Jornal da SBCT Ano 7 | Edição de Dezembro / 2017
20 anos de História da SBCT
Informativo da Sociedade Brasileira de Cirurgia Torácica
Editorial Meus amigos,
A
oportunidade de escrever o editorial que estampa os 20 anos da existência da Sociedade Brasileira de Cirurgia Torácica faz-me lançar, em es�lo budista, a uma tapera no meio do Jalapão para rebuscar o miúdo tempo escorrido entre o agora e o ontem- haja conexão com o universo e entendimento com o nosso propósito. A SBCT foi projeto audacioso, concebido por um punhado de cirurgiões obs�nados por esta quimera cirúrgica, em que pese àquela altura, a modesta amostra de associados no lançamento de sua pedra, no Memorial da América La�na, São Paulo. Se a palavra dá compasso, vou junto ao passo de Alberto Caeiro para definir o que aqueles homens encorpavam em seus assombramentos: “Porque eu sou do tamanho do que vejo e não do tamanho da minha altura”. Inquietação era o que se via: a de abandonar a SBPT para avivar sonhos próprios de se construir uma sociedade independente e sólida. “A percepção dos líderes da época, sob a batuta agregadora, sólida em conceitos, desprovida de vaidade e personalismo do inesquecível Vicente Forte, de que era chegado o momento de dar um passo à frente”, retrata Darcy Pinto, nesta edição. E deu-se, como se urrando no meio da tempestade; como vivo fogo e vento veloz com o ideário faiscante. Naquele alvorecer, a videocirurgia dava passos íngremes, o transplante era fato, a cirurgia da traqueia se solidificava e a oncologia enfa�zava a presença do cirurgião. No cimo da especialidade, o cirurgião torácico brasileiro enlaçava-se na busca de solidez em seus resultados, ao mesmo tempo lançava-se ao congraçamento Norte-Sul e dava oportunidade a jovens, sem deixar de ouvir conselhos dos mais vividos.
Roger Normando
Membro da SBCT-PA
Dali saiu presidente o paulista Vicente Forte. Ele começou a soerguer as diretrizes. Não se �nha a sede, pois inicialmente precisava-se dos alicerces da moral e é�ca para que fôssemos reconhecidos. A par�r daí, um séquito de prósperas diretorias edificaram os pilares administra�vos e ideológicos, que jorravam das veias de Vicente. Não �nha como o olhar do futuro encarquilhar. Mas ainda faltava o teto, ou seja, o simbólico lar, no dizer de Carlos Alberto Araújo: “para servir de ideias e ideais de seus membros, estatutariamente regidos”. Dentro de águas claras adquiriu-se a sede, em 2007, ampliada em 2017, justo d’onde brotaram as ideias faiscantes daqueles obs�nados: São Paulo. Pelas contas foram dez anos sem teto, sem negar a vontade de se ter poltrona para sentar, tomar cafezinho, prosear sobre desafios e as diversas visões de conquistas. Nas próximas edições daremos con�nuidade aos relevos e às prosas desta trilha. Ex-Presidentes reviverão os 20 anos, num contexto de memória, para que sirva de pergaminho para o amanhã. Começamos no sen�do an�-horário, pelo Darcy Pinto, enquanto os demais preparam suas respostas para os próximos números. Boa leitura.
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Mensagem do Presidente Prezados colegas, 08 de dezembro de 2017 é uma data que deve ficar gravada para sempre em nossas mentes. Foi um dia de muito orgulho e alegria pela reinauguração da nossa sede, agora ampliada, mais confortável, digna da nossa sociedade que tem crescido progressivamente ao longo destes úl�mos vinte anos. Foi um dia de agradecimentos a todos os ex-presidentes: Vicente Forte (in memoriam), José Antônio de Figueiredo Pinto, José de Jesus Peixoto Camargo, Fábio Biscegli Jatene, Roberto Saad Junior e Darcy Ribeiro Pinto Filho - testemunhas da dedicação orgulhosa que ergueu literalmente a nossa Sociedade. Os nossos ex-presidentes sempre serviram, e servirão de esteio para todos que aqui vierem exercer funções estribadas nos preceitos estatutários da nossa Sociedade, tornando possível o sonho da nossa criação, em um passado não muito distante, e mais recentemente, nossa expansão. A saudosa memória da ausência �sica do nosso primeiro presidente, representado neste evento pela viúva Lílian Doris Del Grande Forte, trouxe a certeza que jamais essa Sociedade se sen�rá órfã de seu legado, de sua dedicação e orgulho com cada um de nós. O sen�mento que inunda nossas mentes e corações não é o da orfandade. Os ensinamentos e exemplos do professor Vicente Forte são perenes, extemporâneos e, portanto, nos tornam herdeiros e não órfãos. Essa Sociedade, seja com suas ações ou como espaço �sico, sempre haverá de reverenciar a pessoa do Dr. Vicente. Não por menos nossa principal sala leva seu nome. Agradecimentos a presença dos sócios que foram pres�giar este momento “ázigo”: Paulo Pego, Antero Gomes Neto, João Aléssio, Felipe e Ângelo Judice, Luís Carlos Losso, Albino Alegro, Geraldo Medeiros, Paulo Cardoso, José Ribas Milanês, Marcos Samano, Guilherme Ribeiro, Nilson Amaral, Fernando Davi e Jorge Montessi.
Sérgio Tadeu L. F. Pereira
Presidente da SBCT
Agradecer e registrar a presença do casal Fava de Moraes: Dr. Flávio Fava de Moraes e senhora Enice Sala Fava. Ele professor emérito do ICB/USP, ex-reitor da USP e atual presidente da Fundação Faculdade de Medicina da USP. Ela ar�sta plás�ca que doou um quadro belíssimo para nossa sala. Agradecimento à indústria, parceira fundamental para realização dos projetos educacionais da nossa sociedade, representada no evento por Isabel Aguiar, Bruna Vieira e toda equipe da J&J; Diego Giralt, Ana Andreo e toda equipe da Medtronic. Grato pela presença do Dr. Asdrúbal Franco, advogado da SBCT. Pelo serviço de apoio de alta qualidade pelo excelente trabalho das nossas duas secretárias, Vânia e Andrea. Parabéns pelo trabalho e dedicação.
Expediente
Agradecer aos membros de todas as diretorias passadas que de alguma forma contribuíram, em especial ao Darcy Pinto que com sua visão futurista convenceu a todos desta necessidade. A Antero Gomes e Fernando Davi e equipe, pelo resultado financeiro do TÓRAX 2015/17 que permi�u a compra e reforma da nossa sede. A diretoria atual: Miguel Tedde, Ricardo Terra, Carlos Alberto, Mário Ghe�er e Fernando Vannucci pela parceria e confiança.
Diretoria da SBCT
Endereço
Presidente: Sérgio Tadeu L. F. Pereira Vice-presidente: Carlos Alberto Almeida de Araújo Secretário Geral: Mário Cláudio Ghe�er Tesoureiro: Miguel Lia Tedde Secretário Cien�fico: Ricardo Migarini Terra Secretário de Assuntos Internacionais: Fernando Vannucci
Av. Paulista, 2073, Horsa I, cj. 518 | São Paulo - SP CEP: 01311-300 Fone/fax: (11) 3253-0202 secretaria@sbct.org.br www.sbct.org.br
Textos e Edição Editor do Jornal: Roger Normando
Cinthya Brandão - Jornalista DRT/BA 2397 www.cinthyabrandao.com.br
Criação - D27 Design e Comunicação www.d27.com.br
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Você acredita em elogios?
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ma secretária experiente é capaz de redigir uma carta de recomendação irretocável. Uma pena que ninguém leia. Nada a ver com o talento da autora, mas simplesmente porque este é um documento tão solicitado quando inú�l. Como se convencionou que é uma grosseria entregá-lo lacrado, quem se sente confortável em denegrir a imagem do candidato que buscou seu apoio porque considerou que a sua opinião faria diferença no futuro dele? E então, sem alterna�vas, devemos entregar um documento aberto, sem preocupação com os “entretantos” da sinceridade? Alguns polí�cos, frequentemente premidos por pedidos absurdos de apoiadores de campanha, sem nenhuma noção da sua formidável mediocridade, ficam num impasse: não podem negar amparo a quem os ajudou no passado e devem seguir ajudando no futuro, mas também não pretendem comprometer a sua imagem com os des�natários, oferecendo-lhes descerebrados com celofanes de genialidade. Neste sen�do, são famosas as soluções cria�vas como, por exemplo, a cor da �nta, com significados que variam entre “leve a sério” e “esqueça este pedido, pelo amor de Deus”. Outros têm o cuidado de alertar seus correspondentes para o verdadeiro significado de “probidade inconteste”, “comprome�mento incomparável” e “cria�vidade nunca vista”. O problema é que a verdade, na maioria das vezes, é áspera e incômoda, porque infelizmente, por mais que nos esforcemos para agradar, as pessoas de fato interessantes, são raras, e justo por serem originalmente diferenciadas, já foram descobertas e não precisam da recomendação de ninguém. E então restam os que gostariam de ser, e talvez nunca consigam, mas que não seja por falta de nossa ajuda e aí voltamos ao início da meada e acabamos nos comprometendo. No universo acadêmico esta situação é muito frequente e desgastante, aqui e no resto do mundo. Um professor, chefe do departamento de Medicina Interna de uma famosa universidade americana, escreveu um capítulo no livro The Best of Medical Humor, relatando a estratégia que adotou ao perceber o enorme desperdício de tempo e dinheiro envolvido na redação durante um ano, de quase 300 cartas de recomendação de ex-estagiários
e mestrandos de seu serviço, em busca de postos de trabalho no mercado compe��vo dos EUA. Idealizou então uma carta padrão, com cinco campos abertos em que os adje�vos podiam variar. Para cada campo um adje�vo, entre os quatro possíveis, era selecionado e assim a carta estaria pronta em 30 segundos, com uma apreciável economia do tempo de trabalho da secretária. Cada chefe de departamento universitário recebia, previamente, uma correspondência fechada com uma espécie de glossário, em que o verdadeiro significado de cada adje�vo, pretensamente elogioso, era explicitado. Assim um “temperamento inquieto” que parecia tão adequado a um cien�sta, queria mesmo descrever um egocêntrico com problemas de concentração, que não ouvia ninguém, ou o “extraordinariamente organizado” para iden�ficar um portador de TOC incontrolável, ou “extremamente sensível” para reportar alguém que chorava durante o relato de casos graves, ou ainda “uma personalidade voraz” que daria a entender que se tratava de uma mente aberta e fascinada pelo novo, mas queria apenas avisar que ele “roubava comida da bandeja dos pacientes”. O certo é que, por generosidade ou acanhamento, temos dificuldade de emi�r opinião nega�va sobre o desempenho dos outros, e sempre preferiríamos elogiar. Meu velho pai era incapaz de falar mal de alguém, mas quando era inevitável, sempre fazia uma introdução amenizadora. Lembro-me, com ternura, dele falando de um grande desocupado: “O fulano, sempre foi muito bonzinho para tratar a gente, mas como vadio...!”. O inesquecível Ariano Suassuna, queixando-se de deputados que cri�cavam sua atuação como Secretário da Cultura em Pernambuco, foi inteligente e original: "Aquilo me chateava muito porque, como todo mundo, eu preferia ser elogiado. Mas confesso que fiquei agradecido pela gen�leza de não me falarem na cara. Porque falar mal de alguém pela frente é ruim pra quem fala, pior ainda pra quem ouve! E então eu pergunto: O que é que custa esperar o infeliz virar as JJ Camargo costas?”. ■ Membro da SBCT - RS
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Repórter Forte
Vozes da floresta: a inestimável ação dos "Cidade das Mangueiras" cirurgiões de tórax de Belém/PA. "Metrópole da Amazônia" O Repórter Forte aprumou seu azimute para o Norte. Tendo como ponto de par�da a cidade de Natal formou-se então um rumo quase a 0º em direção à maior floresta tropical do nosso planeta, a Floresta Amazônica. Floresta que transcende os limites geográficos entre as nove nações que ela abrange, sendo que 60% de sua extensão estão dentro do território brasileiro. O nome “amazonas” veio decorrente à épica jornada feita, entre 1540 e 1542, por Francisco Orellana quando ele percorreu todo o rio, desde os Andes até a sua foz. As crônicas dessa epopeia relatam o encontro com índias guerreiras, ribeirinhas e que mesmo sem ter maridos não fugiam ou temiam às lutas que envolvessem a defesa ou a conquista de territórios. Houve, então, imediata lembrança às lendárias mulheres guerreiras da mitologia grega, as Amazonas, ou as iacamiabas, na língua tupi. O rio, em mitológica consequência, passou a ser homônimo àquelas mulheres, que não necessitavam de homens para serem guerreiras e fazerem suas conquistas. Nada mais atual e exemplar. Belém do Pará, Cidade das Mangueiras, Metrópole da Amazônia são denominações da mesma cidade que é a porta fluvial para a grande bacia amazônica e, consequentemente, a Floresta Amazônica. Aqui um perfeito e sincronizado �me de cirurgiões torácicos da SBCT desempenha uma ação exemplar, orgulhosa e merecedora de registro para a nossa Sociedade. Como combinado com o cacique-açu Roger Normando, sempre emoldurado com aquele farto, às vezes vinícolo, e sempre acolhedor sorriso, parceiro de tantas horas, cheguei à porteira da Amazônia em uma manhã chuvosa de uma sexta-feira. Marcos, seu cúmplice no âmbito cirúrgico e na formação Jessiana, foi me receber no aeroporto com aquele conhecido jeito acolhedor que lhe é peculiar. Sua voz é de uma musicalidade ímpar, denunciando sua outra pro�cua a�vidade. Nossa programação era aproveitar o resto do dia vendo os pontos importantes da cidade e ao mesmo tempo ter o privilégio do de06
poimento daquela tão entrosada dupla sobre a história da cirurgia torácica daquela região. Atravessamos a baía Guajará, formada pelo encontro de dois rios, o Guamá e o Acará, em direção a ilha do Combu, área de proteção ambiental que fica em frente a um dos vários e pequenos cais que existem na cidade. Aqui as estradas, na maioria das vezes, são formadas pelos rios. Neles, por eles e deles a vida flui e é ob�da. O des�no era um restaurante que ficava em uma esquina. Mas não em uma esquina convencional, daquelas vistas nas cidades que têm ruas pavimentadas e prédios em terra firme. Aqui os rios desenham os cantos, esquinas e determinam onde e quando se pode fixar morada. O endereço era um encontro entre o rio Guamá e um pequeno afluente, o igarapé Combu. Ali, tendo a exuberância da floresta como testemunha e uma peixada de Filhote como iguaria, passei a ser apresentado à história da cirurgia torácica moderna da região. Roger é daqueles membros em que sua ação se confunde com nossa existência, enquanto Sociedade. Sempre teve voz e voto nas nossas mais históricas decisões, inclusive na reunião de nossa fundação. Ato marcante para a sedimentação de um sonho daqueles que vislumbraram com extrema clarividência o que poderíamos ser e o que somos hoje. Com Marcos ainda não �nha grande proximidade, mas não esquecia aquela ines�mável e afetuosa recepção que nos �nha concedido durante o CONNECT 2014 em Belém. A história da cirurgia torácica moderna de Belém, decerto transcendendo os limites geográficos da capital mais chuvosa do Brasil, se confunde com a história cirúrgica dessa simbió�ca e eficiente parceria. Geraldo Roger Normando e Marco Antônio Franco Tavares. A par�r daqui e deles a cirurgia torácica passa a ser exercida em bases cien�ficas, de forma eficaz e por quem recebeu treinamento especializado para isso. Ambos são filhos cirúrgicos do professor Jesse Teixeira. Portanto, reportar a ação de um serviço de cirurgia torácica onde dois “filhos” do professor Jesse são os protagonistas principais justamente no ano do seu centenário de nascimento é bastante simbólico e histórico. ►
Tudo começou com Roger. Nascido em Cruzeiro do Sul/AC, ele pavimentou pioneiramente o caminho da cirurgia torácica moderna em Belém. Desde 1992 tem sido o Norte para os que lá aportam. Não por menos, depois de conhecer sua incrível ancestralidade, percebi que ele tem Normando como sobrenome. O nome Normando advém dos Vikings, o povo do Norte. Hermeneu�camente falando a palavra vem da composição de duas outras da língua inglesa: North Man. Ou seja, homem do Norte. A influência dos povos do Norte, os Normandos, na região Amazônica tem uma história fascinante, intrigante, que está imortalizada pela literatura e pela 7º arte. Primeiramente, o escritor Henri Charrière, em 1967, publica o livro Papillon, onde relata sua fuga espetacular da Ilha do Diabo, em 1935. Foi um grande sucesso desde seu lançamento e tornou público todo o famigerado sistema carcerário que a França man�nha naquela época e na nossa vizinha Guiana Francesa. A fantás�ca história ganhou ainda mais evidência e glamour quando Hollywood fez dela uma superprodução em 1971. Tendo um elenco estelar, foi protagonizado por Steve Macqueen, no papel de Papillon, e Dus�n Hoffman. Mas o iletrado Charrière era um grande farsante. Aqui a vida real estava imitando o mundo ilegal retratado por alguns personagens do filme. René Belbenoît era o verdadeiro autor de Papillon e, diferente de Charrière, era intelectual e poliglota. Ele foi quem liderou um grupo de presos, incluso Charrière, daquele presídio. Essa história está relatada e publicada no seu livro A Ilha do Diabo, ou Dry Guillo�ne no original, ganhador do prêmio Pullitzer de 1938. Pois bem, Belbenoît e seu grupo fugiu inicialmente para a Guiana Inglesa e depois se estabeleceram em Roraima, no norte do Brasil. A integração do grupo com o ambiente e a população foi tão grande que lá se fixaram, cons�tuíram família e passaram a fazer parte da história da região. Um grande exemplo disso foi o que aconteceu em Vila Maú, no Pará. Em homenagem aos seus ilustres habitantes originários do Norte, trocou de iden�dade e passou a se chamar Vila Normandia. Daí advém o sobrenome do nosso membro fundador Geraldo Roger Normando. Não sem surpresas, em razoável e gené�ca consequência, o nosso NorthMan cirurgião desbravou os obscuros caminhos, sejam de terra ou fluviais, da cirurgia torácica moderna do Pará. Com sua inquietante ancestralidade de não se manter preso a uma realidade que o acorrentava a uma prá�ca cirúrgica que o incomodava, Roger foi em busca de uma fonte certa e inesgotável do conhecimento. O porto do conhecimento chamava-se Hospital Beneficência Portuguesa no Rio de Janeiro. O professor Jessé Teixeira sua fonte e seu mentor. Mas a ação da dupla não ficou restrita apenas aos pacientes. Com um olhar no futuro, após o diagnós�co do presente, eles passaram a divulgar o conhecimento dentro do maior palco de ensino médico da cidade, o Hospital Universitário João de Barros Barreto. Nesse cenário aconteceram os primeiros contatos com o outro membro da equipe: Ajalce de Jesus Leão Janahú. Filho de Belém, com ancestra-
lidade em Igarapé-Miri, que na linguagem tupi significa “caminho de canoa pequena”, formou-se pela Universidade Estadual do Pará em 1995. O pretenso cirurgião plás�co recebeu uma forte e oxigenante influência dos “filhos do professor Jessé” e, defini�vamente, abortou seus pretensos dotes de ser um Dr. Rey da Floresta e seguiu os ares, intercostos, recessos, alvéolos e, mais recentemente, os vídeos-portais do mundo da cirurgia torácica moderna. Formava-se, a par�r de então, uma equipe coesa, onde a hierarquia é respeitada, sem ser solicitada, que passaria a dar exemplo de um exercício de uma cirurgia torácica moderna e transformadora para toda uma região. A equipe, em uma ação visionária e pedagógica, transcende sua capacidade de prestar assistência de qualidade aos pacientes e passa a sonhar com a formação dos futuros cirurgiões torácicos da região. Certamente, o NorthMan Açu lembrava-se ainda da sua saga, logicamente não tão emblemá�ca como de seu antepassado Nórdico, quando se aventurou para o serviço do professor Jessé Teixeira. Em 2016, em uma ação de forte cunho pedagógico, inicia-se a residência em cirurgia torácica no Hospital Universitário João de Barros Barreto. Recentemente, seu primeiro fruto recebeu cer�ficado de conclusão - Victor Hugo Toyoki Motoki Teixeira. Não sei se é obra do des�no ou como diriam os mais cé�cos como Einstein, “Deus não joga dados com o universo”. Mas o primeiro cirurgião de tórax formado por um grupo que teve no professor Jessé Teixeira seu maior exemplo e mentor ter Teixeira como nome de família é de ser registrado. A sexta-feira foi de intensa prosa e, sempre que Roger está presente eles facilmente fluem, versos com todos da equipe. A cada encontro uma surpresa da exuberante e única gastronomia da cidade. As cores, sabores e odores dessa culinária, que tem forte e reconhecida influência da cultura indígena, não tem semelhança com o que esse Repórter já degustou mundo afora. Em Belém, a culinária faz parte da vida e da iden�dade da cidade e, portanto, degustar um bom prato é fato natural e corriqueiro. Independente do des�no, seja em um ambiente mais simples, como no restaurante Saldosa Maloca, assim está grafado na entrada do restaurante, localizado na Ilha do Combu onde os rios são estradas e as esquinas são florestas, ou também nos restaurantes mais sofis�cados, localizados em endereços privilegiados da cidade. Aqui, não se abdicando das raízes, antropologicamente e culinariamente falando, os pratos e ambientes ficam mais sofis�cados. Um dos mais marcantes foi o Remanso do Bosque. Alguém, que não tenha as raízes naquela Floresta, poderia imaginar que sensações nossas papilas gusta�vas nos propiciariam diante de pratos feitos com linguiça de maniçoba ao molho de cerveja preta, linguiça de porco com jambú regada ao molho de tucupi e mel? E essas verdadeiras iguarias eram apenas as entradas. O prato principal seguiu na linha de um dos produtos que a farta bacia hidrográfica nos fornece: os peixes pirarucu, filhote e tucunaré. Tudo isso com uma boa hidratação que as cervejas artesanais da Amazon Beer nos proporcionavam. ► 07
Aqui também o convencional é colocado ao lado. Cervejas premiados como a Red Ale Priprioca (maturada com priprioca, raíz típica da região), a Stout Açai ou Forest Bacuri foram cumplices dessa ação gastronômica e científica desse RF.
e laringotraqueal, Piripari também não podia falar. Sua cirurgia, realizada com sucesso em 2017, foi um marco para o programa e um icônico motivo para esse Repórter registrar o programa e toda essa bela ação.
A realidade histórica e, felizmente, não atual dos cuidados com os pacientes portadores de problemas de traqueia no Estado do Pará não era muito diferente do resto do Brasil. Na quase totalidade são pacientes com sequelas decorrentes à violência urbana que necessitaram de um suporte ventilatório como último recurso de preservação da vida. Frequentemente, são pacientes que estão inseridos nas camadas sociais mais podres e são órfãos de quem deles cuidem. Lá, onde os rios, igarapés e lagos são as principais rotas pelas quais a população se movimenta chegar até a capital em um hospital terciário, onde cirurgias de alta complexidade como a de traqueia são feitas, não é tão diferente da epopeia que Orellana realizou.
Quando soube da história do nosso Piripari lembrei-me do quanto a Floresta é viva e de grande sonoridade. Lembrei-me de dois ícones moradores da floresta e que fazem parte da sua vasta fauna. O uirapuru e o macaco uivador, o guariba. Em homenagem a Piripari nominei essa ação e consequente reportagem de: Vozes da Floresta!
Inconformados com essa situação os NorthMen passaram de simples expectadores e, como frequentemente visto no nosso país, confortáveis reclamantes da situação para serem protagonistas transformadores dessa realidade. Nascia então um projeto específico para os pacientes com problemas de traqueia que foi nominado “Programa Traqueoplastia”. Trata-se de uma parceria com o Governo do Estado do Pará em que foi criado todo um fluxograma em toda rede hospitalar do Estado. Em qualquer lugar, em qualquer hospital em que um paciente tenha algum problema de traqueia, ele é encaminhado para o Hospital Público Estadual Galileu, que é gerido pela Pró-Saúde Associação Beneficente de Assistência Social e Hospitalar sob contrato com a Secretaria de Estado de Saúde Pública (SESPA). Localizado na vizinha cidade de Ananindeua, na grande Belém, ali presenciei a ação do grupo. Trata-se de um hospital estadual, inaugurado em 2014, de porte médio e que serve de retaguarda para várias especialidades. A cirurgia torácica está ali bem exercida e representada. O primeiro paciente operado pelo programa foi em 19 de novembro de 2016. Desde então, e até minha visita em 17 de fevereiro de 2018, foram operados sessenta e cinco pacientes com diversos e complexos problemas que envolviam a via aérea superior. Um dos mais emblemáticos foi um caso de um ribeirinho, de 39 anos de idade, que desde os 12 anos usava uma cânula metálica de traqueostomia. Suas feições indígenas eram delicadas e belas. Recebeu o nome de Piripari, em homenagem à lenda da Piripirioca. Seu relato do quanto àquela cânula lhe limitava a vida foi marcante para toda a equipe. Viver à margem da imensidão fluvial da Bacia Amazônica e não nadar ou mergulhar nos inúmeros rios e igarapés fazia dele um ribeirinho diferente e inconformado. Assim como as guerreiras Icamiabas, ele temia nunca encontrar sua amazona. Como a estenose era total 08
Mais uma vez fica a certeza do quanto inexplorada e rica nossa SBCT é. Rica pelos seus cirurgiões que como membros compartilham histórias como essa. Histórias de cirurgiões que formam uma equipe para fazer e trazer saúde nas mais diversas e longínquas regiões do nosso grande, fluvial, esquecido e, muitas vezes, sem voz Brasil. Ações como essa, de grande importância social, devem ser registradas e servir como exemplo de um exercício digno dos ensinamentos Hipocráticos. Reforçando-se que a confortável lamentação, diante das adversas, diversas e inaceitáveis situações que existem, é improdutiva e que devem ser substituídas por atitudes transformadoras. Atitudes que procuram, em parceria com o serviço público, o benefício de uma população carente e, literalmente, sem voz. Seja decorrente a sua condição social ou à falta de cuidados médicos especializados. Esse RF, refletindo muito provavelmente o que Dr. Vicente estaria sentindo se pudesse ter presenciado essa vocal ação, sente-se muito honrado de ter tido a oportunidade de está com os Irmãos da Floresta e, nesse espaço, registrar o quanto orgulhosa nossa Sociedade está pela qualidade de membros que eles são. De forma semelhante aos muitos Piriparis, Uirapurus, Guaribas da Floresta, esse Repórter solta a voz para em um brado retumbante dar os parabéns aos nossos membros do Norte, os NorthMen contemporâneos: Geraldo Roger Normando, Marco Antônio Franco Tavares e Ajalce de Jesus Leão Janahú. Como toda ação, mesmo as coletivas como essa, há sempre um personagem que lhe proporciona identidade e vida. Portanto, fica um registro da personificação dessa ação. Ao professor Geraldo Roger Normando, um verdadeiro e ancestral Homem do Norte, que não nega sua ancestralidade e rompe mais uma vez com um sistema que aprisionava as vozes de seus conterrâneos. Assim como o personagem de René Belbenoît, ele lidera um grupo que faz história e resgata constantemente as Carlos Alberto A. Araújo Vozes na Floresta. ■ Vice-presidente da SBCT - RN
Minha porção de sal, por favor!
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a Roma an�ga os seus soldados recebiam como recompensa ao trabalho prestado, provimentos como vinho, óleo, grãos e sal. O sal era uma mercadoria de grande importância e alto valor sendo o protagonista dos produtos entregues, porque além de dar sabor aos alimentos, era a forma de mantê-los numa época em que não havia refrigeração. A recompensa pelos serviços prestados era medida através de “porções de sal”. Isso explica porque os soldados do Império Romano recebiam uma quan�a periódica de sal. Daí se originou a palavra salário que veio do la�m “salarium” ou “uma porção de sal”. Também explica o caráter de sobrevivência básica que o salário representa. Está evidente para a população brasileira que o nosso país encontra-se em crise. Uma crise predominantemente “polí�ca” que afeta diretamente a economia, permeada de elementos que agravam e até perpetuam a situação crí�ca. Simultaneamente, outros elementos protagonizam uma expecta�va posi�va para o futuro, sinalizando para o início de uma fase de transição. A portaria nº 306/2012 da Secretaria do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda define uma forma de verificar a capacidade de pagamento de um Estado a par�r da avaliação de oito indicadores econômico-financeiros, referentes aos três anos anteriores. Cada estado recebe uma classificação para sua situação fiscal. Dados do bole�m de finanças dos entes subnacionais referentes ao ano de 2017 apontam para uma situação fiscal que compromete a capacidade de pagamento de estados como Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Estados menores como Acre, Alagoas, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Rio Grande do Norte também apresentam dificuldades fiscais. Como consequência, os poderes execu�vos de alguns desses estados não conseguem honrar com seus compromissos. A situação dos municípios brasileiros não é diferente. Na área da saúde o Projeto de Emenda Cons�tucional 29, que foi promulgado no ano de 2000, passou por uma nova regulamentação em 2011. As discussões sobre o tema previam que os Municípios inves�riam 15%, os Estados 12% e a União 10%. No entanto, o percentual definido para a União, que arrecada mais de dois terços dos tributos, passou a corresponder ao valor empenhado no exercício anterior, acrescido do Produto Interno Bruto (PIB), que despencou nos anos seguintes. Perdemos uma grande oportunidade de ampliar o financiamento da saúde que
hoje é de apenas 3,8%, estando abaixo de países como África do Sul, Paraguai, Equador e Colômbia. Há bastante tempo os profissionais da saúde trabalham em condições inadequadas, frequentemente improvisando em situações onde não se permitem improvisações, arriscando sua atuação profissional. Faltam inves�mentos em infraestrutura, equipamentos e insumos básicos para a execução plena do trabalho. Além de não promoverem condições adequadas ao exercício profissional, alguns governos estaduais e municipais têm sacrificado os profissionais de saúde ao não entregar-lhes suas “porções de sal” no tempo devido, alegando a crise econômica e acobertando a insuficiência de financiamento. Nos serviços médicos terceirizados o atraso pode ser sistemá�co de até 90 dias. Os atrasos salariais para os profissionais estatutários a�vos e ina�vos, além do caráter hediondo, comprometem a assistência e agravam a economia local com a redução do capital circulante. Como se não bastassem os atrasos salariais, no dia 13 de dezembro de 2017 a Prefeitura Municipal de Caxias, no estado do Maranhão, publicou Lei municipal fixando o salário do médico em R$ 937,00. Dezesseis dias depois o presidente da República, assinou decreto que fixou em R$ 954,00 o valor do salário mínimo para 2018. Essa bizarrice não ficou restrita ao município de Caxias. No dia 30 de dezembro, o município de Parnamirim, terceira maior cidade do Rio Grande do Norte, fixou o salário do médico em R$ 1.232,48. Por outro lado, nas suas atribuições, o médico deverá exercer as funções de médico. Não é salário para médicos exercerem outras atribuições. É salário para exercer a Medicina, sendo essa condição, incompa�vel com a boa prá�ca profissional. O médico e a Medicina exigem respeito e cobram sua “porção de sal”. Não aquele sal tão prejudicial à saúde, mas aquele sal que lhe é de direito e que dignifica o homem, como recompensa pelo seu trabalho e pela responsabilidade que assume. ■
Marcos Lima de Freitas
Médico Neurologista Presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Norte - CREMERN
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Dr. Darcy Pinto 2013-2017
20 anos de História da SBCT A
Sociedade Brasileira de Cirurgia Torácica tornou-se, ao longo dessas duas úl�mas décadas, uma en�dade de reconhecimento notável em todo o mundo. Uma trajetória de desafios e conquistas alcançadas com empenho, dedicação e altruísmo daqueles que inves�ram parte de suas vidas em prol da Cirurgia Torácica brasileira. Para marcar esta data tão significa�va, o Jornal da SBCT fará durante todo o ano de 2018, entrevistas com os ex-presidentes. Nesta edição teremos a par�cipação de Dr. Darcy Ribeiro que esteve à frente da sociedade por duas gestões, de 2013 a 2017, contribuindo de forma contundente para o engajamento da SBCT no cenário mundial da Cirurgia Torácica.
Jornal da SBCT: Como a SBCT influenciou sua vida profissional?
Jornal da SBCT: Quais os fatos mais marcantes da história da SBCT?
Darcy Pinto: As minhas lembranças mais remotas da SBCT re-
Darcy Pinto: Destaco, inicialmente, o amadurecimento da ideia de construirmos uma sociedade independente. A percepção dos lideres da época, sob a batuta agregadora, sólida em conceitos, desprovida de vaidade e personalismo do inesquecível Vicente Forte, de que era chegado o momento de dar um passo à frente foi marcante e inesquecível. Como inesquecíveis foram o sen�mento de conquista e compromisso com o futuro daqueles que es�veram no Memorial da America La�na em 1997.
montam ao final dos anos 1980. Concluindo minha residência em cirurgia torácica no Pavilhão Pereira Filho, na condição de residente do segundo ano, fui incumbido da preparação dos temas livres para apresentação no congresso de 1987, na época ainda éramos departamento da Sociedade Brasileira de Pneumologia. A tarefa me permi�u os primeiros contatos com os colegas de outros estados do Brasil. Gostei da atmosfera daquele evento. O “namoro” iniciou mesmo em 1989, no congresso de Brasília, já atuando como cirurgião torácico em Caxias do Sul. Deste encontro guardo muitas lembranças, mas destaco um episódio sobre o qual já �ve a oportunidade de me manifestar: estávamos hospedados no Hotel Nacional e haveria uma a�vidade no Hospital de Base. Um "transfer" foi reservado para levar os congressistas do hotel ao hospital. Sentado ao fundo, fiquei impactado pela alegria e camaradagem dos par�cipantes, liderados pela voz tonitruante do Prof. Fraza�o, de Campinas. Ali estava a maioria dos cirurgiões torácicos brasileiros. Cabiam numa van, eram alegres, camaradas, solidários e �nham a pretensão da excelência técnica e cien�fica. Pensei comigo: quero fazer parte desta turma! Este modelo influenciou defini�vamente minha percepção de vida associa�va e profissional. Do distante 1987 até hoje par�cipei de todos os congressos nacionais da SBCT.
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Dali em diante fomos crescendo em número e em qualidade. Nossos encontros começaram a oferecer o púlpito aos novos cirurgiões, promovendo e incen�vando o crescimento de uma nova e consistente geração de cirurgiões torácicos brasileiros. A compra de sede própria em São Paulo permi�u a solidificação do conceito de sociedade independente, com inerente impacto na auto-es�ma dos associados. Mais recentemente destaco o projeto que “�rou” a SBCT da Av. Paulista e levou a sociedade ao encontro dos cirurgiões torácicos em todas as regiões de nosso País. O projeto denominado de Jornadas Cien�fica e de Defesa Profissional foi uma das ações associa�vas mais marcantes destes primeiros 20 anos. A coincidência do início da disseminação da cirurgia por vídeo e a crescente necessidade de defesa da dignidade do trabalho do cirurgião torácico foram os pilares do sucesso daqueles memoráveis encontros. ►
Ao reconhecerem sua sociedade ao seu lado e ao seu alcance, os associados impuseram o menor índice de inadimplência que a SBCT já registrou: menos de 5% dos sócios a�vos deixaram de pagar a anuidade. A integração com sociedades internacionais também representou um marco na trajetória destes 20 anos. O congresso europeu de 2015, realizado em Lisboa, marcou a estréia da SBCT no cenário internacional. Pela primeira vez a cirurgia torácica brasileira foi representada de forma ins�tucional. Na sessão conjunta com nossos colegas portugueses �vemos a oportunidade de mostrar o quanto somos capazes e o quanto somos necessários neste cenário da cirurgia torácica mundial. No entanto, a consistência desta integração só poderia ser efe�va com uma base de dados que expressasse genuinamente nossos números. Era preciso sustentar nosso apregoado desempenho pelos resultados emanados destes dados compilados. Assim, um dos fatos mais marcantes da SBCT contemporânea foi a criação de seu banco de dados. Defini�vamente, nossos números seriam os nossos argumentos. Acima dos fatos marcantes é necessário reconhecer que os 20 anos foram capazes de manter uma sociedade unidade em seus propósitos inicias, protagonista inconteste das ações referentes à cirurgia torácica no Brasil e além fronteiras.
Jornal da SBCT: Diante de um novo panorama, com a entrada da tecnologia na especialidade. Como ver o futuro da SBCT? Darcy Pinto: Vejo o futuro da SBCT pelo seu presente. Reco-
nheço nas ações contemporâneas uma forte integração com os avanços tecnológicos. Uma sociedade aberta ao novo sem afastar-se das suas bases conceituais, preparada para o que vem pela frente.
Jornal da SBCT: Quais os cirurgiões (escola cirúrgica) influenciaram na sua formação profissional? Darcy Pinto: Sou filho da escola gaúcha de Cirurgia Torácica. Por estas coincidências que gostamos de festejar quando às encontramos, minhas influências passam essencialmente por três Josés. Para o desafio de ser cirurgião torácico minha referência foi o PPFº. Lembro que conheci meu futuro chefe numa manhã de dezembro de 1985, procurando o local da prova de seleção para residência. Ao cruzar com ele, no saguão de entrada do velho Pavilhão, alguém me disse, meio sussurrando, é este o Dr. José Camargo. Mal sabia que naquele momento estaria conhecendo meu mentor, meu grande mestre e meu pai médico. E as coisas não começaram sem emoção. Passada a barreira da prova escrita, fui para entrevista e nunca esqueci uma pergunta do mestre, que me soou estranha e desafiadora: você tem medo de vaso grande? Ins�n�vamente respondi: não, tentando disfarçar o �mbre de voz para não revelar minha óbvia insegurança. Muitos anos depois, na solidão das catástrofes cirúrgicas que enfrentei, fui entender o que afinal significou minha resposta. O medo é uma forma de ter coragem e os valentes pulam para frente, me ensinou o Prof. Camargo. Ainda hoje, nas horas de aperto no campo cirúrgico, mantenho o hábito de pensar em como o mestre sairia de determinada situação. E me tranqüilizo, ele sempre tem uma saída. Nos dois anos de convívio durante a residência fui defini�vamente ca�vado pela inteligência brilhante, inquietação cien�fica, obs�nação em fazer sempre perfeito e por uma singular maneira de gostar de gente, que meu mestre �nha e nunca perdeu. Quantas
vezes sai do Pavilhão, já bem tarde, esfolado pelas tarefas diárias, pensando: é este o �po de médico que quero ser. Inigualável retaguarda, absurda destreza cirúrgica, com quem aprendi a dimensão da lealdade e de quem guardo lembranças inesquecíveis de amizade e afeto. Foi o primeiro José de quem �ve no�cia no o�cio da cirurgia torácica. A fama vinha dos plantões do pronto-socorro municipal de Porto Alegre e confesso que os comentários não eram atra�vos, diziam que seu limiar de paciência com a incompetência não era mínimo, ele simplesmente não exis�a. Mas chamava atenção a ressalva de que pouca gente operava como ele. Gostei deste predicado, afinal era este o meu interesse prioritário: ser um bom cirurgião. Devo muito, do pouco que consegui ser, ao sonho de operar como o Dr. José Carlos Felice�. Quando já estava feliz e agradecido pelos dois Josés que haviam cruzado meu caminho durante a residência, a criação da Sociedade de Cirurgia Torácica do Rio Grande do Sul, um sonho acalentado com meu querido amigo Aírton Schneider, trouxe o Dr. José Antônio de Figueiredo Pinto. Desde 1996, poucas primeiras sextas-feiras de cada mês ficaram sem o registro dos nossos encontros. Aprendi com ele a importância do pensamento cirúrgico com solidez cien�fica. Sempre atento à coerência das suas argumentações, à grande capacidade em conviver com o contraponto e a uma enorme paciência em acolher e abrandar os desa�nos diagnós�cos e terapêu�cos de todos nós. Durante todos estes anos a parceria incondicional, a palavra de incen�vo no momento di�cil, o entusiasmo contagiante com os novos projetos, o sen�do aguçado para a análise crí�ca das controvérsias e a devoção infinita ao seu o�cio de cirurgião foram a base da minha grande admiração pela trajetória deste José, que hoje cuida, vejam só os caminhos do des�no, da formação de meu filho Vítor. Sou grato eternamente pela importância destes três “Josés” na minha formação de cirurgião torácico e de homem e ao quanto esta convivência me fez caminhar para frente.
Jornal da SBCT: Se o senhor voltasse a presidir a SBCT, o que você acrescentaria a nossa sociedade? Darcy Pinto: Os atuais projetos da SBCT são abrangentes, contemplando as múl�plas faces da nossa a�vidade profissional. Temos uma diretoria execu�va capaz, comprome�da e atenta às necessidades profissionais do cirurgião torácico brasileiro. Não cogito retornar a presidência, pois entendo que a renovação é imprescindível aos próximos vinte anos. No entanto, no contexto de reflexão que está inserido na pergunta, trabalharia intensamente numa poli�ca de mercado de trabalho para a cirurgia torácica. Análise crí�ca da relação vagas de residência e necessidade de mercado, estruturação de um programa de distribuição demográfica homogênea das oportunidades de trabalho. Discussão com o Ministério da Saúde sobre condições mínimas de trabalho para o cirurgião torácico em cidades de médio porte. Numa outra vertente trabalharia na divulgação conceitual sobre “quem é o cirurgião torácico”. Precisamos divulgar a qualificação profissional do cirurgião torácico que além da a�vidade fim, possui treinamento em cirurgia geral, endoscopia respiratória, sendo capaz de avaliação das doenças respiratórias prevalentes e atuação em terapia intensiva. ► 11
Agradecimento O exercício de um mandato frente à presidência da SBCT não é um ato solitário, por óbvio. Uma das principais razões para que se consiga êxito na execução das metas e projetos esta na escolha do “�me” que vai compor a diretoria execu�va. Neste par�cular, preciso reconhecer os que es�veram ao meu lado durante os quatro anos dos dois mandatos. Ao lançar minha candidatura procurei compor a equipe baseado em dois critérios: afinidade e competência. Resis� aos critérios polí�co e da representa�vidade federa�va. Para a escolha era fundamental a afinidade do grupo, pois a trata�va das demandas necessitaria da in�midade e do compromisso pessoal que só os amigos são capazes de oferecer à causa. Nada do que foi feito teria sido possível sem a retaguarda segura e a palavra sensata do Sergio Tadeu, “meu presidente”, a re�dão é�ca, disponibilidade e disposição, e um incomparável senso de vida associa�va, do Miguel Tedde, o brilhan�smo e o entusiasmo de quem estava
começando, ele que tanto já havia caminhado, do José Camargo, autor do projeto que levou a SBCT a todos os cantos do Brasil, o trabalho e a capacidade de fazer de Fernando Vannucci, no inicio como secretário geral e depois na secretaria de assuntos internacionais colocando nossa SBCT no calendário internacional da especialidade, o incen�vo e senso cri�co da Paula Ugalde, que foi embora sem nunca ter saído de perto da gente, o entusiasmo por fazer parte, a cria�vidade, competência e capacidade de trabalho do Ricardo Terra, sua liderança frente ao Banco de Dados é um legado ines�mável à SBCT, e o senso de equipe, compromisso e devoção do Alexandre Avino, que entrou no �me aos 45 min do segundo tempo e correu o que pode pela secretaria geral. A este �me, de que tanto me orgulho em ter montado, minha gra�dão e minha amizade sinceras. ■
TÓRAX 2019
Ex-presidente da SBCT - RS
XXI CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CIRURGIA TORÁCICA
16 A 18 DE MAIO DE 2019 OURO MINAS PALACE HOTEL – MG
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Dr. Darcy Pinto
Inauguração da nova sede da SBCT Prezados associados, amigos, convidados. Minhas senhoras e meus senhores! Na história da humanidade, desde que o homem deixou de ser nômade, a escolha de um local que lhe trouxesse uma referência de iden�ficação e iden�dade passou a ser crucial para o desenvolvimento e surgimento de uma vida social, familiar ou comercial. Assim surgiram as casas, aldeias, vilas e cidades. Quando um grupo de pessoas, com finalidades e interesses comuns, decidem erguer uma sede, isso tem todo um simbolismo. Somente uma Sociedade muito coesa, que coloca prioritariamente os interesses do grupo como meta, e não os pessoais, que é formada por pessoas comprome�das com a mo�vação e obje�vos que levaram a sua existência, consegue construir um local que possa servir de abrigo, que possa sirva de solo fér�l para o desenvolvimento de suas a�vidades, ideias e propósitos. A�vidades essas que visam o crescimento e desenvolvimento comum, que possam fazer com que a sociedade prospere com o obje�vo de fortalecimento de todos. Assim, uma sede funciona como uma casa, um lar. Serve de abrigo não para pessoas, mas para as ideias e ideais de seus membros, estatutariamente regidos. Muitos aqui presentes, ressaltando os nossos ex-presidentes, são testemunhas vivas da dedicação orgulhosa que ergueu, literalmente, nossa Sociedade. Vocês sempre serviram, e servirão, de esteio para todos que aqui vierem exercer funções estribadas nos preceitos estatutários da nossa Sociedade. A SBCT tem convicto orgulho de ter vocês como parte da sua história. Ao final, mas não menos importante, ressalto a saudosa memória da ausência �sica do nosso primeiro presidente. Uma certeza que jamais essa Sociedade se sen�rá órfã de seu legado, de sua dedicação e orgulho com a nossa Sociedade. Jamais seremos órfãos, seremos sempre sim herdeiros do Dr. Vicente Forte. ■
Carlos Alberto A. Araújo
Vice-presidente da SBCT - RN
Projeto
Reforma
Nova Sede
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Fonte: inhabitat.com. 2013
Figura 1. Thorncrown Chapel., Arkansas. Fachada frontal.
ARQUITETURA & NEUROCIÊNCIAS: A abordagem sensorial do espaço arquitetônico Antônia Verônica Lopes Trindade “I call architecture frozen music” Johann Wolfgang von Goethe
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ara além de ser a arte de projetar espaços para abrigar as diferentes atividades humanas, a arquitetura estabelece uma complexa relação com o ser humano, produzindo consideráveis efeitos em seu metabolismo (AL HORR et al, 2016). Suas atribuições vão muito além dos princípios básicos da Tríade Vitruviana, firmitas, utilitas, venustas: estabilidade, funcionalidade e beleza. Os aspectos técnicos relativos ao dimensionamento, conforto lumínico, térmico e acústico são bem conhecidos por arquitetos e designers há longo tempo, mas não se sabia “onde”, “como” e “porque” nosso cérebro interage tão intensamente com o espaço arquitetônico. Essas questões começaram a ser respondidas com a aplicação da Neurociência aos estudos de comportamento ambiental (Enviroment/Behavior/Neuroscience – E/B/N). O objetivo era identificar a origem dos fenômenos comportamentais, físicos e emocionais desencadeados no espaço construído, e, com isso, manuseá-los de modo a gerar experiências positivas aos
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usuários desse espaço (EBERHARD, 2009). O neurocientista Fred Gage afirma que o cérebro controla nosso comportamento e os genes controlam nosso cérebro, mas que o ambiente pode modular a função dos genes, e consequentemente, a estrutura do cérebro. Segundo ele, mudanças no ambiente afetam o cérebro e podem mudar nosso comportamento (GAGE, 2003). Esse modelo de estudo emprega métodos de medidas de pressão arterial, pulso, de níveis de cortisol na saliva, assim como a ressonância magnética funcional, que permitiu identificar o local do cérebro em que as atividades relacionadas ao ambiente são desenvolvidas. De forma esquemática, o lobo occipital do cérebro, como um sensor, emprega a visão, o tato, o olfato e a audição para captar informações do ambiente. Em seguida essas informações são transformadas em sensações no lobo parietal, com tamanha clareza, que é possível identificar qual estímulo ambiental desencadeou cada sensação. Por fim, no lobo frontal, essas percepções sensoriais originam uma resposta motora, também chamada de “ação emocional”, ►
Fonte: inhabitat.com. 2013
Figura 2. Thorncrown Chapel, Arkansas. Interior. pois representa a ligação entre sentimento e ação. (ZEISEL, 2006). A percepção de lugar é uma habilidade fortemente ligada à nossa memória afe�va. Um exemplo que bem representa a interação do ser humano com o ambiente é a Thorncrown Chapel, Arkansas, USA (Figuras 1 e 2). Trata-se de um projeto do arquiteto Fay Jones, eleito o quarto projeto mais impressionante do século XX. Desde sua inauguração em 1980, já recebeu mais de cinco milhões de visitantes, que relatam vivenciar em seu interior uma experiência única, etérea, de paz e plenitude. Em 2003, foi criada a Academy of Neuroscience for Architecture (ANFA) com o fim de fazer o link entre as pesquisas de Neurociências e a prá�ca da Arquitetura. As cinco áreas do cérebro pesquisadas são sensação e percepção, aprendizado e memória, tomada de decisões, emoção e afeto, e interação com o ambiente. Essas pesquisas têm apontado importantes diretrizes para o design (EBERHARD, 2009). Estabilidade, funcionalidade e esté�ca con�nuam a ser os pilares da arquitetura. Contudo, a abordagem sensorial do espaço
arquitetônico tem mostrado que arquitetura é, acima de tudo, emoção. 1 Médica formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) em 1983. Arquiteta formada pela UFRN em 2015. antoniavlt@yahoo.com.br. 2 NA: autoria não confirmada. Frase também atribuída a Arthur Schopenhauer. 3 Vitruvius, arquiteto romano do século I a.C, autor do De Archite�ura, tratado de arquitetura clássica. REFERÊNCIAS
AL HORR, Y. et al. Impact of indoor environmental quality on occupant well-being and comfort: A review of the literature. International Journal of Sustainable Built Environment (2016), http://dx.doi.org/10.1016/j.ijsbe.2016.03.006 . EBERHARD, J. Applying Neuroscience to Architecture. Neuron 62, June 25, 2009. Elsevier Inc. DE GIULI et al. Indoor environmental quality and pupil perception in italian primary schools. Build. Environ. 56, 2012. p 335–345. GAGE, F.H. Neuroscience and Architecture. AIA 2003 NATIONAL CONVENTION & EXPO. San Diego, Ca. HUISMAN, E.R.C.M. et al. Healing environment: A review of the impact of physical environment factors on users. Building and Environment, 58, 2012 p. 70-80. ZEISEL, John. Inquiry by Design: Enviroment/Behavior/Neuroscience In Architecture, Interiors, Landscape, and Planning. W.W. Norton & Co., New York (2006),ISBN: 0-39373184-7. ■
Antônia Verônica Lopes Trindade
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Atividade física não é gosto, é necessidade
seja para caçar e ter comida diariamente, seja para fugir e não virar comida para outros predadores. Se observarmos maratonistas profissionais em uma prova não teremos dúvidas: somos uma máquina de correr. Dos mamíferos, somente o homem e o canguru são bípedes e nós levamos vantagem por não termos cauda. Além disso, a capacidade de suar nos ajuda a remover o calor do corpo, evitando hipertermia. O ser humano pode suar até 500 ml/m2/ hora, o que é muito mais que o cavalo (100 ml/m2/h) e o camelo (250 ml/m2/h). Com toda essa maquinaria, ainda fazemos pouco exercício e doenças cardiovasculares, diabetes, obesidade, hipertensão, etc. têm aumentado significativamente nas últimas décadas. Os protocolos de tratamento de diabetes, hipertensão, etc. colocam exercícios como ponto primordial, mas isso não é suficiente. Uma pesquisa do Ministério do Esporte (2015) entrevistou 8.902 pessoas e encontrou que 41,2% dos homens e 50,4% das mulheres eram sedentários. Para piorar o cenário, esses números são maiores com o avançar da idade, nas faixas etárias onde as doenças são mais prevalentes. Entre os médicos, isso é mais preocupante ainda, pois na maioria das vezes fazemos recomendações de estilo de vida para nossos pacientes e geralmente não as incluímos no nosso dia a dia. Fazer 150 minutos por semana, divididos em pelo menos três dias e não mais que dois dias consecutivos sem exercício é a recomendação usual. Essa não é uma rotina difícil de seguir, mas muitos não fazem. ►
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ocê usaria um remédio que reduz o risco de doença cardíaca em 40%, o risco de AVC em 27%, a incidência de diabetes em 58%, a incidência de hipertensão arterial em quase 50%, a mortalidade e o risco de recorrência de câncer de mama em quase 50% e risco de câncer de cólon em 60%? Esse remédio existe já há algum tempo: exercícios. Nós humanos nos desenvolvemos fisicamente e fisiologicamente durante séculos para chegarmos ao que somos hoje: bons corredores, competitivos não só como indivíduos, mas também como espécie. Se nossos ancestrais não fossem bons corredores nunca teriam sobrevivido. Eles estavam sempre correndo,
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Com histórico familiar de diabetes, hipertensão e dislipidemia, em 2005 eu fazia parte dos sedentários e minha glicemia começava a aumentar. Decidi fazer uma dieta pobre em gordura e açúcar e, após um ano, a glicemia baixara muito pouco. Iniciei exercícios �sicos (corrida) em uma “dose” até considerada exagerada por alguns (correr maratona) e meus exames normalizaram completamente. Os bene�cios induzidos pelo exercício decorrem da melhora na ação da insulina, aumento na captação muscular de glicose, aumento no clearance de ácidos graxos, etc. Mesmo na ausência de perda de peso, os bene�cios metabólicos são evidentes. A maior parte da gordura corporal é dita branca que, diferentemente da gordura marrom, é metabolicamente menos a�va. O exercício ro�neiro modifica beneficamente a gordura branca, melhorando os exames. Recentemente corri minha maratona número 50 e apesar de 12 anos mais velho, meus exames, peso, percentual corporal de gordura e disposição estão bem melhores. Uma vez que não temos (ainda) como fazer mudanças na gené�ca, precisamos modificar o ambiente. Temos então duas opções: alimentação saudável e exercícios regulares ou tomar medicamentos. Não que os medicamentos sejam indesejáveis, mas devem ser u�lizados quando as mudanças de es�lo de vida não forem eficazes. Vou parar por aqui, pois preciso trocar de roupa para dar uma corridinha... bons exercícios! ■
Josivan Lima
Médico endocrinologista
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Diálogo escalafobético – vídeo ou aberta? - Tenho cisma com a VATS. Nunca me convenceu. A robó�ca menos ainda. - Talvez seja apenas falta de convivência com o espaço e sua dimensão �sica numa outra perspec�va. - Nada disso. Sou cismado, mesmo. - Não tem por quê. Deixa eu te dizer: conheces o “ponto de fuga”? - Mas eu não quero fugir... Só cismado. - Não é isso (rsrsrsrs). Ponto de fuga é o recuo quando se pensava em avançar. Ou seja: a distância mais longa entre o inimigo e você. Aliás, distância é o que os cismados sempre procuram. Saia dessa... - Não sei o que é “ponto de fuga”. Nunca soube. Diz aí! - Pois saiba que curta linha reta é o que nenhum cismado procura. O cismado só vê labirintos, ou seja, alonga linha reta e ainda a transforma numa linha labirín�ca. Mas nada que o treinamento não supere. Enfrente esse encismamento. - Pois é... Mas como surfar nessa tua idéia? - Eis que se apresenta a geometria, braço da matemá�ca que abraça questões de forma, tamanho e posição rela�va de figuras com as propriedades dos espaços. - Huuuuuuum!!! Aí tem coisa. - Tudo a ver com a VATS, em que pulmões e o medias�no, que são figuras, acomodam-se dentro da cavidade torácica após o pneumotórax e passam a ser visualizados após a passagem da ó�ca entre as costelas. - Mas isso está bem claro. Para mim isso é anatomia. - Nem tanto, nem tanto. Depois da geometria, ainda tem a álgebra. - Álgebra? - Sim. A Álgebra estuda a manipulação formal das equações, operações matemá�cas, polinômios e estruturas algébricas, transformando-se na “ciência do cálculo das grandezas abstratas”. Uma 18
dessas grandezas é a percepção visual do cirurgião a par�r do espaço pleural. - E a discussão sobre uniportal versus mul�portal, onde entra? - Exatamente aí. Isso já é geometria e suas respec�vas percepções visuais. - Então isso é subje�vo! - Não, não. Isto é ciência. Foi o arquiteto renascen�sta Brunelleschi, quem resgatou o conceito de perspec�va visual, que havia se perdido na idade média. - Como assim? - Ele pintou um painel reproduzindo a vista que se �nha do Ba�stério a par�r da Catedral. Quem visitou Florença conhece esse ponto turís�co e que ambos ficam na praça Duomo, recheada de turistas. - Já fui lá. É uma defronte da outra. - Isso mesmo. Ele fez um pequeno furo no painel, virou a face pintada para a praça e olhou para o Ba�stério, a esquerda da catedral. Então pegou um espelho e o segurou com o braço estendido, refle�ndo a pintura. Conforme movia o espelho para dentro e para fora de sua linha de visão, ele comparava o reflexo de sua pintura ao verdadeiro Ba�stério, de modo a reproduzir uma visão tridimensional a par�r daquele plano. Chamou de pintura realís�ca. - Acho que vou vomitar... - Calma. Após aplicar tal ar��cio em um painel pintado, Brunelleschi demonstrou como linhas paralelas pareciam convergir, na distância, para um ponto de fuga. No caso da VATS, quem percebe esse ponto, o hilo pulmonar, por exemplo, é o cirurgião que faz a câmera. - Mas isto é verdade ou é uma teoria, apenas? - É a teoria da perspec�va linear, que é a mais pura verdade. Com isso, ele revolucionou a arte e influenciou a ciência da óp�ca, a arquitetura e as aplicações da geometria. ►
- Na prática, onde enxergar isso? - Nos quadro de Leonardo da Vinci, por exemplo. Ele estudou os elementos científicos a partir da perspectiva do ponto de fuga e aplicou à arte. Agora estamos aplicando na VATS. - Onde viste isso? - Na biografia de Leonardo da Vinci, que estudou Brunelleschi e pintou seus quadros a partir da percepção visual deste arquiteto. Por sua vez, Brunelleschi bebeu na fonte da geometria plana e espacial de Pitágoras, Euclídes, Arquimedes e tantos mais, passando esta ciência de um caráter empírico e intuitivo para a criação de uma disciplina racional, dedutiva e lógica, através de teoremas, definições, postulados e axiomas criados nos anos 300 a.C. - Elementar, meu caro Watson! - O grande marco se dá quando o legado de Pitágoras é descascado e jogado ao léu para ganhar novos horizontes com Euclides, ao introduzir a álgebra. Em outras palavras, a álgebra foi luz para visualizar o que antes eram escuro e obscuro, e levar claridade à tão restrita comunidade científico-artística da época. - Seria essa mesma luz, a que falta para tirar essa minha cisma? Explicar melhor. - Pode ser. A partir de então, com base em sólidos alicerces algébricos, a biblioteca de Alexandria passou a ser a banheira de gênios da matemática. Sobre tais vetustos pergaminhos e papiros debruçaram-se gigantes como Isaac Newton e Leonardo da Vinci, de quem falo agora. - E como fazer com que se entenda essa visão dentro da cavidade torácica? - Fácil: a visão bidimensional e finita da geometria plana, exemplificada na praça de Florença, tal como no campo operatório com a ótica de 30 graus, direcionando o olhar ao norte (pra
cima), sul (pra abaixo), leste (pra direita) e oeste (pra esquerda), remete-nos ao espelho da praça, quando somados à profundidade do campo operatório. Assim, pela álgebra euclidiana, chegamos aos elementos da tridimensionalidade e infinito, tornando possível desvendar os mistérios dos fenômenos naturais, ainda não vistos sob o limitado espectro da visão humana, porém dedutivamente notáveis na ilimitada linguagem matemática das fórmulas e teoremas caprichosamente exatos. Ou seja, eles deram à geometria os olhos analíticos da natureza. Foi assim que o homem foi à lua e se projetou para o espaço. Agora estamos conquistando o espaço pleural, pelo olhar euclidiano. - E sobre o acesso uniportal: é o melhor? - Na visão uni ou multiportal o olhar tridimensional é recriado à medida que cada movimento brunelleschiano é realizado pelo cirurgião operador a partir do cirurgião camerador, deixando claro que a praça toscana representa o espaço criado pelo pneumotórax, e o batistério o órgão alvo, a partir da entrada uni, bi ou multiportal. - Então não faz diferença? - Faz sim. - Qual diferença? - Já respondi. Não percebeste? - Claro que não. Já disse que sou cismado e ainda senti náuseas. - Então vou escrever esse diálogo numa boa revista e vou pedir para você reler e então procurar a diferença. Certo? - arghhhh! ■
Roger Normando
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