PM17 Africa Adventure 2013

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sul de África 2013

Zimbabwe • Botswana • Namíbia • África do Sul


D

emorei 4 anos a completar esta edição do álbum e outras tantas épocas de Natal a adiar a promessa da oferta à Nélia.

Foi uma viagem singular, por destinos deslumbrantes que nos fazem sentir especiais por aí estarmos, vendo em estado selvagem os mesmos animais que crescemos a ver nos documentários na televisão. Fizemo-lo de moto, como gostamos de viajar. Encontro justificação na demora por esta ser, para mim, uma viagem que recordo com dificuldade. Bem perto do final tivemos uma queda, a qual apesar de pequena deixou a Nélia maltratada no joelho e a moto incapaz de seguir rolando, remetida para o reboque. Desse ponto em diante, estava condenado a completar a viagem na «mota da vergonha», lembrando-me a todo o momento que falhei, repetindo uma e outra vez tudo na cabeça, recordandome cada pormenor, cada decisão tomada. E aí começam os «E se...». E se não fosse tão depressa? Maldito excesso de confiança. E se tivesse baixado a pressão dos pneus? E se à pergunta «Queres que vá contigo ou sigo no jipe?» feita pela Nélia na paragem anterior, eu tivesse dito que sim? Mas havia algo pior que a minha sentença cumprida na «moto da vergonha» e os diálogos interiores que me impediram de desfrutar da cidade do Cabo, uma das cidades mais bonitas do mundo, num cenário de excepção, envolta em montanhas e florestas. Apesar de sempre

sorridente e bem disposta, a Nélia não disfarça em cada passo as dores persistentes do joelho. Algo mais que apenas uma luxação deverá estar a causar-lhe esse mal-estar. Enquanto os demais entravam num autocarro para nadar com os grandes tubarões-branco eu apenas queria regressar a casa. Procurava fazer por esquecer o que acontecera, permitindo-nos perceber melhor o que estava de errado com a perna. Sabíamos que seriam muitas as horas de voos e espera nos quatro aeroportos e três escalas, onde nem a diversão de poder passar à frente nas filas de embarque — cortesia da cadeira de rodas — parecia aliviar. Chegados a Portugal, o diagnóstico médico confirmara os receios que uma veterinária treinada compreendera muito antes de mim — rutura dos ligamentos cruzados com fratura da cartilagem do joelho. E cada mês que passou, entre fisioterapia, medicação e dores que testemunhei a Nélia passar, afastou-me mais e mais desta viagem e do álbum. Hoje, terminá-lo é uma espécie de catarse — uma reconciliação com a vida. Que tudo faz parte de estar vivo e arriscar viver. E viver é recordar de forma saudável o passado. Determinara que o faria, encorajado por quem mais sofreu na viagem e, ainda assim e apesar disso, sempre se manteve sorridente e sonhadora quando pensa na experiência que foi e no desejo das próximas. Dezembro de 2017

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kalahari a terra dos bushman

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Sossusvlei o deserto da namĂ­bia

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as montanhas do leopardo

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CEderberg

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CAbo

onde começa åfrica

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17 p.

CHobe

o reino dos elefantes

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Vic. fallS the mighty zambezi

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Makgadikgadi os maiores salares do mundo

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OKAvango

o rio que termina no deserto


Angola

Zâmbia

8

1 2

Bem no meio de nada, um cemitério de carros antigos enferrujados e desdentados — faltando-lhes portas, capô, motores ou simplesmente rodas — é a ante-câmara de um café-restaurante que dá nome ao local, isolado que está de tudo o mais — Solitaire.

Maun

Namíbia

3

Thakadu Bush Camp

5

BostWana

Duas oportunidades de ouro para um contacto mais próximo com a vida selvagem africana, ambas no parque natural de Chobe e nas margens do rio Cuando e da ilha de Sedudu.

4 O delta de Okavango feito nas pequenas «mokoro» conduzidas pela mão hábil dos «bosquímanos do rio» permite explorar um ambiente rico em fauna selvagem que a água atrai.

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10

À beira da extinção Há uma vida selvagem que está a desaparecer. Mas esta não é animal, mas humana. Os bosquímanos são de outro tempo, como a língua que falam desenhada em estalidos. São de uma idade onde a caça era permitida e servia o ritual respeitoso onde

Acordar de madrugada para fazer os longos estradões do deserto namibe foi um dos momentos que me fez, como piloto de motos, sentir melhor.

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Fish River Canyon

África do Sul 11

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Ais-Ais

Num dia de 750 km que começara com uma recepção de balões de ar quente sobre Sesriem, terminamos com uma vista sobre o Fish River Canyon que disputa o galardão do «maior do mundo» com o Grand Canyon nos EUA.

Orange

o rapaz se tornava homem. Hoje apenas há «rapazes» nas famílias bushmani, enfermos pelas doenças que não são as deles, intoxicados pelo álcool e envenenados pelo açúcar. Sobrevivem entre danças para turistas, explicando os pormenores que tornaram anacrónicas

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Lesoto

Oceano Atlântico

as suas vidas duras no cruel Kalahari. Batemos palmas ao som dos cânticos entoados na noite, à volta da fogueira que aprendêramos naquele dia a acender sem fósforos ou isqueiros. Mas a despedida é constrangedora, sabendo que pode bem ser a última.

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«KamiKabra» (ou «A Cabra Suicida») é um daqueles casos em que dois teimosos se cruzam na estrada.

A única chuva forte de toda a viagem rapidamente se tornou numa enxurrada, deixando as ruas da capital namibe, Windhoek, inundadas, transformadas num «Okavango urbano».

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12 O local da queda numa curva rápida em terra de berlindes com pneus de estrada, demasiado pressão e um nabo a conduzir — combinação fatal para um joelho magoado seriamente na Nélia.

No mais turístico dos locais onde estivemos (excepção feita à cidade do Cabo), a oferta é vasta em Victoria Falls, desde saltos de bungee a partir da ponte sobre o Zambeze na fronteira literal entre a Zâmbia e o Zimbabwe, «white rafting» nas águas bravas do rio ou sobrevoar as cataratas num ultra-leve .

Com 150 km de largura máxima, os 3 lagos secos de Makgadikgadi ocupam uma área equivalente à Suíça. Entretemo-nos a descobrir os seus limites exteriores em peripécias na argila salina, entre escorregões.

Ghanzi

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3

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Soususvlei

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Makgadikgadi Ntwetwe

Solitaire

Uma ocasião para enterrar os pés na areia dourada das dunas e caminhar no lago argiloso seco de Dead Vlei, no meio das acácias petrificadas.

Zimbabwe

4 Okavango

8

Sesriem

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Kasane

Reserva natural Etosha

Windhoek Walvis Bay

Victoria Falls

Chobe

Os voos seleccionados da British Airways fariam ligação a Londres, Joanesburgo e Cidade do Cabo. Contudo, como o a nossa viagem de moto não era circular, comprámos um voo apenas de ida de Joanesburgo

12 Cederberg Range

Cidade do Cabo Cabo da Boa Esperança

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4 africa‘13

Oceano Índico

para Victoria Falls, interrompendo o voo de ida que continuaria para o Cabo. No final da viagem, ao fazer o check-in no aeroporto informaram-nos que não encontram a nossa reserva de regresso.

Ao que parece, por termos interrompido o voo inicial, assumiram que nunca chegámos ao Cabo e, logo, não regressaríamos por essa via. Resolveu-se, mas apenas por ainda haver lugares vagos nos voos...


África do Sul Republic of South Africa

Lema:

«Ike e: Ixarra Ilke» («Unidos pela diversidade») Governo: República constitucional parlamentar Presidente: Jacob Zuma

Área total: 1 221 037 km2 (~13x Portugal) População: 52,9 milhões hab. (2013) ~5x Portugal Densidade pop.: 42,4 hab/km2

Capital: Pretoria Condução: Esquerda Moeda: Rand Sul-Africano (ZAR) (1 euro ~14 rand) Produto interno bruto: 11 525 USD per capita (82.º mundial, 2013 est.) Desenvolv. humano: 0,63 - 121.º mundial (IDH) Língua oficial: Afrikaans, Inglês, Ndebele, Sotho, Swazi, Tsonga, Tswana, Venda, Xhosa, Zulu Fuso horário: Southern African Time (UTC+2) Dia Nacional: 31 de Maio («Independência») Esperança de vida: 71 anos (etnia branca), 48 (etnia negra)

Namíbia Republic of Namibia

Botswana Republic of Botswana

Lema:

«Pula» («Chuva», «Benção») Governo: República presidencialista Presidente: Ian Khama

Área total: 581 730 km2 (~6x Portugal) População: 1,9 milhões hab. (2008) ~1/5 Portugal Densidade pop.: 2 hab/km2 (200º mundial)

Capital: Gaborone Condução: Esquerda Moeda: Pula (BWP) (1 euro ~12 pula) Produto interno bruto: 16 450 USD per capita (49.º mundial, 2007) Desenvolv. humano: 0,63 - 119.º mundial (IDH) Língua oficial: Inglês, Setswana Fuso horário: Central African Time CAT (UTC+2) Dia Nacional: 30 de Setembro («Independência») Esperança de vida: 55 anos

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Lema:

«Unity, Liberty, Justice» («União, Liberdade, Justiça») Governo: República presidencialista Presidente: Hifikepunye Pohamba Área total: 825 615 km2 (~9x Portugal) População: 2,1 milhões hab. (2011) ~1/5 Portugal Densidade pop.: 2,5 hab/km2 (235º mundial)

Capital: Windhoek Condução: Esquerda Moeda: Namibian Dollar (NAD=ZAR) (1 euro ~14 namibian dollar) Produto interno bruto: 11 525 USD per capita (82.º mundial, 2013 est.) Desenvolv. humano: 0,61 - 128.º mundial (IDH) Língua oficial: Inglês (reconhecidas: Afrikaans, German, Rukwangal, Slozi, Setswana, Damara/ Nama, Herero, Oshiwambo) Fuso horário: Western African Time WAT (UTC+1; Verão UST+2) Dia Nacional: 21 de Março («Independência») Esperança de vida: 71 anos (etnia branca), 48 (etnia negra)


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| 1:: António Oliveira | 2:: Sérgio Rosa | 3:: José Barbosa | 4:: Clayton Tavares | 5:: Luis Fonseca | 6:: Ida Perea | 7:: Leonard Mateko (MotoXplorers) | 8:: Nélia Carvalho | 9:: José Bragança Pinheiro | 10:: Marco Cid | 11:: Francisco Costa | 12:: Carlos J. Martins (MotoXplorers)

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Já desequipados para passar a noite no Felix Unite Provenance Camp, com a África do Sul do lado de lá do rio Orange.

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A

chegada ao aeroporto de Victoria Falls dá-nos o primeiro aroma de África. Um pequeno edifício térreo, a 30 m da pista onde o avião nos largou, reúne todas as funções que estamos habituados a ver onde o controlo de passaportes e o embarque estão separados por caminhadas épicas. Aqui tudo é mais simples e humano — uma única sala com 3 filas paralelas que servem para obter os vistos de entradas única, dupla e múltipla. Ao fundo, nas costas dos oficiais de segurança e alfândega do Zimbabwe, vemos uma pilha de malas que se começa a formar, entretém para os largos minutos de espera, tentando perceber se a próxima será a nossa mala. Já no controlo de raio-X, o operador parece não ligar muito ao que o monitor lhe mostra.

Zâmbia

Chobe Namíbia Kasane

Victoria Falls Ilala Lodge

Zimbabwe Botswana

À saída do edifício, espera-nos o metódico Absulom e Leonard para nos levarem ao lodge, junto com o Francisco Costa que chegara há pouco. É 6.ª F e encontramos os Apostólicos a celebrarem missas debaixo das acácias, ao longo da estrada. De um e de outro lado, são evidentes os sinais de estrago causados pelos elefantes, indiferentes na rota que escolhem para se deslocarem nesta terra. Mabecos, javalis, babuínos são companheiros das margens da estrada.

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Victoria FALLS “the mighty zambezi”

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Da ponte que liga Zimbabwe e Zâmbia, penduram-se as estruturas para saltar de bungee sobre as águas brancas do rio.

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Do lado da Zâmbia, embarcamos para uma voltinha de ultra-leve sobre as cataratas. (@Zâmbia, Victoria Falls)

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Queríamos ir até à Zâmbia para sobrevoar as cascatas de ultra-leve. Mas um carimbo de entrada nesse país obrigar-nos-ia à vacina de febre amarela exigida à entrada na África do Sul, administrada no posto médico em Victoria Falls.

Toca a comer umas lagartas estufadas com molho de tomate — para descer melhor — no restaurante «The Boma», em Victoria Falls. Localmente, chamam-lhes «Macimbi» ou «Mopani worm», como atesta o certificado que nos deram, assinado e tudo...

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Zâmbia

Namíbia

Waterlilly Chobe Lodge Victoria Falls National Park Kasane Zimbabwe Botswana

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Chobe o reino dos elefantes

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Nas traseiras do Waterlily Lodge, o passadiço de madeira dá acesso ao cais. Daí partem os barcos para os passeios no rio Cuando em redor da ilha de Sedudu. (@Kasana, Botswana)

Waterlilly Lodge

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Uma trovoada no final de dia, vista desde o hotel. (@Kasane, Waterlily)

Entra-se no Botswana pela fronteira de Kazungula, ainda sem moto. (@Posto fronteiriço de Kazungula)

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E

ntramos no Botswana ainda sem as motos, as quais apenas experimentaríamos numa curta volta em redor da aldeia de Kasane, percorrendo as ruas interiores empobrecidas, onde os muros das escolas se abateram à passagem dos elefantes. A noite chega iluminada pelos relâmpagos, banhada por uma chuva torrencial. Assim conhecemos o pequeno lesser bushbaby (mohuili), uma cria de marsupial que caiu das árvores do lodge com os ventos e chuva fortes. Embrulhada numa toalha para evitar dentadas defensivas do pequeno assustado, procuramos não interferir demasiado, deixando-o num local protegido, fora da passagem, para permitir à sua mãe resgatá-lo para a segurança e conforto do ninho arbóreo, o que acabou por acontecer. Na manhã seguinte, Frank — guia e condutor do jipe — explica-nos que as chuvas terão iniciado a migração dos elefantes para sul, diminuindo a probabilidade de nos cruzarmos no parque nacional de Chobe onde entrávamos. Por isso, este dia começa com a mesma frase repetida com frequência — «If you are lucky…» («Se tivermos sorte…»). Afinal, visitar uma reserva natural de vida selvagem não se compadece com horários nem certezas.


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O

primeiro contacto com a vida selvagem africana acontece perto de Kasane, fazendo uso da localização privilegiada do lodge Waterlilly, denunciada no próprio nome. Desde as traseiras acede-se a um pequeno cais de madeira onde uma lancha com capacidade para uma dúzia nos espera. Para maior efeito dramático, contamos com o Sol, durante o final de dia, compondo quadros de cores impressionantes, onde em primeiro plano se vê uma boca aberta de um hipopótamo reclamando o seu território aquático no domínio efémero que a sua mandíbula respeituosa lhe permitiu. A abundância de bicharada chega para nos encher a alma, entre os crocodilos de boca aberta a 2 m de distância do barco ou os hipopótamos carregadinhos de testosterona na defesa territorial. O nosso capitão John não disfarça o respeito pelos cavalos do rio acelerando o motor ao mínimo sinal de confronto, para manter uma distância prudente. A ilha de Sedudu (também conhecida por Kazakili) foi um território disputado entre a Namíbia e o Botswana. Nas suas margens acedidas navegando o rio Cuando os herbívoros — waterbuck, bushbucks, antílopes, zebras e búfalos — pastam, valendo-se do isolamento dos grandes felídeos que as águas oferecem.

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As leoas e as crias descansam ao longe. (@Chobe National Park)

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O capitão John alterna um sorriso aberto com um semblante preocupado ao avistar hipopótamos no rio Cuando.

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O (mau) temperamento dos hipĂłpotamos torna-os um dos elementos mais respeitados e temidos. (@Rio Cuando, ilha de Sedudu)

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Tratar os bois pelos nomes E quando a bicheza é estranha, o melhor é ter uma forma de saber o que estamos a ver. Mais do que isso, este guia diz-nos como nos devemos comportar na interacção com cada um. Organizado por

regiões e com um índice por espécie, apenas lhe falta uma identificação de rasto/pegada e uma escala comparativa com o Homem. Dá jeito até para saber “quem manda aqui”...

“Watching Wildlife Southern Africa”

South Africa, Namibia, Botswana, Zimbabwe, Malawi, Zambia.

★★★★★

Versão impressa em inglês Editora: Lonely Planet

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NamĂ­bia

Chobe Victoria Falls National Kasane Park

Zimbabwe Delta do Okavango Maun

Gweta Lodge

Makgadikgadi

Ntwetwe

Botswana

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makgadi kgadi os maiores salares do mundo

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Esta foi a nossa incursĂŁo pelo lago salgado. Impressionante, verdade? ...nem por isso.

Nxai Pan

NtweTwe Pan A B Sowa Pan

Gweta Lodge

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Makgadikgadi Pans Para dar uma ideia da escala, os pontos A e B separam-nos 150 km, mais coisa, menos coisa.


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Melhor percorrido nas orlas para evitar as zonas escorregadias, o salar convida a acelerar.

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Gweta Lodge

Os baobas seculares desafiam a escassez de água a cada metro que se elevam do solo.

M

ackgadikgadi é o nome do gigantesco lago de água doce que seria maior que a Suíça. Agora é um deserto, seco e árido como são todos. Deu origem ao maior complexo de lagos secos do mundo, apesar de nenhum dos três ultrapassar a área do famoso salar de Uyuni, na Bolívia. Rodeados de deserto arenoso, os pans de Ntwentwe, Sowa e Nxai oferecem as imagens únicas dos salares onde a percepção de profundidade é tão difícil como matar a sede.

À entrada no salar, a Nélia mudou de montaria, para o Zé andar mais leve... e, para tirar fotografias, esta posição não desaponta.

Gweta Lodge

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Aproximando-nos por norte desde a estrada, percorremos algumas dezenas de quilómetros, apenas para perceber da imensidão desta formação geológica. Debaixo da aparência seca, esconde-se uma camada húmida que torna o piso de argila escorregadio e traiçoeiro, mesmo ao mais hábil dos pilotos. Já o mais experiente evitará adentrar-se no miolo do lago, preferindo rodar junto aos seus limites. Mas passar ao lado dessa diversão não seria a mesma coisa, pois não?


— Os leões andaram por aqui — conta-nos o nosso condutor do jipe — e mataram as minhas seis únicas vacas. Ele sabe que este território não é dos homens. — Vou ter que juntar para comprar outras —, diz, conformado — ...mas só depois do leão se afastar — remata.

Dança da chuva

A famosa estrada dos elefantes não está à altura do nome, avistando apenas alguns como Frank já havia antevisto. É nas bancas de jornais que encontramos um toque de exotismo, escrito nos títulos de capa dos diários botswanis, reveladores da dureza local. Nestes, o povo critica o bispo local pelas promessas falhadas de chuva. Prolonga-se a época de seca, apesar da chuvada na véspera, e o gado magro e plantações sofrem mais um dia. É uma terra dividida entre duas espécies de gigantes — as termiteiras de 3 e 4 m de altura e os baobas de raízes profundas e braços estendidos como que fazendo chegar ao céu as preces do bispo caído na desgraça nas capas de jornal.

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Em busca dos furtivos suricates que dependem dessa capacidade para arriscar sair da segurança das galerias subterrâneas a que chamam casa. Connosco foram bem sucedidos, pois não vimos um único.

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Zâmbia

Angola Namíbia

Victoria Falls Kasane

Delta do Okavango Okavango

Crocodile Camp Lodge

Maun

Gweta Makgadikgadi

Ntwetwe Botswana

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okavango o rio que termina no deserto

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Crocodile Camp Lodge

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Enquanto esperam pacientemente que lanchemos, as raparigas fazem pequenas peças de artesanato e pulseiras, usando folhas e bambu, para depois venderem.

O

enorme delta do Okavango é impotente e vulnerável aos humores das épocas da chuva, alimentado pelo rio Chobe desde a Namíbia. Depois de seco durante 3 décadas, voltou a estar inundado nos últimos 6 anos, mas não o suficiente para permitir outras embarcações que não as mokoros. Estas canoas — esculpidas de uma única acácia a qual, para atingir o tamanho certo, precisa de uma centena de anos — apenas servem durante 6 a 7 anos. A procura excessiva comprometeu a sustentabilidade da espécie o que levou o Governo botswani a «encorajar» o uso de canoas de polímero. Ainda que simulem o aspecto mais rude, falta-lhes a autenticidade que as originais carregavam. As lanchas levam-nos do lodge em Maún até ao ancoradouro de mokoros no coração do delta, navegando com dificuldade pelos baixios e brancos de areia submersos. Daí em diante, o passeio repousante entre os juncos e a floresta aquática de nenúfares apenas é possível nestas canoas, conduzidas habilmente por bushmen do rio com o auxílio de uma vara de 4 m, fazendo parecer fácil algo que não o é.

Crocodile Camp Lodge

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As lanchas apenas nos conseguem levar até ao ancoradouro, onde as profundidades dos bancos de areia submersos ainda vão permitindo uma navegação cautelosa.

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Crocodile Camp Lodge


Este traje foi criado pelos colonos alemães para as mulheres da tribo Herero. Por serem grandes e muito bonitas, a preocupação era não as expôr demasiado e assim evitar serem uma tentação. Os estilistas do início do séc. xix procuraram representar elementos da cultura herero — criadores de gado, ao contrários dos demais «bantu», agricultores de subsistência — como o chapéu que ilustra os cornos das vacas que criam. Apesar do calor causado por estes enormes vestidos de várias saias e o incómodo dos volumosos chapéus, ainda hoje perdura o hábito de os usarem.

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Delta do Okavango NamĂ­bia

Okavango Maun

Ghanzi 6 KamiKabra

Thakadu Bush Camp

Botswana

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kalahari a terra dos bushman

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«Welcoming Dance» Para acompanhar a visualização destas

páginas, recomendamos ouvir os sons da dança de boas-vindas, cantados pela família de Bushmani, em Ghanzi (Botswana).

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Após o nascimento do primeiro filho — cientes que vivem num ambiente pobre —, as mulheres roem a raíz de uma planta e ficam estéreis, evitando engravidar e ter demasiados filhos, os quais não terão como alimentar e criar.

«Contraceptive talk» Uma das mães Bushmani, em Ghanzi (Botswana) explica, na língua

única desta tribo africana, como a partir do extracto de raízes obtém os contraceptivos que a impedirá de ter mais filhos.

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Thakadu Bush Camp

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Thakadu Bush Camp

As tendas de campanhas foram convertidas num quarto com WC. Para quem ficar — como o Martins —numa tenda assente no chão, pode ao levantar a tenda perceber que afinal partilhou «quarto» com um escorpião.

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Inmanuel Wilderness Lodge Windhoek Walvis Bay

6 KamiKabra Solitaire

Sesriem Soususvlei

Oceano Atlântico

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Namib Desert Lodge Namíbia


sossus Vlei o deserto da namĂ­bia

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A

cabra é um bicho obstinado — quando mete uma coisa nos cornos, não descansa. Esta, em concreto, meteu uma coisa na cabeça, e uma cabeça na moto — tudo a 80 km/h (a velocidade da moto, não da cabra). As bermas da estrada na Namíbia são amplas e são frequentes os animais nelas, desde os mais comuns burros, cabras e vacas, aos mais exóticos javalis. Aquela cabra vira passar algumas motos na estrada sem que isso a parecesse afectar. Mas a nossa, talvez por ser amarela, teve nela um apelo — aquela estrada tinha de ser atravessada já, naquele instante. E assim fez, sem grande aviso, arrancando perpedicular à nossa trajectória, obrigando-nos a avaliar no que daria a combinação de intenções, nossa e dela. Acaba por embater em nós. Tudo correu pelo melhor pois a pancada foi amortecida pela perna da Nélia e, assim, sempre se poupou o estrago na moto, sem que tenhamos caído ou perturbado a estabilidade da moto. Pelo retrovisor, vejo-a às cambalhotas na berma oposta — a cabra, não a Nélia —, endireitar-se e seguir a sua vida. A mesma cabeça dura que a metera naquela confusão, salva-a de qualquer mazela. Imaginamo-la nessa noite a partilhar a história com o rebanho, como quem conta aos amigos a mais recente bravata no bar.

Namib Desert Lodge

Depois da cabra suicida, gelo na perna ajuda a desinchar. (@Inmanuel Wilderness Lodge)

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Namib Desert Lodge

Bem-vindos a Solitaire, onde os carros vĂŞm morrer.

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A «Duna 45» assim chamada por estar ao km 45 da estrada Sesriem—Sossusvlei, eleva-se a 80 m areia com 5 milhões de anos oriundos do rio Orange no deserto do Kalahari.

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Avistar um órix nas dunas de Soussvlei é um evento raro.

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A caminhada para subir à duna «Big Daddy» leva-nos a atravessar outros corpos dunares e o lago seco «Dead Vlei». Uma perna magoada pela KamiKabra dificulta ainda mais a missão.

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É uma tema recorrente, os carros que se vão envolvendo com a paisagem tornando-se um único. Parece Solitaire, mas não é.

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A chegada à capital namibe é feita debaixo de chuva forte, a única da viagem.

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A vista do Fish River Canyon.

Para chegar a Ais-Ais, a estrada ao pôr-do-Sol é um atractivo em si mesma.

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Debaixo da acácia — afinal, não há melhor sítio para furar os pneus.

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Ais-Ais Resort Felix Unite Provenance Camp

Fish-River Canyon Namíbia África do Sul

Oceano Atlântico

Cederberg range Gecko Creek

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Cederberg as montanhas do leopardo

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Felix Unite Provenance Camp

Felix Unite Provenance Camp

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Felix Unite Provenance Camp

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Momentos após a queda na Cederberg, à beira da estrada, onde o Ricardo aproveita para treinar as técnicas de primeiros socorros recém-aprendidas.

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Cederberg range Gecko Creek Oceano Atlântico

África do Sul

Hotel Southern Sun

Cidade do Cabo

Cabo da Boa Esperança

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Cabo onde começa áfrica

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Walvis Bay Solitaire Sesriem Soususvlei

Oceano Atlântico

Angola

Reserva natural Etosha

Namíbia

Windhoek

Fish-River Canyon Ais-Ais Orange

Cidade do Cabo Cabo da Boa Esperança

Ghanzi

Mount Ceder (Cederberg Range)

Chobe

Zâmbia Victoria Falls

Zimbabwe

Makgadikgadi

Kasane

Ntwetwe

Okavango Maun

Thakadu Bush Camp Bostwana

África do Sul

Lesoto

Oceano Índico


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