Venci a leucemia três vezes

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na real resto do tempo, visitando mensalmente. Perto do meu aniversário de 9 anos, rolou um novo baque: pela terceira vez, a leucemia havia voltado. A químio não dava mais conta e só um transplante de medula óssea poderia me ajudar. Não aguentava mais, não queria voltar para o hospital.

Venci a leucemia três vezes Vanessa Canal se curou com o primeiro transplante de células-tronco do Brasil Meus pais descobriram que eu estava doente com apenas 2 anos e meio. Foram pequenos sinais: ficava muito cansada enquanto brincava e exibia umas manchinhas na minha perna. Depois, perceberam um inchaço no baço, uma característica típica da minha doença, a leucemia linfóide aguda.

o tratamento

Foi no Hospital Amaral Carvalho, em Jaú, que conheci meu anjo da guarda: o hematologista Marcos Mauad. Ele me internou e, depois de seis meses de internações e remédios, estava “curada”. Foi difícil para os meus pais. Depois dessa fase e com toda a fé que tinham, eles acreditaram que eu havia superado a doença. Mas, quando já estava com 7 anos, o tal cansaço voltou. E eu só conseguia perguntar: por que estou doente novamente? Tive ajuda para enfrentar a situação. Meus professores mandavam o material da escola e amigos escreviam cartas para que não me sentisse sozinha. Com o tempo, fui me acostumando a viver como podia. Por causa da químio, ficava bastante tempo internada: era a pior parte, além dos enjoos, das dores de cabeça e do desânimo. Em casa, também vivia debilitada pelos remédios. Mas, dessa vez, não fui considerada curada. Passei quase três anos entre a minha casa e o hospital: seis meses internada e, no 80 capricho

Curada e superfeliz, a Vanessa quer ser dentista.

quer contar uma boa história pra gente? Mande a sua para a CH em abr.io/ narealch

Os médicos testaram nossa família para achar um doador de medula, sem sucesso. Meu nome foi então parar no Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea, do Inca – Instituto Nacional do Câncer. E a chance de encontrar por lá um doador era de 1 a cada 100 mil, no mínimo. Com a cura distante, minha família decidiu levar a vida de um jeito diferente, aproveitando cada minuto comigo. Fazíamos passeios e optamos por um tratamento leve, apenas para aliviar minha dor. Tudo pra me deixar feliz e confortável. Já não tínhamos mais esperança quando o doutor Mauad ligou. A equipe havia encontrado uma solução: um transplante de células-tronco de cordão umbilical, nunca feito no Brasil. Naquele ano, o banco público do Inca do Rio de Janeiro tinha 200 cordões disponíveis. O número 189 era compatível comigo. Marcamos: no dia 8 de outubro de 2004, o transplante seria realizado. Sentia uma mistura de felicidade e medo, pois eu poderia rejeitar as células. As chances de sucesso ficavam entre 30 e 50%, por isso, entrei em tratamento intensivo: químio e radioterapia fortes para eliminar as células doentes antes de receber as novas. Foi pesado. Ficava isolada para não correr risco de infecção. O transplante em si foi simples: em um saquinho estava o sangue do cordão umbilical compatível. As células-tronco foram passadas em um processo parecido com uma transfusão normal. Tão tranquilo que nem parecia que salvaria a minha vida. Nos meses seguintes, passei dias no hospital tomando medicações para prevenir as tais rejeições. Apesar disso, rolaram algumas, sim, de pele e estômago. Foi grave – tive até que ser entubada. Mas esse foi o último susto. Todas as complicações foram, aos poucos, superadas. Quando o transplante completou 5 anos – eu tinha 14 –, veio a notícia: poderia me considerar curada! A alegria foi tão grande que fizemos uma festa enorme no hospital, com a equipe médica, minha família e amigos. Pessoas que nunca vi me falavam: “Rezei muito por você!” Isso ainda me dá forças, mesmo nove anos depois do transplante. Hoje, aos 18 anos, estou prestando vestibular para odontologia, aprendendo a dirigir, namorando, saindo e viajando bastante. Dou valor a cada um desses momentos. Acredito em passar pelas dificuldades da maneira mais leve, aprender o caminho mais curto para voltar a sorrir e comemorar cada vitória!

Mary Kantratzou

Texto Lena Ribeiro Ilustração Anderson Alvez

Última Chance


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