sociedade, seja ela familiar, tribal ou comunitária? A violência é anti-social pelos próprios métodos que lhe permitem organizar-se com uma cumplicidade de grupo, no qual uma desviada e secretíssima solidariedade constitui o cimento de coesão e o escudo de protecção; um desonrante sentido da honra confere-lhe um paliativo de consciência; e está aqui uma das deformações hoje di-

fundidas do verdadeiro sentido social, que encobre com o segredo e com as ameaças de vingança sem piedade certas formas associadas de egoísmo colectivo, desconfiado em relação à legalidade normal, e sempre hábil para iludir a sua observância, tramando, como que por força das coisas, empresas criminosas, as quais algumas vezes degeneram em actos de desapiedado terrorismo, epílogo da falsa via adoptada e causa de lamentáveis repressões. A violência leva à revolução, e a revolução à perda da liberdade. É errado o eixo social em torno do qual a violência faz girar o próprio fatal desenvolvimento; tendo explodido como uma reacção de força, não privada por vezes de um impulso lógico, ela conclui o seu ciclo contraposta a si própria e aos motivos que provocaram a sua intervenção. É caso para recordar, talvez, a frase lapidar de Cristo contra o recurso ao uso impulsivo de uma espada vingadora: « ... Todos quantos se servirem de espada, à espada morrerão » (Mt. 26, 52). Recordemos, portanto: a violência não é fortaleza. Ela não exalta, mas rebaixa o homem que a ela faz recurso. Nesta mensagem de Paz Nós falamos da violência como do termo antagonista da mesma, e não falámos da guerra, a qual continua ainda agora a merecer a nossa condenação, muito embora a mesma guerra nos dias de hoje tenha uma sua reprovação, cada vez mais difundida, e tenha contra si um louvável esforço cada dia mais qualificado, quer socialmente, quer politicamente; e depois, também porque a guerra é reprimida pela mesma terribilidade das próprias armas de que ela poderia imediatamente dispor na supertrágica eventualidade de que lá ela viesse a rebentar. O medo, comum a todos os Povos e especialmente aos mais fortes, reprime a eventualidade de a guerra vir a desencadear-se numa conflagração cósmica. E ao medo, reparo mais mental do que real, vem fazer companhia, Nós já o dissemos, um esforço racional e elevado aos supremos níveis políticos, o qual deve tender não tanto para equilibrar as forças dos eventuais contendores, quanto para demonstrar a suprema irracionalidade da guerra e, ao mesmo tempo, para estabelecer entre os Povos relações cada vez mais interdependentes e por fim solidárias, e cada vez mais amigáveis e humanas. Queira Deus que assim seja. Entretanto, não podemos fechar os olhos perante a triste realidade da guerra parcial, quer pela razão de ela manter a sua feroz presença em zonas particulares, quer pelo motivo de, psicologicamente, ela não estar de facto excluída nas sombrias hipóteses da história contemporânea. A nossa guerra contra a guerra ainda não está vencida; e o nosso « sim » à Paz é ainda mais optativo do que real, porque em muitas situações geográficas e políticas, que ainda não foram compostas na base de soluções justas e pacíficas, permanece endémica a hipótese de futuros conflitos. O nosso amor à Paz tem de permanecer de sobreaviso; também ou-


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tras perspectivas, que não apenas a de uma nova guerra mundial, nos obrigam a considerar e a exaltar a Paz, mesmo fora das trincheiras militares. E de facto nós devemos hoje defender a Paz sob o seu aspecto - poderíamos dizer - metafísico, anterior e superior ao aspecto histórico e contingente da pausa militar e da externa « tranquilitas ordinis » ( tranquilidade da ordem); queremos considerar a causa da Paz espelhada na causa da própria vida humana. O nosso « sim » à Paz, estende-se a um « sim » à Vida. A Paz deve afirmar-se não somente nos campos de batalha, mas também onde quer que se desenrola a existência do homem. Há, ou melhor, tem de haver também uma Paz que defen- da esta existência, não apenas das ameaças das armas bélicas, mas uma Paz que, para além disso, proteja a vida enquanto tal, contra todo e qualquer perigo, contra todos os danos e contra todas as insídias. E o discurso aqui poderia ser vastíssimo; os nossos pontos de referência, porém, agora são poucos e determinados. Existe no tecido da nossa civilização uma categoria de Pessoas doutas, valorosas e bondosas, as quais fizeram da ciência e da arte de cuidar da saúde a sua vocação e a sua profissão: são os Médicos e todos aqueles que, com eles e sob a sua direcção, estudam e trabalham em prol da existência e do bem-estar da humanidade. Honra lhes seja e reconhecimento a estes sapientes e generosos tutores da vida humana. Nós, ministros da Religião, olhamos para esta distintíssima categoria de Pessoas adictas ao serviço da saúde física e psíquica da humanidade, com uma grande admiração, com uma grande gratidão e com uma grande confiança. Por muitos motivos, a saúde física, o remédio para as doenças, o alívio para a dor, a energia do desenvolvimento e do trabalho, a mesma duração da existência temporal e até uma boa parte da vida moral, dependem da sabedoria e dos cuidados destes protectores, defensores e amigos do homem. Nós estamos muito ao lado deles e, na medida em que isso Nos é possível, apoiamos o seu labor, a sua honra e o seu espírito. E esperamos da nossa parte poder tê-los solidários connosco no afirmar e no defender a Vida humana, naquelas singulares contingências em que a mesma Vida pode vir a achar-se comprometida, por um positivo e iníquo propósito da vontade humana. O nosso « sim » à Paz significa também « sim » à Vida. A vida do homem, desde o seu primeiro acender-se para a existência, é sagrada. A lei do « não matarás » tutela este inefável prodígio da vida humana com transcendente soberania. É este o princípio que governa o nosso ministério religioso em ordem ao ser humano. Nós confiamos em ter por aliado o ministério terapêutico.

E não menos confiamos também naquele outro ministério, que deu princípio à vida humana, o gerador, o ministério materno em primeiro lugar. Oh! Quanto se torna delicado o nosso discurso, quanto é marcado pela comoção, quanto é piedoso e quanto é veemente! A Paz tem neste campo da vida que nasce o seu primeiro escudo de protecção; um escudo, aliás, munido de delicados resguardos, mas escudo de defesa e de amor. Nós não podemos, por isso mesmo, senão desaprovar toda e qualquer ofensa contra a vida que nasce, e não podemos senão suplicar a todas as Autoridades e a todas as entidades competentes que ajam para que ao aborto voluntário seja feita proibição e seja dado remédio. O seio materno e o berço da infância são as primeiras barreiras que não apenas defendem com a vida a Paz, mas também a constroem (cfr. Sl. 126, 3, ss.). Quem escolhe, em oposição à guerra e à violência, a Paz, escolhe por isso mesmo a Vida, escolhe o Homem com as suas exigências profundas e essenciais; e é este o sentido da presente mensagem, que uma vez ainda Nós enviamos, com humildade e ardente convicção, aos Responsáveis pela Paz sobre a terra e a todos os Irmãos do mundo. E nós devemos acrescentar ainda uma apostila para todas as Crianças e Jovens, que defronte à violência são o sector mais vulnerável da sociedade, mas, ao mesmo tempo, a esperança de um amanhã melhor: que também a eles chegue, mediante alguma via benévola e inteligente, esta Mensagem em favor da Paz. Digamos os porquês. Primeiro porquê: nas Mensagens em favor da Paz dos anos precedentes, pusemos em realce que Nós não falamos em nosso nome somente, mas falamos sim em nome de Cristo, que é « o Príncipe de Paz » no mundo (cfr. Is. 9, 6) e que disse: « Bem-aventurados os pacíficos, porque eles serão chamados filhos de Deus » (Mt. 5, 9). Nós cremos que sem a orientação e sem a ajuda de Cristo a Paz verdadeira, estável e universal não é possível. E cremos também que a Paz de Cristo não enfraquece os homens, não os torna gente medrosa e vítima das prepotências dos outros, mas antes os faz capazes de lutar pela justiça e de solucionar muitas questões com a generosidade, ou melhor com o talento do amor. Segundo porquê. Vós, crianças e jovens, com frequência sois levados a brigar uns com os outros. Lembrai-vos bem: é uma vaidade nociva o querer parecer fortes contra os outros irmãos e companheiros com a rixa, com as pancadas, com a ira e com a vingança. Todos fazem assim, respondereis vós. E está mal, dizemo-vos Nós; se quereis ser fortes, sede-o com a coragem, com o vosso porte digno; procurai saber dominar-vos; e procurai saber também perdoar a voltar rapidamente a ser amigos daqueles que vos ofenderam: assim estareis a ser verdadeiramente cristãos. Não odieis ninguém. Não sejais orgulhosos em relação aos outros coetâneos e às pessoas de diversa condição social ou de outros Países. Não ajais por interesse egoísta ou por despeito e nunca por nunca ser por vingança, repetimos. Terceiro porquê. Nós pensamos que vós, crianças e jovens tornado-vos grandes, deveis mudar a maneira de pensar e de agir do mundo de hoje, o qual está sempre pronto para se distinguir, para se separar dos outros e para os combater: não somos nós todos irmãos? Não somos todos membros da mesma Família humana? E não estão todas as Nações obrigadas a daremse bem umas com as outras e a criarem a Paz? Vós, crianças e jovens do tempo novo, deveis habituar-vos a amar a todos e a procurar dar à sociedade o aspecto de uma comunidade melhor, mais honesta e mais solidária. Quereis na verdade ser homens, e não lobos? Quereis na verdade ter o merecimento e a alegria de fazer bem, de ajudar quem tem precisão, de procurar realizar alguma boa obra, com o prémio apenas da consciência? Pois bem, recordai-vos das palavras ditas por Jesus durante a última ceia, na noite antes da sua paixão. Ele disse assim: « Dou-vos um mandamento novo: que vos ameis uns aos outros ... E nisto precisamente todos reconhecerão que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns pelos outros » (Jo. 13, 34-35). É este o sinal da nossa autenticidade, humana e cristã, querer-nos bem uns aos outros. Crianças e jovens, Nós vos saudamos e abençoamos a todos. Palavra de ordem: Não à violência; sim à Paz. Recomendamo-vos a Deus! Vaticano, 8 de Dezembro de 1977.


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Os Reis magos na iconog

Por Rafael de Mesquita Diehl Há duas formas possíveis de representação dos reis magos na iconografia: a histórica e a alegórica. A forma histórica foca o episódio comemorado: o relato dos Santos Evangelhos da adoração de Nosso Senhor Jesus Cristo pelos magos do Oriente. A representação alegórica, por outro lado, foca no significado da festa e do episódio comemorado: a manifestação de Cristo ao mundo e seu reconhecimento pelos povos pagãos, representados na figura dos magos.[1] A representação mais utilizada nos primeiros séculos da Igreja e durante a antiguidade tardia foi a histórica. Os magos eram representados vestidos em trajes persas[2] reverenciando o Menino Jesus, entronizado ou sentado no colo da Virgem. É assim que os vemos representados nos túmulos dos primeiros cristãos e nos mosaicos das basílicas. A representação alegórica surge a partir da Alta Idade Média[3]. Nesse período, os três magos passam a representar os diversos povos, descendentes dos três filhos de Noé. Também passam a ser representados em vestes régias (algumas vezes eram representados como reis contemporâneos ao artista, vide a iluminura de Jean Fouquet em que o rei Carlos VII da França é representado como um dos magos), simbolizando a homenagem de todos os reis da terra ao Rei dos Reis. No Renascimento essa representação alegórica fica mais significativa, pois cada um dos magos é representado como uma raça ou etnia (e, algumas vezes, representam também as três idades do homem): um representando os europeus, outro os africanos e outro os povos do Oriente Médio. Inclusive, existe uma curiosa pintura datada de cerca de 1500, cuja autoria é geralmente atribuída ao português Vasco Fernandes ou Grão Vasco. Nela, um dos magos é repre-

sentado como um índio Tupi, o que demonstra o desejo dos cristãos daquele tempo em incluir os povos do Novo Mundo no rebanho dos fiéis de Cristo. É importante que conheçamos esses pormenores das representações iconográficas das cenas do Evangelho e das festas litúrgicas para podermos penetrar melhor em seus significados. Mais do que uma ocasional visita de importantes pessoas do Oriente, a adoração dos Magos é um sinal de que Cristo veio para salvar a todas as nações. Por isso que enviou o sinal aos pagãos do Oriente para que pudessem vir a conhecê-Lo e prestar-Lhe homenagem. Notas: [1] Para histórico e significado da festa da Epifania, consulte: MARTYNDALE, Cyril. Verbete “Epifanía”. In: Enciclopédia Católica. Disponível em: http://es.aciprensa.com/e/ epifania.htm

[2] Os magos eram provavelmente sacerdotes e astrólogos Medos (os medos eram um povo da pérsia). De fato, era isso que a palavra grega magoi geralmente designava. A favor desta tese estão os testemunhos da primitiva iconografia cristã que sempre os representou trajados aos moldes sacerdotais persas. Tertuliano no século III disse que os magos seriam de estirpe régia, o que é possível dado que os magos integraram algumas dinastias persas e durante a dinastia dos Partos exerceram funções de conselheiros reais. Não se sabe ao certo quantos eram, mas a tradição posterior acabou fixando o número três, baseando-se no fato de terem sido três os presentes oferecidos a Cristo. É provável


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grafia cristã que tenham viajado com grande comitiva, haja vista serem pessoas de prestígio e estarem fazendo uma viagem de longo percurso. Para mais informações sobre os Magos, vide: DRUM, Walter. Verbete “Reyes Magos”. In: Enciclopedia Católica. Disponível em: http://ec.aciprensa.com/m/magos. htm [3] Provavelmente essa nova forma de representação tenha sido fortemente influenciada pelo alegorismo litúrgico, surgido a partir da Alta Idade Média. De fato, a Liturgia da Igreja aplica para a solenidade da Epifania as palavras do Profeta Isaías Omnes de Saba venient aurum et thus deferentes et laudem Domino annuntiantes (Is 60, 6) para o Gradual e o verso do Salmista Reges Tharsis et insulae munera offerent reges Arabum et Saba dona adducent et adorabunt eum omnes reges terrae omnes gentes servient ei (Sl 71, 10-11) para o Ofertório da Missa. Para maiores informações sobre o alegorismo litúrgico vide: JUNGMANN, Josef Andreas, SJ. Missarum Solemnia Origens, liturgia, história e teologia da Missa Romana. São Paulo: Paulus, 2009. pp. 102-108; RIGHETTI, Mario, OSB. Historia de la Liturgia. Vol. I. Madrid: Biblioteca de Auctores Cristianos, 1955. pp. 55-58. Saiba mais: DIEHL, Rafael de Mesquita. Quem eram os magos do Evangelho? Disponível em: http://civilitaschristiana.blogspot.com/2012/01/quem-eram-os-magosdo-evangelho.html


A Virgem de Guadalupe 28 - In Guardia - fevereiro de 2012

Por Lizandra Danielle Situação histórica O século XVI foi marcado pelo crescimento do Protestantismo. Em 1517, na Alemanha, o frade agostiniano Martinho Lutero começou a sua revolta pregando uma lista com noventa e cinco teses contra a Igreja Católica na porta da igreja do castelo de Wittenberg, na véspera do dia de Todos os Santos. A partir daí começaram a aparecer vários movimentos reformadores, como os de Huldreich Zwínglio (1484/1531) e João Calvino (1509/1564), ambos na Suíça. O início do século XVI também foi marcado pela invasão e conquista da civilização asteca pelos espanhóis. Na época das aparições de Nossa Senhora de Guadalupe a cultura pagã era muito forte na região do México. Muitas tribos indígenas costumavam oferecer sacrifícios humanos aos seus deuses. O Império Asteca foi responsável pela morte de milhares de homens, mulheres e crianças em rituais cruéis de sacrifícios oferecidos aos deuses e até mesmo aos demônios cultuados, o principal deles denominado Tlacaellel. Alguns rituais foram registrados e o pior deles foi em 1487, quando foram oferecidos cerca de oitenta mil homens num período de quatro dias, em honra ao novo templo dedicado ao deus Huitzilopochtli. Aparições No México, Nossa Senhora recebeu o título de “Guadalupe”. As aparições foram registradas na língua azteca (Nahuatl) por An-

tônio Valeriano, que era de origem indígena. Ele relata que um índio da tribo Quauhtlatoatzin, batizado posteriormente com nome de Juan Diego, nascido em 1474, teve a honra de receber a visão e as mensagens de paz de Maria Santíssima. Em uma bela manhã de sábado, no dia 9 de dezembro de 1531, o índio Juan Diego foi até um morro chamado Tepeyac, e, de repente começou a escutar os pássaros cantarem. Tomado pela curiosidade, decidiu ir até o cume. Quando chegou lá avistou uma linda mulher toda revestida de luz cujos raios refletiam em tudo que estava ao seu redor, as plantas pareciam feitas de ouro e prata e o lugar onde seus pés se apoiavam tinha a aparência de várias pedras preciosas. A mulher se dirigiu a Juan dizendo as seguintes palavras: - ”Sabe e entende, tu é o mais humilde dos meus filhos. Eu sou a Sempre Virgem Maria, Mãe do Deus Vivo por quem nós vivemos, do Criador de todas as coisas, Senhor do céu e da terra. Eu desejo que um templo seja construído aqui, rapidamente; então, Eu poderei mostrar todo o meu amor, compaixão, socorro e proteção, porque Eu sou vossa piedosa Mãe e de todos os habitantes desta terra e de todos os outros que me amam, invocam e confiam em mim. Ouço todos os vossos lamentos e remédio todas as vossas misérias, aflições e dores. E para realizar o que a minha clemência pretende, vá ao palácio do Bispo do México e lhe diga que Eu manifesto o meu grande desejo, que aqui neste lugar seja construído um templo para mim. Tu dirás exatamente tudo que viste, admiraste e ouviste. Tem a certeza que ficarei muito agradecida e te recompensarei. Porque Eu te farei muito feliz e digno da minha recompensa, por causa do esforço e fadiga que terás para cumprir o que Eu te ordeno e confio. Observa, tu ouviste minha ordem, meu humilde filho, vai e coloca todo teu esforço.“ Juan não teve medo e logo depois se pôs a fazer o que lhe havia sido pedido pela Mãe Celeste. Caminhou rapidamente até a Cidade do México à procura do Bispo Juan de Zumarraga, da ordem franciscana. Chegando ao palácio do Bispo, pediu para ser anunciado e, momentos depois, entrou e logo se ajoelhou, contando ao Bispo tudo o que vira e ouvira. Infelizmente, o Bispo não


lhe deu muito crédito e pediu para que voltasse outra hora. Muito triste, Juan saiu do palácio e foi direto ao topo da montanha onde a Vigem se encontrava. Numa segunda aparição no morro Tepeyac, o índio pediu à Senhora que mandasse uma pessoa mais importante e bem conhecida em seu lugar para cumprir o que queria, porém, Nossa Senhora lhe respondeu: - ”Escuta, meu filho caçula, deves entender que eu tenho vários servos e mensageiros, aos quais Eu posso encarregar de levar a mensagem e executarem o meu desejo, mas eu quero que tu mesmo o faças. Eu fervorosamente imploro, meu caçula, e com severidade Eu ordeno que voltes novamente amanhã ao Bispo. Tu vais em meu Nome e faze saber meu desejo: que ele inicie a construção do templo como Eu pedi. E novamente dize que Eu, pessoalmente, a Sempre Virgem Maria, Mãe de Deus Vivo, te ordenei.“ Juan ficou muito temeroso em cumprir o que a Virgem lhe havia pedido por se considerar indigno de tamanha confiança, mas, como um bom servo inclinou-se diante Dela e obedeceu-a. No dia seguinte, dia 10 de dezembro (domingo), o índio foi à missa por volta das 10 da manhã, em seguida foi ao encontro do Bispo que, com muita má vontade o atendeu novamente. Juan ajoelhou-se e implorou para que o Bispo acreditasse nele, pois era uma ordem da Maria Santíssima. Chorando aos pés do Bispo pediu-lhe que construísse um templo onde Ela lhe havia aparecido. O Bispo, porém, fez várias perguntas e concluiu que ele estava muito firme em suas colocações, mas que isso ainda não provava nada. Pediu então que lhe desse um sinal qualquer, só então acreditaria ser ele o enviado da Senhora do Céu. Quando Juan saiu do palácio o Bispo ordenou a algumas pessoas de sua casa que o acompanhassem até o local onde supostamente teria acontecido a aparição e que o observassem em todo momento. No meio do caminho eles perderam Juan de vista e tiveram que voltar para o palácio onde deram a desculpa que tinham sido enganados pelo índio. Furiosos, o Bispo e seus acompanhantes planejaram castigá-lo, caso ele voltasse contando as mesmas mentiras. No mesmo dia Juan foi se encontrar com a Senhora para contar que o Bispo estava ordenando um sinal para que sua mensagem fosse provada. Maria então lhe disse: - ”Muito bem, meu querido filhinho, retornarás aqui amanhã, então levarás ao Bispo o sinal por ele pedido. Com isso ele irá acreditar em ti, e a este respeito, ele não mais duvidará nem desconfiará de ti, e sabe, meu querido filhinho, Eu te recompensarei pelo teu cuidado, esforço e fadiga gastos em Meu favor. Vai agora. Espero por ti aqui amanhã.” Infelizmente quando Juan chegou em casa, encontrou seu tio à beira da morte, pois tinha contraído uma peste. No outro dia não pôde ir ao encontro de Maria para levar o sinal para o Bispo, como tinha prometido. No dia 12 de dezembro, foi à procura de um sacerdote para que seu tio pudesse se confessar antes da morte e receber a unção dos enfermos. No caminho para a cidade a Senhora lhe apareceu de repente, perguntando o que iria fazer, muito envergonhado de não ter cumprido o prometido Juan explicou toda a situação. Maria, com suas meigas palavras lhe prometeu a cura de seu tio: não era mais necessário procurar um sacerdote. Muito feliz com a notícia, Juan Diego pediu a Senhora que lhe desse o sinal: - “Sobe, meu caçula, ao topo da montanha; lá onde Me viste e te dei a ordem, encontrarás diferentes flores. Corta-as, junta-as, então volta aqui e traze-as em minha presença”. » Quando Juan chegou ao topo da montanha ficou muito espantado com tantas variedades de flores, algumas que nunca nem tinha visto, uma mais bonita que a outra. O mais espantoso foi ver aquelas lindas flores brotarem do chão em pleno inverno e em um solo nem um pouco favorável. Cortou todas que foi possível e colocou em seu tilma (um manto de material frágil que era comu-

mente usado pelos índios da região). Voltou ao lugar onde estava Nossa Senhora e mostrou a Ela as flores, Ela as tocou e ordenou que as levasse ao Bispo. Quando chegou ao Bispo mostrou todas aquelas flores; todos que estavam na sala ficaram todos impressionados por estarem vendo flores frescas fora de época. Juan pediu que fosse construído um templo no lugar onde as flores tinham sido colhidas. Quando ele abriu totalmente o tilma apareceu subitamente à imagem de Maria Santíssima exatamente como ele a via. Todos os presentes ficaram espantados com tamanho milagre. Os significados da imagem • A imagem mostra Nossa Senhora iluminada por uma luz que vem por trás Dela, dando a impressão que seja o sol, lembrando a passagem da Bíblia onde diz que existe uma mulher revestida de sol. Também simboliza a grandeza e a vitória do Deus verdadeiro em comparação com o deus sol adorado pelos índios. • Também pode ser observada a lua nos pés de Maria. Na cultura dos índios existia a adoração a um deus que era figurado pela lua encrespada. A Senhora sobre a lua significa a vitória sobre

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o falso deus. • O manto azul naquela época era sinal de virgindade, realeza e usado pelas deusas adoradas pelos índios. As estrelas encontradas no manto representam exatamente o modo em que o céu estava no dia 12 de dezembro em 1531. • A cabeça inclinada de Maria simboliza o poder que está por trás dela (Deus verdadeiro), porque os deuses e deusas que os índios adoravam sempre eram representados com a cabeça inclinada olhando seus adoradores nos olhos para mostrar a eles seus poderes. Não podemos nos enganar com a ideia de que Maria queria passar-se por uma deusa, mas sim que todo o poder encontrado, provém do Deus Salvador. • O Coração nas costas da mão representa o Coração Imaculado de Maria. Nas aparições em Fátima também aparece o mesmo sinal, o que mostra que são eventos relacionados. E como sempre as mãos de Maria estão postas, pedindo penitências e muita oração. Entre as mãos se encontra uma chave, que simboliza a grande força encontrada em uma oração, ligando então os pecadores à porta do Reino dos Céus. Além de todas essas simbologias apresentadas aqui, existem muitos outros sinais mais complexos que representam: o Espírito Santo; Abraão; os Reis Davi e Salomão; o profeta Daniel; a maternidade de Maria; Maria, Mãe de Deus; Natividade de Jesus; apresentação do Menino Jesus no Templo; a Última Ceia; um rosto de duas caras representando Judas e o demônio; agonia de Jesus no Horto; flagelação de Jesus; a Cruz; a Sagrada Face. Desafiando a Ciência A tilma usada por Juan onde se encontra a imagem de Nossa Senhora de Guadalupe foi confeccionado com uma fibra vegetal de ayate, — tela rala de fio de magüey, uma espécie de agave potule zacc mexicana. Trata-se de um material muito frágil que, geralmente se decompõe com 20 anos, mas essa é extremamente especial, mesmo exposta a todos os componentes e agentes naturais do ar (umidade, calor, microorganismos, poeira etc.) já se passaram séculos e ela continua intacta por algum motivo inexplicável. Alguns cientistas sugeriram que a tinta encontrada na imagem poderia ser uma proteção contra os agentes naturais. Então foi enviada uma amostra da imagem para ser analisada pelo cientista alemão que já havia ganhado o prêmio Nobel de Química, Richard Kuhn. E mais uma descoberta fantástica! A “tinta” do manto não tem origem nem ao reino vegetal, animal ou mineral, como isso é possível? A imagem foi submetida a mais análises por 2 estudiosos, doutor Calagan, da NASA, e o professor Jody B. Smith, catedrático de Filosofia da Ciência no Pensacolla College. Fizeram análises fotográficas com raios infravermelhos e chegaram a várias conclusões impressionantes. • O ayate não possui preparação alguma, o que torna inexplicável, à luz dos conhecimentos humanos e que qualquer tipo de corante ou tinta impregne e se conserve em fibra tão inadequada. • Não foi encontrado nenhum tipo de esboços prévios, como os descobertos pelo mesmo processo nos quadros de Velázquez, Rubens, El Greco e Ticiano. A imagem foi pintada diretamente, tal qual a vemos, sem esboços nem retificações. • Não há nenhum traço de pincel, uma técnica empregada que é desconhecida pelo homem. É inusitada, 30 - In Guardia - fevereiro de 2012

incompreensível e irrepetível. * Os olhos da imagem Depois de anos de pesquisas, foi detectado que os olhos da imagem refletem imagens como se estivessem vivos no momento em que apareceu subitamente na tilma, imitando o olho de uma pessoa. Está refletida exatamente a cena que é narrada do momento exato em que o índio Juan Diego abriu manto onde se encontrava as flores. Vários oftalmologistas examinaram a figura e relataram que os olhos da imagem possuem todas as características do olho de um humano vivo e quando examinados são extremamente vivos e reais. A cena encontrada nos olhos da imagem retrata um índio no ato de desdobrar o manto, um homem com a mão na barba branca olhando diretamente para o manto com o rosto de surpresa (com as características do bispo da época comparado com os retratos existentes dele), uma família com seis pessoas contendo crianças, alguns religiosos usando o hábito franciscano, uma mulher negra no canto (provavelmente alguma serviçal do bispo) e outro índio se posicionando para oração. Para que essa cena fosse percebida foi necessária a ampliação de mais de 2000 vezes, ou seja, seria impossível alguém pintar algo desse tamanho. *As lágrimas de Nossa Senhora No ano de 1994, a imagem de Nossa Senhora de Guadalupe misteriosamente derramou lágrimas de óleo. Para que essa cena fosse percebida foi necessária a ampliação de mais de 2000 vezes, ou seja, seria impossível alguém pintar algo desse tamanho.


Por Kairo Neves

De Jerusalém a Roma Percorrer os caminhos de Nosso Senhor, andar por onde Ele passou até o local de sua crucifixão, foi desde muito cedo um ato que os cristãos da Terra Santa cultivaram. Desse ato teve origem em Jerusalém o piedoso exercício da via sacra e, não ali, mas em Roma, outro pio costume surgiu com base nessa caminhada: as estações quaresmais. A ideia de que Jerusalém havia se transferido para Roma com a chegada dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo e a destruição do Templo propiciou a construção, nas palavras do Sumo Pontífice, de “uma singular geografia da fé”. Os cristãos na Capital do catolicismo percorriam várias das basílicas durante o período quaresmal. Primeiras Referências e Livros Litúrgicos A primeira referência oficial de que se tem notícia é do Papa Hilário I (461-468). O Liber Pontificalis diz que o papa doou à Igreja de Roma uma série de vasos sagrados a serem usados nas celebrações, não apenas quaresmais, mas também do Tempo do Advento e da Páscoa ou ainda aquelas realizadas na solenidade de um Santo Mártir sepultado na cidade. Fora de Roma, livros litúrgicos provenientes de vários bispados atestam que essas celebrações haviam se espalhado para o norte da África, Milão, dioceses da Gália e da Alemanha. Tais livros relatam ainda a existência de igrejas estacionais com “títulos” iguais aos das igrejas de Roma. Em vista da universalização dessa prática e para se sentirem em comunhão mais estreita com a Igreja de Roma e seu bispo, o Papa, os calendários dessas dioceses mantinham explicitamente os nomes das igrejas romanas nas estações. E assim permaneceu até 1969, quando não apenas os calendários, mas, o próprio Missal Romano possuía indicações da igreja romana logo após o título de cada missa. Essas indicações permanecem na forma extraordinária. Santa Missa Natureza e Estrutura das da QuartaEstações Feira de A princípio, tais celebraCinzas ções constavam de uma vicelebrada gília acompanhada de jejum, por Bento como preparação a um aconXVI na tecimento importante. Ainda Basílica que para nós atualmente, a de Santa vigília seja algo mais diretaSabina mente ligado com o tempo do Advento; a espera do Cristo é um acontecimento de todos os tempos litúrgicos, que se ajusta de maneira singular às vésperas dos dias de guarda e, durante o período da quaresma, à espera da grande sole-

nidade da Páscoa. Assim, as estações romanas se realizavam com a comunidade cristã reunida, junto ao túmulo dos mártires sob a presidência do Sumo Pontífice e nas demais dioceses com seu respectivo bispo. Em Milão, por exemplo, o próprio Santo Ambrósio presidiu estações durante os anos de seu ministério episcopal. A celebração se iniciava em um local donde se faz a “colletta”, esse local é uma igreja vizinha à igreja estacional. Desse local se parte processionalmente, segundo o Liber Pontificalis, sempre cantando a ladainha de todos os santos. Chegando a igreja estacional, realizava-se uma vigília de oração. Essa celebração foi sucessivamente dando lugar à celebração eucarística. Os dias estacioanais quaresmais Quando de seu surgimento, as estações não se celebravam todos os dias da quaresma, mas apenas nos dias mais significativos, nas terças, quartas e sextas-feiras. Depois as quintas-feiras passaram a ser dias estacionais e, por fim, os demais dias. Assim, no século VIII, sob o Pontificado de Gregório II, a série de procissões quaresmais romanas estava completa. Tendo sofrido uma primeira reorganização e sistematização durante o pontificado de Gregório Magno. As igrejas-estações, que formam uma série ininterrupta, estão enumeradas a seguir:

Quarta-Feira de Cinzas Quinta-feira Sexta-feira Sábado Domingo I de Quar. Segunda-feira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Domingo II de Quar. Segunda-feira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira

S. Sabina no Aventino S. João no Velabro Ss. João e Paulo no Célio Sto. Agostinho em Campo Marzio S. João de Latrão S. Pedro in Vincoli no ColleOppio S. Anastásia (S. Teodoro) no Palatino S. Maria Maior S. Loureço em Panisperna S. Maria em DomenicaallaNavicella S. Clemente junto ao Coliseu S. Balbina no Aventino S. Cecilia em Trastevere S. Maria em Trastevere S. Vitale em Fovea (via Nazionale) 31 - In Guardia - fevereiro de 2012


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Sábado Domingo III de Quar. Segunda-feira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira Sábado Domingo IV de Quar. Segunda-feira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira Sábado Domingo V de Quar. Segunda-feira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira Sábado Domingo de Ramos Segunda-feira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira Sábado Domingo de Páscoa

Lósservatore Romano

Ss. Marcelino e Pedro no Latrão (via Merulana) S. Lourenço fora dos Muros S. Marco no Campidoglio S. Pudenciana no Viminale S. Sixto (SS. Nereu e Aquileu) Ss. Cosme e Damião na Via Sacra (Foro Imperial) S. Lourenço em Lucina Sta. Susana nas Termas de Diocleciano Sta. Cruz em Jerusalém Ss. QuattroCoronati no Célio S. Lourenço em Dâmaso S. Paulo fora dos Muros Ss. Silvestre e Martinho ai Monti S. Eusébio no Esquilino S. Nicolau em Cárcere S. Pedro no Vaticano S. Crisógono em Trastevere S. Ciríaco (S. Maria em via Lata al Corso) S. Marcelo al Corso Sto. Apolinário em Campo Marzio S. Estêvão no Célio S. João em Porta Latina S. João de Latrão S. Praxede no Esquilino Sta. Prisca no Aventino S. Maria Maior S. João de Latrão Sta. Cruz em Jerusalém S. João de Latrão Santa Maria Maior

O papado Não se pode falar de nenhuma cerimônia de Roma sem falar de sua relação com o Bispo da Urbe. Ao longo do tempo houve altos e baixos para as estações quaresmais, em vista da presença ou da ausência do Papa nelas. Com o exílio em Avignon, as estações quaresmais tiveram um grande declínio, como toda a liturgia pontifícia. Em outros momentos históricos voltaram a se tornar populares, como com São Pio V. Em 1870, nenhuma das procissões ocorreu, em vista da desordem pública causada pelos conflitos da unificação italiana. Atualmente, o Papa não celebra todas as estações quaresmais, em função de suas demais obrigações, reservando-se à celebração da quarta-feira de cinzas. Mesmo na semana santa, quando celebram a Eucaristia publicamente, costumam fazer não na igreja estacional, mas nas maiores igrejas. Geralmente faz-se a celebração do Domingo de Ramos e do Domingo de Páscoa na Praça de São Pedro. A Celebração da Paixão do Senhor e a Missa Crismal fazem-se no interior da basílica homônima. A missa da ceia do Senhor é feita na Arquibasílica de São João, a catedral de Roma. Esse uso não deve ser visto como um descaso do papado com essa tradição quaresmal, mas como alternativas práticas. Atualmente, para que um maior número de fiéis possa participar das celebrações mais importantes do ano celebrados pelo Santo Padre, opta-se por espaços mais amplos. Sem dúvida, vários papas já deixaram claro o apreço por essas tradições claro em suas homilias. Em 2007, ao celebrar em Santa Sabina, Bento XVI disse: “a tradição das igrejas “estacionais” da Quaresma, não é uma simples recordação do passado, nem uma antecipação vazia do futuro; ao contrário, pretende ajudar os fiéis a percorrer um caminho inte-

Santa Missa, na Basílica Va


Domingo de ramos na Praça São Pedro

rior, o caminho da conversão e da reconciliação, para chegar à glória da Jerusalém celeste onde Deus habita.” No século passado, o Beato João Paulo II, ao celebrar em uma visita pastoral: “Hoje o Papa vem visitar a paróquia, cuja igreja tem o título de Santa Cruz em Jerusalém e é uma das estações quaresmais. Graças a este fato, podemos referirnos às tradições quaresmais de Roma. Essas tradições, em que indiretamente participava toda a Igreja católica, estavam ligadas a cada santuário da Roma antiga, nos quais, cada dia da Quaresma, se reuniam fiéis, clero e Bispos. Em espírito de penitência, visitavam os locais santificados pelo sangue dos mártires e pela memória orante do Povo de Deus. Exatamente no quarto domingo da Quaresma, celebrava-se a Estação quaresmal neste santuário em que nos encontramos agora.”. Basílica de Santa Sabina A quaresma se inicia na Quarta-Feira de Cinzas, nessa ocasião temos a primeira das procissões quaresmais. A procissão parte da Basílica de Santo Anselmo em direção à Basílica de Santa Sabina. Essa igreja, embora não seja uma das basílicas maiores, conserva grande importância por ser a primeira das igrejas estacionais da quaresma e a única que recebe a visita do Bispo de Roma por ocasião de uma estação ainda atualmente. Nos últimos anos do Pontificado de João Paulo II, em vista de sua saúde, a celebração da Quarta-feira de Cinzas perdeu a procissão entre as basílicas; mas até 2003, mante-se a celebração da Santa Missa em Santa Sabina, a partir de então foi transferida para a Basílica Vaticana, provavelmente por maior proximidade com o Palácio Apostólico. aticana, III Domingo da Quareesma Com a eleição de Bento XVI, a celebração da Quarta-feira de cinzas voltou a ter em 2006 a tradicional procissão partindo da basílica de Santo Anselmo, igreja colletta e a Missa com a bênção e imposição das cinzas em Santa Sabina, igreja estacional. Basílica Latranense O Primeiro Domingo da Quaresma é um tempo notável desse tempo litúr-

gico. Antes da reforma de Gregório Magno, era nesse dia o início da quaresma chamado “in capite jeiunii”. Sua celebração se fazia na Catedral de Roma, Arquibasílica de São João do Latrão. Mesmo com a mudança do início da quaresma para Santa Sabina, conservou-se a estação desse domingo na catedral. Essa mesma igreja é sede de outras três estações, o Domingo de Ramos (início da Semana Santa), Quintafeira Santa (início do Tríduo Pascal) e Sábado Santo (Vigília Mãe de todas as vigílias). Como podemos ver, nas estações antigas, a catedral possui a primazia nas celebrações que iniciam os principais períodos, acima da famosa Basílica Vaticana. Arquibasílicas Romanas As grandes basílicas da Cidade Eterna, outrora Basílicas Patriarcais, tinham lugar de destaque entre as principais igrejas estacionais. A Basílica de São João do Latrão, como já falamos, é sede de quatro das principais estações. São Pedro no Vaticano sedia, além do sábado da I Semana, o V Domingo da Quaresma, na forma extraordinária Domingo da Paixão do Senhor, início da Semana das Dores ou Tempo da Paixão. Em São Paulo fora dos Muros se celebra a Quarta-feira da IV Semana e a Terça-feira da Semana Santa. A Basílica Liberiana é estação da Quarta-feira da I Semana e da Semana Santa, além do Próprio dia de Páscoa, na conclusão do Tríduo Sacro. As estações quaresmais na atualidade Tanto o Missal Romano quanto o Cerimonial dos Bispos fala sobre a celebração das estações quaresmais. Ambas as fontes dizem ser louvável manter a tradição das estações quaresmais, ao menos nas maiores cidades e sob a presidência do Bispo Diocesano. Essas celebrações podem realizar-se em qualquer dia da quaresma, seguidamente ou escolhendo os dias mais propícios. É possível ter igrejas pré-estabelecidas na cidade para cada celebração ou, a cada ano, escolher 33 - In Guardia - fevereiro de 2012


novas igrejas. Essas celebrações têm início em uma igreja menor. Nessa igreja, inicia-se a celebração com uma procissão de entrada. O celebrante faz reverência ao altar e saúda o povo. A seguir diz a oração do dia da missa do Mistério da Santa Cruz ou pela remissão dos pecados ou pela Igreja, principalmente a local; pode-se ainda dizer uma das orações sobre o povo, que vem no missal. A seguir, faz-se a procissão em direção à igreja estacional. Chegando à igreja, o celebrante saúda e incensa o altar. Omitindo o ato penitencial, diz-se o Kyrie, a oração do dia da Missa que se vai celebrar e se diz a missa do dia como de costume. Se se julgar mais conveniente, pode-se fazer uma celebração da Palavra de Deus ou uma Celebração Penitencial, usandose os textos que o Ritual da Penitencia indica para o período quaresmal. Podemos ver, assim, que seria de grande utilidade pastoral que se os bispos reestabelecessem em suas dioceses a prática das estações, seja em todos os dias ou ao menos em alguns que se julgar mais convenientes. Também que erigissem igrejas estacionais a nível diocesano e encorajassem os fiéis a visitá-las todos os anos de maneira piedosa, em particular, para participarem das celebrações. As estações romanas hoje Via Sacra no Coliseu com o papa Bento XVI Como já dissemos, o Sumo Pontífice está presente apenas na primeira estação. Não obsquaresmal que aí se celebra, a indulgência será plenátante, as demais estações se realizam todos os anos da ria; considerando que cumpra os outros requisitos: conUrbe sendo acompanhadas colegialmente pelos mem- fissão sacramental, oração nas intenções do Sumo Ponbros da Academia Pontifícia para o Culto aos Mártires, tífice e rejeitar todo apego ao pecado, mesmo venial. organismo responsável, inclusive, por manter e proConclusão pagar essa tradição. Os locais em que ocorrem, entreAs estações ou, mais atualmente, assembleias quatanto, nem sempre são as igrejas estacionais de antigo resmais são celebrações de antiga tradição. Essas cetítulo. Por motivos pastorais (necessidade de se ir aos lebrações têm como último fim serem celebrações de bairros novos da cidade) ou práticos (a igreja antiga comunhão. São ritos provenientes e fortemente ligados não se encontra em condições de receber quantidade à Sé Apostólica; assim demonstramos comunhão com significativa de fiéis ou possui acessibilidade limitada). a Igreja de Roma e seu bispo, o Vigário de Cristo. Na Tenta-se, todavia, manter uma relação estrita com as assembleia reunida nos unimos mais intimamente com igrejas estacionais; como narra o Mons. Pasquale Iaco- a Igreja Diocesana e pela presidência do Bispo, com bone, membro da academia: “Por exemplo, nesse últi- o Sumo Sacerdote daquela porção do Povo de Deus. mo ano (2007) celebramos a estação dos Protomártires Por meio da Ladainha dos Santos, nos unidos àqueles Romanos na nova paróquia. É uma igreja nova, mas re- que nos precederam na fé. Por meio da Celebração Euporta a memória desses mártires e, portanto, é evidente carística e da Comunhão sacramental, nos unimos da o motivo pelo qual propusemos a celebração naquela mais sublime maneira com Nosso Senhor. Pelos mériparóquia uma estação quaresmal.”. tos d’Ele e dos Santos e Mártires, que nos precederam Indulgência Plenária nessa terra, esperamos chegar ao fim de nossa peregriO manual das indulgências diz ainda que o fiel que nação terrestre e sermos contemplados com a graça de visitar a igreja estacional em seu próprio dia pode ga- nos unirmos a Comunhão dos Santos na eterna e indisnhar indulgência parcial. Se participar da assembleia solúvel presença de Deus. 34 - In Guardia - fevereiro de 2012


O dom do filho

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Por Lenise Garcia

Os últimos 50 anos trouxeram mudanças radicais no âmbito da reprodução humana. O maior conhecimento do corpo humano e dos processos de reprodução, e as tecnologias desenvolvidas a partir desse conhecimento, deram ao homem um domínio técnico inédito sobre a geração dos filhos, tanto no sentido de evitá-los, como no de “produzi-los” de modo diferente da relação íntima entre os pais. Que orientação nos dá a Igreja a respeito de tudo isso? Sendo uma temática com profundas implicações éticas e morais, o Magistério da Igreja nos indica princípios claros, expressos em diferentes documentos, cuja leitura recomendo a quem queira aprofundar no assunto. Alguns “a paternidade deles: o Capítulo I da responsável Parte II da Constituição Gaudium et Spes (1965), exerce-se tanto do Concílio Vaticano II; com a deliberação a Encíclica Humanae Viponderada e tae (1968), do Papa Paulo VI; a Encíclica Evangenerosa de fazer gelium Vitae (1995), do crescer uma família Papa João Paulo II; as numerosa, como com Instruções Donum Vitae (1987) e Dignitas Pera decisão, tomada sonae (2008), da Sagrapor motivos graves da Congregação para a e com respeito pela Doutrina da Fé. Muitos destes ensinamentos eslei moral, de evitar tão também sintetizados temporariamente, no Catecismo da Igreja ou mesmo por tempo Católica e seu Compêndio. indeterminado, um Não é simples tranovo nascimento.” duzir em poucas linhas

Humanae Vitae

a profundidade desses ensinamentos que nos fazem compreender a grandeza da relação amorosa humana, à qual está vinculada a procriação. Sem isso, corre-se o risco de entender o posicionamento da Igreja como uma listinha de “pode” e “não pode”, o que seria uma forma muito reducionista de se ver a moral cristã. Diz-nos a Humanae vitae: “a paternidade responsável exerce-se tanto com a deliberação ponderada e generosa de fazer crescer uma família numerosa, como com a decisão, tomada por motivos graves e com respeito pela lei moral, de evitar temporariamente, ou mesmo por tempo indeterminado, um novo nascimento.” Entre os motivos graves que podem justificar que se evitem filhos, estão consideradas condições físicas, econômicas, psicológicas e sociais. E quanto aos métodos lícitos para que sejam evitados os filhos? Diz-nos ainda Paulo VI: Deus dispôs com sabedoria leis e ritmos naturais de fecundidade, que já por si mesmos distanciam o suceder-se dos nascimentos. Atualmente, conhecemos com detalhes o funcionamento dos hormônios responsáveis por esse ritmo e muitas de suas repercus


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sões sobre o organismo feminino. Alguns especialistas desenvolveram modos práticos e simples da mulher se conhecer quanto ao seu próprio ritmo, sabendo quando está fértil ou não, de modo a escolher os dias para um relacionamento sexual que traga ou não a geração de um filho. Os vários métodos existentes, como o da temperatura, auto-apalpação cervical, cristalização da saliva e o método da ovulação Billings (MOB), podem ser usados inclusive em conjunto, e funcionam com eficácia idêntica à dos anticoncepcionais, de acordo com a própria Organização Mundial da Saúde. Podem ser utilizados em qualquer situação, inclusive em ciclos menstruais irregulares, na amamentação ou menopausa. O uso dos métodos naturais aproxima o casal, pois é necessária a colaboração de ambos para a sua execução. É gratuito e não tem contra-indicações médicas. Enfim, neles se percebe a sabedoria do Criador, que quis fazer do homem e da mulher colaboradores da obra criadora. Embora o seu aprendizado não seja difícil, é bom sempre contar com a experiência de profissionais e de casais que se especializaram em seu uso e se dispõem a ensinar. Muitas paróquias e dioceses contam com esses grupos. Também se pode aprender mais e fazer contatos, por exemplo, pelo site http://www.metodosnaturais.com.br Embora em geral se coloque o foco sobre o uso desses métodos para evitar ou espaçar os filhos, eles também são extremamente úteis para aqueles casais que tem dificuldade em obter uma gravidez. Nestes casos,

o casal deve buscar o relacionamento íntimo naqueles dias em que a mulher está fértil. Se mesmo assim não se conseguir a gravidez, o casal deve recorrer a médicos. Os procedimentos que identificam o problema do homem ou da mulher e buscam a sua cura, em geral, são moralmente lícitos. Já a chamada fertilização in vitro vai contra a dignidade humana e jamais pode ser aceita, mesmo que realizada com boas intenções. Como nos diz o Catecismo da Igreja Católica, no ponto 1654: “Os esposos a quem Deus não concedeu ter filhos podem, no entanto, ter uma vida conjugal cheia de sentido, humana e cristãmente. Seu Matrimônio pode irradiar uma fecundidade de caridade, acolhimento e sacrifício.”

Deus dispôs com sabedoria leis e ritmos naturais de fecundidade, que já por si mesmos distanciam o sucederse dos nascimentos

“A família é certamente uma graça de Deus, que deixa transparecer aquilo que ele próprio é: Amor”


Por Ivanaldo Santos

Vida Sim, aborto não Carta de São Carlos Nós, líderes de movimentos universitários e de profissionais liberais católicos, reunidos na sede da Comunidade Católica Totus Mariae, na cidade de São Carlos, em São Paulo, Brasil, no dia 10 de dezembro de 2011, no evento “O cristão na vida pública” emitimos a seguinte carta pública: Diante de uma série de problemas que angustiam o homem e a sociedade contemporânea, dos quais é possível citar: o relativismo moral, a corrupção, a negação da verdade, o secularismo absolutista, que tentam negar o direito ao culto religioso e a participação dos fiéis na vida pública, e a alienação reinante nos meios de comunicação, declaramos: 1. A universidade, demais centros de formação superior, assim como o universo do trabalho, devem estar abertos para todas as ideias e discussões, inclusive as discussões fundamentadas em ideologias ateístas e seculares. No entanto, repudia-se o processo de exclusão que a religião, especialmente o Evangelho de Cristo, sofre dentro desses ambientes. Trata-se de ambientes plurais que, em tese, devem estar abertos a todas as ideias, inclusive ao Evangelho. 2. Rejeita-se o marxismo cultural que tenta, por meio da infiltração dentro das universidades, da mídia e de outros espaços públicos, construir uma sociedade sem Deus, sem fé e sem a presença da Igreja. A sociedade que essa versão do marxismo quer construir é uma sociedade autoritária e fechada, onde não há espaço para a livre reflexão e muito menos para a expressão dos valores e sentimentos religiosos. Vale ressaltar que esses valores fundamentam as bases de qualquer modelo civilizatório. 3. Rejeitamos a cultura de morte. Uma cultura que se apresenta de diversas formas, como, por exemplo, o aborto, a união

homossexual, a eutanásia, o suicídio assistido, a contracepção artificial, a destruição e o comércio de embriões humanos, a escravidão, a legalização das drogas, etc. Infelizmente trata-se de uma cultura que, juntamente com o marxismo cultural, é muito difundida nos ambientes universitários e dos profissionais liberais. Uma sociedade justa, ética e alicerçada pelo Evangelho não pode ser orientada pela cultura de morte. Pelo contrario, tem que ser orientada pela cultura da vida e “vida em abundância” (Jo 10, 10), que promove o aperfeiçoamento de todas as dimensões da vida e da dignidade da pessoa humana. 4. Rejeitamos o secularismo absolutista e autoritário que, ao se apropriar de palavras, como, por exemplo, “razão”, “liberdade” e “revolução”, que, muitas vezes, são utilizadas fora de seu real sentido, desejam banir e até mesmo proibir qualquer ato de manifestação de fé em espaço público. A fé é um direito fundamental do ser humano. Por isso, nenhuma ideologia, grupo empresarial, partido político ou organização social de qualquer natureza tem o direito de limitar sua livre expressão. 5. Por fim, conclamamos a todos os universitários, profissionais liberais e homens e mulheres de boa fé a lutarem para que sejam garantidos os direitos religiosos, para que, em nome de um secularismo autoritário, a livre expressão da fé não seja, por diversos meios, proibida. Para que isso aconteça é preciso que os cristãos se façam presentes, cada vez mais, na vida pública. Essa presença deve ser materializada, por exemplo, na vida política partidária, dentro das mídias (rádio, jornal, blog, site, etc), na vida cultural (cinema, teatro, etc), dentro das universidades e de 37 - In Guardia - fevereiro de 2012


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mais centros de formação superior, e de qualquer outro espaço público que seja permitido, dentro dos limites da Lei, a livre expressão do pensamento. São Carlos, SP, Brasil, 10 de dezembro de 2011. Assinam essa carta: • Marcos Gregório Borges – Coordenador da Missão Universitária de Guarulhos • Prof. Dr. Marcelo Melo Barroso – Comunidade Católica Totus Mariae • Profa. Ms. Julianita Maria Scaranello Simões – Comunidade Católica Totus Mariae • Ms. Idalíria de Moraes Dias – Co-fundadora da Comunidade Católica Totus Mariae • Wilson José Dino dos Anjos – Fundador da Comunidade Católica Totus Mariae • Ms. Maria Alice Soares de Castro – Comunidade Católica Totus Mariae • Profa. Ms. Vanessa Burque Ricci – Comunidade Católica Totus Mariae • Michelle Stephânia Pacheco Moraes – Comunidade Católica Totus Mariae • João Paulino de Moraes – Comunidade Católica Totus Mariae • Daniela Inocêncio de Oliveira – Militante do Ministério Universidades Renovadas • Yanina Mara Rocha Nascimento – Militante do Ministério Universidades Renovadas • Prof. Ms. Marcos Vinicius de Freitas Reis – Renovação Carismática Católica • Marcelo Pastre – Apostolado Teologia do Corpo • Viviane G. C. Pastre – Apostolado Teologia do Corpo • Luis Enrique Paulino Carmelo - Coordenador do grupo de Jovens Hesed (ministério Jovem RCC) e do Grupo Universitário Obra Nova. • Thais Zaninetti Macedo – Coordenadora do Grupo de Jovens Hesed (ministério Jovem RCC). • Luis Gustavo Paulino Carmelo - Coordenador do Grupo de Jovens Hesed (ministério Jovem RCC) • Joice Basílio Machado – mestranda em Ciência da Computação pela USP. • Leandro Tolomeu Marques – mestrando em Engenha ria Elétrica pela USP.

A foto ao lado comoveu o mundo em 2011. Pais de sêxtuplos, o casal Rozonno e Mia McGhee são um exemplo de família que não se rebaixou ao famigerado controle de natalidade


O Catecismo da Igreja Católica Por Carlos Ramalhete

“Convido-vos: estudai o catecismo! Esse é o meu desejo, de coração. [...] Estudai o catecismo com paixão e perseverança!” Papa Bento XVI

Prosseguindo esta série de artigos sobre o presente no universo. Ora, esta ordem é compleCatecismo, passamos agora às vias de acesso ao xíssima e interdependente. Hoje sabemos, mais conhecimento de Deus (itens 32 e 33 do Cate- que os antigos, a extensão desta complexidade. cismo). Os meteorologistas, por exemplo, ao tentarem O homem, como vimos no artigo anterior, é prever a chuva do dia seguinte, munidos de incompleto sem Deus. É por isso que ele é dito imagens de satélite em tempo real, de medições “capaz” (aspas no original) de Deus: porque obtidas em enorme quantidade de estações, de Deus nos chama, nos atrai. Onde, contudo, Ele estudos de eventos anteriores e de todo o aparato está? E, mais importante, por que vias nós pode- técnico que a nossa civilização consegue oferemos chegar a conhece-l’O? cer, ainda são incapazes de prever com exatidão Para nós, cristãos, a coisa é mais simples: nós o tempo que fará. sabemos que Deus Se revelou, que o Eterno InOra, isto ocorre porque a ordem com que eles criado entrou no tempo e na criação, fazendo-se têm que lidar é complexa demais: há elementos verdadeiramente homem sem deixar de ser ver- demais em jogo, numa interação perfeitamente dadeiramente Deus. ordenada – nenhuma nuvem se comporta conMas todo homem, como trariamente às leis da física! vimos, é “capaz” de Deus. – mas complexa demais para Se tomamos a beleza Não se trata de uma forma de que se a possa prever. que o homem mais salvação; nenhum homem, Esta ordem infinitamente seja ele cristão ou pagão, é complexa, em que cada astalentoso é capaz de capaz de salvar a si mesmo. pecto depende de miríades Mas todo homem é capaz de criar, percebemos como de outros aspectos, em que perceber que Deus existe. ela empalidece diante da o calor gerado por um fundo Há muitos estudiosos de garrafa quebrado que conbeleza criada por Deus de antropologia religiosa que centra a luz do sol e provoca sustentam que as religiões um incêndio que destrói cenpanteístas e politeístas – respectivamente, as que tenas de hectares de florestas e modifica todo o divinizam todas as criaturas e as que acreditam clima da região, com reflexos no mundo inteiro, em muitos “deuses” – são na verdade formas de- esta ordem aponta para Quem a tenha ordenado. cadentes de um monoteísmo original. Um pouco O menor não pode gerar o maior; o homem, com como quando se presta tanta atenção nos deta- todo o seu talento e engenho, não consegue criar lhes que se esquece o principal. Chesterton, com algo mais complexo que ele mesmo. Na verdaa verve que lhe era peculiar, afirma que quando de, se tomarmos o avião mais moderno, o comse “encosta na parede” a um politeísta, ele vai putador mais poderoso, a obra mais perfeita da admitir que acredita em um só Deus, que criou engenharia, encontraremos algo que, comparado todos os “deusezinhos”: acredita, mas não pres- à folha de uma árvore, é tão simples que chega ta atenção, como quem suborna cada guardinha a ser primitivo. para não ter que obedecer à Lei. Do mesmo modo, se tomamos a beleza que o Este conhecimento de que há um só Deus, homem mais talentoso é capaz de criar, percebeCriador de tudo, pode ser, portanto, alcançado a mos como ela empalidece diante da beleza criapartir daquilo que temos ao nosso redor: da Cria- da por Deus. Dizem que Michelângelo, acabanção, de tudo o que, como uma obra de arte mos- do de esculpir sua obra-prima, disse-lhe “fala!”, tra quem é o artista, nos aponta para Deus. espantado com a perfeição do próprio trabalho. Há, hoje em dia, quem negue que a Criação Ora, tratava-se de um pedaço de mármore, mudo. aponte para o seu Criador. É uma negativa gra- Uma cópia tremendamente imperfeita de uma tuita, que procura atribuir ao acaso toda a ordem obra de Deus: o homem. Qualquer bebezinho 39 - In Guardia - fevereiro de 2012


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balbucia, sorri, chora. A estátua nada disso faz. A própria beleza dele é “de empréstimo”, cópia da beleza de uma criatura de Deus. Do mesmo modo, quando vemos as obras de arte humanas que não tentam imitar diretamente a beleza da natureza, percebemos sua crueza e seu primitivismo. O que é um edifício, com suas linhas retas, senão uma versão primitivíssima dos brocados e decorações com que o Criador enfeita cada criatura sua? Uma árvore, uma flor, o ninho de um joão-de-barro, uma criança que sorri; tudo isso faz com que a beleza do edifício empalideça. Chega a ser engraçado que se tente atribuir ao acaso a geração de uma ordem tão complexa, que se expressa na própria beleza. A beleza temível de uma nuvem de tempestade – com quilômetros de altura, raios e trovões, pedras de gelo que saem por cima e água que desce torrencialmente daquela montanha voadora – é algo que só pode indicar a existência de Quem a criou e mantém. A complexíssima ordem que a formou e que se expressa no movimento coordenado e obediente às leis da física, mas tão complexo que aparenta ser caótico, também não nos deixa negar que há Alguém que é maior que aquilo, um Artista de Cuja mão saiu tamanha obra de arte. Tudo isso são “pistas” para que percebamos não só a existência, mas a grandeza de Deus. Quando um homem honesto vê o sorriso da mulher que ama, ela sabe que deve agradecer. A quem? Ora, Quem a criou? Quem, por Sua providência, a colocou no caminho daquele homem? E deste amor nascerão vidas novas, crianças que têm mais beleza e mais complexidade num folículo capilar que qualquer criação humana poderia ter.

Quando se tem uma percepção mínima que seja da grandeza de Deus e da distância que há entre nós e ele, mais patente se torna o Seu amor por nós, maior se torna a nossa percepção da gratuidade deste amor

Isso, evidentemente, não basta para a salvação. Mas é o primeiro, e indispensável, passo. Quando se tem uma percepção mínima que seja da grandeza de Deus e da distância que há entre nós e ele, mais patente se torna o Seu amor por nós, maior se torna a nossa percepção da gratuidade deste amor. Quem faz as nuvens, Aquele que criou as montanhas e o mar, Ele mesmo nos atende quando a Ele pedimos aquelas coisas tão ínfimas que para nós são tão grandes: o amor, a vida, o alimento. Esta percepção do Sumo Bem no Belo, do Infinitamente Simples na complexidade de Sua criação, é o que nos permite perceber o que é a virtude da religião, é o que nos permite perceber, quando a Boa Nova nos é dada, o significado verdadeiro da Encarnação do Verbo. Além destas vias – a beleza e a ordem – ensina-nos a Tradição haver ainda várias outras, de que trataremos no próximo artigo. Todas elas têm em comum serem vias do imanente ao transcendente, da criação ao Criador.


Regras para conhecer a fé verdadeira Por Igson Mendes

COMONITÓRIO SÃO VICENTE DE LERINS É necessário falarmos antes a respeito do autor de tão bela obra: São Vicente de Lerins. Os dados sobre sua vida são escassos, sabe-se apenas que foi um Padre da Igreja do século V, de origem francesa, porém, não se sabe o local de seu nascimento. Viveu sua juventude em busca das vaidades do mundo, tornou-se militar e, posteriormente, fez-se religioso, uma vez “afugentado os ventos da vaidade e da soberba, aplacando a Deus com o sacrifício da humildade cristã.”. Vicente, ao encontrar-se com Deus e se converter, foi se tornando cada vez mais obediente à Palavra do Senhor. Amou a Palavra de Deus. Entrou para a vida monástica, tornando-se um exemplo de monge. Aprofundou-se nos mistérios de Deus, tornando-se um grande pensador, teólogo e místico. Indubitavelmente, foi um homem muito douto nas Escrituras e nos dogmas. Notável conhecedor das línguas clássicas, escreveu várias obras, dentre elas algumas foram roubadas. Morreu no reinado de Teodósio e Valentiniano, pouco antes de 450 d.C. A sua obra mais conhecida, O Comonitório, foi escrito em 434 d.C, três anos depois do Concílio de Éfeso. A palavra Comonitório1 era bastante frequente em títulos de obras daquela época e significa anotações ou apontamento feitos para ajudar a memória, sem pretensões de compor um tratado exaustivo. A obra descrita não foge de tal pretensão! O Comonitório é uma dos livros que mais tem feito história. Hoje passam de 150 edições e traduções em diversas línguas, constituindo-se uma jóia da literatura patrística! Seu sucesso em parte se deve ao método aplicado, facilidade na leitura, sem deixar de levar em conta a santidade e sabedoria do autor. Por qual motivo se faz necessário a leitura da obra O Comonitório em nossos dias?

Em tempos “modernos” onde Deus é comparado a um empregador que dá oportunidade igual a todos; de sincretismo religioso; negação de dogmas por aqueles que se dizem “católicos”, dificuldade em distinguir a verdade católica do erro; heresias sendo propagada por muito dos filhos da Igreja; seitas protestantes surgindo a cada dia, criando interpretações divergentes uma das outras, ao ponto de existir tantas interpretações equivocadas quanto cabeças etc. É justamente aí, em um ambiente como este, que tão bela obra se torna um divisor de águas, direcionando ao caminho certo, sendo cada vez mais atual, leitura indispensável a todo aquele que deseja ser realmente um bom Católico! No famoso cânon de São Vicente de Lerins, presente na obra O Comonitório, o leitor encontrará a famosa frase: “QUOD UBIQUE, QUOD SEMPER, QUOD AB OMNIBUS” – o que em toda parte, sempre e por todos foi ensinado – isso é de fé Católica. O resto é invenção dos homens e deve ser descartado. Esta regra simples e universal atravessou os séculos, fazendo do Comonitório um clássico da literatura católica, a que vários Papas e Concílios têm confirmado com sua autoridade a validade perene. No decorrer da obra, São Vicente de Lerins propõem não apenas facilitar o entendimento, mas levar os leitores ao conhecimento da fé pura e sem mácula. Para isso, utiliza exemplos da Tradição e da história da Igreja, estes que são critérios para conservar intacta a verdade Católica. Ele não recorreu a um método complicado. As regras que oferece, servem para distinguir a verdade do erro, podendo ser conhecida e aplicada por todos os cristãos de todos os tempos, constituindo assim um excelente caminho de fidelidade à Tradição da Igreja. A linguagem simples e acessível só confirma a antiguidade do texto e santidade do autor, transparecendo por de trás de cada página a mais alta sabedoria e o amor de Deus. Folheando as paginas da obra, passamos a nos dar conta que: “[...] o verdadeiro e autêntico católico é o que ama a verdade de Deus e a Igreja, corpo de Cristo; aquele que não antepõe nada a religião divina e a fé católica – nem a autoridade de um homem, nem o amor, nem o gênio, nem a eloqüência, nem a filosofia – mas que, desprezando todas estas coisas e permanecendo solidamente firme na fé, está disposto a admitir e a crer somente o que a Igreja sempre e universalmente acreditou” (Comonitório, cap. XIX) A todos que tiverem a oportunidade de ler a referida obra, tão atual, escrita em uma pequena ilha do sul da França, há mais de 15 séculos, que tire grande proveito, aplicando o ensinamento adquirido nos tempos atuais, buscando assim, guardar a fé e proceder da melhor forma em meio a este grande oceano recheado de heresias modernistas que nos assola, persegue, confunde, tentando arrancar de vez a semente da fé lançada em nosso coração. São Vicente de Lerins, rogai por nós ! 1. Do latim cum[=com] + monitus[=advertido,prevenido,avisad o,informado]. 1) Instrução dada a um legado ou a um embaixador. 2) Ordem de comparecimento do metropolitano a um bispo eleito, para vir se consagrar. 3) intimação pessoal expedida por tribunal secular ou eclesiástico. 41 - In Guardia - fevereiro de 2012


Por Karen Mortean

O vício da pornagrafia

A tendência materialista e hedonista que tem violentamente invadido a mente humana nas últimas décadas também tem feito seus assaltos aos lares das famílias pela porta de frente. É o que nos revela um estudo recente conduzido pela empresa Symantec Corporation, no qual sexo e pornografia são mostrados como tópicos principais entre os 10 assuntos que crianças mais pesquisam na internet. Assustador por um lado, redundante por outro, já que não nos é novidade o frequente uso do apelo sexual em quase todos os meios de comunicação atualmente. O apelo erótico que outrora era apenas sutilmente sugerido em novelas adultas, hoje já está abertamente exposto em canais adolescentes, pois, qualquer paixão é sempre conduzida para um fim de intimidade sexual. O mesmo ocorre na cultura musical pop, onde seus versos mais comuns tratam de histórias calorosas e seus refrãos de desfechos sexuais mais incríveis ainda. Nos periódicos femininos, da pré-adolescência à idade adulta, o assunto exclusivo são os detalhamentos pitorescos das mais incríveis histórias de traição, sexo, quando não, orgias e mesmo sadomasoquismo e outras bizarrices. O fácil acesso a tais meios de comunicação associado à quase inexistência de uma formação de virtudes e critérios baseada na liberdade responsável aos nossos filhos, somado à mentalidade relativista vigente, permitiu um afrouxamento moral capaz de nos fazer aceitar o inaceitável. Passamos a crer que a classificação erótico/pornográfico depende unicamente de um valor de juízo social meramente consensual e subjetivo e não baseado na busca da excelência humana: “tais juízos mudam e se ajustam aos contextos, criando fronteiras dinâmicas, históricas, precárias e mutantes. A pornografia é em si, um fenômeno social e, como tal, permanece em constante transformação.” (Benitez, 2009) Esta dinâmica de ajuste contextual gerou um abismo entre o que era a pornografia de 100 anos atrás e o que ela se tornou atualmente. É evidente que a obscenidade não é manifestação exclusiva de nossos tempos, sendo observada e catalogada desde o início da história da humanidade - para os católicos, consequência de um mundo decaído pelo pecado. Cenas sexuais foram encontradas em desenhos rupestres, em manifestações religiosas panteístas e, milênios depois, em casas de prostituição. Em 1896, o primeiro vídeo considerado pornográfico chamado “The May Irwin Kiss” mostra o que seria um hoje 42 - In Guardia - fevereiro de 2012

um discreto beijo de May Irwin e John Rice. Foi somente a partir de 1960, com a revolução sexual, que os porn-movies passam a conter cenas mais explícitas e audaciosas de sexo, e em 1980, nos Estados Unidos, é que os cinemas passam a ter salas especiais somente com a finalidade pornográfica. Com o advento da internet, transformando toda casa com computador numa sala de cinema pornográfica em potencial, a indústria só tem feito cifras sobre cifras em faturamento. Foi como descobrir uma mina de ouro pouco explorada: o efeito entorpecedor da pornografia rendeu a construção de um império sem precedentes: “a pornografia se tornou um produto comercial fabricado para ser vendido e organizado segundo fórmulas e parâmetros comerciais, respondendo às demandas dos consumidores e visando a maximização do rendimento em prol de vendas maciças.” (Benitez,2009). Os dois embaixadores da exploração sexual (ou do mais aceitável nome de mercado adulto) mundialmente conhecidos são Larry Flynt, criador da revista Penthouse, e Hugh Hefner, criador da revista Playboy. O legado desses empresários da pornografia foi a introdução da mentalidade capitalista de fomento e consumo do sexo, que geraram uma nova - se assim podemos chamar - cadeia produtiva com números que nenhuma outra indústria deixaria de almejar: - Entre 1991 a 1997, o número de novos filmes de sexo explícito lançados apresentou um aumento de


500%; - Em 1997, a News & World Report afirmou que o entretenimento adulto estava avaliado em quase US$8 bilhões; - Em 2000, 60% dos sites visitados na Internet eram de natureza sexual; - Em 2001, o jornal New York Times citava uma estimativa para o negócio pornô na casa dos US $ 10 bilhões (incluindo websites, assinaturas de TV a cabo e filmes pay-per-view, filmes pagos em serviço de hotelaria, sexo por telefone, brinquedos sexuais e revistas pornográficas), dados fornecidos pela Forrester Research; - Em 2001, foram produzidos 11.000 vídeos pornográficos contra 400 filmes lançados por Hollywood, e 70.000 websites pornográficos (New York Times, 20 de Maio de 2001, “Naked Capitalists”); - Em 2002, foram criados 100.000 sites adultos nos EUA e cerca de 400.000 no restante do mundo; - Em 2004, havia cerca de 420 milhões de websites pornográficos no mundo; - Em 2006, a estimativa de rendimento da indústria pornográfica era de US$ 13,3 bilhões apenas nos EUA; - Em 2006, a China entra no topo da lista no rendimento do mercado pornográfico seguida pela Coréia do Sul: US$ 27 bilhões e US$ 25 bilhões respectivamente. Ao longo da história da pornografia é observado que o aumento do seu consumo é proporcional ao desenvolvimento tecnológico, a partir da revolução industrial com a velocidade das impressões, o que era necessário meses para imprimir, passou a ser realizado em horas, minutos. Porém, se antes era necessário sair de casa, ir até a única livraria da cidade, para comprar uma única revista com conteúdo pornográfico, agora em 0,24 segundos estão disponíveis 174 milhões de imagens, digitando apenas a palavra porn. Se o acesso é fácil a curiosidade também, dados fornecidos pela empresa Topten Reviews diz: “a cada segundo 28.258 usuários de internet estão a ver pornografia” O problema é que a pornografia oferece recompensas para o cérebro, sua atuação é idêntica a outros provocadores viciosos como jogos de azar e cocaína. Seu mecanismo de ação se dá através de um impulso de dopamina. A dopamina é um neurotransmissor e um neurorregulador, sua função é proporcionar sensação de prazer, energia, disposição, motivação, controle e regulação dos movimentos, está presente na expressão dos estados afetivos, no raciocínio e na concentração. Ao acessar o conteúdo pornográfico, no cérebro é gerado um impulso de dopamina de curta duração, num período de uma ou duas horas a pessoa experimenta elevação do humor, alegria e sensação de bem estar, a este evento dá-se o nome de Sistema de Recompensa Cerebral. A curiosidade pela cena sexual, a impulsividade e a recompensa cerebral, geram um

potencial viciador, como o uso gera gratificação, a pessoa sente vontade de passar por essa situação prazerosa novamente, tornando-se um ciclo vicioso. O estímulo pornográfico gera impulso de dopamina, a dopamina produz sensação de bem estar, cessando o impulso da dopamina, sensação de ansiedade enquanto espera a próxima reposição, podendo levar a compulsão. Da mesma maneira que o jogador e o usuário de cocaína precisam, ao longo do tempo, aumentar a quantidade de apostas e droga (ou até trocar de droga), para conseguir o mesmo efeito de liberação de dopamina, o usuário da pornografia tende a necessitar cada vez mais de imagens sexuais menos ordinárias (aceitando inclusive a pedofilia), para promover o mesmo efeito anterior. Vários sintomas são observados no viciado em pornografia dentre eles: - Diminuição da produtividade no trabalho, nos estudos. - O usuário não consegue deixar de visitar pornografia no trabalho; - Passam muitas horas por dia acessando conteúdo pornográfico e/ou em chats de cybersexo; - Comportamento sexual promíscuo; - Exibicionismo - Compulsão masturbatória - Troca de sexo real por virtual; - Cadastra-se em sites pornográficos pagos, gerando gastos incontroláveis. Como a droga, a decisão inicial de acessar a pornografia é voluntária, mas seu uso crônico pode precipitar mudanças cerebrais que comprometem os sistemas de recompensa, motivação e mesmo o livre-arbítrio. Como acontece com qualquer vício é muito difícil por razões neuroquímicas, para um viciado parar de fazer as coisas, não se trata somente de nulidade moral, e sim de desespero e ansiedade para conseguir obter a próxima dose de dopamina. Num mundo gravemente viciado, compreender o potencial poderosamente viciador do uso da pornografia e a sua indústria se faz necessário, o erotismo e a pornografia estão dispostos 24 horas por dia no conforto dos lares. Ferindo as famílias, usando as pessoas, maltratando quem vê e quem faz. Na segunda parte do texto, na próxima edição, será tratada a questão moral, os danos no matrimônio e os meios para evitar. Referências Bibliográficas h t t p : / / w w w. v a t i c a n . v a / h o l y _ f a t h e r / j o h n _ p a u l _ i i / audiences/1981/documents/hf_jp-ii_aud_19810429_po.html www.familysafemedia.com/pornography www.discernement.com/fichs/10141.pdf http://internet-filter-review.toptenreviews.com/internet-pornography-statistics.html) http://pt.scribd.com/doc/35411982/BASTIDORES-E-CENARIOS-DO-PORNO-BRASILEIRO HUNT, Lynn. 1999. A Invenção da pornografia. São Paulo: Editora Hedra. DIAZ, Benítez, María Elvira .Nas redes do sexo: Bastidores e cenários do pornô brasileiro/ María ElviraDíaz Benítez. Rio de Janeiro: UFRJ/Museu Nacional/PPGAS, 2009 SAIDE, O. & MELLO, L. TDAH e Transtorno do uso de substância American Psychiatric Association 2009, Annual Meeting: Abstract NR2-042. Presented May 18, 2009. “Onde há pornografia, não há liberdade. Há alguém ganhando dinheiro e alguém sofrendo para produzir o dinheiro que este outro está ganhando. Quem se vê submetido à cena pornográfica, sempre sofre, mesmo apesar de seus possíveis comprometimentos subjetivos a tal submissão. O comprometimento eventual de alguns de nós, não legitima o ato agressivo de quem propõe a pornografia”. Manifesto contra a pornografia - Pedro Cardoso – ator. 43 - In Guardia - fevereiro de 2012


A reconciliação com Deus como necessária para o relacionamento fraterno Por Ian Farias Na quarta feira de cinzas a Igreja conclama a todos os cristãos para que se voltem de coração sincero ao Nosso Senhor, arrependendo-se de todos os pecados outrora cometidos. Por meio do Ciclo Litúrgico, a Igreja rememora os mais importantes episódios de quando o Verbo Encarnado se pôs entre nós e fez sua morada. Iniciando o tempo da Quaresma somos chamados a rasgarmos nossos corações e abandonarmos as volúpias que nos conduzem ao pecado assegurando-nos apenas dos bens celestiais. E, como é de tradição, a Liturgia move nossos corações para vivermos tais dias piedosamente e configurados ao Nosso Senhor na humildade, na paciência e no amor. A Quaresma é um tempo de antiquíssima tradição na Igreja. Desde o ano 350, a Igreja celebra quarenta dias de preparação para a Morte e Ressurreição de Nosso Senhor. Nele recolhemo-nos ao silêncio e à interiorização da Palavra de Deus, preparando-nos para a Páscoa do Senhor. O dia que damos início, isto é, a quarta-feira de cinzas, é um veemente convite a relembrarmos a nossa condição miserável e a buscarmos segurança em Cristo. Um gesto simbólico para este dia é a imposição das cinzas realizada em todas as Igrejas. Tal gesto não é parte de um mero ritualismo, mas, vai além: toca e converte o coração do homem. Dá-lhe força na caminhada, mas ensina que essa força sai de Deus e só n’Ele poderá encontrá-la. Aliás, o Cristianismo não deve ser tido como ritualístico, mas ele assume a forma humana em Jesus Cristo, Ele dá sentido à toda ação ritual e por meio d’ Ele poder-se-á dizer que os nossos rituais não são vazios e repetitivos, mas realmente acontecem e em cada um manifesta-se um espírito de renovação e a atualização do Santo Sacrifício oferecido por Cristo ao Pai. A penitência também constitui uma característica fortíssima deste tempo, que juntamente com a ascese desejam colaborar na formação de homens que não apenas vivam com Deus, mas vivam em Deus. 44 - In Guardia - fevereiro de 2012

O homem sabe da sua necessidade de pedir perdão pelos seus inúmeros pecados. É um grito que emerge de suas entranhas, mas também é um clamor do próprio Deus. Ele põe-se ao encontro do homem. São João Crisóstomo em seu Sermão do Diabo Tentador aponta-nos cinco vias de penitência muito eficazes: “Indicamos cinco vias da penitência: primeira, a reprovação dos pecados; segunda, o perdão das faltas do próximo; terceira, a oração; quarta, a esmola; quinta, a humildade”. E, continuando, ele nos diz: “Tendo, pois, aprendido o meio de curar nossas chagas, usemos deste remédio. E com isso, recuperada a saúde, fruiremos com confiança da mesa sagrada, correremos gloriosos ao encontro de Cristo, Rei da glória, e alcançaremos os eternos bens, por graça, misericórdia e benignidade de nosso Senhor Jesus Cristo”. As leituras da quarta-feira de cinzas se desenvolvem também neste clima de reconhecimento dos pecados e da manifestação da bondade de Deus. Só Deus é bondade pura e só nele há verdadeira misericórdia. O mundo muitas vezes parece-nos apresentar formas de redenção e de salvação. Mediante esta grande pretensão o profeta Joel nos faz um profundo alerta, visível na primeira leitura: “Voltai para mim com todo o vosso coração, com jejuns, lágrimas e gemidos; rasgai o coração, e não as vestes; e voltai para o Senhor, vosso Deus; ele é benigno e compassivo, paciente e cheio de misericórdia, inclinado a perdoar o castigo” (2,12-13). Em primeiro lugar vemos um clamor: “Voltai para mim com todo o coração”. O profeta inspira-se na praga da invasão dos gafanhotos que atingiu o povo, destruindo as colheitas, para poder clamar por uma destruição da aparência. O verbo voltar aqui parece estar situado em um duplo sentido: Voltar no sentido de retorno ou voltar no sentido de volver os olhos, contemplar. Mas isso aqui talvez não nos pareça tão complicado, uma vez que aquele que volta os olhos a Deus deve também caminhar em sua direção, não deve perdê-lO de vista, mas sempre tê-lO como a referência, Aquele que


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nos guia pelas estradas turvas do mundo. A volta para Deus requer depositar-se com total confiança nas mãos d’Ele, abandonar as próprias ideologias pretensiosas e render-se Àquele que encerra todo bem e toda bondade. Voltar-se para Deus, mesmo diante das perseguições que sofrem inúmeros cristãos, vítimas de guerras que sufocam a convivência pacífica e a liberdade religiosa. Voltar-se para Deus, mesmo diante das várias formas de “alegria” que o mundo apresenta: eis aqui a maior demonstração de amor. “Rasgai o vosso coração, e não as vestes”. O sentido existencial do homem não está nas coisas materiais, mas no que ele é. Para o encontro com Deus é necessário indubitavelmente dar este primeiro passo que é rasgar o coração. Nada mais nos pede Ele, senão que rasguemos os corações. E, por que nos pede tal coisa? Porque as vestes se rasgam, mas não se vê o coração, e o coração rasgado, ainda que não se rasguem as vestes, pode ser visto. O Cristianismo não oferece forma prática de vida, e Jesus nunca afirmou que prometeria uma vida sem sofrimento a seus seguidores. Pensar no Cristianismo como uma forma de livrar-se dos problemas seria demasiado pobre e reducionista diante de suas tantas maravilhas. As palavras que Deus dirige por meio do profeta ecoam fortemente em nossos dias. Os homens não mais têm Deus como centro, no entanto, exaltam a sua “soberba intelectual”, como nos advertiu o Papa Bento XVI, na Santa Missa de Natal de 2011. O orgulho destrói o homem, faz com que ela venha a consentir com o próprio pecado e, muitas vezes, torna-o escravo dos seus desejos. Deus não pode forçar ninguém a converter-se, mas esta é uma atitude de Deus que deve ter uma livre adesão do homem, ou seja, é Deus quem converte o homem, mas é preciso que o homem converta-se a Deus. “O coração do homem apresenta-se pesado e endurecido. É preciso que Deus dê ao homem um coração novo. A conversão é antes de tudo uma obra da graça de Deus que reconduz nossos corações a ele: “Converte-nos a ti, Senhor, e nos converteremos” (Lm 5,21). Deus nos dá a força de começar de novo. É descobrindo a grandeza do amor de Deus que nosso coração experimenta o horror e o peso do pecado e começa a ter medo de ofender a Deus pelo mesmo

pecado e de ser separado dele. O coração humano convertese olhando para aquele que foi traspassado por nossos pecados” (CIC 1432). Recorda-nos ainda o profeta que Deus é benigno e misericordioso. Assim, Joel, ordenado por Deus, faz soar trombetas e alarmes a todo o povo, para que reconhecendo a sua vida pecaminosa, não persistam no pecado e pereçam, mas convertam-se e tenham a vida eterna. Ordena também que os sacerdotes chorem manifestando o arrependimento por seus pecados. Hoje, creio eu, nós somos chamados a elevar incessantes preces de arrependimento a Deus junto com o nosso coração contrito e humilhado devido os nossos pecados. A conversão é também um processo contínuo, como diria Santo Agostinho, ao dizer que ele não era convertido, mas estava se convertendo. Também aos membros da hierarquia, nós que somos escolhidos para a vocação sacerdotal ou religiosa, é dirigido o clamor que impera como proposta de vida nesta Quaresma e durante a nossa caminhada cotidiana: “Paenitemini et credite evangelio - Converteivos e crede no Evangelho” (Mc 1,15). A nós, cristãos, o Santo Padre Bento XVI dirige profundíssimas e contundentes palavras, não somente ao povo leigo, mas a toda hierarquia: “Todos se podem abrir à ação de Deus, ao seu amor; com o nosso testemunho evangélico, nós cristãos devemos ser uma mensagem viva, aliás, em muitos casos somos o único Evangelho que os homens de hoje ainda lêem”. E o que há de ter por fim? Aquele tão esperado momento pelo qual veremos que os nossos sacrifícios e penitências não foram em vão: “O Senhor encheuSe de zelo pela sua terra e teve compaixão do seu povo” (Joel 2, 18). Eis que o nosso Deus não é vingativo, mas é amor sem reservas. Amor tão grande é o Seu que doa o próprio Filho para salvar a humanidade, para libertá-la do julgo e da escravidão do pecado. A qualquer um que a


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Ele se volte jamais será traído e desamparado. Na segunda leitura, São Paulo nos convida à reconciliação com Deus. Eis o momento propício para que o mundo se volte a Ele. Voltemo-nos hoje! Agora! Deixemos de lado a mediocridade que levamos em nossas vidas. “Irmãos: Nós somos embaixadores de Cristo; é Deus quem vos exorta por nosso intermédio. Nós vos pedimos em nome de Cristo: reconciliai-vos com Deus. A Cristo, que não conhecera o pecado, identificou-O Deus com o pecado por amor de nós, para que em Cristo nos tornássemos justiça de Deus. Como colaboradores de Deus, nós vos exortamos a que não recebais em vão a sua graça. Porque Ele diz: «No tempo favorável, Eu te ouvi; no dia da salvação, vim em teu auxílio». Este é o tempo favorável, este é o dia da salvação” (2Cor 6,2). Pequeno e profundo é o texto que a liturgia nos apresenta na segunda leitura. São Paulo estava em Corinto e realizava a sua defesa perante a acusação de seus opositores. Ele se intitula, então, “embaixador de Cristo”. Quem é o embaixador? Definimos como aquele funcionário diplomático acreditado junto a um Estado estrangeiro ou organização de caráter internacional. O embaixador não fala por si mesmo, mas transmite aquilo que ouviu do seu superior. Paulo é o embaixador de Jesus Cristo e a Igreja dá continuidade a esta missão. Em nome d’Ele a Igreja prega a conversão e a reconciliação, administrando os santos sacramentos para os homens que desejam achegarse à graça divina e tomar parte do Reino de Deus. Não são as suas palavras que a Igreja prega. A missão da Igreja é unicamente pregar a Palavra de Deus, em unidade com a Sagrada Tradição e o Sagrado Magistério. Quando alguns membros da Igreja são tentados a anunciarem suas palavras e não as palavras de Cristo, correm o risco de caírem em um individualismo, separando-se, assim, do Corpo de Cristo. Paulo faz um convite a que nos reconciliemos com Deus. Esta reconciliação, no entanto, não é algo momentâneo. Ela exige uma conversão radical de vida e uma plena doação. Neste sentido, a lógica da conversão não se dá apenas pelo mero fato de que uma pessoa seja batizada e aceite a Santa Fé Católica, mas requer também o testemunho autêntico. Jesus Cristo não conheceu o pecado, e nem poderia têlo conhecido, pois é Deus. Paulo afirma que Deus identifica Cristo com o pecado. Poderíamos dizer, à letra, que Deus fê-lo pecado. A princípio parece-nos chocante e absurda esta informação, porém, Paulo não afirma que Deus o tornou pecador, mas o fez “pecado”, significando que a Ele caberia sofrer os castigos dos nossos pecados. Ainda sobre a “identificação”, diria que ocorre entre dois gêneros: o humano e o divino. Vemos uma compenetração de ideias e, diria ainda, de sentimentos. O pecado expressa a fragilidade humana, à qual todos somos submetidos. Pecamos em nome de uma pretensa felicidade, de um prazer passageiro pelo qual os homens sempre se põem a buscar. De outro lado, contrasta a figura do divino. É Cris-

to que vem do alto, que se inclina, mesmo com a nossa fragilidade, e nos liberta. Dele ouvimos ressoar estas palavras confortadoras e encorajadoras: “No tempo favorável, Eu te ouvi; no dia da salvação, vim em teu auxílio”. Se de um lado o pecado aprisiona e oprime, do outro o amor liberta e restaura. Neste encontro transcendental do humano com o divino, somos tomados por um forte impulso de lançar-nos nas mãos de Cristo; de estar com Aquele que não se submeteu ao pecado, mas submeteu o pecado ao seu poder glorioso, destruído a morte com a sua ressurreição. “Este é o tempo favorável, este é o dia da salvação”. Não virá, não veio. É este o tempo! É agora! São Paulo cita aqui Isaías 49, 8, quando o Profeta classificou, desta forma, o momento em que a misericórdia divina liberta os israelitas do cativeiro. Agora é também o tempo para nós. Deus quer libertar-nos do cativeiro do pecado. Ele oferece-nos a salvação como graça e não podemos deixar de abraçá-la. “Guardai-vos de fazer as vossas boas obras diante dos homens, para vos tornardes notados por eles” (Mt 6, 1). Assim inicia-se o Evangelho de hoje, retirado do Sermão da Montanha (Mt 6, 1-6.16-18). É uma mensagem dedicada inicialmente aos que vinham dos gentios, mas estende-se também a todos nós. Jesus faz uma releitura das três obras de piedade previstas na lei mosaica. Com a vicissitude dos tempos esta prática fora corroída por fundamentalismos ou eram vivenciadas apenas como sinal de superioridade. Claro está, conforme a Sagrada Escritura diversas vezes apresenta, que difícil era vermos os fariseus alheios à hipocrisia. Eram constantemente movidos por um orgulho demasiado tal que chegavam a orgulhar-se da própria desgraça para a qual caminhavam: o afastamento de Deus e a reclusão aos irmãos. Infelizmente, esta realidade é vista, não raras vezes, na hodierna sociedade. Jesus adverte que quem pratica a caridade não deve esperar aplausos, elogios, engrandecimentos, mas precisa exercitar a humildade como prática primeira do amor. Quem busca fazê-lo contrário ao que pedira Nosso Senhor, faz com que suas orações e práticas caritativas que deveriam, a princípio, serem recompensadas por Deus, sejam atiradas no sorvedouro do orgulho e da ganância, de onde só a humildade haverá de salvá-lo. Aliás, o orgulho afasta o homem de Deus, mas, por outro lado, só o amor a Deus pode afastar o homem do orgulho. Não é paradoxal se vermos que o primeiro passo para amar a Deus é curvar-se humildemente como fê-lo Jesus na ultima ceia.


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Ademais, convém ressaltar que “Ele não nos proíbe de praticar a justiça cristã em todas as oportunidades, para edificação do próximo; pelo contrário, disse Ele: ‘Brilhe vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos Céus’. [...] Edificai o próximo, por vossas ações externas, e tudo em vós, até mesmo um piscar de olhos, seja ordenado, mas tudo se faça com naturalidade e simplicidade, visando dar glória a Deus” (OEuvres Choisies de Bossuet. Versailles: Lebel, 1821, v.II, p.47-48). Maldonado dirá: “Não há culpa em ser visto pelos outros quando se faz o bem, mas sim em desejar ser visto. Também não há culpa em querer ser visto, desde que não seja para conseguir o elogio dos homens. ‘Brilhe vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos Céus’” (Comentarios a los cuatro Evangelios - I Evangelio de San Mateo. Madrid: BAC, 1950, p.282.) Estes que vencerem o orgulho e a arrogância poderão contemplar a face de Deus incessantemente. Outro ato que Jesus critica na ação farisaica são as orações feitas no intento de serem vistos e aplaudidos pelo público. Recorro ao texto do Monsenhor João Scognamiglio Clá Dias, onde ele afirma: As pessoas costumavam orar no interior das próprias casas. Os fariseus, porém, escolhiam para tal os lugares mais visíveis nas sinagogas ou nas praças públicas. Ali gesticulavam e repetiam de cor grande número de orações, de forma a impressionar quem por lá passava. Inútil dizer que eram vãs essas preces, pois eles já tinham obtido o que almejavam: o aplauso dos transeuntes. N ã o caiamos, entretanto, no erro de pensar que Nosso Senhor condena toda oração feita em público. O Divino Mestre recrimina neste versículo apenas a preocupa-

ção com as exterioridades, tão frequente nos homens daquele tempo, e a atitude genérica das pessoas que rezam com ostentação ou procurando unicamente o louvor dos semelhantes (Artigo: O centro deve estar sempre ocupado por Deus. Publicado no site www.arautos.org, em 11/02/2010). A oração feita com simplicidade comove o coração de Deus. Nossa oração não deve ser motivada pela exterioridade dos gestos ou pela sua excessividade, antes de tudo, será vista pelo nosso testemunho causado por uma motivação interior que desperta nos demais uma louvável atitude de conversão e das práticas penitências. Jesus fala também do jejum. A cultura oriental é propensa a dramaticidade. Os fariseus quando jejuavam não apenas o faziam abstendo-se do alimento, mas jejuavam do bom senso e da humildade. Não penteavam a barba, colocavam cinzas na cabeça e desfiguravam o rosto para mostrarem sua trágica fisionomia. Jesus alerta aos discípulos prezando pelo asseio corporal que é um desejo exterior do nosso asseio espiritual. A quaresma é sempre um renovado convite à vivência da penitência e da humildade. Crescer na humildade é crescer no amor a Deus, e só ama, na lógica de Deus, quem tem a capacidade de perdoar e reconhecer os seus pecados.

As pessoas costumavam orar no interior das próprias casas. Os fariseus, porém, escolhiam para tal os lugares mais visíveis nas sinagogas ou nas praças públicas. Ali gesticulavam e repetiam de cor grande número de orações, de forma a impressionar quem por lá passava. Inútil dizer que eram vãs essas preces, pois eles já tinham obtido o que almejavam: o aplauso dos transeuntes. Não caiamos, entretanto, no erro de pensar que Nosso Senhor condena toda oração feita em público. O Divino Mestre recrimina neste versículo apenas a preocupação com as exterioridades, tão frequente nos homens daquele tempo, e a atitude genérica das pessoas que rezam com ostentação ou procurando unicamente o louvor dos semelhantes (Artigo: O centro deve estar sempre ocupado por Deus. Publicado no site www.arautos.org, em 11/02/2010).


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