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A Decisão de Inconstitucionalidade da Atual Alíquota de ICMS

PAULO VITOR

ADVOGADO E CONSULTOR JURÍDICO. SÓCIO-FUNDADOR DA SILVA VITOR, FARIA & RIBEIRO SOCIEDADE DE ADVOGADOS

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A DECISÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA ATUAL ALÍQUOTA DE ICMS SOBRE OS SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES, E A RECENTE MODULAÇÃO DE EFEITOS DETERMINADA PELO STF

Em artigo veiculado na edição anterior, foi abordada a decisão meritória do Supremo Tribunal Federal no tocante ao Recurso Extraordinário nº 714139, que trata a respeito da inconstitucionalidade da elevada alíquota de ICMS sobre os serviços de telecomunicações e energia elétrica, haja vista a ofensa direta aos princípios da essencialidade e seletividade.

Como bem salientado no artigo precedente, o Supremo Tribunal Federal, em decisão da maioria de seus Ministros, entendeu ser inconstitucional a elevada alíquota praticada pelo Estado de Santa Catarina sobre os serviços de telecomunicações e energia elétrica.

À época do artigo elaborado na edição anterior, restava ao STF a decisão a respeito da modulação dos efeitos, ou seja, se seria aplicado pelo Supremo Tribunal Federal alguma restrição quanto aos pedidos de restituição do ICMS recolhido a maior, e ainda, quanto a aplicação futura da referida decisão de inconstitucionalidade.

Ressalte-se que a modulação dos efeitos é um instituto criado pela Lei nº 9.868/1999, que excepcionalmente admitiu que o órgão julgador de ações diretas de inconstitucionalidade, estabelecesse, em decisão de 2/3 (dois ter-

“Mais uma vez o STF está indo na contramão de sua própria jurisprudência”

ços) de seus membros, restrições quanto aos efeitos da inconstitucionalidade, ou limites quanto a eficácia da referida decisão.

Veja, nesta linha, o que dispõe o Artigo 27 da Lei nº 9.868/1999:

“Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.”

Trata-se de uma exceção admitida por Lei, haja vista que, em regra, quando declarada a inconstitucionalidade de uma Lei, é notório que a referida norma é inconstitucional desde sua origem (ou seja, desde sua promulgação).

Todavia, em questões de segurança jurídica ou excepcional interesse social, o Supremo Tribunal Federal poderá estabelecer restrições quanto aos efeitos da inconstitucionalidade, ou postergar sua eficácia para após o trânsito em julgado ou outro momento que venha a ser fixado.

E seguindo tais preceitos, em ações diretas de inconstitucionalidade envolvendo matéria tributária, o Supremo Tribunal Federal em diversos julgamentos se utilizou do instituto da modulação dos efeitos. Mais recentemente, foi o caso, a título de exemplificação, da decisão a respeito da tese tributária de exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e COFINS, que o STF entendeu por restringir o direito à restituição (retroativamente aos últimos 05 anos) aos contribuintes que ajuizaram processos neste sentido até a data do término do julgamento da ação no STF (ou seja, até 15.03.2017).

E considerando exatamente esta jurisprudência criada pelo Supremo Tribunal Federal em modulação de efeitos de decisões

de índole tributária, criou-se uma expectativa que o mesmo entendimento seria aplicado, também, quanto a modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade da elevada alíquota de ICMS incidente sobre os serviços de telecomunicações e energia elétrica.

Todavia, para a surpresa geral, o Supremo Tribunal Federal,

cedendo à pressão dos Estados, adotou uma modulação jamais aplicada em decisões de ordem tributária.

O Supremo Tribunal Federal, lamentavelmente, entendeu por aplicar as seguintes restrições quanto a inconstitucionalidade declarada em relação à elevada alíquota de ICMS incidente sobre os serviços de telecomunicações e energia elétrica: (i) Quanto ao direito à restituição retroativamente aos últimos 05 (cinco) anos, o Supremo Tribunal Federal decidiu por restringir este direito aos contribuintes que ajuizaram processos neste sentido até a data de início do Julgamento do mérito, ou seja, até 05 de fevereiro de 2021; (ii) Quanto a aplicabilidade futura, o Supremo Tribunal Federal decidiu por restringir a aplicabilidade da declaração de inconstitucionalidade a partir do exercício de 2024, primeiro exercício financeiro regido pelo próximo plano plurianual (PPA) de cada unidade federada; ressalvados os contribuintes que ajuizaram processos neste sentido até a data de início do Julgamento do mérito, ou seja, até 05 de fevereiro de 2021;

Veja, neste diapasão, o seguinte trecho do voto do Ministro Dias Toffoli: (...) Tendo presentes essas novas informações e ponderando os interesses e os valores em conflito, julgo que seria mais adequado, como dito acima, se estipular que a decisão da Corte produza efeitos a partir de 2024, primeiro exercício financeiro regido pelo próximo plano plurianual (PPA) de cada unidade federada. (...)

Ademais, considero importante ressalvar da modulação dos efeitos da decisão certas ações já ajuizadas. Note-se que medida como essa tem sido muito utilizada pela Corte ( vide , v . g ., os julgamentos da ADI nº 5.469/DFED e do RE nº 574.706/PR-ED). Resta definir qual marco temporal razoável e condizente com as particularidades do presente caso deve ser adotado a fim de se identificar quais são as ações a serem ressalvadas.

“É clarividente que o Supremo Tribunal Federal, com tal decisão/modulação, está criando uma insegurança jurídica ainda maior no Brasil.”

Julgo ser mais adequado adotar como marco o dia no qual foi proferido o voto do Ministro Marco Aurélio, isto é, 5/2/21 (data do início do julgamento do mérito). De um lado isso prestigiará aqueles que já haviam ingressado com ação até essa data . Do outro lado, não serão ressalvadas as ações ajuizadas após esse marco. (...)”

Como visto, ao mesmo tempo em que foi reconhecida a inconstitucionalidade das alíquotas de ICMS aplicadas, há vários anos, sobre os serviços de telecomunicações e energia elétrica, o Supremo Tribunal Federal permitiu que tais alíquotas permanecessem em vigor por mais 02 (dois) exercícios (até 2024). Um completo absurdo, na minha visão!

Apesar do STF entender que tal limitação de eficácia visa amenizar os impactos nas contas dos Estados, é clarividente que o Supremo Tribunal Federal, com tal decisão/modulação, está criando uma insegurança jurídica ainda maior no Brasil, pois somente neste País se reconhece uma norma como inconstitucional, mas permite que tal norma vigore e produza efeitos por mais 02 (dois) anos, em prejuízo evidente à toda coletividade.

Lembrando que o processo que originou esta discussão (RE 714139) foi ajuizado em Outubro de 2012. Logo, os Estados tiveram mais de 09 (nove) anos para se organizar e se preparar para uma eventual modificação das alíquotas de ICMS incidente sobre os serviços de telecomunicações e energia elétrica.

E ainda mais contraditório foi o entendimento do STF de ressalvar dos efeitos da modulação aos contribuintes que ajuizaram processos envolvendo esta temática até o início do julgamento (05/02/2021), quando, historicamente, em outras discussões tributárias de igual relevância, o mesmo Tribunal entendeu por ressalvar os contribuintes que ajuizarem processos até o término do julgamento. Completo absurdo!

Em outras palavras, mais uma vez o STF está indo na contramão de sua própria jurisprudência, protegendo as contas dos Estados, mas criando um cenário de enorme insegurança jurídica no Brasil.

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