VMD Um guia antidesastre em projetos criativos, de Luis Marcelo Mendes

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O FATOR

VDM UM GUIA ANTIDESASTRES EM PROJETOS CRIATIVOS

PARA PROFISSIONAIS LUIS MARCELO MENDES


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O FATOR

VDM UM GUIA ANTIDESASTRES EM PROJETOS CRIATIVOS PARA PROFISSIONAIS LUIS MARCELO MENDES (VERSÃO REDUZIDA PARA DIVULGAÇÃO)


INFORMAÇÕES IMPORTANTES Esse material promocional apresenta uma seleção de capítulos para você conhecer o FATOR VDM . Antes da sua leitura, quero chamar a sua atenção para alguns pontos. A primeiro deles é que esse é um livro lançado por uma nova editora, a Ímã Editorial, que acredita que as novas tecnologias digitais oferecem novas possibilidades para a leitura e para a escrita. Com isso, o leitor passa a ter o poder de decidir por uma brochura, uma clássica edição de capa dura, ou ler na tela de seu celular; pode ainda escolher o design de capa e compor seu próprio livro. No site http://www.imaeditorial.com você terá mais informações sobre os formatos disponíveis desse e de outros títulos. Outro detalhe é que este é um livro impresso on demand, a partir do seu pedido. Essa é uma opção mais inteligente e ecologicamente responsável, que não gera desperdício nem estoques. Participação A impressão on demand permite que este livro sempre esteja atualizado. Inclusive com a sua participação, através do Facebook e do Twitter. O livro tem uma seção chamada Extended Play, justamente para receber o seu artigo sobre os temas abordados.

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Convide o FATOR VDM para falar O livro é também uma palestra e um curso. Tudo o que é necessário é um palco, auditório ou sala de reunião. De eventos de estudantes a conferências, se você estiver interessado numa apresentação divertida e cheia de insights, entre em contato pelo email: ofatorvdm@gmail.com. O FATOR VDM para Clientes A versão de o FATOR VDM para clientes está em andamento e, em breve, estará disponível no site da editora e nas livrarias, apresentando uma visão completa sobre a construção de uma cultura projetual comum. Consultoria Empresas e instituições também podem contar com o serviço de consultoria na gestão de design e comunicação estabelecendo boas práticas corporativas. Os serviços envolvem diagnósticos, apoio na construção de RFPs (Request for Proposal), concorrências e outras contratações de itens de comunicação e design. Formulação de critérios técnicos para elaboração de briefing, de avaliação de propostas e de avaliação crítica de consistência visual e conceitual. Entre em contato pelo email: ofatorvdm@gmail.com.

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PRODUTO DOS FATORES ALTERA A ORDEM

O

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SUMÁRIO

A ARTE DE CATIVAR CLIENTES Por Bruno Porto xi

A CULTURA PROJETUAL Ela acontece 17 Bem-vindo ao meu mundo 22 O brilho da lâmpada 24 Jekyll e Hyde 28 A regra não é clara 32 Otimismo é um veneno 36

COMPUTADOR NA MÃO, IDEIA NA CABEÇA O manual básico de sobrevivência 41 Pede para sair 44 Quando tudo certo nunca é 100% 46 A ordem dos fatores altera o produto 48 Tamanho é documento 51 O fluxo de caixa é mais importante que sua mãe 52 Espeto de aço inox 53


O NEGÓCIO É O SEGUINTE Mantenha o medidor ligado 57 O comercial criativo 61 Briefing: onde a mágica acontece 63 Cliente no divã 65 Encontre o interlocutor 66 Defina o prazo 67 Combine papéis 68 Descubra a verba 70 Identifique referências 72 Vale o escrito 73 Money changes everything 76 O clube dos macacos velhos 78 A pressa passa 81 O maravilhoso mundo dos negócios 84 Incoerência da concorrência 88 A nossa parceria 91 É dando que se dá 95 Temos que endurecer 96 Sem perder a experimentação 98


SÓ FALTA IMPRIMIR O vale das ideias mortas 101 Kill your darlings 103 Óbvio é um lugar que não existe 107 A linha fina entre o amor e o ódio 110 Sexta, não 114 Pra ontem 117 Diga se entendido 120 WYSIWYG 122 De gênio a besta em 15 segundos 124 Paz, amor e compreensão 130 Tudo vai dar certo 136

EXTENDED PLAY Cliente ordinário. Por Michel Lent 141 (Espaço reservado para a sua colaboração)

REFERÊNCIAS 146 BIBLIOGRAFIA 148 DISCOGRAFIA 150


APRESENTAÇÃO

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A ARTE DE CATIVAR CLIENTES POR BRUNO PORTO

O livro de Luis Marcelo Mendes preenche uma lacuna na biblioteca básica de qualquer profissional, empresa ou órgão que lide com design, publicidade, cinema, música, literatura, fotografia e artes de uma forma geral: é uma abordagem inteligentemente pé no chão sobre a gestão de serviços criativos no Brasil. Oportuno e necessário, O FATOR VDM chega no momento exato em que o país adentra um novo estágio de exigência, competitividade e maturidade nesses serviços. O texto deste jornalista mineiro, carioca por vocação, vai direto na jugular de um dos principais problemas que atinge a grande maioria dos nossos profissionais de criação: somos muito criativos, mas nem sempre muito profissionais. Nos dez anos como vice-presidente de operações de uma das mais versáteis agências de design do país — a Tecnopop, da qual foi um dos fundadores — LMM esteve envolvido nos bastidores e na linha de frente de projetos em todos os formatos, portes, áreas e mídias possíveis. Não é exagero. Colaborou com premiadas produções audiovisuais de ficção e não ficção, e desenvolveu sistemas completos de branding para clientes do segmento cultural. Estruturou exposições nacionais e internacionais de artes plásticas, design e arquitetura, e produziu publicações de todos os calibres, lombadas XI


e tiragens. Montou estratégias de campanhas interativas on-line e off-line, envolvendo rádio, televisão, internet, displays urbanos, shows. O que você pensar, ele já negociou, orçou e viabilizou. Esta vivência impressionante o levou a entender como pensam os dois lados do balcão da criação — o que oferece e o que contrata — capacitando-o a identificar quais são e como surgem os problemas no desenvolvimento de projetos criativos. Seu livro destrincha essas questões e contrastes com uma clareza invejável, e a dose certa de um humor implacável. A experiência de Luis Marcelo Mendes já ajudou a vender música, eleger políticos, conquistar prêmios cinematográficos, fazer literatura, documentar histórias de vida, disseminar informação e ideias, apresentar o Brasil ao mundo, e vice-versa. Ela agora vai ajudar você a evitar as armadilhas que cada projeto esconde e, definitivamente, a se tornar um profissional melhor.

Bruno Porto é designer pós-graduado em Gestão Empresarial e Marketing e educador. Autor dos livros Vende-se design (2011, 2AB) e Memórias tipográficas das Laranjeiras, Flamengo, Largo do Machado, Catete e adjacências (2003, 2AB) e coautor de Asian Graphics NOW! (2010, Taschen). É colunista do Portal DesignBrasil.org.br e editor do BrazilianGraphicDesign.com.

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VAI DAR 14


MERDA O “Ministério do Vai Dar Merda” funcionaria assim, segundo Chico Buarque: “A cada decisão importante, esse ministro seria chamado. Se o governo decide recadastrar os idosos, o Lula convoca o ministro e pergunta: ‘Vai dar merda?’ O ministro analisa o caso, vê que os velhinhos vão ser humilhados nas filas, e responde: ‘Vai dar merda’. No caso da briga com o New York Times, era só chamar esse ministro e perguntar: ‘Vamos expulsar o jornalista. Vai dar merda?’ O cara ia analisar e responder: ‘Vai dar merda’.

“Um retrato do artista”. de Rodolfo Fernandes, em O Globo em 18 de junho de 2004

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A CULTURA PROJETUAL

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ELA ACONTECE Existem mil livros de comunicação, marketing e design com incríveis histórias de projetos de sucesso, a partir de grandes sacadas criativas que resultam em glória, fama e fortuna para os profissionais e empresas envolvidas. Este não é um deles. O FATOR VDM é um guia que ajuda profissionais e estudantes a entenderem que, na prática, fazer projetos criativos não é fácil como parece. Isto vale para quem atua na área de comunicação, publicidade, comunicação empresarial, redação e marketing on-line. E para os designers gráficos, de produtos, de embalagens, de design em movimento ou webdesign. E ainda para os especialistas em mídias sociais, jogos e aplicativos mobile, de produção de eventos, de cenografia, de produção audiovisual, de criação total, integrada ou 360°. Em cada escritório criativo encontramos projetos com abordagens diferentes, para clientes de segmentos diferentes e uma série de problemas de relacionamento em comum. Para cada case de sucesso existem mil histórias onde as coisas não foram tão bem, o resultado final não ficou como esperado e a relação com os clientes saiu abalada. E, em alguns casos, os profissionais criativos insistem em escorregar nas mesmas cascas de banana, esperando atingir resultados diferentes. 17


Por isso, quero que você conheça e comece a aplicar nos seus projetos um novo olhar que eu chamo de FATOR VDM . Como você já deve ter entendido, VDM significa “vai dar merda”. Não se trata de uma filosofia pessimista, assim como não é um pensamento que parte do princípio que as pessoas são incompetentes ou amadoras, mas da constatação que o acaso nem sempre vai te proteger enquanto você andar distraído. Essa “merda projetual”, objeto de estudo do livro, é como uma bactéria no ar e está presente em muitos trabalhos de uma forma ou de outra. Por vezes em detalhes imperceptíveis ao olho nu. Você pega o catálogo de uma exposição, por exemplo. A impressão está um primor. O acabamento fantástico. O design consegue estabelecer um diálogo sensível com a obra do artista. Lá pela metade da publicação, uma determinada obra lhe chama a atenção. Alguns segundos depois você vira a página e prossegue a leitura assim como milhares de outros leitores, sem se dar conta de que a obra em questão foi impressa de cabeça para baixo. O que parece um pequeno equívoco foi, na verdade, o grande responsável por uma longa e intensa crise entre o designer, o produtor da exposição, o museu que abrigou a exposição e o artista cuja obra foi retratada 18


no catálogo. O erro passou completamente despercebido por todos até as três mil cópias serem entregues pela gráfica. Nesse momento, o artista encontrou o erro na primeira folheada — como em geral acontece. Erros costumam apresentar esse comportamento bipolar: ficam tímidos na revisão e exibidos quando não há volta. Mas o artista do nosso exemplo ficou furioso e afirmou que faria uma fogueira com o material, que era a contrapartida para o museu receber o pagamento do patrocínio. Isto fez com que a instituição, em pânico, ameaçasse o produtor da exposição de um processo judicial. Por sua vez, o produtor exigiu que o designer pagasse a reimpressão dos catálogos. E, na impossibilidade de passar a conta para o estagiário que inseriu as imagens na correria da produção, só sobrou para o designer a ingrata tarefa de tentar entender em que momento a coisa desandou e o projeto com que ele estava tão entusiasmado se tornou um desastre. O que ele fez para merecer isso? Merdas acontecem. Sabemos disso. Como disse o blogueiro canadense Neil Pasricha, “todos vamos encontrar lombadas e solavancos. Nenhum de nós pode prever o futuro, mas sabemos uma coisa sobre ele: nada vai acontecer exatamente conforme o planejado”. 19


Portanto, se as coisas em algum momento deram errado não se martirize: você não está só. Porém tampouco se acomode. Existem formas de se prevenir do pior cenário. Observando o FATOR VDM você entenderá que “os projetos criativos tendem ao desastre por natureza. É a ação das pessoas envolvidas que o salva”1. O ideal da vida criativa seria a gente ter, pegando carona na figura criada por Chico Buarque, um pequeno “Ministro do Vai dar Merda” nos ombros como os anjinhos e demônios dos desenhos animados. Ele seria o responsável de nos sugerir, por exemplo, obter a confirmação por escrito do artista de que todas as obras e legendas do catálogo usado como exemplo estavam aprovadas, antes da impressão. Tudo é óbvio, depois que as coisas acontecem. Para quem está na linha de frente de projetos, nada deveria ser óbvio. O FATOR VDM não é uma tábua com dez mandamentos, os doze passos da felicidade, a cura para todos os males e nem a receita para a iluminação suprema. E não vai fazer com que todas as suas relações passem a funcionar instantaneamente. Ele não é dogmático, sagrado e nem definitivo. 1 Corruptela da frase do filósofo, teórico político, escritor e compositor suíço Jean-Jacques Rousseau: “O homem é bom por natureza. É a sociedade que o corrompe”.

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O que você verá neste livro são dicas de como conter a proliferação dessas bactérias projetuais, suas infecções e a contaminação do ambiente a partir deste mecanismo mental chamado FATOR VDM . O objetivo é contribuir para que você possa estabelecer uma cultura projetual comum com seus clientes, que seja boa para todos e que produza bons resultados. Por isso O FATOR VDM tem duas versões: para profissionais criativos e clientes — apresentando boas práticas de trabalho tanto para você como para quem o contrata: diretores de comunicação, gerentes de marketing, art buyers, profissionais de atendimento, empresários, administradores dos mais variados tipos de empresas públicas e privadas. A seguir você encontrará um segmento administrativo onde vamos conhecer as bases do VDM; um segmento comercial que diz que nem sempre um negócio é um bom negócio e, finalmente, um segmento de projetos onde entendemos a importância de jamais dizer que está tudo pronto e “só falta imprimir”. E não se preocupe: o livro trata do “vai dar merda”, mas garantimos que você vai se divertir pelo caminho, se identificar com as situações apresentadas e ter aqueles estalos mentais, ou insights, que o ajudarão a lidar com os seus projetos. Prepare-se para momentos de turbulência mental. No final, vai dar tudo certo. 21


BEM-VINDO AO MEU MUNDO Desde a criação do mundo que o mundo da criação não tinha que lidar com um ambiente tão complexo como o que vivemos hoje. Quem assiste à série norte-americana Mad Men, ambientada numa agência de publicidade americana na década de 1960, morre de inveja. Os executivos lidam com apenas um projeto de cada vez, têm tempo para longos almoços e tomar um uísque com seus clientes durante o expediente. Sem iPhone tocando o tempo todo e sem “incêndios” constantes a serem apagados. Velhos tempos. Mudou o ritmo e mudaram as competências. Hoje temos os mais diversos tipos de Serviços Criativos2 na perspectiva da Economia da Cultura. Na prática, temos um monte de profissionais no mercado com diferentes experiências. Boa parte dessas atividades sequer existiam há 20 anos. Outras começaram a amadurecer no Brasil a partir de 1980. Portanto, estamos diante de um mercado novo, que nos oferece o desafio de pensar novas regras e boas práticas de trabalho para aprimorar a relação com os clientes sem vícios inadequados do passado. 2 Segundo o livro Economia Criativa, de Ana Carla Fonseca Reis, a classificação de indústrias criativas considera que propaganda está na área de Serviços Criativos, design gráfico está sob Design e webdesign, em Novas Mídias. Para efeito da análise VDM, peço perdão aos teóricos porque vamos juntar todo mundo no mesmo saco.

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O FATOR VDM é um projeto que não termina na última página deste livro. Como na música do cantor e compositor britânico Elvis Costello3, todos os dias nós escrevemos um novo capítulo deste livro. A interação com o leitor — através das midias sociais — levará a constantes atualizações. Visite nossa página no Facebook, por exemplo, e compartilhe sua experiência. Quem sabe na próxima edição deste livro dinâmico sua história não vira um case para a seção Extended Play?

3 “Everyday I Write the Book”, canção lançada em 1983 no álbum Punch the Clock.

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O BRILHO DA LÂMPADA O primeiro ponto que precisamos deixar claro é a grande diferença entre a Lei de Murphy e o FATOR VDM : enquanto aquela prega a inevitabilidade dos desastres, a filosofia VDM entende que esses podem ser evitados ou, pelo menos, contidos. A divertida Lei de Murphy, quando extraído o humor negro que a caracteriza, leva à sensação de derrota e, portanto, ao desânimo absoluto, já que o pão sempre vai cair no chão com o lado da manteiga para baixo. Por outro lado, o FATOR VDM é uma perspectiva antidesastres, que estimula você a tomar atitudes para evitar que o pão caia. E, se cair, que você tenha outro fresquinho à sua espera com o devido quinhão de manteiga. Ou seja, ninguém deve e pode garantir que o pão nunca vai cair. Errar é da natureza da cultura projetual já que a criatividade deve estar sempre caminhando na linha do risco para poder produzir aquilo que vai diferenciar o seu negócio e não apenas uma repetição de fórmulas estabelecidas. Uma série de autores atuais observam a importância do erro para a inovação. No livro Little Bets, por exemplo, o escritor Peter Sims4 aponta para o fato de 4 petersims.com

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que os profissionais criativos por vezes investem em grandes ideias superlegais cuja realização foge ao seu domínio, enquanto as pequenas apostas são uma forma melhor de explorar e desenvolver novas possibilidades por meio de ações de baixo risco tomadas para desenvolver ou testar uma ideia. Aqui o objetivo principal é o caminho da “tentativa e erro”, cuja experiência pode criar um aprendizado ou se transformar num processo. Um equívoco comum de quem contrata serviços de comunicacão, design ou de novas tecnologias é acreditar que o criativo é um ser dotado de uma lâmpada que acende a cada produção genial da sua mente, quando a solução do seu problema magicamente estoura como um grão de pipoca. O desenvolvimento de bons projetos de identidade visual, por exemplo, funciona dessa forma. São exercícios cromáticos, de tipografia e outros elementos gráficos que resultam em pequenas apostas: um conjunto de caminhos, a partir dos quais são feitas derivações, desdobramentos, inversões. É um processo gradual que exige do profissional criativo a persistência de testar todas as possibilidades e a disposição para aceitar que alguns caminhos que pareciam extremamente promissores no início realmente não vão dar em nada. 25


É um exercício trabalhoso de eliminação, decantando dezenas de desenhos a uma única dezena e, dessa, em três selecionados para a escolha final de uma marca de maior força e consistência que se apresenta ao cliente com extrema segurança. A outra forma é apostar tudo na grande ideia, uma única solução à qual o profissional criativo dedica todo o seu esforço, mas que, talvez, acerte apenas na trave. Nesse caso, voltar à estaca zero é uma situação bem mais complicada. Sims conta no seu livro que o ator americano Chris Rock, em sua carreira de stand-up comedy, faz diversas apresentações em pequenas casas noturnas para testar novas piadas do seu show. Ali ele tem o espaço para fazer o mesmo modelo do trabalho de identidade visual; testar caminhos, tempo, gesticulação, encadeamento de temas e observar a reação do público. O que não funciona tão bem, ele reestrutura. Se ainda assim não funcionar, joga fora. Resultado: antes de se apresentar diante de uma plateia de um grande teatro cobrando centenas de dólares de cada espectatador, Chris Rock, já terá testado todo o seu repertório com uma grande variedade de pessoas. O que nos traz à questão: em que medida você você

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deposita total confiança na luminosidade da imaginária lâmpada que se acende sobre sua cabeça? A jornalista e “erradologista” americana Kathryn Schulz5, em sua palestra “On being wrong” no evento TED em 2011, fez uma observação interessante. Cerca de 1.200 anos antes do filósofo francês René Descartes marcar a epistemologia, também chamada de teoria do conhecimento, com a frase “Penso, logo existo”, o também filósofo e doutor da Igreja Santo Agostinho, escreveu “Fallor ergo sum” (Erro, portanto, eu sou). Assim, nossa capacidade de dar bolas fora, não é algo possível de erradicar ou superar. É totalmente fundamental, como raiz de toda a nossa criatividade. E no entanto, por mais que na teoria o erro seja previsível, ele sempre surge como uma surpresa inesperada. Considerando nossa tendência para o erro, vale pensar por que não temos uma cultura com foco no FATOR VDM e quais os perigos que isso pode trazer para os projetos que realizamos. Quando entendemos esses conceitos, podemos estreitar substancialmente a nossa margem de desastres, empregando o VDM para administrar não somente os erros, mas como os acertos de cada projeto.

5 beingwrongbook.com/

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TUDO VAI DAR CERTO Muitas vezes nos acostumamos a entender projetos criativos como arte. Isso é um engano comum que devemos evitar por mais que um site, folder, campanha, aplicativo mobile ou cenário seja esteticamente bonito. A ideia principal que podemos concluir do FATOR VDM é que todas as pessoas envolvidas no desenvolvimento de projetos criativos devem trabalhar para a construção de uma cultura projetual comum. E essa construção conjunta é o que pode melhor caracterizar a diferença entre o objetivo final que fazemos e o conceito de arte. Arte é talento. Projeto é habilidade. Arte é interpretada. Projeto é compreendido. Um bom trabalho de arte é aberto à interpretação e, portanto, entrega uma mensagem diferente a cada pessoa. Já um bom projeto, por sua vez, é uma construção que entrega a mesma mensagem para todos. O que nos leva a concluir que a arte inspira, enquanto um projeto motiva, leva a uma ação. No ambiente da arte, a noção de certo ou errado não se aplica — pelo menos não no contexto contemporâneo e não academicista. O que é diferente de projetos. Estes entregam produtos, serviços ou resultados exclusivos. Em muitos casos, podemos medir claramente o seu êxito e entender se as escolhas projetuais deram certo ou não. 28


Mas não podemos deixar de lado que esses projetos são, na essência, criativos. Portanto não se deve pensar em fórmulas prontas, caminhos salvos do erro. Pelo contrário, o projeto criativo caminha na linha do risco. Existem leituras mais radicais em relação a isso, como a do designer húngaro Tibor Kalman8 que tinha uma teoria interessante. Ele disse: “Você não quer fazer muitos projetos do mesmo tipo. Eu fiz dois projetos de um monte de coisas. O primeiro você estraga de um jeito interessante. O segundo você acerta. Depois saio fora.” Ele continuou: “Eu acho que enquanto eu não sei como fazer algo, posso fazê-lo bem. Assim que eu aprendi como fazer algo, deixo de fazer tão bem, porque vai ser mais óbvio.” De uma forma um tanto transversa, Kalman nos leva a refletir sobre o conceito de sabedoria prática de Aristóteles9 em nosso trabalho: desenvolver um projeto criativo envolve a vontade fazer a coisa certa e a sabedoria de entender o que é essa coisa certa. O que nem sempre é fácil. Lembrando a citada palestra “On Being Wrong” da Kathryn Schulz, a sensação de estar errado é a mesma 8 aiga.org/medalist-tiborkalman/ 9 Para Aristóteles, as virtudes pelas quais possuímos a verdade são: a arte, o conhecimento científico, a sabedoria prática, a sabedoria filosófica e a intuição ou razão intuitiva.

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de estar certo. Na maioria das vezes, não temos qualquer tipo de dica interna para sabermos que estamos errados sobre algo, até que seja tarde demais. Este é o grande barato de aplicar o raciocínio do FATOR VDM , de questionar, testar, revisar as “pequenas apostas” que têm a ver com o seu projeto. Para que em algum momento você tenha a sacação de pensar: “Considerando que eu estarei em alta velocidade, e se o Papa-Léguas seguir em direção ao precipício? Como eu posso freiar a tempo?” Ou, pelo menos, que você adquira o saudável hábito de não confiar cegamente nos produtos ACME sem realizar um teste prévio. O FATOR VDM não é uma tábua com dez mandamentos, os doze passos da felicidade, a cura para todos os males e nem a receita para a iluminação suprema, que vai fazer com que todas as suas relações com clientes, tercerizados, colaboradores e fornecedores passem a funcionar instantaneamente. Ele não é dogmático, sagrado e nem definitivo. Em resumo, é apenas um guia para chamar sua atenção para o que é essencialmente necessário num projeto criativo bem-sucedido: a virtude de pessoas realmente comprometidas, com o cuidado de combinar bem combinado, mesmo considerando que tudo muda o tempo todo. Como na imagem aristotélica dos artesãos que mediam colunas com réguas flexíveis. Seja a fita de plástico ou régua de madeira, ambas tem 30


exatamente um metro. Cada uma com seu uso próprio, para uma determinada situação. E já que estamos falando tanto de Aristóteles, vale lembrar como ele acreditava também que a sabedoria prática era o caminho para a felicidade. Traduzindo para os projetos significa: conseguir gerenciar boas relações com as pessoas que estão próximas de você, realizando atividades bacanas cujos resultados trazem satisfação a todos. Acredito que isso é quase tudo que se pode desejar. No fundo, este livro espera que você aproveite seu trabalho e consiga fazer com que ele aconteça da melhor forma possível. Do worry, be happy. Ficar ligado nos processos é muito importante. Mas o fundamental é ser feliz. Bons projetos.

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EXTENDED PLAY


CLIENTE ORDINÁRIO MICHEL LENT Publicado originalmente no Webinsider, setembro de 2000

Então o mercado não deve estar mais tão ruim assim, ou não estaríamos aqui falando sobre clientes. Vivemos aquela época um tanto quanto maluca, onde sobram projetos e faltam empresas. Sim, é assim mesmo. O mercado não acabou, nem poderia. Mas a maior parte das grandes empresas web que andavam por aí, desapareceu. Novas e menores empresas estão ocupando esse lugar vazio, trabalhando em outros formatos e muitas vezes os próprios profissionais frilas têm assumido este espaço. Dentre esse novo pelotão profissional, vem uma turma que antes estava acostumada a trabalhar como funcionários nas finadas empresas e que, agora, de repente, se vê atendendo os clientes diretamente, seja como profissional liberal, ou por sua recém-montada produtora, house, consultoria, ou seja lá o apelido que tenha. Fato é que, recentemente, tenho escutado um punhado de histórias sobre clientes cretinos e injustos e toda a sorte de cretinices e injustiças que eles vêm cometendo contra nós, pobres profissionais. Seja: não compreender o valor de um projeto; mandar trabalhar, depois desistir e dizer que não vai pagar; querer pagar a metade do combinado; pedir projetos prontos quando é uma concorrência e depois querer usar o seu projeto sem pagar; não gostar do seu design e por aí vai. 33


Sim, uma sorte sem fim de canalhices destes cretinos clientes. Mas opa. Um observador mais atento facilmente detectaria aqui um certo padrão sintomático. Quando a culpa é sempre do outro, será mesmo que o outro é que é sempre o culpado? Será que a gente não tem uma parcela de culpa nessa história? É óbvio que sim. Neste novo mercado profissional de internet, onde a maioria das antigas grandes produtoras desapareceu, desapareceram junto com elas as boas práticas de mercado e muito do conhecimento acumulado com a experiência e o tempo. O resultado é que voltamos a ter frente a frente, profissionais com boa técnica e talento, mas sem experiência comercial, e clientes com menos verbas e mais exigências para seus projetos interativos. Não é questão de má-fé ou cretinice por parte de ninguém. É simplesmente uma questão de falta de cultura e prática comercial. A prática comercial que já existe, por exemplo, num restaurante, negócio que existe há centenas de anos. Ou alguém tem alguma dúvida da prática comercial que acontece quando vamos a um restaurante? Sabemos passo a passo tudo o que vai acontecer. Pois muito bem. Como no nosso caso ainda não há cultura suficiente, é fundamental que algum dos lados 34


dite as regras e as práticas desta transação comercial. Porque sem regras só restam o bom senso ou a desordem. O mais sensato é que dite as regras aquele que melhor conhece os passos da prática comercial. É claro, portanto, que quem precisa dizer como as coisas vão acontecer é o fornecedor e não o cliente, mas sempre levando em consideração uma coisa essencial: o cliente precisa ter liberdade de escolha, precisa se sentir no comando, mas imprescindivelmente precisa estar sendo comandado por você. Pegando o exemplo do restaurante novamente, quer ver como isso acontece? Você vai a um restaurante, é recebido na porta e o maître lhe apresenta algumas opções de mesa para sentar. Você senta-se, recebe o cardápio e o garçom recebe seu pedido de bebida dentre as opções apresentadas. Escolhe seu prato dentre o que está no cardápio. Sobremesa, café e, ao final, recebe a sua conta já com os 10% incluídos na nota. Você teve durante toda a estadia no restaurante uma série de opções e se sentiu no controle. Mas no final das contas, quem é que ditou as regras, você ou o estabelecimento? A mesma cena sem que o restaurante estivesse ditando as regras: Você chega ao restaurante. O dono do restaurante 35


vem recebê-lo na porta e perfila todos os garçons e o maître e pergunta: quem você quer que lhe atenda? Onde quer se sentar? O que quer comer (tudo assim, de uma vez). Você diz que quer comer carne com aspargos e escolhe a mesa em que há um computador (é o caixa, mas o dono não quer incomodá-lo com isso). Ele manda alguém na rua correndo comprar aspargos, já que não tinha isso em estoque. O prato demora, ninguém lhe oferece bebida. Você diz que está com sede, mas o dono está ocupado servindo outra mesa. Você levanta e vai até a cozinha, abre a geladeira e se serve com uma garrafa de champagne que estava lá dando bobeira. Volta pra sua mesa e tem uma pessoa mexendo no computador. Você reclama que ela está na sua cadeira. O dono aparece de volta e pede desculpas. Ele expulsa a pessoa da cadeira para que você possa sentar e corre para cozinha para voltar às panelas. Um garçom aparece e diz que você não deveria estar bebendo essa champagne. O dono volta com as mãos sujas de farinha e pergunta se você pode adiantar R$ 4,50 pois ele não tem dinheiro para comprar os aspargos que você pediu com a carne… Enfim, acho que dá para ter uma ideia da quantidade de práticas já envolvidas em uma simples ida ao restaurante. Pois é. Com um projeto de internet é exatamente a mesma coisa. Enquanto o mercado não tem uma cul36


tura sólida e aperfeiçoada como a de um restaurante, você precisa criar e ditar suas próprias regras. Sempre deixando o cliente com a sensação de que tem escolha e informado todo o tempo sobre tudo o que está acontecendo e o que vai acontecer. Independentemente de que regras são essas e que prática você vai seguir. Invente a sua. Pergunte para um colega. Copie as da empresa em que você trabalhava. Reúna os amigos e discuta estas práticas. O importante é ter um conjunto de regras, ir adaptando seu modus operandi na medida em que percebe que pode fazer melhorias, mas deixando tudo claro e acordado sempre. Como vai ser o projeto? Quanto tempo vai durar? Quanto vai custar? Qual a forma de pagamento e em que prazos? Qual é a expectativa do cliente? O que você vai oferecer para ele? Não importa o prazo e a pressa de seu cliente (todo cliente nunca terá prazo e sempre terá pressa): separe duas horas para acertar as bases do trabalho e diga você para seu cliente como vão trabalhar. Afinal de contas, quem sabe como funciona um projeto de internet é você. Para deixar seu cliente feliz e, principalmente, seguro, defina você como vão trabalhar. E bons projetos.

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A REGRA NÃO É CLARA. No ambiente dos serviços criativos, que envolve fornecedores, clientes, atendimento, veículos, públicos, orçamentos, cronogramas, reuniões e cafezinhos, é assim: para cada case de sucesso existem mil histórias onde o resultado final não ficou como esperado ou a relação com o cliente saiu abalada. Merdas acontecem. Portanto, se as coisas em algum momento deram errado não se martirize: você não está só. Mas também não se acomode. Existem formas de se prevenir dos desastres. Em O FATOR VDM , Luis Marcelo Mendes provoca profissionais e estudantes a entenderem que, na prática, fazer projetos não é fácil como parece. Esse guia mostra os caminhos para você estabelecer uma cultura projetual comum com seus clientes e produzir bons resultados.

LUIS MARCELO MENDES é jornalista e gestor de projetos criativos. Durante dez anos esteve à frente da Tecnopop, uma das mais versáteis agências de design do país, envolvido com projetos de todos os formatos, portes, áreas e mídias possíveis.

“O FATOR VDM preenche uma lacuna na biblioteca básica de qualquer profissional, empresa ou orgão que lide com a gestão de projetos criativos. É uma abordagem inteligentemente pé-no-chão que vai ajudar você a evitar as armadilhas que cada projeto esconde e, definitivamente, a se tornar um profissional melhor”. BRUNO PORTO

978-85-64528-07-9


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