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2. LEITURA DIALOGADA

Eu não quero repartir é ilustrado com imagens vívidas, propícias para a realização de intervenções que favoreçam o desenvolvimento de diversas habilidades nas crianças. Um olhar mais atento conduzirá à identificação de diversos elementos que permeiam o universo infantil na faixa etária para qual o livro foi escrito. Sempre considerando o nível de alcance da turma, o professor ou professora pode fazer perguntas que levem as crianças à percepção da variedade de formas, cores e detalhes gráficos das imagens: “O que está faltando nessas imagens? Por que será que está faltando uma parte? Por que o rosto dessas pessoas está pela metade? O que será que tem na outra metade?”. Essa prática favorece o desenvolvimento da atenção e da concentração e servirá como base para o aprofundamento do tema desenvolvido pelo texto verbal.

Ao iniciar a leitura mais atenta, página por página, teremos, em cada cena, abertura à discussão sobre as sensações e consequências do ato de repartir: “O que vemos nessa imagem? Há algum brinquedo? Que brinquedo é esse? Há alguma pessoa? A pessoa está feliz ou triste?”. Depois dos comentários sobre as ilustrações deve-se proceder à leitura do texto verbal, seguida de perguntas sobre a reação das crianças: “E você, emprestaria? E se estragassem? E se não devolvessem? E se você tiver que brincar sozinho/sozinha?”.

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O conteúdo verbal e visual do livro apresenta grande potencial para desenvolvimento da educação emocional das crianças, contribuindo para promover seu bem-estar psicossocial e para a formação de sujeitos mais autônomos e capazes de lidar com suas emoções, além de aptos a construir relacionamentos saudáveis. Franco (2009, p. 135) defende uma abordagem significativa das emoções no âmbito escolar por parte dos educadores (as suas e as das crianças), a fim de proporcionar “bem-estar emocional, pois quando elas estão ausentes ou são excessivas tornam-se patológicas, perturbando o curso normal das situações de vida”. No momento da leitura, é importante que as crianças coloquem as ações retratadas no campo das sensações, para que sejam desdobradas depois do fim da leitura. Goleman (2012, p. 28) afirma que a emoção é reflexo de um estado de espírito passageiro que surge como resposta biológica a determinada situação, sendo, portanto, indissociável da razão. Demore-se em cada imagem pelo tempo que for necessário para que os pequenos e pequenas leiam as figuras e as expressões (de alegria ou de tristeza) associadas ao ato de repartir. É importante que “vivam” as memórias que possuam dessas ações corriqueiras do universo infantil, dando embasamento às próximas discussões e atividades propostas. Segundo Moreira (2008, p. 167), a partir dos três anos de idade, a criança é capaz de expressar seu estado emocional, atribuindo significados emocionais às vivências do dia a dia e relacionando-as com experiências já vividas. Ao longo do livro, iremos nos deparar com questionamentos acerca do ato de não repartir. Sugerimos ampliar essa questão, oferecendo exemplos de situações que levem cada um a questionar se é melhor ter tudo só para si: “É melhor ter um saco inteiro de pirulitos só para você e deixar todas as outras crianças olhando, com vontade? O que você escolheria? Repartir com os colegas ou comer tudo sozinho/sozinha?”.

Depois, é importante estimular a criança a justificar sua escolha destacando as consequências da ação: “Se repartir, você terá menos doces, mas todas as outras crianças terão doces também. Se não repartir, você terá todos os pirulitos, mas seus amigos e amigas ficarão com vontade… Talvez os outros também não queiram repartir nada com você. Como se sentiria se o seu amigo/amiga tivesse muitos pirulitos e não quisesse repartir com você?”.

Também é possível avançar essa discussão utilizando brinquedos como exemplo: “Ninguém é obrigado/obrigada a repartir um brinquedo, mas o que é melhor: brincar sozinho/sozinha ou com colegas?

Brincar com vários brinquedos ou só com o seu? Você já teve vontade de brincar com algum brinquedo que alguém não quis repartir com você? Como você se sentiu?”.

Na página 24, a personagem apresenta uma expressão reflexiva diante da constatação de que não quer “repartir nada com ninguém”. No entanto, essa conclusão não demonstra ser confortável, dada a expressão reflexiva e descontente de seu semblante. Por isso, chega à conclusão de que, “pensando bem”, não é que não queira… É aconselhável explorar de maneira cuidadosa esse ponto máximo de conflito em que se encontra a personagem, pois sua expressão reflexiva demonstra que está tentando descobrir o motivo de seu desconforto ao concluir que não quer repartir nada: “O que será que essa pessoa está pensando? Parece feliz ou triste? Se vai ficar com tudo só para si, por que ainda está triste?”. Repetindo a frase “não é que eu não quero repartir”, peça às crianças que apresentem hipóteses sobre qual seria o problema. Segundo Goleman (2012, p. 284), a tristeza é o sentimento imediato decorrente de uma frustração.

Na página seguinte, a personagem constata que o que não quer é “ficar com o coração partido…”. Nesse ponto, é interessante aproveitar as emoções afloradas pela leitura para propor alguns questionamentos: “O que seria ficar com o coração partido? Você já ficou triste? Por quê?”. Deixe que cada uma das crianças fale com naturalidade, orientando a escuta atenta do outro. Pode-se retomar a frase, explicando que, quando estamos tristes, podemos dizer que “estamos de coração partido” e que a personagem sente tristeza ao repartir porque tem de deixar partir um pedaço de si; dividir aquilo de que gosta com alguém. “Mas será que essa pessoa se sente feliz quando não reparte as coisas? Quando reparte, fica com uma parte daquilo de que gosta, mas as outras pessoas também têm uma parte; então, tendo, cada uma, uma parte daquilo que gostam, elas não poderiam, assim, dividir a felicidade e ficarem todas felizes?”.

Conforme Kostelnik et al. (2013, p. 166), o adulto deve ajudar a criança a desenvolver suas habilidades emocionais da seguinte maneira:

• Definir o problema ou objetivos;

• Obter informação sobre a disponibilidade de recursos;

• Criar alternativas possíveis;

• Escolher entre as alternativas possíveis;

• Escolher entre as alternativas e ater-se a elas;

• Reunir materiais e equipamentos conforme as necessidades e organizar o ambiente;

• Executar o plano; e

• Discutir e avaliar a atividade.

A literatura é um dos principais recursos para o desenvolvimento da educação emocional das crianças, e, mais especificamente, Eu não quero repartir oferece diversas possibilidades de intervenções nessa esfera.

Roda De Conversa

Convidamos você, professor ou professora, a aprofundar a mensagem do texto com questões como: “Para um colega que não lhe empresta nada, você mesmo assim emprestaria o seu brinquedo?”.

O livro traz questões que favorecem o desenvolvimento e a valorização da empatia; questões sobre “se colocar no lugar do outro” para estar “ao lado do outro”.

Após os diversos questionamentos apresentados durante a leitura, chega o momento em que podem ser abordadas as singularidades implícitas no ato de emprestar algo: a possibilidade de que se quebre ou se perca, o ato de esperar a vez, os ciúmes decorrentes, dentre outras situações que estão relacionadas ao repartir. Como lidar com elas?

E com as emoções de não repartir?

A vida em sociedade é um processo de aprendizagem do ganhar e do perder, o que podemos, de certa forma, resumir com a expressão “aprender a viver”.

ARTE — SIMETRIA

O que acontece quando emprestamos ao outro aquilo que temos de melhor?

Propõe-se aqui uma atividade que trabalha a simetria por meio da pintura. Sugerimos que a atividade primeiro seja desenvolvida de maneira coletiva e depois sejam oferecidas oportunidades de experiência individual a todas as crianças.

Em uma grande roda, mostre uma folha em branco para as crianças, relatando que, como essa folha não gostava de repartir nada, ficou esperando alguém usá-la — a folha em branco representa o vazio gerado por não compartilhar nada. Nesse momento, pergunte às crianças o que podemos fazer com uma folha em branco. Em seguida, acolha as respostas e, se necessário, amplie o diálogo oferecendo sugestões:

“Escrever? Pintar? Fazer um brinquedo? Um avião? Um barco? Amassar? Rasgar? Transformar em uma bola?”.

Após essa etapa inicial, continue a narrativa explicando que a folha se dividiu ao meio: uma parte resolveu que queria ter muitas coisas e que não iria repartir nada com a outra metade. Neste momento, dobre a folha ao meio, fazendo um vinco. Proponha a pintura desta metade da folha com tinta plástica, reforçando que ela queria muitas coisas: cada desejo poderá ser apresentado por cores diferentes, sendo necessário usar muitas cores, assim como as ilustrações do livro. A pintura deverá ser feita com cores fortes, marcantes, utilizando-se movimentos fortes para representar a fartura, o exagero. Depois, abrindo novamente a folha por inteiro no centro da roda antes que a tinta seque, as crianças observarão juntas a parte colorida, “cheia de coisas e cores”, e a outra que continuou em branco, “sem nada”. Neste momento, reforce a ideia de que uma parte tem muito e que a outra queria tanto um pouquinho de cor, mas nada tem…

Em seguida, peça sugestões sobre o que deveria ser feito para as crianças. Acolha as sugestões antes de continuar a narrativa: “Então, essa parte cheia de cores ficou sozinha e percebeu que ser colorida pela metade não era tão bom quanto ser toda colorida. Pensou que seria muito melhor dividir suas cores com a outra parte. Foi aí que teve uma ideia…”.

Nesse momento, feche a folha ao meio novamente e depois volte a abri-la — a parte colorida com tinta irá de encontro à parte em branco. “E foi assim que uma parte da folha deu o que tinha de melhor para a outra parte. E ambas ficaram coloridas.”

Pode-se reforçar a ideia de que a parte que “repartiu” não deixou de ter o que tinha de melhor e que a parte que nada tinha passou a ter também as mesmas coisas.

Observar e registrar as reações e as falas das crianças são ações importantes para compor o portfólio deste trabalho, ferramenta que pode apoiar a realização de novas atividades.

Dia Do Brinquedo

Outra possibilidade para ampliar o discurso e proporcionar vivências que se relacionam ao ato de repartir é estender essa discussão para o “dia do brinquedo na escola”.

Sugerimos que um dia de trazer um brinquedo de casa seja pensado a partir da leitura da obra Eu não quero repartir, pedindo-se às famílias auxílio na escolha de um brinquedo que realmente seja especial para a criança. O objetivo é tornar o ato de repartir uma vivência afetiva que dialogue com a situação de dividir o que você tem de melhor — não apenas aquilo de que não se gosta ou que não se quer mais.

No dia do evento, organize uma roda de apresentação para que cada um fale sobre o brinquedo escolhido, incentivando o desenvolvimento da oralidade e da capacidade de relatar experiências, e também para que todas as crianças conheçam todos os brinquedos com os quais terão oportunidade de brincar.

A mediação durante o brincar deverá respeitar a vontade de “não emprestar” dos pequenos e pequenas, mas sugerimos pontuar com a observação de que também poderão receber essa mesma negativa ao pedirem algo emprestado para brincar.

Essa troca de experiências e vivências proporcionará construções sobre o ônus e o bônus de repartir, ensinando-se às crianças a lidar com conflitos, sentimentos, ações e reações.

Sugerimos também que, ao final desta atividade, a roda de conversa seja retomada para que todos possam dialogar sobre os acontecimentos e relatar os sentimentos e as sensações experimentadas.

Dramatiza O

O corpo, os gestos e as emoções marcadas pelos movimentos despertam percepções que atingem outras dimensões da comunicação, possibilitado experiências mais intensas de aprendizagem. Assim, pode-se encenar uma experiência do ato de repartir, conferindo-se movimento ao discurso apresentado pelo livro e proporcionando-se ensinamentos por meio da diversificação da linguagem corporal.

Sugerimos que o professor ou professora encene uma curta dramatização sobre o repartir. O exemplo poderá ser embasado em alguma situação ocorrida na vivência anterior do dia do brinquedo, por exemplo. O objetivo é apresentar às crianças os problemas para os quais a ação de repartir torne-se uma solução.

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