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DE ALAGOAS

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MEIO AMBIENTE

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Nunes Lima e a essência dos cínicos

Camisa bonita, ajustada dentro das calças, cinto discreto, sapatos engraxadíssimos. Óculos, cabelos e enganosa fragilidade, sustentados num corpo miúdo, tímido, inquieto.

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Para caber entre nós, o gigante se disfarçava. Era impossível saber que aquele homem construía personagens, desenhos e crônicas.

Nunes Lima tinha as formalidades de alguém que passeava engolindo o chão.

Invisível nos ônibus, descia seu manto mágico ali no ponto do 59º BIMTz para atravessar a impossível Fernandes Lima. E surgia do outro lado, na rua da Importadora. Chegava ao casarão alugado pelo EXTRA no Pinheiro. Entregava o envelope semiaberto, também disfarçado de carta dos Correios.

Era o texto datilografado e o desenho em papel da edição da semana. Se vivo estivesse, associaria todo este seu ritual de partidas e chegadas semanais, mais esconderijos escandalosos, a estes tempos criativos com joias de milhões viajando desinteressadas por aeroportos na mala do aspone ou dinheiro entre outras joias, nas cuecas.

Nunes tinha sorte. Os raios X ainda não leem o que vai escrito e desenhado nos papéis.

Também o ChatGPT e toda a sua inteligência quase viva e artificial não percebe que há subversão Nunes Lima ou rebeldia naqueles desenhos com gente nariguda, vestidos em roupas compradas na feira e histórias carregadas de entrelinhas.

Teimam em tirar a alegria do povão. Nunes devolvia a dignidade aos simples. As gentes poderiam permanecer, de propósito, longe dos palácios de quem os dominava. Mas a identidade estava a salvo.

Sua lanterna, sempre acesa, procurava a essência. Quando nos deixou aos 80 anos, em 4 de julho de 2011, esperou todo mundo sair do cemitério, abriu o túmulo, jogou fora sua capa mágica. O gigante era Diógenes, o cínico filósofo que descobriu o segredo da vida: o povo tinha de ser feliz.

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