Turma AG 2.ยบ
2012/ 2013
Sandinó e o corá
Sandinó era um coelhinho bravo;
muito
marau, rabino espertinho, orgulho do pai e da mãe, uma coelha idosa daquelas redondezas. Curioso como eu nunca vi, este Sandinó! Pois a sua grande tentação era meter-se na aldeia dos Mandingas, ficar uma das raças da Guiné, e deixar-se ficar lá e aprender com eles muitas coisas,
que
o
punham
maravilhado.
Vinha,
depois, todo lampeiro, imitá-los para a sua aldeia. E os outros coelhos e lebres e até os lebrões ficavam espantados com a sabedoria do rabino Sandinó. Sandinó tinha um grande desejo.
Ora certo dia conseguiu falar com o Coelho da
aldeia
dos
mandingas
e
levou-lhe
frutos
saborosos. Espertalhão este coelhinho bravo. E já vão ver porquê. «Fico-te Coelho
muito
agradecido»,
mandinga.
«Mas
disse-lhe
também
o
quero
oferecer-te uma prenda. Lembra-te de qualquer coisa que te agrade na aldeia.» O Sandinó não precisava de pensar um minuto. Nem um minuto sequer. Há muito que, pacientemente juntava pauzinhos para fazer um
corá com o qual desejaria passar o dia inteiro a tocar modinhas que ele aprendera com os Mandingas.
Mas
até
agora
não
conseguira
nenhuma corda apropriada e o instrumento assim não tinha préstimo nenhum. Todos os fios rebentavam quando se punha a afinar o seu
corá.
E
vinha
mandinga
precisamente
oferecer-lhe
agora
uma
coisa
o
Coelho que
lhe
agradasse. Ah, pudesse o Coelho mandinga arranjar-lhe o que tanto ambicionava! Pudesse ele, e o Sandinó seria o bicho mais feliz daquelas redondezas. Mas experimentar não ofende ninguém. E, sabia-se lá, às vezes dava resultado. «Olha», respondeu o Sandinó, «eu gostava era de ver o corá que o teu patrão toca nos dias de festa. Pode ser?»
«Pois claro que pode. Se quiseres até to ofereço». Sandinó olhou-o deslumbrado. «Ofereces-me o corá?» «Ofereço-to, sim senhor. Vinhas de noite e levava-lo. Até me fazia jeito porque não suporto mais
esse
barulhento
corá. Então, quando
chega o Ano-Novo, fazes lá ideia Sandinó, o meu patrão está oito dias a fio a tocar e não me deixa dormir. Não aguento mais.»
Nesse momento, o Coelho mandinga levou o Sandinó até junto da casinha do dono. Lá estava o cobiçado instrumento dependurado na palhota!
«Então logo espero-te», disse o Coelho. «Vou já roer a corda que segura o corá para tu o tirares, sem dificuldade e não seres apanhado de surpresa».
«Mas vê lá se te sucede mal por isso. Eu só queria vê-lo…» Assim
disse
o
Sandinó,
a
fazer-se
desinteressado. Só a fazer-se desinteressado, o matreiro. Ele morria de impaciência por ter aquele instrumentozinho na sua mão. Mas ia tentando disfarçar, que outro não era o seu propósito. «Vê lá se te sucede mal por isso. Eu só queria vê-lo… mas se tanto insistes, sempre virei à noitinha. Não me custa nada. As noites estão tão bonitas.» Até casa, o Sandinó pulou e dançou de contente. Depois contou a aventura ao seu irmãozito e à noite foram os dois em busca do
corá do Mandinga.
O Coelho quando entregou o instrumento ao Sandinó disse-lhe: «Só quero recomendar-te uma coisa. Se vires o Lobo-Lobão foge dele, Sandinó» «O lobo?» «Sim. Foge do Lobo-Lobão.» «Porquê?» «Porque o Lobo-Lobão anda de noite e de dia, de cá para lá, de lá, para cá, metido na floresta, à procura do corá.»
Daí em diante, o ladino Sandinó nunca mais teve parança em casa. Mal nascia o Sol, mal o sol rompia na floresta, fugia para o mato e lá se deixava ficar o dia inteiro. De inverno, de verão, em qualquer época do ano, lançando na floresta sons que lembravam frutos e flores e amor. Ah, que maravilhoso corá!
Ora,
numa
bela
manhã,
apareceu
o
compadre Lobo, muito sorrateiro, naturalmente atraído pela música do corá.
«Olá,
seu
mata-bicho»,
riu
o
Lobo,
esfregando as mãos de contente. «Então o que faz por aqui o meu compadre Sandinó?» «Estou
a guardar
as
peles»,
respondeu
manhosamente, o Sandinó. O compadre Lobo cheirou-lhe a petisco. «Mas são peles de bicho grande?» indagou a crescer-lhe água na boca. O Sandinó espiava-lhe aqueles olhos gulosos e os dentes muito afiados. Meu querido corá !
«Não», respondeu Sandinó. «Agora peles de bicho grande! Umas pobres peles de lobo que o meu pai pôs a secar ao sol», continuou o Sandinó a desorientar esse compadre manhoso, ao mesmo tempo que se preparava para se raspar com o seu corá. «Como é que o teu pai arranjou essas peles?», perguntou-lhe o Lobo, a medir aquele corpinho tenro. O Sandinó via-se perdido. O lobo ia matá-lo e roubar-lhe o seu querido corá. Via-lhe nos olhos, nos dentes descobertos. Como desembaraçarse de tal situação? De súbito ocorreu-lhe uma ideia. Fez-se valente, valentão. Morra homem fique fama.
Espetou a orelhita e fez menção de correr para o Lobo que, de tão surpreendido, se encolheu e hesitou. E mais surpreendido ficou, quando o ladino lhe gritou: «Com este chifre, fica sabendo, espeto a barriga do Lobo-Lobão comilão e vai para a cova no caixão!»
O Lobo recuou uns passos a ver bem até onde ia a ousadia do Sandinó. Foi o bastante para que Sandinó, rabino, ladino, espertinho, pequenino, tivesse tempo de pegar no seu corá e fugisse.
Já lá de longe troçava do Lobo: «Lobo-Lobão comilão, julgas-te esperto e és um patetão!»
Este conto foi retirado das «Histórias tradicionais» Edição de 1988 da Editorial do ME A ideia de copiar a história (que não tinha imagens), surgiu após ter sido contada na turma que tem dois alunos guineenses (Aladje e Mustafa), e um deles, fez uma ilustração (1ª página), que foi aproveitada (adaptada), para ilustrar toda a história. Os dois alunos contribuíram para ajudar à melhor compreensão de alguns dos termos presentes na história, principalmente o significado de «corá» que é um instrumento musical similar à viola e que é pronunciado sem acentuação na língua dos alunos.