JA Magazine | SET 2012

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M AG A Z I N E PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO N.º 2896 DE 27 DE SETEMBRO DE 2012 DO JORNAL DO ALGARVE E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE

Obra de Saramago vista à lupa em Vila Real de Santo António



Arquivo CMP_Filipe da Palma

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A necrópole de Alcalar é atualmente um dos monumentos megalíticos mais importantes a nível nacional

Visitantes podem participar nas atividades típicas da época em Alcalar

Como vivia um algarvio pré-histórico O dia-a-dia dos primeiros homens que habitaram a região vai ser revelado através de uma recriação histórica, a ter lugar no próximo sábado, nos monumentos megalíticos de Alcalar. Foi neste local, a meio caminho entre a ria de Alvor e a serra de Monchique, que os primeiros algarvios se fixaram há cinco mil anos. Hoje, os restos arruinados da grande aldeia pré-histórica são um exemplar perfeito de como se vivia há muitos milhares de anos

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neolítico final e o calcolítico", frisa a equipa do museu, referindo-se a ativida-des como "a caça, a tecelagem, a cerâmica, a ceifa, a moagem, o fabrico de objetos e utensílios, ou o processo utilizado para cozer cerâmica", entre outras experiências.

Viajem pela pré-história Arquivo CMP_Filipe da Palma

olir armas de caça, tear, fazer peças de barro ou cerâmica, moer farinha, deslocar grandes blocos de pedra ou atirar lanças. Estas são algumas das atividades que os visitantes poderão realizar em Alcalar, no próximo dia 29 de setembro. A iniciativa "Um dia e uma noite na préhistória em Alcalar", promovida em conjunto pela equipa do museu municipal de Portimão e da Direção Regional de Cultura do Algarve, no âmbito das Jornadas Europeias do Património, convida todos os algarvios a empreenderem uma "viagem no tempo", passando um dia e uma noite por entre os monumentos megalíticos de Alcalar. Nesta recriação histórica, são revelados os aspetos da vida quotidiana da comunidade préhistórica que habitou em Alcalar no terceiro milénio antes do nascimento de Cristo. Neste dia, as famílias podem participar em diversas atividades, que vão desde visitas orientadas aos monumentos até à participação em oficinas de olaria, tecelagem, caça, moagem e adornos, entre outras. Tudo isto se passa na freguesia da Mexilhoeira Grande, a cerca de nove quilómetros

A recriação pré-histórica que vai ter lugar, no próximo sábado, em Alcalar, vai mostrar como caçavam, semeavam e se vestiam os homens naquela altura

da cidade de Portimão, na estrada entre a Torre e a Senhora do Verde. Composto por cerca de 20 sepulcros agrupados em vários núcleos, a necrópole de Alcalar é um espaço cultural que inclui ainda dois edifícios megalíticos e é atualmente um dos monumentos megalíticos mais importantes do país, classificado como monumento nacional.

Monumentos megalíticos voltam a ganhar vida Há cinco mil anos, este lugar era uma grande aldeia pré-histórica, sendo o centro de um território habitado por comunidades camponesas dispersas em pequenos povoados, que se estendiam desde as margens da ria de Alvor até às encostas da serra de Monchique. Nos últimos anos, Alcalar e os seus vestígios com mais de cinco mil anos têm sido alvo

de visitas guiadas, dinamizadas pelo museu municipal de Portimão. Uma vez por ano, os monumentos megalíticos voltam a ganhar vida com a encenação das práticas e atividades da pré-história. Este ano, a iniciativa "Um dia e uma noite na pré-história" tem lugar já no próximo sábado, dia 29. "As propostas para este dia especial destinam-se a permitir uma abordagem de alguns dos aspetos da vida quotidiana da comunidade pré-histórica que habitou aquele local, há cerca de cinco mil anos", adianta a equipa do Museu de Portimão. Os responsáveis salientam que, para além das visitas orientadas por arqueólogos, os participantes vão poder ainda observar e participar em algumas das atividades. "As pessoas vão poder participar, experimentar e fazer coisas que garantiam a sobrevivência da população no período entre o

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A "viagem" pela pré-história tem entrada gratuita e pode ser feita de dia, entre as 10h00 e as 17h00. À noite, pela primeira vez em Alcalar, vai realizar-se a iniciativa "Uma noite na pré-história", entre as 21h00 e as 24h00. Nesta ocasião, e aproveitando a lua cheia, os telescópios vão ser apontados ao céu para permitir observar, descobrir e localizar os astros, com a colaboração da escola secundária Manuel Teixeira Gomes. A organização reserva ainda outras surpresas e novidades para esta noite especial, entre as quais os "sons da pré-história", produzidos a partir de instrumentos construí-dos com materiais e produtos naturais, a que se associam as vozes do Grupo Coral Adágio. O objetivo de "Um dia e uma noite na préhistória em Alcalar" é que os visitantes possam descobrir e participar nas iniciativas típicas da época, recriando também o modo de vida dos homens pré-históricos há cinco mil anos. Segundo os responsáveis, "o conjunto monumental tem sido objeto de intervenções de pesquisa, salvaguarda e valorização, desde o século XIX, por ser considerado um recurso patrimonial potenciador do desenvolvimento local", sendo que também oferece "uma explicação plausível para as mudanças operadas nos últimos cinco mil anos". Nuno Couto



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Evento realiza-se nos dias 13 e 14 de outubro

Feira da Perdiz leva animação à aldeia de Martim Longo A sexta edição da Feira da Perdiz realiza-se nos dias 13 e 14 de outubro, em Martim Longo, concelho de Alcoutim. Além das atividades ligadas à caça, haverá ainda artesanato, exposições, tasquinhas e muita animação

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rganizada pela Câmara Municipal de Alcoutim, a sexta edição da Feira da Perdiz vai ter lugar, nos dias 13 e 14 de outubro, no pavilhão desportivo José Rosa Pereira, em Martim Longo, apresentando uma exposição de espécies cinegéticas em que a perdiz será "raínha". À semelhança do que nos tem habituado em anos anteriores, a Feira da Perdiz vai oferecer uma enorme variedade de artigos ligados à caça, exposições de espécies cinegéticas, artesanato, gastronomia regional, animação musical e algumas atividades radicais. O certame visa promover o concelho como zona privilegiada da cinegética nacional, nomeadamente caça à perdiz vermelha. Para além da caça, a Feira da Perdiz tem ainda a finalidade de promover o concelho através do artesanato, música, das diferentes atividades desportivas e da deliciosa gastronomia. O programa inclui ainda atividades como tiro com arco, btt, seminários, falcoaria, largada de pombos, marcha corrida, exposições de animais e um micro safari. Ao longo dos últimos seis anos, a Feira da Perdiz tem crescido e melhorado. Atualmente, o evento apresenta-se com uma caracterização única, carregada de semblantes da natureza serrana. Javalis, veados, perdizes, cães de caça, coelhos, pombos, galos e peixes, são alguns dos animais que se podem ver na mostra. No espaço da feira, vendem-se diversas variedades de artigos ligados à caça e à pesca, além dos procurados pratos de caça. Muita animação de rua, o desfile equestre, balonismo, o concurso de cães e demonstrações de falcoaria completam o quadro de festa. Com cerca de 40 reservas de caça, o concelho de Alcoutim é bastante procurado para esta atividade, que é preciso rentabilizar com dinâmicas como a Feira da Perdiz, que mexem com a economia local e dão a conhecer este "paraíso cinegético".

A perdiz é a estrela principal da feira com o mesmo nome, que já vai na sexta edição

Mais uma semana de rastreio de cancro de pele em Alcoutim e Castro Marim Um novo rastreio de cancro de pele e outras doenças de foro dermatológico está a decorrer, ao longo desta semana, desta vez para as populações dos concelhos de Alcoutim e Castro Marim. “Simultaneamente

estão a ser efetuados tratamentos com azoto líquido a algumas dermatoses précancerígenas. As consultas são efetuadas nas sedes de freguesia dos dois concelhos. Os autarcas de Alcoutim e Castro Marim,

Francisco Amaral e José Estevens, agradecem, em comunicado, a pronta colaboração voluntária da médica dermatologista Manuela Aguiar, assim como da enfermeira Cristina Macedo. “Esta iniciativa dos municípios alcoutenejo e

castromarinense conta com o apoio da Administração Regional de Saúde do Algarve e será repetida periodicamente, procurando abranger o maior número de pessoas e continuar a observação dos alertas encontrados.

Programa contra a obesidade vence em Alcoutim Uma parceria entre o centro de saúde e a Câmara Municipal de Alcoutim, o programa de combate à obesidade está a dar frutos em Alcoutim. Todos os elementos do grupo, constituído ainda por quatro pessoas, baixaram o peso e os valores de massa gorda. O programa inicia-se com uma abordagem reeducativa. Acompanhados por um professor de Educação Física e uma nutricionista, os alunos começam por compreender a importância da prática regular de exercício físico e de uma alimentação saudável.

Depois de uma avaliação inicial da condição física dos alunos, a equipa avança com a elaboração de um plano personalizado, que passa pelo treino acompanhado no ginásio do Clube Náutico de Alcoutim, exercícios de ginástica localizada para realizarem em casa, pequenas “dicas” para as tarefas do dia-a-dia e uma dieta alimentar. O combate à obesidade no Algarve é uma iniciativa da ARS Algarve e do Instituto do Desporto de Portugal.

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Iniciativa inédita faz sucesso nos dois lados da fronteira

Obra de Saramago vista à lupa em Vila Real de Santo António Pilar del Rio, viúva de José Saramago, estará na cidade pombalina na sessão de abertura do projeto transfronteiriço de âmbito cultural, que decorrerá durante sete meses na Biblioteca Municipal Vicente Campinas e na de Huelva. Inscrições superaram as expectativas e esgotaram em poucos dias. Objetivo é a divulgação e a partilha de ideias sobre a obra do único “Nobel da Literatura” português

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espanhol Diego González, licenciado em Ciências da Educação, leu várias vezes a obra de José Saramago, sempre de lápis na mão. Os apontamentos que foi juntando ao longo dos anos deram origem a um documento que acabaria por mostrar ao próprio escritor e à sua mulher, Pilar del Rio, que residiam, na altura, em Lanzarote, nas Ilhas Canárias. Depois de lerem e de analisarem ao pormenor o trabalho de Diego González, não tiveram dúvidas em reconhecê-lo como um autêntico documento de estudo sobre a obra do, até agora, único escritor português a ser distinguido como o Prémio Nobel da Literatura. É precisamente este documento e os conhecimentos que possui sobre a obra e sobre o próprio José

Saramago, que Diego González levará às bibliotecas de Vila Real de Santo António e de Huelva, através do curso de literatura intitulado “Aula José Saramago”, que irá decorrer ao longo de sete meses, entre outubro e maio. “Sei que corri um grande risco ao mostrarlhes o que tinha escrito, mas, felizmente, eles aprovaram o trabalho. Depois, tinha duas hipóteses: guarda-lo para mim ou partilha-lo com as pessoas”, explicou, em declarações ao Jornal do Algarve, aquele amante e estudioso da obra de Saramago, fundador da associação cultural CRECIDA, na cidade espanhola de Ayamonte. “Optei pela segunda hipótese. Neste caso, Vila Real de Santo António e Huelva estão aqui tão perto, pois vivo em Ayamonte, e decidi partilhar este conhecimento com as pessoas, de

uma forma altruísta, porque também sei que vou desfrutar partilhando”, frisa Diego Gonzáles.

Divulgar os valores veiculados na obra Trata-se de um projeto de cooperação transfronteiriça de âmbito cultural, que pretende criar um espaço de reflexão e debate, proporcionando um maior conhecimento da obra de José Saramago, de forma que a mesma possa vir a ser utilizada como recurso didático, na formação de uma cidadania responsável. O curso conta com o apoio da Fundação José Saramago, e decorrerá simultane-

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amente na Biblioteca Vicente Campinas de Vila Real de Santo António e na Biblioteca Provincial de Huelva. O dinamizador desta iniciativa inédita explica que pretende levar a cabo “uma espécie de clube de leitura”, mas “centrado apenas em José Saramago” e onde “serão abordados os valores veiculados na sua obra”. “Saramago tem muitos admiradores, em grande parte, devido à sua forma de escrever. Esta iniciativa acaba por representar, também, uma homenagem ao escritor”, diz Diego González, sublinhando que “seria muito importante” que os participantes “continuassem a divulgar os valores que estão representados na obra de José Saramago”. A iniciativa despertou tanto interesse que o


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limite de inscrições foi atingido, tanto na cidade pombalina como em Huelva, em poucos dias. A organização, a cargo das duas bibliotecas e do próprio Diego González, tinha previsto 20 participantes em cada uma das cidades e o dia 1 de outubro como data limite. No início de setembro, e só em Vila Real de Santo António, já havia cerca de meia centena de interessados em participar. Curiosamente, muitas das inscrições efetuadas na biblioteca da cidade pombalina correspondem a participantes espanhóis.

Escritor amado e odiado “Muitas pessoas continuam a contactar-nos e querer inscrever-se. Vamos tentar convencer o dinamizador da iniciativa a aumentar um pouco mais o número de participantes, porque estamos a verificar que há muito interesse”, revela Assunção Constantino, uma das coordenadoras da Biblioteca Municipal Vicente Campinas, de Vila Real de Santo António. Para Mariana Rego, que reparte a coordenação da biblioteca com Assunção Constantino, a explicação é simples: “Além de ser um escritor que está na moda, também é um escritor que tem como característica o facto de ser muito amado ou muito odiado. As pessoas adoram ou odeiam a obra de Saramago. E quem a adora não perde a oportunidade de participar nestas ações e saber um pouco mais”.

Além de pessoas ligadas à área das letras, a iniciativa está a atrair participantes das mais variadas áreas e de todas as idades. “Temos inscrições de pessoas das áreas das ciências, pessoas sem qualquer tipo de formação es pecífica, pessoas de diferentes níveis de formação e de habilitações, estudantes... Penso que esta ação reúne, acima de tudo, amantes da obra de José Saramago”, explica Assunção Constantino. “Trata-se de partilhar a leitura que cada um fez dessa obra. E essa partilha levará uma discussão, que será certamente enriquecedora para todos. Esse será o objetivo principal”, remata Mariana Rego.

Pilar del Rio na sessão inaugural Quem não conseguiu inscrever-se terá a possibilidade de assistir à sessão inaugural, aberta ao público, que decorrerá na Biblioteca Municipal de Vila Real de Santo António, no próximo dia 8 de outubro, a partir das 18h00, e que contará com a presença de Pilar del Rio, viúva de José Saramago. Esta sessão contará, ainda, com a presença dos participantes do curso que decorrerá em Huelva. Ao longo dos sete meses serão analisadas e

debatidas nove obras do escritor: “Deste mundo e do outro (29 de outubro), “Levantado do chão” (19 de novembro), “Viagem a Portugal” (10 de dezembro), “O ano da morte de Ricardo Reis” (14 de janeiro), “O evangelho segundo Jesus Cristo” (04 de fevereiro), Caderno de Lanzarote (25 de fevereiro), “Ensaio sobre a cegueira” (18 de março), “Ensaio sobre a lucidez” (08 de abril) e “O caderno 2” (29 de abril). A sessão de encerramento está agendada para o dia 7 de maio de 2013, na Biblioteca Provincial de Huelva.

Domingos Viegas

De Azinhaga ao Prémio Nobel Filho e neto de camponeses, José Saramago nasceu na aldeia de Azinhaga, província do Ribatejo, no dia 16 de Novembro de 1922, se bem que o registo oficial mencione como data de nascimento o dia 18. Os seus pais emigraram para Lisboa quando ele não havia ainda completado dois anos. A maior parte da sua vida decorreu, portanto, na capital, embora até aos primeiros anos da idade adulta fossem numerosas, e por vezes prolongadas, as suas estadas na aldeia natal. Fez estudos secundários (liceais e técnicos) que, por dificuldades económicas, não pôde prosseguir. O seu primeiro emprego foi como serralheiro mecânico, tendo exercido depois diversas profissões: desenhador, funcionário da saúde e da previdência social, tradutor, editor, jornalista. Publicou o seu primeiro livro, um romance, Terra do Pecado, em 1947, tendo estado depois largo tempo sem publicar (até 1966). Trabalhou durante doze anos numa editora, onde exerceu funções de direcção literária e de produção. Colaborou como crítico literário na revista

Seara Nova. Em 1972 e 1973 fez parte da redacção do jornal Diário de Lisboa, onde foi comentador político, tendo também coordenado, durante cerca de um ano, o suplemento cultural daquele vespertino. Pertenceu à primeira Direcção da Associação Portuguesa de Escritores e foi, de 1985 a 1994, presidente da Assembleia Geral da Sociedade Portuguesa de Autores. Entre Abril e Novembro de 1975 foi director-adjunto do jornal Diário de Notícias. A partir de 1976 passou a viver exclusivamente do seu trabalho literário, primeiro como tradutor, depois como autor. Casou com Pilar del Río em 1988 e em Fevereiro de 1993 decidiu repartir o seu tempo entre a sua residência habitual em Lisboa e a ilha de Lanzarote, no arquipélago das Canárias (Espanha). Em 1998 foi-lhe atribuído o Prémio Nobel de Literatura. José Saramago faleceu a 18 de Junho de 2010. (FJS)

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Arco da Vila - Monumento Nacional - 2.º Centenário

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niciámos um estudo que nos irá levar ao conceito exigente em considerar a milenária cidade de Faro, lugar de variados topónimos (já para uma considerável catalogação que herda para lá de 2.000 anos), à categoria de Cidade Monumental do Algarve, com o Arco da Vila a abrir a porta da história desde Ossónoba, de Santa Maria do Ocidente (segundo David Lopes), até que chegue à Faarun cristã. Comecemos pela entrada neoclássica da Porta Monumental que o povo chamou (continuando) em Arco da Vila, o mais distinto e reconhecido monumento citadino, como Monumento Nacional, desde 16 de Junho de 1910. Vamos ao conhecimento e à vontade de um notável bispo em reconstituir a cidade de Faro após o terramoto de 1755. O padre Francisco Gomes de Avelar, sagrado bispo na igreja das Necessidades, em Lisboa, em Abril de 1789, um mês depois está à frente da diocese do reino do Algarve, encontrando uma igreja central em ruína, tanto quanto o burgo: Na cidade de Faro, hera hoje (1 de Novembro de 1755) a mais brilhante do Algarve pela nobreza dos seus edifícios, pelo florescimento do seo comércio, e trato dos seus moradores (1).O bispo Avelar transporta uma renda anual de dois contos e quatrocentos mil réis para, num espaço de dez anos, reconstruir a sua catedral. E a cidade? E o Algarve da sua responsabilidade? Em poucos minutos foi vista a formosa Faro hum monte de ruínas.(2) Sabemos, por cronistas do tempo próximo, como Moreira Baptista, João Baptista da Silva Lopes, Damião António Faria e Castro, como o recente bispo vinha carregando uma mala de vontades e, sobretudo, homem de cultura ganha por Roma. Assim sendo, logo, após a ocupação francesa pelo Algarve e sob comando do general Maurin, a partir de Faro, e na revolta dos farenses, a partir de 19 de junho (1808), se inicia um novo tempo e novos apoios com a ida de altos representantes do reino do Algarve, ao Brasil, para reconhecimento do governo constituído, após a retirada do ocupante francês, em que D. Francisco Gomes de Avelar assumiu o governo temporal, inicialmente. Sendo urgente informar O regente do reino, o príncipe D. João, com a corte e governo no Rio de Janeiro. Um mês após a largada do caíque “Bom Sucesso” com pescadores de Olhão/Faro(3), para uma prova de verdadeiro patriotismo da gente humilde do reino do Algarve, a sensibilizar, no outro lado do Atlântico, o futuro rei Clemente, zarpa Ria a fora, o iate Nossa Senhora do Carmo (em correio marítimo para o Brasil), chefiado pelo cónego doutor António Luís de Macedo e Brito, em viagem oficial e de Estado: que o Reino do Algarve estava liberto, aceitando de Sua Alteza reconhecimento heróico ao povo do concelho de Faro e de do governo constituído, tendo à cabeça o seu Bispo. De regresso a Faro, o Cónego Macedo e Brito transporta a farta benesse: o Arcebispado para D. Francisco Gomes de Avelar e a gorda esmola para apoiar a reconstrução da cidade de Santa Maria, a capital do Algarve. E a freguesia de Olhão ganhou concelho e gratificações aos heróis, audazes marítimos que afrontaram o Oceano. Estávamos no auge do neoclassicismo arquitectónico. O bispo, tendo necessidade de técnico à altura dos projectos para a cidade, chama o arquitecto italiano, natural de Bolonha, de nome Francesco Saverio Fabri(4) para os novos traços da cidade desejada, ainda em fins do século XVIII. O movimento neoclássico, inspirado na arte romana com as descobertas arqueológicas em Herculano e Pompeia, na Itália, em meados do século XVIII, vai transformar as grandes capitais europeias, nessa imitação que vem dos primeiros arcos romanos, como o Arco de Tito, construído no ano 81, em Roma, e nos que se seguem na capital do império, como o Arco de Septimo Severo (202-208) e Arco Constantino, ano 316. Na era de Cristo. Temos em Portugal, no tempo do iluminismo pombalino, o projecto do arco da rua Augus-ta, como toda a reforma da arquitectónica da baixa iniciada depois da reforma de 1775, na responsabilidade dos arquitectos Machado de Castro e Eugénio Santos, sendo o Arco do Terreiro do Paço só terminado com o rei D. Luís I, em 1870. Como todas as célebres portas das capitais europeias, a de Lisboa não é menos imponente que as suas congéneres, vinda

no mesmo espírito do neoclássico, igualmente profano. Em 1806, com Napoleão impulsionador do novo movimento arquitectónico, manda construir o Arco Triunfal do Carrousel, em Paris, no jardim do Louvre, numa imitação do Arco Constantino de Roma, da autoria de François Bosio. Em 1836 é inaugurado o célebre Arco do Triunfo, no alto dos Campos Elísios, em Paris. O Arco do Triunfo foi planeado pelo arquitecto Jean Chalgrin e decorado pelos escultores Rude, Pradier, Cortot e Etex. De realçar a figura simbólica da La Marseillaise, o símbolo maior da revolução francesa. Ainda, no ano de 1920, no arco central, foi colocada a chama em homenagem ao Soldado desconhecido; tal como se encontra em Portugal, no Mosteiro da Batalha. Berlim tem orgulhosamente a Porta de Brandebourg, construída por Carl Langhans, tendo como modelo as formas de um templo grego, um neoclássico terminado em 1791. Este é o símbolo de Berlim (tanto que o Arco do Triunfo em Paris). A Brandebourg de Berlim constitui-se por uma quadrícula que sobre-monta as cinco portas em seis colunas douradas. Os quatro cavalos (num mélange grego-romano) tiram um carro transportando a deusa Victória. O conjunto dourado foi construído pelo chaudronnier Freserich Jury, fabricante de peças estampadas em cobre, da autoria do artista plástico Johann Schadow. FARO - O ARCO DA VILA – 1812 - Ainda neste ano de 2012, quando se completam dois séculos da construção de tão notável monumento, perguntamos como foi possível, para um bispo de uma pequena cidade e diocese, mas de grande responsabilidade e notoriedade histórica, como sede das primeiras cidades diocesanas cristãs, durante o Império romano, séculos 2-3, assumir tamanha responsabilidade em projecto e concretização de arquitectura classicista, para a época, onde tudo se iniciava no início do século XIX, em capitais europeias de grandes poder político, financeiro e económico!? Responsabilidade assumida, o bispo D. Francisco, como já se disse, contrata o arquitecto Francesco Fabri, de Bolonha, para Faro. Assim se entende a rapidez com que o movimento se introduziu entre nós, com o Arco do Carroucel de Paris (1808) e o de Faro (1812), sabendo que os movimentos artísticos chegavam JORNAL DO ALGARVE MAGAZINE - SETEMBRO/2012

sempre muito mais tarde a Portugal pelas distancias e adaptação dos artistas e mecenato. Com a vinda de Fabri, não só Faro, assim como toda a arquitectura religiosa do Algarve se impulsiona, até que a corte chame o italiano para colaborar no palácio da Ajuda, em Lisboa, onde, repentinamente faleceu, na capital portuguesa, a 23/10/1817, cinco anos após a inauguração, em Faro, do seu notável traço. Quando iniciar a visita Vila Adentro, pare a dez metros do Arco da Vila. Repare na imponência da Porta oitocentista e clássica que Fabri transformou na preexistente de origem árabe. O Arco está corrigido ao clássico europeu, sem aquela visão dos neo-grego-romano. Não tem nada, absolutamente, desse profanismo de Paris, Berlim ou outras cidades, em construção, desse movimento classicista. A importante porta que nos leva, a partir de então, ganha a importância de toda a memória em poderes que toda a Muralha fechou e determinou nos séculos, em espaço sacro e político da antiga Ossónoba dos primeiros bispos em Império Romano: Vicente, Itácio, Pedro, Saturnino, Agrípio, entre tantos outros. Esta é a cidade destruída pelas catástrofes naturais e humanas, e renascida numa autêntica Fénix... Não deixe de olhar e admirar, todo o conjunto arquitectónico: a Porta enquadrada por duas colunas jónicas e encimada por um nicho em que se honra a estátua do padroeiro da cidade, S. Tomás de Aquino, desde o século XVII (7 de Março de 1689), num admirável mármore branco, vindo algures de Itália. Elevando o olhar, reparamos toda a estampa do conjunto arquitectónico enquadrado por outra composição dividida por quatro pilastras (colunas) e rematada por um campanário com frontão triangular entre outros efeitos decorativos em pináculos, aletas e no que o olhar irá descobrindo em admiração e emoção, em que nem só o conhecimento do erudito clássico merece a contemplação num olhar de gente. Assim, só podemos descortinar um admirável retábulo em pedras de cantaria e mármores: Esta é a Porta de todo o merecimento admirativo. É o nosso Arco da Vila que a cultura de um bispo português e o engenho de um arquitecto italiano nos legaram para o nosso pequeno orgulho citadino e de cidadão, em que discretos obreiros: artistas canteiros, pedreiros do concelho de Faro e da própria cidade deram os contributos. Passado um século, 1910, nessa mudança que os homens fazem, chegou a República. Lá está o pináculo, do já Monumento Nacional a receber o símbolo verde e vermelho das cinco quinas, no esforço de um marinheiro da terra, Joaquim Paula Correia, a trepar o alto do Arco da Vila, colocando-lhe a bandeira da República, pela indecisão política do conservadorismo local. Em 1919, alguém reparou que o círculo traçado para lá ser colocado um relógio, ainda estava em branco. Então um mecenas da cidade, um militar, Coronel António Santos Fonseca, escreve ao presidente da Câmara Municipal de Faro, pronto a corrigir a falta de um século, oferecendo um relógio para completar as vontades do Arcebispo Avelar e do arquitecto Fabri. O conteúdo da carta foi este: Senhor Presidente da Câmara de Faro. Se a Câmara a que V. preside, se digna aceitar esta minha oferta, como modesta é a sua intenção, rogo a V. a fineza de assim me informar, para se fazer a encomenda desta machina no estrangeiro. Assinado Coronel António Santos Fonseca.(5)

Teodomiro Neto 1) “História Universal dos Terremotos” de Joachim Joseph Moreira da Silva Edição - 1758 - Lisboa 2) Manuscrito de Faria e Castro - 1786 - Residente local, Palacete dos Pantojas - Rua de Santo António - Faro 3) ”Restauração dos Algarves ou os Héróis de Faro e Olhão”, de Luís de Sequeira Oliva - 1.ª Edição Imprensa Régia - 1809 4) “Francesco Saverio Fabri - Architetto - Medicina - 1761 - Lisboa 1817 uno Studio di Ayres de Carvalho”. 5) Semanário “O Algarve” - 21/09/1919. A ilustração é da autoria do médico-pintor Vicente de Brito; quadro actualmente exposto no Museu Municipal de Faro, e cedido pelo autor, para o Jornal do Algarve, na ilustração do texto.


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Mais de um milhão de visualizações no portal de turismo e lazer mais visitado do país

Baixo Guadiana não para de ganhar adeptos O Baixo Guadiana não para de ganhar adeptos e para isso muito tem contribuído o canal no portal Lifecooler, que já é um sucesso no mundo virtual, com mais de um milhão de visualizações só entre março e julho. O projeto, que foi lançado no final do ano passado pela Associação para o Desenvolvimento do Baixo Guadiana (Odiana), dá a conhecer a oferta turística, cultural e patrimonial dos concelhos de Alcoutim, Castro Marim e Vila Real de Santo António

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assaram oito meses, portanto, desde dezembro de 2011, que o Baixo Guadiana deu mais um passo na política de promoção turística, ao colocar o território em divulgação permanente no diretório nacional turístico Lifecooler. Com mais de 195 mil visualizações em março, a curva de crescimento é unânime, passando para 213 mil, 247 mil, 269 mil (meses de abril, maio e junho, respetivamente), até alcançar 331 mil visualizações no passado mês de julho. Uma soma exponencial com mais de um milhão de visualizações (1.256.589) pela forma mais célere de aceder ao território, através da janela virtual. O tráfego traduz, segundo a Lifecooler, “um crescimento assinalável”, que acredita deverse à extensa promoção da oferta turística e do “fator novidade”, nomeadamente nos períodos de férias da Páscoa e estação estival. Mais uma vez, e à semelhança do primeiro trimestre do canal online, os guias de alojamento, restauração e património são as secções mais pesquisadas e que têm servido como base de apoio para quem a partir de longe organiza as suas férias num território cuja qualidade é indiscutível. De salientar que o canal do Baixo Guadiana dispõe ainda de vários dossiês temáticos, bem como reportagens escritas e fotográficas. Garante a Lifecooler que “com um curto período de vida útil, o facto de se ter ultrapassado a fasquia de um milhão de páginas vistas em cinco meses, espelha a capacidade de atratividade que o território do Baixo Guadiana apresenta aos olhos de quem navega na

O objetivo é dinamizar as potencialidades e imagem turística dos concelhos de Alcoutim, Castro Marim e Vila Real de Santo António

internet à procura de sugestões para os fins de semana e períodos de férias”.

À distância de um simples clique E se os resultados do turismo virtual são, de acordo com a Odiana, “excelentes”, os mesmos passam do virtual para o terreno

quando a Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA) apresenta à imprensa o resumo de evolução do mês de julho, no qual a zona de Monte Gordo e Vila Real de Santo António registou a taxa de ocupação média mais elevada com 82,7 por cento. “Os resultados são extremamente positivos e dão voz e corpo à estratégia promocional

e turística conjunta para a região transfronteiriça do Baixo Guadiana”, frisam os responsáveis. A associação e os três municípios envolvidos destacam ainda que, com este portal, qualquer turista, nacional ou estrangeiro, pode desvendar a serra, o barrocal e o litoral dos concelhos de Alcoutim, Castro Marim e Vila Real de Santo António. E tudo à distância de um simples clique...! O canal Baixo Guadiana dá ainda a conhecer em pormenor a oferta turística, cultural e patrimonial dos três concelhos algarvios, através de reportagens, fotoreportagens, bases de dados consultáveis e agenda cultural. De acordo com os promotores do projeto, “o site Lifecooler consegue ir ao encontro das expectativas de todos os que procuram sugestões de passeios, alojamento, restauração, oferta cultural, paisagística e ornitológica”. A oferta turística é permanente e incide sobretudo na natureza, património, praias, o rio Guadiana e os percursos pedestres. Recorde-se que o site Lifecooler é atualmente o portal nacional mais completo de lazer e viagens, sendo também o mais visitado em Portugal. O diretório de recursos turísticos oferece aos leitores diversas possibilidades de pesquisa, cobrindo desde alojamento e restauração a património ou natureza, entre muitos outros temas, por todo o país. O portal oferece ainda uma agenda cultural completa e atualizada, com destaque para os principais eventos da semana, merecedores de sinopses mais aprofundadas.

Sessão de esclarecimento sobre medida “Passaporte Emprego”

Apoios ao emprego jovem em Castro Marim e Alcoutim

Combater o desemprego é um dos principais objetivos da recente medida “Passaporte Emprego”. A medida concretiza-se através do apoio à contratação de desempregados e o aumento da sua empregabilidade com a componente de formação profissional. É nesse sentido que a Associação para o Desenvolvimento do Baixo Guadiana (Odiana), em colaboração com o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) de Vila Real de Santo António e com o apoio das câmaras municipais de Alcoutim e Castro Marim, vai levar a cabo uma sessão de esclarecimento e informação sobre a recente medida “Passaporte Emprego”. A sessão tem data marcada para o próximo dia 3 de outubro, quarta-feira, pelas 18h00, na biblioteca municipal de Castro Marim e conta com a presença de Álvaro Araújo, diretor do Centro de Empre-

go de Vila Real de Santo António, Valter Matias, diretor executivo da associação Odiana, e Francisco Amaral, presidente da Câmara Municipal de Alcoutim. O programa “Passaporte Emprego” apresenta um conjunto alargado de medidas de combate a um dos principais desafios com que Portugal se confronta atualmente: os elevados níveis de desemprego jovem. Esta medida apoia a contratação de desempregados e pretende aumentar a sua empregabilidade através de formação profissional, tendo como destinatários todas as empresas e entidades privadas com ou sem fins lucrativos. Recorde que a sessão é gratuita mas não dispensa a confirmação, até dia 2 de outubro , às 17h00, para os seguintes contactos: associação Odiana: 281531171; e-mail: geral@diana.pt.

JORNAL DO ALGARVE MAGAZINE - SETEMBRO/2012


Música I Cinema

10 Fernando Proença

LITERATURA INCLUSA

Trinta e Cinco 1 – Sobre o que é uma obra prima.

A característica dominante da obra prima literária é que raramente é intencional. As contingências de que depende – sorte cronológica, imponderáveis picos de forma, correspondência entre intenções e sensibilidade – não podem ser reproduzidas em laboratório, nem sujeitas a planeamento central. O talento pode empurrar-se a si próprio até aos limites; para os romper precisa da colaboração activa das circunstâncias, e de um consenso fortuito entre contemporâneos e posteridade. Fortuito, porque qualquer obra – prima é imperfeita, e a imperfeição quase nunca produz consensos. De um obra – prima exige-se tacitamente que provoque cisões, e que regenere o equipamento estético do seu público. No seu trajecto para a imortalidade, a obra - prima tem de se afastar de antepassados e precursores; tem de dissolver convenções estabelecidas por obras – primas anteriores e testar soluções noivas; tem de renunciar à perfeição formal que o apetite artístico contemporâneo se habituou a reconhecer e aspirar a uma inclusividade alarve, com todo o seu lastro de protótipos, patentes, rejeições e fiascos; tem de abraçar o génio, o tédio e todas as categorias

intermédias; e tem de cortejar activamente o fracasso. Rogério Casanova na revista Ler de Outubro de 2009, a propósito de 2666 de Roberto Bolaño. Uma das virtudes de aliviar carga (serve roupa, livros, papelada variada não directamente relacionável com o preenchimento da declaração do IRS) quando se arruma a casa é encontrar: 1 – o que sabíamos existir mas não o seu respectivo paradeiro – aquela factura da farmácia. A partir do próximo ano, a factura do barbeiro onde fizemos extensões. O livro de José Eduardo Agualusa, que pensávamos muito inteligentemente ter atirado fora, mas que, por ínvios caminhos ainda permanece numa qualquer esconsa prateleira ; 2 – o que não sabíamos, ou já não nos lembrávamos que existia, porque: 2 – 1 – não nos tinha interessado numa primeira abordagem. Por exemplo um romance de Gonçalo M. Tavares, que por estranho que pareça continuará a não me interessar. 2 – 2 – não tínhamos reparado na sua existência. Por exemplo, que ainda temos um número atrasado do Jornal de Letras. Sabiam que ainda se publica o JL? Agora quinzenário, de cada edição pouco se aproveita, entre excertos de teses de mestrado sobre, “A alma portuguesa em Valter Hugo Mãe; subsídios para o seu estudo”, e dossiês extensamente enredados na parte menos conhecida da obra de Pepetela; mas publica-se. E passa por ser muito bom no meio de todo o lixo que enche os escaparates. Porque precisei de espaço, resolvi elaborar uma lista de publicações para marcha e reciclagem e a Ler, saiu nos primei-

ros lugares. As revistas são visualmente atraentes mas quando não há lugar para tudo têm que se fazer opções. E entre a Playboy e a Ler, descubram as que guardarei. Adiante: não sei se conhecem as revistas em causa; estou a falar da Ler, não se ponham agora com ideias que eu bem sei os bons pilares da família que os meus amigos são. Se a conhecem e antes de passar à frente, gostava de lhes perguntar, só para saber a vossa opinião: não acham que as revistas portuguesas sobre livros começam com muita força, cheias de ideias e, paulatinamente, mês após mês, vão perdendo todo o interesse que tinham, até desaparecerem ou estiolarem? Pois bem: Revista em punho, passagem de olhos, rasgam-se e recortam-se artigos que nos serão úteis ou não e no meio de tudo aquilo, uns textos que lemos pela segunda vez, como se tropeçássemos mas aqui em modo suave e miraculosamente claro. Atentemos no artigo de Rogério Casanova sobre, obras – primas, onde as descobrir?, servirá para o que interessa: em que categoria incluir o disco, “The Bravest Man In The Universe” de Bobby Womack? (XL – RECORDING; 2012)?. Womack de 68 anos de idade, veterano da Soul, há muito afastado da ribalta, volta a gravar depois de sobreviver a uma mão cheia de escândalos, drogas e até um cancro. Não gravando desde 1994, tinha uma carreira mais encalhada que o Tallon (se não sabem o que é, vão à Net), quando Damon Albarn dos Blur, juntamente com Richard Russo manda chuva da XL - Recording, lhe propuseram construir o edifício sonoro a partir do qual, aplicaria (não sei se o verbo perfeito será este, mas serve) a sua voz. A ideia foi, usar o que é hoje a mistura ideal para cobrir o

Apontamento de Vídeo Angèle e Tony "A pacata vida de Tony é interrompida pela chegada da jovem Angèle, uma mulher que, tal como ele, nada sabe sobre o amor. As suas tentativas para seduzir Tony são logo rejeitadas. Ele não consegue acreditar que ela está ali por sua causa..." Sobre este filme, diz-nos a sua realizadora Alix Delaporte: "Queria contar uma história de amor num ambiente que me fosse familiar. Esta pequena cidade de pescadores foi a escolha óbvia, na mesma medida em que se estivesse nos EUA teria provavelmente filmado um Western. Os pescadores transformar-se-iam em cowboys e o mar passaria a ser uam grande planicie. A natureza evoca sentimentos mais cruz, menos palavras e mais emoções primárias... E foi exactamente isso que pretendi para este filme". Interpretação de grande mérito, numa película muito realista. Realização e Argumento: Alix Delaporte Com: Coltilde Hesme, Gregory Gadebois, entre outros. Distribuição: Clap Filmes

Vítor Cardoso

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que quer que seja que se queira parecer com moderna música soul a roçar o intelectual mas mesmo assim deixando-se fruir com razoável facilidade. E é feita de R&B não padronizado, Dub, música de dança e em geral tudo o que faça lembrar uma África convenientemente de plástico por causa dos mosquitos. Só falando daqui desta área, do que está gravado, não se daria mais de seis em dez, isto se pudéssemos separar as coisas. A questão central, no entanto, é a voz, meus amigos, a voz poderosa mas cheia de matizes do velho homem da soul, que continua intacta ao mesmo tempo que mais grave e adulta, fazendo respeitar os silêncios que é um feito a que poucos chegam. Onze em dez, depois de ouvir o disco, para ser absolutamente mais correcto. Correcto não é certamente, porque aqui só vale a emoção. Então vem lá o rasto da obra – prima que se fala ao princípio. Será que algum dia o chegará a ser?, nos desequilíbrios, entre som, produção e voz, é esta que me arrebata e convence. Vão já dizer que não. Mas vale bem que o ouçam primeiro.




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