Revista CDM Digital #36

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ano 13 - edição 36

junho de 2015

revista corpo da matéria CURSO DE JORNALISMO PUCPR

Aldeia urbana A cerca de 40 km de Curitiba a tradição guarani sobrevive sob grandes influências externas


Corpo da matéria Ano 13 - Edição 36 - Junho de 2015 Revista Laboratório do Curso de Jornalismo PUCPR Pontifícia Universidade Católica do Paraná R. Imaculada Conceição, 1115 Prado Velho, Curitiba PR REITOR

Waldemiro Gremski DECANA DA ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES

Eliane C. Francisco Maffezzolli

COORDENADOR DO CURSO DE JORNALISMO

Julius Nunes

COORDENADOR EDITORIAL

Julius Nunes

COORDENADOR DE REDAÇÃO/JORNALISTA RESPONSÁVEL

Paulo Camargo (DRT-PR 2569)

COORDENADOR DE PROJETO GRÁFICO

Rafael Andrade MONITORIA

Carolina Mildemberger Alunos - 6º Período Jornalismo PUCPR Amanda Lopes Ribeiro, Andressa Paola Elesbao, Crislaine Franco da Rocha, Debora Helena Dutra Ferreira, Eduardo Manoel Nogueira Soares de Souza, Evelise Kruger Muncinelli, Everton Luis Almeida de Lima, Fernanda Bertonha, Franceslly dos Santos Catozzo, Geane Godois Leite, Giovanna Kasezmark dos Santos, Glaucia Inocência Périco, Isabel Maria dos Santos, Isabella Santos Lanave, Jaderson de Almeida Policante, Jeslayne Magalhães Valente, Leonardo Ferreira Fonseca de Siqueira, Manuella Costa PIres, Marcio Luis Galan Junior, Monica dos Santos Seolim, Pedro Luiz de Almeida, Priscila Tobler Murr, Raphaela Pechini Viscardi, Renata Fernandes Valente, Thamiris Thibes Mottin, Thiago Miotto Vilas Bôas, Victor Hugo Mendes dos Santos, Victor Lucio Waiss

Imagem de capa: Isabella Santos Lanave - 6ºP Jornalismo

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COMPORTAMENTO

Entre a tecnologia e as tradições

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CIDADES

12 Caminho que restringe a liberdade 22 Teatro uma transformação 24 Dia Mundial da Água 26 Vai ou racha? 28 A Herança quilombola

MEIO AMBIENTE

Do lixo às flores

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COMPORTAMENTO

Ser ou não ser curitibano?

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Entre a tecnologia

e as tradições O mundo guarani em Piraquara. Histórias sobre as visitas na aldeia Araçai contam como os jovens índios estão se adaptando às influências externas e, ao mesmo tempo, preservando sua cultura

Texto: Manuella Costa Pires Fotos: Isabella Lanave Diagramação: Thiago Vilas Boas Edição: Isabella Lanave e Thiago Vilas Boas

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ão muito distante de Curitiba existe uma aldeia guarani, onde vivem cerca de 90 índios oriundos do interior do Paraná. Karai Tataendy Marangaju, o Marcolino da Silva, é o grande responsável pela migração da tribo há 15 anos. Karai, que por muito tempo se manteve como cacique da aldeia, passou a responsabilidade para seu filho Wera Kangua Ju, o Laércio da Silva, há aproximadamente dois anos. Segundo Laércio, não porque ele é o filho do cacique, mas sim porque “dos homens da aldeia, ele julgou que eu fosse o mais

Os jovens

preparado”.

ce a realidade indígena. “Dizer que eles não podem ir para a cidade estudar, não podem usar um boné bonitinho, não podem usar um tênis bacana, você está querendo que não ocorra esse processo de transfiguração que já tem mais de 500 anos. E você vai interromper isso como?”, argumenta o professor.

O pai do cacique trabalha na secretaria da escola da aldeia, Mbyá Arandu: Sabedoria Guarani, fundada há 13 anos pelo Colégio Bom Jesus. Lugar onde as crianças têm o primeiro contato com a língua portuguesa, além de manterem aulas também em guarani. A estrutura da escola é precária: construção de madeira com duas salas de aula, uma pequena cozinha, computadores antigos e uma secretaria, construção provisória que já dura 13 anos esperando o projeto final.

“Desde o primeiro contato com o homem branco, o índio desejou ter algumas coisas que ele viu. Como é normal em nós também, ver uma sociedade diferente e querer alguma coisa que você ache importante ou ache interessante”, afirma Vargas. Nos dias atuais cabelos pintados, bonés de aba reta, tênis de marca, smartphones conectados a jogos e redes sociais fazem parte do cenário da aldeia araçai. O processo de transfiguração do índio recebe constantemente críticas de quem não conhe-

Segundo o professor mais antigo da Mbyá Arandú, Fernando Vargas, 28 anos, juruá

Para o cacique da aldeia, a televisão é um reflexo muito negativo da sociedade, principalmente para as crianças e adolescentes, os que mais assistem. Entretanto, “seria uma imposição ir de casa em casa e dizer que eles não podem ver”, comenta Wera. Assim como aconteceu com a senha do Wi-Fi da escola,

(“não índio” na língua guarani), a escola está um pouco melhor agora. “Antes o chão era de terra e os alunos do Ensino de Jovens e Adultos (EJA) tinham aula em uma estrutura de sapê e barro, improvisada na frente da escola.” Hoje, as aulas do EJA acontecem em outro espaço, construído recentemente pela própria comunidade indígena e com o auxílio dos professores.

a qual hoje quase todos possuem. “A gente tem que falar a realidade: assim, nossa cultura vai se perdendo. Mas é impossível entender a cabeça dos adolescentes daqui. Tudo é novidade para eles, é um mundo diferente. A gente nunca sabe se o próximo jovem que sair daqui vai se interessar em voltar e valorizar o que viveu anteriormente, como eu fiz”, desabafa o cacique.

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Laércio da Silva, Wera Kangua Ju

“Mas o que vocês estão fazendo aqui?”, pergunta Laércio, que se sente intimidado pelo fato de não saber da nossa reportagem na aldeia. Explicamos que somos estudantes de Jornalismo e já tínhamos falado com o senhor Marcolino, que autorizou as nossas entrevistas e fotografias. Depois de tudo acertado, o cacique de 26 anos começa a se sentir mais à vontade. De olhar tímido, Laércio é o único que saiu da Aldeia Araçai para fazer faculdade. Ficou um ano estudando Ciências Sociais na Universidade Federal do Paraná, mas o deslocamento diário de duas horas para ir, mais duas para voltar, foi desgastante. Laércio não aguentou viver longe do seu povo. Voltou para a calmaria da aldeia, como ele próprio afirma, e hoje acumula diversas funções, cuida de toda a papelada, vai ao fórum, à prefeitura, à Secretária de Educação e a todos os lugares onde algum problema tenha que ser resolvido. Quando morava em Guarapuava, durante o ensino médio, teve contato com antropólogos e professores que, segundo Laércio, o ajudaram a ver de fora e a entender a importância que a cultura tem no todo. E o conselho que ele tem para os jovens hoje é esse: “Valorizar a sua própria cultura, vendo do alto!”. Ao falar sobre a gravidez de sua mulher, um sorriso se estampa no rosto do início ao fim. Para ele, o conhecimento do índio vem sempre das crianças, que representam o futuro da geração, da aldeia e do mundo. E, pelo fato de ser tão novo e já cacique, ele tem muita confiança nas próximas jovens lideranças.

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Os jovens– parte 02 Existem sete jovens da aldeia Araçai que vão todos os dias até o Colégio Estadual Mário Braga, em Piraquara, com um transporte oferecido pela prefeitura da cidade, para concluir o ensino médio. Segundo o professor Fernando Vargas, continuam recebendo um acompanhamento da escola Mbyá Arandú. “A gente dá todo o apoio. Eles podem fazer as tarefas aqui, usar a internet da escola. Qualquer coisa que acontece lá, a gente fica sabendo aqui.” Em um dos dias em que fomos visitar a aldeia, duas jovens chegaram à escola da tribo com um bilhete do Colégio Mário Braga. Elas cumprimentaram o professor e, numa breve interação, já foi possível ver a forte relação entre professor e comunidade na prática. “Eles são muito tímidos. É difícil a criançada sair conversando. Há alunos que só agora, no terceiro ano do ensino médio, estão começando a fazer amizades com o povo não índio”, comentou Vargas, depois que as meninas foram embora.

A questão do nomadismo indígena ainda permanece na aldeia Araçai, principalmente com os jovens. “A gente tem um restinho de nomadismo e eu incentivo a piazada a viajar mesmo. Quer viajar, viaje, mas não pare de estudar”, afirma Vargas. Eliane Faustino, de 18 anos, Kerexu Miri, é um bom exemplo. Durante uma das conversas, ela comentou que iria se mudar da tribo na próxima semana. Quer ir para o litoral paulista, onde moram seus sogros. Kerexu estudou até a 4.ª série e parou os estudos aos 14 anos. Com 15, teve seu primeiro filho, que hoje tem 3 anos. Ela tem também um bebê de oito meses, Pará Popy (ou Rubiane, em português). Segundo a mãe, os filhos por enquanto só entendem guarani. “Eles aprendem o guarani em casa, o português só na escola. Na nova aldeia, não tem o EJA, eu não vou poder continuar meus estudos, mas eles vão poder começar a estudar na escola de lá”, comentou Kerexu.

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A cultura Quando se entra na aldeia, dois lugares chamam atenção: a Casa de Reza e uma imagem grande na parede do posto de saúde. Laércio (Wera Kangua Ju) conta a história da imagem: “Uma galera de Portugal veio aqui e projetou na parede do posto a foto da minha avó, Emília, que faleceu faz um ano. Aí todos da aldeia ajudaram a raspar a madeira para fazer essa arte”. Já na Casa de Reza, acontecem cerimônias todas as manhãs e tardes, regidas pelo senhor Marcolino (Karai Tataendy Marangaju). O professor Vargas acredita que o local, que funciona como uma espécie de templo, é uma das principais fontes de preservação da cultura indígena dentro das tribos. “Isso é fundamental para eles. Por isso, a nossa escola dedica uma aula por semana para a Casa de Reza. Então mesmo que as crianças já frequentem o local todos os dias, tem mais um dia da semana em que eles vão de novo no horário de aula”, completa o professor. Vargas também dá aula de ensino religioso na aldeia e utiliza esses encontros para mostrar outras religiões, mas sempre ressaltando a necessidade de preservar a religião deles. Ele disse que algumas pessoas têm uma visão superficial da questão indígena e não enxergam o que realmente se passa no dia a dia dos guaranis. “Ninguém de fora vê um pai saindo com o filho para pescar, uma menininha de 5 aninhos lavando a própria roupa, uma criança de 3, voltando 8

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com um saquinho cheio de peixes...”, afirma Vargas. O professor ainda contou que, depois da primeira menstruação, as meninas ficam reclusas por volta de uma semana e raspam o cabelo. “Porque o cabelo é uma questão de energia para os guaranis. Então, não adianta falar: ‘Ahh, eles pintaram o cabelo.’ Eles sabem o que

A tribo está localizada numa área de preservação ambiental, então o máximo que os índios residentes podem fazer é uma horta. Por isso, segundo Wera kangua Ju, o pessoal só come produtos orgânicos nas cerimônias religiosas grandes, nas quais eles recebem índios e alimentos de outras aldeias. Ele explica, também, em relação ao preparo dos alimentos: “Aqui tem fogão a gás, fogão à lenha, fogo de chão,

“A cerimônia para dar o nome da criança acontece mais ou menos um ano depois do nascimento. Um ancião entra em contato com o espírito da criança e o próprio espírito conta a ele o seu nome.” representa, eu acho que é isso que importa”, concluí. Ao contar sobre sua experiência pessoal de adaptação na tribo, o professor conta: “As

tudo depende do momento. Quando tá mais frio a gente faz fogo de chão e já aproveita para se esquentar também”.

pessoas não têm a paciência de tentar enxergar o tempo deles, que é bem mais calmo, bem tranquilo, com bem menos pressa”.

O cachimbo tradicional feito de nó de pinho também é preservado na aldeia. Para os guaranis, a fumaça tem o significado de purificação do espírito e do corpo. “Fumamos tabaco. Não é maconha, como muitos pensam. A gente só puxa a fumaça na boca e solta, não fuma igual cigarro, que vai até o pulmão, estraga, apodrece lá e volta; só pito pela boca mesmo. Claro que tem gente que já criou o hábito e pita sempre, mas quando usamos nas cerimônias, é com o significado da purificação”, conclui o cacique.

Já o cacique Wera Kangua Ju conta porque o nome indígena verdadeiro raramente aparece na certidão de nascimento. “A cerimônia para dar o nome da criança acontece mais ou menos um ano depois do nascimento. Um ancião, que seja o líder espiritual da aldeia — aqui é o meu pai — entra em contato com o espírito da criança e o próprio espírito conta a ele o seu nome.”

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“Não existe guarani ateu. Ele pode perder tudo, mas continua acreditando na nossa religião. Quando o índio perde isso, deixa de ser guarani.” Wera Kangua Ju, cacique da tribo Araçai, sobre a Casa de Reza.

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A HERANÇA QUILOMBOLA que o Paraná não conhece A antiga morada de escravos em Adrianópolis, na Região Metropolitana de Curitiba, hoje preserva um modo de vida muito diferente do observado nos grandes centros urbanos Texto e fotos por: Everton Lima

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“O

s homens são porcos que se ali-

mentam de ouro.” Napoleão Bonaparte definiu assim a relação do ser humano com o metal dourado. A “fome” pelo ouro costuma cobrar um preço alto, normalmente pago com vidas e embebido de suor e sangue inocente. Nem todos os escravos que trabalhavam nas minas de ouro em Apiaí (SP), até o século XVIII, estavam dispostos a se sacrificar. Mesmo sabendo que o castigo para o “escravo fujão” era o tronco, eles estavam dispostos a arriscar. Para quem havia sido raptado de sua terra natal, ser forte não era opção, mas sim obrigação. Lançaram-se então rumo a uma longa jornada em busca da liberdade. O percurso pela mata fechada não era fácil. Enfrentar as águas fortes dos rios Pardo e Ribeira era o mesmo que desafiar a morte. Não fosse a amizade com os índios, talvez os negros não tivessem chegado ao seu destino. O minerador francês João Surá, que fazia o mesmo caminho dos escravos fugidos, almejando encontrar ouro e prata, não conseguiu alcançar seu objetivo de se tornar um homem rico. Morreu ao cair de uma cachoeira. Os

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escravos resolveram dar ao quilombo que os abrigaria em segurança o nome do mineiro branco. Nascia então o Quilombo João Surá. Com o passar dos anos, os moradores venceram os grileiros de terras até o descaso do governo com eles. Hoje a comunidade quilombola João Surá, localizada no município de Adrianópolis, Região Metropolitana de Curitiba, conta com orgulho as batalhas vencidas pelo seu povo. Para chegar até o local, a equipe da CDM levou quase dez horas de viagem, partindo da capital do estado. A única parte do trajeto asfaltado é a da BR-476, o resto do percurso é feito por estradas de terra, que, em diversos pontos, obrigam o motorista a não passar de 20km/h. A paisagem mescla trechos preservados de Mata Atlântica com plantações de pinus, que segundo o morador da cidade, Edson Souza, 43 anos, suga toda a água dos córregos menores. “Aqui era cheio de córgos (sic), mas os pinus acabam com tudo. As empresas de reflorestamento compraram quase tudo aqui”, conta Edson lamentando a mudança na paisagem.


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A comunidade João Surá fica a 22 quilômetros do perímetro urbano de Adrinanópolis.

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“Nunca tive vontade de ir embora daqui. Minha família toda, nasceu e morreu nessas terras.” Joana de Andrade, aposentada

Os herdeiros dos cativos A aposentada Joana de Andrade, 79 anos, recebe a equipe da revista com desconfiança. Nascida e criada na região, “nunca teve vontade de deixar o local”. Católica praticante, ela fala das romarias feitas para São Gonçalo, costume antigo que vem se perdendo, em parte por falta de interesse dos moradores mais novos da localidade. Os quase 140 moradores de João Surá são, em

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grande parte, maiores de 30 anos. Os mais jovens costumam ir embora para trabalhar. Mas não dona Joana. “Nunca tive vontade de ir embora daqui. Minha família toda nasceu e morreu nessas terras”. Dona Clarinda, 62 anos, diz que a qualidade da estrada impossibilita o trajeto de alguém que queira trabalhar no centro de Adrianópolis e viver na comunidade quilombola. Para chegar à parte urbana da cidade é preciso percorrer 22 quilômetros em estrada de terra.


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Silvestre de Castro, o ancião de João Surá Seu Silvestre é o morador mais antigo do local. Com mais de 90 anos ele vive em uma casa ainda mais antiga, que possui em seu telhado algumas telhas feitas “nas coxas” dos escravos. As relíquias que sua morada guarda, como, por exemplo, um rádio com mais de 50 anos, são motivo de orgulho. Dono de uma fala tranquila e gargalhada contagiante, o patriarca de quatro gerações reclama de algumas atividades que os mais jovens mantêm, como ver tevê. “Eu assisto mais à missa. A televisão tem tanta porcaria, tem coisa boa, mas tem coisa que não vale nada”, opina.

Vizinho de uma capela com mais de 40 anos ele não se envaidece por isso. Deixa claro que “a igreja é do povo”. Ao relembrar da juventude, mostra o local da casa onde eram realizados bailes, que, segundo ele, “eram algo fantástico”. Ele argumenta que sua geração “tinha mais respeito”. “Os moços tão tomando uma pinguinha e, ás vezes, por qualquer coisa, saem no tapa”, conta em meio à risadas. Sobre sua origem quilombola, ele brinca: “Aqui nós somos todos quilombolista (SIC)” e acha estranho algumas pessoas que não reivindicam a ascendência escrava. “Têm uns vizinhos aqui, que são descendentes de escravos e não querem ser quilombolas”, revela.

“Têm uns vizinhos aqui, que são descendentes de escravos e não querem ser quilombolas.” Silvestre de Castro, aposentado

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“O isolamento e a falta de lazer pro jovem faz com que ele saia da comunidade.” Cassiano Matos, secretária

“Os jovens têm a obrigação de preservar as conquistas dos antigos.” Gislaine Pereira, estudante

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A volta da filha pródiga

A jovem quilombola

Cassiane Matos, 35 anos, foi embora do vilarejo ainda jovem. Foi trabalhar em Curitiba. Viveu na capital do estado por muitos anos, tinha casa própria e trabalho, mas quando a filha nasceu começou a analisar se a cidade

Gislaine Neves Galvão Pereira, de 16 anos, não costuma ir ao shopping. Diferentemente dos adolescentes da sua idade, não está olhando o celular o tempo todo. Pelo contrário, na internet tem apenas um endereço de e-mail

grande seria o melhor lugar para cria-la. “Aqui a liberdade é outra. Lá na cidade, se vive preso, a vida é corrida”, comenta.

que não costuma checar com frequência. Mas engana-se quem imagina que a jovem está indiferente com o que acontece no mundo. Pelo contrário: ela usa a informação para lutar pela sua cultura.

Trabalhando como secretária da escola da comunidade, Cassiane confessa que também pensou em ajudar a localidade onde nascera. “Havia aquela vontade de lutar pelo lugar, de vê-lo se desenvolver. Se as pessoas continuassem saindo, isso iria desmotivar o desenvolvimento”, esclarece. Sobre a fuga dos mais jovens da vila quilombola, ela diz que “o isolamento e a falta de lazer” voltado para essa faixa etária contribui. Sendo as celebrações religiosas o principal evento do local, Cassiane reconhece que mudanças foram necessárias para atrair os mais novos. “Chegava na igreja só dava gente idosa. Não tinha gente nova, aquilo se tornava cansativo. Muita coisa mudou. Antigamente, a missa ainda era em latim”, explica. Antigos manuscritos contendo ladainhas cantadas nas romarias estavam se perdendo. Agora, já foram digitalizados e Cassiane tenta mostrar para os adolescentes a importância da preservação da cultura.

Cursando o ensino médio no Colégio Estadual Quilombola Diogo Ramos (Diogo Ramos foi um importante professor que alfabetizou adultos na região), sua formação tem ênfase na história e na cultura negras. Atualmente, o colégio tem 24 alunos, 15, no ensino médio e nove, no fundamental. A educação é a principal ferramenta da jovem e é pela educação que ela acredita que o comportamento racista pode ser vencido. “A pessoa racista deve voltar para a escola. Eu não entendo por que uma pessoa pensa assim. Todas as pessoas são filhos de Deus”, esclarece. Gislaine sonha em fazer faculdade e voltar para a comunidade para ajudar a fortalecer o local. “Os jovens têm a obrigação de preservar as conquistas dos antigos”. Orgulhosa das origens do seu povo, resume em uma frase a importância da cultura regional: “Não pode acabar”.

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Desenvolvimento e preservação O mestre em Tecnologia, pela Universidade Tecnológica do Paraná (UTFPR) Paulo Renato Dias desenvolveu uma pesquisa histórica sobre a comunidade João Surá. Ao mesmo tempo em que concorda que o desenvolvimento econômico na região pode prejudicar a comunidade, ele relembra que essas pessoas, descendentes de escravos, já venceram muitos problemas. “O modelo econômico vigente não leva em conta a cultura e o conhecimento das comunidades, que, para muitos, deve ser aniquilado. Mas, o mais importante é que, mesmo assim, João Surá está lá há mais de 200 anos”, conclui o professor. Sua opinião pode ser ilustrada por um poema escrito por “Negro Olegário”, que chefiou um grupo com 50 soldados camponeses durante a Guerra do Contestado (leia a poesia abaixo).

“Sô iguar a pica- pau Que quarqué madera fura Sô nas carta o Rei d’Espada Desaforo não atura Sô quinem toro de briga Por nadinha armo turra, Nego bão da minha raça Não tem chão que se apura” Três gerações de quilombolas: Antônio Andrade, 67 anos, o filho Mizael, 33 anos, e o neto, Cauã, 5 anos. Jornalismo PUCPR Revista CDM

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Caminho que restringe a liberdade Uma das rampas, no centro da cidade, totalmente inacessível. Foto: Mônica Seolim. Acessibilidade ainda é um problema enfrentado por cadeirantes na região central de Araucária. Fernanda Bertonha e Mônica Seolim

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ocomover-se pelos principais pontos do centro de uma cidade como Araucária, na Região Metropolitana de Curitiba, parece algo simples. Mas, infelizmente, essa não é a realidade de Geferson Santos Silva, um jovem

meio do caminho”, conta.

de 25 anos que se tornou paraplégico há dois anos, após sofrer um acidente. Desde então, ele depende da cadeira de rodas.

que dificulta ainda mais a locomoção. “Eu não tenho autonomia, porque para fazer qualquer coisa, ir a qualquer lugar, preciso de alguém comigo, nunca tenho total liberdade”, desabafa Geferson.

Geferson é estudante do Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos (Ceebja), que fica no centro de Araucária. Por morar em um bairro mais afastado, ele reclama das dificuldades para chegar ao local das aulas. “Parece que as ruas até tentam oferecer acessibilidade, mas não da forma correta. Praticamente não há calçadas, onde tem, estão cheias de buracos ou com postes e placas bem no 22

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O jovem faz questão de ressaltar que, além das rampas serem insuficientes no centro de Araucária, a maior parte das calçadas é de paralelepípedo, vários deles fora do lugar, o

E por morar a cerca de quatro quilômetros do Ceebja, o jovem precisa que alguém o leve de carro ou o acompanhe de ônibus. “No trajeto que vai da minha casa ao ponto de ônibus, não tem calçada, eu preciso ir pela rua. Quando chego ao ponto, tem que ter alguém para


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“Preciso de alguém comigo, nunca tenho total liberdade.“ Geferson Santos, cadeirante

me colocar dentro do ônibus, porque a maioria deles não tem o elevador de acesso, ou não está funcionando.” Geferson afirma que esses problemas de estrutura da cidade dificultam ainda mais o processo de adaptação dele a essa limitação imposta pela cadeira. Uma das professoras de Geferson, Marlene Grendel, diz que ele é um bom aluno, mas que os problemas que enfrenta para se locomover podem prejudicar o seu rendimento. “Eu fico boquiaberta com essa situação. É inadmissível que algo assim aconteça, ele sempre depende de alguém para chegar até a escola e isso pode interferir negativamente no procedimento de aprendizagem”, explica Marlene. O engenheiro civil e Secretário Municipal de Urbanismo de Araucária, Elias Kasecker, diz que a falta de acessibilidade não é um problema exclusivo do município e nem cabe apenas ao poder público. “De acordo com a legislação, cada um é responsável pela frente da sua propriedade, então, cada pessoa tem a obrigação de cuidar da calçada que corresponde ao seu imóvel”, esclarece. Kasecker diz ainda que as regiões mais novas da cidade, que começaram a ser construídas a partir do ano 2000 (o que não é o caso do Centro), já foram estruturadas para atender às necessidades de locomoção de todos: cadeirantes, idosos e pessoas com carrinho de bebê. “Infelizmente, algumas ruas de Araucária são muito antigas e estão com problemas, principalmente na região central. Estamos estu-

A dificuldade de locomoção é diária. Foto: Mônica Seolim. dando a possibilidade de executar um projeto de urbanização, para pavimentar as calçadas e trazer outras melhorias, mas os recursos estão escassos”, justifica o secretário. A Rua Carlos Cavalcanti, que faz parte do trajeto diário de Geferson, é uma das que mais apresentam problemas e, ao mesmo tempo, é onde se concentra boa parte do comércio. Kasecker diz que a Secretaria de Urbanismo pretende dar prioridade a ela quando for possível iniciar uma espécie de revitalização. “Alargar as calçadas, mesmo que seja preciso deixar a rua mais estreita é algo que precisamos fazer. Não pensando apenas em quem tem necessidades especiais, mas em todos os cidadãos. A calçada é do pedestre”, conclui. Embora existam projetos de urbanização, não há previsão de quando eles devam ser executados. Jornalismo PUCPR Revista CDM

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Teatro uma transformação Alunos da Apae de Fazenda Rio Grande aprendem com o teatro lições para a vida Amanda Ribeiro, Crislaine Franco e Jeslayne Valente crédito: Jeslayne Valente

Alunos da Apae têm tarde de ensaio para desenvolver as atividades práticas durante as aulas.

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teatro desenvolve habilidades tanto físicas quanto mentais, é a arte do autoconhecimento, na qual as pessoas expandem

com pessoas especiais no teatro, então estamos pegando os métodos e disseminando, para ver o que cabe melhor para esse grupo. Então

a percepção, comunicação, sensibilidade com o próprio corpo e com o mundo a sua volta. Uma iniciativa desenvolvida pela professora de teatro Loara Gonçalves, por meio da lei de incentivo cultural e inclusão social do Ministério da Cultura, promove aulas para alunos da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Fazenda Rio Grande.

fazemos um trabalho de reconhecimento, verificando o que eles gostam de fazer, como eles encaram o teatro”, afirma Loara.

Aulas Os alunos aprendem na prática a criação de personagens, como lidar com o outro e com situações cotidianas. “Nós nunca trabalhamos 24

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Para a psicóloga Anna Caroline Moreschi, o trabalho desenvolvido em conjunto com profissionais de teatro e a instituição, colabora para que cada aluno possa se desenvolver individualmente e, principalmente, em grupo. “O teatro auxilia no desenvolvimento psíquico, exige sempre um pouco mais da criatividade, raciocínio, desenvolvimento motor, da personalidade, convívio social”, esclarece.


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Segundo Loara, as transformações acontecem pouco a pouco: “As mudanças são positivas, eles começam a se movimentar de outra forma, a olhar para o outro de uma maneira mais humana, visto que, hoje em dia não temos nem mais tempo de olhar para quem está ao nosso lado”, constata. Os métodos de ensino são semelhantes aos convencionais, porém adaptáveis. Especialistas da Apae selecionam os alunos que, podem

ensaiávamos os alunos durante dois meses em sala de aula, o que atrapalhava o andamento da grade curricular, agora o espetáculo será ensaiado durante o ano todo, no período da tarde, por um profissional da área teatral, isso é muito gratificante”, conta. De acordo com a pedagoga, Marcela Ciocato, anteriormente isso ficava muito caro para a

“Hoje em dia nao temos mais tempo de olhar para quem está

participar das aulas de acordo com as limitações de cada um, no total são 180 alunos na instituição, mas apenas 30 fazem parte do grupo. “Dentro do teatro nós sempre trabalhamos com diferenças, no caso da Apae nós vamos descobrir o que cada um tem para apresentar a sua maneira”, observa Lucas Buzato, assistente de direção do grupo de teatro.

ao nosso lado.” Loara Gonçalves, professora de teatro da Apae.

História São 18 anos que a Apae, com a ajuda de pais de alunos, promove um auto de Natal para a comunidade, mas é a primeira vez que o espetáculo será dirigido por Loara: “Será um desafio para nós, porque é uma realidade distante da nossa, é um projeto pioneiro, a gente vai testando e vendo o que funciona melhor com eles”. Segundo a pedagoga e vice-diretora da Apae, Nilce Salete Pereira, antes da chegada do incentivo cultural a mostra era administrada pelos próprios professores durante as aulas: “Nos

instituição e para os pais: “Nós pagávamos do nosso bolso a alimentação, os figurinos, o transporte dos alunos e, isso era inviável, seria muito importante se o incentivo viesse do governo e, não por meio de projetos culturais”. Para Nilce Pereira, a participação da filha Bruna Pereira no projeto gera o envolvimento em atividades com as quais ela não era habituada. “Ela gosta de participar do teatro, música e dança. Até agora não era possível oferecer essas atividades para os alunos”, confessa. Renata Bueno e Itacir Soares Silva, alunos da instituição, contam que fazem parte do grupo de teatro e querem continuar a desenvolver as atividades que aprendem nas aulas. “Gostamos de dançar e cantar no musical de Natal e queremos participar cada vez mais do grupo de teatro”, afirmam.

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Dia Mundial da Água

Secretaria do meio ambiente dedica mês de março inteiro ao Dia Mundial da Água Leonardo Siqueira, Renata Valente e Thamiris Mottin

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Secretaria do Meio Ambiente do Município de Colombo dedicou o mês inteiro de março para a comemoração do Dia

foram seis colégios que receberam a capacitação, atingindo pouco mais de 1.400 alunos do ensino fundamental.

Mundial da Água. Em parceria com a Sanepar, levou até as escolas municipais discussões sobre o tema, por meio de palestras de capacitação e atividades ecopedagógicas. Ao todo,

A água é um recurso fundamental para a sobrevivência de todos os seres vivos, apesar de 71% da superfície da Terra ser coberto por Divulgação

Criancas participam de palestras e atividades ecopedagogicas no Dia Mundial da Água

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água. A água potável, que se encontra armazenada em lagos, rios e reservatórios subterrâneos, está estimada em 0,77%. Segundo o secretário do Meio Ambiente, Evandro Busato, a importância dessas ações para o município é principalmente a educação ambiental. Mesmo que os resultados positivos desse investimento

tal”, explica.

possam ser visíveis em um período de médio a longo prazo, é importante orientar a população e, assim, garantir a consciência da preservação do meio ambiente, “A prevenção passa pela educação ambiental, que é fundamental para a população, porque é através dela que podemos explicar a importância da água e do meio ambiente e, nesse caso, as nossas crianças que serão o nosso futuro. Elas precisam entender o que é preservação e, dessa forma, começarmos a minimizar o impacto ambien-

abordamos temas como a preservação do meio ambiente”, comenta, A coordenadora também conta que a educação ambiental auxilia não só as crianças como também os pais, já que toda a informação passada em sala de aula ou nas palestras pode ser repassada aos pais pelas próprias crianças, “Nós sentimos que as informações chegam até os pais e, dessa forma, se trabalharmos temas como esse com os pequenos, teremos um retorno positivo não só para esses alunos mais para todo o mundo.”

A coordenadora da Escola Municipal Santa Isabel, Marina Aparecida Mottin, garante que essas palestras são importantes para o desenvolvimento das aulas, “Elas ajudam a enriquecer as aulas de Ciências, nas quais nós

“A prevenção passa pela educação ambiental, que é fundamental para a população”

Divulgação

O Municipio de Colombo já possui um projeto em parceria com a Sanepar em desenvolvimento desde junho de 2013, o Projeto Cidadão Ambiental Mirim que tem como finalidade promover a conscientização desses alunos em relação a importância do cuidado e respeito ao meio ambiente e também informar a população os diferentes programas dessa área na cidade. A proposta cresceu e já possui várias turmas e a tendência é aumentar.

Prefeitura e Secretetaria Municipal do Municipio de Colombo comemoram o Dia Munidal da Agua

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Vai ou racha? Quase um ano depois das peças chegarem, obras de reconstrução do velódromo do Pan 2007 em Pinhais devem começar agora, em abril Eduardo Souza, Jaderson Policante, Marcio Galan

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Marcio Galan

m velódromo que serviu aos Jogos Pan-americanos do Rio de Janeiro em 2007

exigidos pelo Comitê Olímpico Internacional e pela União Ciclística Internacional. Assim,

está causando polêmica na terra das araucárias. Construído para os Jogos Pan-americanos do Rio de Janeiro em 2007, a pista, que até então era o único espaço coberto dedicado ao ciclismo de alto rendimento no país foi desmontada na cidade carioca e transferida para Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba.

com o respaldo do Ministério do Esporte, os organizadores da Rio-2016 anunciaram que um novo velódromo seria construído no Parque Olímpico da Barra da Tijuca, com o custo estimado em R$ 118 milhões.

O drama começou em 2012, quando a Prefeitura do Rio de Janeiro informou que o velódromo construído para o evento de nível continental em 2007 não cumpria os requisitos 28

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Para aproveitar a estrutura do velódromo construído para 2007, o Ministério do Esporte decidiu transferir a estrutura para outra cidade, com a intenção de preparar os atletas para as Olimpíadas. O destino escolhido teria sido Goiânia, mas seis meses depois de firmar


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acordo, a Secretaria de Esportes da cidade do Centro-Oeste desistiu da obra, alegando que a estrutura estava comprometida e que os custos para transportá-la e reconstruí-la seriam muito elevados. A partir de então, o Ministério do Esporte negociou a vinda da pista para Pinhais, que aceitou a proposta em 2013 e recebeu a estrutura em 2014. As vigas metálicas estão

alojadas no terreno onde será construído o velódromo. Apesar do aspecto desgastado das peças, a Secretaria de Cultura, esporte e Lazer de Pinhais considera que as peças estão em condições de uso, apresentando apenas alguns sinais de ferrugem que não comprometem as estruturas. Os demais materiais estão guardados em um barracão, cujo aluguel custa R$ 10 mil mensais ao município. Em junho de 2014, assaltantes invadiram o espaço e roubaram

A região em que o velódromo será erguido, existe um Centro da Juventude, uma praça pública e quatro escolas públicas

“Há dez anos, Curitiba tinha tudo para ter uma pista coberta para o autorrendimento, e não vingou;agora o projeto vem pra Pinhais, mas a grande maioria das pessoas quer contribuir para que este velódromo também não venha” - Adir Romeo, Presidente da FCP Jornalismo PUCPR Revista CDM

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alguns materiais, mas o prejuízo não passou de R$ 2.mil.

Os problemas

esta disposição de recursos, terá um velódromo remendado que será mais um imenso elefante branco”, pontua.

As vigas da estrutura do velódromo já chegaram ao município paranaense apresentando sinais de deterioração. Na época em que desistira do velódromo, o secretario de Esportes de

O velódromo custou cerca de R$ 14 milhões para o Rio em 2007. Para remontá-lo em Pinhais, o governo federal irá dispor R$ 25 milhões.

“A Prefeitura do Rio assinou de uma vez só, seis projetos para qualificação do ciclismo de pista, desde a formação até o profissional, de repente, ficamos sem nada e ficaremos quatro anos sem treinar” - Claudia Santos, Presidente da FECIERJ Goiânia, Paulo Sérgio Simão Júnior, chegou

Os benefícios

a dizer o velódromo do Pan seria um “presente de grego”, frisando que não seria possível aproveitar 15% do que viria do Rio de Janeiro. Outro motivo da desistência da capital goiana teria sido o elevado custo de manutenção, como confirma o presidente da Federação de Ciclismo do estado do Rio de Janeiro (FECIERJ), Cláudio Santos. “Quando assumi a instituição em 2009, a Prefeitura do Rio mantinha o velódromo, mas precisei gastar R$ 250 mil do próprio bolso para tornar seis projetos possíveis. Se Pinhais não puder contar com

O velódromo será, junto com a Olímpica do Rio de Janeiro, o único coberto do país. Projetos para o autorrendimento e formação dos ciclistas, além da utilização do espaço dentro do velódromo para atender a comunidade com outras atividades. Segundo o Presidente da Federação Paranaense de Ciclismo, o professor Adir Romeo, já existe um plano de ação da União Ciclística Internacional da Suíça para transformar o velódromo em um Centro de Treinamento Internacional, com o apoio do

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Ministério do Esporte. O professor ressalta que a construção do espaço contribuirá com o desenvolvimento da região. “Temos esse plano de ação da União Ciclística Internacional da Suíça para transformar o velódromo em um Centro de Treinamento Internacional. A consequência

pessoas quer contribuir para que este velódromo também não venha”, reclama.

O Rio espera Após a realização dos Jogos Pan-americanos no Rio em 2007, a FECIERJ só pôde utilizar a pista a partir de 2009. Após a implantação

As peças chegaram a Pinhais no início de 2014 e permanecem alojadas no terreno em que será construído o velódromo. O município considera que o desgaste visível das peças danificam apenas a tinta das peças e não comprometem as estruturas disso é um hotel, um restaurante, o crescimento do comércio. Romeu lembra que um projeto deste porte esteve próximo de chegar a Curitiba, mas o fato não se concretizou devido a divergências políticas. “Há dez anos, Curitiba tinha tudo para ter uma pista coberta para o autorrendimento, e não vingou;agora o projeto vem pra Pinhais, mas a grande maioria das

de projetos, inclusos os projetos de preparação para os atletas que participariam das Olímpiadas em 2016. Sem o velódromo, os atletas cariocas ficaram sem pistas para treinar para as Olimpíadas, como relata Cláudio Santos. “A Prefeitura do Rio assinou de uma vez só, seis projetos para qualificação do ciclismo de pista, desde a formação até o profissional, de Jornalismo PUCPR Revista CDM

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repente, ficamos sem nada e ficaremos quatro anos sem treinar.” O velódromo para 2016 será muito mais sofisticado do que o do Pan 2007, no entanto, Santos lembra que a nova casa não será o suficiente para cobrir o prejuízo com a demolição do velódromo que ficou cinco anos na cidade. “Jamais trocaria [o velódromo] pelos quatro anos de atraso que fomos presenteados, por conta da demolição e do ciclismo de pista carioca. Estamos nos arriscando nas ruas, dividindo espaço com veículos motorizados”, reforça.

habitantes. No mesmo terreno do velódromo, já há um campo de futebol –- que deverá ganhar arquibancada para cinco mil pessoas; uma quadra de tênis e um Centro da Juventude – um espaço que abriga pista de skate, quadra poliesportiva e teatro. A região foi escolhida por ter uma população jovem. O bairro tem dois colégios estaduais, dois municipais, duas creches e uma escola para alunos com deficiência. Por ter sido fundada antes da criação do município de Pinhais, o desenvolvimento da vila que sempre foi das mais populosas da

A desmontagem do velódromo no Rio se deu por estar fora das exigências da UCI, dentre elas o limite de65 km/hna pista, enquanto a Olímpica oferecerá condições para os atletas atingirem de 85 km/h a 110 m/h.

região é algo recente, posterior à emancipação.

O bairro A Vila Maria Antonieta é o segundo bairro maior bairro de Pinhais, com cerca de 30 mil

A licitação da obra foi publicada recentemente. Antes das peças chegarem, havia a previsão de fazer da pista um centro de treinamento para os Jogos Olímpicos de 2016. Segundo a Prefeitura, a nova previsão para Previsão era para o início das obras é para o dia 13 de abril, com o prazo para conclusão marcado para depois das Olimpíadas.

O terreno onde será construído o velódromo e a planta do projeto.

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Do Rio para Pinhais O velódromo será construido na Vila Maria Antonieta, em Pinhais. Segundo o Ministério da Educação, o bairro tem uma população majoritariamente jovem e é o segundo mais populoso do município. Ao lado do terreno foi construido um Centro da Juventude. No entorno da região existem quatro escolas publicas.

O material chegou a Pinhais em abril de 2014, mas até agora a única obra iniciada foi a da construção dos tapumes para armazenar os materiais

Para a Prefeitura

Para a FECIERJ

A licitacao foi aprovada e as obras deveriam ter iniciado no dia 13 de abril. A prefeitura defende que a obra sera benefica para a populacao e que pretende promover atividades dedicadas a

A pista foi desmontada por interesses maiores do que a necessidade da construcao de um pista a nivel olimpico. A entidade esta sem treinar desde 2012, quando o velodromo

comunidade dentro do vao do velodromo.

Para a FPC O velodromo contribuira para o desenvolvimento do esporte no estado. As equipes profissionais que treinam atualmente na pista do Jardim Botanico ganhariam uma pista de padrao mundial para o alto-desenvolvimento e para a formacao de atletas principiantes.

foi desmontado na cidade carioca.

Para a oposicao Vereadores da base opositora ao prefeito Luiz Goulart (PT) consideram que o projeto foi apresentado as pressas para votacao e que o velodromo pode representar um presente de grego para o municipio.

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meio ambiente

Do Lixo às flores Município de São José dos Pinhais mantem projeto de reciclagem

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meio ambiente

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ma grande quantidade de lixo é jogada diariamente nos aterros sanitários espalhados pelo Brasil. Curitiba foi a primeira cidade brasileira a ter coleta de lixo seletivo, mas, apenas na capital paranaense e Região Metropolitana, por dia, são despejados 2,4 toneladas.

Apesar de o programa ainda não visar diretamente aos jovens, segundo Prado há palestras dentro das escolas da rede municipal, para que as crianças cresçam com conhecimento sobre reciclagem. Felipe Kxuera tem 26 anos e também faz a troca do material. “Eu participo do programa para dar um fim melhor ao lixo.

Além disso, segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), em todo o país, 42% dos materiais recicláveis são descartados

Assim, ajudo o meio ambiente que meus filhos um dia encontrarão”.

incorretamente, o que contamina o solo com toxinas.

quilograma de alumínio reciclado, por exemplo, evita a extração de cinco quilogramas de bauxita, minério de onde o material é originalmente produzido.

Para reverter essa situação e preservar o meio ambiente, o município de São José dos Pinhais criou o Programa Troca de Resíduos Recicláveis por Mudas de Flores ou de Árvores de Espécies Nativas. A iniciativa é aberta para toda a comunidade e tem o objetivo de conscientizar a população a reutilizar os materiais recicláveis. A partir de dois quilos, já é possível realizar a troca. Segundo Roque Cesar do Prado, coordenador do programa, “a troca acontece toda quinta-feira e são arrecadadas cerca de 30 toneladas de material reciclável”. No entanto, são permitidos apenas 100 quilos de material por contribuinte. Além de evitar o despejo de lixo nas ruas da cidade, há também a eliminação de resíduos dentro das casas. A dona de casa Denize Margaret participa de programas de reciclagem há mais de 15 anos e, segundo ela, “são retirados de 50 a 60 quilogramas de lixo mensalmente da minha casa e trocados por mudas de flores”.

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Além de gerar empregos, a reciclagem preserva a natureza e cria consciência ecológica. Um

Além de favorecer o meio-ambiente, o programa proporciona experiências ecoeducativas contribuindo com a cidadania. Na casa de recuperação Amor Ágape, os residentes, que fazem tratamentos contra o vício em substâncias psicoativas, utilizam a jardinagem como uma forma de terapia ocupacional. De acordo com a coordenadora da instituição, Rucineide da Serra, “este programa da Prefeitura trouxe uma oportunidade de trabalhar o convívio comunitário”. O projeto consiste na manutenção dos jardins externos das residências vizinhas a Instituição. “Os moradores se comprometem a separar os resíduos recicláveis para que façamos a troca por mudas de flores a serem utilizadas em seu jardim”, conta a diretora. Andressa Elesbão, Giovanna Kasezmark, Glaucia Périco e Raphaela Viscardi


crédito: Giovanna Kasezmark

meio ambiente

Projeto gera empregos e preserva a natureza

Problemas sérios Atualmente, existem sérios problemas com relação aos aterros sanitários - forma mais comum de destinação de resíduos sólidos - envolvendo espaço físico e manutenção. De acordo com a técnica em processos ambientais, Mayara Luiza Paiva, “quando materiais recicláveis são incorretamente destinados, os mesmos ocupam parte da área de depósito de resíduos, inviabilizando que outros sejam ali depositados e cria a necessidade da busca de um novo local, causando um impacto negativo no meio ambiente”, alerta. Ademais, a grande presença de material plástico nos aterros, gera

bolsões de chorume e impede que esse efluente seja coletado e tratado. A separação mais simples e usada no Brasil é a de resíduos secos e úmidos. Segundo Mayara, os principais materiais recicláveis são o plástico, papelão, vidro e metal. “Guardanapos usados, restos de alimentos e resíduos sanitários não são recicláveis. Quando os materiais recicláveis ainda possuem resíduos líquidos ou restos de alimentos que possam ser removidos, sugere-se que seja enxaguado para que o material mantenha seu valor.”

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comportamento

Ser ou não ser curitibano? Eis a questão

Morar na Região Metropolitana algumas vezes exige mais do que a necessidade de deslocamento para a capital, mas também a aceitação da identidade de morador suburbano Geane Godois

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uritiba tem facetas que chamam a atenção. Para alguns, ela é a capital mais fria do Brasil. Para outros, é a cidade-modelo em transporte público (mesmo que quem dele usufrua no dia a dia negue isso) e em iniciativas ecologicamente elogiáveis. Há quem diga que sua gente é discreta e até fechada, mas para muitos, o rótulo de “Cidade Sorriso” faz mais sentido. Porém, o peso maior sempre será o de ser a capital do Paraná. Atualmente, a cidade possui mais de 1,8 milhões de habitantes, de acordo com o último levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Contudo, outro dado também aponta que, diariamente, mais de 340 mil moradores de 18 municípios da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) vão trabalhar e/ou estudar na capital. A condição de ser morador “suburbano”, no entanto, às vezes é motivo de negação e até mesmo de vergonha, sobretudo entre os jovens. Os motivos são variados, como explica Anderson Cirino, de 14 anos, natural e residente em Pinhais. “Para mim, não sou pinhaense e, sim, curitibano. Aqui é pequeno e faço 38

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praticamente tudo lá (na capital). Então, qual a serventia de se morar aqui? Por enquanto, fico aqui com a família, mas no futuro gostaria de me mudar”, comenta. Para moradores mais antigos, no entanto, tal questão chega a ser irrelevante e até engraçada. As contradições de opiniões se fazem presentes dentro da mesma família, com experiências distintas de duas gerações. Jair Cirino, de 56 anos, é pai de Anderson e mora em Pinhais antes mesmo de ela ser emancipada de Piraquara, há recém-completados 23 anos. Ele vê as atitudes do filho como preconceituosas. “Fazemos a maioria das coisas em Curitiba sim, mas nem por isso precisamos renegar onde moramos. Aqui tem tudo o que tem lá, só que em menores proporções. Ser nascido ou morador de uma capital não faz alguém melhor que os demais por causa disso. É só um rótulo”, enfatiza. As divergências são contínuas e conflitantes no que diz respeito à construção da identidade pessoal dos indivíduos. Segundo José Carlos Fernandes, jornalista e consultor do Conselho Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico


comportamento

do Paraná, tal situação é compreensível e até justificável. “O orgulho e o desejo de sair, permita-me, podem ser sintomas da mesma frustração, mas manifestada em sentidos diferentes. Em tempo, lembremos que a expressão subúrbio não é negativa nos países desenvolvidos – ao contrário, é o lugar do exílio urbano, para onde muitos mudam para criar filhos, etc.”, explica. Mas há quem não encare a denominação de suburbano como algo negativo. Luana Hrycyna tem 20 anos, estuda em Curitiba e, desde que nasceu, mora em Araucária, uma das localidades que mais possui deslocamento para a capital paranaense todos os dias. Segundo ela, apesar de algumas desvantagens existentes na RMC, como o fato de não possuir mais que uma faculdade, por exemplo, residir no subúrbio não é um problema. “Ter vergonha da sua cidade é quase como ter vergonha de seus pais. Isso não é um defeito ou motivo para se envergonhar. Tenho muito orgulho da cidade onde nasci e não escondo isso de ninguém”, afirma. Em geral, as localidades entorno de capitais são menores e concentram menos polos de empregos e estudantis, sendo muitas vezes resumem-se a comércios e instituições de ensino básico (fundamental e médio) e, quando há a disponibilidade de cursos superiores, comumente são limitadas a áreas como engenharias, administração de empresas ou biomedicina. “As opções são bem restritas também no que diz respeito ao lazer e em variedades de lojas mais especializadas. Porém, a vantagem é que acaba sendo um lugar mais tranquilo, apesar de Araucária, assim como as demais cidades da RMC, estar crescendo visivelmente”, completa Luana.

Fernandes pondera que é preciso observar as cidades ao entorno da capital com mais atenção e deixar-se influenciar menos pelo preconceito. “Penso que conhecemos pouco as cidades vizinhas, julgando-as, do mesmo jeito que fazemos com as favelas, lugares iguais, cidades dormitórios sem vida própria ou coisa assim”, comenta. Além do mais, a Região Metropolitana está em constante crescimento, tanto quanto Curitiba. É preciso reconhecer as singularidades de cada localidade, para que então, cada qual faça parte de um conjunto regional e não como excludentes uma da outra. “Fazenda Rio Grande é uma cidade emergente. São José dos Pinhais é um dos municípios mais diversos e estimulantes do país. Campo Largo, uma pequena Curitiba. Almirante Tamandaré tem aspectos culturais que extrapolam a ideia de uma periferia violenta. E o que dizer de Araucária, que teve um dos melhores ensinos básicos do país. Em resumo, elas têm identidade, nós é que não percebemos nem investigamos esses territórios”, conclui o consultor.

Com 125 anos, Araucária é um dos exemplos de cidade que tem relação direta com a capital. Jornalismo PUCPR Revista CDM

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