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O TRABALHO COM A OBRA E A BASE NACIONAL COMUM

CURRICULAR

CAMPO DE EXPERIÊNCIA HABILIDADES

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Traços, sons, cores e formas

O eu, o outro e o nós

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EI02EO04

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EI02EO07

Corpo, gestos e movimentos

Escuta, fala, pensamento e imaginação

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EI02EF03

EI02EF04

EI02EF07

EI02EF08

Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações

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Antes de iniciar a leitura do livro, é aconselhável que o professor ou professora realize algumas estratégias de antecipação, para que os pequenos e pequenas possam aproveitar melhor a experiência. Assim, sugere-se que se faça uma roda de conversa, para que as crianças possam se ver e interagir; essa estratégia favorece a construção de relacionamentos e a realização de inferências. Pode-se iniciar a atividade com a pergunta: “Qual o brinquedo de que você mais gosta?”. Em seguida, pode-se solicitar que descrevam o brinquedo ou a maneira como se brinca: sozinho/sozinha? Com outras pessoas? A sequência de perguntas pode prosseguir: “Você tem irmão ou irmã? Já teve que repartir o brinquedo de que mais gosta com o seu irmão/a sua irmã? Com algum outro familiar? Com algum amigo/amiga? Já teve que repartir alguma coisa gostosa que estava comendo com alguém? Já teve de repartir a atenção de sua mãe ou seu pai com seu irmão ou irmã?”.

Cada um desses questionamentos deve vir acompanhado da pergunta: “Você se sentiu feliz ou triste?”. Outros exemplos são: “Você já viu alguém comer alguma coisa gostosa e sentiu vontade de comer também? Você quis repartir? Como se sentiu: feliz ou triste? Você já viu alguém brincar com algum brinquedo e teve vontade de brincar também? Como você se sentiu: feliz ou triste?”. É importante que esse momento de interação seja conduzido com espontaneidade pelo professor ou professora, que pode iniciar essa partilha de vivência usando uma fruta, por exemplo, para explicar e exemplificar o que significa a palavra “repartir” e trazer a experiência para o âmbito concreto.

Além de antecipar o tema principal do livro, essa estratégia promove o “diálogo interior”, pois, uma vez questionada, a criança mobiliza seu repertório de experiências e vocabulário que as descrevem; organiza suas ideias para expressá-las, planejando, a partir dos esquemas que já assimilou, a verbalização do que lhe foi solicitado, ainda que com poucos detalhes. As outras crianças podem auxiliá-la nesse processo, complementando com outras palavras de seu repertório, confirmando detalhes de um determinado brinquedo ou indicando um sentimento que também já tenham sentido, em um processo de construção da imagem de si e do outro. Segundo Oliveira et al. (2011, p. 45), “a interação que o indivíduo estabelece com o meio, em especial com outros indivíduos em situações sociais determinadas, é essencial para a formação do pensamento e da personalidade”.

O registro das observações e expressões das crianças é uma prática muito rica, sobretudo quando um dos objetivos do trabalho é a educação emocional; as diversas formas de comunicação, por meio de falas, gestos e intenções de fala marcadas pelas expressões corporais, fornecerão informações para avaliar o desenvolvimento cognitivo de cada uma: como se expressa — a construção e a expressão do pensamento por meio da oralidade —, as relações que consegue estabelecer e sua evolução. Esses registros poderão ser organizados em um portfólio, que servirá como ferramenta avaliatória da evolução de cada criança quanto ao seu processo de aprendizado e também para acompanhamento dos familiares.

Consideramos o portfólio uma testemunha da ação pedagógica, o registro de como o trabalho ocorreu, a memória da evolução de uma mesma proposta desenvolvida em diferentes momentos. Essa forma de documentação envolve interpretações de dimensões pedagógica e psicológica. Pedagógica porque o portfólio caracteriza-se como um objeto fundamental de ensino, da valorização do raciocínio e das atitudes da criança. Psicológica porque mostra um pouco da personalidade de cada uma, de sua forma de ser e de pensar. Por meio dessa documentação, o professor ou professora pode compreender alguns anseios ou dificuldades e as conquistas de cada aluno (SMOLE, 1996, p. 186).

A estratégia seguinte a ser adotada pode ser o convite à leitura do livro por meio da apresentação de sua capa. Afinal, as imagens também mediam nossa relação com o outro. É por meio delas que reconhecemos as diferenças, alimentamos nossas crenças, construímos nossa concepção de como estar no mundo (PEREIRA, 2008, p. 19). Pode-se despertar a atenção do grupo para a ilustração de capa, que traz uma representação da figura humana de perfil, ou seja, mostrando seu rosto pela metade, ainda que com contornos bem definidos e cores vivas. A qualidade das ilustrações criadas por Sergio Magno possibilita apresentar os seguintes questionamentos: “Por que o rosto está pela metade? Cadê a outra parte?”, aguçando ainda mais a curiosidade das crianças e levando-as a perceber a parte que falta da pessoa representada na imagem. Sugerimos utilizar a palavra “pessoa” para se referir à imagem, a fim de evitar as referências binárias de gênero. Para essa abordagem, sugerimos a leitura de estudos recentes e conceituados sobre o percurso de construção da desigualdade de gênero, que provoca muitos problemas de ordem psicológica e social, e sobre como podemos contribuir para a criação de uma sociedade mais justa da perspectiva de gênero. Desde muito cedo, no âmbito familiar ou escolar, as crianças recebem ensinamentos por meio de gestos, tom de voz, da escolha dos brinquedos, das brincadeiras e das roupas que devem usar ou da indicação de como devem se comportar, o que é aprovável e o que é reprovável, inclusive em relação ao que lhe é esperado por ser menino ou menina. Nesse processo, as crianças também depreendem o “significado” dessas palavras, a interpretação que os outros atribuem para os termos homem/menino e mulher/menina.

Segundo renomados autores, como Fagundes (2001, p. 76) ou Passos (1999, p. 106): “[…] no Brasil, tradicionalmente, homens e mulheres recebem educação diferenciada, não em respeito às diferenças entre os sexos e sim para torná-los desiguais e com isso, marcá-los, rotulá-los e destiná-los a lugares e papéis”. Assim, é preciso ter um olhar cuidadoso e despido da visão tradicional e desigual de gênero, a fim de formar sujeitos mais livres e autônomos, que possam se desenvolver de maneira integral desde a educação infantil. Se a definição do gênero for considerada necessária, sugerimos que essa interpretação seja livre, partindo das próprias crianças.

Outra importante ação que poderá ser feita é conduzir a atividade para que as crianças leiam a expressão facial da pessoa representada na imagem:

“Como essa pessoa está se sentindo? Feliz? Triste? Assustada? Calma?”.

A partir das repostas e da conclusão à qual as crianças chegaram em relação à expressão da ilustração, é possível ampliar o diálogo: “Por que será que essa pessoa está se sentindo assim?”.

Neste ponto, a leitura do título complementará as hipóteses levantadas e possibilitará inferências dos pequenos e pequenas. É importante recuperar as questões iniciais: “O que é repartir? Quem reparte?”. E, antecipando a reflexão sobre a escolha de “não repartir”, pode-se apresentar o questionamento: “Será que ficamos felizes quando não repartimos?”.

Os Autores

A leitura com os pequenos e pequenas também é uma partilha, e, para aproveitá-la melhor, sugerimos algumas estratégias. A curiosidade das crianças é genuína, e essa energia para saber “de onde vêm as coisas” deve ser aproveitada. Assim, é importante que o professor ou professora apresente o autor e o ilustrador do livro que vão ler. Além disso, embora as crianças tenham pouco repertório ou experiência para compreenderem a passagem do tempo, é interessante que sejam expostas a exemplos que demonstrem essa passagem. A trajetória do autor e do ilustrador de Eu não quero repartir reflete as vivências que os dois tiveram na infância e que os conduziram a uma vida adulta em contato com as coisas de que mais gostam desde esse período.

Outra prática interessante é, antes de falar do escritor e do ilustrador, incentivar as crianças a pensarem sobre as ocupações dos adultos que as cercam — a ocupação ou profissão de familiares e responsáveis, e também sobre o que fazem alguns profissionais da escola, como o professor ou professora, as pessoas que cuidam da limpeza e da alimentação, por exemplo, sempre com o cuidado de se referir a elas pelo nome e demonstrar a importância de sua atividade. Essa observação tem como objetivo aproximar as crianças da ideia de que escritores e escritoras, ilustradores e ilustradoras, produzem livros e literatura, arte tão necessária à nossa vida. Em seguida, sugerimos que se mostrem as fotos do escritor e do ilustrador, destacando-se a importância do trabalho de cada um na construção do livro e do que mais gostavam de fazer, quando crianças, como fio condutor das atividades que fazem hoje, na vida adulta. As fotos servem como recurso de aproximação e envolvimento na escuta sobre a vida dessas pessoas.

A seguir, fornecemos algumas informações sobre a biografia dos autores para direcionamento das intervenções:

Daniel Goltcher nasceu em Curitiba–PR em 1970 e mudou-se para São Paulo ainda muito pequeno. Apaixonado desde a infância por música, cinema, livros, quadrinhos e artes em geral, acabou buscando na propaganda a junção de todas essas paixões. Nesse percurso, trabalhou em várias fases da produção de conteúdo para rádio e TV. Mais tarde, resolveu escrever livros infantis; Eu não quero repartir é o seu quarto livro. Nele, Daniel conta sobre sua própria experiência com sua irmã menor, mas também aborda questões que observa na relação entre seus filhos.

Sergio Magno é formado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e pelo Istituto Europeo di Design. Sua habilidade para lidar com as imagens desde criança e sua grande criatividade o conduziram para a publicidade e para a produção de animações. Em seu processo de criação, realiza uma imersão em um ambiente lúdico, de onde surgem personagens e histórias. A forma como realiza seu trabalho na vida adulta é uma atualização de seus “rabiscos em blocos de papel e caixas de lápis de cores” tantas vezes apontados, como ele mesmo relata, resultando em um trabalho que para ele é uma grande diversão.

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