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terapia

animal

Cachorros, gatos e outros bichos são usados para ajudar a tratar dores do corpo e da alma de quem está fragilizado n

por Ivonete Lucirio*

C

hegar em casa e encontrar um ser peludo, cheio de amor para dar, acenando o rabinho, ou se enroscando pelas pernas e ronronando, alivia o estresse do trânsito, do chefe chato, das contas que sobraram para pagar. A convivência entre homens e alguns bichos sempre foi próxima e prazerosa. Então, por que não usar essa amizade para tratar pacientes internados em hospitais, idosos, crianças e melhorar seu estado de ânimo? Essa é a proposta da zooterapia, ou Terapia Assistida por Animais (TAA). “Nela, o animal funciona como um objeto mediador no tratamento, ajudando a resgatar a afetividade, principalmente em grupos com restrição de comunicação, como aqueles formados por crianças e idosos”, explica Patrícia Bader, coordenadora do Serviço de Psicologia do Hospital São Luiz (SP). 78 | viva saúde

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Quanto mais a pessoa sentir empatia por animais, mais será beneficiada pela zooterapia. “Se ela tiver medo, será mais um motivo de estresse”, diz a veterinária Hannelore Fuchs, presidente da Associação Brasileira de Zooterapia. “Do contrário, eles acalmam e trazem a sensação de conforto”, completa Hannelore. O francês Jean-Yves Guachet, veterinário da Universidade de Toulouse (França), testou isso em 250 voluntários. Eles foram submetidos em diferentes momentos do dia a uma gravação de 30 minutos com o som de um gato ronronando. Todos relataram maior facilidade para dormir, sensação de bem-estar e serenidade.

* colaboraram? cristina almeida, editora da revista vivasaúde e jéssie panegassi, ESTAGIÁRIA

Dentro e fora dos hospitais

Existem basicamente duas formas de os animais entrarem no hospital. Uma delas é o paciente receber a visita de seu próprio cão ou gato de estimação. A outra é a presença periódica de animais especialmente treinados para interagir com pacientes. “Essas visitas devem ser autorizadas pelo médico e o animal deve vir com um atestado do veterinário”, conta Melina Blanco Amarins, psicóloga do Hospital Israelita Albert Einstein (SP), que libera a entrada dos amigos de quatro patas em suas dependências. As experiências bem-sucedidas com animais não se restringem aos quartos de hospital. As visitas podem ser feitas também a asilos e creches. Um projeto realizado pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (USP) leva principalmente cães — de longe o aniwww.revistavivasaude.com.br

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mal preferido pelos zooterapeutas — para relacionar-se com idosos do asilo São Vicente de Paula, em Pirassununga (SP). Entre os cães estão labradores, golden retrievers, bassê e vira-latas. As visitas, que começaram em 2006, são feitas a cada 15 dias, e os responsáveis garantem que aumentou a capacidade de comunicação entre os idosos. Além dos companheiros caninos, os pesquisadores instalaram no asilo também um aquário, e os moradores ficam responsáveis por tomar conta dos peixes, alimentá-los, mantendo o ambiente limpo. Os cães já foram usados até no tratamento de crianças que sofreram violência familiar. O projeto aconteceu em 2003 na cidade de Porto Alegre (RS). A iniciativa foi do 3º. Batalhão de Polícia do Exército Brasileiro, que oferecia seus cães para participarem de seções de terapia com crianças vítimas de maus-tratos. A ideia era reforçar os vínculos afetivos e ensinar as noções de cuidado e respeito que estavam abaladas no caso de crianças que sofriam violência dentro da própria casa, na faixa etária entre 2 e 12 anos de idade.

Os cães já foram usados até no tratamento de crianças que sofreram violência familiar

Principais benefícios

“Não há contraindicação para quadro de saúde algum”, garante Solange Martins Ferreira, psicóloga do Hospital Santa Catarina (SP), que estuda a implantação de um projeto com animais para 2012, em parceria com a ONG Innata (Instituto Nacional de Ações e Terapias Assistidas por Animais). Lá as indicações são várias. viva saúde | 79

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Terapia animal

Experiências bem-sucedidas com animais não se restringem aos quartos de hospital. As visitas podem ser feitas também a asilos e creches

“A principal é fortalecer o quadro emocional dos pacientes, principalmente em indivíduos com depressão”, diz Solange. “Está provado também que esse tipo de terapia aumenta a aderência do paciente ao tratamento, causa uma melhora na postura e uma diminuição temporária da dor”, completa a médica Hannelore . “A diminuição da dor acontece principalmente porque, com a presença do bicho, o paciente tira o foco da doença e passa a enxergar outras coisas, ao menos durante a visitação.”

Sem falar que relaxa. Um estudo apresentado em maio de 2011, durante a reunião anual da Sociedade Americana Roentgen Ray, mostrou que pessoas que vão passar por um exame de ressonância magnética ficam menos tensas com a presença de cães. Esse exame costuma deixar os pacientes aflitos porque têm de permanecer dentro de uma máquina, imóveis, por vários minutos, ouvindo um barulho alto e constante. Terror para quem tem claustrofobia ou qualquer outro tipo de fobia. Há pesquisas que demonstram que 15% dos pacientes não conseguem chegar ao final desse exame. Depois de ter passado por essa tortura, o pesquisador Allison Ruchan desenhou o experimento. Vinte e oito pacientes interagiram com um cão por um período que variou de 15 a 30 minutos antes de entrar na sala de exame. O grau de ansiedade mostrou-se muito mais baixo e, no final, todos os participantes puderam concluir o exame.

Pilates em quatro patas

Os animais de pequeno porte, como cachorros e pássaros, proporcionam uma melhora nos quadros do ponto de vista emocional e psicológico. Já os cavalos são usados com o fim de alcançar benefícios físicos, psíquicos, educacionais e sociais para pessoas com deficiências físicas, mentais ou necessidades especiais. Na equoterapia, nome dessa prática, o uso do cavalo abrange uma série de técnicas reeducativas que agem para superar danos sensoriais, motores, cognitivos e comportamentais, por meio de uma atividade lúdico desportiva. Manter o equilíbrio sobre o cavalo exige a participação do corpo inteiro e envolve força, tônus muscular, flexibilidade e relaxamento. “É um pilates com a ajuda do animal”, compara a veterinária Hannelore . O desenvolvimento físico é o principal ganho, mas não se devem menosprezar também os benefícios psicológicos. “Como fica mais alta, a criança ganha uma nova visão de mundo e também a noção de responsabilidade sobre o outro”, finaliza a especialista. Grandes ou pequenos, os animais são parceiros do homem, na saúde ou na doença.

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Para cada bicho, uma indicação

Os benefícios do convívio com os bichos estão mais ligados à interação com eles, e também ao preparo que eles recebem para executar esse tipo de função, bem como do perfil racial de cada espécie. Veja os animais mais recomendados para a zooterapia:

Cavalos: indicados nos casos de paralisia cerebral, síndromes de Down e West, autismo, hiperatividade, acidentes traumáticos e doenças locomotoras. “Eles apresentam uma habilidade única, no trote, de estimular a andadura humana”, afirma a médica veterinária Ceres Berger Faraco, professora especializada em psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Isso faz com que o paciente, mesmo estando acomodado, movimente a sua perna e o quadril, como se estivesse andando. Assim, o movimento promovido pelo cavalo estimula o cérebro, fortalece a musculatura e, ainda, aprimora a coordenação motora, a concentração e a reflexão, bem como a postura, o equilíbrio e a flexibilidade.

Cachorros: O uso dos cães é ideal para crianças e adolescentes com transtornos psicomotores e de humor. Além disso, pesquisas científicas evidenciam que há redução dos níveis de ansiedade em pacientes hospitalizados com vários tipos de doenças psiquiátricas. Ceres explica que eles são um estímulo para os jogos e brincadeiras, e incitam a participação das pessoas. “O cachorro é um agente estimulador para a vida”, complementa a veterinária.

Gatos: Os gatos podem ajudar muito com pessoas depressivas e introspectivas, especialmente por meio do toque. Às vezes, também são recomendados para pacientes com pouca mobilidade, em razão do modo como se movem. “Já tive gatos terapeutas que ajudaram no trabalho com crianças vítimas de abuso sexual e, por isso, tinham dificuldade de toque, e superaram suas dificuldades através do trabalho com os gatos”, finaliza Ceres.

cidadão, www.caocidadao.com.br / fotos: shutterstock

consultoria: tatiane ichitani, coordenadora do projeto cão

Seu animal pode ser um “terapeuta”? As espécies que mais se adaptam a esse tipo de trabalho são os cães, os gatos, os coelhos, e até os porquinhos- daÍndia podem participar. Porém, répteis como iguanas, cobras e tartarugas não são considerados adequados pelo alto risco de zoonose, infecção transmissível dos animais para os homens. No caso dos cães, as características necessárias são: serem dóceis, confiantes, gostar de dar e receber carinho, ter relacionamento forte e positivo com seus donos, além da capacidade de obediência a comandos. Centros especializados avaliam e também auxiliam no treinamento

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e nas primeiras visitas. Não há restrição de raças, e os cães devem ter mais de 2 anos de idade, ser vacinados, vermifugados e preferencialmente castrados. Adaptar-se às novas situações como transitar por entre cadeiras de roda, andadores etc. também é desejável. Na maioria das vezes, o trabalho com os animais terapeutas são realizados em residências para idosos, hospitais, centros psiquiátricos ou de saúde mental e pediátricos, além de cuidados paliativos. O comprometimento do dono é essencial, pois, em geral, trata-se de um trabalho de voluntariado.

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